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APOSTILA – CENOGRAFIA - 2012


Prof. Dr. João Batista F. Cardoso

Bibliografia recomendada.
1. CAMARGO, Roberto Gill. Função estética da luz, Ed.TCM.
2. CARDOSO, João Batista. A Semiótica do Cenário Televisivo, Annablume/FAPESP
3. CARDODO, João Batista. Cenário Televisivo: linguagens múltiplas fragmentadas.
Annablume/FAPESP.
4. LEITE, A; GUERRA, L. Figurino: uma experiência na televisão.
5. MANTOVANI, Anna. Cenografia, Série Princípios, Editora Ática.
6. MACHADO, Arlindo. A televisão levada a sério.
7. MILLERSON, Gerard. TV Scenic Design. Oxford: Focal Press.
8. NERO, Cyro Del. Cenografia: uma breve visita. Editora Claridade.
9. NERO, Cyro Del. Máquina para os Deuses. SENAC.
10. RATTO, Gianni. Antitratado de Cenografia, ed. Senac.
11. SERRONI, J. C. Espaço Cenográfico News (www.espacocenografico.com.br)

I - HISTÓRIA DA CENOGRAFIA NO TEATRO E TV


Nunca uma estrutura arquitetônica teatral nasceu espontaneamente, o autor e a sociedade
sempre determinaram sua forma. O espaço de representação no Teatro determina a forma de
participação do público, desde a contemplativa até a integrativa. Na História do Teatro Ocidental
vem variando, determinando as várias concepções do espaço cênico e tendo sido objeto de novas
experiências no Séc. XX.

1. A CENOGRAFIA NO TEATRO
O nascimento do teatro ocidental, como Poesia Coral, ocorreu nos Jogos Dionisíacos. Na
Grécia Antiga o povo se localizava em torno das apresentações dos corais, em uma disposição
circular. Esta forma de relação onde o público está em volta da cena é a mais antiga concepção de
cena, e hoje chamamos de Arena. A mudança do espaço cênico se dá a partir do momento que
Téspis retira um dos elementos do coro para representar os personagens referidos na poesia.
Para que o corista trocasse de máscaras e indumentária para representar os vários personagens
foi construída uma barraca (skene) ao lado do espaço de representação. Com isso, o público foi
retirado de uma das tangentes da arena para que fosse instalada a Skene. Com a cena de fundo,
a arquibancada, também circular, nós temos a forma clássica do teatro grego, Semi-Arena, estava
inventado o teatro do Ocidente.
A Skene pintada deu origem a skenographia. As unidades de ação, lugar e tempo da
tragédia grega simplificaram muito o problema da cenografia, uma única pintura, como cenário,
representava todas as cenas. Não havia unidade estilística entre o pano de fundo e os objetos
construídos. Para a grande trilogia de Orestes (458 a.C.) Ésquilo exigiu que os pavilhões e os
objetos se integrassem unitariamente. O cenógrafo foi Agatarco de Samos.
Com o tempo, amplos teatros foram construídos de forma semicircular e planejados para
que não apresentassem problemas de acústica e visibilidade. As arquibancadas eram escavadas
nas encostas das colinas a céu aberto. No teatro grego a cenografia era constituída pela grande
parede de três portas que ficava no fundo do palco dando respaldo a ressonância a ação verbal
dos atores, cujo movimento básico era paralelo a ela. Elementos pintados – além dos próprios
periáctos – só estavam presentes quanto necessários à clara compreensão da ação. Também a
maquinaria, cuja tecnologia veio dos navios, somente era utilizada para situações específicas e
não para enganar ou surpreender o público.
Em Roma (séc. I a.C.) o anfiteatro, que é utilizado para disputas de lutas, é anexado ao
teatro. Com o crescimento do interesse do público pelos espetáculos nos anfiteatros, o teatro
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acaba perdendo audiência. O edifício teatral romano irá sofrer importantes modificações que irão
determinar a forma do teatro renascentista, que permanece até hoje. Ao contrário do teatro grego
que aproveitava as encostas das montanhas para escavar as arquibancadas, o teatro romano é
erguido no plano, com grandes muros. A relação do espaço entre a representação e o público
também muda. Separados agora por uma cortina e pela elevação do palco. O teatro romano se
espalha pela Península Ibérica (Espanha) e Oriente Médio (Turquia).
Na Idade Média (séc. V a séc. XIV) O prédio teatral desaparece. O teatro vai para o interior
das igrejas como forma de doutrinação, confundindo-se com a liturgia. Quando o espetáculo sai da
igreja, devido ao pouco espaço, o povo e o espetáculo se organizavam em percursos que, partindo
da idéia da via-crúcis, estruturam uma série de estações dramáticas de nível piedoso e educativo,
tudo motivado pela fé do povo. O ritual (“milagres” e “mistérios”) exige estrados de até 50 metros
de comprimento e mais 20 de profundidade, esse espaço era para atingir toda população da
época. O espaço ideal para conter esse tipo de montagem era a rua ou a praça. Os espectadores
podiam movimentar-se de um local de ação para outro, assistindo à seqüência das cenas à
medida que alteravam a própria posição.
A volta das construções de prédios teatrais acontece nos séculos XIV e XV, com o Curralito,
na Espanha, e o Elisabetano, na Inglaterra. Shakespeare apresentou ao mundo suas obras no
espaço Elisabetano. Antes das construções dos teatros, os espetáculos aconteciam nos salões
dos palácios. Revivido o teatro clássico grego, novamente, um só cenário prestava-se a todos os
diálogos. As perspectivas sucessivas tiveram o objetivo de alargar ilusoriamente a dependência do
palácio escolhida como cenário. Bramante criou o cenário em perspectiva, técnica esta que foi
apropriada das artes pictóricas do renascimento. A ópera explora ao máximo a perspectiva em
cenários com ambientes extremamente detalhados em pinturas de telões.
No renascentismo o palco foi ampliado, contando com um leve declive (para a visualização
da pintura em perspectiva), que hoje não existe mais (mas ainda são usadas as terminologias
“Alto” e “Baixo”). A platéia ficou em um nível mais baixo. A arquibancada sobe na vertical, em
andares, constituindo-se em camarotes. A cena ocupa o Palco que tem um avanço, Proscênio
(que já havia aparecido na Grécia).
A concepção que hoje chamamos de Palco Italiano, faz defrontar o espaço da
representação com o espaço do público que ficam distantes, separados pela cortina, proscênio e
fosso de orquestra, pedindo ao público uma atitude apenas contemplativa. A necessidade de ser
visto determinou a forma da maioria dos teatros. A luz na platéia era mantida acesa.
A luz elétrica muda todo o contexto da elaboração cenográfica. Em 1876, no momento em
que triunfa uma estética teatral fundada sobre a falsa-semelhança e o virtuosismo técnico, Richard
Wagner mergulha a sala no escuro (Festival de Bayreuth). Esta reforma que esperaria quatro
séculos (desde que o teatro passou para as salas fechadas da renascença) é pouco a pouco
adotada em toda a Europa. Quando Wagner separa a platéia do espetáculo, a ribalta torna-se uma
fronteira reforçando a ação restritiva do quadro cênico. A extinção da sala correspondia a um
desejo do ilusionismo. O teatro deixa de ser um imenso salão da sociedade burguesa ao deixar de
exibir a platéia.
A cenografia no plano interpretativo tem seu ponto de partida em Craig e Appia. O suíço
Adolphe Appia foi o primeiro a trabalhar a questão da iluminação elétrica e um dos principais
representantes da corrente simbolista, propondo um teatro de atmosfera e sugestão, onde a luz
desempenha um papel fundamental. O diretor e cenógrafo inglês Edward Gordon Craig, da linha
antinaturalista e a favor de um teatro simbólico e atmosférico, valorizava os gestos simbólicos, a
não imitação da natureza. Buscava a harmonia perfeita entre texto, cenário, ator, indumentária e
luz. Craig idealiza uma cenografia composta de sistemas não figurativos de formas e volumes, no
qual a iluminação contribui para multiplicar ainda mais as possibilidades de transformação da
imagem cênica. A preocupação dos artistas em relação ao espaço se identifica num jogo de
volumes e de planos onde a tridimensionalidade não é mais fictícia (como a cenografia operística),
mas concreta, aceitando todo tipo de movimento e de composição das personagens, recebendo e
aceitando luz como elemento que complementa dramaticamente a concepção do espetáculo.
O oitocentocentismo também é marcado pelo academicismo (Théâtre Libre, 1887) que
busca o realismo fotográfico até as primeiras duas décadas do séc. XX. Retratar objetivamente e
descrever exatamente os fatos, são os objetivos do artista naturalista. André Antoine chegou a
colocar em cena, para um espetáculo que apresentava um texto de Zola, um boi de verdade
esquartejado.
Em meados do século XX o teatro à italiana é questionado, surgem novas propostas que se
multiplicam: Antonin Artaud (Teatro da Crueldade; O teatro e seu duplo) sistematiza a bases do
que considera um teatro novo, em que tudo se espetaculariza, figurinos, cenários, gestos, etc.;
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Stanislavsky propõe um teatro que tenha alguma unidade, que diga alguma coisa, que apresente
uma coerência fundamental. Este teatro é, portanto, adequado ao drama psicológico, mas não à
formulação surrealista do teatro que se desenvolveria a partir de Artaud, onde se perdem a
coerência e a verossimilhança, menos ainda com o teatro de Brecht, que propõe um sujeito
totalmente novo; Brecht se opõe totalmente ao Aristotelismo, propondo o distanciamento do
espectador em relação ao palco. Para Brecht o palco se transforma em tribuna. É um teatro de
forte coloração marxista, didático; Piscator acredita que o teatro tem uma missão revolucionária,
mostrar a luta de classes, o espetáculo deve ser pedagógico. Para um novo teatro uma nova
cenografia. Tudo está em função do objetivo final, todos os elementos são determinados em
função da compreensão do público. Piscator vê uma relação entre revolução técnica e social, e
evoluciona a cenografia incluindo projeção cinematográfica. O cenário, ao mesmo tempo em que é
um elemento dramático, mostra uma situação social, ensina, tem uma função didática. Piscator
propõe, junto com Walter Gropius (1926), o Teatro Total; Grotowski (Em busca de um teatro
pobre) impõe o conceito de interferência no espaço, onde público e atores dividem o mesmo
espaço; Peter Brook interfere na arquitetura cênica também. A cada montagem, obriga o edifício a
passar por reformas e adaptações. A partir dos anos 60 temos a fragmentação do teatro. O teatro
contemporâneo é livre. O edifício teatral, de uma forma ou de outra, no entanto, não tende ao
desaparecimento.

2. A CENOGRAFIA MODERNA NO BRASIL


Com direção do polonês Zibgniew Ziembinski (1908-1978) acontece, em 1942, a montagem
de Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues (1912-1980). A cenografia do espetáculo foi de Tomás
Santa Rosa (1909-1956). Antes de Vestido de Noiva, o cenário se resumia, de forma geral, a
pintura dos telões. Santa Rosa inova quando ocupa as três dimensões do palco com um cenário
tridimensional e incorpora a luz à sua cenografia.
Nesse mesmo período, com o surgimento em São Paulo do Teatro Brasileiro de Comédia
(TBC, 1948), chegam aos palcos brasileiros alguns dos grandes nomes da cenografia européia –
entre eles, Gianni Ratto, Bassaro Vaccarini e Aldo Calvo.

3. A CENOGRAFIA NOS PRIMEIROS ANOS DA TELEVISÃO BRASILEIRA


Quando surgiu a primeira emissora de televisão, a TV Tupi-Difusora (1950), o público estava
totalmente inserido na “era do rádio”. Após fazer uso dos conhecimentos vindos do rádio, a TV foi
retirar ensinamentos em outros sistemas: como o circo, o teatro de revista e o cinema.
No que se refere especificamente a estrutura do cenário televisivo, podemos afirmar que,
em seus primeiros anos, as técnicas e materiais utilizados na construção dos cenários foram
adquiridos no teatro, já o uso de ambientes naturais como cenário veio do cinema e das condições
proporcionadas pelas tecnologias de edição.
Como relata Walter Avancini, “havia duas câmeras pesadíssimas, além da limitação da
lente, do espaço do estúdio, da iluminação, que determinavam um tipo de linguagem (...). Para a
ficção havia espaços reduzidos, transformando a coisa num picadeiro ou num palco de teatro. (...)
começou-se a formar uma televisão brasileira, com as nossas dificuldades e deficiências” (apud
Marcondes Filho).
Em suas primeiras aparições, o cenário resumia-se à composição de poucos elementos
cênicos, na maioria das vezes, uma tapadeira ao fundo com o logotipo do anunciante (que
freqüentemente dava nome ao programa – como: Gincana Kibon, Sabatina Maizena e Teatrinho
Trol, entre outros). Eram também utilizados nesses cenários: cortinas, cicloramas e algumas
unidades modulares.
O cenário na teledramaturgia desse período era quase sempre improvisado. “Um salão do
século XVII podia parecer adereçado com móveis coloniais brasileiros” (Alencar). O cenógrafo (ou,
“Supervisor de Estúdio”) era uma espécie de “faz-tudo”: ocupava-se do desenho; construção;
mobiliário; contra-regra etc. Não havia um departamento que se ocupasse especificamente do
cenário, maquiagem ou figurino. Os atores, na maior parte das vezes, traziam seus figurinos, e
quando se tratava de peças históricas, as roupas eram alugadas (Leite e Guerra). A
especialização de funções e a criação de departamentos (como o de figurino e o de cenografia),
só se deram com a chegada das TVs Excelsior e Globo.
Entre os mais importantes cenógrafos na fase de pioneirismo na televisão, destacam-se:
Pernambuco de Oliveira (1922-1983), que participou ativamente da implantação da televisão no
Brasil – trabalhando como cenógrafo e figurinista na TV Tupi; Campello Neto, que iniciou na TV
Continental, Rio de Janeiro, em 1959, e passou pelas TVs Paulista, Cultura e Bandeirantes; e Cyro
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Del Nero, responsável pela implantação dos departamentos de artes e cenografia na TV Excelsior
e TV Globo.
Os programas do Chacrinha (que iniciam na TV Tupi em 1958) são um marco na história da
cenografia na televisão brasileira. No palco do Chacrinha as pessoas, indumentária e cenário se
confundem, nunca se separam. “Daí a impressão de festa contínua que transmite” (Pignatari).

4. O VIDEOTAPE E O CENÁRIO PROFISSIONAL


O cinema chega definitivamente à televisão com Vigilante Rodoviário (TV Tupi, 1961).
Produzida pela empresa cinematográfica de Alfredo Palácios, a série é a primeira a ser filmada no
Brasil.
Em 1959 e 1960, pela TV Tupi, e em 1960, pela TV Rio, foram realizadas as primeiras
experiências com o videotape (VT). Essa nova tecnologia foi utilizada pela TV Excelsior para
gravar, em 1966, os capítulos de 2-5499 Ocupado, a primeira novela diária da televisão brasileira.
“Com os recursos possibilitados pelos editores eletrônicos e pelas câmeras portáteis, (a televisão)
vai perdendo amarras nos (anos) 60, adquirindo um ritmo mais próximo ao cinema” (Ortiz).
Em 1966, a TV Excelsior ergueu em São Bernardo do Campo a primeira cidade cenográfica
brasileira. A obra, desenvolvida para a telenovela Redenção – que durou cerca de 2 anos, e teve
596 capítulos –, contava com os seguintes ambientes: “a estação ferroviária, as salas da prefeitura
e da delegacia de polícia, o consultório, a butique da Dona Helena (Geórgia Gomide), o
confessionário do Padre João (Edmundo Lopes) e o botequim do marginal Mária (Newton Prado)”
(Alencar).
No que se refere à estruturação do departamento de cenografia nos anos de implantação da
TV Cultura, Armando Ferrara, chefe do departamento em 1969, dá o seguinte depoimento: “Antes
da estréia, nós passamos de seis a oito meses formando conceitos, discutindo o caminho que
deveria tomar uma TV educativa (...). Lá estavam profissionais das mais diferentes áreas:
desenho, fotografia, contra-regra, costura, maquiagem... Era um grande desafio montar o
departamento de cenografia” (www.tvcultura.com.br/30anos).

5. O SURGIMENTO DA TV GLOBO E AS NOVAS FORMAS DE CENÁRIOS


Com o nascimento da TV Globo (1965), surge no Brasil uma nova forma de gestão das
empresas de telecomunicação: “Diferentemente de outras emissoras da época, que tinham o seu
corpo diretivo formado por gente do meio cultural, a TV Globo colocou a sua frente um grupo de
homens que mantinham relações estreitas com o mercado. O novo modelo empresarial refletia-se
na parte comercial e produtiva, (...) em fluxo de produção, em especialização de setores como
cenografia e figurinos” (Borelli e Priolli).
Observando a história das telenovelas na TV Globo, podemos constatar que, desde as
primeiras, é dada uma grande importância ao cenário. Em Eu Compro essa Mulher (1966), um dos
destaques era o cenário de um navio construído no terraço da própria emissora. Contudo, o
experimentalismo dos primórdios da TV Globo, em muito ainda se assemelhava às técnicas
empregadas no teatro, “segundo a atriz Yoná Magalhães, nas encenações de tempestade em alto-
mar, os contra-regras sacudiam o ‘navio’ e jogavam água sobre os atores” (Dicionário da TV
Globo).
As necessidades criadas pela dramaturgia, exigiram que os produtores procurassem, fora
da televisão, recursos e elementos que pudessem atender aos apelos cenográficos. Em O Sheik
de Agadir (1966-1967), “as tomadas do deserto do Saara foram feitas nas dunas na Restinga da
Marambaia, no litoral fluminense” (Dicionário da TV Globo).
A dramaturgia da época – que fazia muito uso de referências de ambientes externos de
outros países – levou a TV Globo a iniciar a produção de cenários mais complexos: para a novela
O Homem Proibido (1967-1968), os cenógrafos chegaram a construir, no terraço da emissora,
ruas típicas da Índia; em A Cabana do Pai Tomás (1969-1970), para situar a trama que se passava
no sul dos Estados Unidos, na época da Guerra de Secessão, “a produção incluía o congelamento
artificial de um rio e a reconstituição de uma embarcação do século XIX” (Dicionário da TV Globo).
Para essa última, em particular, a emissora chegou a construir dois novos estúdios especialmente
para as gravações. A TV Globo mostrava aí o interesse em investir no gênero, e a cenografia,
indiretamente, passaria a usufruir dessa situação.
Em 1968, a TV Tupi, com Beto Rockefeller, irá renovar a linguagem das telenovelas. Essa
novela tornou-se um marco na televisão por utilizar referência do cotidiano das pessoas, e
ambientações cenográficas naturais.
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Além da telenovela, outros gêneros televisivos irão contribuir muito para a evolução da
cenografia na televisão. As distintas concepções de configuração do espaço no telejornalismo,
somadas às novas tecnologias incorporadas pelo sistema – como o chroma-key e a computação
gráfica –, tornaram o gênero menos radiofônico que em sua origem. Do simples fundo com logo –
do patrocinador, da emissora ou do programa – em tons de cinzas, até as amplas salas de
redação – que predominam hoje na grande maioria de programas do gênero –, o cenário adquiriu
novas formas, passando a fazer uso também de espaços naturais e virtuais. O humor também
colabora a partir do momento que passa a fazer uso recursos técnicos utilizados, até então, pelo
teatro. O programa Balança mas não cai (TV Globo, 1968-1972; 1982), foi o primeiro a utilizar
palco giratório. Enquanto uma cena era exibida ao vivo, os cenários das demais eram montados
nos outros três espaços.

6. A COR NA TELEVISÃO E AS GRANDES PRODUÇÕES GLOBAIS


Em 1970, a TV Globo monta a sua primeira cidade cenográfica (Coroado, para a novela
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Irmãos Coragem). Em uma área de 5.000m (na Barra da Tijuca, RJ), a cidade de Coroado
contava com oito ruas e diversas edificações, como: praças, prefeitura, delegacia, igreja, pensão e
farmácia (Dicionário da TV Globo).
Em 1973, já com alguma experiência na criação e construção de cidades cenográficas, foi
construída em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro, a cidade fictícia de Vila da Prata, para a
novela Cavalo de Aço. Nesse momento, a cor já fazia parte da televisão brasileira. A tecnologia
empregada para captação e recepção da imagem colorida acrescentaria um novo ingrediente à
composição cenográfica.
A primeira transmissão oficial em cores ocorreu em 19 de fevereiro de 1972, quando foi
transmitida pela TV Record a Festa da Uva, em Caxias do Sul.
No que se refere ao processo de produção, a televisão colorida trouxe aos profissionais
novas possibilidades e grandes desafios. Era preciso repensar o cenário, figurino, maquiagem e
luz. Antes do advento da cor na televisão, raramente um cenário era colorido. As tapadeiras e
praticáveis eram pintadas, em sua maioria, em tons de cinza, branco, marrom ou bege. Segundo
José Dias, foi o cenógrafo Pernambuco de Oliveira um dos primeiros no Brasil que estudou e
aplicou a equivalência nas cores para as matizes de cinza.
O Bem-Amado foi a primeira novela da televisão brasileira gravada em cores. No início,
houve dificuldades técnicas no uso dos novos equipamentos e no ajuste das tonalidades. Até
mesmo a brancura excessiva da pele saturava no vídeo. Os cenários (de Paulo Dunlop) e os
figurinos (de Carlos Gil) alternam cores fortes e exuberantes com tons suaves. Segundo Daniel
Filho, em O Bem Amado “os cenários eram verdadeiras alegorias carnavalescas”. Até mesmo nos
figurinos, os excessos cromáticos eram percebidos. “Paulo Gracindo disse que subiu ao palanque
de Sucupira vestindo um terno de cetim verde e camisa cor-de-rosa, embora o guarda-roupa de
Odorico também contasse com peças de cores mais discretas” (Dicionário da TV Globo).
Além da produção de cidades cenográficas que já se tornava um hábito na emissora, as
telenovelas passaram a contar com determinados recursos tecnológicos que possibilitaram ainda
maior mobilidade na gravação de cenas externas. Em Carinhoso (1973-1974), foram utilizadas,
pela primeira vez, câmeras portáteis para a gravação de cenas externas em Nova York. Com o
avanço técnico, os ambientes naturais puderam se tornar ainda mais cenográficos. Segundo
Daniel Filho, os recursos disponíveis levaram a TV Globo a buscar uma estética mais realista em
suas produções: “Na primeira versão de Pecado Capital a proposta foi assumir uma brasilidade
bem realista”.
Na década de 1970, já temos a consolidação de uma linguagem televisiva, e o cenário,
como signo cenográfico, já começa a adquirir, em cada gênero, características próprias,
libertando-se das referências vindas, a princípio, dos sistemas que o antecederam. Essa evolução
da linguagem cenográfica na televisão se deve, em muito, ao chamado “Padrão Globo de
Qualidade”.

7. O PADRÃO GLOBO DE QUALIDADE


O início da década de 1980 marca a consolidação do Padrão Globo de Qualidade. Apesar
do padrão globo não ser considerado por muitos críticos como positivo, a partir do momento que
não tem como objetivo apresentar propostas inovadoras em termos de programação, não há como
negar que a busca da TV Globo por um “padrão de qualidade” impulsionou em muito a pesquisa
de novos formatos e, conseqüentemente, de uma linguagem cenográfica específica para a
televisão.
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O marco divisório da dramaturgia na televisão aconteceu nesse período com a produção de
Morte e Vida Severina (1981) – primeira peça de teledramaturgia gravada totalmente em locação
(Caiacó, Rio Grande do Norte) –, que acabou também sendo um marco na cenografia. O
programa ganhou o prêmio Emmy do International Council Sciences.
Também no início da década de 1980, motivada pelo sucesso dos seriados do final da
década de 1970 – Malú Mulher, Carga Pesada e Plantão de Polícia –, e percebendo que ainda
havia novas formas de explorar o gênero, a TV Globo dará início, com Lampião e Maria Bonita, a
suas minisséries, gênero que irá explorar ao máximo os recursos cinematográficos na cenografia
televisiva. Contudo, ainda que especule enormemente o realismo cinematográfico, a cenografia,
em grande parte das vezes, não se vê obrigada, ao contrário do que muitos pensam, a reproduzir
com fidelidade histórica os ambientes arquitetônicos e naturais. Em A Casa das Sete Mulheres
(2003), por exemplo, “tanto a cenografia quanto o figurino e a direção de arte não tiveram uma
preocupação rigorosa de reproduzir a época da minissérie (...). Tudo foi feito para atender à
direção, que priorizou o tom mágico” (Dicionário da TV Globo).
Na década de 1980 surge a primeira geração de produtores, diretores, atores, cenógrafos
etc. formados pela própria televisão.
Fazendo uso dessa mão-de-obra, no final da década de 1980, a TV Manchete (1983-1999)
começou a produzir novelas e minisséries. A novela Pantanal, que estreou em 21 de março de
1990, torna-se uma referência para a teledramaturgia nacional. O ambiente natural, então em
grandes planos gerais, rouba a cena. A luz, sob a direção geral de Jaime Monjardim, torna-se
também elemento cenográfico.
Os programas de humor também mostram como o cenário pode funcionar como elemento
de estruturação narrativa. Em Chico City: “Nos dois primeiros blocos, o cenário era a cervejaria
Chopp Chopp Show, onde os mais diferentes personagens circulavam. O terceiro bloco era
ocupado pela ‘Escolinha do Professor Raimundo’, a mais antiga criação do humorista (...). O
quarto e quinto blocos tinham como cenário o Hospital. O último bloco era a Luarada, uma grande
festa organizada no quintal da casa de Pantaleão” (Dicionário da TV Globo). Os distintos cenários,
além de aflorarem ao máximo a personalidade das personagens, também serviam como fio
condutor da narrativa, possibilitando ao público localizar-se dentro do programa.
Os programas de auditório (de variedades, jogos, músicas, entrevistas etc.), herdeiros
diretos do rádio, também colaboraram, ainda que tão-somente em termos técnicos, com a
evolução do cenário televisivo. Grande parte desse tipo de programa, em especial os de
variedades, apresenta mudanças pouco significativas no que se refere à linguagem da cenografia
televisiva. Silvio Santos ditou um modelo de programa, desde 1962, que predomina até os dias de
hoje. Presa ao formato, a televisão inova, no máximo, na criação de novos quadros de
entretenimento dentro dos programas. O cenário, por sua vez, apresenta-se, na maioria das vezes,
como signo utilitário, principalmente quando há disputa entre os participantes. E com relação à
estética, busca tão-somente apresentar o programa – através das formas, cores, luzes e
movimentos – como um grande espetáculo. O programa Pânico na TV (RedeTV, 2003) – assim
como Perdidos na Noite, que lançou Fausto Silva como apresentador – se apóia na cenografia
precária, opondo-se ao “padrão de qualidade” para passar a imagem irreverente do programa.

8. OS GRANDES COMPLEXOS DE PRODUÇÕES E OS RECURSOS DA INFORMÁTICA


Com um caráter bastante experimental, a MTV (1990) irá explorar novas texturas e padrões
na cenografia televisiva, considerados, anteriormente, impensáveis para o sistema. Geralmente,
os cenários da MTV são marcados pela originalidade no uso de texturas, cores e formas que não
são muito comuns na televisão. Os diferentes efeitos matéricos nas paredes do cenário do
programa Meninas Venenos (2005) – que sugerem, simultaneamente, qualidades distintas como
maciez, aspereza e metalicidade; o grafismo em xadrez irregular no piso do programa Quebra
Case (2006) – que deforma o espaço impedindo qualquer noção de profundidade; as cores
saturadas de Ponto Pê (2007) – que subvertem todas as normas estéticas do meio. São apenas
alguns dos exemplos da “estética MTV”, que também pode ser observada na indumentária dos
apresentadores e até mesmo no aspecto das vinhetas da emissora ou nos comerciais dos
anunciantes. O cenário, libertando-se das limitações do quadro videográfico, acaba servindo como
modelo para outras emissoras.
A TV Globo inaugura, em 1995, no Rio de Janeiro, o maior centro de produção televisual da
América Latina, o Projac, que, em 1999, passaria a ser chamado de Central Globo de Produções
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(CGP). O Projac, em sua origem, já contava com 1.300.000m destinados aos estúdios, fábricas
de cenários, fábricas de figurinos, cidades cenográficas, centros de pós-produção, galpões de
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acervo, além do complexo administrativo. A TVSBT, buscando se manter na segunda posição no
mercado, lança, logo a seguir, o Complexo Anhanguera, em São Paulo. Apesar de um pouco mais
modesto em termos de dimensões, o complexo Anhanguera, assim como o Projac, torna-se um
dos grandes centros produtores de cenografia para televisão.
Ainda em meados da década de 1990, os recursos vindos da computação gráfica,
amplamente explorados na automação dos trabalhos desde a década de 1970, e depois no próprio
processamento da imagem (ver Machado 1995), passam a ser utilizados no processo de
elaboração da cenografia. Quem é Você, de 1996, “foi a primeira novela a ter todos os cenários
modelados por computação gráfica: 15 interiores e 82 ambientes (...). Desta forma, era possível
visualizar os espaços cênicos antes de construir os cenários, permitindo maior precisão de
cálculos” (Dicionário da TV Globo).
Em 29 de janeiro de 1999, foi inaugurada, em São Paulo, a mais moderna sede de
telejornalismo do Brasil, com tecnologia totalmente digital que, na ocasião, ocupava o espaço de
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16.500m . O telejornalismo na TV Globo, em seus diversos formatos, possibilitou à cenografia
experimentar do uso de ambientes naturais (como as redações do Jornal Nacional, Jornal da
Globo etc.) a espaços completamente virtuais (como nos programas Globo Repórter e Fantástico).

9. O CENÁRIO VIRTUAL E A IMAGEM DE ALTA DEFINIÇÃO


Os recursos da computação gráfica, a princípio utilizados apenas no processo de
elaboração, acabam sendo, em pouco tempo, incorporados pela produção. Em O Quinto dos
Infernos (2002), foram reproduzidos, em computação gráfica, os palácios de Madri, Que luz e
Mafra. “Trata-se agora de um realismo conceptual” (Machado), as imagens vistas nos monitores
de televisão em casa não são mais compartilhadas pelas pessoas que estão no local no momento
da gravação. Estamos lidando agora com elementos de um novo tipo de realidade, gerados
sinteticamente. A arquitetura do cenário virtual tem maiores possibilidades de evolução rítmica,
tanto no espaço como no tempo.
A tecnologia empregada na confecção de cenários virtuais vem das indústrias que
desenvolvem sistemas de treinamento e simuladores militares. Os sistemas de cenários virtuais
combinam múltiplas tecnologias, entre elas o chroma-key. Na tecnologia aplicada ao cenário
virtual, diferente do chroma-key convencional, o background acompanha os movimentos das
câmeras permitindo até mesmo a simulação de uma panorâmica de 360º. O cenário virtual, nesse
caso, distancia-se do chroma-key por aproximar-se do campo da arquitetura.
As tecnologias disponibilizadas hoje, para o desenvolvimento de cenários virtuais,
possibilitam: a liberdade total da quantidade e dos movimentos de câmeras; o uso de elementos
tridimensionais em cena; a evolução desses elementos e sua “interação” com o apresentador; a
incidência de luz em movimento sobre estes mesmos elementos; e a projeção de sombras e
reflexos do apresentador e dos elementos virtuais. Esses efeitos, que antes eram parte do cenário,
foram crescendo até os dias de hoje e, em alguns programas, são quase a totalidade, senão, o
cenário por inteiro.
Junto às novidades apresentadas pelo cenário virtual, a televisão vive profundas mudanças
com o surgimento da TV de alta definição. Desde 1989, no Japão, diversas experiências em HDTV
vêm sendo realizadas no mundo. A formatação da imagem HDTV é de 1080 linhas verticais ativas
por 1920 linhas horizontais de resolução. O resultado é uma tela 30% maior no tamanho horizontal
que as dos aparelhos atuais, que passa da proporção de 4:3 para 16:9. A maior quantidade de
linhas permitirá uma imagem de melhor qualidade, mais nítida. No Brasil, a TV de alta definição
chega junto com a implantação da TV digital, que segue o padrão japonês.
“Duas Caras”, da TV Globo, e “Dance, Dance, Dance”, da Band, são as primeiras novelas
em alta definição na TV brasileira. Com até seis vezes mais definição que o sistema convencional,
detalhes como nuances de cores ou falhas nos cenários, antes imperceptíveis, agora podem ser
vistos pelos espectadores. Com isso, os cuidados com iluminação, cenário, figurino e maquiagem
passam a ser dobrados. Alguns programas para pós-produção, como o baselight (software que
modela uma espécie de máscara no ator diminuindo as rugas e imperfeições), já colaboram no
tratamento da imagem para os padrões de alta definição.

II – O CENÁRIO E AS FORMAS DE REPRESENTAÇÃO


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A linguagem televisiva é uma mistura de diversos tipos de sistemas clássicos (literatura,
rádio, folhetim, cinema etc.) combinadas com sistemas que surgem com as inovações
tecnológicas.
Todo programa de televisão é um sistema que se constitui de signos de diferentes tipos-
visuais, verbais e sonoros. Cada programa constitui um enunciado singular que é produzido com
uma intencionalidade com vistas a atingir um público especifico. Dessa forma, cada enunciado
utiliza tipos específicos de recursos da televisão, faz uso de certos recursos cenográficos
determinados em função das especificidades do gênero e das características do público.

1. O CENÁRIO
Cenografia é o conjunto de manifestações visuais que se correlacionam de forma
organizada em um determinado espaço cênico (as luzes, com suas cores, movimentos,
intensidades etc.; o corpo dos atores, com seus gestos, expressões, movimentos etc.; a
indumentária, os adereços, a maquiagem etc.; a topologia do espaço cênico, delimitada por
cortinas, objetos, cenários, luzes, movimentos dos atores etc.; os elementos de configuração do
cenário, como as estruturas arquitetônicas, os mobiliários, as pinturas, as projeções etc.), que, na
articulação sincrética estabelecida com os outros códigos da encenação (sonoros: nas músicas,
cantos, falas dos atores, ruídos etc.; e verbais: no texto oral ou na escrita), possibilita ao
espetáculo transmitir uma mensagem.
Para Clóvis Garcia, “Cenografia é o tratamento do espaço cênico. O cenário é o que se
coloca nesse espaço”. Nesse sentido, o cenário é um elemento de composição da cenografia,
uma representação plástica que delimita o espaço de encenação, compondo, com os outros
elementos cenográficos, o espaço cênico. Dessa forma, esse elemento, quando somado aos
demais signos cenográficos, aos signos verbais e aos sonoros, participa da encenação como
elemento significante. Para Décio Pignatari, o cenário é um signo que “participa também da ação
narrativa, que não é apenas algo externo a ação, decorativamente, mas que se identifica até com
o estado psicológico das personagens ou o ambiente da cena”.
Funções do cenário:
(1) cooperar com a configuração do espaço cênico;
(2) representar os espaços e tempos específicos onde se encontram as personagens
e/ou apresentadores;
(3) auxiliar na evolução do ator/apresentador em cena;
(4) atuar como elemento de significação que, na articulação sincrética com os outros
elementos da cena, transmite ao telespectador uma mensagem.

2. O ESPAÇO DO CENÁRIO
Qualquer encenação encontra-se em algum tempo (passado, presente ou futuro),
determinado ou não, e em algum espaço:
(1) com limites físicos definidos: uma cidade, uma rua, uma casa, uma sala etc.;
(2) existente no mundo externo: localizado em um determinado país, região etc.;
(3) fictício, que existe tão-somente na imaginação: um planeta desconhecido etc.;
(4) em algum espaço abstrato, indefinido: o interior de uma mente, do coração etc.

O cenário é um dos elementos que irá configurar o espaço em que se move o ator e o
espaço/tempo em que ocorre a narrativa. Através da configuração do espaço cênico o cenário
deve auxiliar o trabalho do ator, tanto em sua fala como em seus gestos e movimentos corpóreos.
Com isso, será também responsável pela inserção das personagens no espaço e tempo do texto.
Com relação à sua função como elemento significante, a questão principal é que o cenário deve
comunicar alguma coisa específica, que esteja imbricada entre as falas do texto, ou seja, alguma
coisa que todos os outros elementos da cena buscam comunicar.
Independente da sua forma de representação, independente de seu papel dentro da
encenação, independente do sistema onde esteja inserido, a partir do momento em que faça parte
de uma cena, essa forma de representação deve ser reconhecida como cenário.

3. REALIDADE E FICÇÃO NO ESPAÇO TELEVISIVO


Na relação com a realidade, podemos encontrar três tipos de discursos televisivos (Orza):
(1) discursos que extraem e processam informação da realidade;
(2) invenções baseadas na realidade, ou seja, ficções realistas e possíveis;
(3) invenções sem vínculo com o real, ficções fantásticas e impossíveis.
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Estes discursos encontram-se sempre nos campos de referência interno e externo:


(1) Campo de referência interno: estabelece um sistema de relações entre elementos e
significados do texto, onde alguns dos referentes desse texto (nome de pessoas, tempo,
lugares e fatos) são exclusivos dele e não pretendem uma existência externa; Está ligado
diretamente a criação de um texto fictício. Os elementos de configuração do texto não são
obrigatoriamente determinados em função de referências naturais.
(2) Campo de referência externo: as referências são exteriores ao texto, aludem ao
mundo físico. No campo de referência externo, o texto televisivo é resultado da captação de
imagens e sons de acontecimentos que possuem existência própria, que independem da
produção do evento televisivo para que aconteçam.

Apesar de a ficção construir sua própria realidade, isto não exclui a possibilidade de a ficção
audiovisual recorrer com freqüência a elementos externos (pessoas, objetos, fatos). O mesmo
ocorre no sentido inverso. A partir dos campos de referências interno e externo, podemos agrupar
o cenário televisivo em dois tipos específicos:
(1) como Espaços Naturais – interiores de edificações ou paisagens urbanas, rurais,
litorâneas etc., que existem independentemente da produção televisiva –, chamados de
locações;
(2) Espaços Construídos – ambiente construído especialmente para ser espaço de uma
determinada encenação –, na maioria das vezes em estúdios e cidades cenográficas.

Podemos encontrar, tanto em cenários que fazem uso de espaços naturais como em
cenários que fazem uso de espaços construídos, a autorreferencialidade (que remete a si mesmo)
e heterorreferencialidade (que remete ao mundo natural). Ou seja, um salão de baile em uma
minissérie, construída em um estúdio de televisão, apenas com três paredes e sem teto, com
portas, janelas e escadas falsas, pode remeter a algum salão existente, ou que tenha existido,
como pode encerrar-se em sua própria existência.

4. NATURALISMO E SIMBOLISMO
1. Cenário Realista (naturalista): Cenário construído com todos os elementos como
eles realmente são. Ao lado de uma cuidadosa execução acadêmica, pode estar uma
total ausência de criatividade;
2. Cenário Sugestivo (simbolista): Delineamento pictórico relativamente abstrato,
objetos simbólicos. O jogo de luz desempenha papel relevante. A proposta visual da
encenação deve sugerir e não impor, abrindo espaço para a criatividade de quem está
assistindo.

5. REPRESENTAÇÃO: DENOTAÇÃO E CONOTAÇÃO


O cenário é uma representação, e por mais que se queira, dificilmente haverá uma
representação perfeita da realidade. Há uma escala gradativa que permite representações mais
próximas ou mais distantes do objeto real que se procura imitar, há graus de analogia.
Uma representação da realidade pode conter profusão de detalhes ou não. Há certas
representações que mostram a realidade de forma bastante sintética, recorrendo só aos
elementos mais importantes para a comunicação; assim como há representações extremamente
detalhistas. Nos dois casos, o que se tem é imitação, por síntese ou profusão. No entanto,
conforme a época e as convenções de representação vigentes, estabelece-se uma das duas
tendências como modelo de representação (é claro que há outras possibilidades entre as duas).
Convém não confundir “modos de representação” com “níveis de significação”. Uma
coisa é representar (“estar em lugar de”, “fazer o papel de”), por meios figurativos ou não; outra
coisa é entender qual é a finalidade de tal representação em contextos mais amplos.
O espectador não está preocupado com o “modo de representação” da realidade. O que
interessa a ele é entender a peça, seja de forma realista ou não.
O processo de entendimento dá-se em dois níveis: denotação e conotação. Um luar pode
ser representado de forma semelhante ou não, mas, desde que seja entendido como “luar”
(denotativo). O que este luar quer representar (medo, morte, saudade, amor, etc.) é outro
problema (conotativo).

6. ESPAÇOS NATURAIS – A LOCAÇÃO


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Uma locação, para que seja um cenário, deve sofrer a interferência daqueles que estão
produzindo o texto da narrativa: o cenógrafo; o diretor de arte; o diretor geral. Essas interferências
não passam apenas por mudanças físicas nas locações adotadas. As próprias tomadas,
enquadramentos e movimentos de câmeras, edição de imagens, assim como o próprio contexto,
faz com o que o local seja apresentado de tal forma que contribua com o texto montado.
A representação, em especial as locações externas, não é jamais uma cópia inocente da
realidade, mas a escolha de um espaço, reconstruído para dar conta de uma visão particular.
Para que possam atuar de forma simbólica, é necessário que tenhamos um pré-conceito do
ambiente. Nas narrativas seriadas (novelas, minisséries etc.), por exemplo, uma locação pode
atuar de forma simbólica, a partir do momento que são estabelecidos certos vínculos com o texto
da dramaturgia. Já no caso do telejornal, como este espaço (a redação) está, no momento da
apresentação do programa, sendo utilizado em sua forma natural pelos profissionais envolvidos na
produção, é difícil querer manter o controle do espaço como elemento simbólico. Sendo assim, à
redação só restará funcionar como elemento simbólico na identificação de momentos específicos
do programa (como nas chamadas para os comerciais, na abertura ou, então, no fechamento do
programa), ainda que este simbolismo esteja mais relacionado aos movimentos de câmera e
enquadramentos que ao próprio cenário. Ainda assim, essa convenção, e a participação do
cenário neste sistema, é fundamental para que o público possa acompanhar o andamento do
programa. É claro que, nesses momentos, para que consiga atuar como forma simbólica, o
cenário ainda dependerá das relações de significado que estabelecerá com os outros elementos
da cena, com a música, o texto, o contexto etc.

7. TIPOLOGIAS E TOPOLOGIAS
Tipologias cenográficas - o agrupamento de características semelhantes entre
cenografias de diferentes eventos;
Topologia – delineação do espaço físico.

O cenário se configura, de forma geral, a partir de duas perspectivas complementares: (1) a


perspectiva sintático estilística (atenta as formas que o cenário adquire no espaço televisivo);
(2) e a perspectiva semântica (atenta aos significados do espaço televisivo) (Casetti e Chio).
No que se refere à perspectiva “sintáctico estilística”, para Eugeni podemos determinar as
diferentes configurações estruturais do espaço televisivo em função da:
(1) topologia do cenário: onde teremos um espaço central que pode ser único –
como em certos programas de entrevistas; dividido em módulos – como nas
telenovelas onde diferentes ambientes constituem o espaço/tempo de ação; externos
que se conectam ao central – no caso de telejornais, onde a equipe de comentaristas
se apresenta em diferentes espaços que entram em conexão com o espaço dos
apresentadores; ou, ainda, externos de natureza diferente do central – como nas
conexões entre estúdio e locações reais;
(2) modalidade de conexão entre estes módulos espaciais: como a inserção de
um espaço em outro ou a justaposição de espaços;
(3) dinâmica: onde a transformação do cenário pode acontecer diante da platéia e
das câmeras.

Já a definição do estilo e significados (perspectiva semântica) do cenário se deve à:


(1) disposição dos elementos arquitetônicos e cenográficos: fundo neutro,
desenho, fotografia, logotipo, mobiliário, etc.;
(2) escolha das cores: tons quentes e frios, harmonia e contraste, predominância de
cores, etc.;
(3) aplicação das luzes: disposição, direção, valores cromáticos, etc.;
(4) e às características das superfícies: materiais utilizados, relação com fontes
luminosas, texturas etc.

No trabalho de Gustavo Orza, também podemos encontrar a tipologia e a topologia


associadas diretamente à construção do texto televisivo. Partindo da dicotomia “realidade/ficção”,
Orza indica três possíveis tipos de espaços de representação na televisão em que podemos
observar as relações estabelecidas entre distintas tipologias e determinadas topologias:
(1) Discurso Referencial / Espaços Reais;
(2) Discurso Ficcional / Espaços Reais Representados;
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(3) Discurso de Hibridação / Espaços Fingidos (possíveis ou imaginados).

No primeiro grupo, aparecem os programas de telejornalismo, programas em que os


conteúdos apresentam um alto grau de concordância com o “campo de referência externo”. No
segundo grupo, destacam-se os programas de ficção. Predomina aí o “campo de referência
interno”. No último, encontram-se os programas que operam entre os limites da “realidade” e
“ficção”. Desse modo, os conceitos de “espaços reais”, “espaços reais representados” e “espaços
fingidos” se remetem a espaços que têm como referência uma “realidade” externa, uma interna e
as duas simultaneamente.
Qualquer gênero televisivo pode fazer uso das diferentes formas de representação do
cenário televisivo. As locações ou os estúdios estão abertos para as telenovelas, para os
telejornais, para os programas infantis ou de auditório etc. Apesar do predomínio de certa
“organização espacial” e certo “registro estilístico”, na maioria dos gêneros, não podemos afirmar
que um determinado programa esteja limitado a certa topologia. Acreditar nisso seria eliminar
qualquer possibilidade de pensar a inovação na televisão.
A divisão espacial proposta por Orza nos auxilia no sentido de indicar uma forma de
categorização dos distintos tipos de representações cenográficas que encontramos na televisão:
(1) Espaços Naturais: locações, que podem ser externas – ruas, praias, praças etc. – ou
não – repartições públicas, salões de museus, teatros etc. Estão contidos nesse grupo os
ambientes da natureza ou as edificações feitas pelo homem, espaços que possuem função
própria independente da gravação do programa ou da captação das imagens. Ou seja, não
foram construídos para essa finalidade e podem ser utilizados como cenários nas novelas,
telejornais, programas infantis etc.
(2) Espaços Naturais Representados: cenários construídos – com materiais corpóreos ou
produzidos através de modelagem digital, cenário virtual –, que podem estar em estúdios,
cidades cenográficas ou, ainda, na memória do computador. Utilizam sempre como modelo
os “espaços naturais”. Contudo, apesar de serem, na maior parte das vezes, uma cópia fiel
desses espaços, servem tão-somente à encenação. Predominam nas telenovelas, de certa
forma em toda teledramaturgia, e encontram-se também nos programas de humor e infantil,
entre outros.
(3) Espaços Imaginários: ambientes fantasiosos – corpóreos ou virtuais – que não utilizam
como referência “espaços naturais”. Estão presentes em programas de auditório, infantis,
documentários, telejornais etc.

III - O CENÁRIO COMO FUNDO


Mesmo tendo em mente que o cenário deve atuar como elemento de significação no texto
televisivo, não devemos esquecer que esta função leva em conta todos os outros elementos
presentes na cena. O que temos são relações de linguagens estabelecidas entre o cenário e
outros signos visuais – os atores, os figurinos, os adereços, a iluminação etc. –, verbais – na
oralidade dos atores/apresentadores ou nas legendas videográficas – e sonoros – músicas, trilhas,
efeitos, fala etc.
Nessa relação sincrética, o cenário deve ser pensado como um elemento que tem como
principal objetivo valorizar os gestos, movimentos e fala do “profissional do vídeo” (ator,
apresentador, jornalista, humorista, animador etc.). Ainda que participe do texto como elemento
comunicacional, o cenário deve, na maior parte das vezes, assumir a posição de fundo da cena.
Para observarmos os elementos de composição da cena e as relações espaciais
estabelecidas com o cenário, é necessário entendermos que a cena reduzida ao seu menor
fragmento se resume a um quadro, uma foto videográfica (frame). A organização de quadros
videográficos se apresentará no suporte televisual por meio de planos. A significação do plano
está condicionada tanto aos planos que o precedem como aos que o seguem. Cada plano, por sua
vez, estabelece um tipo de relação com o espaço cênico e com o cenário:
(1) Grande Plano Geral: o cenário predomina na cena. Esse plano é geralmente utilizado
em narrativas para apresentar a região em que se passa a história;
(2) Plano Geral: o enquadramento compreende não só a personagem completa, mas
também o espaço de ação. Nesse plano, independente do gênero, normalmente se
apresenta o cenário onde irá ocorrer a ação;
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(3) Plano Conjunto: é um plano onde predomina o ator, o cenário começa a assumir sua
posição como fundo da cena;
(4) Plano Americano: o cenário, que nos planos anteriores ocupava parte da atenção,
começa a sair de cena;
(5) Plano Médio: é um dos planos mais utilizados na televisão. O cenário, nesse plano, se
resume a fragmentos indiciadores de um espaço;
(6) Primeiro Plano: a cenografia se limita à luz, maquiagem, adereços etc. O cenário sai
definitivamente de cena;
(7) Primeiríssimo Plano: a imagem se resume aos detalhes da expressão do ator;
(8) Plano Detalhe: plano fechado que normalmente apresenta pequenos objetos ou
detalhes do cenário. Nas narrativas, um pequeno fragmento do cenário – como uma
maçaneta de porta, uma torneira etc. – ou pequenos objetos – como uma bolsa, uma arma,
uma carta etc. – são elementos da maior importância para o entendimento da história.

A partir dos conceitos de quadro, cena e plano, e em especial, a partir da divisão dos planos
em distintos enquadramentos, é que podemos passar a pensar no cenário como elemento de
significação do texto televisivo.
Cada enquadramento televisual, como representação bidimensional, se apresenta “na sua
forma mais elementar pela relação figura-fundo” (Arnheim). Essa relação se caracteriza pelo
agrupamento de dois planos distintos. A figura, em sua forma limitada, se encontra, a princípio, em
frente a um fundo, que tem sua forma ilimitada confinada por uma borda (gestalt).
Segundo Arnheim, Edgar Rubin descobriu que “a superfície limitada circundada tende a ser
vista como figura, a circundante, ilimitada, como fundo”. Outro aspecto que, para Rubin, leva a
percepção a considerar duas formas como sendo uma figura e outra fundo, é a divisão do espaço
em topologias horizontais. Nesse caso, a parte inferior tende sempre a ser vista como figura.
- No entanto, a relação entre as partes de uma representação não se encontra estática, imutável.
Em especial nas imagens em movimento, como é o caso da imagem televisual, uma determinada
figura pode passar a assumir a função de fundo, assim como um fundo pode assumir o posto de
figura. Esse intercâmbio de posições se deve em grande parte ao movimento. O mesmo
movimento que irá determinar, em um primeiro momento, a posição da figura e do fundo no
espaço. Nessa relação, o cenário ocupará, na maior parte das vezes, a posição de fundo. A figura,
por sua vez, se apresentará como uma pessoa – ator, apresentador, convidado, entrevistado,
entrevistador etc. –, como animais, objetos ou, até mesmo, partes do cenário. E cabe a esse
cenário, como fundo, valorizar a figura, fazer com que o telespectador consiga segregar as partes
da imagem e fixar a vista em único ponto.

1. PRINCÍPIOS BÁSICOS DA GESTALT


a. Segregação: ato de separar, perceber ou identificar as unidades, as formas e partes
delas. Possibilita separar a figura do fundo.
b. Unidade: forma configurada e partes que configuram a forma. Na experiência visual as
unidades são facilmente identificadas e nomeadas, os limites costumam ser definidos.
c. Positivo e Negativo: o elemento que domina o olho na experiência visual é considerado o
elemento positivo e o elemento negativo é tudo aquilo que se apresenta de forma passiva,
que não é focado no olhar.
d. Figura e Fundo: A figura, em sua forma limitada, se encontra, a princípio, em frente a um
fundo, que tem sua forma ilimitada confinada por uma borda. Outro aspecto que leva a
percepção a considerar duas formas como sendo uma figura, e a outra fundo, é a divisão
do espaço em topologias horizontais. Nesse caso, a parte inferior tende sempre a ser vista
como figura. Do mesmo modo, o que é maior parece mais próximo dentro do campo
visual, contudo, a distância relativa é ainda mais claramente determinada pela
sobreposição. No entanto, a relação entre as partes de uma representação não se
encontra estática, imutável. Em especial nas imagens em movimento, uma determinada
figura pode passar a assumir a função de fundo, assim como um fundo pode assumir o
posto de figura.

2. ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO
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A forma pode ser definida como a figura ou a imagem visível na composição. Tudo o que se
vê possui forma. As formas podem ser apresentadas nos seguintes tipos:
a. figurativas: estão no nível da denotação, representam algo que pode ser
nomeado. Podem ser apresentadas em níveis distintos, que vão do realismo máximo
a simplificação do real, estilização.
b. geométricas: as formas básicas são o quadrado, o círculo e o triângulo. Cada uma
das formas geométricas está potencialmente preparada para estimular determinadas
sensações: triângulos e retângulos tendem a passar estabilidade e segurança; os
círculos, imensidão e continuidade; a elipse, delicadeza e movimento. Servem como
estrutura para os grids de composição, atuando como esqueleto sobre os quais se
constroem os leiautes.
c. abstratas: diferente das formas figurativas, que representam algum elemento
externo, ou das geométricas, que são gerais, as formas abstratas são não-
identificáveis, não-representativas, não-definíveis, e, na maioria das vezes, se
apresentam como um fundo que busca tão-somente valorizar a figura.
d. simbólicas: podem ser formas figurativas, geométricas ou abstratas. Por meio de
convenções, as forma simbólicas estabelecem relações de significado a partir da
relação com os outros elementos da composição (título, texto, contexto, cores etc.),
gerando um novo sentido para a forma que não se limita a denotação.

IV – ILUMINAÇÃO E COR

A iluminação é um dos elementos de maior importância na composição cênica. A luz está


diretamente relacionada ao espaço, é ela que provoca a sensação espacial. Junto com as cores e
texturas, a luz deve ser um dos primeiros elementos a ser pensado em um projeto cenográfico,
mas deve ser o último a ser percebido. A iluminação cenográfica em eventos e exposições tem
algumas funções: delimitar o espaço; destacar o objeto exposto; colorir objetos e pontos do
espaço; intensificar a qualidade matérica dos elementos; criar atmosfera e sensação de
profundidade no espaço.

A luz participa da construção do cenário, iluminando ou colorindo de


maneira diferente cada elemento conforme o planejado no projeto, com
o intuito de realçar o produto, um material, uma cor, ou, ainda, as
qualidades dos objetos ali instalados. Clareia o todo, com sua
luminosidade, foca o produto ao ser direcionada para ele, obscurece os
cantos, delineando contornos, criando sombras, aumentando ou
diminuindo a penumbra; dá maior ou menor força às cores, modificando
a textura dos elementos; unifica e pontua os elementos inseridos no
discurso com o propósito de atrair o espectador tanto pela razão quanto
pela sensação (DEMETRESCO, p. 124).

A iluminação será fundamental no aproveitamento dos efeitos matéricos, alterando


sua opacidade ou transparência. Ao focar objeto, ou elementos do cenário, a luz realça, ou altera
as qualidades de cada matéria: aspereza, rugosidade, metalicidade, suavidade etc. No projeto de
iluminação, o cenógrafo e o iluminador, devem considerar os aspectos de luminosidade (nos
objetos expostos e no espaço como um todo), luminescência (o brilho que a luz cria no objeto
intensificando a sensação matérica e cromática) e sombras (que funde-se à luz para criar os
espaço).
O diretor e o autor são os primeiros a pensar na cor como elemento expressivo, essa
proposta inicial é aperfeiçoada pelos diretores de arte e fotografia. A paleta deve ser definida de
antemão tendo em consideração a atmosfera desejada e aspectos simbólicos. É comum definir a
paleta de cores considerando a obra como um todo e não cada cena em si.
Em A trilogia das cores, de Krzysztof Kieslowski, as cores são elementos fundamentais na
concepção dos filmes, o azul simbolizando a liberdade, o branco a igualdade e o vermelho a
fraternidade – cores da bandeira francesa. Em Dick Tracy, por sua vez, a paleta de cores foi
urilizada para manter a mesma atmosfera das histórias em quadrinhos. Em algumas produções as
paletas são simplificadas em alto contraste (como os vermelhos e verdes de O fabuloso destino de
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Amélie Poulain) e, em outras, a partir de filtros monocromáticos (como o verde em Matrix),
intensificando ainda mais a significação das cores e o clima.
Embora a cor seja um elemento fundamental (tanto no aspecto simbólico como sensível),
muitos autores e ditores acabam optando pelas representações em PB – como em O Homem
elefante, A lista de Schindler ou A vida em preto e branco. Em muitos desses casos, a cor aparece
no filme como um detalhe que tende a aguçar a atenção do espectador.

V – FIGURINO

Diferente do vestuário da indústria da moda, o figurino não tem a função primária de


proteger o corpo ou servir como um adorno, ele é, antes de tudo, um discurso que visa um fim
específico a partir de relações sincréticas que estabelece com uma história, interpretação, cenário,
luz etc. “A encenação é a manifestação que, por meio de um conjunto de atitudes, escolhas,
seleções, expressa uma proposta humana, bem demarcada e definida” (LEITE e GUERRA).
Mesmo em uma representação naturalista, deve-se considerar o registro ficcional, simbólico. “Os
figurinistas devem vestir personagens” (LEITE e GUERRA).
“A moda busca o novo, a superação do antigo” (LEITE e GUERRA), o figurino não se
prende ao tempo, região ou às tendências, responde apenas à encenação. E a encenação é o
espaço “onde se pode ser sem ser, os mortos vivem, o passado se faz presente, o futuro é hoje, a
duração dissocia-se do tempo, aqui e agora tudo é possível, a ficção é pura realidade e a
realidade, ficção” (BOAL). Para Leite e Guerra: “Moda e Figurino convivem em ‘mundos’ paralelos,
e sua diferença reside no real e na ficção”.
Simbólicamente, o figurino materializa – em conjunto com os ornamentos, cabelos e
intervenções no próprio corpo – uma série de atitudes que caracterizam a personalidade do
personagem. O conjunto constitui um sistema de representação, “o vestuário incorpora-se tal qual
uma segunda pele” (LEITE e GUERRA).
O figurino e adereços marcam uma época, papel social, profissão, idade, personalidade e
visão de mundo do personagem. O ator, ao vestir o figurino, veste o personagem. Na televisão, o
uso de estereótipos visa, muitas vezes, facilitar a compreensão, pois certos trajes já indicam um
determinado significado. No entanto, a quebra desses paradigmas pode gerar representações
inovadoras. “As manifestações artísticas contemporâneas têm, a princípio, como proposta, a
busca do novo, na tentativa de romper com o estabelecido, com o estereótipo” (LEITE e
GUERRA). O desenvolvimento do figurino na televisão, assim como no cenário, está relacionado
diretamente às especificidades dos gêneros televisivos.
Pensar o figurino é pensar em expressar um personagem em contexto por meio de cores,
texturas, padrões, volume e movimentos. Os materiais e as técnicas de modelagem, corte ou
costura não são os mesmos do campo da moda, eles são determinados pela funcionalidade em
cena, efeito matérico, significação e custo. A dramaticidade da cena pode exigir do figurino
detalhamentos diferenciados e até mesmo exagerados para os padrões de consumo da moda,
como, por exemplo, golas extremamente alongadas ou botões em dimensões maiores. As provas
com os atores e o ensaio com o figurino são fundamentais antes de realizar o acabamento final.
No processo de concepção do figurino é preciso considerar três aspectos referentes à
personagem: Aspecto Físico: idade, peso, altura, cor de cabelo, cor da pele etc; Aspecto Social:
classe, religião, origens, profissão, nível cultural etc; e o Aspecto Psicológico: ambições, anseios,
frustrações, sexualidade, perturbações, sensibilidade, percepções etc. (COMPARATO). A criação,
como na cenografia, passa pela incorporação de referências iconográficas do cinema, artes
plásticas, história da moda etc.
No processo de confecção é preciso considerar as maneiras como os diversos tipos de
tecidos amoldam-se às diferentes anatomias, que permitem, ou melhor, potencializam os
movimentos e gestos do ator. A equipe de caracterização, de maquiagem, está subordina ao
figurino no que diz respeito à concepção artística. Outro aspecto que deve considerado no
processo é a composição da cena, as relações que serão estabelecidas entre os diferentes
figurinos dos diferentes personagens e as relações destes com o cenário.
Mesmo no sitema de alta definição quadro videográfico, formado por linhas, causa uma
série de ruídos em determinadas texturas, estampas e cores. Listras finas e constrastantes e
xadrezes pequenos são exemplos de texturas que causam os mesmo efeitos de Optical Art no
vídeo.
15

ETAPAS E PRAZOS DE PRODUÇÃO (LEITE e GUERRA)


Semana 7 – análise de sinopse/storyboard; reunião com diretor, diretor de arte e cenógrafo;
definição de conceito geral e primeiros esboços.
Semana 6 – assistir ao primeiro ensaio; pesquisa de ambiência (referências iconográficas,
de cores, época, estilo, região etc.); desenvolvimento de desenhos de figurino e
caracterização.
Semana 5 – tirar medidas dos atores; finalizar o projeto; comprar tecidos e materiais;
definição de peças que serão alugadas ou emprestadas.
Semana 4 – primeiras provas; corte e início da confecção; ajustes em peças prontas.
Semana 3 – rever ensaios; aperfeiçoar figurino.
Semana 2 – compra de acessórios finais; prova final.
Semana 1 – checar figurinos e adereços; acomodar nos camarins e araras; chegar figurino
na luz em ensaio técnico; ajustes finais para estréia.
Gravação – acompanhar as gravações controlando as trocas.
Pós Produção – desmontagem e manutenção de peças.

No processo de produção o figurino estabelece diferentes tipos de relações com as outras


esferas do sistema:
a. Direção – o figurinista deve atender às expectativas da proposta.
b. Assistente de Direção – o figurinista deve buscar esclarecimentos sobre dúvidas das
gravações.
c. Direção de Arte – o figurinista informa-se sobre a concepção visual da obra, solicita
referências iconográficas para composição de ambiência.
d. Cenografia e Iluminação – o figurinista informa-se sobre as propostas de cenário e luz
(cores, texturas, estilos) e apresenta esboços de figurinos.
e. Produção Executiva – o figurinista cota os preços, indica fornecedores e solicita as
compras.
f. Produtor de Elenco – o figurinista deve buscar informações sobre os atores.
g. Caracterização – o figurinista desenvolve a concepção de caracterização (cabelo,
maquiagem, adereços) e acompanha processo.
h. Costura – o figurinista apresenta desenhos com especificações técnicas, negocia o prazo
e acompanha execução.
i. Continuidade – o figurinista confere trocas de roupas avaliando a decupagem técnica, de
produção.
j. Acervo, aluguel, empréstimo e doação – o figurinista faz pesquisa, solicitação e
devolução.
k. Lavanderia – o figurinista define peças e prazos em função do roteiro técnico.

VI - A TELA VIDEOGRÁFICA
Tratando primeiro de sua forma de apresentação, devemos considerar que a representação
videográfica trata-se, na realidade, de uma imagem iridescente, composta, simplesmente, por
pontos luz (pixels) que se distribuem na tela em 525 linhas, no caso da TV analógica. Apesar do
crescimento na venda de monitores com novas tecnologias, a maior parte dos aparelhos de TV
ainda está equipada com monitores baseados em tubo de raios catódicos (CRT, cathode ray tube).
Com uma estrutura como essa, muitos acreditam que a imagem televisiva está capacitada apenas
para aceitar pouca quantidade de informação.
Ainda que a natureza da malha eletrônica “chape” a imagem e “reduza as qualidades do
cenário”, algumas experiências feitas nos últimos anos têm colocado em dúvida certas crenças,
como as que se referem à limitação no uso de determinadas textura, materiais e padrões de
tecidos, assim como no uso de determinados tons ou movimentos. Os novos processos de
captação, transmissão e recepção da imagem, onde se incluem o sistema digital e as telas de alta
resolução, somados à aceitação dos efeitos naturais causados pela retícula eletrônica, como o
moiré, trouxeram para nossa tela as texturas extremamente detalhadas, as cores saturadas e
contrastantes, os xadrezes, as listras etc.
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Outro aspecto que deve ser considerado na imagem videográfica diz respeito à dimensão.
“A dimensão existe no mundo real. Não só podemos senti-la, mas também vê-la, com o auxílio de
nossa visão estereóptica e binocular. Mas em nenhuma das representações bidimensionais da
realidade, como o desenho, a pintura, a fotografia, o cinema e a televisão, existe uma dimensão
real; ela é apenas implícita” (DONDIS).
A representação de um espaço tridimensional – como o espaço cenográfico – em uma
imagem bidimensional – como a imagem impressa na tela da televisão – depende da ilusão. Ainda
que muitos pensem de modo contrário, as figuras “chapadas” podem ser percebidas
tridimensionalmente tanto quanto uma figura naturalmente tridimensional.
Tratando especificamente das imagens tridimensionais, Arnheim afirma: “Os objetos podem
participar da terceira dimensão de dois modos: afastando-se por inclinação do plano frontal e
adquirindo volume ou rotundidade”. Esses modos de se obter o efeito de tridimensionalidade, na
superfície plana, são possíveis através de algumas técnicas amplamente utilizadas na produção
televisual. Entre essas técnicas, estão: a perspectiva de campo, os contrastes de escalas, as
variações tonais de claros e escuros e os efeitos de luzes e sombras. O emprego dessas técnicas
na captação e manipulação da imagem televisual faz com que os planos se separem em
profundidade. As formas são segregadas.

VII - O CENÁRIO SIGNIFICANTE NA TELEVISÃO


Para Décio Pignatari, tanto no teatro, como no cinema ou na televisão, “há uma cenografia
viva e há uma cenografia morta”. Ou seja, por um lado, há cenários que participam efetivamente
da ação narrativa e são necessários à montagem da cena; por outro lado, há cenários que não
exercem qualquer função como elementos comunicacionais, que não auxiliam de forma alguma a
evolução do ator em cena, que não mantêm qualquer relação com os demais elementos da
cenografia, na realidade, nem sequer com qualquer elemento da cena e, se retirados, não fariam
falta.
A minissérie Hoje é dia de Maria (TV Globo 2005) apresentou, em duas edições, um dos
melhores exemplos de “cenário vivo” na televisão brasileira. O cenário montado no interior de um
domo – uma cúpula esférica com cinqüenta e quatro metros de diâmetro por vinte e cinco metros
2
de pé direito, aproximadamente 1.700m sem cantos –, possibilitou à direção movimentos de
câmera de até 360º, além da inserção de elementos naturais – como plantas, água e fogo. A
chuva que cobria as cenas encharcava o solo que, por sua vez, havia sido preparado com areia e
plantas naturais. Contrastando com a naturalidade desses elementos, as representações das
paisagens – céu, nuvens, montanhas, estrada de terra etc. –, feitas em pintura em um gigantesco
ciclorama (painel de cento e setenta metros de largura por dez de altura), assumiam-se, em suas
cores, texturas, formas e movimento, como representações gráficas. Dessa forma, o cenário, ao
mesmo tempo em que explorava o realismo com os elementos naturais, acabava por revelar a
fantasia da narrativa. Experiências como esta – assim como o Auto da Compadecida (1999) e A
invenção do Brasil (2000), ambos do núcleo de Guel Arraes da TV Globo – mostram como, na
teledramaturgia, a representação realista pode não ser a única forma para se pensar a cenografia.
No entanto, isso não significa que não possamos ter trabalhos bastante interessantes que
buscaram, através da cenografia, alcançar o mais alto grau de realismo.
Em 1985, para a realização de O Tempo e o Vento (TV Globo), minissérie baseada na
primeira parte da trilogia homônima de Érico Veríssimo, foi projetada uma cidade – em uma área
2
de aproximadamente 40.000m –, “exatamente como Érico Veríssimo a descreve no livro, com as
mesmas ruas largas, as mesmas quadras, o sol marcando a passagem do tempo sobre as casas
etc.” (Dicionário da TV Globo). Três anos depois, para a minissérie Primo Basílio – baseada no
romance homônimo de Eça de Queiroz –, o mesmo cenógrafo, Mário Monteiro, seguindo a
descrição da obra, procurou reproduzir com fidelidade a Lisboa do século XIX. Para Daniel Filho,
diretor da minissérie, “um escritor como o Eça já nos dá toda a conceituação espacial e a
caracterização das personagens, o leque de cores, a arquitetura. Tudo está no livro”. A exatidão
na representação cenográfica, em casos como esses, tem apenas como objetivo procurar
transmitir, da forma considerada pela produção como a mais fiel, o clima geral das obras.
Buscando um grau ainda maior de realismo, Daniel Filho, em 1982, solicitou ao cenógrafo
Mário Monteiro, para a minissérie Quem ama não mata, um cenário com cômodos interligados.
Apesar de, à primeira vista, a ambientação cênica assemelhar-se a mero design de interior, a
relação do cenário com a obra foi fundamental para a construção do texto narrativo. À medida que
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a história se desenrolava, o apartamento ia sendo montado e, a partir do momento que a trama
seguia para o desenlace, o apartamento se decompunha.
Uma das experiências mais ousadas e originais no campo da cenografia televisiva foi o
cenário, concebido por Gringo Cardia, para o programa Muvuca (1998-2000). Muvuca se destaca
dos outros não só pela estrutura do cenário, mas também pelo excesso de cores e texturas
exploradas nos ambientes, que contradiziam, naquele momento, todos os manuais de produção
para TV.
Para finalizar esta série de exemplos, o programa Metrópolis (TV Cultura 2005), há alguns
anos, vem explorando uma forma original e interessante de composição cenográfica, a chamada
Galeria Eletrônica. O programa cede seu espaço a artistas plásticos que queiram expor algumas
de suas obras. A troca proporciona ao artista publicidade gratuita por um período, e ao programa,
a constante renovação de cenário, sempre tendo como objetivo principal a declaração explícita de
apoio às artes. O resultado da experiência acabou dando origem à exposição Coleção Metrópolis
de Arte Contemporânea, exibida na Pinacoteca de São Paulo e na Pinacoteca de Santos (2002).
Foram apresentados trabalhos dos principais artistas brasileiros – entre eles Tomie Ohtake, Leda
Catunda, Lygia Pape, Antonio Dias, entre outros.
Esse caso, em especial, estabelece entre a representação cenográfica e os elementos de
composição do cenário uma relação muito particular. Os elementos que compõem o cenário
(pinturas, esculturas, instalações etc.), antes de fazerem parte da cenografia, eram obras de arte,
e, a partir do momento que deixaram de ser utilizadas como elementos cênicos, retornaram aos
seus espaços naturais (galerias, museus etc.) como obras/cenários. Parte do público visitou a
Pinacoteca de São Paulo para ver Leda Catunda, entre outros artistas. Outra parte dos visitantes
foi ver os cenários do Metrópolis.

VIII - O CENÁRIO NOS GÊNEROS TELEVISIVOS

A evolução da linguagem televisual, assim como a configuração da linguagem do cenário na


televisão, está ligada intimamente à variedade e especificidades dos gêneros televisivos, assim
como das programações, programas e formatos.
Sem dúvida alguma, o principal elemento determinante da concepção cenográfica é o
gênero. O gênero orienta certos padrões na estrutura do programa, que vão do texto à cenografia;
do figurino à edição; da duração do programa à topologia da cena. Não há como negar que, de
forma geral, uma telenovela possui uma forma de base que irá orientar a produção deste gênero.
O mesmo acontece com os telejornais, e os dois, por sua vez, têm traços distintivos que nos
permitem reconhecê-los como gêneros diversos. O gênero, por si só, irá submeter os programas a
determinados espaços. Estes, por sua vez, irão também orientar a concepção cenográfica, irão,
até mesmo, determinar os tipos de materiais utilizados na confecção do cenário. E não só o
espaço, mas as relações temporais também devem ser observadas nesse momento, ou seja: que
topologias e que tipologias determinam a configuração do cenário? Para finalizar, devemos
observar como o público acaba orientando a concepção cenográfica, tendo em mente que este é
um fator que, assim como o espaço, está diretamente relacionado ao gênero.

VIII - O PAPEL DO CENÓGRAFO NO PROCESSO


Um fator que irá interferir diretamente na definição do cenário para a dramaturgia televisiva
é o acelerado processo de produção. As cenas são gravadas fora de sua ordem narrativa, com
isso, a montagem dos capítulos passa a ser feita a partir de fragmentos não seqüenciais. Esse
processo também irá se repetir em outros gêneros televisivos.
Estão envolvidos na produção profissionais das mais distintas áreas, entre elas: fotografia,
produção de arte, caracterização, figurino, cenografia. Todos trabalhando em torno das
especificações do projeto e da concepção da direção. Nesse processo, o trabalho do cenógrafo é
descrito por Alencar da seguinte forma: “em consecutivas reuniões com o autor e com o diretor, os
cenógrafos examinam os mínimos detalhes de tudo: protagonistas, ambientes, situações. E com
todas as informações necessárias, partindo para um anteprojeto (acompanhado do respectivo
orçamento) que será apresentado, examinado, discutido, aprovado ou não, modificado ou não, até
a solução definitiva”.
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Tendo sido aprovada a concepção do cenário, o projeto é enviado à “Fábrica de Cenários”,
que é composta por profissionais responsáveis por diferentes áreas, entre elas: marcenaria,
tapeçaria, elétrica, serralharia, pintura, adereço, efeitos especiais etc. O cenógrafo deve também
supervisionar essa fase.
Quando iniciam as gravações, o processo torna-se ainda mais dinâmico. Segundo Leite e
Guerra, “as novelas estabelecem duas frentes de gravações diárias, uma em estúdio e outra para
cenas exteriores”. É comum que 70% das cenas sejam gravadas em estúdio e 30% sejam
externas. Segundo Daniel Filho, já que os cenários demoram a ficar prontos, geralmente as
externas são as primeiras a serem gravadas. Diante desse processo dinâmico, a função do roteiro
é permitir “a operacionalização da produção dentro de critérios de maior rentabilidade de trabalho”
(Ortiz). E é justamente essa logística de trabalho que possibilitará à cenografia realizar as
inúmeras mudanças que costumam ocorrer na obra durante seu período de veiculação.
Ainda que prevaleça nesse processo o sistema industrial (em que verificamos uma série de
modelos de cenários e até mesmo uma série de locações reaproveitadas), não se deve esquecer
que o valor do cenário, como elemento de significação, está na relação que este estabelece com
os outros códigos da encenação. Ou seja, uma mesma sala passa a ser um outro espaço a partir
do momento que temos uma outra trama, com outras personagens, atores e direção, um outro
texto.
As características aqui apontada, em função das especificidades dos distintos gêneros, são
tendências que podem ser observadas na televisão, mas de modo algum se configuram em leis as
quais os profissionais do meio devem se subordinar. Como afirma Santaella: “Tentar estabelecer
uma especificidade para um meio como o vídeo (...), acrescido de uma enorme capacidade de
transmutação plástica, poderia se correr no erro de se almejar uma pureza que este meio não
possui”. O cuidado que se deve tomar aqui é que os gêneros nascem, crescem e evoluem em
uma rapidez nem sempre acompanhada pelos pesquisadores. Os novos formatos, com certeza,
irão levar a cenografia a novas mutações em suas estruturas e estilos.
Ainda assim, devemos estar atentos ao fato de que um cenário de telejornal possui
determinadas características que o diferenciam de um talk show, de uma telenovela ou de um
programa infantil. E cada um destes, por sua vez, possui características que os diferenciam de
programas de outros gêneros. As marcas de cada evento televisivo possibilitam que a audiência
reconheça o gênero, ainda que não conheça o programa. Frente a isso, devemos considerar a
possibilidade de utilização de alguns modelos de cenários, mesmo que esses já tenham sido
utilizados em outros programas do mesmo gênero. Se um cenário foi concebido para atender as
necessidades de um determinado programa, é natural que faça uso de certos elementos de
composição que sejam utilizados também por outros programas do mesmo gênero. Entendemos,
que as particularidades dos gêneros, que orientam a concepção cenográfica, não devem ser vistas
como estereótipos, dentro do emprego pejorativo que se dá ao termo. Acreditamos que a
adaptação de certos estereótipos, pode resultar não só em manifestações singulares, mas em
manifestações com competência para atuarem como elementos comunicacionais no sistema.
Cabe ao cenógrafo conhecer: as especificidades da linguagem do cenário televisivo; as
particularidades da imagem eletrônica; o clima geral que autor e diretor pretendem impregnar na
obra; as referências culturais do público; os estilos arquitetônicos que fazem parte da cultura, da
região e da época da narrativa; os costumes, hábitos e valores em que estão inseridas as
personagens;os demais elementos cenográficos que irão compor com o cenário o espaço; os
materiais e processos de produção e instalação do cenário.
Os profissionais envolvidos na produção devem ter consciência que o cenário televisivo tem
condições de transmitir sensações, e sensações muitas vezes indescritíveis – nesse nível, tendo
em vista a materialidade da malha eletrônica, devem cuidar dos elementos de base da
composição (cores, texturas, volumes, luzes etc.). Devem considerar que, na figuratividade, o
cenário está capacitado para denotar um espaço, indicar uma época, um local etc. Com isso,
auxiliará na evolução do ator ou apresentador. Cabe ao cenógrafo, nesse caso, cuidar da
ambiência, das condições físicas e estéticas que podem influir diretamente na encenação. Dotado
de sentido, o cenário participa ativamente da construção do texto televisivo. Passa a estabelecer
relações de significado com os outros signos da cena.
Se levarmos em conta que, a todo o momento, surgem novos tipos de programas, resultado
da subdivisão de tipos específicos ou então da aglutinação de tipos variados, e somarmos a isso o
fato de que os meios estão evoluindo tecnologicamente em períodos cada vez mais curtos,
podemos afirmar que estamos diante de uma linguagem que, além de múltipla e fragmentária,
está em permanente formação. Com isso, não podemos nos limitar a cânones impostos ao
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cenário em virtude de um número limitado de gêneros televisivos ou a particularidades do aparelho
analógico de dimensões reduzidas.

1. PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DO CENÁRIO


A cenografia deve estar integrada ao espetáculo. O espectador não deve ter a atenção
voltada unicamente para os elementos cenográficos, eles devem se confundir com os
personagens, dialogando com o texto e ação em uma linguagem silenciosa.

Funções dramatúrgicas do Cenário


a. O cenário tem a função de atuar na figuratividade dos elementos que se supõe que
sejam existentes no universo dramático. Nesse nível, encontra-se no estágio da
denotação. Essa figuração é sempre uma estilização e uma escolha pertinente de
signos, podendo variar de uma abordagem naturalista até uma simples evocação
mediante alguns poucos traços;
b. Através das formas, cores, texturas e luzes, atua na subjetivação do palco, criando
impressões de realidade que jogam com a sugestão de uma atmosfera onírica ou
fantasiosa do palco;
c. Serve também como um conjunto de planos, passarelas e construções que dão aos
atores uma plataforma para suas evoluções. Os atores constroem os lugares e o
momento da ação a partir de seu espaço gestual.

Processo de criação e desenvolvimento


a. Compreensão do tema e definição do clima geral
A criação de um cenário teatral iniciará com a leitura da sinopse e informações do diretor
sobre o que ele deseja em termos visuais. A tendência natural de iniciar o processo
produzindo um bom desenho é uma forma errada de conduzir o trabalho. O cenário, antes
de ser uma mera ilustração, deve manter diálogo direto com o texto, não é possível
conceber um cenário sem a compreensão profunda dos temas propostos pelo autor e da
visão crítico-estética do diretor.
No momento da definição da atmosfera geral da cena, intervirão fatores como equilíbrio,
forma, cores, texturas e dimensionamento do espaço e da ação. Um cenário é equilibrado
quando todos os elementos visuais básicos atuam no mesmo sentido, sendo cada um
deles fundamental ao todo. Os elementos devem considerar as ações e falas dos
personagens, devem ter uma função provocatória, tanto no sentido do gesto como na
significação de suas vibrações. Ao criar um cenário é preciso não se deixar influenciar
pelas tendências modernas, ou ainda, pelas normas acadêmicas ou tradicionais. O que
interessa são as mensagens contidas no texto e o impacto visual que se deseja para a
encenação:
1. Os significados (mensagens) que estão contidos no cenário.
Existe uma ligação entre a mensagem e o significado, por um lado, e as técnicas
e elementos visuais por outro. Estes significados apresentam-se de forma
diferente em cada forma de representação e são definidos na leitura do texto ou
da proposta.
2. O impacto visual que o cenário causará.
O impacto que o cenário causa visualmente, é mais importante do que a forma
como ele é produzido, ou, ainda, com que materiais é confeccionado. Este
impacto é determinado em um esboço que deve traduzir plasticamente o texto,
transmitir visualmente seu conteúdo, sua atmosfera moral ou histórica.
b. A definição dos materiais no projeto.
A escolha do material (madeira, ferro, tecido, plástico etc.) será determinada no
detalhamento técnico do projeto, e será definida a partir do impacto que se deseja causar;
da forma como o cenário será instalado; e, principalmente, em função da viabilização do
projeto em relação ao orçamento. As dificuldades financeiras exigem mais criatividade do
cenógrafo, com utilização de materiais alternativos. Desse modo, a cenografia teatral,
assim como a do carnaval, acabam sendo as mais criativas em termos de produção. A
televisão, ao contrário disso, com todos seus recursos e estrutura, pouco oferece em
termos de criatividade.
c. Cuidados durante com o projeto.
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É preciso fazer um levantamento do espaço onde o cenário será instalado: largura e altura
da boca de cena; profundidade do palco; largura interna do palco; altura máxima até o
urdimento etc. Se no interior do palco houver obstáculos, eles devem ser registrados; se o
palco for irregular, é importante fazer um levantamento planimétrico desenhando-o
cuidadosamente. Quando se está estudando o projeto, é necessário projetar a Curva de
Visibilidade na Planta, considerando a vista do cenário do palco para a sala, assim como
da sala para o palco. A curva de visibilidade também serve para evitar os rompimentos,
não revelando os espaços dos bastidores e urdimentos, assim como servirá também para
evitar que haja sobreposição de painéis. Por mais preciso que sejam esses cálculos, é
preciso que, no momento da instalação, o cenógrafo sente-se nas extremidades da platéia
para ver se não há rompimento.
d. A instalação do cenário
A instalação do projeto é a ultima preocupação do cenógrafo. O cenógrafo deve
confeccionar uma maquete para comprovar o funcionamento dos mecanismos. Esta
também servirá para que marceneiros, serralheiros e pintores possam se orientar. O
cenógrafo deve ainda preocupar-se com as características do espaço (topologia do palco
no teatro; do estúdio na TV; do pavilhão em evento etc.) para o qual está projetando o
cenário, pois, nos diferentes espaços, variam o acesso ao local, infra-estrutura dos
ambientes e, até mesmo, o tempo disponível para a instalação.

Projeto
Para o desenvolvimento de projetos tridimensionais, são necessários alguns
conhecimentos:
1. Visão espacial.
2. Habilidade para visualizar escalas.
3. Habilidade para desenho em perspectiva.
4. Conhecimento de técnicas de perspectiva.
5. Conhecimento de escala técnica.
6. Conhecimento de projeto (PB / elevações / detalhamento).
7. Conhecimento de materiais (texturas / resistências).

IX - O PAPEL DA PRODUTORA NO PROCESSO


Decupagem: fragmentação da história em partes para que se cuide de cada elemento.
(1) Decupagem de cena: Cena é o fragmento de ação que acontece em um mesmo
espaço/tempo. Mudou o espaço e/ou o tempo, mudou a cena. A decupagem de cena,
nesse caso ajuda na dimensão da produção (figurino, locações, cenários etc.). Cabe
a agência enviar o roteiro já decupado para a produtora;
(2) Decupagem técnica: cada cena é decupada em uma série de tomadas ou planos
(trecho entre dois cortes). Cada tomada deve fazer uso de enquadramentos e
movimentos de câmeras diferentes.
Seleção do Casting: algumas produtoras têm seu produtor de elenco. Outras terceirizam o
trabalho. O processo de seleção (sempre com atores anônimos) envolve desde teste de roteiro
(voz, entonação, interpretação etc.) a análise dos aspectos estéticos relacionados às
necessidades do filme.
Definição da Locação: muitas produtoras trabalham com um produtor de locação que irá
buscar o espaço ideal para a captação das imagens e verificar as possibilidades de gravação. O
produtor de locação deve estar atento a algumas questões na seleção do espaço, que vai do custo
para captação da imagem no local (aluguel, reformas no espaço, adequações etc.) a infra-
estrutura necessária para utilização de equipamentos (iluminação, grua, travelling, etc.).

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