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PRÁTICASPEDAGOGICAS
política, Currículo e espaço escolar
(e_>O>G)
e
junqueira&marin
editores
5
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Coordenação: Prof. Dr. Dinael Marin
Produção: ZEROCRIATIVA
Revisões: Fabiana Abi Rached de Almeida
Impressão: Gráfica Viena
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Conselho Editorial da Junqueira&Marin:
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
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P925
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-86305-89-4
05.05.11 06.05.11
026160
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Pessoal de Nível Superior por meio do PROCAD – Programa Nacional de Cooperação
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Proibida a reprodução total ou parcial desta edição, por qualquer meio ou forma, em
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da editora.
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Impresso no Brasil
5
Printed in Brazil
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e SUMÁRIO e
Apresentação
11 Maria Helena
Heloisa SallesMichels
Gentil
PARTE I
POLÍTICAS E PRÁTICAS EDUCACIONAIS
CAPÍTULO I
Quatro teses sobre política de formação de
21 professores
Maria Helena Michels
Eneida Oto Shiroma
Olinda Evangelista
CAPÍTULO II
O fracasso escolar das crianças
41 migrantes no Japão: as políticas
educacionais em discussão
Izumi Nozaki
CAPÍTULO III
A educação infantil no contexto
75 pós-reforma: institucionalização e
regulação no Brasil e na Argentina
Roselane Fatima Campos
CAPÍTULO IV
uma das alternativas
Avaliação institucional
departicipativa:
97 (re)construção da
emancipação nos espaços educacionais
Elizeth Gonzaga dos Santos Lima
8
PARTE II
CURRÍCULO E FORMAÇÃO
NO ENSINO SUPERIOR
CAPÍTULO V
Interdisciplinaridade
no curso
uma prática
de pedagogia:
de difícil construção
131 Ilma Ferreira Machado
Irton Milanesi
CAPÍTULO VI
Educação da pequena infância: um olhar
151 sobre a formação inicial dos professores
de educação infantil
Moema Helena Koche de Albuquerque Kiehn
CAPÍTULO VIII
Escola e formação escolar:
reflexões a partir da produção dogrupo de
195 trabalho
(2000–2005)
educação fundamental daANPEd
Solange Aparecida da Rosa
Maria Isabel Batista Serrão
CAPÍTULO IX
Elementos políticos e pedagógicos em
217 cartilhas escolares italianas
Claricia Otto
8
CAPÍTULO
A
pedagógica:
sombra da
X um estudona
violência das
relação
representações
Fazeres na XI
CAPÍTULO pré-escola:
CAPÍTULOna
Mediação XIIprática pedagógica de
professores dos ciclos iniciais do ensino
fundamental
287 Tatiane Lebre Dias
Sônia Regina Fiorim Enumo
Mirian da Silva Marinho Moreira
Fabiana Muniz Mello Félix
CAPÍTULO XIII
Escola, multiplicidade e desejo:
305 agenciamentos necessários
Maritza Maciel Castrillon Maldonado
321
331 NOTAS
SOBRE OS AUTORES
8
U APRESENTAÇÃO V
9 junqueira&marin editores 9 11
APRESENTAÇÃO PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
questões educacionais, com o compromisso de promover um
diálogo a partir de interrogações a respeito da articulação entre
teoria e prática, questão tão cara à área da educação. Análises a
respeito das práticas pedagógicas, tanto em nível de educação
básica como superior, exigem uma leitura mais ampla da
realidade em que estão inseridas na tentativa de compreendê
las. Com esse intuito, apresentamos, neste livro, estudos a
respeito de políticas, currículos, espaços escolares que possuem
como eixo articulador a prática pedagógica, entendendo-a, com
base em Bernstein (1996), tanto como aquela explicitamente
apresentada, a pedagogia visível, quanto àquela que não se
manifesta a priori, mas que organiza a escola e seus fazeres, a
pedagogia invisível.
A parte 1 aborda o tema Políticas e Práticas
Educacionais, apresentando análises de políticas educacionais
que orientam determinadas práticas pedagógicas. A parte 2,
Currículo e Formação no Ensino Superior, concentra os estudos
acerca de currículos como expressões de relações pedagógicas
e seus determinantes. A terceira parte, Escolas e Relações
Pedagógicas, reúne as discussões referentes ao espaço escolar
como lugar privilegiado das ações pedagógicas.
Sabemos que as relações analisadas por esses
estudos e pesquisas são amplas e, portanto, não serão esgotadas
aqui. Porém, temos a clareza das contribuições que essa
reflexão sobre as práticas pedagógicas pode trazer para a área
educacional.
No primeiro capítulo do livro, quatro textos têm o
propósito de articular as discussões entre Políticas e Práticas
Educacionais. O primeiro texto intitulado Quatro teses sobre
política de formação de professores, de Maria Helena Michels,
Eneida Oto Shiroma e Olinda Evangelista, apresenta pesquisas
desenvolvidas no Grupo de Estudos sobre Política Educacional e
Trabalho (GEPETO/UFSC), referentes à formação de professores.
Situados no campo da política educacional, tais estudos utilizam
12 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar APRESENTAÇÃO
referenciais teórico-metodológicos desenvolvidos por autores
como Ball, Fairclough, Ozga e Neves. As autoras sintetizam
as investigações sobre formação docente em quatro teses:
1ª) profissionalização como estratégia de (con)formação
docente; 2ª) desintelectualização do professor; 3ª) certificação
de professores e 4ª) reconversão docente. Essas teses são
analisadas, também, no que concerne ao ensino fundamental, à
educação infantil e à educação especial.
O texto de Izumi Nozaki, O fracasso escolar das
crianças migrantes no Japão: as políticas educacionais em
discussão, busca compreender a relação entre o que a autora
denomina de “duplo movimento”: de crescimento gradativo no
número de matrículas de crianças brasileiras em idade escolar
nas escolas públicas japonesas e de evasão escolar desses alunos.
Para tanto, apresenta o contexto da migração de brasileiros
para o Japão, evidencia aspectos da política educacional
japonesa, analisa especialmente a política curricular e apresenta
informações a partir de uma escuta sensível das crianças
brasileiras estudantes no Japão. Os resultados de sua pesquisa
apontam para as relações entre obrigatoriedade escolar e
aprovação automática, permeadas pela questão da diversidade
cultural e linguística, e entre escola e trabalho. Para desenvolver
suas análises, a autora se fundamenta em autores como Berquó,
Tajima, Sacristán, entre outros.
Com o intuito de contribuir com os estudos sobre
as novas regulações no campo da Educação Infantil, Roselane
Fatima Campos apresenta A educação infantil no contexto pós
reforma: institucionalização e regulação no Brasil e na Argentina,
buscando discutir os novos marcos regulatórios que orientam a
Educação Infantil, especificamente no Brasil e na Argentina. A
autora procura explicitar as estratégias políticas adotadas por
intermédio de dados referentes aos dois países, no que tange ao
atendimento das crianças de 0 a 3 anos, destacando as novas
configurações que orientam as relações entre o Estado e a esfera
9 junqueira&marin editores 9 13
APRESENTAÇÃO PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
privada, constituída especialmente pelas chamadas instituições
sem fins lucrativos. Em sua perspectiva, as novas configurações
do campo da Educação Infantil vêm tornando os limites entre
público e privado, o formal e não formal, cada vez mais tênues.
Para tais análises, a autora recorre especialmente às obras de
Ball e Maroy.
A produção de Elizeth Gonzaga dos Santos Lima,
intitulada Avaliação institucional participativa: uma das
alternativas de (re)construção da emancipação nos espaços
educacionais, mostra uma clara articulação entre política e
prática avaliativa. A autora apresenta uma discussão conceitual e
teórica referente à perspectiva da participação e da emancipação
e um debate sobre o Estado avaliador. Este texto aponta para a
importância de se usar os resultados da avaliação institucional
como estratégias de (re)organização dos espaços institucionais
a fim promover mudanças individuais, coletivas e institucionais,
sob a lógica da emancipação. Conceitos como espaço social e
habitus de Bourdieu e emancipação de Freitas são basilares para
a discussão proposta.
Na segunda parte, apresentamos discussões
concernentes a Currículo e Formação no Ensino Superior por
meio de análises a respeito de práticas pedagógicas no Ensino
Superior, no curso de Pedagogia e demais licenciaturas.
Ilma Ferreira Machado e Irton Milanesi, no texto
Interdisciplinaridade no curso de pedagogia: uma prática de difícil
construção, trazem uma reflexão sobre a interdisciplinaridade a
partir da realidade do Curso de Pedagogia da Universidade do
Estado de Mato Grosso, Campus Jane Vanini, Cáceres-MT. Com
as contribuições de autores como Jantsch; Bianchetti, Milanesi,
Frigotto, analisam documentos do curso e entrevistas com alunos
e apresentam como uma das conclusões a ideia de que para que se
concretize a interdisciplinaridade três fatores são fundamentais:
profissionalidade docente, forma de organização do trabalho
pedagógico e gestão escolar. Além disso, a participação dos
14 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar APRESENTAÇÃO
acadêmicos é considerada extremamente relevante, uma vez
que eles se inserem nessa relação em uma dupla dimensão:
estão em processo de formação e são formadores em potencial.
O texto de Moema Helena Koche de Albuquerque
Kiehn, intitulado Educação da pequena infância: um olhar sobre
a formação inicial dos professores de educação infantil, contribui
com o debate referente à formação de professores das crianças
pequenas nos cursos de Pedagogia. Para tanto, analisa currículos
de cursos oferecidos em dezesseis universidades federais
brasileiras, por intermédio de três eixos: Fundamentos Teóricos,
Metodologias e Prática. Rocha, Sacristán, Popkewitz, Moreira e
Silva são autores que sustentam suas análises.
Contribuindo também com a discussão sobre
formação de professores, o texto Experiências de estagiários
de licenciaturas: as relações entre a universidade escola, de
Heloisa Salles Gentil, traz a visão dos alunos de três cursos
de licenciatura - História, Matemática, Computação - de uma
universidade pública brasileira sobre os estágios. Analisando as
orientações legais para a realização de estágios, os documentos
dos cursos e entrevistas com alunos, a autora busca, baseada
em autores como Pimenta, Marcondes e Veiga, perceber a
relação entre universidade e escola presentes nesse momento
específico da formação de professores. Suas conclusões indicam
que, apesar de ser fundamental para a formação do professor,
o momento do estágio tem privilegiado as ações de regência,
em especial conteúdos e métodos de ensino, mas as relações
entre a universidade e a escola têm sido pouco consistentes, não
contribuindo para uma verdadeira relação dialógica.
A terceira parte, Escolas e Relações Pedagógicas,
compõe-se de seis textos que tomam o espaço escolar como
local privilegiado para as análises das relações pedagógicas.
O primeiro deles, de autoria de Solange Aparecida da Rosa e
Maria Isabel Batista Serrão, intitulado Escola e formação escolar:
reflexões a partir da produção do grupo de trabalho educação
9 junqueira&marin editores 9 15
APRESENTAÇÃO PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
fundamental da ANPEd (2000-2005), apresenta uma análise
referente a trabalhos apresentados nas reuniões da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd),
buscando perceber como são concebidas e tratadas as categorias
“escola” e “formação escolar”. Tais trabalhos, oriundos do Grupo
de Trabalho “Educação Fundamental”, referem-se ao período
entre 2000 e 2005. Warde, Davídov e Canário são bases para as
análises desenvolvidas pelas autoras, que observam a relação
entre formação de professores e o que se produz academicamente
sobre tal tema.
Claricia Otto com o seu artigo Elementos políticos
e pedagógicos em cartilhas escolares italianas nos possibilita
pensar as tensões entre educação, sociedade e cultura mediadas
pelo ensino. Toma como fonte principal uma cartilha italiana
intitulada “A menina italiana na escola”, usada nos três Estados
do Sul no final do século XIX e início do XX. A autora leva-nos
inferir que a função social das escolas da época consistia em
afirmar os valores de determinada cultura - a italiana, a fim
de legitimar o pertencimento a ela. Bourdieu, Frago e Forquin
foram alguns autores que subsidiam suas análises.
O texto A sombra da violência na relação pedagógica:
um estudo das representações de dirigentes e professores de
escolas de ensino fundamental e médio, de Emília Darci de Souza
Cuyabano,abordaas possíveislidasde gestorese professorescom
a violência e a articulação de tais ações na relação pedagógica.
Tendo Gilbert Durand, Michel Maffesoli e Paula Carvalho como
seus principais aportes teóricos, a autora indica que, para
professores e dirigentes, o imaginário heróico e o imaginário
místico são as matrizes das práticas e das representações sobre
a violência.
Maria Izete de Oliveira e Rinalda Bezerra Carlos,
em seu texto Fazeres na pré-escola: uma prática consistente?,
discutem a prática pedagógica das professoras envolvendo duas
temáticas específicas da educação infantil: o movimento e a
16 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar APRESENTAÇÃO
linguagem oral e escrita. Vygotsky, Arce e Martins são alguns dos
autoresque contribuem com asanálisesapresentadas.Asautoras
sintetizam suas análises indicando que as práticas pedagógicas
das professoras se fundamentam ora numa concepção de pré
escola como um momento de passatempo, ora como preparação
da criança para o Ensino Fundamental, não há intencionalidade
em trabalhar movimento e linguagem de forma a propiciar as
aprendizagens necessárias.
O texto intitulado Mediação na prática pedagógica
de professores dos ciclos iniciais do ensino fundamental, de
autoria de Tatiane Lebre Dias, Sônia Regina Fiorim Enumo,
Mirian da Silva Marinho Moreira e Fabiana Muniz Mello Félix,
possibilita-nos perceber critérios que, segundo a Teoria
da Modificabilidade Cognitiva Estrutural e o conceito de
Experiência de Aprendizagem Mediada, poderiam organizar
as análises referentes às ações pedagógicas: Intencionalidade;
Transcendência; Competência/Regulação na tarefa;
Competência/Elogiar-encorajar e Responsividade contingente.
Estudando o contexto de quatro professoras do primeiro e
segundo ciclos do Ensino Fundamental de uma escola pública
em Mato Grosso, as autoras observaram a pertinência da escala
para avaliação da Experiência de Aprendizagem Mediada
denominada Mediated Learning Experience (MLE) Rate Scale
(Escala de Avaliação da Experiência de Aprendizagem Mediada).
Suas análises são subsidiadas por estudos de autores, como
Fonseca, Lidz, Tzuriel e Haywood & Tzuriel.
Por fim, as contribuições de Maritza Maciel
Castrillon Maldonado, no texto Escola, multiplicidade e desejo:
agenciamentos necessários, apresenta uma discussão a respeito
do processo de subjetivação de crianças a partir de questões
sobre a possibilidade de conciliação entre escola, multiplicidades
e desejos. A autora tem como interlocutores principais Walter
Benjamin, Michel Foucault, Gilles Deleuze e Felix Guattari. A
narrativa de uma vivência escolar exemplifica a disciplinarização
9 junqueira&marin editores 9 17
APRESENTAÇÃO PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
dos saberes e do corpo como resultado das práticas pedagógicas
escolares e a análise da autora coloca em questão o papel dos
educadores.
Assim, acreditamos que a leitura desse livro
contribuirá com as reflexões necessárias acerca de questões
educacionais contemporâneas, especialmente por apresentar
como eixo as práticas pedagógicas sem, contudo, ater-se a um
nível de ensino. Os temas apresentados buscaram apresentar
o entrelaçamento existente entre as políticas, as práticas, os
contextos em que se desenvolvem e também as possibilidades
de análise e compreensão da realidade educacional sob várias
perspectivas teórico-metodológicas. 3
18 9 junqueira&marin editores 9
L
PARTE I
POLÍTICAS E PRÁTICAS
EDUCACIONAIS
U PARTE
POLÍTICAS I
E PRÁTICAS V
EDUCACIONAIS
i CAPÍTULO I j
QUATRO TESES SOBRE POLÍTICA
DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Introdução
O
de formação de professores
apresentar algumas
presente texto
desenvolvidas
análises
tem como objetivo
sobre a política
pelo Grupo de
Estudo sobre Política Educacional e Trabalho (GEPETO), da
Universidade Federal de Santa Catarina. Discutir política de
formação de professores é um desafio considerando os muitos
aspectos e dimensões relacionados ao tema. Para contribuir
com tal debate, optamos por apresentar algumas das teses
desenvolvidas pelo GEPETO concernentes à formação docente.
O GEPETO foi criado em 1996 e é constituído por
professores e alunos de doutorado, mestrado e graduação que
buscam novos referenciais para análise de documentos, tendo
em vista embasar os estudos que desenvolve relacionados à
política educacional e trabalho. As pesquisas realizadas pelo
grupo podem ser agrupadas em cinco grandes linhas: educação
9 junqueira&marin editores 9 21
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
e inclusão; formação, gestão e profissionalização de educadores;
inserção profissional, trabalho e educação; política e reforma
educacional e trabalho docente.
Os estudos acerca da formação referem-se ao
âmbito do Ensino Superior focando, principalmente, o Curso
de Pedagogia e sua relação com a Educação Básica. Dentre as
temáticas mais investigadas pelo grupo, estão as da formação de
professores para as séries iniciais do Ensino Fundamental, para a
Educação Infantil e para a Educação Especial. Situados no campo
da política educacional, tais estudos utilizam referencial teórico
metodológicodesenvolvidosporautores,comoBall(2007,1994),
Fairclough (2001), Ozga (2000), Neves (2005), entre outros.
Ademais, Gramsci e Thompson são referências importantes
nas pesquisas empreendidas. As investigações sobre formação
docente produzidas nesta década podem ser sintetizadas
em quatro teses, quais sejam: 1ª) profissionalização como
estratégia de (con)formação docente; 2ª) desintelectualização
do professor; 3ª) certificação de professores de resultado e 4ª)
reconversão docente. Pretendemos evidenciar que essas teses
relacionam-se pelo eixo da política educacional de modo que
permitem reconhecer os contornos da proposição de formação
de professores no Brasil, hoje. De outro lado, as três últimas
teses podem ser vistas como desdobramentos da primeira, isto
é, da problemática da profissionalização docente. Para discutir
cada uma delas, neste artigo, elegemos uma produção do grupo
referente às mesmas. Com isso não temos a pretensão de esgotar
os debates sobre formação nessas produções, mas procuramos,
por intermédio delas, auxiliar nesse debate.
1ª Tese:
profissionalização como estratégia
de (con)formação docente
A primeira tese a ser apresentada vem sendo
desenvolvida, principalmente, por Shiroma e Evangelista
22 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
(2003)⁴. As autoras partem do pressuposto de que a
racionalidade presente na reforma educacional dos anos de
1990 assume claramente a perspectiva gerencial norteadora da
Reforma do Estado. Segundo Oliveira (2004), o principal traço
dessa política é a tentativa de modernização administrativa do
aparato público, processo que demanda esforços na direção da
profissionalização do funcionalismo.
O conceito de “profissionalização” ganhou priori
dade na política educacional brasileira, entretanto não recebeu
proporcional atenção por parte dos pesquisadores. Para Shiro
ma e Evangelista (2003, p. 269),
9 junqueira&marin editores 9 23
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
Estado gerir o quadro do magistério que deve ser controlado.
“Ou seja, essa política está menos relacionada à qualificação
docente e mais ao controle do professor, forjado sob a designação
de ‘novo’ profissional, responsável, competente e competitivo”
(SHIROMA; EVANGELISTA, 2003, p. 271-272).
Neste sentido, podemos perceber o papel estratégico
que o diretor de escola assume nos documentos nacionais e
internacionais. Para as referidas autoras, ao diretor é atribuída
a função de
24 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
orçamento e satisfazer os clientes e 3. habilidade de agir de
forma empreendedora (SHIROMA; EVANGELISTA, 2003, p. 274).
Na perspectiva gerencial, a gestão escolar converte
se em estratégia pela qual os líderes escolares mantêm a
burocracia da organização para assegurar seu poder e controle
sobre a escola, mais do que para ajudar seus membros a
realizarem seus propósitos (SHIROMA; EVANGELISTA, 2003)⁵.
As autoras indicam que, quando se implementa a
profissionalização do magistério, promove-se o consenso em
torno de uma demanda que é histórica da categoria, qual seja, a da
formação em nível superior e a da maior qualificação profissional
dosdocentes. Neste sentido, a qualidade de ensino é almejada por
todos os segmentos: professores em busca de aprimoramento e
desenvolvimento profissional; diretores em busca de eficiência
para que seu estabelecimento apresente melhores resultados
nas avaliações; sindicatos na luta por melhores condições de
trabalho, plano de carreira, status e remuneração; empresários
que realizam ações de “responsabilidade social” investindo em
educação; políticos que podem gabar-se de terem implantado
políticas de profissionalização.
Porém, esse mesmo consenso poderá promover
a segmentação da categoria, pois tem como cerne de sua
proposta a meritocracia, a avaliação por desempenho de alunos
e professores para o estabelecimento de rankings e o pagamento
por produtividade. Tais encaminhamentos não conduzem à
propalada “eficiência coletiva”.
Para Shiroma e Evangelista (2003, p. 277),
9 junqueira&marin editores 9 25
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
para administrar conflitos, forjar consensos, estabelecer
meritocracia, salários diferençados, condições para o
gerenciamento do imenso contingente de professores.
2ª Tese:
a desintelectualização do professor
Corroborandoastesesapresentadas,Shiroma(2003)
vem desenvolvendo análises sobre o eixo desintelectualização
do professor⁶. Em seu exame, a autora indica que a reforma
educacional, não somente no Brasil, baliza-se por alguns
conceitos que buscam construir o consenso em torno de sua
necessidade e de seus conceitos centrais. A autora destaca os
conceitos de competência, excelência, mérito, produtividade e
sua capacidade de seduzir os profissionais da educação. Segundo
Shiroma (2003, p. 3),
26 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
A dificuldade de se contrapor a este discurso deve-se ao fato
de que inseridos na “cultura da avaliação” implementada nas
instituições educacionais durante os governos de FHC, estes
termos adquirem tal valoração positiva que ninguém quer
ser identificado com os antônimos: incompetente, medíocre,
improdutivo. Ademais, a retórica da reforma encontra um
terreno fértil em meio aos apaixonados pelo conhecimento,
saber, pelo trabalho acadêmico.
9 junqueira&marin editores 9 27
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
nos moldes em que vem sendo implantada, tem por objetivo
não a qualificação do quadro do magistério, mas a sua
desintelectualização. Essa seria a via mais rápida de torná-los
pragmáticos, diminuindo-lhes a capacidade de intervenção
crítica consciente.
Convém salientar que essas são recomendações
que estão – não explicitamente – inscritas nas indicações de
organismos internacionais com o intuito de criar uma “nova
cultura organizacional” para a escola. Tal cultura estaria
marcada pelo aumento da disputa, pelo individualismo e pela
pseudo cooperação entre os profissionais da educação. Nessa
perspectiva, a escola seria transformada em espaço “acolhedor”
dos segmentos “vulneráveis”, que poderiam pôr em risco os
interesses dominantes de reprodução da ordem capitalista.
Por que, então, a centralidade da política está no
professor? Certamente não é para promover habilidades e
competências nos profissionais da educação, mas – ao que tudo
indica – para formá-los tendo em vista a preparação das novas
gerações lastreada em valores que perpetuem as relações sociais
capitalistas.
3ª Tese:
certificação de professores de resultados
28 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
enfraquecimento dos sindicatos de professores – e mesmo sua
extinção – e de uma “cultura de avaliação” que culpabiliza os
professores pelo fracasso dos alunos e deles próprios. Exime
se, dessa maneira, o Estado de sua responsabilidade sobre as
diretrizes políticas e os percursos que produziram os problemas
educacionais (SHIROMA; SCHNEIDER, 2008).
As autoras destacam que o projeto de certificação de
professores vem sendo defendido desde 1990 pelos educadores
ligados à social-democracia no Brasil, como é o caso de Mello
(2000). Para a autora, a certificação de competências
9 junqueira&marin editores 9 29
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
por agências internacionais. Destacam, por exemplo, que, para
o Banco Interamericano de Desenvolvimento, “[...] melhorar a
aprendizagem dos alunos pressupõe melhorar a qualidade do
ensino, o que inclui realizar reformas na formação inicial dos
docentes, introduzir avaliações e exames de licença” (BID, 2005
apud SHIROMA; SCHNEIDER, 2008, p. 13). Ao mesmo tempo, o
BID reconhece que a capacitação em serviço não tem resultado
em melhoras significativas na sala de aula. Segundo o BID, esses
resultados estariam relacionados ao fato de que, no Chile e no
Brasil, por exemplo, os cursos de formação contêm muita teoria
e pouco ensino de técnicas e de métodos de ensino (SHIROMA;
SCHNEIDER, 2008, p. 13).
Na mesmalinha, asautorasapresentamodocumento
do Banco Mundial intitulado Brazil: Teachers Development and
Incentives: A Strategic Framework, publicado em 2000. O Banco
também afirma que a qualidade da educação no Brasil não é boa
porque os cursos de formação de professores são deficientes.
O BM “considera que a formação inicial é ineficiente, pois os
cursos ofertados pelas Escolas Normais são academicamente
fracos e aqueles ofertados por universidades são excessivamente
teóricos” (BM apud SHIROMA; SCHNEIDER 2008, p. 14).
As autoras concluem seu trabalho afirmando que
30 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
uma nova ordem social, precisamos reforçar em nossos cursos
de formação inicial e/ou continuada de professores: justamente
a formação teórica, a natureza científica, a perspectiva da práxis
e a dimensão política da formação do professor (SHIROMA;
SCHNEIDER, 2008, p. 16-17).
4ª Tese:
reconversão docente
Analisando principalmente a Resolução nº 1/2006
(BRASIL, 2006) – Diretrizes Curriculares para o Curso de
Pedagogia (DCNP), Evangelista (2006) elabora a tese da
reconversão do trabalho docente no Brasil¹⁰. Para a autora
(EVANGELISTA, 2006, p. 5),
As discussões sobre “reconversão docente” têm-se estruturado,
principalmente, em torno da idéia de que, dadas algumas
9 junqueira&marin editores 9 31
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
condições objetivas – falta de professores em algumas áreas,
sobra de professores em outras, formação continuada –, os
docentes deveriam aceitar mudanças em sua área de atuação
original.
32 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
teórico-prático e extensivas “no acessório, isto é, se dilatam em
múltiplas e reiterativas referencias à linguagem hoje em evidência”
(2007, p. 127).
Nessa perspectiva, o saber fazer tomaria o lugar
do esforço teórico em conhecer (MORAES, 2004). Sem sombra
de dúvidas, o professor precisa saber como desenvolver
suas atividades em sala de aula. Porém, como prescindir do
conhecimento para tal atividade? Para Duayer (apud MORAES,
2004, p. 17), “em um mundo cada vez mais complexo teorizar é
um imperativo da prática”.
9 junqueira&marin editores 9 33
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
seus contratos temporários e os que são efetivos. Além disso,
dividem-se entre aqueles que atuam nas creches e aqueles que
trabalham nas pré-escolas. Tal divisão confere um determinado
status social diferente além de apresentar distinções em termos
de salários, de formação e de carreira¹¹.
Ademais, entre os docentes da Educação Infantil,
há outra distinção que parece passar despercebida por muitos
e sobre a qual Campos (2008) chama atenção sobre a existência:
auxiliares de classe, atendentes ou monitoras. Essas assumem,
por vezes, um papel de menor destaque na divisão de trabalho
nas classes de Educação Infantil; muitas vezes pertencem
ao quadro da administração civil e não são consideradas
professoras, embora desenvolvam suas atividades diretamente
com as crianças¹².
Essa maneira de organizar a Educação Infantil, que
dá nova forma e conteúdo às funções pedagógicas, parece justificar
a intensificação e precarização do trabalho docente nessa etapa
da educação.
Ao mesmo tempo em que se observa a precarização
e intensificação do trabalho docente, percebemos a exigência de
formação sem uma de política de formação docente:
34 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
Curso de Pedagogia, dentre essas, as responsáveis pela formação
dos professores para atenderem os alunos com deficiência.
Com tal modificação, podemos observar que, na maioria das
universidades públicas do país, houve reorganização das grades
curriculares, extinguindo-se as habilitações, mantendo-se
disciplinas específicas da área (na maioria delas, uma disciplina
de Fundamentos de Educação Especial)¹³.
Especificamente relacionada à formação docente
para atender alunos com deficiência, a Resolução n. 1 afirma, no
Artigo 5º, que os egressos do Curso de Pedagogia deverão estar
aptos a:
9 junqueira&marin editores 9 35
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
Em 2008, a Secretaria de Educação Especial do MEC
lança a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (BRASIL, 2008, p. 17-18) na qual apresenta
encaminhamentos sobre a formação de professores e indica que
36 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
nos documentos aqui referidos como na pesquisa realizada nos
municípios catarinenses¹⁴, que há uma centralização em três
grandes estratégias de organização dessa formação, quais sejam:
a base instrumental, a gestão do sistema para torná-lo inclusivo
e o ensino a distância como o mais adequado para tal formação.
Diante de tais evidências, algumas questões
emergem: o que podemos pensar sobre a formação e as
funções do chamado professor dos serviços especializados em
uma perspectiva gerencial? Seria este um gestor dos recursos
pedagógicos especializados? A formação desse especialista
suporia a constituição de um facilitador de vivências inclusivas?
Se a tese da reconversão do trabalho docente se
confirma para a área de Educação Especial, juntamente com
estas três estratégias, podemos pensar que a este professor
está reservada a tarefa de fazer a inclusão, sem garantir, porém,
o processo de escolarização a uma parte dos sujeitos excluídos
historicamente. A quem interessa esta perspectiva de inclusão?
De que modo os organismos multilaterais influenciam na
formulação e implantação das políticas de inclusão e de formação
docente no Brasil? Como a atual política de profissionalização
docente concorre para reconversão dos professores a fim de
viabilizarem a referida inclusão? A que projeto histórico se
vincula?
Estas são algumas das questões derivadas das
pesquisas realizadas nos últimos anos pelos pesquisadores do
GEPETO¹⁵ relativas à formação de professores no Brasil. Não
tivemos a pretensão de apresentar todas as facetas da política
de formação docente no país. Apenas pretendemos contribuir
para a discussão sobre um tema tão abrangente e central na
política educacional brasileira como é o da formação docente
por intermédio das teses aqui apresentadas. 3
9 junqueira&marin editores 9 37
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
Referências
38 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar CAPÍTULO I
EVANGELISTA, O. Almas em Disputa. Reconversão do docente pela
ressignificação da educação. Projeto PQ/CNPq 2006-2010. Florianópolis:
EED/CED/UFSC, 2006.
INEP. EFA 2000. Educação para Todos: avaliação do ano 2000, Informe nacional,
Brasil / Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, 1999.
MELLO, G.N. de. Política e gestão do sistema de ensino no Brasil após a LDB:
a prioridade da formação inicial de professores para a educação básica. Mar.
2000. (Mimeo).
9 junqueira&marin editores 9 39
CAPÍTULO IPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar s
MICHELS, M. H. O instrumental, o gerencial e a formação à distância:
estratégias para a reconversão docente na perspectiva da Educação Inclusiva.
In: V Seminário Nacional de Pesquisa em Educação Especial: formação de
professores em foco. CD-rom. São Paulo, 2009.
40 9 junqueira&marin editores 9
U PARTE
POLÍTICAS I
E PRÁTICAS V
EDUCACIONAIS
i CAPÍTULO II j
O FRACASSO ESCOLAR DAS CRIANÇAS MIGRANTES NO
JAPÃO: AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM DISCUSSÃO
Izumi Nozaki
Introdução
9 junqueira&marin editores 9 41
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
parciais deste estudo exploratório e multirreferencial sobre
a evasão escolar desenvolvido junto a crianças e adolescentes
brasileiros inseridos nas escolas públicas japonesas de nível
primário e ginasial.
42 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
de assegurar sua sobrevivência e manutenção. Assim, no
mundo globalizado, quando, de um lado, há a “necessidade de
população” devido à falta de força humana produtiva e, de outro,
a “necessidade de trabalho” devido à superpopulação, esta
combinação de carências inspira, de acordo com Berquó (2001,
p. 11), os fluxos migratórios de reposição populacional.
Neste contexto, o Brasil, apesar de seu crescimento
econômico nos últimos anos, por ser um país com uma população
de baixa escolaridade relativamente numerosa, com altos índices
de desemprego e com uma reforma na Previdência Social,
que conduz a um quadro em que “o trabalhador aposentado
continua trabalhando” (FREITAS, 2001, p. 528), posiciona-se no
bloco dos países em desenvolvimento. E, nesta posição, participa
do processo de reposição populacional por meio da migração
de brasileiros, em sua grande maioria, para países do primeiro
bloco e para o trabalho com baixa exigência de escolarização e
qualificação.
Como um país de emigração, o Ministério das
Relações Exteriores do Brasil (2001, p. 95), na virada do milênio,
identificou mais de um milhão e meio de brasileiros vivendo no
exterior, sendo que as maiores concentrações se encontravam
nos Estados Unidos, com 750 mil, no Paraguai, com 350 mil, e no
Japão, com 220 mil brasileiros.
Com relação ao movimento migratório de
brasileiros para o Japão, segundo Tajima (2005, p. 15-16), este
é constituído de três fases distintas, tendo seu início ocorrido
devido “à falta crônica de mão-de-obra não qualificada” e a partir
da necessidade de sua “importação de países onde há excesso
de força de trabalho dessa natureza”. Assim, a primeira fase,
marcada por dois movimentos diferentes, iniciou-se na década
de 1980 e caracterizou-se pela entrada de milhares de pessoas
da 1ª geração de japoneses natos residentes em regiões agrícolas
de países latino-americanos, notadamente do Brasil e Peru, que
almejavam acumular capital e saldar dívidas contraídas no país
9 junqueira&marin editores 9 43
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
residente. O segundo movimento teve início na segunda metade
da década de 1980 e caracterizou-se pela chegada de pessoas da
1ª geração oriundas de áreas urbanas.
A segunda fase, explica Tajima, começou com o
advento da reforma da Lei de Controle de Entradas e Saídas e
de Reconhecimento de Refugiados, homologada em 1° de junho
de 1990, a qual concedeu, aos descendentes de japonês e aos
seus cônjuges e filhos, o direito à entrada e permanência no país,
por três anos ao nissei (2ª geração) e por um ano ao sansei (3ª
geração), com possibilidade ilimitada de prorrogação. Esta fase
caracterizou-se, portanto, pela imigração de nisseis e sanseis de
ambos os sexos, entre 20 e 30 anos de idade, seus cônjuges e
filhos com ou sem ascendência japonesa. Finalmente, a terceira
fase começou em meados da década de 1990, quando ocorreu
a piora do desemprego no Japão (MISAWA, 2003, p. 140)¹⁶.
Neste período, a fixação do trabalhador brasileiro no país se dá,
segundo Kitawaki (2003), por consequência da implantação de
melhorias na infraestrutura de vida dos estrangeiros e, de acordo
com Tajima (2005, p. 16), por forças da enorme dificuldade de
retorno e inserção imediata no mercado de trabalho no país de
origem.
Neste contexto histórico de reposição populacional,
conforme Miyajima e Oota (2005, p. 6), em 2004, já se
encontravam, em todo o Japão, 274.700 brasileiros registrados,
sendo 27.613 crianças na faixa de 5 a 14 anos.
A cidade de Hamamatsu é o maior município do
distrito de Shizuoka com mais de 800 mil habitantes e é um dos
maiores centros industriais de peçasautomotivas e instrumentos
musicais. Após a Reforma da Lei, ocorreu em Hamamatsu, um
enorme crescimento populacional de migrantes estrangeiros,
representando, no período de 1991 a 2006, um aumento
de 8.346 para 30.977 estrangeiros, e de 4.407 para 18.457
brasileiros (ver Quadro 1).
44 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
Quadro 1:
Quadro evolutivo do número de estrangeiros na cidade
de Hamamatsu (30 Junho 2006)
9 junqueira&marin editores 9 45
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Particularmente no tocante às crianças migrantes, a
BBC Brasil, em 2005, noticiou que havia em todo o Japão, 40 mil
crianças estrangeiras em idade escolar, sendo que 17 mil delas
fora da escola. Sobre o assunto, em 2007, o governo japonês,
com base em um levantamento em nível nacional, afirmou que
havia cerca de 1% de crianças estrangeiras cadastradas no
país que se encontrava fora da escola, e 17% de crianças com
“paradeiro desconhecido” (cf. YOMIURI & SHINBUN, 2007). E,
especificamente na cidade de Hamamatsu, em 2007, a Prefeitura
divulgou os resultados de um levantamento geral, e seus dados
mostraram um aumento de 1.335 crianças estrangeiras em
idade escolar, no espaço de cinco anos.
Quadro 2
Sobre a situação escolar das crianças estrangeiras
(Cidade de Hamamatsu, 1o maio 2007)
Nível Ano N°
estrangeiras
cadastradas
em
de
escolar
crianças
idade N°
regular
frequência
públicas
de
escolas
com
crianças
nas crianças
regular
frequência
escolas
N° decom
em crianças
fora
escola
N° de
da % de
crianças
fora da
escola
étnicas
46 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS:20072.140 política, currículo1.172 e espaço escolar‐‐‐
‐‐‐ CAPÍTULO‐‐‐ II
Idade 2002 468 252 111 105 22,4%
Quadro 3
Número de crianças estrangeiras matriculadas nas
escolas públicas japonesas de nível primário e ginasial
da cidade de Hamamatsu – 1989 a 2006
1.5.1989 Primário 31 3 14 6 1 7
Ginásio 1 32 1
1.5.1990 Primário 72 37 11 8 3 13
9 junqueira&marin editores 9 47
CAPÍTULO II
Ginásio 1321
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
1.5.1990 Primário 72 37 11 8 3 13
Ginásio 14 86 3 8 1 1 1
Ginásio 35 210 14 15 2 1 3
Ginásio 84 395 54 2 17 4 2 5
48 9 junqueira&marin editores 9
sPRÁTICAS 203política, currículo724 135
PEDAGÓGICAS:Ginásio e espaço21escolar2414CAPÍTULO54 II
30.4.2001 Primário 548 374 55 40 35 24 20
9 junqueira&marin editores 9 49
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
de um nível a outro quando matriculadas nas escolas públicas
japonesas.
À parte, dados dos meses de abril (N = 202) e de
outubro de 2006 (N = 184), levantados, na época, pelo Colégio
Municipal de Ensino Secundário de Hamamatsu, quanto ao
número de alunos brasileiros matriculados no curso ginasial,
nas escolas públicas japonesas da cidade de Hamamatsu,
mostraram uma leve redução no seu quantitativo total, uma
diminuição na passagem de uma série a outra, e a presença de
um número reduzido de apenas 43 alunos brasileiros ao final do
ensino obrigatório em todo o município (ver Quadro 4).
Quadro 4
Número de crianças brasileiras matriculadas em
escolas públicas japonesas de ensino ginasial na cidade
de Hamamatsu
1a série 2a série 3a série Total
73 68 43 184
50 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
de crianças estrangeiras em situação de migração no Japão, a
questão fundamental levantada pela proposta de estudo foi:
por que as crianças brasileiras migrantes se inserem e depois
abandonam a escola pública japonesa?
9 junqueira&marin editores 9 51
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
proibi-lo de trazer para junto de si, dentro de certos limites e sob
certas condições, sua mulher e seus filhos. E, enquanto pai, “não
se poderia, por exemplo, privar seus filhos de educação escolar
e de formação profissional” (1998, p. 59).
No seio da discussão acerca da educação das
crianças no mundo globalizado da contemporaneidade,
Sacristán (2002), preocupado com a questão da justiça, discute
as faces da igualdade e da diferença na educação e, dentro desta
perspectiva, defende cinco momentos de sentido da igualdade.
Para ele, o primeiro momento refere-se ao acesso à educação, ou
seja, “a possibilidade de todos de poder ter uma vaga na escola,
a igualdade no acesso a escolas de qualidade equivalente” (p.
249).
Embora Sacristán defenda a igualdade de acesso
como uma questão de justiça, há quem explique que esta nem
sempre é praticada e por motivos variados. Carvalho (1997), por
exemplo, afirma que o direito à escolarização pode ou não ser
estendido a toda população, não por uma decisão pedagógica,
mas por uma escolha política da sociedade.
Seguindo, assim, a linha de raciocínio de Carvalho,
pode-se dizer que a escolha política sobre o direito igualitário de
acesso à escola e da obrigatoriedade escolar ocorre entre duas
alternativas, ou seja, entre aquela que entende que a Educação
Fundamental é um direito público e obrigatório a todas as
crianças e, portanto, também às crianças estrangeiras, tal como
ocorre na França e, conforme Miyajima e Oota (2005, p. 32),
em outros países como Alemanha, Holanda, Canadá e EUA; e
aquela que a compreende como um direito público e obrigatório
exclusivo às crianças pertinentes à nação e, portanto, excluídos
os filhos dos estrangeiros, como é o caso do Japão.
No caso específico do Japão, conforme sua
Constituição, a educação primária e ginasial com nove anos de
52 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
duração é compulsória a todas as crianças japonesas, porém,
esta não é claramente garantida para as crianças migrantes
(OOTA; TSUBOYA, 2005, p.18), mesmo para aquelas nascidas no
estrangeiro e com comprovada ascendência japonesa ou àquelas
nascidas no país, no seio de uma família migrante.
Em razão da falta de uma legislação que trate sobre
a educação de crianças estrangeiras, Oota e Tsuboya (2005,
p. 19) explicam que, no início do movimento migratório, as
famílias brasileiras solicitavam a autorização junto aos Comitês
Municipais de Educação para procederem a matrícula dos filhos
em escolas públicas japonesas. Entretanto, as solicitações eram
indeferidas com base no fato das crianças não dominarem o
idioma japonês.
Diante do grande contingente de crianças
brasileiras em idade escolar, em situação de migração e sem
direito constitucional à educação básica, na metade da década
de 1990, o Ministério da Educação e Cultura do Brasil – MEC
concedeu, em caráter especial, autorização para a criação de
escolas brasileiras, de natureza privada (HAINO, 2006); e como
efeito, em 2005, havia em todo o Japão, um total de 8 mil crianças
estudando em escolas brasileiras (BBC Brasil, 2005), e em 2006,
um total de 50 escolas homologadas pelo MEC.
Com o passar do tempo, diante da irreversibilidade
constitucional, segundo Oota e Tsuboya (2005), cada Comitê
Municipal de Educação começou a agir de modo diferenciado, e,
em algumas cidades com grande concentração de estrangeiros,
autorizações passaram a ser fornecidas para crianças de todas
as nacionalidades. Tal medida, particularmente na cidade de
Hamamatsu, repercutiu com uma expansão, entre 1990 e 2006,
de 25 para 1.311 crianças estrangeiras e, dentre elas, de 4 para
877 crianças brasileiras (ver Quadro 5).
9 junqueira&marin editores 9 53
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Quadro 5
Número de alunos estrangeiros matriculados nas
escolas públicas japonesas da cidade de Hamamatsu –
1990, 1998, 2006 (30 Junho 2006)
Data Total Brasil Peru Vietnã Filipinas China
04.1990 25 4 0 14 1 6
AnalisandooestudodeWatanabeesuaequipe(1995)
sobre o movimento migratório de trabalhadores estrangeiros
do Japão, em particular, sobre as questões educacionais das
crianças brasileiras da cidade de Hamamatsu, vê-se que,
neste município, as medidas emergenciais não se resumiram
às políticas de inserção escolar. No estudo de Watanabe,
encontram-se relatadas diversas ações sociais implantadas no
seio das escolas japonesas e da comunidade local desde o ano de
1990, ano da homologação da Reforma da Lei. Por exemplo, em
1990, foi elaborada uma coletânea sobre conversação simples
em japonês-português; também foi implantado pelo Comitê de
Educação de Hamamatsu um programa especial de atendimento
e entrosamento de crianças estrangeiras com crianças japonesas
retornadas ao Japão após vivência no exterior, e criadas salas de
ensino de japonês e de português para crianças brasileiras. Em
1991, foram encaminhados às escolas japonesas, atendentes
falantes da língua portuguesa para atuarem como intérpretes; em
fevereiro de 1992, foi distribuído para todas as escolas japonesas
da cidade um manual contendo os recados escolares traduzidos
54 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
para o português destinado aos pais dos alunos brasileiros; e,
em fevereiro de 1993, 14 escolas japonesas desenvolviam um
trabalho de orientação de crianças estrangeiras por professores
destinados para tal fim pela Prefeitura da cidade.
O estudo da equipe de Watanabe mostra, assim,
que, na cidade de Hamamatsu, desde o início do movimento
migratório, as crianças brasileiras migrantes foram acolhidas
nas escolas públicas japonesas, de nível primário e ginasial,
ainda que o seu acolhimento não fosse legalmente compulsório;
além do mais, desde a chegada das primeiras crianças brasileiras
são desenvolvidas ações sociais coordenadas tanto por setores
públicos como por órgãos não-governamentais, tendo como alvo
as famílias migrantes e os problemas de aprendizagem escolar
das crianças, a sua adaptação ao Japão e a sua readaptação após
o retorno ao Brasil.
Em pesquisa de campo desenvolvida entre 2006 e
2007, em quatro escolas públicas de Hamamatsu e a dois projetos
comunitários desenvolvidos por voluntários, constatou-se que o
trabalho social iniciado em 1990 se perpetuava nos dias atuais
ao longo de quase duas décadas. E embora nos termos da lei
não houvesse indícios de uma solução para o problema da não
obrigatoriedade escolar, na prática, a adaptação das crianças
brasileiras inseridas nas escolas japonesas continuava sendo
motivo de grande preocupação.
Em visita ao Comitê de Educação de Hamamatsu,
observou-se que este atualmente não somente incentiva como
também orienta as famílias brasileiras residentes na localidade
quanto aos procedimentos de matrícula nas escolas públicas
japonesas, notadamente de Ensino Fundamental. Para tanto, é
mantida uma funcionária brasileira que, juntamente com uma
funcionária peruana, desempenha, dentre outras funções, a
de fornecer orientações gerais e específicas sobre educação
escolar aos pais e às crianças brasileiras em português ou em
espanhol para as famílias de outros países da América Latina.
Seguramente, os impactos de tal política de inserção podem
ser observados nos índices de matrícula, os quais, entre 1990
9 junqueira&marin editores 9 55
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
e 2006, revelaram um aumento de 15,36 vezes em termos de
crianças estrangeiras, e de 21,07 vezes, em termos de crianças
brasileiras (cf. Quadro 3).
Ainda dentro dos esforços da administração
local, a Prefeitura de Hamamatsu participa do movimento
em prol da aprovação do pedido de determinação do direito
à obrigatoriedade escolar para as crianças estrangeiras de
famílias trabalhadoras em contexto de migração no Japão.
Conforme consta do Relatório da Assembleia das Cidades
com Concentração de Estrangeiros (2006), evento do qual a
Prefeitura da cidade de Hamamatsu fez parte, foi aprovada a
“Petição de Controle da Reforma Resultante das Assembleias
das Cidades com Concentração de Estrangeiros”, por meio da
qual é solicitada ao governo central a determinação do direito
e da obrigação da criança estrangeira que permanecer no
país por mais de 90 dias de receber educação e a providência
de ambientes apropriados necessários à implantação da
obrigatoriedade da educação à criança estrangeira. A respeito
do assunto, até o início do ano de 2008, o governo japonês não
havia apresentado seu parecer final, mas, no dia 11 de janeiro
de 2007, declarou ao Jornal Nihon Keizai que medidas estavam
sendo preparadas para tornar obrigatório o acesso à escola aos
filhos de estrangeiros com visto de longa permanência, devido
principalmente ao interesse em estimular a convivência das
famílias estrangeiras com a comunidade local, evitar abusos e
prevenir a criminalidade (cf. JORNAL INTERNATIONAL PRESS,
de 20 de janeiro de 2007).
56 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
insere a igualdade de tratamento interno representada pelo
“direito de receber uma educação de igual qualidade: mesmos
professores, currículos, meios técnicos e condições ambientais”.
Assim, para ele, o significado de igualdade implica “desenvolver
políticas curriculares que garantam um currículo semelhante
para todos em relação a seus conteúdos, assim como condições
equiparáveis para seu desenvolvimento” (p. 251).
Na visão de Candau (2008), para tratar da
problemática da igualdade-diferença e dos direitos humanos em
um mundo marcado por uma globalização neoliberal excludente,
a primeira questão a ser respondida deve ser: afinal, somos iguais
ou somos diferentes? A partir desse questionamento, Candau
discute as várias abordagens do multiculturalismo e explica que,
na abordagem do multiculturalismo assimilacionista, parte
se da afirmação de que vivemos numa sociedade multicultural
e todos devem se integrar na sociedade incorporando-se à
cultura hegemônica. Nesta perspectiva, na educação, promove
se uma política de universalização da escolarização, e todos são
chamados a participar do sistema escolar. Na abordagem do
multiculturalismo diferencialista, por outro lado, a ênfase está
no reconhecimento da diferença; e, para garantira expressão das
diferentes identidades culturais presentes num determinado
contexto, são garantidos espaços em que estas possam se
expressar (CANDAU, 2008, p. 50).
Com o intuito de esclarecer qual tipo de tratamento
(se igualitário ou diferencialista) é dado à criança brasileira no
Japão, foram realizadas visitas às escolas públicas japonesas da
cidade de Hamamatsu tanto de nível primário como ginasial. Ao
longo da investigação, primeiramente, observou-se que, após
serem matriculadas, as crianças migrantes são encaminhadas
para as séries correspondentes à sua idade e, desse modo,
iniciam sua vida escolar igualmente como toda criança de
nacionalidade japonesa. Visto que não existe reprovação por
aproveitamento no sistema educacional japonês, em princípio,
9 junqueira&marin editores 9 57
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
todas as crianças migrantes inseridas nas escolas japonesas
seguem naturalmente de uma série a outra até concluírem o
Ensino Fundamental juntamente com seus colegas de classe.
Neste sentido, pode-se dizer que, ao serem inseridas nas escolas
públicas, as crianças estrangeiras são acolhidas por uma política
educacional que considera-as iguais a todas as demais crianças
japonesas e que busca garantir um currículo semelhante em
relação aos conteúdos.
Até aqui, o estudo mostrava, em linhas gerais, os
modos pelos quais as crianças brasileiras eram inseridas nas
escolaspúblicasjaponesasadespeito desua nãoobrigatoriedade.
Porém, este não esclarecia sobre os motivos pelos quais elas
abandonavam a escola. Em busca de uma compreensão sobre
as causas da evasão escolar, procurou-se uma resposta na
literatura japonesa, e, ao final do levantamento bibliográfico
verificou-se a existência de um arsenal de estudos acerca do
problema das crianças migrantes publicados em forma de livros
individuais, coletâneas ou relatórios de pesquisa (SASAKI, 2000;
ISHII, E., 2000; MURATA, 2000; IKEGAMI, 2001; ISHII, R., 2003;
SAKUMA, 2005; SHIMIZU, M., 2006; SHIMIZU, H., 2006; TANADA,
2006; MIYAJIMA, 2007, e outros). Em todos eles, observou
se um destaque aos problemas de aprendizagem das crianças
migrantes, em especial, das crianças brasileiras e, sem variação,
é apontada como causa a falta de domínio suficiente da língua
local necessário para a aprendizagem dos conteúdos escolares
nas escolas japonesas. E, como solução, os primeiros trabalhos
recomendavam a necessidade de priorização do ensino da
língua japonesa nos currículos escolares; e, nos últimos, havia
uma divergência de opiniões entre “dar prioridade ao ensino da
língua local” e “dar prioridade ao ensino da língua materna”, no
caso das crianças brasileiras, o ensino da língua portuguesa no
Japão.
Ao retomar a pesquisa de campo nas escolas
japonesas, verificou-se que levados pelos resultados das
58 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
pesquisas, o governo local e os agentes comunitários decidiram
enfrentar o problema da aprendizagem das crianças migrantes
com ações educativas dando prioridade ao ensino da língua
japonesa. Certamente, é em consequência disto que, em
todas as escolas públicas de Hamamatsu com determinado
número de crianças estrangeiras, notadamente de brasileiras,
são desenvolvidos programas educacionais envolvendo
voluntários e professores japoneses contratados pela Prefeitura
especificamente para o ensino do idioma local.
Na escola japonesa, em princípio, em obediência ao
sentido de igualdade, todas as crianças devem permanecer em
classe junto com seus colegas para estudar as matérias do currículo
comum. Contudo, devido às dificuldades de aprendizagem
resultantes do não domínio da língua local, excepcionalmente,
a criança migrante é autorizada a assistir somente as aulas nas
quais o conhecimento do idioma não é essencial, como as de
Matemática, Artes, Inglês, Música, Fundamentos Domésticos,
Educação Física; e enquanto os alunos japoneses da classe
assistem às aulas de Redação, Caligrafia, História, Geografia,
Ciências, etc., as quais requerem um domínio mais avançado da
língua local, a criança migrante desloca-se para as salas especiais
para participar individualmente ou em pequenos grupos das
aulas de língua japonesa em nível de alfabetização. Desse modo,
nas escolas públicas de ensino primário e ginasial, a prática do
ensino da língua japonesa para as crianças estrangeiras tem
notadamente prioridade sobre o ensino das matérias, e nas salas
especiais, os professores dão prioridade ao desenvolvimento
das habilidades de compreensão, comunicação, leitura e escrita
do idioma japonês.
Assim, nas visitas às escolas, verificou-se que a
criança migrante, de fato, é retirada da sala de aula e encaminhada
para as salas especiais. Nas escolas de nível primário, de modo
geral, as crianças estrangeiras são agrupadas para serem
alfabetizadas, e nas escolas de nível ginasial, enquanto algumas
9 junqueira&marin editores 9 59
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
se alfabetizam, outras são atendidas individualmente por
professores japoneses para tratar das dificuldades referentes
aos conteúdos escolares. Desse modo, em um contexto
concretamente complexo, na escola pública japonesa onde se
inserem crianças migrantes brasileiras, o currículo comum se
desenvolve em paralelo a um currículo plural.
Em termos gerais, pode-se dizer que a Educação
Fundamental no Japão apóia-se em princípios específicos da
abordagem do multiculturalismo diferencialista, pois reconhece
as diferenças culturais e permite à família a escolha entre a
escola japonesa ou a escola brasileira. No que diz respeito
especificamente à escola japonesa, as políticas educacionais, a
priori, embora reconheçam a sociedade multicultural, tentam
fixar seus princípios em uma abordagem assimilacionista,
promovendo a integração das crianças migrantes na cultura
hegemônica. Primeiramente, esta integração se dá por meio
de sua inserção nas classes conforme sua idade, do mesmo
modo como se procede com qualquer criança japonesa e,
em seguida, por meio da garantia ao direito de receber um
currículo semelhante para todos. Em resposta, quando as
crianças migrantes mostram que não podem compartilhar dessa
“igualdade interna”, as políticas curriculares japonesas reagem
implantando programas de alfabetização na língua japonesa.
Assim fazendo, em lugar de oferecer o currículo comum eleito
como instrumento de justiça e patrocinador da igualdade, a
escola japonesa termina por oferecer um currículo plural para
atender de imediato às diferenças de necessidades das crianças
migrantes e, de imediato, alcançar os princípios da igualdade de
condições de receber uma educação de qualidade para todos.
Ou seja, de uma perspectiva multicultural assimilacionista,
desloca-se para uma perspectiva multicultural assimilacionista
diferencialista.
A análise até aqui desenvolvida, embora tenha
permitido visualizar as bem intencionadas políticas de
60 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
intervenção implantadas pelo governo local na tentativa de
dirimir os problemas de aprendizagem das crianças brasileiras
migrantes, objetivamente, pouco auxiliam na compreensão do
fenômeno da evasão escolar.
9 junqueira&marin editores 9 61
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
de colegas japoneses, principalmente por parte das meninas, e
também da família, especialmente por parte dos pais.
Na investigação acerca das condições de
aprendizagem dos conteúdos escolares em nível primário e
ginasial, as 12 crianças entrevistadas informaram que seu
desempenho escolar no Brasil, até antes de sua migração, não
era ruim: “as minhas notas no Brasil eram boas” (C1-BN); “até
que eu era bom aluno. Lá, eu não tirava nota abaixo da média
[...] Eu sempre tirava 8, daí pra cima” (C3-LN). Mas, agora, na
escola japonesa, todas elas comentam sobre seu rendimento
insatisfatório. Elas explicam que “eu consigo me comunicar
um pouco bem com eles, mas a única coisa que eu não consigo
é nas atividades” (C2-SC); “nas primeiras provas, eu consegui
2” (C1-BN). C12-RY conta o quanto é complicado o estudo dos
conteúdos escolares na escola japonesa mesmo para quem “sabe
falar japonês” e acrescenta:
“Sei, é claro que eu sei falar japonês, sei me virar quando é preciso,
só que quando o professor está falando, eu não entendo o quê que
ele fala, não sei do que ele está falando, que matéria [...] A melhor
nota que eu tirei? Acho que é Inglês [...] Acho que vai assim, de
Inglês, foi até 14. Acho que no resto, eu tiro tudo zero!” (C12-RY).
62 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
anos de idade, quando cursava a 3a série do Ensino Fundamental
em uma escola privada no Brasil. Ela lembra que ao ser inserida
na escola japonesa,
“não sabia falar um A em japonês. [...] Eu ficava só sentada na
classe, ouvindo, só que não sabia nada. Escreviam no quadro,
eu não sabia nada. Tinha um caderno, assim, na minha frente,
mas como que eu ia escrever se eu não sei o que está escrito, nem
nada, assim, o que o professor está falando? No começo foi bem
difícil pra mim porque como minha mãe é professora, eu sempre
tive que tirar nota boa. Aí, eu estudava bastante, né? Aí, quando
cheguei aqui no Japão, como que eu vou estudar? Fiquei com
medo, né? Se eu tirar nota baixa, eu não vou passar de série, nem
nada. Eu estava pensando isso, no começo” (UB1-FL).
9 junqueira&marin editores 9 63
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
no processo de escolarização das crianças brasileiras migrantes
no Japão, os quais são cruciais à análise da problemática
inserção escolar versus evasão escolar. Estes elementos são: a
relação entre obrigatoriedade escolar e aprovação automática,
e a relação entre escola e trabalho. Ambos as relações vinculam
se diretamente às causas da evasão escolar e, por isso, merecem
especial atenção nas discussões que tratam das políticas
educacionais direcionadas às crianças brasileiras de famílias
trabalhadoras residentes no Japão.
Conclusão
64 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
na escola ou fora dela, situam-se em um contexto de diversidade
cultural e linguística.
Os resultados do presente estudo mostraram, em
síntese, que as crianças brasileiras com vivência escolar no
Brasil antes da migração, iniciam sua vida escolar no Japão
em uma escola brasileira visando a sua imediata adaptação ao
país de migração em um contexto escolar cuja língua é aquela
de seu domínio. Em seguida, solicitam ao Comitê de Educação
seu ingresso na escola japonesa com o objetivo principal de
aprender a língua do país onde agora residem e respaldados
por um desejo de inserção na sociedade. Porém, logo se tornam
cientes do grau de dificuldade de sua apreensão; ainda assim,
em pouco tempo, desenvolvem o uso da linguagem oral, mas
este domínio, de certo, não é suficiente para a relação social com
os professores do mesmo modo que com os saberes escolares.
Assim, por longos anos, as crianças sobrevivem sem conexão
com o universo da sala de aula e dos saberes por causa do não
domínio suficiente da língua local; neste contexto, por mais que
se desenvolvam, este desenvolvimento sempre se encontra em
um estágio de atraso irrecuperável para o acompanhamento dos
estudos escolares.
Tendo já vivenciado a escola no Brasil, as crianças
sabem que lá, a não apreensão dos conteúdos resulta em uma
reprovação, mas sua experiência na escola japonesa leva-as
à compreensão de que a progressão depende meramente da
frequência. Com isso, mesmo assistindo às aulas de algumas
matérias, as crianças brasileiras logo percebem que os princípios
de estruturação do currículo especialmente pensado para
elas subordinam objetivos pedagógicos que não privilegiam o
conhecimento dos conteúdos escolares. Mais adiante, deduzem
o quanto a escola japonesa é ligada à função de controle
(disciplina, frequência, etc.) e desligada da função instrumental,
de formação do sujeito cultural e cognitivamente escolarizado.
Neste processo, muitas crianças migrantes abandonam a escola
9 junqueira&marin editores 9 65
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
e permanecem fora dela a espera da chegada da idade para a
sua inserção no mercado de trabalho; outras prosseguem até
a sua conclusão graças ao sistema de aprovação automática,
apresentando um desenvolvimento elementar do uso da língua
local e um não aprendizado dos conteúdos escolares. Aqui, pode
se dizer, está a razão principal para o seu afastamento. Assim,
parte delas se evade; e a outra parte resiste permanecendo na
escola alheia a tudo até a sua conclusão, à espera de sua inserção
no trabalho após a conclusão do ensino obrigatório.
Ao concluir o ensino obrigatório, as crianças devem
prestar, na língua japonesa, rigorosos e competitivos exames
de seleção para o Ensino Secundário. E, neste momento, as
crianças migrantes deparam-se com o dilema entre prestar os
exames ou inserir-se no mercado de trabalho, nas fábricas como
seus pais. Prestar os exames significa apresentar provas de seu
aprendizado nas matérias essenciais, e estar disposto a pagar
o curso porque, mesmo no setor público, o ensino secundário
não é gratuito. Quanto às crianças matriculadas nas escolas
brasileiras, após a conclusão do Ensino Fundamental, parte delas
prossegue os estudos em nível médio na escola brasileira; outra
parte insere-se no mercado de trabalho fabril. Na fábrica, todos
eles, indistintamente, enquadram-se como jovens trabalhadores
migrantes, apenas com a diferença de que há aqueles que não
podem se comunicar com os chefes japoneses e aqueles que
apresentam certo domínio oral da língua japonesa e detêm
certa vantagem sobre os primeiros. De todo modo, nenhum dos
grupos detêm as condições básicas para os prosseguimentos
dos estudos superiores, no Brasil ou no Japão.
Assim, quando as crianças brasileiras mostram o
entendimento de que seu futuro está previamente programado
para o trabalho na fábrica e que, para a sua inserção no mercado
laboral, o aprendizado escolar não é um requisito importante,
revelam a sua compreensão sobre a relação entre educação e
trabalho no Japão. No trabalho, visto que a aprendizagem dos
66 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
conteúdos escolares e o da língua local são irrelevantes, ou pelo
menos, secundária, as crianças intuem que a educação escolar
não tem utilidade prática e funcional para a sua vida profissional,
portanto, o vínculo entre educação e trabalho é fraco e,
evidentemente, dispensável. Aqui, notadamente, encontra-se o
segundo fator motriz da evasão escolar.
Assim, os dois aspectos, de aprovação automática
do sistema educacional japonês e de fraca vinculação entre
educação e trabalho, regulam, na criança brasileira migrante
no Japão, a sua “relação com o saber” e, por conseguinte, a sua
relação com o aprender e com o seu desejo de saber, conforme
conceitos desenvolvidos por Charlot (2000).
Entretanto, tal como afirma Sacristán (2002, p. 61
62), em uma sociedade capitalista,
saber ler e escrever, ou ser incapaz de fazê-lo, introduziu
uma das divisões sociais mais determinantes nas sociedades
modernas quanto a essa capacidade de acesso: a que se produz
entre os alfabetizados e os analfabetos. Uma divisão que
estabelece a fronteira entre a inclusão e a exclusão social.
9 junqueira&marin editores 9 67
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Em uma sociedade moderna, cuja língua é
indubitavelmente de difícil aquisição, a criança brasileira
migrante no Japão flutua entre ser “letrado” e ser “analfabeta”
e, nos limites dessa fronteira, sobrevive sem expectativa entre
a sua caótica inserção escolar e a predestinada exclusão social.
Em síntese, o estudo revelou que o problema da
educação das crianças brasileiras migrantes no Japão se liga a
três aspectos característicos da educação japonesa: a aprovação
automática, a política curricular assimilacionista e a fraca
vinculação entre educação e trabalho. Estes aspectos são fortes
reguladores da relação da criança com o saber e o aprender, e
levam-na ao abandono da Escola Fundamental, dificultam a sua
aprovação no Ensino Secundário e encaminham-na à precoce
inserção no mercado de trabalho fabril.
Ao longo dos 20 anos da história da migração, as
crianças brasileiras, ainda que fora da esteira educacional e das
possibilidades de uma carreira profissional, eram perfeitamente
reguladas pelos bons ganhos do trabalho nas fábricas. Em meados
do ano de 2008, entretanto, o Japão perdeu sua força econômica
devido ao enfraquecimento das exportações e a posterior queda
da produção industrial por conta do saneamento do mercado
financeiro dos Estados Unidos; e esta brusca alteração afetou a
vida dos trabalhadores migrantes e, por conseguinte, a educação
de seus filhos. Neste contexto, em fevereiro de 2009, Julieta
Yoshimura, presidente da Associação das Escolas Brasileiras no
Japão, declarou que “as escolas brasileiras perderam metade dos
alunos desde o início da atual crise econômica, já que, afetados
pelas demissões em massa, muitos pais ficaram sem condições
de arcar com as mensalidades. Segundo um levantamento feito
pela Associação das Escolas Brasileiras no Japão (AEBJ), até
novembro do ano passado o número de alunos em 40 das cerca
de 90 escolas brasileiras no país chegava a 6.300. Desse total,
cerca de 3 mil já deixaram as escolas” [...]“40% dessas crianças
já voltaram para o Brasil, 10% foram para escolas japonesas e
68 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO II
50% estão em casa” (cf. JORNAL INTERNATIONAL PRESS, 12 de
fevereiro de 2009).
Assim, com a crise econômica desencadeada em
meados de 2008, os jovens brasileiros passaram a conviver
com a nova situação entre o desemprego dos pais e a própria
necessidade de rápida imersão no mercado de trabalho japonês.
Neste cenário, seguem à margem do mundo do trabalho aqueles
que abandoram a escola ou não aprenderam a língua japonesa
durante sua estada no Japão; e aqueles concluintes do ensino
obrigatório na escola japonesa, estes podem ser absorvidos pelo
mercado, porém, sem o Ensino Secundário, ocupam apenas os
cargos mais inferiores da escala de ocupações.
Respeitada a complexidade da situação atual,
ao final, é importante dizer que o estudo buscou responder à
questão “por que as crianças brasileiras migrantes se inserem
e depois abandonam a escola pública japonesa?” orientando a
discussão para uma direção que ultrapassa os limites do ensino
da língua. Certamente, ainda há muito que ser compreendido
sobre a educação das crianças brasileiras migrantes no Japão,
e que a hipercomplexidade do problema não conduz a soluções
simples, principalmente quando novas configurações sociais,
políticas e econômicas redefinem o movimento migratório de
trabalhadores brasileiros.
Enfim, é claro que a falta de uma legislação específica
que trate da obrigatoriedade escolar voltada para as crianças
estrangeiras residentes no Japão, na atualidade, ainda causa
certo estranhamento. Não obstante, caso a obrigatoriedade
venha a ser democratizada em resposta às exigências dos direitos
universais, necessariamente ela deverá vir acompanhada de uma
reflexão aprofundada e séria sobre “qual é a finalidade da escola”
para a criança migrante no Japão. Isto porque, paradoxalmente,
ela irá destinar-se a crianças e jovens, filhos de trabalhadores
migrantes, que, no contexto do mundo globalizado, foram
“importados” para o trabalho fabril, para o suprimento de
9 junqueira&marin editores 9 69
CAPÍTULO II PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
uma mão-de-obra não qualificada oriunda de um país onde há
excesso de força de trabalho dessa natureza, conforme afirma
Tajima (2005). No contexto da migração, lamentavelmente, a
garantia, em lei, dos direitos à educação não é por si suficiente,
pois que, na prática, existe um conflito em torno do sentido da
escola e, exatamente por isso, os filhos dos imigrantes, com ou
sem ela, continuam nos corredores do trabalho laboral, no setor
industrial do país. E só por este motivo, este assunto merece
continuar sendo pensado e com muita seriedade. 3
Referências
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74 9 junqueira&marin editores 9
U PARTE
POLÍTICAS I
E PRÁTICAS V
EDUCACIONAIS
i CAPÍTULO III j
A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO PÓS-REFORMA:
INSTITUCIONALIZAÇÃO E REGULAÇÃO NO BRASIL E
NA ARGENTINA
Introdução
Os
educacional dos anos
aqueles
debates
1990,
que
têm
sobre
analisam
apontado
a educação,
os para
efeitos
aemdaespecial
emergência
reforma
9 junqueira&marin editores 9 75
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Nesse sentido, a regulação da Educação Infantil não
é apenas objeto do conjunto de regulamentações e orientações
advindas do poder central, mas é também resultante dos
contextoslocais, cujasdeterminações históricas, sociais, políticas
e econômicasmodulamaçõeseiniciativaspolíticas, configurando
arranjos institucionais variados com repercussões em aspectos
como cobertura de atendimento, formação docente, organização
do trabalho do professor, recursos financeiros, propostas
curriculares, focalização de populações a serem atendidas,
para citar alguns. Dessa perspectiva, podemos compreender
que um aspecto como “ampliação de vagas” pode ser objeto
de estratégias diferenciadas e/ou combinadas utilizadas pelas
redes municipais de educação: por exemplo, ampliação do
quadro de profissionais que atuam diretamente com as crianças,
privilegiando a contratação dos chamados “auxiliares de sala”;
ou ampliação dos convênios com organizações sociais, podendo,
ainda, ser resultante da combinação dessas duas estratégias
(CAMPOS, 2008).
Com o intuito de contribuir com os estudos sobre as
novas regulações no campo da Educação Infantil, este trabalho
tem como objetivo apresentar os primeiros resultados de uma
pesquisa que trata de conhecer os novos marcos regulatórios
que orientam a Educação Infantil em quatro países do Mercosul
(Brasil, Argentina, Chile e Uruguai). De modo específico,
apresentamos dados que explicitam as estratégias políticas
adotadas pelos governos brasileiro e argentino, no que tange ao
atendimento das crianças de 0 a 3 anos, destacando as novas
configurações que orientam as relações entre o Estado e a esfera
privada constituída, em especial, pelas chamadas instituições
sem fins lucrativos.
Para análise da política educacional implementada
nesses países, recorremos à abordagem do “ciclo de políticas”,
tal como proposto por S. Ball (SHIROMA, CAMPOS; GARCIA,
2005; MAINARDES, 2007). Recorremos também ao conceito
de regulação, conforme proposição de Maroy e Dupriez (2000),
76 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
para bem compreender as relações entre as esferas públicas e
privadas e, de modo especial, a ação do Estado e as ações dos
sujeitos locais.
Este trabalho apresenta, inicialmente, uma breve
análise dos principais marcos legais que orientam as políticas
para a Educação Infantil no Brasil e na Argentina para, em
seguida, analisar os efeitos desses marcos nas políticas adotadas
pelos governos de ambos os países.
9 junqueira&marin editores 9 77
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
que autoriza a incorporação das instituições privadas nas
redes públicas de Educação Infantil. Note-se que isso não se
aplica ao Ensino Fundamental e Médio, caracterizado apenas
pelas instituições mantidas pelo poder público¹⁹. No artigo
20, a lei esclarece os tipos institucionais compreendidos como
privados, incorporando-se nestes as categorias: privadas com
fins lucrativos e aquelas sem fins lucrativos, do tipo comunitário,
confessional e filantrópico. Posteriormente, na seção II, que
trata especificamente da organização da Educação Infantil, o
artigo 30 prevê sua oferta nas duas modalidades: creches para
crianças entre 0 e 3 anos e pré-escola para aquelas entre 4 e 6
anos. Observe-se, no entanto, que, apenas para a “modalidade
creche”, admite-se a oferta em “entidades equivalentes”.
Embora a LDB 9.394/96 crie essa categoria
“entidades equivalentes”, não especifica quais seriam estas,
possibilitando interpretações variadas sobre esse termo. Três
fontes de motivação parecem se conjugar nesse termo: a) a
presença significativa de crianças atendidas em entidades
cofinanciadas com recursos da assistência social e aincapacidade
de os sistemas municipais absorverem essas matrículas de modo
imediato; b) as pressões dos movimentos sociais de creches que
almejavam manter suas identidades e formas organizativas,
embora integradas aos sistemas; c) a incorporação dos novos
marcosregulatórios advindos da reforma do Estado e as pressões
do chamado “ajuste neoliberal”, que pressupunha a transferência
da execução dos serviços educacionais para “organizações da
sociedade civil”, reservando-se ao Estado apenas o papel de
regulador.
Passados mais de uma década da promulgação da
LDB 9.394/96, evidencia-se com mais clareza o que a letra da
lei continha em estado embrionário: a crescente segmentação
entre creches e pré-escolas, materializada pela predominância
de instituições públicas nesta última, ao passo que na primeira
encontramos presença significativa de instituições privadas sem
78 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
fins lucrativos. Essa “divisão de tarefas”, na gestão da Educação
Infantil, é ratificada pela política de financiamento implantada
com a aprovação da Lei 11.424/2007, que regulamenta a criação
do Fundeb.
Examinando a legislação que orienta o sistema de
educação nacional na Argentina, constatamos que também lá
a Lei da Educação Nacional (Lei 26.206/2006) prevê apenas
para a Educação Inicial seu provimento por instituições de
“gestão estatal” e de “gestão privada”, estando compreendidas
nesta última categoria, além dos estabelecimentos privados no
sentido estrito, também “[...] as organizações sem fins lucrativos,
sociedade civil, grêmios, sindicatos, cooperativas, organizações
não governamentais, organizações de bairros, comunitárias e
outros” (artigo 23).
Especificamente no que tange à educação das
crianças de 45 dias a 2 anos, determina-se, de acordo com as
“particularidades locais ou comunitárias”, a adoção de outras
estratégias voltadas ao atendimento infantil, em programas
articulados de desenvolvimento social, saúde e educação,
oferecidos no âmbito da educação não formal dirigidos às
crianças e suas famílias (artigo 22).
Analisando a situação da Argentina, Lassalle
destaca:
9 junqueira&marin editores 9 79
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Para mais bem compreendermos as dimensões
envolvidas na normatização da Educação Infantil em ambos
os países, é importante relembrar que ambas as leis foram
aprovadas e implementadas como peças importantes da
reforma educacional dos anos 1990; na medida em que criaram
as bases jurídicas necessárias à descentralização da gestão dos
serviços educativos da esfera nacional para Estados, províncias
e municípios, flexibilizando também os marcos regulatórios
que normatizavam a oferta desses serviços pelas instituições
públicas.
Coadunados a estes princípios, os dois países
têm ampliado a oferta de atendimento às crianças pequenas,
em especial daquelas entre 0 e 3 anos, “alargando” as redes
públicas de ensino pela inclusão das chamadas “instituições
sociais sem fins lucrativos” na execução destes serviços. Parece
não haver novidade nesse cenário, uma vez que a Educação
Infantil, historicamente, tanto no Brasil como na Argentina,
foi objeto de ações assistenciais. No entanto, essas redes de
instituições cofinanciadas pela assistência social conviviam de
modo paralelo, sem articulações entre si, apartadas tanto pelas
origens de classe de seus destinatários como pelas concepções
e pressupostos metodológicos que orientavam sua atuação.
Extrapolando o que diz Faria (2005, p.1025) para a realidade da
Argentina, concordamos quando se refere que
80 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
por muitos como compondo um “terceiro setor” – o “público
não estatal”, essas instituições vêm se tornando, cada vez
mais, objeto de regulações produzidas nos diversos níveis dos
sistemas (federal e municipal, no caso da Educação Infantil).
Sua integração aos sistemas de ensino vem também mudando a
natureza destes, que deixam de ser públicos, no sentido estrito,
para assumir uma composição híbrida, dada por esta nova
articulação entre as esferas públicas e privadas²⁰.
No entanto, esse processo – de conjugação de
instituições públicas e privadas em um sistema público de
educação – é eivado de contradições, pois se, por um lado, as
creches são a modalidade educativa mais sujeita à presença de
variados tipos de instituição privada; por outro, sua integração
aos sistemas municipais de educação pode significar também
maior fiscalização e controle, por parte do poder público,
sobre elas. Relembramos que os municípios dispõem de
autonomia para estabelecer critérios e efetivar processos
de credenciamento, acompanhamento e fiscalização das
instituições de Educação Infantil. Enfim, se considerarmos
ainda que é tarefa dos municípios a definição dos termos para
a realização de ações de transferência de recursos públicos, na
forma dos convênios para execução de serviços, podemos inferir
que a Educação Infantil, no atual contexto, é também a etapa da
Educação Básica mais sujeita às regulações locais.
Com essa breve incursão pelas leis nacionais
que reorientaram a educação no Brasil e Argentina na última
década, pretendemos evidenciar alguns elementos produzidos
no campo da política que repercutiram diretamente nas formas
de organização e de regulação dos sistemas de ensino e, de
modo particular, na educação das crianças pequenas. Se não há
dúvida que a inclusão da Educação Infantil como uma unidade
pedagógica, integrada ao âmbito da Educação Básica em ambos
os países, representou um avanço importante em termos da
garantia dos direitos das crianças pequenas à educação; por
9 junqueira&marin editores 9 81
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
outro lado, constata-se que o processo vem sendo caracterizado
pela frágil presença e determinação do Estado.
Colabora, para essa situação, o processo de
descentralização administrativa implementada pelos dois países
no bojo de suas reformaseducacionais. O efeito mais visível desse
processo foi a fragmentação e segmentação do sistema educativo,
na medida em que passaram a conviver estruturas educativas
diferentes, sob a responsabilidade jurídica dos diferentes entes
da federação. Nesse sentido, a Educação Infantil tem sido uma
das mais prejudicadas, pois sua efetivação depende basicamente
da capacidade gestionária dos municípios, de sua orientação
política e dos recursos orçamentários de que dispõe para
essa etapa da Educação Básica (SAVIANI, 2008; PONCE, 2006;
CERISARA, 2002). Na seção seguinte, apresentaremos alguns
elementos de análise focalizando em especial o atendimento das
crianças de 0 a 3 anos.
82 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
No caso da Argentina, o Estado tem fortemente
induzido, por força de lei e pela política de financiamento,
a obrigatoriedade e a universalização para os anos finais da
Educação Inicial. Desde 1993, a classe de cinco anos foi instituída
como obrigatória, resultando que educação desta faixa etária
está, praticamente, universalizada.
De acordo com o documento “El nível inicial en la
última década: desafíos para la universalización” (DINIECE,
2007, p. 9), mais de 90% das crianças com idade de cinco anos
cumprem a obrigatoriedade estabelecida por lei; esse percentual
diminui quando se trata das salas de 3 e 4 anos, constatando-se,
em 2005, uma cobertura de 30% e 60%, respectivamente. Ainda
de acordo com o mesmo documento, a oferta educativa para as
classes de três e quatro anos, em especial para a última, está em
crescente processo de expansão.
Apesar dos avanços, o acesso à Educação Infantil
na Argentina é também fortemente constrangido pela origem de
classe social. De acordo com dados coletados junto ao Diniece,
o acesso à educação continua sendo um privilégio das classes
sociais mais favorecidas economicamente: os 40% mais ricos
da população têm taxas mais elevadas de frequência à Educação
Infantil do que os 40% mais pobres. Respectivamente, na classe
de três anos, essas taxas são de 47,2% para os mais ricos contra
24,7% mais pobres; na classe de quatro anos, 76,6% e 56,4%
respectivamente; por fim, na classe de 5 anos, 96,9% e 88,2%
(Fonte: DINIECE, 2007, p. 17). De acordo com Malajovich (2006),
apesar dos esforços e depois de doze anos de promulgada a Lei
Federal de Educação, que estabeleceu a obrigatoriedade para a
última seção da educação inicial, a classe de cinco anos,
9 junqueira&marin editores 9 83
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
95,2% dos que pertencem aos 20% mais ricos” (MALAJOVICH,
2006, p. 106).
84 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
pré-escola. Conforme os dados do IBGE, constantes na Tabela
1, podemos verificar o apartheid social existente, por exemplo,
entre os segmentos mais pobres e mais ricos quando se trata da
creche.
9 junqueira&marin editores 9 85
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
41,62% das crianças de três anos frequentam alguma instituição
privada; esse percentual decresce na medida em que cresce a
idade: 33,7% de quatro anos, reduzindo-se significativamente
para 13,19% na idade de cinco anos.
No Brasil, encontramos dados semelhantes. De
acordo com o IBGE (2006), em 2006, 57,7% das crianças em
idade entre 0 e 3 anos frequentavam alguma instituição pública,
ao passo que 42,3% o faziam em instituições privadas; esse
percentual se inverte quando se trata da pré-escola: 73,5%
vão a estabelecimentos públicos, enquanto que 26,5% o fazem
em instituições privadas. Esses indicadores não sofreram
alterações significativas quando confrontados com os dados do
Censo Escolar de 2007 (CINEP, 2008), 42,53% das creches que
oferecem atendimento às crianças de 0 a 3 anos são de natureza
privada; já na pré-escola – de 4 a 5 anos, esse percentual decresce
substancialmente, ficando em 22,3%.
Os dados que rapidamente apresentamos ilustram
a situação da Educação Infantil nos dois países estudados,
em especial, a desvantagem observada sempre que tratamos
do atendimento às crianças com idades inferiores a três anos.
Sua análise nos permite identificar que as ações e políticas
adotadas pelos dois governos têm pontos convergentes,
embora os processos regulatórios e estratégias utilizadas sejam
diferentes. A focalização nas classes de idade mais próximas da
escolarização do Ensino Fundamental tem sido comum aos dois
países; embora observemos também estratégias e mecanismos
reguladores diferenciados, especialmente no que tange ao
financiamento e aos modos com que cada local organiza os
processos de provimento da Educação Infantil. Assim, se, no
Brasil, o financiamento abrange as creches e pré-escolas, na
Argentina, os recursos são preferencialmente destinados às
classes de cinco anos e, apenas se atendida as matrículas desse
grupo, recomenda-se o atendimento da classe de quatro anos.
Os jardins maternais, correspondentes às nossas creches, são
86 9 junqueira&marin editores 9
sPRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
fundamentalmente financiados com recursos da assistência
social, das comunidades, de doações de empresas e/ou
organizações internacionais.
No entanto, aqui no Brasil, o financiamento da
Educação Infantil, via Fundeb, tende a induzir fortemente a
escolarização nas redes públicas das crianças de 4 a 5 anos,
na medida em que estabelece critérios diferenciados para a
inclusão de matriculas de creches e pré-escolas no censo escolar
e no prazo estipulado para a incorporação das matrículas das
instituições conveniadas pelas redes públicas de educação²².
Nesse sentido, tanto o Brasil como a Argentina tendem a adotar
políticas que podem aprofundar a dualidade já existente na
Educação Infantil entre a creche e a pré-escola não apenas em
termos de concepção e orientação pedagógica, mas também em
termos de provimento de direitos e gestão de sistemas públicos
de educação.
Em ambos os países, acreditamos, as ações políticas
em curso tendem a institucionalizar, nos sistemas formais de
ensino, a educação pré-escolar, induzindo-se políticas no âmbito
não formal para as crianças em idades inferiores a três anos.
Porém, como veremos a seguir, ambos os países estabelecem
critérios para a formalização de convênios que tendem, cada
vez mais, a “formalizar” estas instituições, desafiando-nos a
compreender, do ponto de vista teórico e prático, essas novas
relações entre a esfera público-estatal e o setor privado.
9 junqueira&marin editores 9 87
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
com inserção das crianças na Educação Infantil. Isso pode nos
ajudar a compreender, entre outros fatores, o impulso dado
pelos governos da região, a obrigatoriedade dos anos finais da
Educação Infantil, aqui entre nós denominada pré-escola. Como
já mencionamos acima, essa focalização tende a repor o debate
sobre a especificidade da Educação Infantil, as funções que lhes
são atribuídas e suas articulações com o Ensino Fundamental.
Do ponto de vista da gestão das políticas educacionais, leva
nos a questionar os futuros resultados dessa opção política,
pois pode aprofundar a dualidade estrutural já existente entre
creches e pré-escolas (ou das crianças de 0 a 3anos e aquelas das
idades subsequentes).
Análises de documentos produzidos pelos governos
dos países estudados e por organismos multilaterais atuantes
na região nos mostram que, desde a década de 1990, encontram
se em ascensão, na América Latina, projetos, programas ou
ações destinados à educação das crianças pequenas e de suas
famílias. Esses programas podem ter fontes de financiamento
diversas, desde organismos multilaterais, empresas, instituições
filantrópicas a própria comunidade e também recursos públicos
(PIERO, 2005). No que tange à Educação Infantil, os acordos,
programas e metas, pactuados pelos governantes da região
latino-americana nas mais diversas “reuniões de cúpula”, têm
priorizado o atendimento socioeducativo das crianças com
idades entre 0 e 3 anos, de suas famílias, em programas do tipo
não formal (CAMPOS, 2007). Apesar das críticas já feitas por
inúmeros estudiosos sobre a efetividade social deste tipo de
atendimento (ROSEMBERG, 2002; FRANCO, 1989), conforme
mostramos anteriormente, a própria legislação educacional
resguarda a possibilidade de os Estados nacionais adotarem/
implementarem ações dessa natureza.
Não obstante a visibilidade discursiva sobre a
criança e sua educação, dispomos de poucos dados sobre o
atendimento prestado pelas instituições privadas às crianças
88 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
entre 0 e 3 anos. No Brasil, já dispomos de dados produzidos
pelo Censo Escolar com relação a indicadores de matrícula e
características do atendimento para crianças de 0 a 3 anos, de
instituições cadastradas no censo escolar. No entanto, essas
informações são parciais na medida em que não incorporam
todas as instituições privadas sem fins lucrativos que prestam
esse atendimento. Além desse problema, a categoria “privada”,
conforme consta no censo, não nos permite diferenciar as
instituições sem fins lucrativos daquelas com fins lucrativos.
Dados apresentados pelo Ministério do
DesenvolvimentoSocial(MDS,2008),nodocumento“Orientações
sobre a transição da rede de Educação Infantil financiada com
recursos da assistência social para a educação”, resultantes de
um pareamento entre os indicadores do MDS – instituições que
prestavam serviços de Educação Infantil cofinanciadas com
recursos daquele ministério, trazem informações importantes.
Das 13.627 instituições que recebiam recursos do Fundo
Nacional da Assistência Social (FNAS) em 2005, 8.859 (65%)
também constam no censo escolar do INEP, identificadas,
portanto, como instituições de Educação Infantil. Destas 8.859
instituições de Educação Infantil, 80,3% constavam no censo
como “instituições públicas”, e apenas 19,7% constavam como
“instituições privadas”. Considerando o total de matrículas
(instituições declaradas como públicas e privadas), registrou
se o número de 892.981 e, dessas, predominantemente, eram
na pré-escola, 73%, e apenas 27% de crianças frequentavam a
creche.
Os dados apresentados pelo MDS ratificam nossa
análise de que a focalização das políticas governamentais na
pré-escola (4 a 5 anos) tem sido feita à custa da exclusão ou
do “constrangimento” da oferta pública de matrículas para as
crianças de 0 a 3 anos. Observemos também que os recursos
vindos da assistência social priorizavam o grupo etário de 4 a
5 anos, corroborando, nesse sentido, os dados apresentados
9 junqueira&marin editores 9 89
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
pelo IBGE (2008) – apenas 17% das crianças em idade de 0 a 3
anos frequentam creches. Conforme o próprio relatório do MDS,
os dados surpreenderam na medida em que “[...] demonstram
que a maior parte do público de Educação Infantil, financiado
pela assistência social, freqüenta pré-escola, e não creche, como
comumente se acreditou” (DOLAGARAY, s/d, p. 1).
Vale relembrar que, aqui, no Brasil, a rede de creches
que ofereciam serviços de Educação Infantil, cofinanciadas
pela assistência social, com a aprovação do Fundeb, deixou de
receber esses recursos, passando a ser financiadas com recursos
da educação. Isso não ocorre na Argentina, uma vez que os
jardins maternais privados, embora integrantes do sistema
nacional de educação, estão vinculados predominantemente aos
programas socioeducativos do Ministério de Desenvolvimento
Social, observando-se uma diversidade de formatos e formas de
organização deste atendimento. De acordo com Dolagaray (s/d,
s/p.):
90 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
De fato, se tomarmos como referência dois documentos – a Lei
26.233, que regulamenta os Centros de Desenvolvimento Infantil
na Argentina, e a Lei 11.424/2007, que regulamenta o Fundeb no
Brasil – observamos que as condicionalidades estipuladas para a
obtenção dos recursos públicos pode funcionar como indutores
de processos de adequação dessas instituições aos “modelos”
das creches públicas. Além dos documentos legais, produzidos
na esfera central do governo, os modos de funcionamento
dessas instituições também podem ser modelados pelos termos
dos convênios de prestação de serviços estabelecidos por
cada municipalidade ou jurisdição com as instituições; pelos
processos de acompanhamento e supervisão das equipes de
técnicos locais, vinculados às secretarias de educação e, por fim,
as leis e normativas que regulam a Educação Infantil em cada
município ou Estado.
Considerações finais
Essas novas configurações do campo da Educação
Infantil tornam cada vez mais tênues os limites entre público e
privado; entre formal e não formal. Na educação das crianças
pequenas, as famílias são chamadas a executarem o seu
“protagonismo”, colaborando com as instituições ou sendo alvo
também de programas educativos. Novas funções têm sido
atribuídas a estas, dilatando sua função socializadora básica.
Poderíamos nos arriscar a dizer que tendem, cada vez mais,
a se tornar unidades educadoras e executoras de políticas e
programas voltados para à educação das crianças. Essa nova
dinâmica é apresentada, mormente, como uma celebração do
protagonismo da sociedade civil, contemplando-se, desse modo,
um dos princípios basilares das reformas dos aparelhos de
Estado na América Latina: a emergência de um setor público
não estatal, a definição da educação como políticas educativas.
A quase-ausência de informações sobre os
atendimentos das crianças entre 0 e 3 anos parece nos revelar
9 junqueira&marin editores 9 91
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
também a fragilidade nos processos de regulação por parte
das diferentes esferas de governo, uma vez que a execução de
serviços por instituições privadas mediante a transferência de
recursos públicos é orientada por contratos conveniados entre
as partes. Em países como Brasil e Argentina, em que o Estado
tem assumido apenas o papel de indutor e de suplência na
execução das políticas, essa situação se agrava mais, uma vez que
a ampla autonomia dos chamados “entes federados” para criar
e gerir seus sistemas educacionais pode resultar em profundo
processo de fragmentação, impossibilitando o fortalecimento de
sistemas nacionais de educação.
A incorporação da Educação Infantil à Educação
Básica nos dois países estudados tem produzido impactos
importantes, dentre os quais, gostaríamos de destacar alguns
aspectos que, do nosso ponto de vista, estão presentes na
composição de um novo cenário: a) nas leis dos dois países, a
Educação Infantil tem sido tratada, apenas em tese, como uma
unidade pedagógica, pois na prática se intensificam processos
de segmentação entre creches e pré-escolas; b) esses processos
de segmentação criam status diferenciados e diferenciadores
em várias dimensões, dentre os quais vale destacar aqueles
relacionados a formação e trabalho docente, além de revitalizar,
no nível pedagógico, a dicotomia entre cuidar e educar; c) os
indicadores relacionados à pré-escola evidenciam a crescente
oferta pública para as classes de idade entre 4 e 5 anos, ao passo
que, para as crianças entre 0 e 3 anos, a oferta educativa faz
se de modo significativo, também por instituições não públicas;
d) observa-se, de fato, que caminhamos em ambos os países
para a articulação de redes distintas – no âmbito das creches –
caracterizadas pela presença de instituições públicas no sentido
lato, e instituições privadas financiadas com recursos públicos.
Enfim, como alerta Faria (2005, p. 1025), esperamos que o
convívio entre “vias formais” e “não formais” signifiquem “a
mais e não em vez de”. 3
92 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
Referências
9 junqueira&marin editores 9 93
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
CENTRO NACIONAL DE ORGANIZACIONES DE LA COMUNIDAD (CENOC).
Organizaciones de la Sociedad Civil y Desarrollo Local: Un análisis de las
Organizaciones de la Sociedad Civil registradas en la Base de Datos del CENOC.
Vl Seminario Nacional de la Red de Centros Académicos para el Estudio de
Gobiernos locales. Córdoba, 2004.
94 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO III
MAINARDES, J. Reinterpretando os ciclos de aprendizagem. São Paulo: Cortez,
2007.
9 junqueira&marin editores 9 95
CAPÍTULO III PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
SAVIANI, D. Sistema nacional de educação: conceito, papel histórico e
obstáculos para sua construção no Brasil. Trabalho apresentado na REUNIÃO
ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM
EDUCAÇÃO, 31ª. Caxambu, Minas Gerais, outubro de 2008. Disponível em:
<www.anped.org.br>. Acesso em: 18/03/2009.
96 9 junqueira&marin editores 9
U PARTE
POLÍTICAS I
E PRÁTICAS V
EDUCACIONAIS
i CAPÍTULO IV j
AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL PARTICIPATIVA:
UMA DAS ALTERNATIVAS DE (RE)CONSTRUÇÃO DA
EMANCIPAÇÃO NOS ESPAÇOS EDUCACIONAIS
Introdução
As
a redefinição do papel do de
Políticas
preocupações
Estado.
Avaliação
Nas
comno
palavras
a Brasil
implantação
de Morosini
surgem das
com
9 junqueira&marin editores 9 97
CAPÍTULO IV PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Para Dias Sobrinho (2002, p. 35), as políticas
empreendidaspela União Europeia de ajuda financeira aospaíses
mais pobres, aqueles que sofrem atrasos em seus processos
de desenvolvimento, como exemplo, o Brasil, produziram a
necessidade de avaliações sistemáticas com o propósito de
apreciar a eficácia das intervenções e seu impacto. Destaca a
interferência técnica, política e financeira de dois Organismos:
a OCDE e o Banco Mundial. Esses organismos internacionais
não se limitam em financiar e cobrar avaliações e, também,
intervêm na imposição ideológica e na criação de competências
segundo seus interesses. A ideia de avaliação que se deriva é a
da medida, da eficiência e da produtividade educativa através de
indicadores econômicos e financeiros.
A definição de Estado Avaliador está sustentado no
modelo de controle estatal. “Estado Avaliador é uma nova forma
de coordenação e regulação dos sistemas de educação superior
e da relação entre Estado e universidade” (SANTOS FILHO, 2000,
p. 161). Com esse viés mercadológico emergem as Políticas
de Avaliação Institucional para a educação, que, em grande
parte, surgem em função de acordos firmados com organismos
internacionais, levando-se em consideração os indicadores
da educação no Brasil, que comparados com outros países em
desenvolvimento, precisavam melhorar.
Este texto discute a possibilidade de instaurar, nos
espaços educacionais, um processo de avaliação na contramão
dessalógica queestá posta. Discutimosainstauração da avaliação
institucional participativa, construída pelas universidades e
pelas escolas a partir do seu projeto pedagógico como uma das
alternativas de (re)construção da emancipação nos espaços
educacionais.
Discutir avaliação institucional, na perspectiva da
participação, implica ressignificar os princípios de participação
e de democracia; princípios que devem sustentar a avaliação
institucional. Ressignificar a democracia abre possibilidade
98 9 junqueira&marin editores 9
s PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolarCAPÍTULO IV
para lidar com a complexidade cultural, social e econômica. Para
instaurar a democracia participativa, é necessário “querer se
libertar” dos conceitos que a nova ordem econômica impõe à
sociedade como a competição, o individualismo, a classificação, o
ranking e outros princípios fundamentados na ética do mercado.
A discussão dessas questõesperpassa pela discussão
dos paradigmas de regulação e emancipação construídos na
modernidade, sendo que o primeiro “tomou conta” da sociedade.
Entender esses conceitos como sustentadores dos enfoques
de avaliação é fundamental para compreensão da avaliação
institucional participativa como alternativa de reconstrução da
emancipação nos espaços educacionais.
Defendemos a avaliação institucional participativa
como uma estratégia para produção de espaços sociais
emancipatórios, que contribui para a construção de novas
subjetividades/intersubjetividades, o que possibilita mudanças
de concepções, de atitudes, das práticas e constrói sujeitos
capazes de contribuir com a transformação social. Nesse
sentido, para definir a avaliação institucional participativa, será
necessário discutir o conceito de espaço social entendido como
local de lutas entre posições diferentes o que gera conflitos
necessários para que haja mudanças de atitudes, questão que
analisaremos neste texto. Ainda discutiremos o conceito de
emancipação como construto da modernidade e que foi se
perdendo no decorrer da história à medida que os princípios
da regulação dominaram a sociedade e, portanto, é necessário
reinventar a emancipação. O terceiro conceito necessário para
compreendermos a avaliação participativa é o conceito de
participação como resultante da democracia participativa e não
da democracia representativa. A partir desses pressupostos
teóricos, discutiremos a avaliação institucional participativa
como caminho para a reconstrução da emancipação nos espaços
universitários.
9 junqueira&marin editores 9 99
CAPÍTULO IV PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: política, currículo e espaço escolar
s
Espaço Social na perspectiva de Bourdieu como um
campo de relações complexas necessário ao processo de
avaliação participativa
Ascensão tecnológica/regulação:
a lógica que sobreviveu
Emancipação/libertação:
“tudo que é sólido desmancha no ar”
Considerações finais
PERONI, Vera. Política educacional e papel do Estado: no Brasil dos anos 1990.
Xamã, São Paulo, 2003.
i CAPÍTULO V j
INTERDISCIPLINARIDADE NO CURSO DE PEDAGOGIA:
UMA PRÁTICA DE DIFÍCIL CONSTRUÇÃO
Introdução
Este
a artigo traz uma reflexão sobre
interdisciplinaridade a partir da
reestruturação do Curso de Pedagogia da Universidade do
Estado de Mato Grosso, Campus Jane Vanini, Cáceres-MT. O novo
projeto político-pedagógico do Curso teve início no segundo
semestre do ano de 2007 e apontou a interdisciplinaridade
como um dos elementos estruturantes de seu currículo, o qual
foi organizado em torno de oito eixos temáticos, sendo um para
cada semestre. Os eixos tratados interdisciplinarmente têm o
campo de atuação dos futurospedagogos como meta, apontando,
assim, para as múltiplas relações que a escola (por meio da
elaboração e execução do seu currículo) e o docente (por meio
do desenvolvimento de sua prática pedagógica) estabelecem
com a sociedade de uma maneira mais ampla.
A interdisciplinaridade na produção do
conhecimento é vista, por um lado, como necessária, mas,
por outro, em virtude do processo de produção da existência
humana, que é capitalista e carregado dos mais variados
interesses, torna-se um problema que, para Frigotto (2000, p.
31), explicita-se em dois níveis: “[...] pelos limites do sujeito que
busca construir o conhecimento de uma determinada realidade
e, de outro lado, pela complexidade desta realidade e seu caráter
histórico”.
Em busca de uma acepção de interdisciplinaridade
que possa orientar nossas ações, concordamos também com
Freitas (2000) quando salienta que, fora do contexto do
A interdisciplinaridade a partir da
implantação da nova matriz curricular
Considerações finais
Referências
i CAPÍTULO VI j
EDUCAÇÃO DA PEQUENA INFÂNCIA: UM OLHAR
SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL DOS PROFESSORES DE
EDUCAÇÃO INFANTIL²⁵
Introdução
O em
currículo para o curso
núcleo
de
torno
Pedagogia
do dos
presente
elementos
e suastrabalho
possíveis
constitutivos
implicações
é o debate
do
UFS
Centro‐
Oeste
Sul ‐ Fundação
Universidade
UniversidadedeFederal
Federal do Santa
Rio
Paraná
Grande
Catarina
Maria
do Rio
doGrande
Sul do Sul FURG
UFRGS
UFSC
UFPR
UFSM
2. QUADRO COMPARATIVO
Arte 55,56%
Avaliação 50,00%
Referências
Educando a infância brasileira. In: LOPES, Eliana Marta Teixeira, FARIA FILHO,
Luciano Mendes de e VEIGA, Cynthia Greive (Orgs.).500 anos de educação no
Brasil. (Org). 3 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
ROCHA,EloísaAcires Candal.ApesquisaemeducaçãoinfantilnoBrasil:trajetória
recente e perspectiva de consolidação de uma pedagogia. Florianópolis: UFSC,
Centro de Ciências da Educação, Núcleo de Publicações, 1999, 290 p.
SACRISTÁN, José Gimeno. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3 ed. Porto
Alegre: Artmed, 2000.
iCAPÍTULO VIIj
EXPERIÊNCIAS DE ESTAGIÁRIOS DE LICENCIATURAS:
AS RELAÇÕES ENTRE A UNIVERSIDADE ESCOLA
Introdução
Esta
universidade e escola,
projeto
análise
desenvolvido
de pesquisa
é parte dos resultados do
Formação de professores
no campus universitário
“Jane Vanini”, UNEMAT/ Cáceres, junto aos cursos de
licenciatura. Os dados aqui apresentados se referem ao grupo
de alunos em fase de estágio, sujeitos desta pesquisa até o
momento, e sua visão sobre o estágio, especialmente sobre a
relação entre a universidade e a escola. A pesquisa se pautou
em estudos bibliográficos sobre o tema, análise de documentos
e entrevistas com alunos dos cursos de licenciatura (cuja
referência neste trabalho será feita por letras), sendo 9 (nove)
de História, 7 (sete) de Matemática, 4 (quatro) de Computação.
A variedade na quantidade se explica pela anuência à pesquisa
e/ou pelo número de estagiários disponíveis no período em que
se realizou a coleta de informações.
“Ele ajudou bastante, ele orienta nas nossas dificuldades, ele não
deixa de fazer a parte dele, ele ajuda bastante mesmo e nunca nos
deixou na mão” (AFH).
“Foi muito bom. No sétimo semestre ele fez com que a gente
se aproximasse mais das escolas e não só observasse mais,
fizéssemos uma análise bem feita não só das escolas, mas dos
alunos e também dos professores ele nos orientou muito bem
mesmo” (ADH).
“(...) eu lido com crianças carentes, eu achava que eles só que eram
assim e certas coisas acontecia somente no Peti mas me enganei
direitinho, tem alunos que falam palavrões, não param sentados,
se agridem dentro das salas de aulas e o professor não pode fazer
muita coisa. Você tem que amar muito sua profissão mesmo para
continuar. A sociedade tem mudado muito e as mudanças são a
todo o momento, as cabeças não é mais o homem... a mulher tem
assumido esse papel, as crianças ficam a maior parte do tempo
sozinhas ou com parentes, pois os pais precisam trabalhar muito
e não tem muito tempo para dedicar o seu tempo para os filhos.
Isso reflete muito nas escolas, por isso é que a escola hoje tem que
estar mais preparada para trabalhar o psicológico das crianças
e dos jovens...” (ADH).
“(...) você tem que ter outra opção para dar aula, até porque
as escolas não tem todo estes aparatos de mídia... aqui na
universidade tudo que a gente vai fazer a gente diz “pega o data
show, pega o retro” e nas escolas não tem isso” (AHI).
Considerações finais
Referências
i CAPÍTULO VIII j
ESCOLA E FORMAÇÃO ESCOLAR:
REFLEXÕES A PARTIR DA PRODUÇÃO DO GRUPO
DE TRABALHO EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL DA ANPEd³⁷
(2000-2005)
Introdução
Opresente
análises realizadas
texto parte
em dos
umaresultados
dissertaçãodas
de
mestrado em Educação (ROSA, 2008), que buscou apreender
como as categorias “escola”, “ensino”, “conhecimento escolar”
e “formação escolar” são concebidas e tratadas em artigos
apresentados nas reuniões anuais da Associação Nacional de
Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd).
Considerando os limites postos para este artigo,
optou-se por enfocar principalmente aspectos relacionados às
categorias “escola” e “formação escolar”, na produção do GT
13, mencionada acima. Contudo, alguns aspectos referentes às
demais categorias estudadas, como o “ensino” e o “conhecimento
escolar” também serão abordados, pois estão direta ou
indiretamente conectados.
Tabela 1: GT 13
5 Políticas educacionais 06 7
7 Formação de professores 06 7
8 Outros 13 15
Total 88 100
Considerações finais
Referências
ARAÚJO, M.S.; PÉREZ, C. L.V. (2004). Um jogo de luz e sombras: lógicas de ação
no cotidiano escolar. Anais. 27ª Reunião da ANPEd.
_________. A educação numa encruzilhada. Educação. Ano 11, n. 19, p. 33-53, dez.
2003.
i CAPÍTULO IX j
ELEMENTOS POLÍTICOS E PEDAGÓGICOS EM
CARTILHAS ESCOLARES ITALIANAS⁴⁴
Claricia Otto
Introdução
Ofragmento
La bambinaacima
italiana
étranscrito
alla scuolada(Acartilha
menina
italiana na escola), a qual tem por autores os professores Siro
A Itália e o Rei
Considerações Finais
Referências
__________. A economia das trocas simbólicas. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 1999.
Cartilhas
CORTI, Siro; CAVAZZUTI, Pietro. La bambina italiana alla scuola. 8. ed. Roma:
A. Vallardi, 1905, p.55.
i CAPÍTULO X j
A SOMBRA DA VIOLÊNCIA NA RELAÇÃO PEDAGÓGICA:
UM ESTUDO DAS REPRESENTAÇÕES DE
DIRIGENTES E PROFESSORES DE ESCOLAS
DE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO
Emília Darci de Souza Cuyabano
Introdução
Este
do medo na escola”
máscaras da é parte
trabalho
desenvolvida no Núcleo de Pesquisa
da pesquisa “As
violência e o imaginário
“Nós temos aqui dentro da escola fatos recentes, vou até citar
porque nós tamos vivendo isso, então é importante citar é...
Nós temos uma aluna aqui, né, que tava na sala de aula e o
coleguinha derrubou um lápis pra cima, e caiu dentro do olho
dela, e machucou o olho. Eles jogam, jogam bolsas e quando dá
um pouquinho o aluno zanga e joga lápis, ele joga caderno, joga
bolsa, ele vira a cadeira... São atos de violência, que se vê que às
vezes grita... Esses dias [...], meu aluno virou a cadeira, me xingou,
e eu fiquei muito triste, [...] na minha época a gente tinha que
respeitar o professor, respeitar mãe, respeitar pai. Hoje, eu tô aqui
dentro da sala de aula e não sinto... Sabe se faz tanto, se luta tanto
[...] e não consegue pelo menos respeito, questão de dignidade
[...] Tenho um fato recente que aconteceu comigo, meu aluno me
xingou e derrubou a carteira, derrubou a mesa, jogou material
no chão, me xingou de vagabunda, e não xingou só mais a sua
avó. Gente, o que tá acontecendo? Um momento, eu nem cheguei
a falar com as crianças, porque se fosse um filho meu jamais na
minha vida eu ia ter uma filha, eu nunca ouvi essa palavra de
ninguém eu ouvi de uma criança de seis anos” (DFE12).
“Em alguns casos, teve alunos nossos que foram nas imediações,
não na porta, mas nas imediações [...] foram assaltados. Então os
“Os problemas que você vivencia no dia a dia com as crianças, com
as famílias, com os problemas do bairro, eles são semelhantes, eles
só mudam de endereço, os problemas são os mesmos” (DFE7).
“Eu acho que a violência aqui não é expressa... Essa sala de aula,
por exemplo: você pode olhar pra ela, mas não tem condições
de trabalhar numa sala dessas, suja, as paredes estão aí, olha
lá, palavrões na parede, o quadro tem um buraco no meio, né?
“A gente às vezes acha que [...] classe média alta não existe
violência [...]. Ela também é violência [...]. Falta de atenção, [...]
falta de carinho, da presença dos pais, né? [...] Eu já vi casos
“Às vezes têm pais, que a gente tem contato, que são super
agressivos [...]. Obviamente, essa agressão acontece em casa
também [...]. A criança, se... criada num ambiente desses [...] ela
também vai ser violenta com as palavras e com as atitudes” (SG
E3).
“Por exemplo, fica ali em cima... Daqui a pouco, onze horas, você
costuma ouvir grito de socorro de mulher: ‘socorro... socorro...’
aquela gritaria, cachorro latindo... Então é um tipo de violência
“O jovem de hoje ele não tem... ele não pensa não, ele age
instintivamente e sabemos disso” (CNE1).
“Falam à hora que eles querem. Eles gritam na hora que eles
querem, levantam à hora que eles querem, esmurram, né? Fazem
o que eles querem. As convenções são outras, né? Eu não sei qual
é” (JVE18).
“Muitos são adolescentes que não têm nem profissão. Não têm
de onde tirar esses recursos. Então, além de roubar, às vezes
da própria casa, ainda acabam cometendo pequenos furtos pra
tá adquirindo as drogas. Já trabalhei em bairros periféricos
assim, aonde a questão do roubo é uma alternativa aceita, é
“O aluno, ele tá todo dia na escola, né? Eu digo que ele é excelente,
pra mim poder não me comprometer. Essa é aquela forma mais
simples de lidar com a violência. Porque eu passo a mão na
cabeça dele dizendo que ele é ótimo? Essa é uma forma, porque
eu prefiro dizer que ele está excelente, pra eu não ter que falar
com o pai, com a mãe...” (DFE7).
“A escola sempre tem uma questão de [...] ser vítima. [...] É uma
escola central, na qual recebe todos os bairros, né? Da Capital.
Então, a gente tem essa condição de uma gangue, de repente,
querer interferir, na outra, na escola, mostrar quem é o bom,
quem que é o ruim...” (CN E2).
Considerações finais
Referências
i CAPÍTULO XI j
FAZERES NA PRÉ-ESCOLA: UMA PRÁTICA
CONSISTENTE?
Introdução
Pesquisas
e os movimentos populares em
da infânciaque
para
prol
comprovam
o desenvolvimento
da Educaçãoa importância
humano
Infantil têm
propiciado mudanças na educação oferecida às crianças de 0 a
6⁴⁶ anos de idade. Graças a esses dois fatores, a Educação Infantil
tem passado por um processo histórico marcado por grandes
avanços, tanto no que se refere à política para Educação Infantil
quanto à prática pedagógica corrente nessas instituições.
Podemos perceber um sinal desse avanço no texto
da Política Nacional de Educação Infantil. Dentre as metas
expressas nesse documento, ressaltamos dois aspectos em
especial: fortalecer a concepção de Educação Infantil nas
instâncias competentes e promover a melhoria da qualidade
do atendimento em creches e pré-escolas (BRASIL, 2005, grifos
nossos).
A receptividade
1. Em relação ao movimento
[...] dar atenção a ela como pessoa que está num contínuo
crescimento e desenvolvimento, compreendendo sua
singularidade, identificando e respondendo às suas
necessidades. Isto inclui interessar-se sobre o que a criança
sente, pensa, o que ela sabe sobre si e sobre o mundo visando
2. Em relação ao desenvolvimento
da linguagem oral e escrita
Considerações finais
Referências
ARCE, Alessandra; MARTINS, Ligia Márcia (Orgs.). Quem tem medo de ensinar
na Educação Infantil? São Paulo: Alínea, 2007.
VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. 5 ed. São Paulo: Martins Fontes,
1994.
iCAPÍTULO XIIj
MEDIAÇÃO NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE
PROFESSORES DOS CICLOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL
Tatiane Lebre Dias
Sônia Regina Fiorim Enumo
Mirian da Silva Marinho Moreira
Fabiana Muniz Mello Félix
Introdução
Aavaliação
estudantesbrasileiros
do desempenho
do EnsinoFundamental
escolar de
S-H-O-H-R
(S= estímulo, O= organismo, R= resposta e H= humano)
Mediação Comportamental
A B C D
Conceitual 0 0 0 0
Solicitar
a tarefa atenção 1,91 0,9 0
Regulação na tarefa
Competência/ 0,5
Solicitar
Dar feedback
autorregulação
corretivo 6 3,2 7,0 5,6
0,1 0 1 0,1
Elogiar‐
Competência/ Dar feedback positivo 0,8 0 0,8 0,0
Encorajar
Encorajar
contingente
Responsividade Responder à questão 1,5 1,4 1,0 0,3
Responder à solicitação do
“Psiu! Oh, Talita, será que você poderia falar baixo, Talita?”
FONSECA,V.;CUNHA,A.C.B.TeoriadaExperiênciadeAprendizagemMediatizada
e interacção familiar: prevenção das perturbações de desenvolvimento e de
aprendizagem. Lisboa: FMH Edições, 2003.
i CAPÍTULO XIII j
ESCOLA, MULTIPLICIDADE E DESEJO:
AGENCIAMENTOS NECESSÁRIOS⁵⁰
Introdução
Acordar,
passarear, quebrantar,
pantalear,
benzer,
solear,
saranzar,
grunir,
verdejar,
cevar,
assobiar,
nadar,
brincar,
brejear,
rezar,riolar,
pescar,
sorrir,
gritar, pular, andar, ir, escolear, silenciar, escutar, obedecer,
comer, tentar, falar, contar, voltar, trepar, laranjear, arear, zumbir,
escurecer, dormir... ações cotidianas de Ana, uma menina de 9 anos
que movimenta esta pesquisa. Ana, que mora na Campina, região
labiríntica do Pantanal mato-grossense, espaço que se faz a todo
instante e que, num piscar de olhos, transforma-se em outro.
Ana, que dá mais respeito às coisas que vivem de barriga no
chão, que entende o sotaque das águas, que valoriza as coisas e
os seres desimportantes, que preza mais os insetos que os aviões,
mais a velocidade das tartarugas que a dos mísseis; que gosta
de passarinhos e, apanhando desperdícios em seu quintal, que
“ah, tia, até que é bom porque os professorsão bom, a escola é boa
e a merenda tamém. Mas eu num gosto é de tê que i de ônibus.
Nóis anda todo dia um caminho bem bom prá pegá o ônibus, nóis
brinca de pega-pega, nóis sobe nas árvore, nóis esconde do otro,
aí eles fica preocupado e, quando nós volta da escola, dá até pra
tomá banho na vazante”.
Interrompi, perguntando:
E ela respondeu:
“num tá veno tia, aqui é meio triste, tem que ficá meia hora sem
fazê nada, veno o tempo passá. Mas, quando estraga o ônibus e
nóis tem que descê, aí é legal”.
Imagem 1⁵⁵:
Considerações Finais
Referências
BARROS, Manoel. O livro das ignorãças. 12 ed. Rio de Janeiro: Record, 2006.
____________. Concerto a céu aberto: para solos de ave. 4 ed. Rio de janeiro:
Record, 2004.
____________.Compêndio para uso dos pássaros. 3 ed. Rio de janeiro: Record, 1999.
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas: Magia e Técnica, Arte e Política. 6 ed. São
Paulo: Brasiliense, 1993.
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas: Rua de mão única. São Paulo: Brasiliense,
1994.
DELEUZE, Gilles. Conversações. Tradução Peter Pál Pelbart. Rio de Janeiro, Ed.
34, 1992.
40Há tambémcríticassobrealegitimidadedoqueseconvencionou
chamar de “conhecimento científico”. Apesar de instigantes, não
será possível abordar tais críticas nesse artigo.
aquela
55Transcrição dá frutos
que me do até vida 1:
texto -eImagem aliais
“A árvore
todas me
dadão
minha
vidavida
maisé
não é todas que me dá frutos como a: mangueira, bananeira,
morangueira, mamoeiro, coqueiro, cajueiro, jabuticabeira, ateira,
etc. bom e tem a quelas que dão só flores como a: roseira e etc. eu
acho que todo mundo gosta dela só que nós não tamo sabendo
cuidar dela como ela cuida da gente. Como todo mundo sabe a
árvore tem: tronco, raiz, galhos, flores, frutos, calles e etc. Como
eu amo as plantas as plantas elas respiram o gás carbono e soltam
HeloisaSallesGentil–DoutoraemEducaçãopelaUniversidade
Federal do Rio Grande do Sul (2005). Professora da Universidade
do Estado de Mato Grosso (UNEMAT). Tem atualmente voltado
seus estudos para formação de professores, políticas públicas,
movimentos sociais e escola.