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INSPER

Instituto de Ensino e Pesquisa

Letícia Martins Delfino


Luiza Brugger Pires do Carmo
Pietra Rosa de Jesus Araujo
Rhamyle Fabres de Oliveira
Rafaella de La Torre Giaffone
Sophia Burmaian Vasconcellos de Oliveira

Clínica I, 2º Semestre:
Relatório Parcial

Professora Tutora: Mariana Chies Santiago Santos

São Paulo
2023
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 3
2. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS 5
3. CONCEITUAÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO 6
3.1. Doutrina de Proteção Integral e Prioridade Absoluta 7
3.2. Melhor Interesse da Criança 8
3.3. Destituição do Poder Familiar 10
4. RESULTADOS 13
4.1. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça 13
4.2. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 13
5. CONCLUSÃO 14
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 15

2
1. INTRODUÇÃO

A partir do tema Análise sobre o tratamento jurídico do conceito de “melhor interesse


da criança, junto ao cliente – Instituto Alana –, definiu-se, inicialmente, o recorte temático
“melhor interesse da criança no que tange à convivência familiar e possibilidades de
destituição do vínculo da família”, com o objetivo de desenvolver um trabalho focalizado nos
grupos vulnerabilizados e, por conseguinte, a interpretação dada pelos tribunais
(jurisprudência estadual e federal) ao que seria a melhor forma de amparo às crianças e
adolescentes no Brasil.
Não obstante, consoante ao artigo 189 do Código de Processo Civil, os “atos
processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos: II - que
versem sobre casamento, separação de corpos, divórcio, separação, união estável, filiação,
alimentos e guarda de crianças e adolescentes”1. Assim, a realização de mera análise
jurisprudencial, sobretudo concernente aos Tribunais de Justiça estaduais, pouco diria sobre
os perfis desses núcleos marginalizados dado que todos os processos que envolvem crianças e
adolescentes estão protegidos por sigilo. Em razão disso, optou-se, a fim de contemplar o
critério de amplitude nacional, a análise da jurisprudência dos tribunais superiores, isto é,
Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF), os quais atendem à
regra de publicidade dos atos processuais.
Ainda, sendo o Instituto uma organização da sociedade civil que busca garantir à
população infantojuvenil prioridade absoluta em todas as esferas sociais, isto é,
salvaguardando seus direitos, desejos e protagonismo, a presente pesquisa objetiva explorar
as múltiplas infâncias por meio de fatores sociais de renda, raça e/ou etnia e contexto social,
de modo a dar preferência às deliberações judiciais recentes sobre a temática, em suma, sob
um intervalo de dez anos. Ademais, em apoio ao exame jurisprudencial, serão verificados os
pressupostos do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal n. 8.069/90) e da
Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (ONU, 1989), a doutrina da proteção
integral e o surgimento do conceito “melhor interesse da criança” como pontos de partida.
Dessa forma, planeja-se comparar as diferentes formas de tratamentos às famílias
marginalizadas e as hipóteses em que a destituição familiar é praticada pelo órgão público,
em especial, como primeira e única alternativa. Por fim, pretende-se compreender e constatar
se a doutrina de proteção integral positivada pelo ECA condiz com as decisões judiciais

1
BRASIL. Código de Processo Civil. Brasília, DF, Presidência da República, 16 mar. 2015. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 28 nov. 2023.

3
contemporâneas. Em outras palavras, se a perspectiva do(a) Ministro(a) para definição do
maior interesse da criança ao caso concreto está amparada pelos fundamentos da legislação e,
em certa medida, se a margem para tal discricionariedade, oriunda da carência de
especificação do conceito, poderiam corroborar para sua desvirtuação.

4
2. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS

O exame de jurisprudência, por discorrer sobre a infância e a adolescência, tornou-se


um desafio à feitura da pesquisa, em princípio, pela indisponibilidade do inteiro teor dos
processos – em virtude do segredo de justiça –, exigindo, consequentemente, predileção às
decisões das cortes superiores que, por sua vez, dificultam uma análise dos grupos em
vulnerabilidade social. Isto é, em razão de despender recursos financeiros e outros
instrumentos que tais indivíduos poderiam não possuir, tem-se uma inibição da presença
desses perfis ao acesso às últimas instâncias do Judiciário brasileiro.
Nesse ínterim, deliberou-se a favor de uma ponderação das diferentes manifestações
de insegurança social expostas em 168 acórdãos (153 do STJ e 15 do STF), os quais foram
submetidos a uma seleção que os filtrava com base em quatro critérios – (i) pertinência
temática; (ii) pertinência ao intervalo de análise, isto é, entre 01 de novembro de 2013 a 01 de
novembro de 2023; (iii) contexto de vulnerabilidade social; e (iv) hipótese de destituição do
núcleo familiar. Dessarte, obteve-se 45 decisões (39 do STJ e 6 do STF) que contemplam,
simultaneamente, tais preceitos, o que, por consequência, colabora para a inspeção dos
distintos cenários de marginalização e as pessoas a eles inerentes.
Subsequentemente, os atos processuais serão divididos, de modo uniforme, para que
se possa verificar o inteiro teor e, tão logo, as informações relevantes que podem ser
apreendidas dele. Desse modo, tais pareceres serão sintetizados levando em consideração a
fundamentação dos(as) Ministros(as), naquela ocasião, para a defesa de sua interpretação ao
“melhor interesse da criança”, bem como, as circunstâncias em que o afastamento do vínculo
familiar foi exercitado. Em seguida, será elencando os dados fundamentais à leitura desse
cenário, de maneira a possibilitar comparações entre as decisões, sendo elas responsáveis
pelo agrupamento de linhas interpretativas [ao conceito de maior interesse infantojuvenil]
similares ou pela divisão de perspectivas conflitantes.
Por fim, será determinado se a maioria, ou minoria, das decisões na última década
estão adequadas à doutrina de proteção integral efetivado pelo ECA, ou seja, à prioridade
absoluta concedida às crianças e aos adolescentes, enquanto sujeitos de direito. Portanto,
torna-se factível argumentar se os pressupostos materializados em 1989 (Convenção
Internacional sobre os Direitos da Criança ) e em 1990 (Lei Federal n. 8.069/90) se mantêm
assegurados, hodiernamente, pelos operadores do direito. Ainda, como forma de nutrir tal
discussão, paralelamente, recorrer-se-ão às doutrinas correspondentes a fim de conceituar,
contextualizar e explicar as ideias relativas ao amparo integral do público infantojuvenil.

5
3. CONCEITUAÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO

O tratamento dado à criança e ao adolescente pela legislação brasileira pode ser


sistematizado em quatro fases – da (i) absoluta indiferença, em que não haviam diplomas
legislativos que lhes diziam respeito; da (ii) mera imputação criminal, em que as Ordenações
Afonsinas e Filipinas, o Código Criminal do Império de 1830 e o Código Penal de 1890
atuavam como mecanismos de controle às práticas ilícitas desses indivíduos; da (iii) tutela,
sob a qual o Código Mello Mattos de 1927 e o Código de Menores de 1979 promoviam,
conjuntamente, a tutela dos interesses pessoais dos adultos por meio da integração
sociofamiliar da criança; e da (iv) proteção integral, positivada pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente de 1990 que, por sua vez, reconhecia os direitos e garantias das crianças e
adolescentes2, considerando-os não apenas objeto de direito, mas sujeito dele. Isto é, ainda
que sejam pessoas em desenvolvimento, são também sujeitos de direito.
Por esse viés, a proteção a ser dada a tais indivíduos visa a passagem adequada de sua
condição de incapazes a adultos capazes de exercer plena e pessoalmente os atos de sua vida
civil3. Daí advém a noção de melhor interesse, ou seja, a implementação de políticas, atos e
decisões, sejam eles públicos ou privados, devem priorizar o interesse da infância e da
adolescência para sua execução, mesmo que esse interesse maior ultrapasse o de adultos. Tão
logo, tal precedência exemplifica a denominada doutrina de proteção integral, originária não
somente de uma interpretação dos dispositivos da Constituição Federal de 1988,
especialmente o artigo 227, mas também das normas internacionais de direitos humanos,
como a Declaração Universal de Direitos Humanos e a Convenção sobre os Direitos da
Criança4, as quais estabeleciam uma concepção de positivação dos direitos humanos,
entendidos como fundamentais, inclusive aqueles inerentes às crianças.

2
ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto da Criança e do
Adolescente: Lei n. 8.069/90 - Comentado artigo por artigo. Publicação de: Saraivajur. Brasil, 2018. 10ª edição,
cap. 1, p. 60-61.
3
COLUCCI, Camila Fernanda Pinsinato. Princípio do melhor interesse da criança: construção teórica e
aplicação prática no direito brasileiro. Dissertação (Mestrado em Direito Civil) - Faculdade de Direito,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014. Publicação de: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP.
cap. 2, p. 29. doi: 10.11606/D.2.2014.tde-25022015-083746. Disponível em:
https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2131/tde-25022015-083746/publico/Camila_Fernanda_Pinsinato_C
olucci_completa.pdf. Acesso em: 28 nov. 2023.
4
ROSSATO, op. cit., cap. 1, p. 60-61.

6
Ainda, tem-se que o ECA foi redigido em prol da assistência integral da “pessoa até
doze anos de idade incompletos”5 e “aquela entre doze e dezoito anos de idade”6, instituindo,
para isso, direitos e deveres a eles relativos com foco em seu desenvolvimento seguro e
saudável. Sendo assim, a família, a sociedade e o Estado, sendo solidariamente responsáveis,
devem proporcionar-lhes respeito aos seus direitos fundamentais de cidadãos e de pessoas em
desenvolvimento, tais quais direito à vida e à saúde, direito à liberdade, ao respeito e à
dignidade, direito à convivência familiar e comunitária, direito à educação, à cultura, ao
esporte e ao lazer e direito à profissionalização e à proteção no trabalho.7

3.1. Doutrina de Proteção Integral e Prioridade Absoluta

A partir da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada pela


Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 20 de novembro de 1989,
reconheceu-se a doutrina de proteção integral, ambas ratificadas no Brasil pelo Decreto n.
99.710 de 21 de novembro de 1990 com o objetivo de efetivar a salvaguarda especial ao
grupo infantojuvenil. Assim sendo, foram reconhecidos internacionalmente os direitos
próprios da criança que, por sua vez, deixou de ser parte integrante do complexo familiar para
se tornar seu mais novo membro individualizado, que em razão de sua falta de maturidade
física e mental exige anteparos especiais, incluindo a devida proteção legal desde o
nascimento.

“[...] passa a criança a ter direito à vida, a um nome, à nacionalidade,


a preservar sua identidade, à liberdade de expressão e opinião –
devendo ser ouvida em todo processo judicial que lhe diga respeito –,
à liberdade de pensamento, consciência, de crença, de associação;

5
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.
6
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.
7
GUEDES, Silmara Regina; ACOSTA, Matheus Vinicios; COSTA, Luciano Lima. Cartilha Direitos & Deveres.
Publicação de: Secretaria de Estado de Justiça, Família e Trabalho. Cense Santo Antônio da Platina. Paraná,
ago. 2020. Disponível em:
https://coronavirus.tjpr.jus.br/documents/116858/36369873/Cartilha+Direitos+e+Deveres.pdf/ad8dc559-eef2-80
52-5bb3-4795c84069f3. Acesso em: 28 nov. 2023.

7
enfim, tem reconhecida a dignidade inerente e os direitos iguais e
inalienáveis de todos os membros da família humana”8

Sob perspectiva análoga, o princípio da prioridade absoluta daí decorrente é


assegurado, simultaneamente, pelo artigos 227 da Constituição Federal e 4º do ECA, este
último determinando que é “dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida,
à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”9, sendo que a
preservação dessa preferência integral é sintetizada por:

“[...] a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer


circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos
de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das
políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos
públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à
juventude”10

3.2. Melhor Interesse da Criança

O conceito de melhor interesse da criança é proveniente da evolução da percepção


que se tem sobre as crianças internacionalmente, sobretudo a respeito da imprescindibilidade
de reforçar amplamente a tutela da infância e da juventude. Não obstante, a Convenção sobre
os Direitos da Criança de 1989, ao não definir estritamente tal ideia, somente enfatiza que
essas pessoas, enquanto sujeitos de direito em formação, devem ser protegidas integralmente.
Por conseguinte, em virtude da ausência de critérios claros para determiná-lo, as decisões que
lhe utilizam como base dependerão, exclusivamente, de uma avaliação do caso concreto, em

8
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A Família na Travessia do Milênio: Anais do II Congresso Brasileiro de Direito
de Família. Publicação de: Livraria Del Rey. Belo Horizonte, 2000. cap. 4, p. 203. Disponível em:
https://ibdfam.org.br/_img/congressos/anais/69.pdf. Acesso em: 28 nov. 2023.
9
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.
10
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.

8
que o operador do direito, por meio de sua discricionariedade, interpreta esse ideal da forma
que lhe for pertinente.
Sendo assim, essa carência de especificidade permite sua aplicação a diferentes
contextos, o que, consequentemente, torna-o adaptável aos diferentes perfis, intervalos de
tempo e espaços. Por outro ângulo, tal característica, no que tange à discricionariedade de
decisores, pode propiciar que eles, valendo-se dessa ampla margem interpretativa, imponham
suas próprias convicções, inclusive sobre o interesse superior da criança. Todavia, apesar de
sua elasticidade e conteúdo indeterminado, tem-se que esse conceito não pode ser colocado
aleatoriamente, incumbindo-lhe a obediência aos princípios constitucionais e as garantias por
eles previstos, dado que, se assim não o for, oportuniza-se a distorção de seu objetivo
superior, que é a proteção da criança e do adolescente. Ou seja, seu núcleo conceitual deve,
invariavelmente, ser fundamentado por valores atrelados “à estabilidade de condições de
vida, às relações afetivas e o ambiente físico e social da criança e do adolescente”11.
Além disso, como uma representação do avanço relativo ao direito da criança e do
adolescente no Brasil, o princípio do melhor interesse atuou para a substituição do Código de
Menores (Lei n. 6.697/79), “aplicado apenas aos menores que se encontrassem em ‘situação
irregular’”12, pelo ECA que, por sua vez, defendia a salvaguarda integral do grupo
infantojuvenil, isto é, sua primazia quando da existência de interesses antagônicos.

“O melhor interesse deve ser o princípio norteador de toda política


voltada para a infância e adolescência. Deve ele ser considerado
quando da feitura de leis, quando de sua execução, quando da
formulação de políticas públicas. Tal princípio vai mais além,
devendo ser utilizado também em casos de conflitos entre interesses
de crianças e de terceiras pessoas”13

Destarte, Colucci, em Princípio do melhor interesse da criança: Construção teórica e


aplicação prática no direito brasileiro14, sintetiza que esse princípio deve ser sempre a
fundação para qualquer decisão relativa à infância e à juventude, em outras palavras, torna-se
ferramenta de auxílio decisório, cabendo aos pais e ao Poder Judiciário sua garantia. Portanto,
11
COLUCCI, op. cit., cap. 2, p. 34.
12
COLUCCI, op. cit., cap. 1, p. 28.
13
COLUCCI, op. cit., cap. 1, p. 28-29.
14
COLUCCI, op. cit., cap. 1, p. 31.

9
quando de sua aplicação, são hipóteses viáveis o conflito entre interesses de crianças e de
terceiros; o conflito entre dois interesses fundamentais da criança; e, ainda, quando se deve
deliberar sobre os interesses individuais de uma criança específica. Em suma, tal conceito se
torna imperativo não somente para a solução de divergências, mas também para promover
que os juízos que o tenham como suporte se façam valer.

3.3. Destituição do Poder Familiar

Por mérito da aplicação do princípio do melhor interesse da criança aos casos


concretos que lhe dizem respeito, especialmente aqueles “relativos a conflitos no âmbito
familiar, como disputa de guarda, suspensão ou destituição do poder familiar”15, origina-se
uma incerteza quanto à melhor maneira de resolução, sobretudo pelo grau de indeterminação
do que seria o interesse superior daquela criança. Tão logo, os agentes de direito, premidos
pela “necessidade de cumprir o dever constitucional de assegurar com a absoluta prioridade
os direitos fundamentais e melhor interesse das crianças”16, resguardando-lhes de quaisquer
formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, estão
submetidos à uma responsabilidade de determinar, na ocasião, por meio de inferências
ideológicas incertas e menos por dispositivos legais, a decisão que melhor atende a criança,
no tocante à sua proteção, à sua defesa, enquanto indivíduo em formação, e ao amparo aos
seus direitos fundamentais.
Em referência, notadamente nos casos de suspensão ou destituição do poder familiar,
tal incerteza lhe é intrínseca, isto é, pondera-se se naquele caso em concreto, o melhor
interesse da criança é sua permanência na família, uma família acolhedora que fique
incumbida de sua guarda, seu acolhimento via instituição ou sua adoção. Por razões óbvias,
são eles as hipóteses de relevante interferência do Estado nas relações familiares, uma vez
que o instrumento público pode, temporária ou definitivamente, retirar a criança de seu

15
HARTUNG, Pedro Affonso Duarte. Levando os Direitos das Crianças a Sério: a absoluta prioridade dos
direitos fundamentais e melhor interesse da criança. Tese (Doutorado em Direito do Estado) - Faculdade de
Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Publicação de: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações
da USP. cap. 5, p. 413. doi:10.11606/T.2.2019.tde-04092020-174138. Disponível em:
https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2134/tde-04092020-174138/publico/5953955_Tese_Original.pdf.
Acesso em: 30 de nov. 2023.
16
HARTUNG, op. cit., cap. 5, p. 413.

10
convívio familiar. Assim, consoante a Hartung17, as principais razões para a extinção do
núcleo familiar dizem respeito, nesta ordem, à negligência dos pais e/ou responsáveis, à
dependência química/alcoolismo dos pais e/ou responsáveis, ao abandono dos pais e/ou
responsáveis, à violência doméstica e ao abuso sexual praticado pelos pais e/ou responsáveis.

“Todos os fundamentos utilizados para a decretação da suspensão ou


destituição do poder familiar e, assim, o acolhimento institucional são
relacionados, em menor ou maior grau, ao conceito de maus-tratos,
que, apesar da falta de definição legal ou doutrinária, pode ser
caracterizado por duas práticas: o abuso, uma ação que resulta em
dano ou viola intencionalmente direitos de crianças, como sua
integridade física, psíquica, sexual ou moral; ou a negligência, uma
omissão que igualmente resulta em dano ou violação de direitos de
crianças”18

Assim sendo, haja vista que o ECA foi o responsável por positivar
infraconstitucionalmente o princípio do melhor interesse, tem-se, em seus artigos 98 e 100, as
medidas de proteção à criança e ao adolescente que se baseiam em “I - condição da criança e
do adolescente como sujeitos de direito; II - proteção integral e prioritária; III -
responsabilidade primária e solidária do poder público; IV - interesse superior da criança e do
adolescente; [...] VII - intervenção mínima; [...] IX responsabilidade parental; X -
prevalência na família [...]”19, sendo elas “aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos
nesta Lei forem ameaçados ou violados: I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta”20.
Portanto, a suspensão do vínculo familiar pela autoridade competente para proteção
da criança inclui medidas de prestação de serviços de assistência social, de saúde, e de
educação que, por sua vez, preveem o acolhimento institucional e a inclusão em programas

17
HARTUNG, op. cit., cap. 5, p. 417.
18
HARTUNG, op. cit., cap. 5, p. 417.
19
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.
20
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.

11
de acolhimento familiar. Não obstante, trata-se de “medidas provisórias e excepcionais”21, já
que a prevalência na família (prevalência às medidas que mantenham ou reitegrem a criança
na sua família natural); a intervenção mínima (autoridades e instituições devem intervir
somente quando sua ação for indispensável à efetiva promoção dos direitos e proteção da
infância e da adolescência); e o interesse superior (intervenção deve atender prioritariamente
aos interesses da criança e do adolescente) não apenas são critérios definidos por lei, mas
também atuam como princípios que devem orientar quaisquer decisões relativas à criança e
ao adolescente, sobretudo aquelas que discorrem sobre uma interferência tão expressiva como
é a destituição do vínculo da família. Daí se infere que tal hipótese, por sua gravidade, deve
ser cogitada como última possibilidade de garantia ao melhor interesse infantojuvenil.

21
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13 jul. 1990.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 28 de nov. 2023.

12
4. RESULTADOS

4.1. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça


4.2. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

13
5. CONCLUSÃO

14
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Código de Processo Civil. Brasília, DF, Presidência da República, 16 mar. 2015.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm.
Acesso em: 28 nov. 2023.

ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto
da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069/90 - Comentado artigo por artigo. Publicação de:
Saraivajur. Brasil, 2018. 10ª edição, cap. 1, p. 60-61.

COLUCCI, Camila Fernanda Pinsinato. Princípio do melhor interesse da criança:


construção teórica e aplicação prática no direito brasileiro. Dissertação (Mestrado em
Direito Civil) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.
Publicação de: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP. cap. 2, p. 28-29, 31 e 34.
doi: 10.11606/D.2.2014.tde-25022015-083746. Disponível em:
https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2131/tde-25022015-083746/publico/Camila_Fer
nanda_Pinsinato_Colucci_completa.pdf. Acesso em: 28 nov. 2023.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF. Presidência da República, 13


jul. 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em:
28 de nov. 2023.

GUEDES, Silmara Regina; ACOSTA, Matheus Vinicios; COSTA, Luciano Lima. Cartilha
Direitos & Deveres. Publicação de: Secretaria de Estado de Justiça, Família e Trabalho.
Cense Santo Antônio da Platina. Paraná, ago. 2020. Disponível em:
https://coronavirus.tjpr.jus.br/documents/116858/36369873/Cartilha+Direitos+e+Deveres.pdf
/ad8dc559-eef2-8052-5bb3-4795c84069f3. Acesso em: 28 nov. 2023.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A Família na Travessia do Milênio: Anais do II Congresso


Brasileiro de Direito de Família. Publicação de: Livraria Del Rey. Belo Horizonte, 2000. cap.
4, p. 203. Disponível em: https://ibdfam.org.br/_img/congressos/anais/69.pdf. Acesso em: 28
nov. 2023.

15
HARTUNG, Pedro Affonso Duarte. Levando os Direitos das Crianças a Sério: a absoluta
prioridade dos direitos fundamentais e melhor interesse da criança. Tese (Doutorado em
Direito do Estado) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.
Publicação de: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP. cap. 5, p. 413 e 417.
doi:10.11606/T.2.2019.tde-04092020-174138. Disponível em:
https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2134/tde-04092020-174138/publico/5953955_T
ese_Original.pdf. Acesso em: 30 de nov. 2023.

16

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