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Universidade Federal do Maranhão

Centro de Ciências Humanas


Licenciatura em Teatro
Disciplina de Iluminação
Prof. Abimaelson Santos
Aluna: Eduarda Milena A. Saraiva

Reposição

1 – A partir da leitura do livro “A função estética da luz”, de Gill


Camargo, faça um panorama histórico sobre a ideia de luz e
visibilidade e exemplifique, de modo crítico, utilizando um exercício de
luz realizado em sala de aula.

Sabe que o teatro tem suas origens na Grécia com os cultos ao deus
Dionísio com seus ritos de fertilidade dançantes, ao entoar de cânticos e
ditirambos nas ruas, por volta de 539 a.C, de onde se originou as primeiras
tragédias, sendo reconhecido pelo estado grego que estabeleceu concursos
dramáticos para apresentação destas obras, estes, que sempre foram
realizados à luz do sol, tanto que as representações tinham a duração do
percurso do sol, o público chegava ao nascer do sol, e estas iam até ao
anoitecer, que era quando retornavam a Atenas em cortejo sob à luz de
tochas. Os seguimento das tragédias seguiam uma ordem cronológica, uma
ideia de tempo que tinha o sol como determinante, bem como mudanças de
ângulos.

Na antiguidade os espaços para as representações eram


cuidadosamente planejados para que não houvessem problemas de
acústica e visibilidade, as arquibancadas eram construídas nas encostas das
colinas e atores e público ficavam expostos ao sol, levava-se em conta o
nascer do sol que deveria ser atrás dos espectadores e não de frente para
que também não os cegasse. Com a luz do sol não haviam possibilidades de
recortes das figuras no espaço, ressaltar ações e separar planos por meio
da luz. Quando as representações invadiam a noite, eram utilizadas tochas,
e em alguns
casos para designar a “noite” e a “escuridão”, onde deu-se os
primeiros indícios do pensamento da luz enquanto um meio de
representação, tão poderoso quanto os demais elementos cênicos.

Seguiu-se o teatro romano também com a utilização da luz do sol nas


representações e nesta época, Vitrúvio (século I. a.C. ou d.C), alertava sobre
a necessidade de construir os teatros em locais favoráveis que não se
tornassem insuportáveis para os atores e público, devido ao calor do sol.

Durante a idade média, como uma época predominantemente


religiosa, havia os dramas litúrgicos que também se aproveitaram da
claridade do sol, como eram apresentados dentro dos templos, a claridade
que entrava pelos vitrais era satisfatória para a visibilidade do público, e o
clima dos dramas litúrgicos dava-se pela luz incidente do sol e da luz trêmula
das velas e candelabros acesos, depois passaram pros adros e
posteriormente confrontados pela igreja como profanos por irem de encontro
às contradições ao que dizia respeito ao sagrado, saíram para as praças
públicas e feiras, retomando o uso da claridade natural – hoje, ainda
utilizamos a luz solar para espetáculos sem nenhuma necessidade de
iluminação cênica, quando feito em ambientes externos, como o teatro de
rua que pode ser pensado ou com uma iluminação cênica quando
apresentados à noite, ou utilizando-se da claridade do sol, retomando as
características primitivas, na fala de Gil Camargo (2000, p.14) “O que os
olhos veem é o que os olhos veem, sem filtros, sem artifícios”.

O uso da claridade do sol deu-se até o teatro Elisabetano, o espaço


configurava-se em formato circular, a plateia ficava em torno do palco –
frente e laterais - o palco ficava no centro e avançava no espaço vazio, por
cima do tablado havia um teto apoiado em colunas e fora do tablado o
espaço era descoberto. As representações eram apresentadas também
durante o dia.

No século XVI, o teatro passa a ser o edifício teatral, e o primeiro


problema foi o da visibilidade, pois haveria que se encontrar uma luz que
pudesse substituir o da luz natural. Tal problema nos turnos vespertinos
eram resolvidos com o abrir das janelas, já a noite passou-se a utilização de
velas no interior das salas.

Por cerca de 300 anos d.C a vela de cera foi usada pelos fenícius,
produzindo uma luz trêmula, instável, não controlável.

Os candelabros foram utilizados entre os séculos XVII e XVIII que


eram pendurados pelo palco e plateia, já no século XVIII, utilizou-se sebo
que causava o incômodo do mal cheiro e irritação nos olhos, e mais tarde
em 1973, Ami Argand cria o primeiro tipo de lampião a óleo (lampiões
Argand), que produzia um efeito menos oscilante, mais intenso. Depois o
lampião Astral Francês e o tipo criado por Bernard Carcel, que produzia uma
luz mais constante que as demais, mas que havia o inconveniente do uso do
óleo que criava sujeira por todo o espaço, logo, havia-se a necessidade de
uma luz que não oscilasse e ao mesmo tempo não criasse demais
problemas como sujeira ou fuligem. Havia também paralela à preocupação
das fontes combustíveis, novos modos de instalação das luminárias, a
preocupação era a de ocultar estas da vista do público, foi quando surgiu as
primeiras noções supercifiais de ribalta, luz lateral, luz de fundo e luz vertical.

Os recursos ainda eram muito precário, eram apenas um fraco


substitutivo do sol, instáveis, de difícil controle, e mesmo assim, no século
XVI, houve interesse pelo estudo da iluminação cênica, Sabastiano Serlio e
Leone di Somi, descrevem sobre o uso de tochas atrás de vidros com água
colorida para reproduzir efeitos, além de garrafas e vidros coloridos e metais
para produzir reflexos, disponível no Dialoghi in Materia di Reppresentazioni.

Di Somi preocupou-se com a redução de luz no espaço da plateia,


que as fontes visíveis fossem ao máximo ocultas com um mínimo de luzes
possíveis atrás da plateia para se criar um contraste entre palco e plateia e o
palco parecesse mais iluminado.

Neste mesmo século Angelo Ingegneri propôs o escurecimento total


da plateia que não teve êxito no momento, ir ao teatro naquela época era um
evento para o qual se veria pessoas e pra ser visto. Nicola Sabbatini
descreve em Pratica di Fabricar Scene e Machine né Teatri (1638), propõe
um fusível que acendesse as luminárias ao mesmo tempo como uma
espécie de dimmer.David Garric, em 1765, propõe a retirada das fontes
visíveis do palco Drury Lane em Londres, utilizando apenas as laterais,
ribalta e a iluminação de cima, uma idéia ainda não explorada na época e
muito mais adequado.

Mais tarde utiliza-se a iluminação a gás representando um avanço


diante das tochas, velas e lâmpadas de azeite ou querosene. Suas
vantagens eram uma luz mais intensa, uma vez que um candelabro a gás
equivalia a doze velas, regulagem de intensidade, fachos com mais
estabilidade, nitidez e controle centralizado, com esta ferramenta foi-se
possível criar efeitos individuais e isolar cenas criando zonas de atenção. O
gás trazia gastos enormes por sua cara manutenção, e apresentava alto
ricos de incêndios, apesar da fiscalização obrigatória de guardas, incêndios
eram comuns, mas não deixando de ser utilizado pois era o mais avançado
recurso até então,

Thomas Edson em 1879, surge com a descoberta da lâmpada


incandescente projeto o qual trabalhou para se gerar luz a partir da energia
elétrica, esta que até o final do século XIX já havia chegado aos grandes
teatros.

As primeiras instalações elétricas utilizavam a luz de ribalta, as


gambiarras (luzes de cima) e as laterais, todas estas cobriam todo o campo
da representação, e em 1876. Richard Wagner, retoma a antiga ideia de
Ingegneri escurecendo a plateia totalmente afim de suprir a necessidade de
ilusão, mantendo a sala obscura e o palco iluminado, o público poderia
centrar a sua atenção no mundo fictício sem confrontá-lo com o real, o
público acreditaria no que estivesse vendo, e a ilusão assim foi formada. Nas
palavras de Gill Camargo “chega-se a perder a consciência da realidade que
o rodeia. Mantido num estado parcial de hipnotismo, o espectador será tanto
mais receptivo da ação dramática quanto mais esquecer tudo o que não lhe
diz respeito”
A visibilidade dava-se agora exclusivamente da ribalta para o tablado,
Wagner obscurece a sala para se criar um universo cênico o qual o público
pudesse conectar-se e esquecer de tudo ao seu redor, a luz tornou-se a
fronteira entre ator e plateia, ressaltando a ação do quadro cênico,
correspondendo ao desejo de se alcançar o ilusionismo do teatro. A técnica
de iluminação deveria respeitar

e estar a serviço das estruturas e objetivos da cena à italiana. Tal


ideia, possibilitou de fato esta separação que antes dava-se apenas pela
arquitetura mas que não surtia efeitos enquanto “forma particular do olhar do
espectador, sugerindo impressões, revelando a materialidade e o significado
das coisas, captando-as nas suas três dimensões.”(CAMARGO, 2000, p.20)
O Realismo toma conta da iluminação como parte fundamental da
cenografia, e a iluminação compunha a intenção de trazer aspectos reais
para uma maior verossimilhança com a vida real com uma luz
“aparentemente uniforme e integrada”. (CAMARGO,2000, p.20).

Mariano Fortuny em 1902, desenvolve na Alemanha, o


“Kuppelhorizont”, uma meia-cúpula feita de seda ou gesso, que refletia luz
sobre o palco simulando o infinito (céu). Este recurso daria origem ao
ciclorama. (CAMARGO, 2000. p.20), que fez importantes modificações no
cenário como ideia de profundidade, altura á cena, bem como sensação do
infinito, e à sua arquitetura. Utilizou um sistema de cores e adaptou
dispositivos nos refletores afim de colorir e difundir a luz na cena, tornando-a
mais suave. Lennebach e Hasait na Alemanha também trouxeram
contribuições técnicas para o aperfeiçoamento do ciclorama e os sistemas
de controle.

Mais tarde surgem os spotlights com possibilidades de foco,obturador


para ajuste de abertura, instalação à distância, regulagem para dar
movimento – direita e esquerda, cima e baixo- captação de qualquer objetos
de cena e suporte de filtros coloridos.

Se antes na antiguidade até anterior ao período da renascença a


função da luz era de apenas levar claridade às representações, e com o
passar dos séculos produzir nitidez, intensidade e estabilidade, e
obscurecendo a sala do público - nos primeiros lampejos acerca da
separação entre palco e plateia - com a chegada da luz a partir da
eletricidade e mais tarde do spotlight conseguiu-se uma concentração à
cena que representaria um avanço na estrutura do teatro, possibilitando um
novo conceito de cenografia, mudanças no figurino, elementos de cena,
como cenário, este que antes era dado por pinturas em telas quase como as
pinturas renascentistas, agora, com novos recursos advindos da iluminação
elétrica, o cenário transformar-se e o pictório dá lugar a objetos de cena
reais, o uso do spotlight trouxe grandes avanços que propiciaram pôr em
evidência o ator, os novos elementos cênicos, o isolamento de cenas,
ressaltar zonas de ação.

Logo no início da disciplina de iluminação, foi-nos proposto um texto


“Fando e Liz”, teatro do absurdo, o qual deveríamos extrair fragmentos e
pensar a luz sobre o corpo em diálogo com o fragmento escolhido.

Uma das cenas foram a do Gleysson e Ozana, onde a proposta era


os dois atores um em cada lado da caixa cênica, com um foco de luz em
cada um, ambos eram Fando e Liz, em uma dinâmica estabelecida pelo
grupo. Eles usaram quatro pontos de luz: Ozana embaixo de um pc à pino,
um Fresnel no chão em Gleysson, uma luz vermelha de ataque no mesmo e
ao final, uma foi utilizado uma lanterna. O texto foi construído a partir de
recortes da obra e inserções do grupo e haviam momentos em que a
personagem Fando ameaçava e estrangulava Liz. Os atores interpretavam
sem se tocar, o ato de estrangular Liz, era interpretado pela aluna-atriz
Ozana, ao lado direito da caixa cênica em relação a nós que éramos público.
No momento da agressão, o grupo usou a luz de ataque vermelha, cor que
sugere nesta dada cena, a violência, agressividade, que dialogava com a
atuação da personagem Liz, que ao reagir à agressão, a luz à pino sobre ela
oscilava causando uma sensação de movimento, de tensão e angústia.

Eram apenas os primeiros experimentos do corpo na cena, mas a


equipe teve um desempenho satisfatório dialogando a luz com a disposição
mais a interpretação e intenção de cada cena, os focos concentravam a
nossa atenção para estas duas personagens, a oscilação sugeria uma
tensão e angústia de ambas as personagens, um dos pontos mais fracos,
deu-se no momento em que o personagem Fando (nesse momento feito por
Gleysson) sai do seu lugar para ir de encontro a Liz e matá-la. Neste
momento o vácuo entre os dois pontos de luz não foi preenchido, o ator se
deslocou de um ponto a outro ficando totalmente no escuro, onde poderia-se
ter pensado num ponto de luz que englobasse a área percorrida do ator até
chegar na sua marca, o que deixou um buraco na cena obscurecendo o
corpo do ator. Poderia-se ter usado dois par32 de ribalta em resistência, por
exemplo para se iluminar o meio desta cena, sem perder o foco do lado
direito concentrado em Ozana, já que o foco de luz permanecia nela e suas
mudanças deram-se pela luz oscilante proposta pela equipe.

2 – A partir da leitura do livro “A função estética da luz”, de Gill


Camargo, faça um panorama analítico sobre a ideia de luz e criação e
exemplifique de modo crítico, utilizando os aspectos e exemplos
históricos relacionados a esta correlação (luz/criação)

3 – A partir da leitura do livro “A função estética da luz”, de Gill


Camargo, faça um panorama conceitual sobre luz e atmosfera,
destacando a importância das tonalidades, contrastes e volume na
concepção da cena.

A atmosfera da cena é o ambiente de uma realidade fictícia que


engloba toda uma cena sob a ótica e concepção de alguém, geralmente tal
olhar advém do próprio encenador, que concebe o espetáculo segundo sua
visão particular.

Esta começou a se manifestar com André Antoine (1858-1943),


quando ele preocupado com detalhes e usos de elementos reais no palco,
procura tingir uma atmosfera e ambientação naturais apagando as luzes dos
candelabros usuais da época no teatro e passando a usar velas, faróis e
lâmpadas, sendo inovador para toda a Paris teatral da época.

Não é apenas a fonte de luz que determina a atmosfera da cena,


qualquer uma pode criar uma atmosfera, mas o que irá determinar sua
atmosfera será

a maneira de lidar com esta luz, o pensamento estético que a


engloba, como se distribui e dialoga com o espaço.

Para se chegar a uma atmosfera da cena, três são os fatores


determinantes: Tonalidade, contrastes e volume.

A tonalidade é uma questão, não de cor mas, de gradiência. Cada


objeto em si possui uma claridade imanente em si que é revelado a partir de
uma simples luz uniforme. A tonalidade consiste na própria natureza
luminosa de cada objeto e isto independe da claridade sobreposta ao objeto,
ou seja, a luz ambiente jamais modificará a claridade natural que este
possui, ela só a revelará – a partir de claridade – e a intensificará. Logo,
quando um refletor se acende, aquilo que é claro permanecerá mais claro e
aquilo que é escuro continuará escuro, tais diferenças são realçadas pela luz
que segundo Camargo é “como se, para a percepção, uma luz viesse se
sobrepor a outra já existente” (2000, p.63), tal característica, jamais será
mudada seja por qualquer refletor.

A tonalidade nos remete a cor, e cada cor possui uma claridade e


uma gradiência de tons, azul claro, marinho, celeste, anil, a cor é baseada
em critério de escolha e cada cor comunica uma tonalidade, pois quando se
fala em uma cor, a forma como o meu pensamento concebe esta cor pode
certamente não ter a mesma tonalidade que o outro, logo, a tonalidade é
uma questão de gradiência.

Para tanto, na cena, a tonalidade dos objetos revelam-se à medida


que se prolongam na horizontal, vertical, transversal, e em cada modo que
for colocado no espaço da cena, o objeto revelará em si uma gradiência de
tonalidades que a luz irá ressaltar.
Logo, há uma estreita relação entre iluminação cênica e os elementos
visuais do espetáculo teatral, sobretudo cenário e figurinos.

Os contrastes, surgem a partir da comparação entre dois ou mais


tons, um mais claro que se opõe a um escuro. Tudo o que vemos possui
variações de claridade, algumas vezes nossos olhos não captam tais
variações dentro do

conjunto que forma o objeto e outras vezes tais oposições se fazem muito
mais perceptíveis, e a estas oposições de tonalidades dá-se o nome de
contraste.

Para cada tipo de contraste, há uma atmosfera a ser buscada que


dialoga com a “textura” da cena. Os contrastes suaves, por exemplo,
priorizam oposições fracas, pouco perceptíveis, não possui limites tão
nítidos, tão demarcados, tais contrastes valorizam a transição e não o corte.
E os elementos visuais do palco possuem uma continuidade tal que nos dê a
impressão de serem ininterruptos. No teatro, a iluminação deve buscar tons
mais claros e não muito definidos, sem recortes bruscos, que acompanhem
a aparência uniforme e suave da cena com seus elementos. Para tal
atmosfera usa-se refletores com lente Fresnel e difusores em modo geral.

Para contrastes normais, seus pontos de evolução são mais precisos


e vão do claro para o escuro e vice e versa. A iluminação para contrastes
normais priorizam a definição e a delimitação da luz, porém tal procedimento
dificilmente resulta numa atmosfera.

E tem os contrates do tipo duros, bastante acentuados e os máximos,


onde não existem pólos em oposição, são claramente expressivos mas
raramente prestam-se a resultados atmosféricos também.

A luz atmosférica não incide com o fim de transformar a cena, de


forma a ressaltar, exagerar seus fins expressivos, ela surge como uma luz
que é consequência da cena naturalista quando esta procurou combater o
ilusionismo do teatro, sua intenção era valorizar aspectos da realidade, e
passar essa impressão,” no seu frescor, na sua umidade, no seu equilíbrio
principalmente térmico e visual.” (CAMARGO, 2000, p.67)
O volume, por fim, é o resultado da combinação entre tons e
contrastes. Na cena contemporânea é a grande preocupação enquanto
espaço e visibilidade dos espetáculos, cena esta que traz a característica do
cenário construído e da sua tridimensionalidade, a qual a iluminação atua
como fator determinante.

Os volumes não constituem espaços vazios, dispersos no vácuo, eles


relacionam-se entre si e há entre eles um vácuo que não é sem significado,
é “uma pausa visual, plena de ar”, ar que existe na cena e sua existência é
declarada ao refletir a luz. Tal espaço, é o espaço atmosférico.

Neste espaço tem sido utilizado nos últimos anos, a fumaça e a névoa
no palco utilizados para comunicar as distâncias entre os volumes, esta, tem
sido muito utilizada nos últimos anos. Tal espaço entre volumes não se dá
somente por um palco preenchido com fumaça de modo a acentuar o
espaço entre volumes. É preciso observar, como afirma Camargo (2000,
p.68), que os elementos menores se organizam em conjuntos que
distribuem-se em planos distintos, acompanhando a visão do público, há o
plano mais próximo do público, plano médio e posterior, os quais os fatores
que contribuem para uma luz atmosférica também envolvem estes três
planos e o procedimento que a luz irá dar a cada um deles. (CAMARGO,
2000. P.68)

4 – Tendo por base pelo menos uma das cenas apresentadas na


finalização da disciplina, faça uma análise crítica e dissertativa sobre a
relação da luz com os seguintes elementos da cena: espaço; corpo;
texto.

A cena escolhida para esta análise crítica, será a que tenho mais
propriedade para falar enquanto participante do processo, da cena III da
obra “Hotel Jasmin” de Cláudia Barral.

Cena III - Jorge acha que seu então amigo foi humilhá-lo no
restaurante que trabalha, entram numa briga física, Fernando explica a
verdade ao amigo que acredita na sua fala. Fernando conta que vai embora
pra morar com um cliente, Jorge tentar dar outras alternativas para que
ambos pudesse tentar a vida juntos. Fernando se despede, ambos se
despedem emocionados. Jorge aceita a partida do amigo. Finaliza com
Jorge sozinho no quarto fumando um cigarro enquanto a luz se apaga.

Estes eram as circunstâncias dadas no texto. A dramaturgia era


realista, ao definir a cena e conhecer profundamente a história, era
necessário propor a minha versão – olhar – sobre a sucessão de
acontecimentos da cena.

A estética escolhida primeiramente havia sido a linha do realismo mas


com marcas e movimentações e ideias pra cena que pudessem ser
representadas de formas para além do realismo, mas extra-cotidianas.
Pensando-se em trabalhar dentro do realismo fantástico/poético, mas por
motivos de tempo acabou-se excluindo ideias que reforçariam esta temática.
Assim se pensou o processo de criação. Tal opção pelo extra-cotidiano,
pretendia se apoiar na movimentação dos atores e do uso da luz como
aporte para o seguimento desta linha. Pretendia-se contar a história com
uma atuação realista, mas utilizando elementos não reais, um destes
elementos seria o flashback que seria evidenciado pela mudança de luz, em
que acontece duas vezes dentro de dado momento que será falado adiante.
Usamos sonoplastia ao vivo para a intensificação dos momentos
conflituosos e emocionais das personagens dialogando também com uma
luz de

contra, revelando uma silhueta que surgiria na cena apenas quando a


música surgisse na cena e desapareceria assim quando a cena fosse
terminada.

A cena havia sido apresentada e a partir dessa primeira experiência,


algumas dicas foram reforçadas aos atores e algumas mudanças sugeridas,
bem como detalhes na movimentação, na interpretação, e na disposição do
músico em cena – uma vez que também tivemos que o mudar de lugar e o
abajur que anteriormente na primeira apresentação não estava, mas
também dialogaria com uma das cenas, no novo espaço que também nos
proporcionava novas ideias. (A exemplo do mudança da marca do músico
que antes se fazia presente na cena e que agora tinha uma novela
possibilidade que pensamos a partir do dado espaço do casarão Angelus
Novus).

Tal ideia de se chegar ao extra-cotidiano, dar-se-ia por exemplo, pela


movimentação dos atores – como na primeira cena em que durante a
discussão, a movimentação deu-se da seguinte maneira:

Ator 1 acusava e ator 2 seguia-o em tom de explicação, e vice e


versa, em formato circula. Era uma cena em que um julgava o outro e para
isto pensou-se em um caminhar em círculos que tinha paradas dentro da
mesma tensão, e retomava, trazendo movimentação para a briga, onde
tentou-se não criar uma briga real, mas levar um movimento que ressaltasse
o momento de tensão e confrontamento entre os dois. Esta cena acontecia
no centro da cena e era iluminada por dois par32 na ribalta. Fora a
movimentação, os flashbacks, foram recursos de inserções, e as duas
cenas que construímos como flashbacks, eram cenas da obra mas que não
constavam na cena III, mas que ajudariam a situar o público na história e
histórias vividas pelas duas personagems, que era sobre uma amizade entre
um michê e um paraibano evangélico, dividindo um quarto de hotel na
periferia de São Paulo, turbulenta e caótica. Os flashbacks mostravam tanto
o lado caótico dos primeiros momentos dos dois convivendo juntos, quanto
das suas vidas que começavam a mexer com a vida do outro, suas crenças
e a forma de agir do outro que com o tempo e as circunstâncias foram
mudando. Jorge o evangélico que passa a beber constantemente, Fernando
o Michê anti-ético e de personalidade marginal que começa a preocupar-se
com o amigo e a se sentir tocado pela crença cristã do amigo.
A cena dos flashbacks – Dava-se com os dois na janela do hotel, esta janela
foi representada pela luz que não só tinha um papel como iluminante mas
como cenografia da cena. A cada vez que os personagens iam para a
janela, o foco de luz branca do Elipsoidal se abria à direita, tornando-se
signo na cena, onde o facho de luz representava a janela do hotel jasmin,
tantas vezes ressaltada na dramaturgia.

As personagens ao relembrarem ao passo que bebiam juntos de


como fora difícil a convivência anteriormente, nesta cena, haviam duas falas
que serviam de deixa para o flashback, que eram as cenas do roubo do
dinheiro e a cena da bíblia.

Tal conversa foi uma inserção no texto como forma de evidenciar uma
parte da história dos dois personagens convivendo juntos. Na cena da
acusação, em que Jorge percebe que Fernando roubou seu dinheiro e
exige-o de volta, utilizamos um par de ataque com luz vermelha no meio da
cena colocado em ribalta, o vermelho ressaltaria a ideia de agressividade
que continha a cena, as personagens deveria fazer um deslocamento do
facho de luz – janela – para o centro da cena em total mudança de atitude,
de serenos e amistosos, agora a cena se configurava-se em uma cena
agressiva, acompanhada pela sonoplastia que tocava um tipo de música
mais voltada para o rock que pensamos que fosse dialogar perfeitamente
com a interpretação dos atores e a luz de ataque vermelha sobre eles. Essa
luz vermelha de ataque, determinava o início do flashback bem como o fim
deste. Final do flashback, e o foco do Elipsoidal (janela) abria-se novamente
sempre em resistência e os atores prosseguiam a conversa.

Agora teria um novo flashback, mas como encenadora, não queria


que os atores retornassem de novo à janela, então, nesta mesma cena, a
próxima marca era seguir pro centro da cena conversando e a partir de uma
palavra (deixa) sentarem-se ao mesmo tempo de costas – segundo as
marcas ensaiadas, essa ideia de movimentos no mesmo tempo/ritmo
deveria trazer essa ideia de buscar movimentos não cotidianos, não
queríamos um realismo puro, mas sim utilizar outros elementos inseridos a
partir do olhar como encenadora também da cena, pois a atuação era
realista mas as marcas não

( pelo menos era esta a ideia ) porém na apresentação foi uma das marcas
que quase não ficou perceptível - A luz da janela se apagaria e ficaria os
dois par32 direcionados para o centro da cena acesos em resistência, a qual
teria o segundo flashback; a cena da bíblia.

O fato de não requerer que os atores retornassem ao foco da janela


novamente, era para que após a cena da bíblia, a conversa retomasse já no
centro da cena, para que desta marca pudéssemos realizar a cena da
boemia, em que os dois personagens cantam bêbados ao som de uma
música cristã, cena que também foi uma inserção no texto e para a qual,
pensamos na cor azul pois seu caráter de serenidade e pureza – a qual
queríamos trazer para a cena da bíblia, a qual se dava naquele universo tão
caótico da vida das duas personagens, esta foi a primeira ideia, mas a
mesma não seria possível, então utilizamos as duas que já estavam em
cena e diminuímos a intensidade neste momento mais ainda, mas que
funcionou bem e em nenhum momento os atores ficaram obscurecidos. As
marcas e a disposição das luzes nos foi satisfatório para o que queríamos.

Dentro da cena da bíblia, onde o personagem Jorge lê a bíblia para


Fernando, outra inserção foi pensada na ideia de concentrar a ação de
Fernando e ressaltar o sentimento por ele sentido, que seria de volta ao
passado, memórias do abandono da mãe, dos abusos sofridos. Para esta
cena, que é uma cena, dentro de um flashback (cena da bíblia), utilizamos
uma luz de ataque vermelha do lado esquerdo à cena, onde evidenciaria a
personagem do Fernando e também juntamente com a emoção colocada-
que era a de lembranças de amargas memórias da sua infância - utilizamos
também uma quebra de quarta parere quando Fernando indaga o público a
partir do seu texto e o confronta, isto, criaria o diálogo entre corpo, espaço,
luz e texto da cena, contribuindo para um todo, ressaltando a ideia que
queríamos passar, de uma cena serena, com trazendo um caráter de fé
cristã e ao mesmo tempo que revelasse um lado amargo escondido na
personagem, mas evidenciado no seu momento em que a luz vermelha
concentrava-se nele na cena. A sonoplastia novamente vinha trazendo uma
sonoridade dramática e ao mesmo tempo poética.

Nesta cena, o abajur foi acrescentado, de luz amarela e que trazia a


ideia de intimidade, pois as luzes de ribalta ficam em resistência, o elipsoidal
também, dando uma leve claridade no personagem Jorge (do lado direito)
mas que também é iluminado pela luz íntima e aconchegante do abajur. A
ideia de noite deveria ser ressaltada com a entrada do abajur, mas também
não queríamos que a luz do lado direito adentrasse o lado esquerdo. Nesse
momento, queríamos focar apenas as personagens, o que lia iluminado pelo
abajur, e o que reagia à leitura, confrontado pelas palavras, o qual sobre ele
tínhamos uma luz de ataque vermelha, como foi dito anteriormente.

A cena contava, com dois focos de luz em cada ator, de cada lado do
espaço, com dois refletores garantindo a iluminação do centro da cena
escapando também para os lados, mas não completamente, com uma luz de
ataque vermelha de ribalta do lado esquerdo, uma de ataque vermelha de
ribalta focando o centro da cena, um elipsoidal do lado direito superior como
cenografia da janela do hotel, o abajur do lado esquerdo, e um refletor de luz
branca como luz de contra atrás do músico o qual colocamos atrás da porta
sobre a escada, para criar um contorno em sua imagem. Tirar o músico da
cena, e colocá-lo atrás da porta evidenciando sua silhueta com o violão, foi
pensado após a primeira apresentação, quando se percebeu que a presença
do músico com um foco de luz o tempo inteiro nele – ou seja, presente na
cena do começo ao fim – quebrava com a intimidade da cena, dos
flashbacks, da cena como um todo. Mas também não se pensava em
colocá-lo escondido apenas fazendo a sonoplastia. A ideia era mostrar que a
sonoplastia era feita ao vivo mas sem quebrar com a intimidade da cena. Ter
colocado nesta disposição, atrás de uma porta com furos, fazia-o participar
da cena, sem quebrar com a intimidade das personagens, mas em outra
dimensão, ele estava lá, mas fora da cena, e a luz foi a base fundamental
para a concepção da ideia, pois ela é quem revelava que a sonoplastia
acontecia no momento presente, e não que era uma gravação.

Para cada cena, pensou-se numa luz que refletisse para o espectador
a atmosfera que queríamos causar, seja a de tensão, a de tristeza, a de
partida, a de uma briga e o uso dos flashbacks trouxeram maior dinâmica à
cena como um todo. Os elementos de cena eram poucos, mas necessários,

de resto, o texto, corpo e luz dialogaram de forma satisfatória e de acordo


com aquilo que pretendíamos. Algumas coisas não conseguimos alcançar,
por conta de que teríamos que dispor de mais ensaios e mais marcas com
as cadeiras, por exemplo, para as quais tínhamos pensado numa proposta
rítmica para com estas, o levantar, o sentar, o deslocar-se com as cadeiras e
o sentar novamente, esta ideia não conseguimos alcançar, mas que mesmo
assim não influenciou na qualidade da cena, apenas para nós que
conhecíamos todas as marcas da cena.

Para esta segunda apresentação, avaliamos como uma versão


melhorada da primeira. Todas as ideias foram melhoradas, e ressalto a luz
de contra no músico atrás da porta como um elemento insubstituível para o
qual havia pensado, mas que pela possibilidade do próprio espaço, pudemos
trazer uma ideia com uma potência muito mais interessante à cena,
utilizando a ferramenta da luz, que trouxe uma atmosfera de um
acontecimento no momento presente mas de fora da cena (neste caso, o
espaço de atuação dos atores), mas dialogando com ela não interferindo em
sua intimidade, e tal diálogo só foi possível não pela musicalidade
executada, mas pela possibilidade que trouxe a luz de unir dois
acontecimentos em espaços diferentes, em consonância entre si.

Referêncial teórico:

CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz, Sorocaba, SP: ed:


TCM Comunicação, 2000.

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