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Como Contabilizar Duplicatas Descontadas – Contabilização Em Conta Do Passivo

Neste artigo, vou mostrar como contabilizar duplicatas descontadas segundo as novas regras contábeis, ou seja, com sua
contabilização em conta do passivo.

Como visto em um artigo anterior, o desconto de duplicatas é uma operação financeira em que a empresa “vende”
determinadas duplicatas para o banco em troca de uma antecipação do valor em conta corrente, sendo cobrado juros nessa
operação. Como essa operação consiste no fato de que a empresa, normalmente, não perde a titularidade da duplicata, os
contadores registravam essa operação como uma conta redutora de Clientes. Dessa forma, enquanto a duplicata não fosse
quitada, a empresa teria uma obrigação com o banco.

Porém, essa forma de contabilização vinha sendo questionada há muito tempo, e o Pronunciamento Técnico CPC 38 –
Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração, deu uma posição definitiva sobre assunto, validada pela
Comissão de Valores Mobiliários (CVM), por meio da Deliberação CVM nº 604/2009 e pelo Conselho Federal de
Contabilidade (CFC), por meio da Resolução CFC nº 1.197/2009 (NBC TG 37).

O que diz o CPC 38?

O item 20 do Pronunciamento Técnico CPC 38 estabelece o seguinte:

Quando a entidade transfere um ativo financeiro, deve avaliar até que ponto ela retém os riscos e benefícios da propriedade do
ativo financeiro. Nesse caso:

a) se a entidade transferir todos os riscos e benefícios da propriedade do ativo financeiro, a entidade deve “desreconhecer” o
ativo financeiro e reconhecer separadamente como ativos ou passivos quaisquer direitos e obrigações criados ou retidos com a
transferência;

b) se a entidade retiver todos os riscos e benefícios da propriedade do ativo financeiro, a entidade deve continuar a reconhecer o
ativo financeiro;

Assim, de acordo com o Pronunciamento Técnico CPC 38, quando a entidade vende, desconta ou transfere um ativo
financeiro (venda ou desconto de carteira de recebíveis, por exemplo), ela somente poderá baixá-lo se transferir todos os riscos
e benefícios da propriedade desse ativo e se não mantiver envolvimento continuado com ele. Caso contrário, a entidade deve
manter os instrumentos financeiros no ativo e tratar o valor recebido como empréstimo.

Dessa forma, reconhecemos que a essência da transação é que deve ser retratada contabilmente. Assim, as duplicatas
descontadas (parcela recebida do desconto), quando não há transferência dos riscos e benefícios da propriedade, devem ser
classificadas como passivo, sendo que a duplicata a receber continua a ser mantida no ativo até o seu efetivo recebimento.

QUANDO A EMPRESA NÃO TRANSFERE OS RISCOS E BENEFÍCIOS DO ATIVO AO

BANCO

Para exemplificar essa condição, vamos considerar uma operação de desconto de duplicata, onde a empresa oferece seus
recebíveis vencíveis em 30, 60, 90 dias ao banco no valor total de R$ 90.000,00, com juros bancários de R$ 15.000,00.
Com base nos dados acima, temos o seguinte lançamento contábil:

Registro do “desconto” (agora, “empréstimo”, segundo o Pronunciamento Técnico CPC 38):

D – Bancos (Ativo Circulante – Disponibilidades) R$ 90.000,00


C – Empréstimos a Pagar – Duplicatas Descontadas (Passivo Circulante) R$ 90.000,00

Observe que a empresa não transferiu os riscos e benefícios do ativo. Portanto, ao mantê-los, a empresa conservou o ativo e
reconheceu um passivo, que é o empréstimo a pagar.

Os encargos financeiros incidentes

A operação de desconto veio acompanhada de cobrança de juros pelo banco. A boa prática contábil requer que a apropriação
dos encargos financeiros seja feita de acordo com o princípio da competência. Portanto, recomendo que a apropriação dos juros
seja mensal, tendo em vista que muitas empresas geram balanços e balancetes, para fins gerenciais, todos os meses.

Este, porém, não é único motivo para se reconhecer as despesas mensalmente. Não devemos esquecer que esse procedimento é
muito importante para as empresas tributadas com base no lucro real anual, que levantam balanços de suspensão ou redução do
Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro (CSL).

Dessa forma, teremos os seguintes lançamentos:

Registro dos juros a apropriar:

D – Juros a apropriar (Conta Redutora do Passivo Circulante) R$ 15.000,00


C – Bancos (Ativo Circulante – Disponibilidades) R$ 15.000,00

Apropriação mensal dos encargos financeiros:

D – Despesas financeiras (Conta de Resultado) R$ 5.000,00


C – Juros a apropriar (Conta Redutora do Passivo Circulante) R$ 5.000,00

Obs: Prazo de recebimento das duplicatas é de três meses (dados do exemplo), por isso o valor mensal da apropriação é R$
5.000,00.

Liquidação das duplicatas “descontadas”

A empresa deve contabilizar a baixa das duplicatas na data da liquidação. A empresa consegue essa informação através dos
“avisos bancários” (borderôs, francesinhas, etc) da instituição financeira, já que é ela que recebe o valor do cliente. Dessa
forma, teremos o seguinte lançamento:

Baixa das duplicatas pelo recebimento/quitação do empréstimo por conta dos avisos bancários:

D – Empréstimos a Pagar – Desconto de Duplicatas (Passivo Circulante) R$ 30.000,00


C – Clientes (Ativo Circulante – Contas a receber) R$ 30.000,00
Quando a duplicata não é liquidada

Caso a duplicata não seja paga pelo cliente, o banco devolverá o título à empresa. Em geral, o contrato de desconto/empréstimo
prevê que o valor não recebido seja debitado da conta-corrente da empresa.

Assim, caso alguma duplicata não seja paga no vencimento, o Banco devolverá o título à empresa, procedendo o débito em sua
conta-corrente do valor correspondente ao título não pago.

Débito na conta-corrente da duplicata não paga:

D – Empréstimos a Pagar – Desconto de Duplicatas (Passivo Circulante) R$ 30.000,00


C – Bancos Conta Movimento (Ativo Circulante) R$ 30.000,00

Obs: A parcela de juros descontadas na operação não é devolvida à empresa.

QUANDO A EMPRESA TRANSFERE OS RISCOS E BENEFÍCIOS DO ATIVO AO BANCO

Considerando o mesmo exemplo, vamos supor que a empresa transfira todos os riscos e benefícios do ativo à instituição
financeira.

Naturalmente, nesse tipo de operação, os juros cobrados são maiores, já que a responsabilidade é do banco. Vamos admitir que
os juros cobrados sejam de R$ 24.000,00.

Atente que, nesse caso, não existe a figura do empréstimo. A empresa entregou definitivamente o título ao banco.

Em atendimento ao Pronunciamento Técnico CPC 38 (letra “a” do item 20), a empresa deve “desreconhecer” o ativo
financeiro e reconhecer separadamente como passivo qualquer obrigação criada ou retida com a transferência.

Portanto, a empresa deve baixar imediatamente as duplicatas e, simultaneamente, reconhecer como despesa o valor dos juros
cobrados.

Desse modo, teremos os seguintes registros contábeis:

Reconhecimento da “venda” das duplicatas:

D – Bancos (Ativo Circulante – Disponibilidades) R$ 90.000,00


C – Clientes (Ativo Circulante – Contas a receber) R$ 90.000,00

Reconhecimento dos encargos financeiros:

D – Despesas Financeiras (Conta de Resultado) R$ 24.000,00


C – Bancos (Ativo Circulante) ou Juros a Pagar (Passivo Circulante) R$ 24.000,00

Base Legal

 Deliberação CVM nº 604/2009


 Resolução CFC nº 1.197/2009
 Pronunciamento Técnico CPC 38 – Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração

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