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Universidade Federal de Goiás.

Escola de Música e Artes Cênicas – EMAC


Programa de Pós-Graduação em Artes da Cena

JOSÉ DE OLIVEIRA JÚNIOR

A Luz Ativa no Trabalho de Adolphe Appia.

Goiânia
2020

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JOSÉ DE OLIVEIRA JÚNIOR

A Luz Ativa no Trabalho de Adolphe Appia.

Pré-Projeto de pesquisa apresentado ao


Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em
Música da Escola de Música e Artes Cênicas
da Universidade Federal de Goiás como pré-
requisito para a obtenção do título de
MESTRE EM ARTES DA CENA. Área
de Concentração: TEATRO, DANÇA,
DIREÇÃO DE ARTE.
Linha de Pesquisa: ESTÉTICA E
POETICAS DAS ARTES CENICAS
Orientadora Prof. Dra. Maria Cristina Freitas
Bonetti.
Coorientador: Pof. Dr. Dalmir Rogério
Pereira

Goiânia
2020

2
Introdução

O presente projeto de pesquisa é um estudo sobre o conceito de Luz Ativa no


trabalho de Adolphe Appia, pesquisa em andamento no programa de Pós-Graduação em
Artes da Cena, da Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás.
Pretendemos gerar conhecimento sobre este objeto, que ainda é pouco estudado no
ambiente acadêmico, que é o método de aplicação da iluminação cênica proposto por
Appia. Segundo Plaza (1997, p.22), “[...]produzir conhecimentos é transformar
informações complexas (científicas ou tecnológicas, sensíveis e técnicas), em resultados
de um processo de trabalho”. com esse pensamento empreenderemos este estudo, pois
“Ciência e arte têm uma origem comum, na abdução ou capacidade para formular
hipóteses, imagens, ideias, na colocação de problemas, e nos métodos infra lógicos”
(PLAZA, 1997, p.24-25). A pesquisa se dividirá em três etapas, exporemos mais à frente
o modo com procederemos para a realização de cada uma delas.

Adolphe Appia (1862 – 1928) “Foi arquiteto e músico Suíço, um estudioso do


espaço teatral, com o qual se origina o trinômio ator-música-cena, incorporando uma
compreensão inovadora de “verdade” na cena, ao vislumbrar novas fusões para a luz”
(TUDELLA, 2017, p.567). Para Forjaz (2008) ele foi o artista que propôs, com mais
consciência, uma mudança estrutural no conceito e na prática da iluminação cênica. Ele
o fez através de desenhos e concepções cenográficas, que ganham movimento através da
luz. Mas o foi, sobretudo, por meio de seus escritos sobre a arte do espetáculo, nos quais
dá grande importância à iluminação cênica, sua relação com os demais elementos da
encenação e seu papel artístico na construção da cena. Os elementos que compõem seus
estudos sobre o teatro foram responsáveis por modificar a visão sobre a encenação no
início do século XX, antes ligada ao naturalismo e ao realismo, propôs uma mudança
estética radical na arte teatral, não mais baseada nas influências pictóricas dos grande
telões decorativos, e sim no uso da iluminação, do trabalho do ator e da cenografia, a fim
de garantir a plasticidade do movimento expressivo e a reforma da concepção espacial,
numa tríade harmônica Ator-Espaço-Luz. Segundo Plaza (1997, P. 22) “Quando o
cientista ou o filósofo se interrogam, sobre o que é isto, ou aquilo, iniciam um processo

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de busca do conhecimento [...]. Conhecimento é, pois, um esforço mental que extrai do
caos um esquema de ordem, um cosmos, uma informação, uma linguagem diríamos”.

Justificativa
Estudar a luz no trabalho de Appia se justifica dada as grandes transformações
propostas por ele para a cena teatral, alterando de forma significativa o modo como a
iluminação elétrica era utilizada no teatro. Suas pesquisas sobre a arte do espetáculo
abrem inúmeras possibilidades de conhecimento dos elementos que compõem a cena
teatral, ao tratar de forma pioneira a luz e a sombra, abordando a excelência da expressão
plástico/visual na prática cênica, atento às relações entre cenografia, luz e o corpo do
ator. Segundo Tudella (2017), para a compreensão na totalidade da obra de Appia, são
necessárias ao leitor e ou pesquisador uma postura aberta e flexível para se deixar levar
pelas possibilidades e sugestões, para pensar e adentrar no íntimo visual da cena Appiana.
Livrar-se de molduras, de preconceito formal e se incorporar em uma leitura aberta dos
processos de experimentações visuais. Essa leitura é determinada por um grau de
educação e de entendimento apreendidos pela experimentação até então não pensadas.
Um historiador envolvido com a práxis cênica, preocupado com uma construção positiva
da pesquisa artística, jamais pode negligenciar e deixar Adolphe Appia, e principalmente
seus estudos sobre a iluminação cênica, sobre a Luz Ativa, fora do contexto teatral, assim
como da pesquisa das artes da cena, dada a contundência do seu pensamento.
O conceito ou o método da Luz Ativa é um dos elementos propostos pelo
encenador para a reformulação conceitual e estrutural da espacialidade cênica, o que mais
tarde Appia, num compêndio dos seus estudos sobre a arte teatral nominou, de Obra de
Arte Viva. O que pretendemos, aqui, é fazer uma reflexão sobre o escopo teórico de Appia
analisando e debatendo, dentro da sua obra, as questões que se referem à iluminação, o
conceito da Luz Ativa, isso nos leva, também, a abordar as transformações que o espaço
teatral sofreu sob a influência da iluminação elétrica, no final do século XIX. Neste
período, segundo Roubine (1982, p118) “Appia é sem dúvida um dos primeiros a tomar
consciência dos extraordinários recursos que a iluminação elétrica põe à disposição do
encenador”. Porém, a chegada da iluminação elétrica no teatro, num primeiro momento,
não alterou substancialmente as práticas habituais, o uso da iluminação na cena ainda era
o da representação de fenômenos da natureza;

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As lâmpadas incandescentes e a eletricidade, utilizadas a
partir dos anos 1880, foram consideradas primeiramente
apenas como uma nova técnica, mais eficiente, para realizar
as mesmas funções: clarear a cena e copiar, com maior
verossimilhança, os efeitos da natureza, como o arco-íris ou
o pôr do sol” ( SIMÕES, 2008, p. 63).
Roubine (1982) diz que Denis Bablet, em seu livro que trata da cenografia teatral1,
nos traz informações sobre o gosto do público do fim do século XIX, um gosto com
predileções para os cenários decorativos, o que denotava um atravancamento estético do
palco. Os encenadores naturalistas exploraram esse gosto, projetando seus trabalhos com
uma precisão e cuidados arqueológicos e ou sociológicos, na busca de uma ilusão perfeita
da vida real. Essa verossimilhança não teve outro efeito senão o de reforçar a estranheza
da realidade cenográfica artificial. “O fato é que o teatro ilusionista do fim do século
XIX se vê a si mesmo como uma tecnologia mais do que como uma arte, e que os
problemas de estilização e de expressão simbólica lhe sãos bastante alheios” (ROUBINE,
1982, p.107). Simões (2008, p. 76) também aborda o problema ao dizer que: “Quando o
Naturalismo assume como legado a conquista da verdade no teatro tem diante de si um
paradoxo indissolúvel. Este conflito entre verdade e ilusão chega ao clímax, e engendra
sua própria reviravolta.”
Com a chegada dessa nova tecnologia, a iluminação elétrica, estudiosos do teatro,
como Adolphe Appia, viram nela, uma ferramenta importante para as transformações da
encenação. A influência do Simbolismo, corrente literária francesa, que influenciou
vários artistas, em diferentes áreas, por toda a Europa, aliada à eletricidade, abriu caminho
para as reformulações do espaço cenográfico e da encenação como um todo. Com a cena
abstrata, a ideia de sugestões simbolista se contrapõe a encenação ilusória dos
naturalistas. Assim, “A sugestão torna-se parte fundamental da revelação e o que não
pode ser dito, vira silêncio... E imagem, da mesma forma que na poesia simbolista,
encontra através da palavra, o indizível – a visualidade abre caminho para aquilo que está
para além do visível.” (SIMÕES, 2008, p. 84). É com este espírito de abstração que os
encenadores do final do século XIX iniciam um processo de crítica, reformulação e
abandono da cenografia decorativa, pois os simbolistas não se comprometem com o rigor
técnico e ilusório dos cenários pictóricos. “A encenação volta-se para a iluminação

1
O Livro ao qual Roubine faz menção e de uma edição francesa, não encontrei referência, nem
informação se ele tem edição em português. A edição francesa é Le decor de theatre de 1870 d 1914.
Paris, CNRS, 1975.

5
entendida agora como “jogo de luzes” e esse por sua vez, livre da coerência naturalista,
toma um sentido poético, musical e sinestésico.” (SIMÕES, 2008, p. 85, 86).
A luz tem, a partir de então, uma nova função, a da sugestão, não está mais para
revelar objetos em cena. Participa agora do mundo dos sentidos, da imaginação, não para
mostrar algo ao público, mas para sugerir que este descubra por si mesmo, abre-se um
canal de comunicação sensorial. “Será o encontro entre as possibilidades da iluminação
elétrica com as necessidades da cena advindas de novas teorias e práticas do teatro, que
transformará potência em ato, impulsionando o salto qualitativo da iluminação cênica.”
(SIMÕES, 2008, pag. 64). A luz alcança poder transformador em potência;
A luz é de uma flexibilidade quase miraculosa. Ela possui
todos os graus de claridade, todas as possibilidades de
cores, como uma paleta; ela pode criar sombras, torná-las
vivas, e expandir no espaço a harmonia de suas vibrações,
exatamente como faz a música. Nós possuímos nela todo o
poder expressivo do espaço, se este espaço é colocado à
disposição do ator. (APPIA, apud FORJAZ, p.105).
Para Appia, o ator deveria ocupar o centro da cena, dada a sua vitalidade e
plasticidade. O ator vivo, móvel, explorando a espacialidade, harmoniosamente, revelado
pela magia sugestiva da luz e da sombra, só assim o teatro propiciaria ao espectador uma
cena, integralmente, livre, ativa, completa e entregue a plasticidade orgânica de uma ação
viva. Que no presente trabalho aplicaremos, sua proposta, para o bailarino “vivo”. A
cenografia, para atender a vitalidade do ator, deve ser arquitetônica, com plano diversos,
blocos, linhas de fuga, volumes variados, aberta a interação, a exploração. A cenografia
não deve impor ao ator um lugar fixo, sem movimento, e desconectado do ambiente, mas
deixá-lo livre para sua ação. Por não ser assim, criticava duramente este lugar de domínio
da pintura. Expomos a seguir algumas de suas palavras a respeito da questão:
Aqui eu suponho que o ator já tomou parte na cenografia
que nós acabamos de percorrer com os olhos. Ora, seu
lugar não está no centro da cena, infelizmente; de forma
que aquele que, pela sua atividade dramática, é o único
motivo da representação e da atenção que nós prestamos a
ele, deve se mover na parte da cenografia onde a ilusão
cênica está no seu mínimo. Essa superfície plana, ou
arbitrariamente despedaçada, sobre a qual repousa a
cenografia, torna-se pela presença do ator uma realidade
tangível; são pés vivos que a pisam, e cada passo acentua
sua insignificância. É evidente que quanto mais a pintura
das telas for bem feita do ponto de vista da ilusão de óptica,
menos o ator e seu entorno direto poderão misturar-se com
a cena, já que nenhuma das ações do ator corresponderia ao

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lugar e aos objetos representados pela cenografia. A
iluminação que poderia, pela sua expressão, dar alguns
relevos aos personagens, encontra-se monopolizada pelas
telas pintadas. E o arranjo espacial, quase inteiramente ao
serviço dessas telas, só fornece ao ator o ínfimo mínimo de
praticabilidade autorizado pela pintura. (APPIA, 2017, p.
165)
Appia acreditava que para a reforma do espaço cênico a luz é o elo de conexão
ente o ator e o espaço. Para ele, a Luz é no espaço uma expressão perfeita da realidade
viva, assim como os sons são no tempo. A cor, no entanto, é um derivado da luz, e só pela
luz pode ser realidade viva. Portanto, é dependente dela sob dois aspectos para a realidade
cênica que diferem enormemente. Um é a representação por meio da visibilidade
projetada numa superfície que aparentemente se limita à realidade do objeto, deste modo
a cor é uma realidade do objeto, sem conexão externa que a torne viva fora da
representação pictórica, como é nos telões dos pintores. Ela só pode agir por reflexos e
absorções, pois está presa ao objeto e se se move o faz por causa do objeto, não por ela.
Por outro lado, está a luz viva, a cor nela passeia pelo espaço cênico restituindo-o móvel,
permeia toda a cena conferindo-lhe luminosidade ambiente, deste modo a cor participa
da existência da luz. É um elemento vivo que está em contato direto com a cena tornando-
se parte integrante do espaço cênico, gerando movimento à cena, conectando-se
intimamente com o espaço, os objetos e o corpo do ator. Sua vida, não é fictícia, como
nas pinturas, mas é realidade, (APPIA, 196?). Nesta passagem podemos ver claramente a
força que Appia creditava à iluminação como componente estruturador de uma
espacialidade livre da pintura.
No livro Música e Encenação (1899), ao contrário dos seus outros escritos onde
a luz é tratada de forma estético filosófica, Appia expõe os fundamentos técnicos quanto
a aplicação da Luz Ativa;
Appia escreveu muito sobre a iluminação, mas em geral
com enfoque teórico e conceitual. Em A Música e a
Encenação, porém, como uma exceção que confirma a
regra, em cinco páginas dedicadas especificamente ao tema,
ele tenta organizar um sistema geral da prática da
iluminação cênica do ponto de vista estético e técnico,
estabelecendo diferentes funções e formas da luz no
espetáculo, incluindo a descrição dos equipamentos e
posicionamento preferenciais para cada função proposta.
Esse “compêndio das técnicas de iluminação cênica”
escrito em 1892 é, portanto, documento fundamental para
compreender em seus primórdios a articulação de uma
função ativa da luz no teatro e suas características técnicas.
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Ou seja, o que poderíamos chamar de “be-a-bá” da
constituição de uma “Scriptura” da iluminação cênica
(FORJAZ, 2008, p. 111).
Assim temos que, para Appia, quanto aos equipamentos de iluminação de uma
produção necessários para a cena eram requeridos dois grupos distintos de aparelhos, com
funções também distintas. Um grupo era para as luzes de preenchimento, para as luzes
atmosféricas, uma aplicação até de certo modo similar aos naturalistas, porém não com a
mesma finalidade. O outro grupo de equipamentos seria para a luz direta. Assim, para a
Luz Ativa eram necessários o uso de equipamentos com as duas funções. Uma parte os
aparelhos seriam encarregados de propagar a luz, os outros, seriam aqueles, que pela
direção precisa de seus raios criassem as sombras para nos assegurar da qualidade da
iluminação. Nós chamaremos umas de luz difusa e as outras de luz ativa. (2017). Nas
descrição, para os equipamentos da luz difusa, ele indica que necessitamos de aparelhos
que sejam com foco aberto, com lentes transparentes, e com telas de transparência
variável, emitindo um facho luminoso de forma a atenuar a claridade em cima dos objetos
cenográficos e do ator, “ o que chamamos hoje, justamente, de difusores, perfeitos para
suavizar o contraste na luz geral, e realçar as cores, volumes, de forma homogênea [...]
ou seja ele recomenda o que chamamos hoje de Luz Geral.”(FORJAZ, 2008, p.116). Por
outro lado, para a luz ativa, aponta que sejam colocados aparelhos móveis,
individualizados, direcionais e manipuláveis, aos quais serão objeto de grande
aperfeiçoamento de seus mecanismos,” propõe também, o uso de formas e recortes para
interceptar parte da luz dos aparelhos móveis e manipuláveis, criando sombras sugestivas,
fachos de luz com formas ou imagens projetadas.”( FORJAZ, 2008,p. 116). O que se
aproxima dos Gobos2 usados hoje, para projetar imagens quando colocados em aparelhos
como o elipsoidal3.
Seu referencial para elaborar seus conceitos para iluminação cênica partiu da
observação da natureza. Nela está a influência do seu conceito da luz para a nova
encenação, para Appia (2017), a qualidade da luz está a qualidade da sombra que ela
projeta, a luz do dia penetra em todos os lugares e só percebemos sua direção quando
percebemos sua sombra, elas se formam pela mesma luz que penetra e se espalha pela

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Os Gobos são acessórios utilizados em projetores de iluminação como os elipsoidais para projetar
imagens, podem ser feitos de vidro pintados com alguma imagem ou aço onde a imagem é recortada, como
um negativo. Colocados em frente ao facho luminoso a imagem é projetada e forma o desenho através da
luz.
3
Elipsoidais são refletores de iluminação, também chamados de refletores de recorte, eles possuem
componentes como íris para focalizar a luz, peças laterais achatadas (facas) para recortar o facho de luz
criando formas geométricas e suporte para fixação dos Gobos.

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atmosfera. Ele aponta que não podemos reproduzir este efeito natural com todo o poder
que a natureza, uma lareira, por exemplo, produziria sombra pelo poder de sua luz, uma
sombra de beleza, é certo, mas ela não seria capaz de penetrar o ambiente criando o
claro-escuro, o que chamamos de a sombra levada, como o faz a natureza, assim a luz
produzida por este fogo não consegue o claro-escuro pelo poder de sua força. Portanto ,
para simular esta luz, devemos ter dois grupos de equipamentos, como afirma o
encenador:
É preciso então dividir a tarefa e ter de uma parte os
aparelhos encarregados de espalhar a luz, e de outra aqueles
que pela direção precisa dos seus raios provocarão as
sombras que devem nos assegurar a qualidade da
iluminação. Nós chamaremos os primeiros de “luz difusa”,
e os segundos de “luz ativa” (APPIA, 2017, p. 179).

Para o arranjo espacial de uma boa iluminação é necessário que, e Appia é enfático
em apontar, exista a luz difusa e a luz direta em conjunto. A luz difusa sozinha só existiria
para ver claramente, assim com a luz direta sozinha só poderia expressar o sobrenatural,
à noite, uma tocha, uma aparição sobrenatural. Para a existência da Luz Ativa é necessário
que as duas luzes, a difusa e a direta/ativa, sejam projetas sobre a cena simultaneamente
e com intensidades diferentes, porém esta intensidade não pode ser maior que a
necessária para formar as sombras que a luz direta produz quando atravessa os objetos de
cena. Um afastamento muito grande entre elas não nos permite ver a luz difusa, e seria
somente a luz direta, o que afetaria a representação quanto a visibilidade e/ou a
plasticidade.

O encenador tenta elaborar um sistema metodológico para criação da iluminação,


com métodos para aplicação técnica, indicando posicionamentos e modelos de aparelhos
para cada uso. No entanto, sua teoria baseada nas condições artísticas do teatro de seu
tempo, na tentativa de melhorias para a confusão da época, ele identifica os problemas
tecnológicos em relação aos aparelhos existente para a iluminação, assim como as
dificuldades dos encenadores para alcançar tecnicamente o ideal para a construção visual
do seu espetáculo.

Appia até considerava que os instrumentos disponíveis em


posições fixas nos teatros, poderiam operar na produção da
luz difusa, mas aponta a necessidade de estudos do seu
posicionamento, uma vez que a nova práxis cênica por ele
proposta descartava a disposição sucessiva de pinturas
verticais paralelas, para as quais as posições fixas dos

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instrumentos de luz foram concebidas. (TUDELLA, 2013,
pag. 580).
Assim, apontou que os equipamentos não eram suficientes, ele demandou
“pesquisas que investigassem a possibilidade de uma maior eficiência técnica dos
instrumentos, incluindo sua mobilidade e manuseio, para permitir flexibilidade no
atendimento das novas proposições dos dispositivos cenográficos [...] mudando
radicalmente a geografia da cena”. (TUDELLA, 2013, p. 580). No livro Música e
Encenação (1899), ele expõe como eram o equipamento para a luz cênica, numa tentativa
de organizar o caos que era a iluminação da época;
Sobre nossas cenas, a iluminação se faz simultaneamente
sobre quatro formas diferentes: 1 As varas levadiças que,
colocadas nas frisas, devem iluminar as telas pintadas e são
apoiadas nas coxias e sobre o chão da cena pela ribalta mais
móvel, mas cujo objetivo é o mesmo. 2 O que nós
chamamos “ribalta”, essa monstruosidade singular de
nossos teatros, encarregada de iluminar a cenografia e os
atores pela frente e por baixo. 3 Os aparelhos
completamente móveis e manuseáveis para fornecer um
foco preciso, ou diversas projeções. 4 E, por fim, a
iluminação por transparência, isto é, aquela que ressalta
certos elementos transparentes da pintura, iluminando a tela
do lado oposto ao público. O jogo harmônico de tudo isso é
evidentemente bastante complicado, até mesmo tão
complicado que é completamente impossível, e nossos
espetáculos demonstram isso. Há ali elementos
contraditórios demais para poder fornecer qualquer
harmonia.
Como observa Forjaz (2008), ele identificou bem as relações deste sistema de
iluminação do teatro de seu tempo, quanto a técnica, funções, forma e equipamentos clara
e distintamente, fez reivindicações futuras para a iluminação que possibilitaram
equipamentos melhores, especializados, às necessidades que ele defendidas para este
novo princípio da iluminação cênica. Estas melhorias sugeridas por ele, foram
empreendidas ao longo do tempo e fazem parte da realidade dos iluminadores atualmente.

Do Objetivo e Procedimentos Metodológicos.

Investigaremos os procedimentos técnicos e estéticos quanto à aplicação da


iluminação na elaboração da cena Appiana. Para isso, num primeiro momento faremos
um estudo mergulhado na obra do encenador, identificando os elementos que conceitua

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a Luz Ativa e os procedimentos técnicos de sua aplicação. Em seguida, faremos um
estudo de caso, onde analisaremos projetos de três iluminadores da atualidade,
observando neles se o escopo teórico elaborado por Appia, e identificado por nós, pode
ser verificado em seus trabalhos. Nesta etapa, o objetivo é tentar identificar qual o alcance
das influências, se elas existem ou não, que a Luz Ativa exerce sobre os trabalhos de
profissionais iluminadores da atualidade. Por fim, iremos elaborar um trabalho de dança,
com um grupo de profissionais locais, onde serão experienciados os conceitos de Appia
para a criação do projeto de iluminação.
A primeira etapa, a da consulta bibliográfica, tem como referências basilares a
obra o próprio Appia. Ele escreveu alguns textos sobre o tema, o seu pensamento sobre a
arte do espetáculo está gravado em três livros publicados entre o final do século XIX e
início do XX. O primeiro trabalho publicado e de interesse para o estudo foi La Mise-en-
scène du drame Wagnerien (1892) – A encenação do drama Wagneriano, o segundo
livro foi La Musique et la mise-en-scène (1899) – Música e Encenação, e por último o
livro L’Ouvre d’art Vivant – A Obra de Arte Viva, publicado em 1921. Neste último
trabalho ele faz uma síntese de toda sua teoria sobre as questões da reformulação da
espacialidade cênica. Por meio dessas obras buscamos compreender da melhor forma
possível, mergulhando no íntimo desses escritos, o conceito de Luz Ativa que se
concentra nos dois últimos livros. Outras fontes poderão ser consultadas na primeira
etapa com a finalidade de entender o ambiente em que estavam inseridas as questões
levantadas por Adolphe Appia a respeito da arte teatral, contudo, serão nos escritos do
encenador que iremos nos ater com maior atenção para compreensão das proposituras
sobre a Luz Ativa.
Assim, ao que se refere à luz em Appia, a investigação é uma investida para o
interior dos textos, buscando a compreensão da sua obra partindo de dentro para fora,
tendo sempre os escritos do encenador como um modelo/matriz a ser buscado e analisado.
Como se pode identificar será utilizado, para a pesquisa, o Método Matricial apresentado
por Brito e Guinsburg (2006, p.20), que assim o define: o “Método Matricial é um método
que visa desvendar e analisar a matriz criativa do artista, e que tem como objetivo o
esclarecimento do seu processo de criação [...] para isto é necessário encontrar na obra do
artista a Matriz”, que podemos dizer que é um quadro formado pelos elementos de
criação que o artista usa para gerar sua obra. Detalhando sua proposta registram que:
Ao se esclarecer cada etapa deste trabalho chegar-se à
sistematização do que pretendemos denominar de Método

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Matricial. O exame realizado principiou com a reunião dos
textos [...] com o objetivo de, a partir deles, investigar o
processo de criação efetivado [...]. o primeiro passo,
portanto, do Método Matricial, é precisar a fonte primária
do trabalho[...]. Uma vez disposto esse acervo, determinam-
se os elementos, cuja reunião constituirá a matriz, e faz-se
o levantamento dos procedimentos, objetivando esclarecer
os modos pelos quais o autor configura esses elementos
(BRITO, GUINSBURG, 2006, p.19).
Partindo do ponto bibliográfico da pesquisa, aplicando o método acima citado, e
já com conhecimento dos elementos e procedimentos da Luz Ativa, iniciaremos um
estudo de campo investigando a obra criativa e documental de três profissionais
brasileiros, onde analisaremos os planos (projetos) de iluminação, memorial descritivo, e
roteiro de operação. Nessa etapa queremos saber quais as influências do trabalho de
Appia, e se elas podem ser reconhecidas, caso sejam encontradas nos trabalhos dos
iluminadores selecionados. O procedimento de análise nesse momento da pesquisa,
levará em conta que as tecnologias que se encontram disponíveis hoje são muito
diferentes das do início do século XX. Dessa forma, consideraremos essa diferença
tecnológica, uma premissa para o estudo de caso. Analisaremos os conceitos
metodológicos e técnicos quanto as orientações de distribuição dos equipamentos, porém
desconsideraremos indicações, que porventura ocorram, de modelo e aplicação dos
refletores da época. Não seremos atentos somente às orientações técnicas, mas também,
e principalmente, aos conceitos estéticos da Luz Ativa.
De posse do material coletado, e seguindo os caminhos do Método Matricial
seguiremos conforme nos indica Brito e Guinsburg (2006, p 23) “utilizando o método
comparativo, destaca-se os elementos que o artista usa para criar sua obra, determina os
procedimentos relativos a cada um dos elementos”. Entendemos que a aplicação do
Método Matricial aos elementos que constituem as artes cênicas é um deslocamento do
mesmo, por isto nós nos propomos à uma abordagem do Método de forma mais aberta,
visto que o Método Matricial foi elaborado primeiramente para a análise investigativa no
campo literário, que aqui o transportamos para as artes da cena, com a intenção de que
ele possa contribuir para a pesquisa, a fim que encontremos aos elementos/procedimentos
do processo criativo, das matrizes criativas, dos meios construtivos da Luz Ativa na cena.
Na última fase da pesquisa mergulharemos em um processo experimental, com a
criação de um espetáculo de dança onde iremos aplicar as proposituras de Appia para a
Luz Ativa. Importante frisar, aqui, que não está no escopo e nem é nossa pretensão avaliar,

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validar ou comprovar os estudos de Adolphe Appia sobre a Luz Ativa, emitindo juízo de
valor sobre sua obra e aplicação prática, restringimo-nos a colocar os elementos e
procedimentos do método do encenador. Pois, a pesquisa é de natureza básica, por isso
nossa abordagem sobre o encenador se dará conforme nos apresenta Nascimento;
é baseada na interpretação dos fenômenos observados e no
significado que carregam, ou no significado atribuído pelo
pesquisador, dada a realidade em que os fenômenos estão
inseridos. Considera a realidade e a particularidade de cada
sujeito/objeto da pesquisa. O processo
é um descritivo [...] de observação que considera a
singularidade do sujeito e a subjetividade do fenômeno [...].
Permite generalizações de forma
moderada.”  (NASCIMENTOS, 2016, pag.03)
Por ser assim, a montagem proposta visa, a experimentação dos conceitos da Luz
Ativa, a fim de produzir elementos para a conclusão da pesquisa e gerar conhecimentos
sobre o escopo teórico dos trabalhos A Obra de Arte Viva e Música e Encenação, de
Adolphe Appia.
Nós pretendemos abordar a iluminação como objeto central na presente pesquisa,
investigando seus modos, método práticos, e principalmente, seus conceitos estéticos,
tratando-a como linguagem nos processos de construção das artes da cena, nos limites da
teorização de Adolphe Appia. Queremos compreender qual o impacto dessa teoria nos
dias de hoje.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Fazer um levantamento bibliográfico sobre a obra teórica de Appia


 Fazer um levantamento bibliográfico sobre iluminação no final do século
XIX e início do Sec. XX.
 Identificar as proposições de Appia para a Luz Ativa, no que ser refere as
especificidades técnicas e estéticas.
 Fichar o material teórico sobre a Luz Ativa
 Produzir questionário de entrevista da pesquisa.
 Escolhe profissionais iluminadores para análise de seus trabalhos quanto a
Luz Ativa.
 Iniciar redação da pesquisa,
 Buscar parceria profissionais coreógrafos e bailarinos para realizar a
trabalho de experimentação da pesquisa

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 Estabelecer o processo de trabalho da experimentação da Luz ativa, como
tema da coreografia, duração, elenco.
 Estabelecer cronograma do trabalho de experimentação.
 Apresentar o trabalho experimentação
 Fazer análise do resultado da experimentação. – Como a pesquisa está em
processo, a forma metodológica da análise ainda não está estabelecida.
 Finalizar redação da pesquisa.

CRONOGRAMA

ATIVIDADES ago. set. out. nov dez jan. fev. mar abr. Mai jun. jul. Ago
2019/2020
Leitura e pesquisa
de textos sobre X X X X X X X X X X
Adolphe Appia
Leitura e pesquisa
de textos sobre X X X X X X X X X X
iluminação cênica
Leitura sobre
história e conceitos
X X X X X X X X X X
de Iluminação e
teatro.
Fichamento do X
X X X X X X X X X
material levantado
Entrar com
documentação no X X
conselho de ética.
Estabelecer parceria com
profissionais da dança para X X
experimentação.
Revisão
X X X X
bibliográfica
Definir e contactar
profissionais
X X
iluminadores para
estudo de caso.
ATIVIDADES
ago set out nov dez jan Fev mar abr mai jun jul ago
2020/2021
Redação do X X X
primeiro capítulo

14
Inicio do estudo de caso.
E ensaio do trabalho X X X X X X
prático.
Orientação e
X X X
correções
Escritas dos
capítulos
X X X X X
subsequentes e
Orientação
Qualificação X
Escrita dos capítulos
dos estudo de caso e X X X X X
Orientação
Apresentação da
experimentação da luz X
ativa.
Orientação e
X X X
Correções
Estrega do Trabalho
X
para Banca
Defesa do Trabalho. X

REFERÊNICAS:

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