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DIMENSÕES DA RESPONSABILIZAÇÃO DA EMPRESA VALE DO RIO DOCE

APÓS ROMPIMENTO DA BARRAGEM EM BRUMADINHO: “FOI SEM QUERER


QUERENDO?”

DIMENSIONS OF RESPONSIBILIZATION OF VALE DO RIO DOCE COMPANY


AFTER THE DAM RUPTURE IN BRUMADINHO: “WAS IT ACCIDENTALLY ON
PURPOSE?”

1
Ana Caroline de França Santos
2
Angélica Maria Santos Guimarães

RESUMO
A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, prescreve o Meio
Ambiente ecologicamente equilibrado como um direito difuso, inerente ao princípio da
dignidade da pessoa humana, cabendo a cada um o dever de proteção e preservação
do mesmo. O licenciamento ambiental é trazido à baila como destaque, visto que a
sua juridicidade desencadeia um equilíbrio entre o desenvolvimento sustentável,
econômico, social e ambiental. O presente artigo perpassa pelos conceitos de meio
ambiente e sua relação com o Homem, abordando os aspectos do procedimento de
licenciamento ambiental no contexto do regime de autorização de pesquisa e
concessão de lavra no sistema minerário brasileiro, enfocando, a importância das
prescrições dos princípios da prevenção, precaução e do poluidor-pagador no
processo de licenciamento ambiental e a repercussão dos enunciados da Lei
13.874/19 - Estatuto da Liberdade Econômica neste processo. Por fim, enfoca-se,
como escopo central da pesquisa, a questão da responsabilização da Vale do Rio
Doce após o rompimento da barragem em Brumadinho.
Palavras-chave: Direito Ambiental. Licenciamento. Responsabilidade.

ABSTRACT
The Constitution of the Federative Republic of Brazil, of 1988, prescribes the
ecologically balanced environment as a diffuse right, inherent to the principle of human
dignity, and each one has the duty to protect and preserve it. The environmental
licensing is brought up highlighted, considering that its legality triggers a balance
between sustainable, economic, social and environmental development. This article
goes through the concepts of the environment and its relationship with man,
1
Bacharelanda do curso de Direito do Centro Universitário Ruy Barbosa/Wyden, campus Paralela. Artigo
científico, apresentado como requisito para obtenção de aprovação na disciplina de Trabalho de Conclusão de
Curso II, ano de 2019.2.
2
Procuradora do Município do Salvador, Doutora em Direto Urbanístico na PUC/SP, possui Graduação em
Direito pela Universidade Federal da Bahia (1992); Especialista em Direito Processual pela Universidade
Federal da Bahia (1997), Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2003 e Professora do
Curso de Pós-graduação em Direito Empresarial da Faculdade Rio Branco/SP, Professora de Direito Urbanístico
e Ambiental no Centro Universitário Ruy Barbosa/Wyden e Consultora do MV Sociedade de Advogados.
2

addressing the aspects of the environmental licensing procedure in the context of the
exploration permit and mining concession in the Brazilian mining system, focusing on
the importance of prescribing the principles of prevention, precaution and of the
polluter pays in the environmental licensing process and the repercussions of the
statements of Law 13.874 / 19 - Statute of Economic Freedom in this process. At last,
the focus as the central scope of the research, the issue of the accountability of Vale
do Rio Doce after the dam rupture in Brumadinho.
Key-words: Environmental Law. Licencing. Responsibility.

INTRODUÇÃO

A preocupação do Direito Ambiental brasileiro é que a geração presente busque


atender às suas necessidades, sem comprometer as futuras gerações. Para tanto, é
necessário que haja uma compatibilização entre a equidade social, o crescimento
econômico e a preservação do meio ambiente, ou seja, que garanta a qualidade
ambiental de toda e qualquer forma de vida.

Os debates relativos ao meio ambiente, baseiam-se na terceira geração de


direitos, por este motivo, após verificação do enorme potencial lesivo ao ambiente, o
constituinte incluiu na Carta Magna a atividade econômica da mineração, pois tal
exploração afeta diretamente o solo, bem como o subsolo, acarretando a poluição, o
desmatamento e contaminação dos recursos hídricos.

O entusiasmo para a elaboração desta pesquisa, surgiu após o rompimento da


barragem I de rejeitos de minério da Vale S.A, o segundo desastre não-natural
ocorrido no país num curto espaço de tempo. Além de ser um tema bastante atual, o
rompimento supracitado gerou diversas especulações acerca da capacidade humana
de se autodestruir, em detrimento do proveito econômico e qual seria a
responsabilização da Mineradora diante de tal acontecimento.

Em face da escassez de material de pesquisa, uma vez que o rompimento da


barragem da Vale em Brumadinho é fato recente, com poucas obras científicas
publicadas e jurisprudência em construção, optou-se pela utilização de toda fonte
literária disponível que estivesse correlacionada ao assunto. Portanto, a pesquisa
desenvolveu-se sob o arcabouço de matérias jornalísticas, reportagens, entrevistas e
laudos técnicos de órgãos públicos e privados que versam sobre o tema.
3

Ademais, o presente artigo foi dividido em tópicos, tendo como objetivos


específicos: a identificação da incidência de elementos caracterizadores da
responsabilidade civil por danos ambientais, a verificação do cumprimento de etapas
concernentes ao licenciamento ambiental e demonstração de que o rompimento da
barragem, poderia ter sido evitado, caso fossem observados pontos convergentes no
desastre com a barragem da Samarco três anos antes.

1 A RELAÇÃO ENTRE O HOMEM E O MEIO

Nos tempos hodiernos, a humanidade tem se preocupado cada vez mais com
a necessidade da preservação ambiental, visto que, o meio ambiente encontra-se
deteriorado devido a seu uso de forma desmedida e imprudente. Desde os primórdios,
há a modificação na natureza pelo homem, a fim de adequá-lo às suas necessidades
evolutivas, o que por vezes, desencadeou impactos ambientais imensuráveis.

Porém, nem sempre foi assim. Durante a Revolução Industrial no início do


século XVIII, os avanços pautavam-se nos três fatores básicos da produção, sendo
estes: o trabalho, a natureza e o capital. Entretanto, em meados do século XX
acrescentou-se a tecnologia, fator determinante e revolucionário, tanto de maneira
quantitativa bem como qualitativa do processo industrial.

De maneira acelerada e num curto espaço de tempo a indústria introduziu


mudanças drásticas no Meio Ambiente físico, dando um novo conceito à respeito do
seu uso e destinação, gerando desta maneira prejuízos irreparáveis.

A partir do século XX, mais precisamente após a Segunda Guerra Mundial


(1939-1945), é que esta preocupação tornou-se efetiva, sendo necessária a adoção
de medidas contrárias às idealizadas anteriormente na Revolução Industrial.

Além disso, em meados do referido século, surge como prioridade a Educação


Ambiental, fazendo com que as pessoas compreendessem que "Sociedade e
natureza, de fato, interagem afetando-se mútua e equitativamente, porém, ambas
vitalmente importantes, crescem ou desaparecem juntas" (São Paulo, 1994).

A natureza está para o homem, assim como o homem está para a natureza.
Ocorre que, com o passar dos anos, as atividades desenvolvidas pelo homem,
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desencadearam a poluição, causando entropia no meio ambiente em todas as suas


dimensões (natural, artificial, cultural e do trabalho).

Assim, conforme prescrito nas normas do artigo 3º, inciso III, da Política
Nacional do Meio Ambiente (PNMA), será considerado poluição toda e qualquer
atividade que cause a degradação da qualidade ambiental, à qual, de maneira direta
ou indiretamente, gere um desequilíbrio ecológico. Sendo seus efeitos variáveis,
podendo atingir o ecossistema em todas as suas dimensões, o que justifica a
necessária proteção estatal, inclusive por meio do licenciamento
ambiental/urbanístico, centrado na juridicidade.

O uso desenfreado dos recursos oferecidos pela natureza, unidos a novos


padrões sociais, como o aumento do consumo e o ambiente globalizado, tem deixado
marcas ambientais irretratáveis no planeta. Nesse contexto, insere-se o Direito
Ambiental, que ultrapassa sua esfera legal jurídica, visto que tudo aquilo que envolva
o meio ambiente é de suma importância na congruência entre o Direito e o cidadão.

Desta maneira, insere-se a cidadania, a qual está interligada ao Direito


Ambiental, visto que tanto a evolução da qualidade de vida, como o dano ambiental
são sentidos por todos. Ou seja, o meio ambiente é um valor jurídico, objeto do Direito
da Dignidade da Pessoa humana, como princípio fundamental de terceira geração e
protege toda e qualquer forma de vida.

Segundo a Biblioteca Virtual em Saúde - BVS (2013), o bem-estar físico,


mental, psicológico, espiritual e emocional, além de relacionamentos sociais, como
família e amigos e, também, saúde, educação, habitação, saneamento básico e
outras circunstâncias da vida estão ligadas ao conceito da qualidade de vida. A OMS,
por sua vez, define qualidade de vida como sendo “a percepção do indivíduo de sua
inserção na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em
relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”.

Em paralelo a qualidade de vida, surge o Princípio da Dignidade, o qual é


pontuado por Sarlet (2001) como sendo o valor da pessoa humana que a torna titular
direitos e deveres fundamentais, que lhes assegura consideração e respeito por parte
dos seus iguais e do Estado, em oposição a atos que vão de encontro aos direitos
fundamentais inerentes à si, assim como inclui a garantia de uma vida saudável, desde
que possua mínimas condições de existência.
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No caput do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, o legislador


prescreveu que:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso


comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.

A garantia enunciada nesse neste artigo representa um direito subjetivo


oponível erga omnes, podendo ser exigido do Poder Público e de toda a coletividade.
O meio ambiente ecologicamente equilibrado é o que é o que associa os fatores
culturais, naturais, artificiais e laborais, garantindo desta forma plenas condições à
sadia qualidade de vida.

Ademais, o meio ambiente é um bem jurídico de caráter difuso, de maneira que


o direito de exigir sua integralidade pertence a todos. No entanto, há também o dever
de proteção e preservação do meio ambiente. Por fim, todos aqueles que podem usar
e gozar do meio ambiente ecologicamente equilibrado, serão estes responsáveis por
sua guarda e proteção.

Esse reconhecimento do meio ambiente ecologicamente equilibrado e


sustentável como bem jurídico tutelado pelo direito ambiental, possui grande
relevância já que qualquer dano que seja causado ao meio ambiente, interfere
diretamente no equilíbrio ecológico. Logo, numa reparação futura, deverá ser levado
em consideração a recuperação desse equilíbrio, exatamente como ele é.

Para Rodrigues (2016) o equilíbrio ecológico existe através de combinações


físicas, químicas e biológicas de fatores bióticos e abióticos, que ao interagirem entre
si, nele resultam. Sendo o mesmo de suma importância à conservação e manutenção
de toda e qualquer forma de vida, visto que, não há que se falar em vida digna e de
qualidade num meio ambiente ecologicamente desequilibrado.

Nesse diapasão, vale mencionar a principal intensão do Direito Ambiental


Brasileiro, encontra-se na relação direta entre este e o desenvolvimento sustentável,
econômico e social, não apenas da preservação ambiental propriamente dita. Este
ramo do direito não surgiu apenas com o intuito de proteger/preservar o meio
ambiente, ele tem como finalidade conciliar o desenvolvimento econômico com a
preservação do meio ambiente em suas quatro dimensões, bem como desencadear
um desenvolvimento social justo e econômico viável.
6

De acordo com Sarlet e Fensterseifer (2012), o Estado Socioambiental de


Direito trata-se de um marco jurídico-constitucional convencionado à necessidade da
tutela e promoção, de forma integrada e interdependente:

"dos direitos sociais e dos direitos ambientais num mesmo projeto jurídico-
político para o desenvolvimento humano em padrões sustentáveis, inclusive
pela perspectiva da noção ampliada e integrada dos direitos fundamentais
socioambientais ou direitos fundamentais econômicos, sociais, culturais e
ambientais".

O meio ambiente pode ser definido em quatro aspectos: meio ambiente natural,
artificial, cultural e do trabalho. Como explica Fiorillo (2013), o meio natural, tutelado
pelo caput do artigo 225 da CF/88, pelo § 1º, I, III e VII, desse mesmo artigo, é aquele
constituído pelas águas, pela atmosfera, pelo solo, subsolo, pelos elementos
presentes na biosfera, pela fauna e flora. Onde concentra-se o equilíbrio dinâmico
entre os seres vivos e o meio onde vivem. De acordo com a Lei da Política Nacional
de Meio Ambiente, em seu artigo 3º, inciso I, meio ambiente natural é “o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

A respeito do meio ambiente artificial, o autor supramencionado (2013),


discorre que o mesmo se encontra diretamente ligado ao conceito de cidade, sendo
compreendido pelo espaço urbano construído, englobando um conjunto de
edificações (espaço urbano fechado) e os equipamentos públicos (espaço urbano
aberto). O meio ambiente artificial vem disciplinado principalmente nos artigos 182 e
183 da CF.

O multicitado autor (2013) ainda conceitua o chamado ambiente cultural, com


previsão expressa nos artigos 215, 216 e 2016-A da CF/88, é o patrimônio cultural
brasileiro, compreendido entre os bens de natureza material e imaterial. Inclui todo o
bem que traz em seu arcabouço a história de um povo, a sua cultura, formação e os
elementos próprios que identificam a sua cidadania.

Por fim o meio ambiente do trabalho, previsto nos artigos 7º, inciso XXII e 200,
inciso VIII, da CF, está diretamente relacionado às condições de saúde e segurança
do local em que o trabalhador desempenha as suas atividades laborais, sejam elas
remuneradas ou não, da qual o equilíbrio está aprimorado na salubridade do meio e
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na inexistência de agentes que venham a comprometer a segurança dos


trabalhadores.

2 LICENCIAMENTO AMBIENTAL DE “MINERADORAS” NO BRASIL

A mineração é uma atividade de suma importância para o desenvolvimento


social, contudo, não deixa de desencadear diversas deteriorações ao meio ambiente,
por esta razão, foi incluída na carta magna a previsão da reparação em caso de dano
ambiental. Portanto, deve ser efetivada dentro da sustentabilidade e juridicidade, a
qual necessita de expedição adequada da licença ambiental permitindo que as
mineradoras passem a atuar de maneira sustentável.

No Brasil as atividades das mineradoras são regulamentadas pelo órgão


federal chamado Departamento Nacional de Produção Mineral (DPNM), que
administra e fiscaliza o desempenho da atividade mineradora com o desígnio de
monitorar a utilização dos recursos minerais, gerando um enorme benefício à
sociedade. Entretanto, após a sanção do Decreto 9.406/18, o DPNM foi extinto, sendo
substituído pela Agência Nacional de Mineração (ANM), contudo, o artigo 79 do
referido Decreto dispõe que “os atos normativos do DNPM permanecem aplicáveis,
no que couberem, até que sejam substituídos por Resoluções da ANM.”

Ao decorrer dos anos, o Meio Ambiente vem passando por mudanças


significativas, sejam elas humanas ou naturais, por esta razão, a Constituição Federal,
prescreve que, os recursos minerais são atributos da União, à qual detém o domínio
destes, possibilitando a exploração pelo particular, mediante os Regimes de
Aproveitamento dos Recursos Minerais.

A Política Nacional do Meio Ambiente – Lei nº 6938/81, baseia-se na


implantação e controle de atividades que possam vir a alterar de forma significativa o
meio ambiente, para que haja melhoria na preservação e recuperação da qualidade
ambiental, tornando-se propícia a vida, assegurando à população condições
favoráveis para seu desenvolvimento social e econômico.

O licenciamento ambiental é obrigatório em todas as atividades potencialmente


prejudiciais ao Meio Ambiente, e a partir deste instrumento inicia-se a possibilidade
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de cuidados com o meio ambiente equilibrado e estende-se o alcance nas melhorias


e qualidades, das águas, do ar e do solo, a fim de minimizar os impactos neles
sofridos.

O processo de licenciamento ambiental no Brasil, está entre um dos mais


rigorosos existentes no mundo, isso se dá em decorrência da sua composição por três
fases diversas e devido a sua complexidade. O mesmo, visa a preservação, melhoria
e recuperação da qualidade ambiental e proporcionar a vida, assegurando condições
ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e a
proteção da dignidade da vida humana.

Contudo, devido as diversas alterações normativas ocorridas nos últimos 3


(três) anos, em especial a mais recente, Lei 13.874/19, especialmente em seu artigo
3º, inciso IX, passa-se a temer um retrocesso na eficaz proteção do meio ambiente,
visto que suas prescrições introduzem no ordenamento nacional, o licenciamento
tácito e o simplificado. Pois extrapolado o prazo máximo estabelecido e mantendo-se
silente a Administração Pública, todas as solicitações realizadas pelo particular, para
liberação de algumas atividades econômicas serão validadas.

Posto isso, cumpre lembrar que procedimento deliberativo das grandes


barragens no Brasil engloba um processo de licenciamento ambiental, onde há um
trato maior entre o setor ambiental e do setor de energia, assim como da ativa
participação popular afim de estabelecerem congruentes planejamentos e interesses
que gerem benefícios comuns.

O mecanismo de licenciamento ambiental para a mineração surge através da


anuência dada ao particular para a lavra de minerais por parte da União. Tal
licenciamento será concedido exclusivamente para que empreguem-se na construção
civil as substâncias minerais. Não sendo necessário, portanto, um período destinado
à pesquisa mineral, apenas o conhecimento prévio de que há minério naquela área.
A sua solicitação poderá ser feita por pessoa física, no entanto, o registro apenas
poderá ser concedido à pessoa jurídica, tendo em vista que a pessoa física não tem
poderes para a realização de atividades comerciais.

Para a concessão da habilitação ao “Licenciamento Mineral”, faz-se necessário


que a pessoa jurídica ou física seja dono do solo aonde encontra-se a jazida, ou que
a mesma tenha a devida autorização do proprietário. Devendo o interessado, solicitar
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à prefeitura Municipal onde está localizada a jazida, a licença específica para efetuar
a exploração do minério. Cabendo ao órgão licenciador, desde a confecção do Termo
de Referência, verificar os demais órgãos a serem envolvidos no licenciamento.

Segundo Araújo (2012), o regime de autorização de pesquisa e concessão de


lavra é composto por duas fases. Inicia-se com a solicitação feita pelo interessado de
uma autorização de pesquisa para verificação do ativo mineral, através de um
requerimento dirigido ao Diretor-Geral do DNPM. Caso seja concedida tal autorização,
conforme o artigo 22 e seus incisos, do Código de Mineração, será publicado o Alvará
de Pesquisa, contendo prazo de 1 (um) a 3 (três) anos para realização de trabalhos
de prospecção dentro da área requerida, podendo ser renovado por igual período
através de um requerimento ao DNPM.

Ainda de acordo com a autora supramencionada (2012), nota-se que, nesta


fase, ainda não é concedido ao particular um direito de lavra mineral, tratando-se de
mera expectativa de direito, condicionadas ao resultado das pesquisas. Concluídas
as pesquisas, será elaborado o Relatório Final de Pesquisa, o qual deverá ser
apresentado para a análise e posterior aprovação por parte do DNPM. Em caso de
aprovação, de acordo com o artigo 31, parágrafo único, do Código de Mineração, o
titular do direito minerário para solicitar a concessão de lavra em um ano, prazo
prorrogável por igual período.

Ademais, conclui Araújo (2012), que, por conseguinte, terá início a fase de
Requerimento para a Concessão de Lavra, devendo conter o laudo de viabilidade
técnico-econômica de lavra da jazida em questão, bem como a exibição do Plano de
Aproveitamento Econômico ao DNPM. É imprescindível salientar que, a exploração
da jazida mineral pelo titular do processo só será concedida após a aprovação do
referido pedido pelo DNPM, desde que o processo de licenciamento ambiental tenha
sido aprovação anteriormente. Serão executados nesta fase, todos os trabalhos
indispensáveis ao aproveitamento da jazida mineral.

2.1 AUTORIZAÇÕES REQUERIDAS NO LICENCIAMENTO AMBIENTAL

De acordo com o Guia Técnico de Mineração do Ministério Público de Minas


Gerais (2012), para a concessão do licenciamento ambiental de mineradoras, faz-se
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necessário o requerimento de determinadas autorizações, quais sejam: realização de


audiências públicas3, compensação ambiental4, supressão de vegetação5 e outorga
de recursos hídricos6.

Ainda em conformidade com o documento supracitado (2012), há na mineração


peculiaridades, principalmente no que tange as etapas de concessão mineral e do
licenciamento ambiental (LP, LI, LO). Nesse passo, as normas do artigo 6º da
Resolução do CONAMA nº 10, prescrevem que para que seja haja concessão de
lavra, o DNPM exige a apresentação da Licença Ambiental, especificamente a LI.
Logo, caso o empreendimento de mineração não contemple as diretrizes
consideradas como sendo ambientalmente viáveis ao licenciamento ambiental, o
direito de lavra não poderá ser concedido.

2.2 DOCUMENTOS TÉCNICOS PARA O LICENCIAMENTO AMBIENTAL

A Resolução CONAMA 09/90, regulamenta o licenciamento ambiental de


empreendimentos de mineração, prescrevendo que o mesmo deverá sempre ser
realizado por meio do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental
(EIA/RIMA), para a etapa de LP, e de Plano de Controle Ambiental (PCA), para a
etapa de LI. Já a Resolução CONAMA 10/90, enuncia notadamente que, para
mineração destinada a extração de minerais para uso na construção civil, em
situações que se encontrem à critério do órgão competente, é possível a substituição
do EIA/RIMA pelo RCA (Relatório de Controle Ambiental).

Assim, o EIA é um documento técnico essencial ao processo de licenciamento


ambiental, que analisa minuciosamente um projeto, detecta os prováveis impactos,
investiga sua relevância e recomenda soluções para impedir ou reduzir os impactos
antagônicos e para ampliar os impactos que sejam positivos.

3
São realizadas com o intuito de expor aos interessados os possíveis impactos ambientais, bem
como dirimir dúvidas e coletar sugestões/críticas a respeito do produto em análise.
4
Serve como mecanismo compensador dos impactos que não possam ser reduzidos de maneira
satisfatória.
5
É composta pela caracterização e quantificação da vegetação na área objeto do pedido.
6
Requerida pelo empreendedor ao órgão gestor competente da bacia da qual fará uso dos recursos
ou onde executará lançamentos.
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Regulamentado na Resolução CONAMA 001/86, o RIMA, tem como finalidade


principal a conferência de informação pública a respeito do empreendimento
pretendido. Devendo conter linguagem clara, bem como os resultados conclusos
elaborados pela equipe multidisciplinar responsável pela elaboração do EIA quanto
aos possíveis impactos ambientais.

Já o RCA é um tipo de licenciamento ambiental mais simplificado. Por não


possuir em seu bojo uma Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), não pode ser
comparado ao EIA, e, portanto, não podendo ser aplicado nos empreendimentos que
potencialmente venham a causar impactos ambientais significativos, à exemplo da
mineração.

3 A FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO, PRECAUÇÃO E DO


POLUIDOR-PAGADOR NO LICENCIAMENTO AMBIENTAL

É indiscutível que os princípios norteadores do Direito Ambiental são: o


princípio da prevenção/precaução, da proteção ao meio como hipossuficiente, do
poluidor-pagador e do poluidor-usuário, conforme prescrevem a Política Nacional do
Meio Ambiente e a CRF.

O princípio da prevenção determina a atuação preventiva, afim de evitar o risco


de uma atividade humana que se sabe ser danosa ao meio ambiente, logo, faz-se
necessário a utilização de pesquisas e informações ambientais sobre o risco ou danos
ocorridos em uma situação similar. Nas palavras de Édis Milaré (2009), “na prática, o
princípio da prevenção tem como objetivo impedir a ocorrência de danos ao meio
ambiente, através da imposição de medidas acautelatórias, antes da implantação de
empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras”.

Resumindo, sendo possível prever que determinada atividade causará um


dano, ela deverá ser evitada. Por estar muito preocupado em evitar o dano, o direito
ambiental desenvolveu um complexo procedimento de licenciamento ambiental. Logo,
conforme debatido anteriormente, toda e qualquer atividade que potencialmente
possa vir a causar dano ambiental requer a emissão da Licença Prévia (LP), Licença
de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO).
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Já o princípio da precaução pressupõe a ausência de informações ou a


existência de incertezas científicas a respeito da potencialidade de danos sérios e
irreversíveis de uma intervenção no meio ambiente. Por conseguinte, havendo
dúvidas, deve-se adotar uma postura conservadora, in dubio pro ambiente. Conforme
Pavione (2017), no campo processual nestes casos tem-se adotado a inversão do
ônus da prova, de modo que o interessado deverá comprovar que a sua intervenção
não trará prejuízo algum ao meio ambiente.

Após a conclusão da política de prevenção e feito todo e qualquer procedimento


complexo do licenciamento ambiental, caso apareça o dano, surgirá o princípio do
poluidor pagador, que é reconhecido pela CRFB em seu artigo 225, § 3º:

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão


os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas
independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL,
1988).

Em conformidade com este princípio, a pessoa física ou jurídica que venha a


causar, direta ou indiretamente externalidades negativas deverá arcar com as
despesas de prevenção, reparação ou até indenização por todos os prejuízos
causados. O princípio do poluidor-pagador possui natureza econômica, pois faz com
que o empreendedor arque com os custos ambientais decorrentes de sua atividade,
inclusive com a obrigação de adotar medidas que evitem os prejuízos. E se ainda
assim o dano vier a ocorrer, será o empreendedor compelido a repará-lo,
preferivelmente “in natura”, reestabelecendo-se o “status quo ante”.

No ordenamento jurídico pátrio, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente


(Lei n. 6.938/81), enuncia, nas normas do seu artigo 4º, inciso VII, que se visará “a
imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os
danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais
com fins econômicos”.

De maneira complementar, a referida lei prevê em seu artigo 3º, inciso IV, o
conceito de poluidor como “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado,
responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação
ambiental”. Ainda que os dispositivos supracitados não contemplem diretamente a
expressão “poluidor-pagador”, o teor do princípio encontra-se ali consagrado.
13

Em suma, Sarlet e Fensterseifer (2014, p.87) descrevem que a diretriz geral do


princípio do poluidor-pagador:

“consiste, portanto, na responsabilização jurídica e econômica pelos danos


causados ao ambiente com o nítido propósito de desonerar a sociedade, ou,
pelo menos, de modo a minimizar o fenômeno da “externalização” dos custos
ambientais gerados no âmbito das atividades de produção e consumos de
bens e serviços”.

Em contrapartida, a Lei 13.874/19- Estatuto da Liberdade Econômica, acaba


por mitigar tais princípios em seus artigos. 2º e 3º, onde prestigia com relevância a
liberdade econômica e a hipossuficiência da iniciativa privada e o dano reverso em
favor do particular empreendedor, conforme abaixo transcrito.

Art. 2º São princípios que norteiam o disposto nesta Lei:


I - a liberdade como uma garantia no exercício de atividades econômicas;
II - a boa-fé do particular perante o poder público;
III - a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de
atividades econômicas; e
IV - o reconhecimento da vulnerabilidade do particular perante o
Estado.
Parágrafo único. Regulamento disporá sobre os critérios de aferição para
afastamento do inciso IV do caput deste artigo, limitados a questões de
má-fé, hipersuficiência ou reincidência.
Art. 3° - IX - ter a garantia de que, nas solicitações de atos públicos de
liberação da atividade econômica que se sujeitam ao disposto nesta Lei,
apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o
particular será cientificado expressa e imediatamente do prazo máximo
estipulado para a análise de seu pedido e de que, transcorrido o prazo
fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita
para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas
em lei;
Assim, há que se analisar a dimensão dos princípios da prevenção e precaução
no contexto desse novo regime jurídico do licenciamento, pois, como bem pontua o
advogado André Lima (2019), em sua fala no debate ocorrido na Comissão de Meio
Ambiente, o licenciamento não trata-se apenas de uma mera etapa burocrática e sim
uma garantia de segurança ao meio ambiente, bem como um direito permanente dos
cidadãos.

Acredita-se, portanto, que o silêncio da Administração Pública poderá


desencadear enormes desastres ambientais devido à falta de efetividade na
autorização de desempenho das atividades potencialmente lesivas ao meio ambiente.
14

A partir desta circunstância surge a discussão a respeito da revogação ou não da


Súmula 613 do STJ.

O posicionamento do STJ ao editar a súmula 613, é o seguinte: “Não se admite


a aplicação da teoria do fato consumado em tema de direito ambiental”.
Parafraseando Marques Neto e Freitas (2018), o mesmo requer revisão, haja vista
trata-se de precedente firmado após a edição da nova LINDB, Lei 13.655/18, sendo
com ela incompatível, pois, ao firmar uma interpretação nova a teoria do fato
consumado, gera precedentes a novos condicionamentos de direito, sem contudo
respeitar a regra de transição estabelecida no artigo 23 da lei 13.655/18.

Segundo Marques Neto (2018), o artigo 23 da referida Leia, amplia o dever de


transição em benefício da segurança jurídica, com o intuito de evitar mudanças
drásticas. Ademais, pontua que a referida súmula violará também o artigo 24 da lei
13.655/18, visto que poderá resultar na revisão da validade de atos praticados na
vigência da superada interpretação.

Do mesmo modo, explica Câmara (2018), que após o advento do artigo 24:

A LINDB passou a reconhecer que decisão administrativa proferida em


conformidade com o entendimento jurídico geral adotado em sua época
deve ser considerada válida mesmo que, no futuro, a interpretação sobre
o Direito vigente mude, e ela se mostre contrária ao novo padrão de
orientação jurídica.

Em síntese, quando um entendimento sumulado extingue os efeitos


consagrados, sem realizar qualquer tipo de equilíbrio em matéria ambiental,
contraria todo os aspectos que devem nortear a descrição da nova LINDB.

4 DIMENSÕES DA RESPONSABILIDADE AMBIENTAL NO CASO DO


ROMPIMENTO DA BARRAGEM DA VALE DO RIO DOCE.

Em 25 de janeiro de 2019, a Barragem I de rejeitos de minério da Mina do


Córrego do Feijão, administrada pela Vale do Rio Doce, localizada em Brumadinho-
MG que encontrava-se inativa a 3 anos, se rompeu. Embora tal fato não tenha sido
divulgado de maneira precisa, os danos causados estão sendo caracterizados como
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uma tragédia de grande escala, chegando a superar a ocorrida em Mariana três anos
antes.

Durante uma coletiva de imprensa, logo após a ocorrência do desastre, o até


então Presidente da Vale, Fábio Schvartsman, ao ser interrogado à respeito das
proporções do incidente comparado ao ocorrido em Mariana, afirmou que: “Dessa vez
é uma tragédia humana [...] e possivelmente o dano ambiental desta vez será menor,
pois como a barragem era inativa, o material dentro da barragem já era razoavelmente
seco e consequentemente ele não tem esse poder de se deslocar por longas regiões.
Então, a parte ambiental deve ser muito menor e a tragédia humana terrível”. 7

Em vista dos argumentos apresentados, é possível concluir que este


rompimento provocou uma das maiores fatalidades ambientais ocorridas no Brasil,
sendo considerado ainda hoje como um desastre de dimensões imensuráveis e
catastróficas, ocasionando a morte de 252 pessoas, bem como o desaparecimento de
tantas outras.

Ante o exposto, é cediço, que o rompimento da barragem da Vale no Município


de Brumadinho, não se enquadra apenas como sendo uma tragédia meramente
isolada, mas sim anunciada. Não raro, devido ao histórico recente, toma-se
conhecimento, através de acontecimentos similares que vem acontecendo no Estado
de Minas Gerais.

Levando-se em conta o que fora mencionado em tópico anterior, à respeito das


fases que precedem o licenciamento ambiental, torna-se indispensável pontuar que
em dezembro de 2018 a Vale utilizou-se do mecanismo de licenciamento simplificado,
ou seja, fase única, para ampliar em 70% a mineração da região.

A referida simplificação mostra-se totalmente incoerente em relação às


atividades altamente poluidoras desenvolvidas pela Mineradora. Visto que, este tipo
de licenciamento dispensa os estudos de impactos ambientais para os
empreendimentos de pequeno porte e com baixo potencial poluidor, atesta a
probabilidade ambiental, aprovando a localização e por conseguinte a implantação e
o funcionamento do empreendimento. O que não condiz com a estrutura da Barragem
administrada pela Vale S.A.

7
Entrevista concedida por Fábio Schvartsman, à coletiva de imprensa sobre o rompimento da
Barragem em Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019.
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Em entrevista à Folha Vitória, o geógrafo Klemens Laschefski (2019), revela


que:

O projeto entrou (no Copam) como classe 6, de alto risco e que necessita de
um processo de licenciamento profundo, e assim foi tratado até novembro.
De repente, virou classe 4, com um licenciamento simplificado, sem estudos
necessários para se mensurar as exatas consequências da intervenção.

Explicação que resta evidente a inobservância das condições de segurança da


barragem, por parte da mineradora.

Devido à falta de efetiva fiscalização, bem como a omissão do Poder Público


frente aos impactos avassaladores oriundos das atividades desenvolvidas pelo setor
minerário, o cenário ambiental da mineração brasileira hodiernamente é muito grave.

Noutro giro, por existir um programa frágil e insuficiente de vistorias regulares


dos órgãos governamentais, empresas mineradoras, à exemplo da Vale S.A, têm sido
desatentas no que tange a inspeção de empreendimentos com elevado risco
socioambiental. Sendo imprescindível salientar que em decorrência da prática
corriqueira de auto licenciamentos, onde licenças são concedidas através de relatórios
elaborados pelas próprias empresas interessadas, abrem-se precedentes para a
contínua mineração predatória no país.

Outro fator relevante surgiu no dia 05 de novembro de 2019, após a conclusão


do relatório técnico pela ANM, onde foi possível identificar divergências existentes
entre as informações passadas pela empresa Vale S.A à ANM e os documentos
internos da mineradora. Por este motivo, acredita-se que o desastre poderia ter sido
evitado, caso a ANM fosse cientificada de maneira correta, tendo em vista a
possibilidade de serem adotadas medidas cautelares e exigirem ações emergenciais
por parte da empresa. Como explica o diretor da ANM, Eduardo Leão (2019):

Quando são detectadas situações de comprometimento da segurança da


barragem, imediatamente o empreendedor deve dar início às inspeções
especiais para o monitoramento e controle de anomalias. De imediato, a ANM
envia técnicos para o local onde podem ser feitos exigências, notificações e
até interditar a estrutura a fim de aumentar o nível de segurança.

Ante o exposto, torna-se evidente que a Vale S.A agiu com negligência perante
a todos os riscos eminentes e principalmente em ignorar os alertas emitidos. De
17

acordo com o artigo 225, parágrafo 2º, da CF/88, o dano ambiental já é um


pressuposto da mineração, devendo ser reparado em conformidade com as
orientações e diretrizes técnicas traçadas pelo Poder Público. Diante disso, insere-se
a responsabilidade civil por danos ambientais, a qual pode-se afirmar que é objetiva,
ou seja, é desnecessário comprovar o dolo ou culpa do infrator.

É o que dispõe o artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938 - Lei da Política Nacional
do Meio Ambiente, quando impõe ao poluidor, independentemente da existência de
culpa, a obrigação de indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e
terceiros, afetados por sua atividade. Tendo legitimidade para propor ação de
responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente o Ministério
Público da União e dos Estados.

Prevalece na doutrina e jurisprudência o entendimento de que a teoria adotada


foi a do risco integral, que seria um tipo de responsabilidade objetiva mais gravosa,
não podendo o causídico invocar qualquer tipo de excludente de ilicitude, bastando
que seja comprovado o dano ao meio ambiente. Em sede de recursos repetitivos,
firmou o STJ o seguinte posicionamento a respeito do tema:

1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) a responsabilidade


por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo
o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre
na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa
responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil
para afastar sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a
empresa deve recompor os danos materiais e morais causados e c) na
fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento
seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de
culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa,
orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência,
com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à
realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um
lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e,
de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por
aquele que fora lesado. (STJ, 4ª Turma, Resp. 1.374.284 - MG
(2012/0108265-7), rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ 27-08-2014).

Ademais, é importante salientar que a responsabilidade civil ambiental se


baseia na concepção de solidariedade, portanto, se existir um dano ambiental e vários
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infratores contribuíram de forma direta ou indireta para o mesmo, serão solidariamente


responsáveis pela reparação do dano.

Por fim, conclui-se que, a fatalidade ocorrida em Brumadinho, é exemplo dos


catastróficos resultados de tentativas de abrandamento da legislação ambiental, em
detrimento do poder aquisitivo, eis que, mesmo diante da devastação ocorrida em
Mariana, em 2015, a legislação brasileira não implementou medidas de segurança
eficazes, a fim de prevenir a ruina de barragens.

Desrespeitando assim, os direitos humanos inerentes aos trabalhadores,


moradores e turistas que visitavam a região, bem como o princípio da dignidade da
pessoa humana, segundo Vinio (2019): “A sua vida, frente ao capital de nada Vale”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O meio ambiente ecologicamente equilibrado é um Direito Fundamental,


assegurado a todos e está atrelado ao princípio da dignidade da pessoa humana. Por
este motivo, é de suma importância a observância dos princípios ambientais no
procedimento de licenciamento ambiental, a fim de garantir que as atividades
potencialmente poluidoras sejam seguras e não apresentem riscos à sociedade.

Conforme explanado anteriormente, o Brasil possui um dos mais rigorosos


processos de licenciamento ambiental do mundo. Entretanto, é possível identificar
“falhas” cometidas na emissão de tais licenciamentos. O que fica evidente quando se
nota que, a tragédia de Brumadinho, ocorreu no período em que, objetivando a
desburocratização do licenciamento, discutia-se a flexibilização das leis ambientais.

Ao invés de haver uma implementação de regras de segurança mais rigorosas


após os desastres ocorridos em Mariana, em 2015, e em Brumadinho, em 2019, o
Estado brasileiro surpreende o mundo com a edição da Lei 13.874/19, a qual,
caracteriza-se como sendo um total retrocesso na proteção do meio ambiente de
forma eficaz, visto que suas prescrições introduzem no ordenamento jurídico nacional,
o licenciamento tácito e o simplificado.
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Com o surgimento do Estatuto da Liberdade Econômica fica claro que os dois


maiores desastres ambientais enfrentados pelo país, num intervalo de três anos entre
eles, não serviu de aprendizado para as autoridades.

As atividades potencialmente poluidoras que já eram, até então negligenciadas,


continuarão sendo, uma vez que, extrapolado o prazo máximo estabelecido para
avaliação por parte da Administração Pública, mantendo-se silente a mesma, todas
as solicitações realizadas pelo particular serão validadas.

Logo, faz-se necessário um olhar crítico à respeito da necessidade de um maior


cutela ao tomar determinadas decisões frente ao meio ambiente, de modo que o setor
minerário deve enfrentar o desafio de encontrar compatibilidade entre a
sustentabilidade do meio ambiente e a preservação da vida.
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REFERÊNCIAS

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