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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Faculdade de Direito

Fundamentos do Direito Público II

Professor Pietro Alarcón

Monitor Fabrizio Prado

São Paulo, 20 de setembro de 2021

Nomes:

Helena Maiorino Degiovani - RA00299158

Leonardo Couto Fontana - RA00299101

Marina Luzia do Amaral - RA00299159

Orientação:
Os alunas e alunas, em grupos de três, deverão realizar um juízo crítico com relação à
jurisprudência em anexo do STF. Destacando cada uma das características dos direitos
fundamentais que foram levadas em conta e oferecendo argumentos sobre sua concordância
ou discordância da decisão da Corte.

Primeiramente, é importante definir o que são os direitos fundamentais, isto é, direitos


protetivos, os quais asseguram o mínimo necessário para que uma pessoa possa existir de
maneira digna dentro do corpo social administrada pelo Estado. Esses direitos estão previstos
no título II da Constituição Federal de 1988 e possuem como alicerce a dignidade da pessoa
humana.
Em vista disso, pode ser analisado o caso de habeas corpus coletivo, proposto por
cinco advogados membros do Coletivo de Advogados em Direitos Humanos, a respeito das
condições precárias as quais mulheres gestantes, puérperas ou mães de crianças sob sua
responsabilidade são submetidas no sistema carcerário, situações as quais violam diversos
direitos fundamentais. Nesse sentido, o pedido feito pelo grupo foi determinado cabível de
ser decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e este direito foi julgado favorável à
solicitação dos advogados. Dentro da prisão, eles afirmaram que as mulheres grávidas não
têm acesso a exames pré-natal, assistência na gestação e no pós-parto, e as próprias crianças,
por terem que crescer dentro do ambiente carcerário, são privadas das condições necessárias
para o seu desenvolvimento apropriado. Isso, de acordo com o grupo de advogados, se
enquadra em tratamento desumano, cruel e degradante.
Isto posto, pode-se analisar o caso de habeas corpus coletivo sob a perspectiva das
características dos direitos fundamentais, visto que o pedido realizado pelo Ministro Ricardo
Lewandowski em conjunto com os membros do Coletivo de Advogados em Direitos
Humanos, Eloísa Machado de Almeida, Bruna Soares Angotti, André Ferreira, Nathalie
Fragoso e Hilem Oliveira possui como um de seus fundamentos o fato de que o Estado não
possui a capacidade de assegurar os direitos fundamentais às encarceradas em virtude dos
obstáculos postos relativos à gestação e à maternidade.
Primeiramente, a singularidade da fundamentalidade pode ser relacionada a este caso,
posto que esta é crucial para a revelação dos direitos fundamentais fora do que está prescrito
na Constituição, permitindo uma autorização extensiva. A fundamentalidade se transparece
pelo conteúdo do direito, isto é, os valores supremos do ser humano e preocupação com a
promoção da dignidade da pessoa humana e também se transparece pela posição normativa.
Desta maneira, pode-se afirmar que essa característica se constitui como um alicerce
no caso analisado, dado que o reconhecimento dos direitos fundamentais deve ocorrer no
âmbito material, ou seja, tornar-se concreto na realidade social, isto quer dizer que é essencial
que o que está prescrito no título II da Constituição Federal de 1988 acerca dos direitos e
garantias fundamentais seja transformado em práticas concretas. Assim, pode-se dizer que o
pedido de habeas corpus no caso de mulheres gestantes, puérperas ou mães de crianças é uma
forma de assegurar os direitos fundamentais dessas mulheres no âmbito material.
Em sequência, a característica da internacionalização diz respeito ao reconhecimento
dos direitos fundamentais pelas comunidades internacionais. Sendo assim, no caso, essa
característica fica evidente ao tratar das Regras de Bangkok, regras essas discutidas pela
ONU (Organização das Nações Unidas) a respeito do tratamento de mulheres presas e de
medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. Entre os seus princípios,
utilizado no voto do Ministro Ricardo Lewandowski, está a priorização de solução judicial
que vise facilitar a utilização de medidas alternativas ao encarceramento, principalmente se
tratando de prisão preventiva.
Além disso, várias de suas regras dizem respeito ao tratamento apropriado de
grávidas, puérperas e mães com crianças dentro do cárcere, como instalações especiais,
trabalho de parto em hospital civil, berçário e creche com pessoas qualificadas, atendimento
médico eficiente, entre outras, regras as quais não são cumpridas de maneira eficiente no
Brasil.
Outro exemplo de internacionalização é quando os advogados se utilizaram do artigo
25, inciso I, da Convenção Americana dos Direitos Humanos, que garante o direito a um
processo simples, rápido e efetivo, apto a tutelar direitos fundamentais lesionados ou
ameaçados, direito esse não cumprido no Brasil, pois, como mostrou a emenda, há 100
milhões de casos para 16 mil juízes, o que atrasa anos a realização dos processos.
Quando é mencionado a cultura do encarceramento nessa jurisprudência, em especial
com um grupo marginalizado, neste caso das mulheres, fica evidente o princípio da
historicidade. O caráter histórico levado em conta nessa decisão se dá em virtude ao repúdio à
fundamentação absoluta de um direito, isto é, ignora-se um direito fundamental em virtude do
reconhecimento deste com base nos valores abarcados pela sociedade da época. Esta foi
desde sempre irrazoável com as mulheres, principalmente com as mais pobres, o que
demonstra a imposição de um problema estrutural que permeia a sociedade até hoje.
No entanto, o que se percebe é uma alteração dos valores sociais antes retrógrados e
sexistas, que, por meio dessa decisão favorável ao habeas corpus coletivo do órgão máximo
do Poder Judiciário brasileiro, garante uma teoria evolucionista do direito. Este está em
constante melhora em virtude das novas necessidades dos homens e, aos poucos, vão se
firmando como um patrimônio comum da humanidade.
Outrossim, a característica de maximização, ou efetividade, significa que deve-se
sempre retirar dos direitos fundamentais o máximo de conteúdo e de realização possível,
tendo uma maximização em termos teóricos e em repercussão prática, obtendo uma real
implementação desses direitos. Logo, quando o STF votou a favor do habeas corpus, foi
efetuado um prazo de 60 dias para sua implementação e, para conferir mais agilidade e
maximizar as pessoas atingidas pela medida, foi oficiado ao DEPEN, para que esse
comunique a decisão aos estabelecimentos prisionais.
Outro exemplo de efetividade foi a manifestação da Defensoria Pública do Estado do
Ceará, que juntou documentos que permitem identificar as presas que são mães de crianças e
estão em unidade superlotada, com o objetivo de ajudar na aplicação da medida. Junto com
essas medidas, é possível identificar também o princípio da aplicabilidade imediata, pois, a
fim de se dar um cumprimento imediato, deu-se um prazo de 60 dias para que a medida seja
implementada, trabalhando junto com a maximização, sendo então também uma relação de
mútua-dependência, visto que seus conteúdos se vinculam.
Tendo em mente que o habeas corpus tinha a intenção de prever o mesmo direito às
mulheres já encarceradas, percebe-se a presença de outra característica essencial do direito
fundamental, a inalienabilidade. Isso quer dizer que, de acordo com o relatório, o direito de
recorrer ao fim de uma prisão preventiva por mulheres presas na condição de gestantes, de
puérperas ou de crianças sob sua responsabilidade não acaba ou mesmo não se extingue,
demonstrando o seu caráter imprescritível.
Ademais, a característica da indivisibilidade também é presente nesse caso, dado que
essa característica prevê uma unidade incindível dos direitos fundamentais em seu conteúdo,
isto é, não se pode optar por adotar somente alguns direitos. O que se observa, na verdade, é a
interdependência e a inter-relação dos direitos fundamentais, o que implica no respeito total
da unidade, não parcial. Um exemplo dessa complementação e integralidade, são os artigos
5º, inciso III, ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante,
e 6º da Constituição Federal, são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o
trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Estes, em conjunto, garantem reforçadamente o contrário do que está acontecendo nas
precárias e cruéis penitenciárias brasileiras.
A restringibilidade excepcional ressalta que os direitos fundamentais não podem ser
diminuídos pela interpretação ou pela atividade infraconstitucional, salvo em casos que essas
exceções estejam previstas na Constituição ou decorra de outras disposições constitucionais.
Quando por exemplo, o Ministro Edson Fachin, em seu voto contrário ao habeas corpus
coletivo, cita que no julgamento da ADPF 347 (Arguição de descumprimento de preceito
fundamental) de 2015, considerou que a situação prisional no Brasil um “estado de coisas
inconstitucional”, uma vez que violava massivamente os direitos fundamentais da população
prisional, por omissão do poder público. No entanto, sua interpretação limitada e vencida pela
maioria, colocava que o estado de coisas inconstitucional não implica automaticamente o
encarceramento domiciliar, ignorando totalmente o estado de vulnerabilidade da mulher em
razões de maternidade. Isso, de certa forma, fere alguns princípios fundamentais já citados da
Constituição, uma vez que não há proteção da maternidade e da infância, por exemplo,
prevista no art. 6º.
Além disso, aplica-se a característica da universalidade nesse caso, posto que os
direitos fundamentais são inerentes à pessoa humana, isto é, singularidades locais ou
ocasionais não podem afastar o dever de respeito e a promoção dos direitos fundamentais.
Essa característica é aplicada ao caso, dado que independente da mulher estar encarcerada
esta ainda possui seus direitos fundamentais. Um exemplo disso é o artigo 5° inciso L o qual
prescreve que às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer
com seus filhos durante o período de amamentação.
Por fim, a característica da projeção positiva é relacionada ao caso, já que o pedido de
habeas corpus é uma forma de proporcionar condições e estímulos para o gozo de direitos
fundamentais. Isso é exemplificado na Lei de Execução Penal (LEP), a qual determina como
obrigatória, nos estabelecimentos penais, a presença de instalações para atendimento a
gestantes e crianças. Entretanto, na prática essas disposições legais são desrespeitadas,
provocando uma lesão nos direitos fundamentais das mulheres gestantes e crianças. Deste
modo, a substituição da prisão preventiva pela domiciliar seria benéfica, visto que a mãe e a
gestante possuem outros direitos que estão sendo desrespeitados, não se podendo penalizá-las
pela estrutura ineficiente do Estado para fazê-los valer, como é o caso da LEP.
Isto posto, nós do grupo concordamos com a decisão favorável do STF em relação ao
habeas corpus coletivo às mulheres gestantes, puérperas ou mães de crianças sob sua
responsabilidade são submetidas no sistema carcerário. Tendo como alicerce o fato de que o
Estado negligencia tais mulheres, sendo que são em sua maioria negras e pobres, é
imprescindível que a luta para a preservação da vida e dos direitos de mulheres em estado de
maternidade, ocorra em sinergia com a luta contra o racismo estrutural e sistêmico, que pode
trazer consequências graves como o caso de Alyne da Silva Pimentel Teixeira, mulher negra
e marginalizada, que morreu ao ser deixada sem atendimento médico por 21 horas no
corredor do hospital após dar à luz a um bebê morto.
Além do racismo evidente, é também preciso levar em consideração a saúde e
desenvolvimento das crianças. De acordo com o artigo 227 da CF, é dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão, ou seja, nas pentenciárias, como já analisado
anteriormente na jurisprudência, não garantem os princípios fundamentais da dignidade do
ser humano, não sendo um ambiente adequado para as crianças.
Ademais, é essencial analisar o impacto das violações aos direitos da mulher em
estado de maternidade violam também os direitos de crianças, posto que o período
gestacional reflete no desenvolvimento infantil, ou seja, o feto reage aos estímulos do
ambiente externo que afetam a mãe. Dessa forma, uma mãe encarcerada sem os devidos
cuidados necessários para uma gravidez segura ou o desenvolvimento infanto juvenil
saudável, devido a situação precária dos presídios representam uma infração à Declaração
Universal dos Direitos Humanos, que prescreve em seu artigo 25 que a maternidade e a
infância têm direito a cuidados e assistência especiais e que todas as crianças, nascidas
dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social
Por fim, é essencial citar o artigo 5º, inciso XLV, de que nenhuma pena passará da
pessoa do condenado, pois, ao deixar a criança no cárcere junto de sua mãe, isso limitará suas
experiências de vida, além de prejudicar o seu desenvolvimento. No entanto, a simples
remoção da criança para um abrigo não é eficiente, uma vez que lá não serão atendidas suas
necessidades de acolhimento e quanto à entrega do bebê à sua família em seus primeiros
meses de vida seria também algo traumático, além de privá-las do leite materno, essencial
para seu crescimento. Assim, a única medida realmente efetiva seria a prisão domiciliar, já
que a criança estaria em contato direto com a mãe e em um ambiente propício para o seu
desenvolvimento.

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