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RESUMO
O presente artigo tem como objetivo analisar como se dá a regulamentação do uso dos agrotóxicos, em
especial dos organoclorados e fosforados, bem como a aplicabilidade do princípio da precaução e as
consequências, nas três dimensões da Sustentabilidade, da utilização dessas substâncias. A partir de
pareceres de órgãos públicos acerca da toxidade dos agrotóxicos, doutrinas de Direito Ambiental e obras
de autores como Fritjof Capra e Rachel Carson, constatou-se indutivamente que apesar de o
ordenamento jurídico brasileiro prever o direito das presentes e futuras gerações a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida, os princípios e instrumentos normativos não
estão sendo aplicados de maneira a efetivar tal direito, causando impactos e danos para o meio
ambiente e toda a sociedade.
INTRODUÇÃO
Os agrotóxicos são agentes que se infiltram nos processos mais íntimos do
meio ambiente e dos organismos biológicos. A legislação brasileira se mostrou
consciente dos danos causados agrotóxicos organoclorados, como o DDT, e por isso
adotou a posição preventiva de banir sua utilização. No entanto, apesar de o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida também serem
1
Acadêmica do 5º período do curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí. Bolsista PIBIC e do
grupo de estudo “Observatório de Direito Ambiental e Sustentabilidade”. E-mail:
anaveigadias@gmail.com.
2
Doutora e Mestre em "Derecho Ambiental y de la Sostenibilidad" pela Universidade de Alicante -
Espanha. Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí - Brasil, Graduada em Direito
pela Universidade do Vale do Itajaí - Brasil. Professora no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em Ciência Jurídica, nos cursos de Doutorado e Mestrado em Direito e na Graduação no Curso de
Direito da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Coordenadora do Grupo de Pesquisa: “Estado,
Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade”, cadastrado no CNPq/EDATS/UNIVALI.
Coordenadora do Projeto de pesquisa aprovado no CNPQ intitulado: “Possibilidades e Limites da
Avaliação Ambiental Estratégica no Brasil e Impacto na Gestão Ambiental Portuária” (2013/2015).
Coordenadora do Projeto de pesquisa aprovado através do Edital MCTI/CNPQ/UNIVERSAL 14/2014,
intitulado "Análise comparada dos limites e das possibilidades da Avaliação Ambiental Estratégica e sua
efetivação com vistas a contribuir para uma melhor gestão ambiental da atividade portuária no Brasil e
na Espanha" (2015/2017). Coordenadora do Projeto de pesquisa aprovado através da FAPESC -
EDITAL 09/2015- intitulado "Limites e possibilidades da Avaliação Ambiental Estratégica e sua efetivação
com vistas a contribuir para uma melhor Gestão Ambiental da Atividade Portuária Catarinense".
(2016/2018). Membro vitalício à Cadeira n. 11 da Academia Catarinense de Letras Jurídicas (ACALEJ).
Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB). Membro da Comissão de Direito Ambiental
do IAB (2016/2018). Advogada e Consultora Jurídica. E-mail: mclaudia@univali.br.
ameaçados pelo uso dos organofosforados, a postura estatal foi divergente. Vê-se,
assim, que não obstante a mudança de paradigma, comprovações científicas do perigo
dos compostos de fósforo à saúde humana e ambiental e o princípio da precaução,
todas as três dimensões da Sustentabilidade são ameaçadas pelo uso destes
compostos.
Assim, com base nos estudos prévios, tem-se como base o problema de
pesquisa de que o uso indiscriminado dos agrotóxicos é responsável por uma série de
problemas ambientais, sociais e até mesmo econômicos. No ordenamento jurídico
brasileiro está previsto o direito das presentes e futuras gerações a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida. Entretanto, os princípios e
instrumentos normativos estão sendo aplicados a fim que tal direito possa ser
efetivado? Quais as consequências para o meio ambiente e toda a sociedade?
Além disso, o objetivo geral é estudar as leis, princípios e direitos relacionados a
utilização dos agrotóxicos e as consequências do seu uso nas três dimensões da
Sustentabilidade. Além de objetivos específicos como conhecer o histórico da
inserção dos agrotóxicos na agricultura brasileira e seu tratamento no ordenamento
jurídico; compreender o princípio da precaução e analisar sua aplicabilidade; identificar
os impactos e danos nas dimensões ambiental, social e econômica causados pela
utilização dos agrotóxicos, em especial os organofosforados.
O método a ser utilizado será o indutivo principalmente por meio da
pesquisa bibliográfica, documental e de pareceres de órgãos públicos acerca da
toxidade dos agrotóxicos. Sendo utilizadas técnicas do referente, da categoria,
fichamento e dos conceitos operacionais.
Dessa forma, visando ao seguimento lógico da apresentação da pesquisa, na
primeira parte, nomeada “de defensivos agrícolas a agrotóxicos”, o histórico e a
inserção destes produtos no Brasil são expostos, bem como as leis criadas para
disciplinar sua utilização. A segunda parte, “o princípio da precaução”, traz a
explanação deste princípio e o caso concreto de carência de sua aplicabilidade na
regulamentação do uso dos organofosforados. A terceira parte “os impactos na tríplice
estrutura da Sustentabilidade” apresenta inicialmente os conceitos de Desenvolvimento
Sustentável e a definição da Sustentabilidade como aquela fundamentada em três
pilares: ambiental, social e econômico. Assim, esta terceira parte subdivide-se nas
respectivas dimensões da Sustentabilidade para melhor e mais claramente abordar os
impactos e danos ocasionados pelo uso dos agrotóxicos, em especial dos compostos
orgânicos de fósforo.
3
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. São Paulo: Cultrix, 2012. p. 253.
4
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 253.
5
BRASIL. Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7802.htm>. Acesso em: 21 fev 2017.
6
TROIAN, Alessandra. et al. O uso de agrotóxicos na produção de fumo: algumas percepções de
agricultores da comunidade Cândido Brum, no município de Arvorezinha (RS). 43º Congresso da
Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Porto Alegre, 2009. Disponível em:
<http://www.sober.org.br/palestra/13/844.pdf> . Acesso em 20 fev 2017.
7
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. 2. ed. São Paulo: Pórtico, 1969. p. 30.
8
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. p. 38.
pele da população para prevenir epidemias de tifo transmitidas por piolhos, que
causavam alta mortalidade.”9
O DDT é um composto da família dos organoclorados “à base de carbono com
radicais de cloro e altamente resistentes aos mecanismos de decomposição dos
sistemas biológicos.”10 Seu caráter lipofílico, de alta afinidade e solubilidade em
gorduras, lhe confere expressiva absorção pelos organismos biológicos.
Porém, esse organoclorado é apenas um dos representantes do enorme arsenal
de produtos que foram oferecidos aos agricultores.
O uso maciço de fertilizantes e pesticidas químicos mudou toda a estrutura
básica da agricultura e da lavoura. A indústria persuadiu os agricultores de que
podiam lucrar muito desenvolvendo uma única cultura altamente lucrativa em
campos imensos e controlando parasitas e pragas com produtos químicos. Os
resultados dessa prática de monoculturas de uma única safra foram grandes
perdas de variedade genética nos campos e, por conseguinte, altos riscos de
grandes áreas de terras cultivadas serem destruídas por uma única praga. 11
9
FLORES, Araceli Verônica. et al. Organoclorados: um problema de saúde pública. Ambiente &
Sociedade – Vol. VII nº. 2 jul./dez. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/asoc/v7n2/24690.pdf>.
Acesso em: 20 fev 2017.
10
SAVOY, Vera Lúcia Tedeschi. Palestra: Classificação dos agrotóxicos. Biológico, São Paulo, v.73, n.1,
p.91-92, jan./jun., 2011. Disponível em:
<http://www.biologico.sp.gov.br/docs/bio/v73_1/savoy_palestra.pdf>. Acesso em: 20 fev 2017.
11
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 247.
12
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 246.
13
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 251.
14
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 251.
15
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 251
16
FERRARI, Antenor. Agrotóxicos: a praga da dominação. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985. p 26.
anos sessenta e setenta e foram responsáveis pelo aumento exponencial do consumo
dessas substâncias.
A propaganda enaltecia valores ideológicos, segundo os quais somente
possuía valor social aquela propriedade que tivesse condições de absorver as
mais modernas técnicas – máquinas, implementos, novas variedades e,
evidentemente, agrotóxicos. Explorando fartamente valores como eficiência,
segurança, garantia, certeza, a publicidade dos venenos contribuiu
favoravelmente para modificar antigos hábitos no meio rural, tidos como
‘atrasados’ pela nova agricultura química-industrial.17
26
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 16 fev 2017.
27
BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6938.htm>. Acesso em: 21 fev 2017.
28
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.229.
29
BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6938.htm>. Acesso em: 21 fev 2017.
30
MILARÉ, Édis. Reação jurídica à danosidade ambiental: contribuição para o delineamento de um
microssistema de responsabilidade. PUC-SP. São Paulo, 2016. p. 79. Disponível em:<
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/18874/2/%C3%89dis%20Milar%C3%A9.pdf>. Acesso em: 22
fev 2017.
qualidade de vida e o meio ambiente.”31 Vê-se então que a produção, comercialização
e o uso dos defensivos agrícolas, termo cunhado de eufemismo em uma tentativa de
ocultar sua real toxidade para o meio agrícola e possibilitar sua utilização sem
questionamentos, deve ser controlado pelo Poder Público e é requisito para a saúde
humana e ambiental.
Assim, a Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989, posteriormente regulamentada
pelo Decreto 4.074, de 4 de janeiro de 2002 , deu um grande passo em direção ao
equilíbrio ecológico ao deter a utilização irrestrita dos organoclorados, como o DDT, no
parágrafo único de seu artigo 20. Na letra da lei especificou-se que “aos titulares do
registro de produtos agrotóxicos que têm como componentes os organoclorados será
exigida imediata reavaliação de seu registro.” 32 Como exposto anteriormente:
Muitos compostos organoclorados, oriundos tanto de fontes agrícolas como
industriais, apresentam, frequentemente, alta resistência à degradação química
e biológica e alta solubilidade em lipídios. A combinação entre a baixa
solubilidade em água e a alta capacidade de adsorção na matéria orgânica leva
ao acúmulo desses compostos ao longo da cadeia alimentar, especialmente
nos tecidos ricos em gorduras dos organismos vivos.33
2- O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO
Segundo Capra, “o envenenamento químico passa a fazer parte, cada vez mais,
de nossa vida”41. Para o físico norte-americano, os riscos à saúde humana representam
“meros efeitos diretos e óbvios da tecnologia humana sobre o meio ambiente natural” 42.
Consoante esta afirmação está o princípio da precaução, que busca evitar danos
futuros diante da incerteza dos riscos das atividades do presente.
Efeitos menos óbvios mas possivelmente muitíssimos perigosos só
recentemente foram reconhecidos, e ainda não foram compreendidos em toda
a sua extensão. Contudo, tornou-se claro que nossa tecnologia está
perturbando seriamente e pode até estar destruindo os sistemas ecológicos de
que depende a nossa existência.43
37
FLORES, Araceli Verônica. et al. Organoclorados: um problema de saúde pública. Ambiente &
Sociedade – Vol. VII nº. 2 jul./dez. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/asoc/v7n2/24690.pdf>.
Acesso em: 20 fev 2017.
38
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p. 35.
39
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. p. 28.
40
SAVOY, Vera Lúcia Tedeschi. Palestra: Classificação dos agrotóxicos. Biológico, São Paulo, v.73, n.1,
p.91-92, jan./jun., 2011. Disponível em:
<http://www.biologico.sp.gov.br/docs/bio/v73_1/savoy_palestra.pdf>. Acesso em: 20 fev 2017.
41
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 23.
42
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 23.
43
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 23.
Antes, no entanto, de discorrer sobre a precaução, é preciso entendimento do
conceito de dano ambiental, definição intimamente ligada à aplicabilidade desse
princípio, e do conhecimento, na visão de grandes cientistas, da sociedade atual.
A definição de dano ambiental não se encontra positivada na lei brasileira,
contudo, Édis Milaré traz uma noção de um dano provável ou futuro encontrado nas
obras de Ulrich Beck. Assim, dano ambiental é visto como um:
[...] Evento possível mas imperceptível ao senso comum -, o qual, diante de
sua incerteza, indeterminação, invisibilidade, além de sua probabilidade e
magnitude desconhecidas, é marca e preocupação de uma nova fase da
sociedade moderna, hoje conhecida como “sociedade de risco” ou “sociedade
de incertezas”.44
44
MILARÉ, Édis. Reação jurídica à danosidade ambiental: contribuição para o delineamento de um
microssistema de responsabilidade. PUC-SP. São Paulo, 2016. p. 02. Disponível em:<
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/18874/2/%C3%89dis%20Milar%C3%A9.pdf>. Acesso em: 22
fev 2017.
45
MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 67.
46
Traité de Droit Européen de l’Environnement apud MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental
Brasileiro. p. 66.
47
MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 56.
caso de dúvida ou de incerteza sobre qualquer dano ambiental deve-se agir de forma
preventiva. O caráter preventivo é semelhante ao princípio da prevenção, mas a grande
inovação da precaução está na dúvida científica que “expressa com argumentos
razoáveis, não dispensa a prevenção.”48
As medidas de prevenção não devem ser postergadas. [...] Postergar é esperar
acontecer. A precaução age no presente para não se ter que chorar e lastimar
no futuro. A precaução não só deve estar presente para impedir o prejuízo
ambiental, mesmo incerto, que possa resultar das ações ou omissões
humanas, como deve atuar para a prevenção oportuna desse prejuízo. 49
O provável dano futuro, “muitas vezes, não pode ser provado de plano, vindo a
materializar-se, somente, com o decorrer do tempo”. 50 Assim, postergar as medidas
preventivas seria deixar a encargo das futuras gerações cuidar e arcar com as
consequências dessa negligência. O que contraria outro princípio ambiental, o princípio
da equidade intergeracional que assegura dever o acesso aos recursos naturais, aos
bens que integram o ambiente planetário, satisfazer as necessidades comuns de todos
os habitantes da Terra, inclusive as futuras gerações. 51 Por essas razões e com a
finalidade maior de preservar o meio ambiente:
O princípio da precaução entra no domínio do direito público que se chama
‘poder de polícia’ da administração. O Estado, que, tradicionalmente, se
encarrega da salubridade, da tranquilidade, da segurança, pode e deve para
este fim tomar medidas que contradigam, reduzam, limitem, suspendam
algumas das liberdades do homem e do cidadão. [...] O Estado pode suspender
uma grande liberdade, ainda mesmo que ele não possa apoiar sua decisão em
uma certeza científica.52
Esse poder de polícia estatal pode ser constatado em um caso concreto após
aproximadamente sete anos de longas discussões e distintos pareceres de acordo com
as aspirações de cada interessado. Trata-se da reavaliação de agrotóxicos prevista no
Decreto nº 4.074, de 2002, que efetivou-se com a publicação da Instrução Normativa
Conjunta n° 2, de 2006. 53 O início das discussões datam do ano de 2006 quando
falava-se sobre a alteração da Ingestão Diária Aceitável (IDA), porém, no ano seguinte,
48
MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 65.
49
MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 67.
50
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.205.
51
SOUZA, Maria Claudia da Silva Antunes; MAFRA, Juliete Ruana. A sustentabilidade e seus reflexos
dimensionais na avaliação ambiental estratégica: o ciclo do equilíbrio do bem-estar. p. 5. Disponível
em:<http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=ec82bd533b0033cb>. Acesso em: 21 fev 2017.
52
François Ewald apud MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 68.
53
ANVISA. Reavaliação de agrotóxicos. 20 de junho de 2016. Disponível
em:<http://portal.anvisa.gov.br/informacoes-tecnicas13/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/
reavaliacao-de-agrotoxicos/219201/pop_up?
_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_viewMode=print&_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_languageId=en_
US>. Acesso em 30 mai 2017.
uma liminar suspendeu essa revisão. 54 Em 22 de fevereiro de 2008 foi publicada a RDC
(Resolução da Diretoria Colegiada) de número 10 pela Anvisa 55, Agência Nacional de
Vigilância Sanitária. Tal resolução formalizou o processo de reavaliação toxicológica 14
substâncias ativas utilizadas na composição de agrotóxicos, sendo que deste grupo,
cinco compostos pertenciam à família dos organofosforados: Acefato, Fosmete,
Parationa Metílica, Metamidofós, Triclorfom e Forato. Novamente, uma liminar foi
obtida para suspender o processo. Ainda no mesmo ano, a RDC nº 48 dispôs sobre os
procedimentos a ser adotados na reavaliação toxicológica e suspendeu a liminar
anterior.
Essas seis substâncias foram reavaliadas e reguladas por suas respectivas
resoluções. O Triclorfom foi o primeiro a ser banido pela resolução nº 37/2010, o
Fosmete submetido a restrições e reavaliações 56. A RDC nº01 de janeiro de 2011
baniu o Metamidofós, dois anos depois a Resolução nº 45 foi publicada estatuindo o
“regulamento técnico para o ingrediente ativo Acefato em decorrência de sua
reavaliação toxicológica.”57, o uso do Forato foi banido em março de 2015 pela RDC nº
12 e a comercialização de agrotóxicos a base de Parationa Metílica foi proibida apenas
a partir de 1º de setembro de 2016. 58
Ao analisar separadamente o caso dos agrotóxicos de Acefato, verifica-se que
foi alegada como motivação para a reavaliação suspeita de carcinogenicidade e
54
ANVISA. Reavaliação Toxicológica do Ingrediente Ativo Acefato. Gerência Geral de Toxicologia –
GGTOX. 29 de janeiro de 2013. Disponível
em:<http://portal.anvisa.gov.br/documents/111215/117758/Apres_Acefato_DICOL_2013%2B210113.pdf/
d7afb571-a75c-4017-a3ea-610047ff7abb>. Acesso em: 25 mai 2017.
55
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Resolução RDC nº 10, de 22 de fevereiro de 2008.
Diário Oficial da União. ISSN 1677-7042. Nº 37, segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008. p. 60.
Disponível em:<https://www.mprs.mp.br/areas/gapp/arquivos/rdc_anvisa_10_2008.pdf>. Acesso em: 30
mai 2017.
56
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Reavaliação Toxicológica Paraquate. CPNBR –
GGTOX. Superintendência de Toxicologia - SUTOX. Brasília, 04 de novembro de 2015. p. 5.
Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/
capadr/audiencias-publicas/audiencias-publicas-2015/audiencia-publica-04-de-novembro-de-2015-
anvisa>. Acesso em 30 mai 2017.
57
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Resolução RDC nº 45, de 2 de outubro de 2013.
Regulamento técnico para o ingrediente ativo acefato em decorrência de sua reavaliação toxicológica.
Diário Oficial da União. ISSN 1677-7042. Nº 193, sexta-feira, 4 de outubro de 2013. p. 115. Disponível
em:<http://portal.anvisa.gov.br/documents/111215/117758/RDC%2B452013.pdf/123c9216-c11f-4b95-
9fcb-9d949acf6788>. Acesso em: 30 mai 2017.
58
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Proibido uso de agrotóxicos com Parationa
Metílica. 02 de setembro de 2016. Disponível
em:<http://portal.anvisa.gov.br/noticias/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/proibido-uso-de-
agrotoxicos-com-parationa-metilica/219201?inheritRedirect=false>. Acesso em: 30 mai 2017.
toxicidade reprodutiva para seres humanos com base em estudos epidemiológicos e
em animais que reportaram efeitos neurotóxicos.59
A Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (Environmental
Protection Agency – EPA) classificou o acefato como Possível Carcinógeno
Humano, ou classe C. A agência americana EPA inclui nessa classe as
substâncias para as quais há evidências de carcinogenicidade obtidas em
estudos experimentais, mas que não foram adequadamente avaliadas em
estudos com seres humanos. [...] Não existem, até o momento, estudos
epidemiológicos que tenham investigado a associação entre exposição ao
acefato e a ocorrência de câncer em seres humanos. 60
68
ANVISA. Reavaliação de agrotóxicos. 20 de junho de 2016. Disponível
em:<http://portal.anvisa.gov.br/informacoes-tecnicas13/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/
reavaliacao-de-agrotoxicos/219201/pop_up?
_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_viewMode=print&_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_languageId=en_
US>. Acesso em 30 mai 2017.
69
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.205.
70
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Reavaliação Toxicológica do Ingrediente Ativo
Acefato. Gerência Geral de Toxicologia – GGTOX. 29 de janeiro de 2013. Disponível
em:<http://portal.anvisa.gov.br/documents/111215/117758/Apres_Acefato_DICOL_2013%2B210113.pdf/
d7afb571-a75c-4017-a3ea-610047ff7abb>. Acesso em: 30 mai 2017.
71
BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 16 fev. 2017.
72
DEL'OLMO, Elisa Cerioli. Informação Ambiental como direito e dever fundamental. Faculdade de
Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 27 de novembro de 2007. p. 17.
Disponível em:<http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2007_2/
Elisa_Cerioli.pdf>. Acesso em 30 mai 2017.
73
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p. 28.
educação ambiental, a garantia de democratização das informações
ambientais.74
74
DEL'OLMO, Elisa Cerioli. Informação Ambiental como direito e dever fundamental. Faculdade de
Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 27 de novembro de 2007. p. 42.
Disponível em:<http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2007_2/
Elisa_Cerioli.pdf>. Acesso em 30 mai 2017.
75
BONAVIDES apud DEL'OLMO, Elisa Cerioli. Informação Ambiental como direito e dever fundamental.
Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 27 de novembro de
2007. p. 12. Disponível em:<http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/
trabalhos2007_2/Elisa_Cerioli.pdf>. Acesso em 30 mai 2017.
76
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 42.
mecanicista, comparou o meio ambiente a uma máquina. 77 O reducionismo da filosofia
de Francis Bacon alegou que os fenômenos complexos poderiam “sempre ser
entendidos desde que se os reduzisse a seus componentes básicos e se investigasse
os mecanismos através dos quais esses componentes interagem” 78. E a concepção
cartesiana instituiu a dúvida, porém a partir de uma ótica cética, a qual requeria que
somente poderia ser considerado existente o que pudesse ser provado, dessa forma,
duvidar-se-ia do que poderia ser duvidado. 79 Essas revoluções dos pensamentos
“serviram como fundamento lógico para o tratamento do meio ambiente natural, como
se ele fosse formado de peças separadas a serem exploradas por diferentes grupos de
interesses.”80
A drástica mudança na imagem da natureza, de organismo para máquina, teve
um poderoso efeito sobre a atitude das pessoas em relação ao meio ambiente
natural. A visão de mundo orgânica da Idade Média implicava um sistema de
valores que conduzia ao comportamento ecológico. Nas palavras de Carolyn
Merchant: "A imagem da terra como organismo vivo e mãe nutriente serviu
como restrição cultural, limitando as ações dos seres humanos. Não se mata
facilmente uma mãe, perfurando suas entranhas em busca de ouro ou
mutilando seu corpo. [...] Enquanto a terra fosse considerada viva e sensível,
seria uma violação do comportamento ético humano levar a efeito atos
destrutivos contra ela".81
Sabe-se que, como colocado por Leonardo Boff em seu texto “O século dos
direito da Mãe Terra” - nome sugestivo para designar o período de inovações e
avanços durante este século XXI - “não estamos mais dentro do antropocentrismo que
desconhecia o valor intrínseco de cada ser, independentemente, do uso que fizermos
dele. Cresce mais e mais a clara consciência de que tudo o que existe merece existir e
77
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 42.
78
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 46.
79
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 46.
80
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 39.
81
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 58.
82
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 75.
tudo o que vive merece viver” 83.
vê-se, então que os ideias sistêmicos estão sendo introduzidos na sociedade para
serem analisados e avaliados, o que permite falar-se em sustentabilidade. Pois esta, de
acordo com Klaus Bosselmann, “não pode ser definida sem uma maior reflexão sobre
valores e princípios”84.
Na sua forma mais elementar, a sustentabilidade reflete a pura necessidade. O
ar que respiramos, a água que bebemos, os solos que fornecem o nosso
alimento são essenciais para nossa sobrevivência. A regra básica da existência
humana é manter a sustentabilidade das condições de vida de que depende. 85
83
BOFF, Leonardo. O século dos direitos da Mãe Terra. 2009. Disponível
em:<http://leonardoboff.com/site/vista/2009/maio08.htm>. Acesso em: 21 fev 2017.
84
BOSSELMANN, Klaus. O Princípio da Sustentabilidade: transformando direito e governança. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 25.
85
BOSSELMANN, Klaus. O Princípio da Sustentabilidade: transformando direito e governança. p. 25.
86
SOUZA, Maria Claudia da Silva Antunes; MAFRA, Juliete Ruana. A sustentabilidade e seus reflexos
dimensionais na avaliação ambiental estratégica: o ciclo do equilíbrio do bem-estar. p. 5. Disponível
em:<http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=ec82bd533b0033cb>. Acesso em: 21 fev 2017.
87
BOSSELMANN, Klaus. O Princípio da Sustentabilidade: transformando direito e governança. p. 27.
88
SOUZA, Maria Claudia da Silva Antunes; MAFRA, Juliete Ruana. A sustentabilidade e seus reflexos
dimensionais na avaliação ambiental estratégica: o ciclo do equilíbrio do bem-estar. p. 5. Disponível
em:<http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=ec82bd533b0033cb>. Acesso em: 21 fev 2017.
O desenvolvimento sustentável é o instrumento da sustentabilidade e seu
objetivo é “definir um modelo econômico capaz de gerar riquezas e bem estar,
concomitantemente que fomente a coesão social e impeça a degradação do
ambiente.”89 Pode-se resumir este conceito quando se é constatado que o
desenvolvimento para a sustentabilidade pressupõe equilíbrio entre as dimensões
ambientais, econômicas e sociais90, os componentes da tríplice estrutura da
Sustentabilidade.
Não obstante, Bosselmann escreve que a governança para a sustentabilidade
tem suas origens nos valores e na percepção holística e, a despeito do início da
mudança de paradigmas e da passagem do cartesianismo para a concepção
sistemática, ele escreve que, ainda, a ênfase atual é sobre a governança econômica,
sendo esta posição “produto de valores que colocam o ganho pessoal, de curto prazo,
acime a da igualdade social e da segurança humana.” 91 É a disparidade entre os três
tripés sustentáveis que resulta no caos ambiental e social da atualidade. Os interesses
econômicos e a ambição humana se sobressaem sem consciência dos danos e riscos
que causam e projetam no futuro. Não diferente, pois, é a agricultura na maior parte do
mundo e especialmente no Brasil:
Decorrente desse modelo químico dependente de agrotóxicos examinamos a
cadeia produtiva do agronegócio que reveste-se de um processo de
insustentabilidade ambiental, pois no seu espaço se cria um território com
muitas e novas situações de vulnerabilidades ocupacionais, sanitárias,
ambientais e sociais que induzem eventos nocivos que se externalizam em
trabalho degradante e escravo, acidentes de trabalho, intoxicações humanas,
cânceres, malformações, mutilados, sequelados e ainda, contaminação com
agrotóxicos e fertilizantes químicos das águas, ar, chuva e solo em todos os
espaços ou setores da cadeia produtiva do agronegócio. 92
98
FERRARI, Antenor. Agrotóxicos: a praga da dominação. p 23.
99
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 245.
100
MARX, Karl apud CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 202.
101
Chateaubriand apud HUXLEY, Aldous. A situação humana. p. 20.eaubriand, apud Huxley
102
ABRASCO. Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde: parte 2 – agrotóxicos, saúde,
ambiente e sustentabilidade. p. 33.
103
ABRASCO. Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde: parte 2 – agrotóxicos, saúde,
ambiente e sustentabilidade. p. 33.
magnificação biológica, cujos mecanismos tendem a concentrar, nos sistemas
biológicos, os produtos tóxicos persistentes encontrados no ambiente.” 104
Fritjof Capra escreveu que “uma das mais sérias ameaças, quase totalmente
ignorada até recentemente, é o envenenamento da água e do ar por resíduos químicos
tóxicos.”105 Sabe-se que o lançamento acidental de pesticidas em lagos, rios e baias às
vezes causam mortalidade massiva de peixes e seus compostos são potentemente
tóxicos para pequenos organismos aquáticos.
O uso dos organofosforados foi expandido nos anos 70, pois se apresentou
como alternativa aos ainda mais nocivos compostos clorados. Após seu uso contínuo,
foi constatada sua grande eficácia no combate as pragas agrícolas e seus efeitos
considerados relativamente menos lesivos ao meio ambiente, porém não o suficiente
para serem negligenciados.106 As substâncias fosfóricas, muito solúveis em gorduras,
pouco em meio aquoso e de baixa volatilidade, degradam-se com maior rapidez na
natureza ao entrar em contato com o ar ou com a luz solar. 107 Seus antecessores, os
organoclorados, caracterizam-se pela “alta resistência à degradação química e
biológica e alta solubilidade em lipídios” 108 o que “leva ao acúmulo desses compostos
ao longo da cadeia alimentar, especialmente nos tecidos ricos em gorduras dos
organismos vivos”109.
Mas, mesmo com essas características que possam tornar os organofosforados
levemente menos danosos ao ambiente natural, a Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária, EMBRAPA, realizou um estudo do risco de contaminação de águas
superficiais e subterrâneas em relação às características dos agrotóxicos. A análise
permitiu verificar que dentre os agrotóxicos analisados, alguns dos que possuem maior
mobilidade no ambiente são os organofosforados: Metamidofós, Triclorfom, Acefato e
104
FERRARI, Antenor. Agrotóxicos: a praga da dominação. p 46.
105
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 228.
106
INVS (Institut de Veille Sanitaire). Pesticides organophosphorés. 2011. Disponível
em:<http://invs.santepubliquefrance.fr/Dossiers-thematiques/Environnement-et-sante/Biosurveillance/
Index-de-A-a-Z/P/Pesticides-organophosphores>. Acesso em: 22 fev 2017. Tradução livre.
107
INVS (Institut de Veille Sanitaire). Pesticides organophosphorés. 2011. Disponível
em:<http://invs.santepubliquefrance.fr/Dossiers-thematiques/Environnement-et-sante/Biosurveillance/
Index-de-A-a-Z/P/Pesticides-organophosphores>. Acesso em: 22 fev 2017. Tradução livre.
108
FLORES, Araceli Verônica. et al. Organoclorados: um problema de saúde pública. Ambiente &
Sociedade – Vol. VII nº. 2 jul./dez. 2004. p.114. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/asoc/v7n2/24690.pdf>. Acesso em: 20 fev 2017.
109
FLORES, Araceli Verônica. et al. Organoclorados: um problema de saúde pública. Ambiente &
Sociedade – Vol. VII nº. 2 jul./dez. 2004. p.114. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/asoc/v7n2/24690.pdf>. Acesso em: 20 fev 2017.
Dimetoato e Monocrotofós.110 Os dois primeiros banidos do mercado e o terceiro
regulamentado, como visto anteriormente. Os produtos a base de Dimetoato são
classificados como muito perigosos ao meio ambiente, altamente tóxico para
crustáceos, aves, abelhas e outros insetos. 111 Já o Monocrotofós teve seu uso proibido
pela RDC nº 215/2006 e está incluído na lista de substâncias perigosas da Convenção
de Roterdã, a qual o Brasil é signatário desde 1997 e que trata do controle do trânsito
internacional desse composto.112 Consoante, o Instituto de Vigilância Sanitária da
França ao se pronunciar sobre esse grupo químico disse ainda ser possível detectar
pequenas quantidades de seus compostos nos alimentos e na água potável. 113
Consoante, sabe-se que deformações congênitas e anencefalia podem ser provocados
por um fator interno que age no organismo materno, como podem ser provocados por
problemas ambientais. Questiona-se então se esta mobilidade ambiental, ou seja, a
capacidade dos agrotóxicos de penetrar nos sistemas biológicos e neles se
comportarem de forma a alterar as dinâmicas naturais, dos organofosforados, não seria
participante no fenômeno da magnificação biológica, o processo pelo qual a
concentração química em um organismo se torna maior que a concentração no ar ou
na água do ambiente. Como resultado desta bioacumulação pode ocorrer que um
composto químico consiga concentrar-se nos diversos níveis trópicos e tornar-se a
cada vez mais concentrado conforme é transmitido de organismo a organismo na
cadeia alimentar, a chamada biomagnificação. Assim, vê-se que tanto por vias
ambientais como pela transmissão hereditária a contaminação do meio ambiente pelos
agrotóxicos afeta a saúde humana.
110
ABRASCO. Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde: parte 2 – agrotóxicos, saúde,
ambiente e sustentabilidade. p. 59.
111
ADAPAR (Agência de Defesa Agropecuária do Paraná). Dimetoato 500 ec nortox.Disponível
em:<http://www.adapar.pr.gov.br/arquivos/File/defis/DFI/Bulas/Inseticidas/
DIMETOATO500ECNORTOX.pdf>. Acesso em: 22 fev 2017.
112
ANVISA (Agência Nacional de Segurança Sanitária). Resolução-RDC nº 215, de 14 de dezembro de
2006. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?
jornal=1&pagina=127&data=15/12/2006>. Acesso em: 22 fev 2017. ANVISA (Agência Nacional de
Segurança Sanitária). Resolução-RDC nº 215, de 14 de dezembro de 2006. Disponível em:
<http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=127&data=15/12/2006>.
Acesso em: 22 fev 2017.
113
ANVISA (Agência Nacional de Segurança Sanitária). Resolução-RDC nº 215, de 14 de dezembro de
2006. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?
jornal=1&pagina=127&data=15/12/2006>. Acesso em: 22 fev 2017.
Para Edis Milaré a saúde da coletividade humana depende da saúde do
Planeta.114 O bem estar e a qualidade de vida do homem podem ser medidos pelo
equilíbrio ambiental que o cerca, consequentemente, “a deterioração do meio ambiente
natural tem sido acompanhada de um correspondente aumento nos problemas de
saúde dos indivíduos”.115
Os agrotóxicos são portadores de uma enorme potência biológica, “eles
possuem poder imenso não somente de envenenar, mas também de penetrar nos
processos mais íntimos e vitais do organismo, modificando-os em sentido sinistro e,
com frequência, em sentido mortal”.116Entretanto, na maioria das vezes não é possível
comprovar a relação de causalidade entre a exposição a esses venenos e as
intoxicações e doenças manifestadas por conta da dificuldade em se realizar um
diagnóstico preciso117.
Especificamente quanto aos inseticidas organofosforados, ao adentrarem na
corrente sanguínea do homem, destroem enzimas com funções essenciais para o
funcionamento do corpo humano, atingindo principalmente o sistema nervoso. A
acetilcolina é um neurotransmissor responsável pela passagem dos impulsos nervosos
de um nervo para outro e após desempenhar sua função é eliminada do organismo. Tal
existência, segundo Rachel Carson, efêmera, impede que os mesmos impulsos
continuem sendo transmitidos pela mesma ponte neurológica, o que levaria a
movimentos descoordenados do corpo como tremores, espasmos, e até uma possível
morte após tais efeitos.118 Porém, quem executa a tarefa de eliminar a acetilcolina do
corpo, depois que ela não se faz mais necessária é a enzima colinesterase, o alvo dos
organofosforados. Os efeitos tóxicos se dão pela falta da enzima contingente que
resulta em um enorme acúmulo de acetilcolina nas terminações nervosas e toda ordem
do organismo é alterada.119
Quanto às vias de contaminação, os organofosforados podem ser absorvidos
por via dérmica, respiratória e oral, sendo a dérmica a principal via de penetração nos
envenenamentos ocupacionais, visto que “a taxa de absorção cutânea é aumentada
114
MILARÉ, Édis. Reação jurídica à danosidade ambiental: contribuição para o delineamento de um
microssistema de responsabilidade. PUC-SP. São Paulo, 2016. p. 43. Disponível em:<
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/18874/2/%C3%89dis%20Milar%C3%A9.pdf>. Acesso em: 22
fev 2017.
115
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 23.
116
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. p. 26.
117
ABRASCO. Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde: parte 2 – agrotóxicos, saúde,
ambiente e sustentabilidade. p. 47 e 49
118
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. p. 38 e 39.
119
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. p. 38 e 39.
em temperaturas elevadas ou ainda quando há lesões na pele” 120
, seguida pela
respiratória.
A exposição repetida ao veneno reduz o nível de colinesterase, até que o
indivíduo alcança o limite do envenenamento agudo, limite este além do qual
ele pode ser empurrado por meio de uma bem pequena exposição adicional. 121
120
VOMMARO, Alanna. et al. Praguicidas organofosforados e sua toxidade. Universidade Vale do Rio
Doce. Governador Valadares, 2010. p. 24 Disponível em:<
http://www.pergamum.univale.br/pergamum/tcc/Praguicidasorganofosforadosesuatoxicidade.pdf>.
Acesso em: 21 fev 2017.
121
CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. p. 39.
122
ONIL, Samuel; SAINT-LAURENT, Louis. Guide de prévention pour les utilisateurs de pesticides
en agriculture maraîchère. Institut Nacional de Santé Publique du Québec. Jjunho 2001. Disponível
em:<https://www.inspq.qc.ca/pdf/publications/045_pesticides_agriculture.pdf>. Acesso em: 22 fev 2017.
Tradução livre.
123
LINHARES, Amanda Guedes. Efeito de pesticidas organofosforados e carbamatos sobre a
acetilcolinesterase eritrocitária humana e seu potencial uso como biomarcador da exposição
ocupacional. Universidade Federal de Pernambuco. 2013. Disponível em:<
http://repositorio.ufpe.br/bitstream/handle/123456789/13270/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Amanda
%20Guedes%20Linhares.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 20 fev 2017.
124
VOMMARO, Alanna. et al. Praguicidas organofosforados e sua toxidade. Universidade Vale do Rio
Doce. Governador Valadares, 2010. p. 14 e 15. Disponível em:<
http://www.pergamum.univale.br/pergamum/tcc/Praguicidasorganofosforadosesuatoxicidade.pdf>.
Acesso em: 21 fev 2017.
125
SÃO PAULO. Governo do Estado de São Paulo: Secretaria da Saúde. Toxicologia de Praguicidas.
Disponível em: <http://www.saude.sp.gov.br/resources/sucen/programas/arquivos-seguranca-do-
organofosforados pode ter efeito cumulativo” 126 e essa evidência torna o fenômeno da
bioacumulação iminente, podendo ocasionar efeitos mutagênicos que “não se
restringem à população diretamente atingida, mas [que] vão afetar as futuras gerações,
onde irão acumular-se as mutações recessivas, que se manifestarão sob a forma de
doenças genéticas”.127
Diversos pesticidas organofosforados e alguns carbamatos, incluindo alguns de
seus metabólitos, são capazes de provocar malformações congênitas, afetar a
fertilidade e produzir efeitos genéticos tóxicos, inclusive câncer (WHO, 1986a;
1986b). [...] Os efeitos teratogênicos dos agrotóxicos podem resultar da
exposição intra-uterina do indivíduo em formação e mediante a ação
mutagênica nos gametas dos progenitores nas primeiras etapas da gestação.
Das malformações congênitas de fácil diagnóstico clínico, as que se
destacaram pela influência de agrotóxicos em estudo realizado no Chile foram
a síndrome de down, espinha bífida e hidrocefalia (ROJAS et al., 2000). 128
Com tais constatações é possível notar que boa parcela da população está
exposta aos efeitos nocivos dos organofosforados e, assim como a ele, a todos os
outros inúmeros agrotóxicos. Os impactos no organismo humano, principalmente na
integridade orgânica e psicológica dos trabalhadores, são reflexos de uma indústria de
produtos alimentícios que, para Capra, “representa um notável exemplo dos riscos para
a saúde gerados por interesses comerciais”. 129 O que se compromete é a saúde da
coletividade que vive no presente, porém, dado o efeito cumulativo desse grupo de
agrotóxicos e suas já estudadas consequências, as futuras gerações são injustamente
condenadas a suportar os ônus das ambições da sociedade contemporânea.
131
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 43.
132
MARX, Karl apud CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 201.
133
ABRASCO. Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde: parte 2 – agrotóxicos, saúde,
ambiente e sustentabilidade. p. 49.
134
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 194 e 195.
135
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 185.
136
SOUZA, Maria Claudia da Silva Antunes. Noções da Teoria da Sustentabilidade: um olhar sobre a
educação ambiental. Empório do Direito, 2015. Disponível em:< http://emporiododireito.com.br/nocoes-
da-teoria-da-sustentabilidade-um-olhar-sobre-a-educacao-ambiental-por-maria-claudia-antunes-de-
souza-2/>. Acesso em: 21 fev 2017.
agrotóxicos no âmbito do legislativo (mais de 40 projetos de lei nessa direção),
no executivo (pressões sobre os órgãos reguladores como a ANVISA), no
judiciário (impunidade nas mortes no campo), na pesquisa (mais de 95% dos
recursos da EMBRAPA estão voltados para o agronegócio) e na mídia (o
agronegócio possui até canais de televisão).137
137
ABRASCO. Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde: parte 2 – agrotóxicos, saúde,
ambiente e sustentabilidade. p. 115.
138
SOUZA, Maria Claudia da Silva Antunes. Noções da Teoria da Sustentabilidade: um olhar sobre a
educação ambiental. Empório do Direito, 2015. Disponível em:< http://emporiododireito.com.br/nocoes-
da-teoria-da-sustentabilidade-um-olhar-sobre-a-educacao-ambiental-por-maria-claudia-antunes-de-
souza-2/>. Acesso em: 21 fev 2017.
139
FERRARI, Antenor. Agrotóxicos: a praga da dominação. p 45.
140
MILARÉ, Édis. Reação jurídica à danosidade ambiental: contribuição para o delineamento de um
microssistema de responsabilidade. PUC-SP. São Paulo, 2016. p. 79. Disponível em:<
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/18874/2/%C3%89dis%20Milar%C3%A9.pdf>. Acesso em: 22
fev 2017.
141
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 214.
142
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 199.
143
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 183.
Considerando que a governança para a sustentabilidade tem suas próprias
origens na percepção holística e valores de fundo, a ênfase atual sobre a
governança econômica é produto de valores que colocam o ganho pessoal, de
curto prazo, acima da igualdade social e da segurança humana. O problema
não é tanta a racionalidade econômica subjacente, mas a sua posição
dominante em qualquer forma de governo. O foco defensivo e reativo, baseado
na especialização e na resolução de problemas da governança ambiental,
contrasta com a necessidade de projetar abordagens proativas e imaginativas
redesenhadas para a saúde e bem-estar do planeta. 144
CONCLUSÃO
A simetria entre o meio ambiente, os interesses da sociedade e a economia são
pressupostos para uma sociedade sustentável e também para a efetiva concretização
do direito constitucional a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia
qualidade de vida.
A restrição legislativa ao uso dos organoclorados foi um grande avanço para o
alcance desta paridade, e consequentemente da Sustentabilidade. No entanto, sua
substituição pelos organofosforados mostrou ser a postura estatal paradoxal quanto à
144
BOSSELMANN, Klaus. O Princípio da Sustentabilidade: transformando direito e governança. p.
220.
145
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. p. 219.
146
MILARÉ, Édis. Reação jurídica à danosidade ambiental: contribuição para o delineamento de um
microssistema de responsabilidade. PUC-SP. São Paulo, 2016. p. 77. Disponível em:<
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/18874/2/%C3%89dis%20Milar%C3%A9.pdf>. Acesso em: 22
fev 2017.
vontade de tutelar a saúde humana e ambiental face às ambições econômicas do setor
agrícola, de forma a até mesmo desrespeitar o princípio da precaução.
Apesar disto, foi visto que já houve um avanço e a tutela do meio ambiente
passou de mero interesse antropocêntrico para real preocupação. Agora, então, busca-
se a total libertação da agricultura química, o que garantirá o direito a todos de um meio
ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida.
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