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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO TRÊS RIOS


DEPARTAMENTO DE DIREITO, HUMANIDADES E LETRAS

Rômulo Fernandes Costa

OS DISPOSITIVOS LEGAIS PROPOSTOS PELO PL 2630/2020


QUE VISAM RESTRINGIR AS REDES DE DISSEMINAÇÃO
ARTIFICIAIS DE FAKE NEWS E PERSPECTIVAS FUTURAS

Três Rios, RJ
2021
RÔMULO FERNANDES COSTA

OS DISPOSITIVOS LEGAIS PROPOSTOS PELO PL 2.630/2020


QUE VISAM RESTRINGIR AS REDES DE DISSEMINAÇÃO
ARTIFICIAIS DE FAKE NEWS E PERSPECTIVAS FUTURAS

Monografia apresentada como requisito parcial


para obtenção do título de Bacharel em Direito,
em curso de graduação oferecido pela
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro,
campus Instituto Três Rios.

Orientadora: Profª. Drª. Ludmilla Elyseu Rocha

Três Rios, RJ
Dezembro de 2021
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UFRRJ – ITR / BIBLIOTECA
Os dispositivos legais propostos pelo PL 2630/2020 que visam restringir as
redes de disseminação artificiais de fake news e perspectivas futuras.
COSTA, Rômulo Fernandes / Rômulo Fernandes Costa – 2021.
60 f.
Orientador: Ludmilla Elyseu Rocha
Direito Civil – Monografia. 2. Responsabilidade Civil – Monografia. 3. Direito
Penal - Monografia.
Monografia (Graduação em Direito). Instituto Três Rios, Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro - Faculdade de Direito.

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese,
desde que citada a fonte.

_______________________________ ______________________________
Assinatura Data
RÔMULO FERNANDES COSTA

OS DISPOSITIVOS LEGAIS PROPOSTOS PELO PL 2.630/2020


QUE VISAM RESTRINGIR AS REDES DE DISSEMINAÇÃO
ARTIFICIAIS DE FAKE NEWS E PERSPECTIVAS FUTURAS

Monografia apresentada como requisito parcial


para obtenção do título de Bacharel em Direito,
em curso de graduação oferecido pela
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro,
campus Instituto Três Rios.

Aprovado em:

Banca Examinadora:

Professora Doutora Ludmilla Elyseu Rocha (Orientadora)


Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – Instituto Três Rios

Professora Doutora Marcela Siqueira Miguens


Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – Instituto Três Rios

Mestre Jorge Baptista Canavez Júnior


Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – Instituto Três Rios
O fim do Direito não é abolir nem restringir, mas
preservar e ampliar a liberdade.

Jonh Locke
RESUMO

COSTA, Rômulo Fernandes. Os dispositivos legais propostos pelo PL 2630/2020 que visam
restringir as redes de disseminação artificiais de fake news e perspectivas futuras. 2021.
60 p. Monografia (Graduação em Direito). Instituto Três Rios, Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro, Três Rios, RJ, 2021.

O presente trabalho buscará expor, de forma crítica, as propostas do Projeto de Lei


nº 2.630/2020 para combater a disseminação das fake news programadas com o fim de impactar,
de forma artificial, a distribuição de conteúdo com o objetivo de obter ganhos políticos e os
efeitos esperados pós promulgação do projeto nas próximas eleições. Visto isso, visa analisar a
gênese do projeto lei, o que ele visa regulamentar e coibir com a promulgação do PL
nº 2.630/2020, tendo em vista que fake news não se trata de opinião, mas sim a manipulação de
uma informação errada e/ou destorcida. Posteriormente, a pesquisa vislumbrará um relevante
tema a ser combatido pela lei, qual seja, o financiamento, com grupos especializados, visando
o disparo em massa de informações falsas para obtenção de vantagem políticas; as chamadas
“quadrilhas digitais”. E, por fim, serão abordadas as perspectivas futuras eleitorais, caso haja a
promulgação do PL 2630/2020.

Palavras-chave: Fake News. Liberdade de Expressão. Liberdade de Informação. PL


nº 2630/2020. Política.
ABSTRACT

COSTA, Rômulo Fernandes. The legal provisions proposed by PL 2630/2020 aimed at


restricting artificial dissemination networks of fake news and future prospects. 2021. 60 p.
Monograph (Law Degree). Três Rios Institute, Federal Rural University of Rio de Janeiro, Três
Rios, RJ, 2015.

This paper will seek to critically expose the proposals of Bill n. 2,630/2020 to combat the
dissemination of fake news programmed in order to artificially impact the distribution of
content in order to obtain political gains and the expected effects after the project's enactment
in the next elections. Given this, it aims to analyze the genesis of the bill, which it aims to
regulate and curb with the promulgation of PL 2.630/2020, considering that fake news is not
about opinion, but rather the manipulation of wrong and / or twisted information. Subsequently,
the research will envision a relevant theme to be fought by law, namely, funding, with
specialized groups, aiming at the mass shooting of false information to gain political advantage;
so-called "digital gangs". Finally, the future electoral prospects will be addressed if PL
2630/2020 is enacted.

Keywords: Fake News. Freedom of Speech. Freedom of information. PL No. 2630/2020.


Policy.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 08

CAPÍTULO 1
DIREITO FUNDAMENTAL A INFORMAÇÃO X INDICAÇÃO DA FONTE / ORIGEM DA
INFORMAÇÃO ....................................................................................................................... 11

1.1 Do direito à informação e da liberdade de expressão ......................................... 14


1.2 Das ponderações entre a liberdade de expressão e a liberdade de informação .. 17
1.3 Da obrigatoriedade do estado em delegar os meios de comunicação ................ 20
1.4 A vedação ao anonimato e o direito de sigilo da fonte ........................................ 23

CAPÍTULO 2
OS CONTEÚDOS QUE O PL Nº 2.630/2020 VISA COMBATER..................................... 26

2.1 A regulação das fake new antes do PL 2.630/20 ................................................. 30


2.2 As regulamentações da PL 2.630/2020 que poderão influenciar nos processos
eleitorais brasileiros futuros................................................................................. 35

CAPÍTULO 3
RESPONSABILIDADE CIVIL E INDENIZAÇÃO POR FAKE NEWS ................................ 39

3.1 Da responsabilidade civil .................................................................................... 39


3.1.1 Do conceito de responsabilidade .............................................................................. 39
3.1.2 Origem histórica da responsabilidade civil .............................................................. 39
3.1.3 Do ato ilícito, culpa, dano e dever de reparação ...................................................... 40

3.2 Indenização por injúria, difamação e calúnia .................................................... 42


3.2.1 Da responsabilidade civil e penal ............................................................................. 42

3.3 Da reparação civil por injúria, difamação e calúnia .......................................... 44

3.4 Da responsabilidade civil nos em caso de fake news ............................................ 44


3.4.1 Da responsabilidade civil dos provedores de internet e mensageria e demais veículos
de informação ............................................................................................................ 45
3.4.2 Da responsabilização de quem cria e dissemina fake news ...................................... 49
3.4.3 Precedentes e jurisprudência em casos de fake news no ordenamento brasileiro ..... 51

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 56

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 57
8

INTRODUÇÃO

Não há como delimitar o início da dissipação de notícias inverídicas, é sabido, porém,


que estas geram revoltas, até mesmo daqueles que não figuram como vítimas da calúnia, por
não saberem a verdade. Desta forma, mudam-se as circunstâncias, mas a inverdade continua a
incomodar.

No Brasil contemporâneo não é diferente e, desde as eleições de 2018, o país passa por
uma onda de informações enganosas com viés de impedir a visão de uma realidade subjetiva.
Tanto o atual Presidente do Brasil Jair Bolsonaro quanto o Presidente dos Estados Unidos
Donald Trump veem seus nomes frequentemente relacionados a notícias falsas, ainda mais por
serem apoiadores e emissores destas. Ou seja, pessoas com algum vínculo com os
representantes da nação valorizam e intensificam a propagação da mentira1, no intuito de
manterem a sociedade vendada. Donald Trump, inclusive, é investigado por manter uma rede
de robôs responsável por encaminhar notícias falsas, massivamente, nas mídias sociais. 2 Haja
vista a conduta de Trump servir de exemplo a do presidente brasileiro, este também compartilha
informações infundadas através dos meios de comunicação, consideradas fake news.

Diferentemente de histórias mal contadas, as fake news atuam como uma inverdade
desde o seu princípio, ou seja, a intenção ao conta-la é a de enganar o receptor da mensagem,
que ficará iludido, portanto, desinformado. Observa-se, assim, que a desinformação é um
terreno fértil para o fortalecimento mentira. Além disso, cabe ressaltar a facilidade da
divulgação das fake news em um país onde a política, a justiça e mídia são desmoralizadas.
Quanto mais frágil for a sociedade, a nível de conhecimento, maior será a dificuldade em
absolver, em sentido crítico, as informações recebidas. O resultado dessa cadeia de
desinformação é catastrófico e resulta, fora a alienação popular, em uma polarização política e
em uma sociedade inflamada.

1
MILITÃO, Eduardo; REBELLO, Aiuri. Rede de fake news com robôs pró-Bolsonaro mantém 80% das contas
ativas. In: UOL, Brasília / São Paulo, 19 set. 2019. Disponível em:
<https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/09/19/fake-news-pro-bolsonaro-whatsapp-
eleicoes-robos-disparo-em-massa.htm>. Acesso em: 04 mar. 2021.
2
BRENAN, Megan. President Trump and social media are super spreaders of misinformation right now,
Americans say. In: Knight Foundation. NiemanLab, Nova York, publicado em: 8 out. 2020. Disponível em:
<https://www.niemanlab.org/2020/10/president-trump-and-social-media-are-super-spreaders-of-
misinformation-right-now-americans-say/>. Acesso em: 04 mar. 2021.
9

Frente a esse quadro problemático, o senador Alessandro Vieira apresentou o Projeto


de Lei 2.630, amplamente conhecido como PL das fake news, pois tem como objetivo combatê-
las e, desta forma, preservar o cidadão. Impende salientar o impacto das notícias falsas nas
eleições, como, por exemplo, nas eleições brasileiras de 2018 e a de 2020 para prefeito da cidade
de São Paulo. Elas são capazes de manipular e delinear um caminho a ser seguido pelo eleitor,
uma vez que agem em seu subconsciente, tirando, assim, um dos requisitos para o voto, que é
a motivação pessoal. O texto do PL é, em algumas partes, contraditório e passível de discussão,
todavia, dado o contexto social, evidencia-se como um instrumento de suma importância. Nas
palavras do ministro Luís Roberto Barroso:

O que a circulação de notícias fraudulentas faz é criar um estado mental de equívoco,


de confusão nas pessoas, fazendo com que elas não possam manifestar a sua vontade
de maneira verdadeiramente livre e esclarecida porque são influenciadas muitas vezes
por verdadeiras milícias digitais, que fazem terrorismo moral pelas redes sociais,
desconstruindo biografias e inventando factoides que muitas vezes influenciam o
processo eleitoral, comprometendo a manifestação de vontade do eleitor.3

Assim, pode-se enfatizar que o tema trazido pela presente monografia está totalmente
em voga, fazendo parte das atuais discussões doutrinárias, jurisprudenciais e legislativas do
Brasil e do mundo, fatos esses levados em conta para a escolha do presente tema. Além disso,
a análise de um projeto de lei, de seus trâmites e discussões, ante a votação do certame nas
devidas casas legislativas, também influenciou na opção do conteúdo a ser tratado na presente
dissertação.

Para a elaboração do trabalho foram utilizadas várias reportagens jornalísticas acerca


do tema, também foram usadas algumas audiências públicas sobre o certame, juntamente com
o uso de doutrinas já existentes sobre o objeto e legislações, além de alguns julgados e demais
jurisprudências acerca do tema.

Além do trabalho metodológico, a presente monografia analisará de forma crítica a


atual conjuntura legislativa referente a liberdade de expressão e informação no Brasil, as
mudanças que o PL 2630/2020 busca fazer no ordenamento e a responsabilidade civil e penal
imposta para quem cria e dissemina fake news no Brasil, além dos provedores.

3
SOUZA, Michel de; NIERO, Guilherme. 'Judiciário não deve ser um censor privado', diz Barroso no
Conbrade/MG. In: CNN Brasil. São Paulo, publicado em: 07 jul. 2020. Disponível em:
<https://www.cnnbrasil.com.br/politica/2020/07/08/judiciario-nao-e-local-mais-adequado-para-enfrentar-
fake-news-diz-barroso>. Acesso em: 04 mar. 2020.
10

Visto isso, serão analisados os dispositivos ligais sugeridos pelo PL 2.630/20 - os quais
visarão restringir os conteúdos, bem como a atuação das redes de disseminações artificiais- e
seus reflexos no processo eleitoral brasileiro, sua constitucionalidade e a responsabilização dos
responsáveis por criar e disseminar conteúdos inverídicos.
11

CAPÍTULO 1

DIREITO FUNDAMENTAL A INFORMAÇÃO X INDICAÇÃO DA FONTE / ORIGEM DA


INFORMAÇÃO

Com o advento da internet e do mundo globalizado somos colocados à frente de um


bombardeamento de informações. Com isso, essa expansiva massa de conteúdos leva-se a uma
facilidade imensa na obtenção de informação em grande escala, entretanto, também constrói uma
vil possibilidade de produção materiais informativos, seja de cunho jornalístico ou não,
verdadeiros ou falsos.

Visto a grande possibilidade de criação e obtenção conteúdos, isso atrelado ao direito


fundamental de se resguardar e manter o sigilo da fonte da informação, o ordenamento brasileiro
preza por um ambiente de livre circulação de notícias e opiniões, sem nenhuma intervenção prévia
do Estado ou dos provedores de internet sob o que é publicado.

Com isso, os cidadãos destinatários desses conteúdos ficam à mercê de uma grande carga
de informações inverídicas, equivocadas, incompletas ou que não abordam todos os pontos de
vista sobre determinado fato, tendo em vista que resposta jurídica aos efeitos gerados pela
publicação será posterior a sua livre circulação.

Além do problema referente aos impactos gerados pelo compartilhamento em massa de


fake news, o Brasil enfrenta outro problema contemporâneo. Os principais canais de comunicação
e de imprensa nacionais disseminam conteúdos de acordo com o interesse de determinados
grupos. Assim, com o monopólio dos meios de comunicação, a informações vinculadas por eles
sempre irão de encontro aos ideais de quem patrocina, ao ponto de que, manter os meios de
comunicação aumenta o poder de persuasão populacional.

Em contra senso a isso, grupos especializados no compartilhamento de fake news vêm


crescendo nos dias atuais, pois, além da criação e divulgação de conteúdos em massa de forma
mecânica, eles também impulsionam a divulgação e compartilhamento de conteúdo em
provedores de informação e mensageria, como, por exemplo, no Twitter.4

4
QUEIROZ. Antônio Augusto de. O papel dos robôs e das redes sociais nas eleições deste ano. In: CONJUR.
Publicado em: 23 out. 2018. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-out-23/antonio-queiroz-papel-
12

Ao fazer este impulsionamento, a informação acaba ganhando mais relevância de forma


nacional ou regional, isso faz com que ela chegue ao maior número de pessoas, bem como a
projeção de um grande veículo de imprensa.

Visto isso, a internet ganha um espeço de “concorrência” com os meios de comunicação,


na divulgação de conteúdos e opiniões, corroborando com a persuasão social.

Assim, o pluralismo dos provedores de conteúdo e de opinião deve ser garantido pelo
ordenamento, juntamente a um trabalho voraz contra às fake news, visando sempre a finalidade
de busca da verdade real dos fatos e um ambiente informacional democrático.

Entretanto, por diversos motivos estas fake news dão ênfase a opinião de um grupo
específico, sendo publicado nos provedores de serviço de mensageria e redes sociais informações
5
com a intenção real de interferir no juízo de valor do receptor da informação6, e na grande
maioria das vezes, na obtenção de benefícios financeiros, sociais e/ou políticos, visando manter
os interesses do grupo nos meios de comunicação, interferindo na formação da opinião pública.

Fica evidente, assim, que o grande volume de informações e a facilidade de acesso à


conteúdos fortaleceu a disseminação de fake news no Brasil, isso atrelado aos interesses e
intenções pré-estabelecidos por determinados grupos detentores dos meios de comunicação, os
quais vem de longo tempo, ficando notório a real necessidade de atuações legislativas e
administrativas eficazes para que as notícias e opiniões passadas e recebidas sejam feitas da
maneira mais sóbrias possível.

Por isso, se faz necessário enfatizar que o mero acesso a informações, por si só, não quer
dizer ter conhecimento. É necessário tomar um juízo de valor sobre a informação e analisadas de
forma crítica.

Para início de análise, é necessário conceituar o significado de informação com a


definição de ser o ato ou efeito de se informa-se; ter ciência7. Assim, deve-se ater a linha tênue
entre informação e conhecimento, a qual é fundamental para o entendimento dos paradigmas

robos-redes-sociais-eleicoes>. Acesso em: 08 mar. 2021.


5
Provedores de conteúdo ou de informação são os intermediários entre o editor de conteúdo e o usuário de um
site. Podem ser pessoas naturais ou jurídicas, isto é, engloba desde um blog ou website pessoal até grandes
empresas especializadas, como é o caso das redes sociais (ex.: Orkut, Facebook, Instagram, etc).
(Moraes/2018).
6
DIJK, Teun A. Van. Discurso e poder. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2015, p. 23.
7
The Oxford English Dictionary. In: Oxford Languages. Disponível em: <https://languages.oup.com/>. Acesso
em: 08 mar. 2021.
13

atuais e da grande problemática oriunda das fake news. Primeiramente, a questão de ser informado
por si só não irá considerar um conhecimento sobre o fato. Ao ser informado, o receptor do
conteúdo deve analisa-lo e fazer um juízo de valor, verificando a fonte da informação e fazer sua
síntese como um todo. Como bem preconiza Favero e Steinmetz:

A questão é que informação não é sinônimo de conhecimento. O conhecimento


depende de análise, verificação, comparação e juízo de valor. Às vezes, o receptor da
informação não possui as condições materiais e nem mesmo as competências
intelectuais para a avaliação crítica. Além disso, há que se considerar que nem sempre
a informação posta à disposição das pessoas é imparcial e nem sempre o objetivo é
contribuir para a formação de uma razão pública, mas sim influenciar as atitudes das
pessoas, seja com propósitos culturais, políticos, ideológicos ou até mesmo
financeiros. A informação é poder e, por essa razão, o direito à informação,
componente da liberdade de expressão, não pode ser concebido em uma perspectiva
apenas individual. Ele há de ser considerado também em uma perspectiva coletiva.8

Visto isso, pode-se compreender um pouco mais a ótica de como é formado o


conhecimento sobre determinada matéria analítica. Para isso, deve ser feito um exame dialético
sobre os fatos para chegar mais próximo a um conhecimento sóbrio com juízo de valor. Por isso,
a capacidade intelectual individual é de suma importância para uma adequada absorção de
informações, juntamente a uma real inteiração e filtragem das mesmas, em busca da verdade dos
fatos.

Em virtude dessa tal verdade se faz necessário traçar um liame pré-definido e ético sobre
a verdade dos fatos que será passada ao receptor. Esta análise deve ser feita com muito cuidado,
pois ao se fazer a arguição de um mesmo fato, deve-se encontrar, no mínimo, dois pontos de vista
distintos do fato em si, aos quais levam a interpretações na maioria das vezes distintas. Assim, se
faz necessário cobrar dos provedores de conteúdo a veracidade dos fatos aos quais está sendo
repassada para terceiros, não se exigindo uma informação irrefutável, mas sim aquela oriunda da
diligência do informador, publicada com base em dados e provas concretos, sendo totalmente
rechaçados insinuações e/ou boatos.

Desta forma, trata-se de uma verdade subjetiva e não a verdade objetiva.

Portanto, a verdade deve ser compreendida sempre como subjetiva, ao ponto de


incumbir a quem vai informar o máximo de seriedade possível ao repassar a informação, ao ponto

8
FAVERO, Sabrina; STEINMETZ, Wilson Antônio. Direito de informação: dimensão coletiva da liberdade de
expressão e democracia. In: Revista Jurídica Cesumar. Publicado em: set./dez. 2016. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.17765/2176-9184.2016v16n3p639-655>. v. 16, n. 3, p. 639-655. Acesso em: 15 mar.
2021.
14

de ser extremamente necessária a checagem da veracidade dos fatos, como bem afirma Chequer
“[...] o requisito da verdade deve ser compreendido do ponto de vista subjetivo, equiparando-se à
diligência do informador, a quem incumbe apurar de forma séria os fatos que pretende tornar
públicos”.9

1.1 Do direito à informação e da liberdade de expressão

Para início de debate é necessário conceituar o termo ‘liberdade de expressão’, que, no


entendimento de Barroso, a liberdade de expressão “destina-se a tutelar o direito de externar
ideias, opiniões, juízos de valor, em suma, qualquer manifestação do pensamento humano”.10

Pode-se perceber que a conceituação do termo é muito abrangente e expansiva, mesmo


que sua definição seja de relativa facilidade de compreensão.

No mesmo sentido, a constituição brasileira coloca o direito à informação como um


direito fundamental, elencado no art. 5°, inciso XVI da CRFB/88 (Constituição Republicana
Federativa do Brasil de 1988), que positiva o seguinte: “é assegurado a todos o acesso à
informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. 11

Devemos, assim, analisar que o direito de informação, direito fundamental elencado no


art. 5° da carta magna brasileira, engloba, em primeiro lugar, o Direito Individual de livre
comunicação sobre os fatos, e, por conseguinte, a necessidade de atrelar esse direito como um
Direito Difuso,12 que traz a possibilidade de ser informados sobre fatos relevantes a vida social e
democrática, sempre ligados a valores libertários.

9
CHEQUER, Cláudio. A liberdade de expressão como direito fundamental preferencial prima facie: análise
crítica e proposta de revisão do padrão jurisprudencial brasileiro. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011,
p. 52.
10
BARROSO. Luís Roberto. Colisão entre liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de
ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do código civil e da lei de imprensa. In: Revista de
Direito Administrativo, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, nº 235, jan/mar. 2004, p. 18. Disponível
em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45123>. Acesso em: 15 mar. 2021.
11
BRASIL. Planalto. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
12
Os direitos coletivos, em sentido amplo, dividem-se em direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos,
conforme o parágrafo único do art. 81 da Lei 8.078/90.
Os direitos difusos são aqueles cujos titulares são indeterminados e indetermináveis (transindividuais). Isso
não significa que ninguém sofra ameaça ou violação de direitos difusos, mas que os direitos difusos são direitos
que merecem especial proteção, pois não atingem a alguém em particular e, simultaneamente, a todos.
São exemplos de direitos difusos os direitos a um meio ambiente sadio, à vedação à propaganda enganosa e o
15

Pode-se perceber que o direito à informação engloba tanto a seara de direitos


fundamentais, que por hora sua ideia se confunde com o conceito genérico de liberdade de
expressão, quanto aos direitos coletivos difusos, os quais não estão dispostos à um determinado
grupo de pessoas, sendo direitos transindividuais.

Assim, esta confusão conceitual entre liberdade de expressão, liberdade de informação


e até mesmo o conceito de liberdade de imprensa não é uma grande novidade, principalmente
fora do meio jurídico. Porém, os termos ao serem tratados como sinônimos não passam de
equívocos. Barroso trata a liberdade de expressão como gênero, o qual uma de suas espécies seria
a liberdade de informação em sentido estrito.13

Já para Barroso a liberdade de informação é espécie do gênero liberdade de expressão


em sentido amplo, pois diferentemente, a liberdade de informação tem fiel compromisso com a
verdade, ainda que subjetiva, como bem preconiza o autor:

É fora de dúvida que a liberdade de informação se insere na liberdade de expressão


em sentido amplo, mas a distinção parece útil por conta de um inegável interesse
prático, relacionado com os diferentes requisitos exigíveis de cada uma das
modalidades e suas possíveis limitações. A informação não pode prescindir da verdade
- ainda que uma verdade subjetiva e apenas possível (o ponto será desenvolvido a
diante) - pela circunstancia de que é isso que as pessoas legitimamente supõem estar
conhecendo ao busca-la. Decerto, não se cogita desse requisito quando se cuida de
manifestações da liberdade de expressão. De qualquer forma, a distinção deve pautar-
se por um critério de prevalência: exercício do direito de informação quando a
finalidade da manifestação for a comunicação de fatos noticiáveis, cuja caracterização
vai repousar sobretudo no critério da sua veracidade.14

Já Carvalho acredita que o critério da verdade para diferenciação entre liberdade de


expressão e liberdade de informação é imprescindível porque “o recebedor da informação
necessita do fato objetivamente ocorrido para estabelecer a sua cognição pessoal e para que possa
elaborar a sua percepção sobre o mesmo fato, de modo a formar sua convicção sem qualquer
interferência”.15

direito à segurança pública. (Barroso/2016).


In: BARROSO. Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e
a construção do novo modelo. 9ª ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2020, p. 32.
13
BARROSO, Luís Roberto. Colisão ente liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de
ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do código civil e da lei da imprensa. In: Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 235, jan./mar. 2004, p. 19. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45123>. Acesso em: 15 mar. 2021.
14
Id ibidem, p. 18.
15
CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Direito de informação e liberdade de expressão. 1ª ed.
16

Neste sentido, o autor acredita que a liberdade de informação seria outra espécie do
gênero, se contrapondo a liberdade de expressão pela necessidade de estar atrelada a verdade,
diferente do entendimento do ministro Barroso.

Já a utilização da expressão “liberdade de imprensa” como sinônimo de “liberdade de


expressão” e/ou “direito a informação” é totalmente infundada e descabida, tendo em vista que a
liberdade de imprensa está mais ligada aos meios de comunicação em sentido amplo em
comunicarem fatos e opiniões, englobando, assim, a liberdade de informação como a liberdade
de expressão (tópico que abordaremos mais adiante).

Em síntese, pode-se dizer que a liberdade de expressão está atrelada a seu direito de
expor suas ideias, opiniões, crenças e cultos, interpretações culturais e ideáis sem nenhum tipo de
censura prévia, sem algum compromisso com a verdade. Já a liberdade de informação está
também atrelada ao direito individual e fundamental de liberdade de expressão, se leva-se em
conta a liberdade de publicação e compartilhamento prévio de informações sem nenhum tipo de
censura ou sansão prévia. Porém, também está a liberdade de informação atrelada ao interesse
público de se informar, juntamente com interferência na formação da opinião pública, devendo,
assim, ter compromisso com a verdade subjetiva, e não a indubitável. Por fim, a liberdade de
imprensa engloba a exteriorização das duas outras expressões pelos meios de comunicação em
geral. Nas palavras de Chequer:

A liberdade de expressão em sentido estrito refere-se a ideias e opiniões e não está


necessariamente vinculada à verdade, enquanto que a liberdade de informação tem
relevância pública porque interfere na formação da opinião pública, e, assim, tem
compromisso com a verdade. Já a liberdade de imprensa é uma forma de
exteriorização das liberdades de expressão e de informação conferidas aos meios de
comunicação em geral, abrangendo tanto a liberdade de informação (fatos) quanto a
liberdade de expressão em sentido estrito (ideias, pensamentos etc.).16

1.2 Das ponderações entre a liberdade de expressão e a liberdade de informação

Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 25.


16
CHEQUER, Cláudio. A liberdade de expressão como direito fundamental preferencial prima facie: análise
crítica e proposta de revisão do padrão jurisprudencial brasileiro. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011,
p. 39.
17

Sabe-se que a liberdade de expressão foi um grande avanço para o Estado Democrático
de Direito na luta contra governos tiranos e autoritários após a segunda guerra mundial.
Entretanto, mesmo sendo livre a disseminação de opiniões e ideias, o seu uso descabido e
irresponsável pode trazer prejuízos incalculáveis a terceiros, a proteção da segurança nacional,
a ordem, a saúde e a moral pública, dentre outros.

A título de exemplo, pode-se imaginar uma publicação, em uma plataforma com


grande volume de acessos, de um artigo de opinião que difame e exponha a vida privada de
terceiro, gerando constrangimento, humilhação e perseguição pública do mesmo. Visto isso,
mesmo que a publicação esteja resguardada sob o crivo da liberdade de expressão, estará ela
ferindo a sua honra, necessitando, assim, ser apagada e fazer com que os danos sejam
remediados.

Portanto, percebe-se que a liberdade de expressão não é um direito absoluto, devendo


ela ser ponderada com outros princípios constitucionais, como argumenta Ferraz, “A liberdade
de expressão lastreia-se no binômio liberdade-responsabilidade, a exigir daquele que manifesta
seu pensamento e/ou sentimento o respeito (responsabilidade) aos direitos fundamentais que
coexistem no ordenamento normativo”.17

Sob esta mesma ótica Favero e Steinmetz definem:

A liberdade de expressão é informada por outros princípios, como, por exemplo, o


princípio da igualdade, razão pela qual não é um direito absoluto, admitindo, assim,
ponderações perante outros direitos. Para tanto, adota-se uma metodologia analítica
de abordagem e organiza-se a exposição da seguinte forma: inicia-se com uma
delimitação do conteúdo do direito à informação e sua conexão com a liberdade de
expressão; a seguir, investigam-se os deveres do agente informador; e, por fim,
analisa-se a relação entre informação e participação política.18

Visto isso, como que os tribunais Brasileiros lidam com os abusos a liberdade de
expressão, como, por exemplo, a disseminação de fake news? Seria a censura um ato correto
para tentar sanar o problema da vasta agilidade e propagação de conteúdos que ferem a
liberdade de expressão?

17
FERRAZ, Sérgio Valladão. Restrições às restrições à liberdade de expressão. In: VITORELLI, Edilson (Org.).
Temas atuais do Ministério Público Federal. 3. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Juspodvm, 2015, p. 125.
18
FAVERO, Sabrina. STEINMETZ, Wilson Antônio. Direito de informação: dimensão coletiva da liberdade de
expressão e democracia. In: Revista Jurídica Cesumar. V. 16, n° 3, Santa Catarina, p. 641. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.17765/2176-9184.2016v16n3p639-655>. Acesso em: 22 fev. 2021.
18

De forma ocasional, alguns membros da magistratura, seja via decisão de mérito ou


por decisão interlocutória, bloquearam contas e retiraram conteúdos abusivos ou falsos dos
provedores de mensageria. Um dos casos que gerou grande repercussão nacional foi quando o
ministro do STF, Alexandre de Morais, determinou ao Twitter derrubar as contas de vários
militantes influenciadores de extrema direita da plataforma, em razão da quantidade de fake
News e ataques gratuitos dos mesmos a pessoas voltadas a ideologia de esquerda em postagens
nas contas dos mesmos.

Este movimento de censura vem crescendo nos últimos anos, estando atrelada, dentre
outras coisas, a velocidade de disseminação de informações inverídicas, onde os tribunais
tentam frear o gigante lastro de fake news. Nos dias atuais, a vinculação de uma matéria
caluniosa por apenas dois dias pode tomar proporções mundiais, tornando, assim, um desafio
gigantesco para o Estado em controlar e contornar este problema.

Entretanto o STF, por meio do julgamento da Ação Declaratória de


Inconstitucionalidade nº 4.815, no caso das biografias não autorizadas, e no julgado da Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental nº 130 - no qual se declarou a Lei 5.250/1967,
conhecida como Lei de Imprensa, não recepcionada pela CF - foi dada preferência ao sistema
de repressão posterior a informações falsas, pelo fato de haver conexão entre liberdade de
expressão com o pluralismo e a democracia.

A corte decidiu pelo entendimento que a liberdade de expressão não poderá ser
previamente censurada, entretanto, quando houver abusos deverão ser condenados, de forma a
posteriori, mediante direito de resposta e indenização, devendo ser o princípio da
proporcionalidade o crivo norteador para o uso correto da autonomia de manifestação
juntamente com a relação com outros direitos. Deve-se salientar, também, que, a liberdade de
expressão tem uma posição preferencial prima facie, mas não definitiva em relação a direitos
da personalidade de outrem.

Como já outrora analisado, a liberdade de imprensa deve estar sempre atrelada à


verdade, mesmo que seja ela apenas subjetiva e não indubitável e, segundo Barroso, a liberdade
de informação deve ser protegida e as publicações devem ser defendidas pela constituição
brasileira, desde que o conteúdo seja verdadeiro, e, de forma contrária, deve ser combatida pelo
ordenamento, como bem define o autor:

A informação que goza de proteção constitucional é a informação verdadeira. A


divulgação deliberada de uma notícia falsa, em detrimento do direito da personalidade
de outrem, não constitui direito fundamental do emissor. Os veículos de comunicação
19

têm o dever de apurar, com boa fé e dentro de critérios de razoabilidade, a correção


do fato ao qual darão publicidade. É bem de ver. no entanto, que não se trata de uma
verdade objetiva, mas subjetiva, subordinada a um juízo de plausibilidade e ao ponto
de observação de quem a divulga. Para haver responsabilidade, é necessário haver
clara negligência na apuração do fato ou dolo na difusão da falsidade.19 (grifo
nosso)

Mas mesmo que a informação trazida seja verdadeira, não poderá o informante expor
ninguém ao ridículo e ferir algum direito personalíssimo, como, por exemplo, o direito à vida
privada, pois, além de tudo, é necessário respeito pelo informante. Importante salientar, também
que há uma importante ligação entre informação de interesse social, atrelada a conteúdos
informacionais com valores sociais necessários a vida em sociedade, em contraponto as
informações com interesse do social, conteúdos com estima popular em que não interferem em
nada na cidadania e vida democrática. Assim, mesmo estando o informante dotado de verdade
e fazendo jus a sua liberdade de expressão, não poderá o mesmo ferir o direito alheio de honra
e vida privada, por mais que a informação possa ser apreciada pela população.
Subtende-se, então, portanto, que deve haver ponderação entre liberdade de expressão
e demais princípios fundamentais constitucionais, como, por exemplo, o direito a
inviolabilidade da intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Além disso,
deve-se salientar que a informação deve ser veiculada com responsabilidade, haja vista que
ambas expressões de direito não são usadas de forma absoluta, havendo sempre ponderação
entre os demais princípios. A orientação que prepondera na jurisprudência do STF é conferir
uma preferência à liberdade de expressão e ao direito de informação na maioria dos casos em
que esses direitos conflitam com outros, como intimidade e vida privada, deixando o tribunal
para reprimir os abusos dessa prevalência de forma posterior, utilizando-se do direito de
resposta e indenização e até mesmo uma censura previa em casos extremos. 20

19
BARROSO, Luís Roberto. Colisão ente liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de
ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do código civil e da lei da imprensa. In: Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 235, jan./mar. 2004, p. 19. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45123>. Acesso em: 15 mar. 2021
20
O STF julgou procedente a ação para permitir a divulgação de biografias não autorizadas, dando uma
interpretação aos artigos 20 e 21 do Código Civil conforme a Constituição em consonância com a liberdade de
expressão da atividade intelectual. In: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de
Inconstitucionalidade 4.815. Relatora Ministra Cármem Lúcia, julgamento: 10 jun. 2015. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/ paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10162709>. Acesso em: 8 mar. 2021.
20

1.3 Da obrigatoriedade do estado em delegar os meios de comunicação

Como anteriormente abordado, a liberdade de imprensa está vinculada, em sentido


amplo a autonomia em que os meios de comunicação detêm em comunicarem fatos e opiniões
sem nenhum tipo de censura prévia. Mas, além deste viés ligado a liberdade de expressão e
informação, deve-se debruçar sobre a necessidade em que o Estado tem em delegar os meios
de comunicação e deixá-los democráticos.

Para tanto, a Constituição Republicana Federativa do Brasil de 1988 trata a


comunicação social e a liberdade de imprensa em um artigo próprio, conferindo aos
informadores autonomia e a não intervenção prévia, nos seguintes termos:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob


qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o
disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade
de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o
disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
§ 5º Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto
de monopólio ou oligopólio.
§ 6º A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de
autoridade.21

Visto isso, a necessidade de delegação dos meios de comunicação ao setor privado,


com o intuito de perfazer o caráter democrático e participativo das pessoas vida pública do país.
Para isso, o Estado deve garantir o acesso da população a informações sobre vida particular do
próprio cidadão, transparências nos atos públicos e acesso aos demais fatos de interesses
públicos formadores de opiniões, os quais influenciarão nas decisões pessoais dos cidadãos e
qual caminho querem seguir a partir do conhecimento adquirido.

Fato é, que a concessão dos meios de comunicação ao setor privado não acontece em
governos autoritários, os quais detêm o monopólio dos meios de comunicação e censuram as
opiniões distintas, visando sempre moldar a opinião pública aos interesses governamentais,
como bem define Farias:

21
BRASIL. Planalto. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
21

Se a liberdade de expressão e informação, nos seus primórdios, estava ligada à


dimensão individualista da manifestação livre do pensamento e da opinião,
viabilizando a crítica política contra o ancien régime, a evolução daquela liberdade
operada pelo direito/dever à informação, especialmente com o reconhecimento do
direito ao público de estar suficientemente e corretamente informado; àquela
dimensão individualista-liberal foi acrescida uma outra dimensão de natureza
coletiva: a de que a liberdade de expressão e informação contribui para a formação
da opinião pública pluralista está cada vez mais essencial para o funcionamento dos
regimes democráticos. a despeito dos anátemas eventualmente dirigidos contra a
manipulação da opinião pública.22

Desta forma, a expressão popular “informação é poder” nunca fez tanto sentido e, por
isso, o Estado ao não manter o monopólio dos meios de comunicação e concessionando os
veículos de comunicação à esfera privada, acaba-se entrelaçando-os aos interesses privados de
determinados grupos em detrimento a cidadania e ao interesse público.

É notório que os veículos de comunicação e as pessoas formadoras de opiniões detêm


ferramentas e prestígio para moldar a opinião pública, ao ponto de que os fatos a serem
abordados pelos informantes serão muitas vezes pouco questionados. Entretanto, a versão dos
fatos que irá ser contada pelos veículos de imprensa, pode estar muito atrelados aos interesses
de quem patrocina.

Vale ressaltar que ter poder não está apenas atrelado a deter força política e/ou
financeira, pois possuindo conhecimento e o monopólio dos meios de comunicação abre-se a
possibilidade de influência no convencimento das pessoas, devido ao componente financeiro e
tecnológico que mantem as famílias concessionárias dos meios de comunicação. Apresentando-
se, assim, uma forma de possuir poder.

Deste modo, nota-se, que, atualmente a maioria dos meios de comunicação nacionais
estão nas mãos de determinadas famílias e seus patrocinadores são praticamente os mesmos.
Por isso, por mais que pareça contradizente, mas para garantir meios de comunicação plurais e
democráticos, o Estado deve intervir para efetivar a regulamentação dos meios de comunicação,
a fim de impedir que os veículos de imprensa virem monopólios com viés ideológico e que a
atuação privada dos meios de comunicação atenda os princípios constitucionais, bem como a
cidadania e ao interesse público.

Para tentar regularizar o acesso à informação no Brasil, foi promulgada a Lei


12.527/2011, a qual regula o acesso à informação pública no país, juntamente com uma série

22
FARIAS. Edilsom Pereira de. Colisão de direitos - a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a
liberdade de expressão e informação, 2000, p. 166-167.
22

de diretrizes e princípios estabelecidos pelo ordenamento, mas, em nada fez a administração


pública e as casas legislativas, em âmbito nacional, para uma autorregulação econômica dos
meios de comunicação, continuando o problema macro a existir, como acertadamente define
Favero:

Por essas razões, não se deve afastar, de plano, a regulação e autorregulação


econômica dos veículos de comunicação social, seja na perspectiva pública ou
privada, a fim de garantir que a formação da opinião pública possa ocorrer com base
em um pluralismo de ideias e não na “ditadura” de um pensamento único ou
dominante. Cabe especialmente ao Estado criar e promover as condições e os
mecanismos, legais e administrativos, para que o processo de formação e veiculação
de ideias seja o mais livre e democrático possível.23

Logicamente que a internet contribui positivamente na formação de opinião e


vinculação de informações, fazendo juízos de valor, mesmo estando distanciado dos maiores
provedores de conteúdo. Visto isso, o cyber espaço acaba minimizando um pouco o monopólio
supracitado e consequentemente a influência dos mesmos na formação da opinião pública. Por
outro lado, o espaço cibernético agrava os problemas de disseminação de fake news previamente
manipuladas com interesses políticos e/ou financeiros por robôs e pela facilidade de
compartilhamento de informação.

Com isso, Favero e Steinmetz defendem uma regulamentação inteligente sobre a


democratização da informação, juntamente com a responsabilidade financeira dos meios de
comunicação, atrelados a sansões aos abusos à liberdade de expressão e o descompromisso com
a verdade, podendo ser muito eficazes para a efetividade ao direito de informação, seja pelos
meios convencionais de comunicação ou não. 24

Entretanto, ainda que se promovam medidas estatais de democratização da


informação, somente a conscientização, seja do cidadão, seja do informador, poderão levar à
efetivação plena desse processo.

Portanto, o direito/dever de se informar, de pluralidade de opiniões, além do pleno


funcionamento da democracia nacional está ligado à vedação do monopólio dos veículos de
comunicação, a necessidade em intervir para evitar que os meios de comunicação estejam nas

23
FAVERO, Sabrina. STEINMETZ, Wilson Antônio. Direito de informação: dimensão coletiva da liberdade de
expressão e democracia. In: Revista Jurídica Cesumar, V. 16, nº 3, Santa Catarina, 2016, p. 651. Disponível
em: <http://dx.doi.org/10.17765/2176-9184.2016v16n3p639-655>. Acesso em: 14 jan. 2020.
24
Idem, p. 652.
23

mãos de um determinado grupos específicos, fazendo com que a informação seja livre, plural,
democrática e, sobretudo, garantindo a liberdade de expressão e direito de resposta.

1.4 A vedação ao anonimato e o direito de sigilo da fonte

Pode-se notar, que, durante toda a narrativa do presente trabalho, a informação tem um
viés social, desde que ela esteja atrelada ao interesse público e dotada de verdade subjetiva.
Sendo assim, para se manter o livre exercício da profissão de informar e o pleno exercício da
democracia é necessário que a imprensa mantenha o sigilo da fonte. Para isso, visto a
importância desse direito para a democracia, o constituinte colocou o direito ao sigilo das fontes
no rol dos direitos fundamentais, em seu artigo 5°, que está positivado da seguinte maneira:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte,
quando necessário ao exercício profissional;25

Deste modo, por expressa designação da constituição o profissional de informação não


é obrigado a informar a fonte de sua publicação, independentemente da origem da informação.

Por esta garantia constitucional, o profissional ao ter acesso a uma informação, através
de sua fonte, deverá averiguar se há interesse público e veracidade dos fatos, após esta
checagem, espera-se que haja publicação dos fatos, sem nenhuma inquietação prévia sobre as
fontes e sua veracidade.

O sigilo da origem da informação garante um sistema informacional desembaraçado e


democrático, tendo em vista que a supressão da garantia da confidência de fonte desestimularia
fortemente todo e qualquer cidadão a fornecer dados e informações a jornalistas, até porquê
notícias veiculadas nos órgãos de imprensa podem afetar diretamente pessoas de muito poder.
Ao se garantir o sigilo da fonte, o informante não ficará à mercê da pressão ou de coações dos
que se julgam atingidos pela notícia.

25
BRASIL. Planalto. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
24

Ademais, a origem da informação trazida pelo informante pode ser oriunda de fontes
ilícitas, como por exemplo, pela invasão de dispositivos celulares por hackers, crime previsto
no art. 154 - A, do Código Penal, sem prejuízo de outras condutas ilícitas. Mas, mesmo com a
suspeita da origem ilegal da sapiência, não poderá o jornalista ser inquietado pelo magistrado,
via quebra de sigilo telefônico, por exemplo, na tentativa de descobrir a origem da informação.
Entretanto, não se pode dizer o mesmo do responsável pela fonte da informação, pessoa essa
que apresentou o fato ao informante.

Assim, não poderá a justiça quebrar o sigilo telefônico do profissional, nem mesmo
apreender seus instrumentos de trabalho para buscar a veracidade dos fatos, como defende o
ministro do STF Celso de Melo:

[…] o sigilo da fonte corrobora uma garantia de ordem jurídica que, outorgada a
qualquer jornalista em decorrência de sua atividade profissional, destina-se, em última
análise, a viabilizar, em favor da própria coletividade, a ampla pesquisa dos fatos ou
eventos cuja revelação se impõe como consequência ditada por razões de estrito
interesse público. [...] Isso claramente significa que a prerrogativa concernente ao
sigilo da fonte, longe de qualificar-se como mero privilégio de ordem pessoal ou
estamental, configura, na realidade, meio essencial de concretização do direito
constitucional de informar, revelando-se oponível, em consequência, a quaisquer
órgãos ou autoridades do Poder Público, não importando a esfera em que se situe a
atuação institucional dos agentes estatais interessados. 26

Por este entendimento, a garantia constitucional de sigilo da fonte confere ao


profissional de imprensa o direito de não proceder a divulgação da origem da informação ou o
nome da pessoa que originou a publicação, desautorizando qualquer medida que tente
constranger esse profissional a confessar a origem dos fatos.

Entretanto, ao ser admitida pelo ordenamento brasileiro o sigilo da fonte, o profissional


e o veículo de comunicação passam a ser responsáveis pela veracidade dos fatos. Assim,
responsabilizam-se os provedores de conteúdo e seus profissionais pelos fatos ali elencados,
sendo certo que qualquer tipo de ofensa a honra de terceiro ou qualquer prejuízo trazido por
informações falsas serão eles responsabilizados na via judicial, resguardando, como sempre, o
sigilo da fonte.

26
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inq: 870 RJ. Relator Ministro Celso de Mello, Julgamento: 08 abr. 1996,
Publicação: DJU 15 abr. 1996. Disponível em: <http://com.br/jurisprudencia/14758836/inquerito-inq-870-rj-
stf>. Acesso em: 15 mar. 2021.
25

Desta forma, mesmo que se resguarde o sigilo da fonte, deverá a publicação estar
contida com o nome do profissional responsável e, em grande parte, o seu veículo de
comunicação, pois serão eles responsáveis civilmente por ela, em termos de responsabilidade
civil, na forma subjetiva, aos desencadeamentos da postagem, sendo totalmente ilegal a
publicação de informações sem disposição de quem é o responsável.

Portanto, a liberdade de expressão garante aos profissionais a liberdade nos conteúdos


e publicações sem nenhum tipo de embaraço prévio, mas incubem aos responsáveis pela
publicação a reparação civil a qualquer tipo de dano a terceiros advindos da vinculação de
notícias falsas e/ou distorcidas.

Porém, esta necessidade de vincular o informante a publicação, gerando preocupação


no ordenamento, pois muitas informações, com viés jornalístico, são atualmente compartilhadas
nos provedores de mensageria sem indicação do autor, tornando muito difícil chegar ao
responsável pela publicação e a responsabilização do mesmo pelos danos gerados pelo
conteúdo.

Por outro lado, o inciso XIV do art. 5° da CRFB/88 dispõe que apenas os profissionais
de informação detêm o privilégio em manter o sigilo da fonte, para o exercício profissional,
sem nenhuma menção as pessoas em geral. Com isso, levanta-se o questionamento se o direito
de sigilo das fontes seria um privilégio apenas da imprensa. Entretanto, há um entendimento
jurisprudencial, o qual vai de encontro com o pensamento doutrinário majoritário, de que a
constituição visa dar a todos as garantias constitucionais de liberdade de expressão, direito a
informação, preservação da liberdade de imprensa e de democracia. Há de se ressaltar também
para se trabalhar nos meios de imprensa não é necessário ser jornalista e qualquer que fosse a
quebra deste direito de sigilo da fonte interferiria na liberdade de informação e na liberdade de
imprensa.27

27
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.815. Relatora Ministra Cármem
Lúcia, julgamento: 10 jun. 2015. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?
docTP=TP&docID=10162709>. Acesso em: 8 mar. 2021.
26

CAPÍTULO 2

OS CONTEÚDOS QUE O PL Nº 2.630/2020 VISA COMBATER

A disseminação em massa de fake news é uma grande questão contemporânea, a qual


impulsionou o poder legislativo brasileiro a tomar medidas para tentar coibir o problema. Certo
é, que após muitos discursos sobre o tema, chegou-se à consonância do PL 2.630 de 2020, já
aprovado pelo Senado brasileiro e levado à votação na Câmara dos Deputados, em Brasília.
Porém, antes de abordar sobre o que o PL visa regulamentar, além, claro, de seus impactos
esperados após sua vigência, discorrendo sobre o que a lei visa regulamentar, conceito de fake
news e, principalmente, o que ficaria de fora da atuação da lei, não sendo taxadas como as
próprias fake news.

Pode-se conceituar fake news como notícias públicas falsas feitas por veículos de
comunicação como se fossem informações tidas como reais. Esse tipo de texto, tem como
intuito, na grande maioria das vezes, dar veracidade a um fato mentiroso que visa prejudicar
um grupo específico ou uma determinada figura pública.28

Não se sabe, originariamente, quando surgiu o termo fake news para se remeter a
notícias inverídicas. Entretanto, o conceito desse tipo de conteúdo falso vem de séculos
passados, e não há um termo inicial dado como origem do mesmo. A expressão fake, de origem
do dialeto inglês, é considerada nova, segundo o dicionário inglês Merriam-Webster, pois,
anteriormente, no século XIX, o termo utilizado para tratar notícias inverídicas era “false
news”.29

Desta forma, as chamadas false news estão presentes na história a muito tempo, sem
nenhum termo histórico inicial, transformando-se, anos depois, em fake news, as quais tornaram
as grandes repercussões, em meio ao enorme potencial de persuasão que o material falso

28
CARVALHO, Mariana Freitas Canielo; MATEUS, Cristille Andrade. Fake news e desinformação no meio
digital: análise da produção científica sobre o tema na área de ciência da informação. Belo Horizonte,
nov. 2018, p. 5. Disponível em: <https://periodicos.ufmg.br/index.php/moci/article/view/1690>. Acesso em:
21 out. 2020.
29
Merriam-Webster. The real story of 'fake news'. The term seems to have emerged around the end of the 19th
century. Disponível em: <https://www.merriam-webster.com/words-at-play/the-real-story-of-fake-news#:~:
text=Fake%20news%20is%2C%20quite%20simply,%E2%80%9Cfalse%2C%20counterfeit%E2%80%9D)>.
Acesso em: 18 out. 2020.
27

adquiriu nos últimos anos, com a popularização da internet e das redes sociais atrelado a
facilidade de trocar informações e conteúdo em meio eletrônico, bem como preconiza a autora
Carolina Delmazo:

Apesar de as notícias fabricadas serem um fenómeno antigo, a disseminação das redes


sociais online e a cultura de partilha abrem margem para que a desinformação atinja
um novo patamar. Esse problema ganhou visibilidade pela capacidade de influenciar
os sistemas políticos, especialmente processos eleitorais, e acentuar a polarização
política. O contexto ensejou uma série de reações, como tentamos apresentar de forma
sintética neste artigo. Faz-se necessário enfatizar que elas se dão em um terreno
complexo de tensão entre a garantia da liberdade de expressão e os limites do seu
exercício.30

Além da conceituação do termo fake news, é necessário englobar o pensamento


conceitual juntamente com os fins da PL 2630/2020, objetivando qual são os seus fins. Desta
forma, o projeto de lei, em seu artigo 4° dispõe como seus objetivos:

Art. 4º Esta Lei tem como objetivos:


I – o fortalecimento do processo democrático por meio do combate ao
comportamento inautêntico e às redes de distribuição artificial de conteúdo e do
fomento ao acesso à diversidade de informações na internet no Brasil;
II – a defesa da liberdade de expressão e o impedimento da censura no ambiente
online;
III – a busca por maior transparência das práticas de moderação de conteúdos postados
por terceiros em redes sociais, com a garantia do contraditório e da ampla defesa; e
IV – a adoção de mecanismos e ferramentas de informação sobre conteúdos
impulsionados e publicitários disponibilizados para o usuário.31

Cabe ressaltar que em momento algum o texto do PL expressa quais os conteúdos que
visa combater, podendo estar, assim, atrelando a legislação a achismos e suposições, o que
poderá violar direitos fundamentais, como, por exemplo, o direito de expressão dos brasileiros,
direito esse fundamental e constitucional, normativamente superior ao texto da possível redação
legal do PL que se tornará ordinária, em caso de promulgação.

30
DELMAZO, Caroline; VALENTE, Jonas C.L. Fake news nas redes sociais online: propagação e reações à
desinformação em busca de cliques. Media & Jornalismo [online]. São Paulo, 2018, vol. 18, n. 32, p. 155-169.
ISSN 1645-5681. Disponível em: <https://impactum-journals.uc.pt/mj/article/view/2183-5462_32_11>.
Acesso em: 21 out. 2020.
31
BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei n° 2630, de 2020. PL das fake news. Disponível em:
<https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/141944>. Acesso em: 15 mar. 2021.
28

Há de se salientar que conteúdo baseados em opiniões, difamações e calúnias não


merecem espaços para restrições pelo PL 2.630, pois estão englobadas no direito à liberdade de
expressão, sendo suas consequências medidas em outro tipo de discussão legal. Ressalta-se,
assim, a necessidade de uma maior definição sobre quais os conteúdos serão combatidos pela
lei, definindo-os e positivando-os, de forma a combater realmente notícias falsas publicadas
como se fossem informações. Somente assim, se terá a preservação de um espaço virtual
público, livre, plural, diverso e democrático.

Outrossim, devemos ressaltar que o PL, em seu art. 1°, inciso I, visa chancelar e atrelar
um novo comportamento “aos provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada
que ofertem serviços ao público brasileiro com mais de 2.000.000 (dois milhões) de usuários
registrados”. Nota-se, então, que a lei somente poderá incidir em determinados provedores
específicos, os quais deverão de adequar ao novo ordenamento, em caso de promulgação do
PL, enquanto os demais ficariam isentos de adequação proposto pelo PL.

O intuito do PL seria de dar aos provedores autonomia e legitimidade para julgar os


conteúdos publicados em suas plataformas, decidindo de antemão se o conteúdo publicado se
trata ou não de fake News. Com isso, as publicações julgadas por eles como falsas, seriam
previamente excluídas sem a necessidade de autorização judicial, retornando ao ordenamento
brasileiro a figura da censura prévia, só que dessa vez feita por terceiros e não pelo Estado,
matéria essa já havia sido superada pelo ordenamento nacionais por serem caracterizadas como
inconstitucionais.

Ao repassar o poder de julgamento sobre as publicações para empresas, jurisdição essa


que cabe apenas ao Estado, elucidaria uma real possibilidade de supressão da liberdade de
publicação e troca de mensagens individuais, englobando toda essa problemática a uma esfera
de mitigação da liberdade de expressão e de informação individual.

Outro ponto importante para a discussão, tratada pelo presente trabalho, é a


preocupação do PL 2630/2020 sobre a disseminação de conteúdos de forma artificial. Esses
conteúdos são impulsionados por quadrilhas especializadas em disseminar fake news,
previamente financiados, trabalhando sempre com viés de obtenção de benefícios financeiro ou
com intuito de prejudicar um grupo específico ou alguma pessoa pública. 32 Neste entendimento,

32
ROMÉRIO. Processo eleitoral: “fake news”. Publicado em: 11 fev. 2018. In: Instituto Brasileiro de Altos
Estudos de Direito Público. Disponível em: <http://www.altosestudos.com.br/? p=57033>.Acesso em: 19
nov. 2020.
29

as quadrilhas que impulsionam fake news, mediante financiamento, propõem a divulgação em


massa de conteúdos falsos visando denegrir a imagem de uma pessoa, seja ela física ou jurídica,
para a obtenção de vantagens políticas, financeiras ou comerciais.

Segundo o portal correio brasileiro, o sistema artificial de divulgação de conteúdos


pode compartilhar uma informação falsa a cada 2 segundos, o que seria totalmente impossível
de ser feito por seres humanos, o que nos mostra a necessidade de políticas públicas
administrativas vorazes e uma legislação específica com intuito de aumentar a penalidade aos
partícipes desse crime, em âmbito cível, penal e administrativo.33

Há de se notar, que, este universo de fake news é alimentado por pessoas de grande
influência, que contratam “equipes” especializadas nesse tipo de conteúdo, geralmente por
políticos em campanha eleitoral. Como bem preconiza Leonardo Cavalcanti:

Esse universo é alimentado por pessoas de grande influência, geralmente políticos em


campanha eleitoral, que contratam equipes especializadas nesse tipo de conteúdo
viral. Essas equipes podem ser compostas por ex-jornalistas, publicitários,
profissionais de marketing, profissionais da área de tecnologia e até mesmo policiais,
que garantem a segurança da sede e dos equipamentos utilizados. 34

Portanto, torna-se perceptível que as interferências das fake news nos processos
eleitorais são, em grande maioria, precedidas da disseminação de notícias falsas de forma
artificial, anteriormente financiadas por políticos ou seus adeptos visando prejudicar alguém ou
algum grupo político e obter vantagens a partir disso. Porém, o PL pouco discorre sobre o
problema e procurou se destinar a regulamentar a atuação dos provedores de redes sociais e de
serviços de mensageria privada no combate as fakes news em suas plataformas.35

33
SOUZA. Renato. Barroso diz que “milícias virtuais” precisam ser neutralizadas. In: Correio Brasiliense.
Política. Publicado em: 24 jul. 2020. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/
app/noticia/politica/2020/07/24/interna_politica,875128/barroso-diz-que-milicias-virtuais-precisam-ser-
neutralizadas.shtml>. Acesso em: 05 mar. 2021.
34
CAVALCANTE, Leonardo. FAKE NEWS. Memórias de mercenários. Correio Braziliense. 2019. Disponível
em: <https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2019/04/30/interna_politica,752487/serie-
de-reportagens-do-correio-sobre-fake-news-ganha-premio-republica.shtml>. Acesso em: 18 out. 2020.
35
ALESSI. Gil. Empresários financiaram disparos em massa pró-Bolsonaro no WhatsApp diz jornal. In: El País.
São Paulo. Madri. Publicado em: 18 jun. 2019. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2019/06/18/
politica/1560864965_530788.html>. Acesso em: 05 mar. 2021.
30

2.1 A regulação das fake new antes do PL 2.630/20

As notícias falsas, por seu caráter atemporal, já foram discutidas e regulamentadas


antes da proposta do PL 2.630/20. Em 1934, o Decreto nº 24.776 já coordenava a liberdade de
imprensa, para que não houvesse a divulgação de mentiras ou até mesmo de fatos deturpados,
em prol do bem estar social. Conforme o art. 11 do referido Decreto: “Art. 11. Publicar notícias
falsas, ou noticiar fatos verdadeiros, umas e outros, porém, tendenciosamente, por forma a
provocar alarme social, ou perturbação da ordem pública; penas de multa de 500$ a 2:000$ ou
prisão por um a seis meses”.36

Nessa mesma toada, foi editada em 1953 a Lei nº 2.083, anunciando o crime de abuso
da liberdade de imprensa, mencionado em seu art. 9º:

Art.9. Constituem abusos no exercício da liberdade de imprensa, sujeitos às penas que


vão ser indicadas, os seguintes fatos: [...]
b) Publicar notícias falsas ou divulgar fatos verdadeiros, truncados ou deturpados, que
provoquem alarme social ou perturbação da ordem pública: pena–as mesmas da letra
anterior.37

Ainda no século XX, todavia no ano de 1967, foi editada a Lei de Imprensa, que, da
mesma forma, regulamentava a liberdade de manifestação e pensamento dos jornalistas. Dentro
da sua estrutura, destacou-se o art. 16, que anunciava: “Publicar ou divulgar notícias falsas ou
fatos verdadeiros truncados ou deturpados, que provoquem: I- perturbação da ordem pública ou
alarma social”.38

Torna-se evidente, portanto, que as notícias falsas ultrapassavam os limites do bom


senso, a ponto de existirem sanções para constrangê-las. Ocorre que esta última lei, a Lei de
Imprensa, foi elaborada durante a ditatura militar e, por considerarem uma afronta à liberdade
de expressão, não foi recepcionada pela Constituição de 1988, nos termos da ADPF 130, relator
Ministro Carlos Ayres Britto.

36
BRASIL. Planalto. Decreto-Lei n° 24.776, 14 de julho de 1934. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/D24776.htm>. Acesso em: 18 mar. 2021.
37
______. Planalto. Lei n° 2.083, de 12 de novembro de 1953. Lei da liberdade de imprensa. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L2083.htm>. Acesso em: 18 mar. 2021.
38
______. Planalto. Lei n° 5.250, de 09 de fevereiro de 1967. Lei de imprensa. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5250.htm>. Acesso em: 18 mar. 2021.
31

Antes mesmo de tal lei ser suprimida do ordenamento jurídico, os Ministros, à época
da análise da ADPF, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Ellen Gracie,
se posicionaram a favor de determinados pontos da Lei de Imprensa, como o art. 16 acima
mencionado. Os Ministros, em suas falas, alegavam a não incidência de censura, caso a Lei
5.250 fosse mantida na Carta Magna, pois a condenação de notícias falsas não havia trazido
malefício ao trabalho da mídia.39

Desde 2009, com a não recepção da Lei de Imprensa, estabeleceu-se um vácuo na


Constituição em relação às notícias falsas e às suas consequências, principalmente quando não
eram vinculadas a crimes contra a honra. E, assim, há uma omissão na legislação vigente quanto
ao tratamento às velhas conhecidas Fake News.

Surge em 2014 o Marco Civil da Internet, em decorrência da edição da Lei 12.965/14.


Tal Marco serviu de expoente para os outros países, nos termos de liberdade de expressão e
democracia no ciberespaço, pois era pautado nos princípios da neutralidade da rede e tinha
como objetivos o acesso à informação, bem como a participação popular nos assuntos políticos
e no âmbito cultural de sua comunidade. Ou seja, o foco do Marco Civil está na amplitude e
nos benefícios da internet, apesar de trazer um bom ponto no combate das fake News, que é o
seu art. 19:

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o


provedor de aplicações de Internet somente poderá ser responsabilizado civilmente
por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial
específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu
serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como
infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.
§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade,
identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita
a localização inequívoca do material.
§ 2º A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos
conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de
expressão e demais garantias previstas no art. 5º da Constituição Federal.
§ 3º As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos
disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de
personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores
de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.
§ 4º O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3º, poderá antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova
inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do

39
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (plenário). Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
130 Distrito Federal. p. 174/188 e 269/290. Argte.: Partido Democrata Trabalhista - PDT. Argdo.(s):
Presidente da República e Federação Nacional dos Jornalistas Profissionais - FENAJ. Relator: Min. Carlos
Britto. Brasília. 6 de novembro de 2009. Decisão do STF. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp? docTP=AC&docID=605411>. Acesso em: 16 mar. 2021.
32

conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da


alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Tal artigo tornou-se o centro das atenções em uma nova discussão no Supremo
Tribunal Federal, sobre constitucionalidade, em observância ao art. 5º da CRFB. Já que sem o
advento de uma lei específica para combate à fake news, este ainda é o dispositivo legal vigente
para a retirada de publicações e mensagens falsas dos provedores. Caba ressaltar, também, que
a norma atual é considerada morosa para os dias atuais, pois o trâmite burocrático para
derrubada de informações falsas da rede é considerado lento, em tempos de internet.

Já na esfera eleitoral, impende salientar as leis n. 13.185/2015, n. 13.487/2017 e


n. 13.488/2017, que, ao instituírem reformas, alteraram a Lei Eleitoral nº 9.504/97, no que diz
respeito a não possibilidade de se exaltar características pessoais dos candidatos a cargos
eleitorais durante a campanha política e a permissão à existência de blogs e grupos de cunho
político nas redes sociais. Todavia, continuaram bastante falhas e omissas quanto ao assunto da
criminalização ou sanção da propagação das Fake News e dos ciborgues sociais.40

Frente a esse problema, o Senador Ciro Nogueira, ainda em 2017, elaborou o PL


nº 473, para que fosse acrescentado, no art. 287 do Código Penal, o texto a seguir:

Divulgar notícia que sabe ser falsa e que possa distorcer, alterar ou corromper a
verdade sobre informações relacionadas à saúde, à segurança pública, à economia
nacional, ao processo eleitoral ou que afetem interesse público relevante.
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui crime mais
grave.
§ 1º Se o agente pratica a conduta prevista no caput valendo-se da internet ou de outro
meio que facilite a divulgação da notícia falsa:
Pena – reclusão, de um a três anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.
§ 2º A pena aumenta-se de um a dois terços, se o agente divulga a notícia falsa visando
a obtenção de vantagem para si ou para outrem.41

Segundo Ciro Nogueira, e como supracitado, havia a necessidade de se legislar sobre


as notícias falsas e suas apurações, pois a sociedade ansiava uma resposta às infrações que não

40
Ciborgues Sociais: sistema artificial responsável pela explanação de informações falsas em massa nos
provedores de internet. Estes bots se submetem a grupos com centenas ou milhares de contas, publicando um
mesmo conteúdo e manipulando algoritmos de redes sociais como Facebook e Twitter, inflando artificialmente
a relevância do tema, o que aumenta o seu alcance.
41
BRASIL. Planalto. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
33

fossem relacionadas à honra, mas que exalavam violência e agressão, por sua potencialidade
lesiva.

Inclusive, também em 2017, no rol das atribuições do Tribunal Superior Eleitoral, foi
criado, com a Portaria nº 949, o Conselho Consultivo sobre internet e Eleições, que visava
estudar as regras eleitorais, bem como a capacidade de persuasão da internet na vida dos
cidadãos, para que, através das análises, se chegasse à uma conclusão sobre o aprimoramento
das normas, no intuito do combater as fake news e os robôs disseminadores de notícias falsas
em grande volume.

Faz-se imprescindível destacar que, em dezembro de 2017, o outrora presidente do


TSE, Ministro Gilmar Mendes, em explanação, no I Seminário do Fórum Internet e Eleições -
Um desafio Multidisciplinar, que:

Hoje temos uma realidade de uso constante da Internet como arma de manipulação do
processo político. E isso vem crescendo rapidamente, com a utilização, cada vez
maior, das chamadas Fake News. E essa é a realidade com que teremos de lidar e
combater no ano que vem.42

Já em junho de 2018, o novo Ministro do TSE, Luiz Fux, em discurso, a respeito das
campanhas eleitorais que: “Candidatos preferem destruir a honra alheia através de notícias
falsas por meio de redes sociais, em vez de revelar as próprias aptidões e qualidades”.
Sintetizando, desta forma, a onda de Fake News na internet, com o objetivo de manchar a
reputação dos adversários políticos do usuário da rede. Ainda alertou que criaria uma força
tarefa de inteligência e ação, integrada por agências de inteligência do governo aliadas às Forças
Armadas, empresas de mídia, Ministério Público, Polícia Federal, bem como especialistas de
todo o mundo, sendo sempre observada a liberdade de expressão do indivíduo.

Ressalta-se, ainda, que a Polícia Federal atuaria em conjunto com o Ministério Público
através do seu Grupo de Trabalho, criado especialmente para dar suporte aos órgãos que
combatem a divulgação de notícias falsas.

42
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Biblioteca digital do TSE. Painel 5 – Mídias sociais no cenário eleitoral.
In: I seminário do fórum internet e eleições - um desafio multidisciplinar. TSE. Brasília, DF. Publicado
em: mai. 2019, p. 126. Disponível em: <http://bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlui/bitstream/handle/bdtse/5981/
2019seminario_fake_news_eleicoes.pdf?sequence=8&isAllowed=y>. Acesso em: 16 mar. 2020.
34

Assim, no Brasil há normas e órgãos que combatem as Fake News, pois conforme o
art. 5º, V, da CRFB: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem”.43

Entende-se, desta forma, que a liberdade de expressão é um direito garantido


constitucionalmente, todavia, o direito de resposta e de indenização por dano também o são.

O Código Civil adota o mesmo entendimento da Constituição Federal, na medida em


que responsabiliza os disseminadores de Fake News, a partir do momento em que violem
direitos e causem danos, ainda que morais, a outro sujeito. Essa é a percepção que se tem do
art. 186, CC, em que: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que moral comete ato ilícito. Segue
em seu art. 187: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos
bons costumes. Ambos artigos encontram seu complemento no art. 927, CC, em que: Aquele
que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. 44

Nessa toada, provavelmente, uma mera retratação não será o suficiente, devendo o
ofensor pagar uma indenização, atribuída pelo Poder Judiciário, conforme o caso concreto.

Já, segundo o CP (Código Penal), o autor de crimes contra a honra, aquele que
intencionalmente difamou, caluniou ou injuriou outro indivíduo, poderá ser detido, de 1 (um)
mês a 2 (dois) anos, pena esta somada ao pagamento de multa.45

Ressalta-se que, além do Código Penal, outras normas também instruem a sanção a ser
aplicada no caso de divulgação dolosa de Fake News, com penas restritivas de liberdade, como
o Decreto-Lei nº 4.766 e a Lei de Contravenções Penais.

Conforme o art. 30 do Decreto-Lei supramencionado:

43
BRASIL. Planalto. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
44
______. Planalto. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
45
Calúnia: art. 138 do CP- Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Difamação: Art. 139 do CP- Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Injúria: Art. 140 do CP - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
In: ______. Planalto. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
35

Divulgar notícia que possa gerar pânico ou desassossego público. Pena – reclusão, de
seis meses a um ano. E, caso as Fake News provoquem um perigo que não exista, o
art.41 da Lei das Contravenções Penais estabelece que: Provocar alarma, anunciando
desastre ou perigo inexistente, ou praticar qualquer ato capaz de produzir pânico ou
tumulto: Pena – prisão simples, de quinze a seis meses, ou multa.46

Assim, podemos vislumbrar que o ordenamento jurídico estabelece limites à liberdade


de expressão, para que as mentiras e ofensas não permeiem o inconsciente popular.

2.2 As regulamentações da PL 2.630/2020 que poderão influenciar nos processos


eleitorais brasileiros futuros

Fica mais que evidente, desta forma, que as regulamentações das fake News poderão
auxiliar em uma disputa política mais honesta, com a eminente luta contra a disseminação de
conteúdos inautênticos em massa, atrelado a um financiamento prévio visando um benefício
para o determinado grupo político e os chamados cyborgs virtuais. Insta salientar, porém, que
o PL 2630 pouco aborda sobre os temas, mas visa dar aos provedores de redes sociais e de
serviços de mensageria privada encargos e poderes para o combate às fake news.

Se faz necessário, assim, expor, que o PL visa ser aplicada apenas para os provedores
de redes sociais e de serviços de mensageria privada que tenham ao menos 2.000.000 (dois
milhões de usuários), estando as outras instituições do meio, que não chegam ao mesmo número
de usuários, isentos de se encaixarem ao que suscita o PL.

Outro ponto importante a ser analisado é o fato de que o PL não tem capacidade de
regulamentar o tema por si só, apenas com o seu texto legal, haja vista que o projeto traz artigos
pouco específicas e muito genéricos, admitindo que os provedores de redes sociais e de serviços
de mensageria privada criem instituições de autorregulação voltadas à transparência e à
responsabilidade no uso da internet, com suas atribuições, além da criação de um conselho de
transparência e responsabilidade na internet, visando a criação de um código de ética a ser
seguido pelas instituições que deverão se adequar à lei.

É importante frisar que o PL visa limitar a quantidade de perfis a serem controladas


pelo mesmo usuário, além de adotar medidas para vedar que contas automatizadas não sejam

46
BRASIL. Planalto. Decreto-Lei nº 4.766, de 1º de outubro de 1942. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
36

identificadas como tal, obrigando os provedores, a qual o PL se destina, a fazerem a


identificação de contas que apresentem movimentação incompatível com a capacidade humana,
devendo informá-las em seus termos de uso ou outros documentos disponíveis aos usuários, na
tentativa de frear a disseminação de conteúdos inverídicos de forma automatizada.

Outrossim, o PL visa regulamentar o limite de encaminhamentos da mesma mensagem


a usuários e grupos, bem como o número máximo de membros em grupos de mensageria (sem
definir a quantidade máxima de usuários por grupo), além de obrigar os provedores de serviço
de mensageria privada a arquivar os registros e conteúdos encaminhados em massa, pelo prazo
de três meses.

Insta frisar que o PL, ao se tornar uma lei vigente, irá vedar o uso e comercialização
de ferramentas externas com intuito de encaminhar mensagens em massa (sob ressalvas).

Nos chama a atenção o art. 12 da PL, que dispõe:

Art. 12. Os provedores de aplicação de internet submetidos a esta Lei devem garantir
o direito de acesso à informação e à liberdade de expressão de seus usuários nos
processos de elaboração e aplicação de seus termos de uso, disponibilizando
mecanismos de recurso e devido processo.
§ 1º Em caso de denúncia ou de medida aplicada em função dos termos de uso das
aplicações ou da presente Lei que recaia sobre conteúdos e contas em operação, o
usuário deve ser notificado sobre a fundamentação, o processo de análise e a aplicação
da medida, assim como sobre os prazos e procedimentos para sua contestação.
§ 2º Os provedores dispensarão a notificação aos usuários se verificarem risco: I – de
dano imediato de difícil reparação; II – para a segurança da informação ou do usuário;
III – de violação a direitos de crianças e adolescentes; IV – de crimes tipificados na
Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989;47

O processo ao qual o artigo trata, visa dar a possibilidade do contraditório e retratação


ao usuário denunciado pelo compartilhamento de uma fake news, ou pelo fato de uma conta
automatizada estar irradiando informações inverídicas como se verdade fosse. Porém, o artigo
supracitado gerou muitas críticas dos provedores de mensageria, devido a burocracia e mora
que irá ser institucionalizada nas empresas, para se apagar o conteúdo ou excluir uma conta
falsa utilizada para espalhar fake news. Devido à grande capacidade de compartilhamento de
conteúdo pela internet, em pouquíssimo tempo, com a promulgação do art.12, se trará à tona
toda uma problemática sobre o tempo que será gasto durante o trâmite do processo para aí então

47
BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei n° 2630, de 2020. PL das fake news. Disponível em:
<https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/141944>. Acesso em: 15 mar. 2021.
37

se excluir o conteúdo, o que, às vezes, tornará ineficaz a exclusão da informação após todo o
trâmite do processo, pois a mensagem irá ser disseminada em grande escala em uma quantidade
de tempo razoável, durante todo o tempo que perdurar o processo. Para o grupo WhatsApp, o
ideal seria a exclusão prévia do conteúdo para depois ser aberto a possibilidade do usuário se
retratar.48

Em se pautando na liberdade de expressão e o acesso à informação, a medida seria


totalmente democrática, mas o processo ao qual será atribuído para a checagem da informação
realmente será moroso e poderá deixar o conteúdo informacional falso ser compartilhado por
muito tempo. Cabe ressaltar que a PL não trouxe o prazo específico para se contestar o processo.

Há de se ressaltar, também que o PL 2630/2020 cita que buscará promover a educação


das pessoas, em todos níveis de ensino sobre o uso seguro, consciente e responsável da internet,
além do fato do Poder Público buscar, em especial o Ministério Público e o Poder Judiciário,
desenvolver ações direcionadas para responder aos danos coletivos resultantes de condutas
tratados pela PL.

Já no que tange o processo eleitoral, o PL nos traz, em seu artigo 15, sobre a
obrigatoriedade dos provedores de rede social em fornecer ao público em geral o valor gasto
pelo candidato político ou coligação em suas publicações, o tempo de veiculação do conteúdo,
as características da audiência contratada, características do conteúdo veiculado na campanha
eleitoral e, a identificação do anunciante, seja por CPF, ID ou CNPJ.

Fica evidente, então, que o PL 2.630/2020 visa dar poderes e obrigações aos
provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada, com o objetivo de cumprir
com o que está, obviamente, disposto em seu texto.

O poder e a responsabilidade ao qual serão dados a esses provedores, caso o projeto


de lei seja promulgado, estarão atreladas também a possíveis sanções, em caso de
descumprimento, penalidades essas, previstas no art. 31 do PL 2.630/2020, em caso de não
cumprimento do que está proposto no texto do PL. Entretanto, o que o PL não regulamentou
sansões penais específicas ao seu tema, visando aumentar a pena para quem comete o ato
criminoso de compartilhar dolosamente fake news com intuito de tirar vantagens econômicas

48
BELLO. Pablo. Audiência pública: Lei das fake News. Publicado em: 14 jul. 2020. (1h03min). Canal
LIVRES, 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xktKe1wqDV8>. Acesso em: 05 mar.
2021.
38

ou pessoais, destruindo a reputação de alguém com informações falsas para obtenção de


vantagens.

Realmente restringir a quantidade de vezes que uma mensagem será compartilhada,


arquivamento de conversas, restrição sobre o número de contas administradas pela mesma
pessoa, obrigar os provedores a se certificarem sobre todas as contas automatizadas e obriga-
las a seguirem fins pré-determinados, como, por exemplo, um fim comercial, dentre outras
medidas, podem sim auxiliar no combate e na diminuição do compartilhamento fake news e
auxiliar no processo eleitoral brasileiro nos próximos anos, mas não resolverá o problema
macro.

Ademias, no ponto de vista eleitoral, podemos notar que as fake news afetaram o
processo das eleições no Brasil e nos Estados Unidos (como exemplo) com a disseminação em
massa de notícias falsas de forma automatizada, mediante investimento financeiro prévio a fim
de acabar com reputação dos candidatos opositores. Obviamente que a população também
ajudou a compartilhar Fake News em suas contas de WhatsApp, Facebook e outros aplicativos
de mensagens, mas o PL nem mesmo trouxe uma solução para restringir ainda mais o
compartilhamento das mesmas mensagens no o período eleitoral. Ao único dispositivo
específico para o período eleitoral foi obrigar os provedores de rede social a dispor informações
dos candidatos, financeiras e sobre a campanha ao público em geral, como já aludido acima.
39

CAPÍTULO 3

RESPONSABILIDADE CIVIL E INDENIZAÇÃO POR FAKE NEWS

3.1 Da responsabilidade civil

3.1.1 Do conceito de responsabilidade

Inicialmente, se faz necessário a conceituação de responsabilidade, que para o


professor Venosa é, “em sentido amplo, [...] definida como a virtude da qual se atribui a um
sujeito o dever de assumir as consequências de um evento ou de uma ação”. 49

Observa-se que, para o Direito, o termo responsabilidade também está atrelado com
capacidade civil, sendo evidente que a incapacidade civil para determinados atos desobriga o
agente de uma possível indenização. A noção de responsabilidade como gênero, implica sempre
o exame da conduta voluntária violadora de um dever jurídico. O que não quer dizer, que, irá
desobrigar terceiro responsável pelo agente incapaz que praticou o ato ilegal a ser
responsabilizado.

Para um melhor entendimento, prima-se por traçar algumas considerações sobre o


instituto objeto da presente, no intuito de relembrar as mesmas, conforme exposto a seguir.

3.1.2 Origem histórica da responsabilidade civil

No aspecto histórico, a responsabilidade civil nasce como um corolário de uma lenta


evolução, pois o conceito de reparar um dano injusto, por determinação do Estado, surge em
época relativamente recente na história.

O princípio da Lei do Talião, conhecido como reparação do “mal pelo mal”, “dente
por dente”, “olho por olho”, já denota uma forma de reparação do dano. Na realidade, o

49
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil, responsabilidade civil, vol. IV, 6ª ed. São Paulo: Jurídico Atlas.
2002, p. 3.
40

princípio é de natureza humana, qual seja, reagir a um mal injusto perpetrado contra a pessoa,
a família ou o grupo social, polo dato de que a “sociedade primitiva” reagia com a violência.
Se faz evidente que a vontade em reaver o dano causado por outrem é o mais primordial senso
de justiça humano, como bem define Cavalieri Filho: “o anseio de obrigar o agente, causador
do dano a repara-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça”. 50

Visto isso, no direito Romano surge então a Lex Aquilia, diploma responsável na época
Justiniana, onde no sistema romano de responsabilidade, utilizava o princípio ao qual se punia
a culpa por danos injustamente provocados, independente se havia entre as partes uma
obrigação preexistente.

Somente no século XVII, com a escola do Direito Natural, que a teoria da reparação
ganhou o critério do dano para haver reparação civil, na ocorrência de quebra no equilíbrio
patrimonial, sendo retirado o enfoque da culpa como fenômeno centralizador da indenização.

Com isso, o direito francês aperfeiçoou as ideias romanas, estabelecendo princípios


gerais de responsabilidade civil, os quais são utilizados até os dias atuais pelo ordenamento
brasileiro.

Atualmente, após a entrada em vigor da CRFB/88 (Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988) e consequentemente do Código Civil de 2002, a responsabilidade
civil engloba tanto a reparação dos danos oriundos do de danos materiais, como também os de
caráter moral, todas elas pautadas na ideia do desiquilíbrio financeiro ou provocada pelo dano
contratual ou extracontratual, bem como foi introduzida pela Escola do Direito Natural.

3.1.3 Do ato ilícito, culpa, dano e dever de reparação

Pode-se, assim, definir a responsabilidade civil como uma obrigação de reparar danos
causados de forma ilegais, os quais geram prejuízos, desta eventual ação ou omissão, de forma
objetiva ou subjetiva, a depender da relação jurídica e de seus sujeitos. Esta reparação pode
advir de uma relação contratual ou extra contratual, bem como define Venosa:

Em princípio, toda atividade que acarreta um prejuízo gera responsabilidade ou dever


de indenizar. Haverá, por vezes, excludentes, que impedem a indenização. O termo
responsabilidade é utilizado em qualquer situação na qual alguma pessoa, natural ou

50
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 45.
41

jurídica, deva arcar com as consequências de um ato, fato, ou um negócio danoso. Sob
essa noção, toda atividade humana, portanto, pode acarretar no dever de
indenizar.51 (Grifo nosso)

Enfatiza-se, assim, que o dever de indenização pode estar ligado ao dano estritamente
financeiro ou até mesmo uma reparação moral, quando há danos causados aos direitos
personalíssimos do indivíduo e esta reparação se dá na forma subjetiva ou objetiva.

Haverá o dever de reparação civil de forma subjetiva sempre em que houver uma ação
ou omissão ilegal, onde o agente capaz age com culpa (negligência e/ou imperícia e/ou
imprudência) e, para fins do Direito Civil, engloba também as ações praticadas com dolo, que
em relação a indenização são idênticas as de culpa.

Fica notório que o ato ilícito na seara de responsabilidade civil subjetiva é a junção de
vontade (de uma pessoa capaz) juntamente com uma ilicitude. Se deste ato ilícito surgir algum
dano, abrirá a possibilidade de indenização, desde que comprovado o nexo causal do ato e do
dano.

Há de salientar, que o agente incapaz ao praticar ato ilícito será devidamente


responsabilizado na figura de seu representante legal.

Já a responsabilidade objetiva está ligada à teoria do risco, onde a atividade ou conduta


do agente, por si só resulta no dano. Subtende-se, então, que a simples existência da ilicitude já
gera o ato ilícito. Como bem define Venosa: “Ao se analisar a teoria do risco, mais exatamente
do chamado risco criado, nesta fase da responsabilidade civil de pós-modernidade, o que se
leva em conta é a potencialidade de ocasionar danos; a atividade ou conduta do agente que
resulta por si só a um perigo”.52

Além do aspecto ligado à teoria do risco, muitas vezes a vítima de ato ilícito tem
dificuldades em comprovar a culpa do agente causador e, para garantir os princípios da
dignidade da pessoa humana, que, se faz necessária a possibilidade de haver a responsabilidade
civil sem culpa cada vez mais no nosso ordenamento. Por isso, o ordenamento e nossa
jurisprudência brasileira traz vários dispositivos remetendo aos casos, os quais incidem a

51
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil, responsabilidade civil, vol. IV, 6ª ed. São Paulo: Jurídico Atlas.
2002, p. 1.
52
Ibidem, p. 9.
42

responsabilidade civil objetiva. Um exemplo disso é a responsabilidade objetiva do Estado,


estampada no art. 37, § 6° da CRFB/88.53

Assim, havendo algum dano, advindo por ato ilícito, de uma atribuição devida ou
prestada pelo Estado ensejará dever de indenização, havendo ou não culpa da administração,
seja ela direta ou indireta.

Portanto, para que haja a garantia de que princípios basilares da personalidade e dos
direitos humanos tenham efetividade no Brasil, se faz necessário que algumas relações jurídicas
sejam de caráter exclusivamente objetivo. Neste caso, apenas a conduta ilícita e o dano são
suficientes para haver a responsabilização do agente, abrindo, assim, a possibilidade de
reparação de forma direta, como bem define Venosa: “(...) A questão tem a ver com os princípios
da dignidade da pessoa humana do ofendido e da sociedade como um todo. Muito cedo se
percebeu no curso da história que os princípios da responsabilidade com culpa eram
insuficientes”.54

3.2 Indenização por injúria, difamação e calúnia

3.2.1 Da responsabilidade civil e penal

A questão da responsabilidade civil em conjunto com a penal é totalmente viável


dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Assim, o agente, ao cometer um ilícito penal
responderá pelo ato na esfera criminal, bem como poderá responder pelos danos causados pelo
ato na esfera cível, visando a reparação do dano causado.

Pode se dizer que a responsabilidade penal sempre ocasiona um dever de reparação na


justiça cível. Assim, havendo uma condenação na seara penal se faz coisa julgada na esfera

53
Art. 37 da CRFB/88. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão
pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa.
In: BRASIL. Planalto. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2021.
54
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil, responsabilidade civil, vol. IV, 6ª ed. São Paulo: Jurídico Atlas.
2002, p. 12.
43

cível, no que diz respeito a indenizar o dano decorrente do ilícito criminal, vide art. 91, I do CP
(Código Panal) e art.63 do CPP (Código de Processo Penal). Como bem define Venosa:

Com a descrição da conduta penal é sempre uma tipificação restrita, em princípio a


responsabilidade penal ocasiona o dever de indenizar. Por esta razão, a sentença penal
condenatória faz coisa julgada no cível quanto ao dever de indenizar o dano decorrente
da conduta criminal.55

Em compensação, uma sentença absolutória na seara penal, seja ela sumária ou


definitiva, não faz coisa julgada na ação de natureza cível sobre o mesmo fato. Significa dizer,
que, a sentença penal que inocentou o réu não modulará efeitos na demanda civil pelo mesmo
ato, exceto em casos excepcionais.

Pode-se dar como exemplo uma sentença absolutória por insuficiência de provas na
vara penal, a qual não trará prejuízo algum ao processo cível, nem mesmo impedirá uma futura
indenização sob o ato em questão, o qual foi absolvido nos autos de natureza criminal.

Se na eminência de uma sentença condenatória penal e, assim, tornado coisa julgada


para o processo cível, tornará desnecessário o decurso processual, na fase conhecimento na vara
civil. Desta forma, a sentença penal torna-se-a uma espécie de título executivo judicial, cabendo
ao juiz cível apenas definir um quantum indenizatório. Assim, o juízo penal resolve o mérito de
todo processo de conhecimento, cabendo, assim, ao magistrado cível ficar responsável pela
execução processual dos valores.

Entretanto, havendo sentença absolutória no juízo penal, não terá a mesma influência
sobre a ação indenizatória civil, a qual deverá correr normalmente com processo de
conhecimento, revendo autonomamente toda a matéria probatória em seu bojo.

Portanto, as sanções penais em conjunto com a ação de responsabilidade cível não


configuram bis in idem, sendo certo, que, no ordenamento jurídico brasileiro um mesmo ato
ilícito pode ou não tecer efeitos no direito cível, penal e administrativo. Insta destacar, também,
que a indenização cível busca resgatar o status quo ante do ato ilícito.

55
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil, responsabilidade civil, vol. IV, 6ª ed. São Paulo: Jurídico Atlas.
2002, p. 16.
44

3.3 Da reparação civil por injúria, difamação e calúnia

Como mencionado no tópico anterior, a responsabilidade por um dano de natureza


penal gera consequências civis, com o dever de indenização pelos danos causados. Não
diferente dos demais atos penais, a reparação civil por atos danosos por injúria, difamação e
calúnia será quantificada pela extensão do dano.

Por mais que seja impossível a reparação e quantificação de danos a direitos


personalíssimos, como, por exemplo, a honra e a angústia, não se pode deslegitimar o caráter
compensador e coator da indenização em dinheiro. Por isso, além da condenação penal, a
indenização em pecúnia é importantíssima para se tentar reaver o caráter mais essencial do
senso de justiça e satisfação, por mais personalíssimo que o seja.

Além dos aspectos analisados, o direito Brasileiro abre a possibilidade de haver direito
de resposta e contraste aos fatos, como base de um sistema jurídico baseado na democracia e
no contraditório. Com isso, o pedido formal de desculpas compulsório nasce em no Brasil como
um norte a ser seguido em tempos de internet e influenciadores digitais (formadores de opiniões
nas redes de mensageria e conteúdo).

Por mais que a responsabilidade penal, atrelada a própria indenização pecuniária possa
trazer algum tipo de alento pessoal para vítima de uma difamação (honra subjetiva), seu nome,
carreira e reputação social (honra objetiva) ainda está gravemente ferida diante da sociedade
que em suma maioria não saberá dos desfechos processuais sobre o caso.

Por isso, é de suma importância o juízo deferir o pedido de desculpa compulsória, em


casos de crimes de calúnia, difamação e injúria, para perfis com grande influência que
cometeram tais ilicitudes penais em seus veículos de comunicação, a fim de zelar com a imagem
da vítima perante a sociedade.

3.4 Da responsabilidade civil nos em caso de fake news

Ficou evidente, no presente trabalho, que a responsabilidade civil que incide na


maioria dos casos sobre fake news é a responsabilidade extracontratual. Pois, o agente, ao
difundir notícias falsas, com o cunho de prejudicar terceiros, visa afetar os direitos
45

personalíssimos e atingir a imagem de grupos ou pessoas, para um determinado ganho, seja ele
financeiro, político, ideológico e etc.

Por esta situação, a disseminação de notícias inverídicas, dentre outras coisas, visa
ferir a honra e a credibilidade da vítima, a sua honra objetiva – sua visão perante a sociedade,
o nome e credibilidade social da vítima – ao ponto que seu emprego e atributos ficam totalmente
afetados, pois na maioria das vezes, as vítimas de fake news são pessoas públicas. Por isso a
manipulação da opinião pública gera, de forma indireta os parâmetros sociais, políticos,
financeiros e os costumes a ser utilizado pelas pessoas.

Por isso, que deter os meios de comunicação e a difusão de informação em grande


escala é uma forma de gozar de poder. Assim, ao manchar a credibilidade pessoal de um
adversário político, por exemplo, mediante uma fake news, poderá resultar em um ganho maciço
de votos.

Ter o condão de influenciar as decisões subjetivas das pessoas é de suma importância


para quem é detentor do poder, mas, mesmo assim, a disseminação em massa de notícias falsas
ganha cada vez mais espaço, mesmo que não vá de contra ponto a quem possui os meios de
comunicação, com o advento da internet e a popularização dos provedores de mensageria.

Por estas razões, a indenização a ser prestada por quem cria e dissemina fake news,
seja pessoa física ou jurídica, deve ser responsabilizada, não de maneira apenas vestigial, mas
de maneira severa, devido a gravidade do ato ilícito.

É de suma importância, portanto, que se saiba quando os provedores de mensageria e


pessoas físicas serão responsáveis pelos atos cometidos ao vincularem falsas informações,
como veremos nos tópicos adiante.

3.4.1 Da responsabilidade civil dos provedores de internet e mensageria e demais veículos


de informação

Devido a globalização e inovação digital vivenciada atualmente, a qual atrela uma


nova forma de utilização da internet, se faz necessária uma atuação legislativa mais específica,
voltada para relações pessoais e comerciais, as quais são feitas no meio on-line, já que as
legislações vigentes, por si só, não são capazes de engloba-las. Para isso, o parlamento brasileiro
e a jurisprudência nacional vêm atuando de forma a uma regulamentação do meio cibernético,
46

por mais difícil que seja, devido a constante interações internacionais geradas em meio
eletrônico e todos outros percursos ligados a hackers, vírus, fraudes e etc. Deve-se ressaltar,
também, que, o Brasil se encontra muito aquém legislativamente das necessidades normativas
necessárias para regulamentar às inteirações sociais via internet. Entretanto, o país já possuí
alguns dispositivos legais com real efetividade dentro dos tribunais. Um exemplo disso, é a Lei
12.965/14, a qual instituiu o Marco Civil da Internet.

A aludida lei veio à tona visando regular as tratativas jurídicas em meio cibernético,
pois os demais dispositivos normativos nacionais cíveis não estavam sendo suficientes para
uma real entrelace entre os “novos casos concretos” existentes. A partir da entrada em vigor do
dispositivo legal, a intenção seria a de que a internet não seria mais uma “terra de ninguém”.

E assim, os provedores de mensageria e de conteúdo passaram a ter maiores


responsabilidades no controle das informações que eram disseminados em suas redes. Não
diferentemente, os veículos de comunicação virtuais agora também passaram a ter
responsabilidades por aquilo que vinculam em seus portais.

Porém, a regulamentação e submissão ao controle do Estado sob mensagens e


informação poderiam cercear o direito fundamental da liberdade de expressão e informação,
balizados pelo art. 5° da CRFB/88, pois há uma linha tênue entre regulação a utilização do
direito individual de informar e expressar-se que acabaria censurando os informantes.

Visto este entendimento, o STF, por meio do julgamento da ADI (Ação declaratória de
inconstitucionalidade) n° 4.815, no caso das biografias não autorizadas, juntamente com o
julgamento da ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) n° 130, no qual
declarou a Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa) não recepcionada pela CRFB/88, dando preferência
ao sistema de repressão posterior a postagem, em razão da conexão existente entre a liberdade
de expressão, pluralismo e a democracia, tendo em vista, que, a censura prévia de informações
considera-se um limitador da garantia fundamentais e basilares desses direitos constitucionais.

Com este entendimento, o Brasil passou a vedar qualquer tipo de censura prévia em
seu território, sendo certo, que, qualquer tipo de dano causado pelos conteúdos que forem
veiculados em território nacional seria reprimido, ressarcido e indenizado posteriormente.

Para a devida repressão aos danos causados por ilicitudes na informação veiculada, o
sistema jurídico brasileiro goza, além responsabilidade penal, de três importantes instrumentos,
são eles: a responsabilidade civil pela indenização por danos morais e materiais advindas pelo
47

nexo causal do ato ilícito, o direito de retratação, o direito resposta e o pedido compulsório e
formal de desculpas.

Frisa-se que o próprio Código Civil de 2002 dispõe, em seu art. 927 que, aquele que
por ato ilícito (art. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Sob este mesmo entendimento, as novas legislações pós constituição de 1988


trouxeram o mesmo entendimento dos julgados supramencionados, tanto é que a lei do Marco
Civil da Internet citada dispõe, no caput de seu 8° artigo, que a internet deve ser um local que
impere a liberdade de expressão, direito à privacidade e o pleno exercício do direito de acesso
à internet. O aludido artigo está redigido da seguinte maneira: “Art. 8º A garantia do direito à
privacidade e à liberdade de expressão nas comunicações é condição para o pleno exercício do
direito de acesso à internet”.

Sob este mesmo prisma, o art. 7° da mesma lei, 12.965/14, dispõe que a internet deve
ser um local de cidadania, onde seja assegurado o direito a intimidade e vida privada, o sigilo
de suas comunicações e dados, salvo por ordem judicial, segue a redação do art.7°:

Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são


assegurados os seguintes direitos:
I - inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo
dano material ou moral decorrente de sua violação;
II - Inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, salvo por
ordem judicial, na forma da lei;
III - inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por
ordem judicial;

Para que realmente seja garantida a liberdade de expressão e que seja assegurada a
inviolabilidade da vida privada, os provedores de conteúdo e mensageria devem ser
responsabilizados civilmente em específicos casos. Atualmente, os aludidos provedores
imputam danos em sede judicial apenas nos casos em que as empresas, notificados
judicialmente para derrubar o conteúdo, estando dentro da capacidade estrutural e técnica do
provedor, não o fizerem. Isso fará com que a mesma seja responsabilizada pelo dano, o qual
está persistindo continuamente, pela não derrubada do conteúdo e irá indenizar a vítima do
conteúdo falso, como bem positiva o art. 19 da lei 12.965/14:

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o


provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente
48

por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial
específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do
seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo
apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.56 (grifo
nosso)

A exceção a esta regra é em casos do compartilhamento de pornografia sem


consentimento. Nestes casos, os provedores são obrigados a derrubar o conteúdo logo após a
uma simples notificação pessoal, e não judicial. 57

Anteriormente a este entendimento, trazida pela lei do Marco Civil da Internet, havia
o entendimento pacificado nos tribunais que os conteúdos considerados ilegais compartilhados
na rede de internet, ao serem denunciados, deveriam ser momentaneamente derrubados em 24
horas pelos provedores e, ao passar o prazo, a empresa deveria apurar sua licitude. Porém, a
censura destes conteúdos, por mais que de caráter provisório, poderiam acabar interferindo na
liberdade de expressão e na livre circulação de ideias e notícias, como bem expõe Barroso:

Pois bem, antes de abril de 2014, havia jurisprudência pacificada no sentido que o
conteúdo considerado e denunciado como ilícito por algum usuário tinha o prazo de
24 horas para ser retirado momentaneamente da plataforma, sendo que após esse
prazo, seria devidamente apurada a licitude ou ilicitude do conteúdo divulgado.
Entretanto, decisões neste sentido estavam sendo encaradas como risco à liberdade de
expressão e imprensa, uma vez que tais julgamentos podem acabar limitando a livre
circulação de ideias e notícias na sociedade.58

Fica evidente, assim, que a responsabilização judicial dos provedores está ligada
apenas a derrubada de conteúdos ilícitos e, com raras exceções, após o não cumprimento de
decisão judicial. Desta forma, casos de fake news devem se ater na busca pela responsabilização

56
BRASIL. Planalto. Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm>. Acesso em: 14 jan. 2021.
57
Art. 21. O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será
responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de
seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais
de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal,
deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização
desse conteúdo.
In: BRASIL. Planalto. Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm>. Acesso em: 14 jan. 2021.
58
BARROSO, Luís Roberto. Colisão ente liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de
ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do código civil e da lei da imprensa. In: Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 235, jan./mar. 2004, p. 19. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45123>. Acesso em: 15 mar. 2021.
49

dos agentes causadores do dano e, desta forma, indenizar apenas aquele que exclusivamente
sofreu efetivamente o dano. Logicamente que não se deve esquecer de empresas, profissionais
e cibers-robôs especializados no compartilhamento em massa de notícias falsas.

3.4.2 Da responsabilização de quem cria e dissemina fake news

No subtópico anterior, foi possível notar que a responsabilidade dos provedores só se


dará a partir do momento que os mesmos não cumprem uma determinação judicial e, assim,
não serão responsabilizados pelo conteúdo gerado por terceiros que estejam na plataforma,
como bem define o art. 18 da lei 12.965/2014: “Art. 18. O provedor de conexão à internet não
será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por
terceiros.” (grifo nosso)

Portanto, fica notório que o ordenamento jurídico brasileiro busca a responsabilizar o


agente causador do dano, o qual, no presente contexto, responsável por criar e disseminar o
conteúdo inverídico. Com isso, a indenização civil sempre buscará reestabelecer o status quo
ante da vítima lesada pelo ato ilícito. Como bem preconiza o professor Barroso:

Dessa forma, o agente causador do dano deverá compensar apenas e exclusivamente


quem sofreu efetivamente o dano. É importante ressaltar que a responsabilidade civil
está ligada à ideia compensar os danos sofridos por alguém em razão de uma conduta
de outrem, buscando assim, o restabelecimento do status quo ante da pessoa lesada, o
que infelizmente, nem sempre é alcançável após a divulgação de fake news.59

Por estes motivos, torna-se evidente que a legislação atual busca de forma mais
contundente responsabilizar os agentes que responsáveis pela publicação conteúdo falso
gerado, ou perfis on line com grande poder persuasivo e de participantes nos provedores de
internet, do que os cidadãos que perfis tidos como “comuns” que compartilham a publicação
de maneira irresponsável.

Com isso, mesmo que a Constituição garanta aos informantes o sigilo da fonte, o

59
BARROSO, Luís Roberto. Colisão entre liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de
ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do Código Civil e da Lei da Imprensa. In: Revista de
Direito Administrativo, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, n. 235, jan./mar. 2004. p. 48. Disponível
em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45123>. Acesso em: 15 mar. 2021.
50

divulgador em si, tem a obrigação identificar-se na publicação de conteúdo, bem como o veículo
de comunicação onde será publicado, ficando, assim, os responsáveis pelo material divulgado
facilmente identificáveis.

Porém, nos dias atuais, a responsabilização pelos conteúdos falsos não é tão simples
quanto parece. Atualmente, vários são os sites criados que veiculam informações sem nenhum
tipo de credibilidade e seriedade e, além do mais, não se importam se a informação prestada
está sem o nome do responsável pela publicação. Já é de grande número, os sites brasileiros
usados como ferramenta para as quadrilhas especializadas em divulgar em massa notícias fakes.

Além destes conteúdos falsos, há o presente problema de troca de informações via


provedores de mensageria, onde, as próprias pessoas ao receberem algum tipo de texto
informativo o repassam sem nenhum tipo de checagem ou questionamento prévio. Cabe
ressaltar que em alguns desses provedores, como, por exemplo, o WhatsApp, há grupos de
pessoas com mais de 200 (duzentos) participantes dialogando e trocando informações a todo
momento, os quais podem encaminhar arquivos e mensagens pra diversos outros grupos e
demais pessoas, corroborando, assim, com disseminação de fake news.

É muito difícil, pela via legislativa e judiciária, tentar suprimir esses sites e os
conteúdos trocados nos provedores de mensageria, ou até mesmo tentar “frear” o
compartilhamento em massa de algum conteúdo notificado como fake news, antes da decisão
judicial, sem ferir o direito basilar da liberdade de expressão. Desta forma, medidas
administrativas educacionais poderiam ser um contribuinte para ao menos amenizar o
problema. Outra medida a ser tomada, seria a responsabilização civil mais severa àquela pessoa
que compartilhou a informação falsa, possibilidade esta não trazida pelo PL 2630/2020 e nem
em voga pela lei do Marco Civil da Internet.

Por outro lado, muito severa seria uma punição a quem compartilhou informações via
provedor de mensageria sem mesmo ter a capacidade cognitiva de saber se o conteúdo é real
ou não. Um exemplo comum disso seria um parente, que no grupo de família repassa mídias,
receitas, documentos e notícias recebidas de outros grupos, as vezes nem lendo o conteúdo, mas
apenas a manchete da notícia, e repassando-a.

Conclui-se, então, que a responsabilidade civil por fake news, recaí, na maioria das
vezes, ao agente causador da informação. Muito pouco se responsabiliza àquela pessoa que
compartilhou a informação falsa em grupos de mensageria, pois, na prática, é difícil achar até
um precedente sobre nos tribunais brasileiros. Com isso, pode-se notar, que, a responsabilidade
51

civil por danos causados pelo conteúdo inverídico não atrapalha as demais sanções oriundas da
responsabilidade penal (subtópico 2.2), além da possibilidade de retratação e pedido de
desculpas compulsório trazidos pelo ordenamento.

3.4.3 Precedentes e jurisprudência em casos de fake news no ordenamento brasileiro

No Brasil, como em outros países, fake news é um assunto totalmente em voga, onde,
a globalização do mundo, a inovação digital, a adesão e o acesso em massa das pessoas ao uso
da internet, tudo isso ligado as facilidades contemporâneas na troca na troca de arquivos,
conteúdos, mensagem e diálogos, torna o tema muito complexo e de difícil legislação. Por isso,
atualmente, praticamente todos os países, nos quais é livre a navegação na internet, têm
problemas com disseminação em massa de notícias falsas.

Não há hoje um país que seja exemplo na política ao combate a fake news
democraticamente, seja por via legislativa ou mesmo com uso de políticas públicas de
enfrentamento.

Visto isso, por mais que o problema de veiculação de falsas notícias seja antigo, hoje,
ele se mostra em uma nova roupagem, devido o advento da internet e a troca de informações
em massa. Deve-se levar em conta, também, que a forma com que a informação é contada
influencia em muito nas questões sociais e no uso de poder por poderosos, fazendo com que os
meios tradicionais de informação estejam nas mãos de grupos específicos.

O primeiro precedente que o presente trabalho abordará é referente a uma


disseminação feke news, que tomou grande repercussão regional, publicação essa
compartilhada em um provedor de conteúdo e mensageria: o Facebook. Na ocasião, um cidadão
filmou a chegada de uma enfermeira ao seu posto de trabalho, e, no vídeo, a profissional aparece
batendo seu ponto eletrônico e voltando para dentro carro e saindo do seu local de serviço, o
qual é de competência pública. Porém, o que parecia ser uma grave falta da funcionária, que
evidentemente bateu seu ponto e foi embora, na realidade não era o que tinha acontecido. A
profissional de enfermagem, por estar um pouco atrasada, bateu seu ponto eletrônico e retornou
a seu automóvel para estaciona-lo no devido lugar. Ficou comprovado nos autos que a mesma
atendeu diversos pacientes no dia em questão e assinou vários formulários, comprovando,
52

assim, que se tratava de uma notícia falsa. 60

Porém, por mais que a enfermeira conseguisse na via judicial ser indenizada por danos
morais, a postagem ilícita no Facebook não foi devidamente apagada, pois segundo o STJ, a
interessada não trouxe o URL da localidade da publicação e, neste caso, tornaria muito difícil
o provedor localizar o conteúdo da lide. Fato este que deixou o conteúdo continuar a ser
compartilhado normalmente pelas pessoas, expondo ainda mais a imagem da vítima em todo
Brasil.

É surpreendente que uma corte do alto escalão do judiciário brasileiro permita que a
imagem e a honra de um cidadão brasileiro sejam expostas, por um fato mentiroso, sob o
argumento de que a vítima não trouxe o URL da publicação. O acontecimento absurdo é tido
como o entendimento jurisprudencial e majoritário do STJ, como podemos notar pela emenda:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE


FAZER. PUBLICAÇÃO DE NOTÍCIA FALSA EM REDE SOCIAL. FACEBOOK.
Com efeito, ressalta-se que o egrégio STJ já consolidou o entendimento de que é
indispensável a indicação pelo interessado do URL que permita ao provedor de
conteúdo na internet localizar precisa e exclusivamente o perfil apontado. Assim,
diferente do alegado pela requerente, esta deve apontar o URL capaz de permitir ao
provedor localizar e excluir o conteúdo objeto da lide. Da mesma, na dicção do art.
22 da Lei n° 12.965/2014, haja vista que a interessada não demonstrou o cumprimento
daqueles requisitos elencados nos incisos I e III, não há como obrigar o requerido a
proceder a identificação dos responsáveis por postar a notícia falsa na sua rede social.
Por fim, mostra-se adequada a multa fixada para o caso de descumprimento da
determinação judicial. Sentença mantida. NEGARAM PROVIMENTO AO
RECURSO. UNÂNIME.
“[...] LIBERDADES QUE DÃO CONTEÚDO ÀS RELAÇÕES DE IMPRENSA E
QUE SE PÕEM COMO SUPERIORES BENS DE PERSONALIDADE E MAIS
DIRETA EMANAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
[...] PONDERAÇÃO DIRETAMENTE CONSTITUCIONAL ENTRE BLOCOS DE
BENS DE PERSONALIDADE: O BLOCO DOS DIREITOS QUE DÃO
CONTEÚDO À LIBERDADE DE IMPRENSA E O BLOCO DOS DIREITOS À
IMAGEM, HONRA, INTIMIDADE E VIDA PRIVADA. PRECEDÊNCIA DO
PRIMEIRO BLOCO. INCIDÊNCIA A POSTERIORI DO SEGUNDO BLOCO DE
DIREITOS, PARA O EFEITO DE ASSEGURAR O DIREITO DE RESPOSTA E
ASSENTAR RESPONSABILIDADES PENAL, CIVIL E ADMINISTRATIVA,
ENTRE OUTRAS CONSEQUÊNCIAS DO PLENO GOZO DA LIBERDADE DE
IMPRENSA. [...] PROPORCIONALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA
E RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MORAIS E MATERIAIS A
TERCEIROS. RELAÇÃO DE MÚTUA CAUSALIDADE ENTRE LIBERDADE DE
IMPRENSA E DEMOCRACIA. RELAÇÃO DE INERÊNCIA ENTRE
PENSAMENTO CRÍTICO E IMPRENSA LIVRE. A IMPRENSA COMO

60
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível: AC 0320439-
85.8.21.7000. Resp. Décima Oitava Câmara Cível. Publicação: 21/09/2020. Julgamento: 22/05/2020. Relator
Nelson José Gonzaga. Disponível em: <https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/930028102/apelacao-
civel-ac-70083485300-rs>. Acesso em: 05 mar. 2021.
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INSTÂNCIA NATURAL DE FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA E COMO


ALTERNATIVA À VERSÃO OFICIAL DOS FATOS [...]61

Já o segundo precedente, trazido pelo presente trabalho, trata de um caso onde o


deputado federal pelo PSL de São Paulo, Eduardo Bolsonaro, filho do então presidente da
república Jair Messias Bolsonaro, é réu por disseminar fakes news referentes a índole e o
profissionalismo de uma repórter de um jornal de grande circulação. O deputado também fez
ataques ao veículo de comunicação que a profissional trabalha, todas infundadas e sem
demonstrar a fonte da informação.62

No caso, o réu acusa a jornalista, via Twitter e também em uma Live, via YouTube,
imputando a profissional de ter mantido relações sexuais para obter informações precisas e
publicá-las, bem como atribuiu a promoção da profissional em seu emprego devido à
quantidade de fake news publicadas envolvendo o presidente da república, Jair Bolsonaro.

O deputado, por meio de contestação, nem mesmo tentou comprovar a veracidade dos
fatos publicados referente a jornalista, onde, apenas alegou que havia no caso ilegitimidade
passiva, pois o mesmo gozava de imunidade parlamentar (art. 53 da CRFB/88), por ser
deputado federal. O pedido preliminar foi devidamente rechaçado pelo juiz ad quem, pois a
imunidade parlamentar não tem caráter absoluto e muito menos coíbe a responsabilidade pelos
atos praticados sem nenhum vínculo com seu mandato parlamentar, como no presente caso.

O processo ainda não transitou em julgado, podendo o deputado federal recorrer da


sentença em segunda instância, no TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo). Segue a emenda
do caso:

AÇÃO DE REPARAÇÃO DANOS MORAIS. PONDERAÇÃO ENTRE


LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DIREITOS DA PERSONALIDADE. FAKE
NEWS. GRANDE PROPORÇÃO TOMADA DA INFORMAÇÃO FALSA NAS
REDES SOCIAIS. IMUNIDADE PARLAMENTAR NÃO RECONHECIDA NO
CASO. SENTENÇA EM PRIMEIRO GRAU CONFIMADA.
1. Aduz a autora, que no dia 27 de maio de 2020 o requerido transmitiu uma live pelo
canal “Terça Livre” do YouTube, durante a qual afirmou que a demandante tentava
seduzir para obter informações que fossem prejudiciais ao Exmo. Presidente Jair

61
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação cível n° 70083485300. Comarca de Porto
Alegre. Relator: Des. Nelson José Gonzaga. Publicado em: 21 set. 2020. Disponível em: <https://tj-
rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/930028102/apelacao-civel-ac-70083485300-rs>. Acesso em: 15 mar. 2021.
62
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Ação de Indenização Por Danos Morais n° 1048998 -
75.2020.8.26.0100. Juiz de Direito: Luiz Gustavo Esteves; Órgão Julgador: 11ª Vara Cível do Foro de São
Paulo – SP; Julgamento: 20/01/2021. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/processos/283110098/
processo-n-10 48998-7520208260100-do-tjsp>. Acesso em: 05 mar. 2021.
54

Bolsonaro, pai do réu, e que esta mesma declaração foi veiculada pela página
pessoal do requerido no Twitter. Narra, ainda, que o requerido imputou à
requerente conduta de publicar fake news em 2018 e de tentar se insinuar
sexualmente à Hans River para ter acesso ao seu laptop e conseguir materiais
prejudiciais ao seu genitor. Ademais, alegou que o requerido, em seu Twitter,
publicou que a autora obteve uma promoção no veículo de imprensa a qual
trabalha, pela obtenção de êxito na publicação diversas fake news até então.
Sustenta, ainda, sobre os danos individuais e reparação do dano ao pagamento de
indenização pelas declarações do réu. Discorre acerca da trajetória profissional da
requerente e da conduta do requerido dos fatos no contexto da ofensa, outrossim,
requer a procedência da demanda para condenar o requerido ao pagamento de
indenização por danos morais acrescidos de juros de mora desde o ato ilícito e
correção monetária.
2. o requerido ofertou resposta na forma de contestação, fls. 113/136, arguindo, em
preliminar, ilegitimidade passiva e, no mérito, apresenta esclarecimentos a
respeito da conduta do requerido, aduzindo que somente reproduziu informação
colhida em depoimento em comissão parlamentar de inquérito sem a intenção de
ofensa. Discorre acerca de fls. 165 publicidade dos polos da ação, da culpa de
terceiros, da ausência do dever em indenizar e sustenta sobre a imunidade
parlamentar. Requer improcedência da ação.
A preliminar em contestação foi afasta, dada a incidência da imunidade prevista no
artigo 53, da Constituição da República, já que ela não é absoluta, não alcançando
eventuais ofensas praticadas sem qualquer relação com o mandato parlamentar em
exercício.
3. Como se sabe, nenhum direito é absoluto, nisso, incluindo o direito de livre
manifestação e pensamento. Em outras palavras qualquer comportamento humano
deve guardar respeito aos limites do direito de outra pessoa.
O réu ao postar/transmitir em sua rede social que a autora teria praticado fake news e,
como resultado, obtido uma promoção em seu trabalho, bem como que teria se
insinuado sexualmente a terceira pessoa, no exercício de sua profissão, por certo,
transbordou tais limites, ofendendo a honra daquela, colocando em dúvida,
inclusive, a seriedade do seu trabalho jornalístico e de sua empregadora.
Afinal, não é possível que um comportamento que o próprio ordenamento jurídico
tipifica, em tese, como crime contra a honra possa ser admitido como lícito.
O requerido, ocupando cargo tal importante no cenário nacional – sendo o deputado
mais votado na história do país, conforme declarado na contestação – e sendo filho do
atual Presidente da República, por óbvio, deve ter maior cautela nas suas
manifestações, o que se espera de todos aqueles com algum senso de responsabilidade
para com a nação, em especial, nesse momento tão sensível pelo qual passamos, com
notícias terríveis sendo divulgadas pela imprensa todos os dias, muitas das quais, diga-
se de passagem, poderiam ter sido evitadas, com o mínimo de prudência das figuras
públicas, sem divulgação, aqui sim, de fake news.
4. Pedido inicial parcialmente deferido pelo tribunal, condenando o réu, em decisão
do juízo a quo, em indenizar a autora no valor de R$ 30.000 (trinta mil reais),
conjuntamente com o pagamento de honorários sucumbenciais e demais custas
processuais.63

Nota-se, desta forma, que os precedentes tratados no trabalho ganharam grande

63
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Ação de Indenização Por Danos Morais n° 1048998 -
75.2020.8.26.0100. Juiz de Direito: Luiz Gustavo Esteves; Órgão Julgador: 11ª Vara Cível do Foro de São
Paulo – SP; Julgamento: 20/01/2021. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/processos/283110098/
processo-n-10 48998-7520208260100-do-tjsp>. Acesso em: 05 mar. 2021.
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repercussão, até mesmo a nível nacional, pois as notícias inverídicas foram postadas em
provedores de internet e, assim, ganharam grandes proporções, devida a quantidade de acessos
e ao compartilhamento em massa dos conteúdos mentirosos. Observa-se, também, que a honra
objetiva das duas vítimas foi gravemente molestada, ao ponto de colocarem a suas carreiras em
cheque.

A título de curiosidade, no segundo precedente trazido, mesmo com o deputado sendo


réu pelas atrocidades publicadas referente a jornalista, é possível achar com facilidade na
internet pessoas que defendem o discurso do parlamentar e ofendem a índole da profissional,
com palavras de baixo calão e um notório preconceito de gênero. A credibilidade do veículo de
comunicação que a repórter trabalha também é diretamente atacado por seus apoiadores.

Portanto, devido a grande proporção tomada por uma publicação nos dias atuais e a
gravidade que isso pode gerar ao ser atribuído a notícias falsas, mostra a necessidade de uma
legislação específica para tentar frear e punir mais severamente as fake news no Brasil.
56

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho abordou os malefícios da dissipação das fake news, bem como a
iniciativas legislativas para tentar limitá-las. Ocorre que, como abordado, a linha entre a
divulgação de notícias falsas e a liberdade de expressão é muito tênue, o que faz com que o
Poder Legislativo dobre o cuidado ao abordar tal tema. Há de se proteger e aplicar os princípios
delineados na Carta Magna. No Projeto de Lei elaborado pelo Senador Ângelo Coronel, existem
certos pontos que contradizem o explicitado no Marco Civil da Internet, na Lei Geral de
Proteção de Dados e em demais legislações. A própria investigação para se chegar no autor da
difamação, calúnia, ou injúria, é envolta por uma polêmica, pois, nos dias atuais, a internet
segue a ideia de minimização da coleta de dados, para que os usuários das redes sociais tenham
liberdade em suas conversas e perfis. O PL 2.630/2020 defende que, para o Poder Judiciário
chegar ao infrator, sejam capturas uma série de mensagens, de diversas pessoas, que sequer
cometeram qualquer crime ou contravenção.

Assim, mesmo que a derrubadas às notícias falsas chegue em boa hora, principalmente
no que diz respeito às eleições e honra dos candidatos, é imprescindível cautela na publicação
do texto do PL 2.639/20, uma vez que ordenamento jurídico não regula a conduta de robôs,
todavia de vidas. Cabe ressaltar que já existem ferramentas brasileiras que regulem os falsos
boatos, não se tratando, porém, de uma sociedade refém de regras comportamentais. Mostra-se
inviável que algum tipo de regulamento permeie o subconsciente dos indivíduos, reprimindo-
os de cometer determinadas ações. Desta forma, o caminho mais fácil para a não propagação
das fake news é individual, devendo, cada cidadão, pesquisar a fonte do que se diz e
compartilha, em prol do bem comum e, consequentemente, do Estado.
57

REFERÊNCIAS

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