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Jornalismo: Ofício & Ofensa

O impacto do jornalista e porque o jornalismo é atacado


Por Rafael Viana.

Escrever é resistir. Desde antes do surgimento da imprensa, a escrita era uma forma de poder.
Controlar essa técnica, portanto quem tem acesso a ela, é uma forma de controle da
sociedade. Esse domínio pertencia ao Clero e às monarquias. Não à toa foi a imprensa de
Gutemberg que possibilitou a reforma Luterana, além da revolução burguesa. Pensar nos
primórdios da escrita e como a conhecemos hoje, mais próxima de ser universalizada, deveria
ser motivo para celebrar e defender como uma conquista. Mas essa afirmação depende muito
de para qual dos lados perguntamos e, talvez o mais importante, depende do que vai ser
escrito.

Nesse contexto histórico, definimos a escrita como um tipo de poder. E assim temos a mídia
como “o quarto poder”, porque é o jornalista e a notícia que tem essa capacidade de
investigar, apurar, buscar, denunciar e difundir as informações acerca de todo e qualquer
assunto. Então devemos sempre celebrar a escrita como algo positivo, devemos mais, lutar
pelo alcance de todos a escrita e leitura - a alfabetização. Assumindo essa premissa, quem
vem se incomodar com a notícia? A quem a notícia ofende? A notícia é uma forma de
ofensa?
Vamos definir aqui a ofensa. E para isso, lembro dos dois anos que morei em João Pessoa,
quando eu era lavador de carro; me perguntaram se a esponja que eu usava não ofenderia a
pintura. O proprietário queria saber se não iria arranhar a pintura com aquele material. Outra
vez, me perguntaram se beber muito café não ofende meu estômago, e nessa queriam saber se
a quantidade não me causaria algum mal estar. Diante disso, quando falarmos de ofensa aqui,
não falaremos de atacar deliberadamente a outrem através das palavras. Mas o efeito.

É comum que nunca tenhamos confrontado esses questionamentos mas, façamos isso agora.
Mas antes de responder tais questões, preciso definir os interesses da notícia: primeiro, a
notícia de interesse público é toda aquela que é pertinente ao impacto direto ou indireto na
sociedade como um todo ou em grupos, por exemplo, as operações policiais; segundo, a
notícia de interesse do público pode ser qualquer informativo que atraia o público em geral
ou uma parcela pelo “querer conhecer” a informação, por exemplo, o fim do relacionamento
de um artista; terceiro, a notícia pode ter múltiplos interesses, podendo ser algo que o público
queira saber por interesse pessoal e que seja necessário, por exemplo, a agenda das festas de
carnaval de uma cidade, que é do interesse do folião, do trabalhador do carnaval, dos usuários
de transportes públicos e motoristas, interessa também o bloco econômico e do turismo.

Tendo isso em mente, quando uma notícia vai ao ar na TV, no rádio, no virtual e também nos
impressos, nem sempre ele é uma ofensa à alguém, à alguma empresa ou instituição. Mas
quando o personagem da notícia, seja quem for, tem algo a esconder e que pretende deixar
nas sombras, se sente exposto por ser centro da notícia em voga ou recorrente, esse
personagem da notícia costuma ser reativo ao jornalismo.
Entendemos: ninguém gosta de ser alvo das gozações dos colegas quando o time perde uma
partida de futebol, né? Mas quando os jornais do dia seguinte ao jogo noticiam a derrota do
time, a equipe de comunicação do clube logo usa suas mídias para trazer pontos positivos
sobre o clube e suas estratégias. Recorrentemente os dirigentes e técnicos por sua vez, se
sentem ofendidos pelas perguntas dos repórteres e agridem verbalmente os profissionais da
imprensa, quando não fisicamente.
O peso do ofício jornalístico vem quando o personagem é alvo de uma denúncia ou
confrontado diante de acusações comprovadas. Se esse personagem da notícia chegou ao
ponto de efetuar um crime e se sente seguro após enganar as autoridades, não há ofensa maior
que ser denunciado e exposto. A reação para estes casos, dentro do jornalismo investigativo,
costuma culminar no jornalista recebendo ameaças do ofendido. Como dito antes, o efeito!

Entre os dois exemplos, não devemos em momento algum sentirmo-nos constrangidos ao


ofender. Digo isso com firmeza, pois, a crítica é parte de toda profissão e atividade, um bom
profissional sabe gerir as emoções e lidar com consequências. Sobre o ato criminoso, é dever
como cidadão a denúncia, e na posição de jornalista ao investigar os fatos e denunciá-los, é
serviço de utilidade pública, é notícia de interesse público. Devemos ofendê-los e os
ofendidos deverão ser investigados na área cível e/ou jurídica.

Diante disso, me orgulho de ser parte de um grupo de pessoas cujo ofício é ofender. Assim
como o arranhão ofende a pintura, como o café ofende o estômago, o jornalismo ofende a
farsa, ofende a corrupção e ofende aqueles que nos tenham ofendido.

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