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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


NÚCLEO INTERINSTITUCIONAL DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA E CIDADANIA
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA

WYLTON MASSAO OHARA

“NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO E A IMPORTÂNCIA DA


ANÁLISE CRIMINAL

Cuiabá
2014
WYLTON MASSAO OHARA

“NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO E A IMPORTÂNCIA DA


ANÁLISE CRIMINAL

Monografia apresentada como requisito


obrigatório para obtenção do título de
Especialista em Gestão de Políticas de
Segurança Pública, pela Universidade
Federal de Mato Grosso – NIEVIC/ICHS, sob
orientação do Prof. Dr. Naldson Ramos da
Costa.

Orientador: Prof. Dr. Naldson Ramos da Costa

Cuiabá
2014
WYLTON MASSAO OHARA

“NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO E A IMPORTÂNCIA DA


ANÁLISE CRIMINAL

Monografia apresentada como requisito obrigatório para obtenção do título de


Especialista em Gestão de Políticas de Segurança Pública, pela Universidade
Federal de Mato Grosso – NIEVIC/ICHS, sob orientação do Prof. Dr. Naldson Ramos
da Costa.

Banca Examinadora:

Conceito: ____

Cuiabá, _____ de ___________________________ de 2014


DEDICATÓRIA

À minha esposa e filhos que, pelo


amor e compreensão demonstrados no
decorrer desta jornada, deram a mim a
certeza de que não estava só durante os
momentos de dificuldade. À minha mãe e
irmãos pelo incentivo e apoio prestados.
AGRADECIMENTO

Em primeiro lugar, a Deus pela sua


existência e onipresença divina. À
Universidade Federal do Estado de Mato
Grosso, à Secretaria de Segurança Pública e
à Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato
Grosso pela oportunidade que a mim foi
dada de participar do presente curso. Ao
meu orientador Naldson pelo apoio prestado
na coordenação do Curso e no presente
trabalho. Por fim, a todos os meus amigos
de Curso pelo apoio e companheirismo
demonstrados durante o Curso.
Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o
resultado de cem batalhas. Se você se conhece mas não conhece o inimigo, para
cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Se você não conhece nem o
inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas.

Sun Tzu
RESUMO

O presente estudo realiza uma abordagem exploratória e descritiva, no


sentido de demonstrar como a análise criminal (AC) pode contribuir para a redução
dos crimes de roubos contra bancos públicos e privados praticados por
organizações criminosas, na modalidade novo cangaço, no estado de Mato Grosso
nos anos de 2010 a 2013. No decorrer do trabalho, serão apontadas características
e diferenças entre a estatística criminal, análise estatística e análise criminal. Será
apresentado um histórico do “cangaço” e sua evolução no Brasil e no estado de
Mato Grosso, bem como será apresentado um estudo de caso, onde a análise
criminal sobre o tema “novo cangaço”, contribuiu para redução e prevenção de
novos roubos a Bancos em Mato Grosso.
Palavras-chave:
Análise Criminal – Novo Gangaço – Roubo à Banco
ABSTRACT

This study conducts an exploratory and descriptive approach, to demonstrate


how the criminal analysis (CA) can contribute to the reduction of theft crimes against
public and private banks committed by criminal organizations, the new cangaço
mode in the state of Mato Grosso in the years 2010 to 2013. during the work,
characteristics and differences are identified between the criminal statistics, statistical
analysis and crime analysis. A history of "highwaymen" will be presented and its
evolution in Brazil and in the state of Mato Grosso, as well as a case study will be
presented, where the crime analysis on "new highwaymen" contributed to reducing
and preventing new robberies banks in Mato Grosso.
Keywords:
Criminal Analysis - New Gangaço - Rob the Bank
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1: Fluxograma exemplificativo da tela do i2 Analyst's Notebook............... 24


Ilustração 2: Mapeamento das ocorrências registradas no período: 2010 a outubro
2012 .......................................................................................................................... 39
Ilustração 3: Mapeamento do Tipo de Vegetação ..................................................... 41
Ilustração 4: Mapeamento da Densidade Demográfica (hab/Km²) – MT ................... 42
Ilustração 5: Mapeamento da Atividade Sócio Econômica do Município .................. 43
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Distribuição por município de roubos a banco – 01/2010 a 10/2012 ........ 36


Gráfico 2: Tipo de vegetação .................................................................................... 40
Gráfico 3: Densidade Demográfica (hab/Km²)........................................................... 41
Gráfico 4: Área do Município (Km²) .......................................................................... 43
Gráfico 5: Com a Distribuição por Dia da Semana de Roubo a Banco - Novo
Cangaço .................................................................................................................... 44
Gráfico 6: Meio Empregado – Armas identificadas ................................................... 45
Gráfico 7: Efetivo Policial (PM e PJC) ....................................................................... 46
Gráfico 8: Roubo a banco modalidade "Novo Cangaço" - Total Mato Grosso .......... 50
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Quantitativo de Ocorrências de Roubos em Instituições Financeiras -


2011/2012/2013 ........................................................................................................ 34
Tabela 2: Datas e locais coincidentes – Roubo a Banco “Novo Cangaço" ............... 47
Tabela 3: Municípios do Estado com características atrativas para este crime ........ 47
LISTA DE ABREVIATURAS

AC Análise Criminal
CEAC Coordenadoria de Estatística de Análise Criminal
CO Crime Organizado
EC Estatística Criminal
DNISP Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública
FEBRABAN Federação Brasileira de Bancos
INFOSEG Rede Nacional de Integração de Informações de Segurança Pública,
Justiça e Fiscalização
POP Policiamento Orientado ao Problema
SAI Secretaria Adjunta de Inteligência
SENASP Secretaria Nacional de Segurança Pública
SESP-MT Secretaria de Estado de Segurança Pública de Mato Grosso
SISP-MT Sistema de Inteligência de Segurança Pública do Estado de Mato
Grosso
SUPIN Superintendência de Inteligência
SISP Subsistema de Inteligência de Segurança Pública
TI Tecnologia da Informação
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14

1 CARACTERÍSTICAS E DIFERENÇAS ENTRE ESTATÍSTICA, ANÁLISE


ESTATÍSTICA E ANÁLISE CRIMINAL .................................................................... 18
1.1 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA ESTATÍSTICA CRIMINAL ................... 18
1.2 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA ANÁLISE ESTATÍSTICA ..................... 19
1.3 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA ANÁLISE CRIMINAL ........................... 21
1.4 A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E A ANÁLISE CRIMINAL ......................... 23
1.5 A ANÁLISE CRIMINAL E O POLICIAMENTO ORIENTADO AO PROBLEMA ... 25
1.6 A COORDENADORIA DE ESTATÍSTICA E ANÁLISE CRIMINAL DE
SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO...... 27

2 O CRIME DE ROUBO A BANCO NA MODALIDADE “NOVO CANGAÇO” ........ 29


2.1 HISTÓRICO ........................................................................................................ 29
2.2 CARACTERÍSTICAS ........................................................................................... 30
2.3 MODALIDADE DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA .............................................. 31
2.3 “NOVO CANGAÇO” NO BRASIL ........................................................................ 33
2.4 “NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO .................................... 35

3 ANÁLISE CRIMINAL DOS CRIMES DE ROUBO A BANCO NA MODALIDADE


“NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO, NOS ANOS DE
2010/2012 ................................................................................................................. 37
3.1 SITUAÇÃO .......................................................................................................... 37
3.2 A ANÁLISE CRIMINAL: UM ESTUDO DE CASO DO “NOVO CANGAÇO EM
MATO GROSSO – 2010-12 ...................................................................................... 38
3.3 RESULTADO DO RELATÓRIO E SUA UTILIZAÇÃO......................................... 48

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 51

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 55
14

INTRODUÇÃO

A violência e a criminalidade vêm se tornando uma das maiores


preocupações para a sociedade, o que tem pressionado os governantes e gestores
a darem respostas no sentido de reduzir a criminalidade, pois este fenômeno social
agride os valores morais e o patrimônio privado e público de todos os governantes.
No Estado de Mato Grosso, as transformações sociais, econômicas e políticas que
ocorreram com maior intensidade a partir dos anos 90, acabaram afetando, na
mesma proporção, o aumento dessa criminalidade.
Nos anos 90, Mato Grosso passou por um grande e intenso processo de
urbanização, onde grande parte da população rural, face à modernização dos
implementos agrícolas, migra para pequenas cidades e grandes centros em busca
de empregos e nova oportunidade de vida. De outro lado, essas cidades, por não
estarem preparadas para receber esse contingente populacional, passaram a ter
dificuldades não somente em absorver essa mão-de-obra, como também em
expandir os serviços urbanos colocados à disposição, tais como educação, saúde,
moradia, transporte e segurança. Somadas, essas condições favoreceram para o
surgimento de grandes problemas sociais, que foram se agravando e culminaram
com o aumento significativo da criminalidade, principalmente contra a vida e o
patrimônio.
Essa criminalidade, que, até então era composta por um ou outro indivíduo,
passa a ser composta por vários indivíduos ou diversos grupos de indivíduos que se
associam para cometer determinados crimes. Posteriormente, esses grupos de
indivíduos, passam a dividir funções, ter hierarquia e fazer do crime uma
habitualidade, surge então o que passou a ser caracterizado e conhecido como
organização criminosa e crime organizado.
15

Nesse contexto de transformações sociais, econômicas e culturais, mais


especificamente no ano de 2010 surge em todo o Brasil, com certa expressividade,
uma nova modalidade de roubo a banco, denominada “novo cangaço”1 Agora com
veículos motorizados e armados de fuzis, esses “novo cangaceiros” sitiam pequenos
municípios brasileiros previamente e estrategicamente escolhidos. A ação
geralmente acontece da mesma forma. Um grupo segue até o destacamento da
Polícia Militar e atira nas paredes do prédio e nas viaturas no local como forma de
amedrontar e inibir qualquer reação diante da superioridade de homens e armas. A
disseminação do terror está presente em todo momento da ação criminosa e é
proposital, com o intuito de intimidar as forças policiais e a população. Enquanto
isso, outra parte da quadrilha se desloca até a agência bancária, faz os clientes de
refém e dá início à subtração do numerário.
São necessários pouco mais de 20 minutos. Apenas o tempo suficiente para
entrar na agência, efetuar alguns disparos de arma de fogo e, em seguida, subtrair o
numerário. Na fuga, costumam interditar as vias de acesso ao município, com
veículos de grande porte ou com carros incendiados. Geralmente, levam alguns
reféns na carroceria dos veículos e, posteriormente, libertam-nos, fugindo mata
adentro.
Esse tipo de ação criminosa costuma ser planejada com semanas de
antecedência. Os caminhos de fuga, os horários de trabalho da polícia e troca de
turno, os dias de maior movimentação de dinheiro, a rotina da cidade escolhida; tudo
é planejado a fim de facilitar o sucesso da empreitada. Poderíamos dizer que os
grupos criminosos trabalham até mesmo com uma precária “análise criminal” antes
de invadir a cidade e tomar como refém a população que se encontra próximo ou
dentro das agências bancárias.
Nos anos de 2010 e 2012 o estado de Mato Grosso foi alvo de diversos
crimes de roubo a banco na modalidade “novo cangaço”, mormente nas pequenas
cidades do interior. Foram registradas um total de 31 ocorrências, sendo estas
distribuídas da seguinte forma, 05 roubos em 2010, 16 em 2011 e 10 de janeiro a
outubro de 2012.

1
São grupos criminosos, que saqueiam, de forma violenta, os bancos, sejam privados ou públicos. O
que interessa é recurso financeiro para alimentar grupos organizados. Apesar da semelhança,
existem diferenças entre o velho e novo cangaço. Naquele a atuação do bando de Lampião, tinha um
cunho sociológico. O objetivo era invadir as cidades e fazer justiça a seu modo. Lembrado como
Robin Hood, Lampião era conhecido por roubar dos ricos para dar aos pobres.
16

Diante desse cenário de insegurança e medo provocado por esta modalidade


de crime, as Polícias Civil e Militar, solicitaram apoio à Secretaria de Estado de
Segurança Pública (SESP-MT), a fim de identificar, com os recursos tecnológicos
existentes, as causas, conseqüências e eventuais cenários prospectivos como forma
de antecipar e prevenir novos ataques.
Nesse sentido, a Secretaria de Estado de Segurança Pública do Estado de
Mato Grosso (SESP-MT), no final do ano de 2012, através da coordenadoria de
estatística e análise criminal (CEAC), após analisar os casos concretos, constatou
que esses crimes possuíam diversos padrões em comum.
Percebeu-se, com a Análise Criminal (AC), que esses roubos ocorriam de
maneira mais acentuada em determinados dias do mês, horários, circunstâncias,
locais e modo de agir semelhantes.
Assim, foi possível apontar determinadas cidades que, em face das
circunstâncias analisadas, poderiam ser alvo de possíveis ataques.
Em face disso, no ano de 2013, após a difusão dessa análise criminal para
todas as forças policial, traçaram-se planejamentos táticos e operacionais nessas
prováveis cidades alvo, o que teria contribuído, de alguma maneira, na diminuição
dos delitos objeto de estudo.
O presente trabalho realiza uma abordagem exploratória, descritiva e, em
alguns momentos, crítica, no sentido de demonstrar de que maneira a análise
criminal (AC) pode contribuir para a redução dos crimes de roubos contra bancos
públicos e privados praticados por organizações criminosas, na modalidade novo
cangaço, no estado de Mato Grosso nos anos de 2010 a 2013.
É evidente que, por se tratar de uma relação de causa e efeito, não se pode
inferir que a análise criminal, por si só, contribui para a redução do crime de “novo
cangaço”, outros fatores, como por exemplo, uma melhor repressão qualificada, com
a identificação e indiciamentos de todos os membros das quadrilhas que aqui
atuavam, podem ter contribuído para o resultado.
Não será tratado no presente estudo, por se tratar de documento reservado, o
planejamento tático e operacional dos órgãos de segurança pública, nas potenciais
cidades alvo.
No decorrer do trabalho, serão apontadas características e diferenças entre a
estatística criminal, análise estatística e análise criminal. Será apresentado um
17

histórico do “cangaço” e sua evolução no Brasil e no estado de Mato Grosso, bem


como será apresentado um estudo de caso sobre o tema “novo cangaço”.
Por se tratarem de conceitos muito correlacionados e, às vezes, até
confundidos, essas características e diferenças entre a estatística criminal, análise
estatística e análise criminal serão bem delimitadas para que não haja divergência
entre elas. Será demonstrada a importância da tecnologia da Informação no
processamento de informações, bem como será descrita a atual estrutura da
Coordenadoria da Estatística e Análise Criminal da Secretaria de Estado de
Segurança Pública do Estado de Mato Grosso.
Em seguida será apresentado um histórico do “novo cangaço” no Brasil e no
estado de Mato Grosso, com a apresentação de dados estatísticos e demonstração
da preocupação com esse tipo de organização criminosa, notadamente com o
aumento da sensação de insegurança gerada por ele.
O estudo de caso diz respeito a uma análise criminal realizada pela
Coordenadoria da Estatística e Análise Criminal da Secretaria de Estado de
Segurança Pública do Estado de Mato Grosso, que mapeou a incidência desse tipo
de crime em Mato Grosso, nos anos de 2010 a 2012, apontando os padrões
encontrados, tais como dias do mês, horários, circunstâncias, locais e modo de agir.
Indicando na oportunidade, face às circunstâncias encontradas, quais seriam as
possíveis cidades alvo.
Esta pesquisa está estruturada da seguinte forma: na primeira parte são
apresentadas as características e diferenças entre análise criminal, análise
estatística e estatística, além de conceitos e particularidades sobre tecnologia da
informação aplicada na área de análise criminal; a segunda parte versa sobre o
crime de roubo na modalidade “Novo Cangaço”, é apresentado o seu histórico e
características, bem como se tese comentários sobre como se deu a sua atuação no
Estado de Mato Grosso; na terceira é descrito como a análise criminal pode atuar
para reduzir os índices de ocorrências desta modalidade de crime; por fim será
apresentado um quadro comparativo da incidência de crimes de roubo a banco, na
modalidade “novo cangaço”, nos anos de 2010 a 2013, com objetivo de demonstrar
que a análise criminal pode contribuir sim na redução da criminalidade.
18

1 CARACTERÍSTICAS E DIFERENÇAS ENTRE ESTATÍSTICA, ANÁLISE


ESTATÍSTICA E ANÁLISE CRIMINAL

1.1 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA ESTATÍSTICA CRIMINAL

Percebe-se, claramente, que alguns autores confundem o conceito de


estatística criminal, análise estatística e análise criminal. Na realidade, são conceitos
diferentes, mas que se complementam, por isso acaba causando divergência
conceitual entre os autores.
Na realidade, esses termos não podem ser estudados de forma estanque, até
por que eles possuem, entre si, pontos em comum. Assim, para facilitar o
entendimento, imprescindível conceituar estatística criminal, análise estatística e
análise criminal, nessa ordem, da forma mais simples para a mais complexa.
O termo estatística, segundo Boyer (1996) apud Weber (2006), surge da
expressão em latim statisticumcollegium palestra sobre os assuntos do Estado, de
onde surgiu a palavra em língua italiana statista, que significa "homem de estado",
ou político, e a palavra alemã statistik, designando a análise de dados sobre o
Estado.
Atualmente, podemos definir a estatística como uma área do conhecimento
que utiliza teorias probabilísticas para explicação de eventos, estudos e
experimentos. Tem por objetivo obter, organizar e analisar dados, determinar suas
correlações, tirar delas suas consequências para descrição, explicar o que passou e
até fazer previsões.
Azevedo assim comenta em seu estudo:

Conforme a contribuição de Grenander e Miller (1994) apud


Azevedo (2012) se assume que o objetivo das estatísticas é a informação,
ou melhor, a compreensão das informações contidas nos dados. Como
aponta Silvestre (2007) apud Azevedo (2012), na base da disciplina
estatística está um conjunto de dados, “sendo esta constituída pelos
métodos que são utilizados para recolher, organizar, descrever e
interpretar”. Outra definição que pode ser incorporada é a de Kendall (1950)
apud Azevedo (2012) que considera as estatísticas como o estudo de
propriedades coletivas de populações. Stevens (1968) apud Azevedo (2012)
ao afirmar que as estatísticas representam uma disciplina projetada para
estabelecer uma ordem em meio a complexidade ajuda a traduzir a noção
da estatística como uma disciplina cujos procedimentos sistemáticos podem
atribuir sentido ao dado bruto com a obtenção de algum tipo de informação
passível de ser analisada (AZEVEDO, 2012, p.45).
19

Por sua vez, a estatística criminal pode ser entendida como o contexto em
que se desenvolvem os eventos criminosos, que afetam a polícia, a sociedade, os
órgãos do sistema de justiça, da educação, da saúde, enfim, visando estabelecer
políticas de segurança pública para amenizar os problemas decorrentes da
violência.
Azevedo (2012) traz alguns aspectos que devem ser observados quanto às
fontes de dados para a estatística criminal.

Além dos dados relacionados aos crimes que são registrados,


podem ser usados, por exemplo, a definição das características
socioeconômicas da população e do local a serem policiados, e até mesmo
a quantidade de viaturas, efetivos policiais, operações realizadas, dados
de interceptações telefônicas e do monitoramento com câmeras de
vigilância (AZEVEDO, 2012, p. 56).

Vale destacar que o conceito de estatística criminal envolve também o


conceito de estatística pública. Dessa forma, quando se falar de estatística criminal
está se reconhecendo que esta se refere a uma estatística que é pública.
Anota inda Azevedo:

Segundo a definição de Jannuzzi (2001, p.133) estatísticas


públicas consistem em “conjunto de dados sociais, demográficos e
econômicos coletados, compilados e disponibilizados regularmente pelas
agências ligadas ao Planejamento Governamental e outras instituições para
a sociedade civil, governos e empresas (idem, ibidem, p. 57).

Nesse sentido, as estatísticas criminais podem ser entendidas como


estatísticas públicas que são baseadas em registros administrativos, mais
particularmente nos registros de ocorrências da Polícia Civil.
Portanto, as estatísticas criminais são consideradas como sendo os registros
constantes nos bancos de dados e boletins de ocorrências, devidamente agrupados
e descritos em tabelas ou gráficos.

1.2 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA ANÁLISE ESTATÍSTICA

A análise estatística criminal consiste na aplicação da análise estatística aos


dados de criminalidade e segurança pública. O trabalho de análise estatística resulta
da execução de quatro fases: coleta, crítica, apresentação e análise dos dados.
20

Coleta de dados consiste na busca ou compilação das informações em


variáveis, componentes do fenômeno a ser estudado. Evidente que essa coleta de
dados somente ocorre após a definição do problema a ser estudado e o
estabelecimento do projeto de pesquisa (objetivo, a forma pela qual os dados serão
coletados, cronograma das atividades, custos envolvidos, exame das informações
disponíveis e delineamento da amostra).
Crítica consiste na revisão dos dados, com a finalidade de identificar e
suprimir os valores estranhos ao levantamento que não interfeririam no resultado, os
quais podem ser capazes de provocar futuros enganos. Esses valores podem
ocorrer, principalmente, por problemas de preenchimento ou digitação dos
questionários.
Apresentação dos dados é uma fase de extrema importância, já que
representa visualmente esses dados coletados. Requer que os dados sejam
organizados de forma prática e racional, para facilitar sua apresentação, no formato
de tabelas, gráficos ou mapas.
A execução dessa etapa ocorre de forma interligada à próxima etapa
referente à análise dos dados, pois com o desenvolvimento da análise é possível
descobrir outras tabelas, gráficos ou mapas que sejam necessários para uma melhor
compreensão do fenômeno estudado.
Por fim, é realizada a análise dos dados, cujas informações são produzidas a
partir da leitura das tabelas, gráficos e mapas, sistematizando as conclusões em um
relatório final.
A execução desse fluxo da análise estatística envolve sempre a possibilidade
de se ter que retornar à primeira etapa da pesquisa referente à coleta de dados.
Tanto uma crítica dos dados pode mostrar que a etapa de coleta não foi bem
planejada ou executada, quanto às etapas de apresentação e análise dos dados
podem evidenciar que os dados coletados são insuficientes para garantir uma boa
compreensão do fenômeno estudado.
Percebe-se que a análise estatística passa praticamente por todas as fases
da elaboração da estatística criminal (coleta, crítica e apresentação dos dados),
realizando em seguida a análise, que seria uma interpretação desses dados,
encontrando padrões que permite ao pesquisador ou gestor público selecionar as
variáveis que mais se ressaltam sobre o fenômeno estudado.
21

1.3 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA ANÁLISE CRIMINAL

A Análise Criminal (AC) surgiu nos Estados Unidos no ano de 1920, quando,
através de catalogação de registros de ocorrências, começou-se a perceber
incidências de crimes em determinadas localidades e por meio da análise, detectou-
se que se poderia direcionar o policiamento para prevenção e diminuição da
criminalidade (CASTRO, 2009).
GOTTLIEB (2002) define AC da seguinte maneira:

É um conjunto de processos sistemáticos direcionados para o


provimento de informação oportuna e pertinente sobre os padrões de crime
e suas correlações de tendências de modo a apoiar a área operacional e
administrativa, o planejamento e a distribuição de recursos para a
prevenção e repressão de atividades criminais, auxiliando o processo
investigativo e aumentando o número de prisões e esclarecimentos de
casos (GOTTLIEB, 2002, p. 5).

Por sua vez, DANTAS (2005) conceitua AC como sendo:

A Análise Criminal é genericamente, a coleta e análise de


informação pertinente ao fenômeno da criminalidade. Através dela, grande
quantidade de dados criminais podem ser analisados para a detecção de
padrões criminais; estabelecidas correlações entre delitos e autores;
determinados perfis de alvos e respectivos delinqüentes habituais e mesmo
previsto o cometimento de crimes (DANTAS, 2005, p. 12).

Para a Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública (DNISP):

Análise Criminal: Genericamente, é a coleta e análise da


informação pertinente ao fenômeno da criminalidade. Sua finalidade é a
produção de conhecimento relativo à identificação de parâmetros temporais
e geográficos do crime e eventuais cifras obscuras, detecção da atividade e
identidade da delinqüência correspondente, subsidiando as ações dos
operadores diretos do sistema (análise criminal tática) bem como dos
formuladores de políticas de controle (análise criminal estratégica e
administrativa). As informações são utilizadas para o dimensionamento e
posicionamento de recursos, bem como para a realização de ações gerais
de gestão em relação a patrulhamento e investigação policial (MINISTÉRIO
DA JUSTIÇA, 2009, p. 23).

Dessa forma, a AC é caracterizada pela coleta e análise de informações de


forma sistemática de modo a obter uma relação causal de fenômenos, tendências
comportamentais e padrões criminais (“modus operandi”), com o propósito de apoiar
a gestão das organizações policiais em relação ao patrulhamento e investigação
policial.
22

Para se realizar a AC, os analistas de crime utilizam também dados


qualitativos e métodos apropriados, examinando não somente dados numéricos,
mas outros fatores que podem influenciar na criminalidade objeto do estudo.
Esses métodos qualitativos específicos para análise de crime incluem
pesquisa de campo (como observar características de locais: iluminação, terrenos e
imóveis abandonados, etc.) e análise de conteúdo (tal como analisar relatórios
policiais e realizar entrevistas).
De maneira geral o objetivo da AC é subsidiar tomadas de decisões das
atividades de Segurança Pública no tocante ao planejamento estratégico, tático e
operacional, bem como o emprego de recursos humanos e materiais, no sentido de
prevenir e reprimir crimes.
Paralelamente, pode a AC auxiliar uma investigação criminal específica. Por
exemplo, um agente policial ao investigar uma ocorrência de roubo, em que o
delinquente usou um “modus operandi” específico, o analista de crime pode ajudar o
investigador, procurando em um banco de dados de roubos, ocorrências anteriores
de casos semelhantes.
Entretanto, a AC não se confunde com a Estatística Criminal (EC) nem com a
Análise Estatística (AE). A EC está intimamente relacionada aos números de
ocorrências de uma determinada área ou região.
Azevedo assim comenta em seu estudo:

É preciso reconhecer que a análise criminal pode englobar


informações de diversas naturezas, como as sigilosas provenientes de
informantes, as estruturais (como o efetivo policial e a quantidade de viaturas
disponíveis) até dados sociodemográficos. Contudo, acredita-se que as
estatísticas criminais situam-se como um dos instrumentos centrais nesse
processo (VIERA DE AZEVEDO, 2011, p. 6).

A AC resulta de cruzamentos de dados, organização de informações e


realização de projeções probabilísticas.
Tudo isso de maneira que a EC e AE tornam-se imprescindíveis para a efetiva
realização da AC. Sem esse prévio processamento de dados, todo o processo de
análise criminal torna-se praticamente inviável em face do volume de informações
obtidas.
23

1.4 A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E A ANÁLISE CRIMINAL

Inicialmente, os profissionais de Análise Criminal (AC) estudavam séries de


crimes como se eles tivessem ocorrido ao mesmo tempo, de modo estático. Quando
da análise de um crime que fazia parte de uma série deles, o analista estudava o
fenômeno delitivo como um todo, codificando manualmente os eventos da série em
um mapa, como se estivessem ocorrendo concomitantemente. Com o passar do
tempo, os analistas perceberam que a análise da criminalidade de forma estática
induzia-os a erro, vez que o crime é dinâmico e sujeito a diversas variáveis.
Atualmente, os analistas contam com o auxílio da Tecnologia da Informação
(TI) e dessa forma conseguem analisar, de forma pragmática, a relação do número
de ocorrências em tempos diferentes com locais coincidentes, possibilitando a
elaboração de mapas com dados estatísticos georeferenciados, bem esclarecedores
e úteis à definição de áreas que precisem de posicionamento preventivo ou de ação
tática repressiva qualificada de forças policiais.
Com base nessa mesma técnica, o analista pode estudar o fenômeno de
padrões temporais, para pré-determinar a data e a hora que o criminoso poderá
escolher para atuar novamente. Nessas duas hipóteses, os objetos de estudo são
crimes em série, só que vistos por uma perspectiva dinâmica, ampla, panorâmica e,
por isso, permitindo alguma capacidade preditiva.
Dantas assim anota:

Ao utilizar as técnicas baseadas na análise dinâmica, o analista


poderá identificar mudanças no comportamento delitivo, capazes de
determinar, em princípio, possíveis dados e informações causais e/ou
operacionais acerca da consecução do crime, tais como distâncias
percorridas, direções tomadas, tempo de consecução e fatores
motivacionais. Geralmente, as técnicas utilizadas para estudar a dinâmica
desses eventos delitivos não são mais difíceis de aplicar do que as utilizadas
na análise estática, demandando, entretanto, uma mudança na metodologia
de análise (DANTAS, 2007, p. 4).

A Tecnologia da Informação trouxe também instrumentos de mapeamento


computadorizado, denominado Sistemas de Informação Geográfica [Geographic
Information Systems – (GIS)]. Utilizando os GIS, os analistas podem estabelecer
relações entre várias camadas de dados, informações e/ou outras variáveis. Com os
GIS, é possível produzir e testar modelos padronizados de movimentos de diversos
fenômenos criminais.
24

É através dos GIS que os analistas deixaram de fincar “alfinetes coloridos”


nos mapas geográficos, visando apontar os locais onde os crimes ocorreram, e
passaram a se utilizar dessa importante ferramenta de Tecnologia de Informação,
para prevenção e repressão de crimes.
De fato, a introdução das ferramentas de GIS nas instituições policiais
significou um dos maiores avanços tecnológicos da AC. Formas sofisticadas de
análise passaram a ser possíveis, permitindo aos seus usuários visualizar inter-
relações temporais e espaciais entre eventos e trabalhar com bases de dados que,
ainda que de classes diferentes de registros, passaram a poder ser efetivamente
inter-relacionáveis.
Outra ferramenta extremamente significativa na AC é um software
denominado i2 Analyst's Notebook, criado no início da década de 90 e atualmente
considerado indispensável acessar e analisar informações localizadas em qualquer
tipo de base de dados. Com ele, o analista criminal informa o que deseja localizar
(por exemplo, tipos de crimes e seu local de ocorrência, meios empregados,
horários, etc...). Daí então, o i2 acessa as bases de dados disponíveis e exibe todos
os vínculos existentes, realizando de forma rápida e eficaz, o que demoraria dias ou
meses, se o fizesse manualmente. Conforme ilustração a seguir:

Ilustração 1: Fluxograma exemplificativo da tela do i2 Analyst's Notebook

Fonte: Software Analyst's Notebook


25

Não há dúvidas de que a Tecnologia da Informação é praticamente


imprescindível para a realização de uma AC mais pragmática e eficiente. Entretanto,
a figura do analista é de suma importância para coletar dados estatísticos e
interpretar as tendências e dinâmicas do crime.

1.5 A ANÁLISE CRIMINAL E O POLICIAMENTO ORIENTADO AO PROBLEMA

Como o objetivo final da Análise de Criminal é de assessorar a polícia na


redução e prevenção do crime e da desordem, temos que lançar mão de estratégias
de policiamento de ponta, utilizando o policiamento orientado ao problema (POP).
Diversos são os conceitos de POP, não havendo na doutrina um
entendimento unânime. Trata-se de uma estratégia de policiamento moderno,
direcionado para redução da criminalidade de forma pontual, tanto do ponto de vista
do tipo de crime quanto à sua incidência em determinado local. É resultado de uma
espécie de análise que, após identificar o problema de criminalidade, analisa suas
causas e tenta resolvê-lo, ocasião em que são realizadas avaliações periódicas de
resultado. Não se pode falar em POP, sem se falar do Método IARA (SARA2), uma
proposta para solução do problema. Esse método IARA é composto de 04 (quatro
fases): 1) identificação do problema; 2) análise das suas causas; 3) responder com
as medidas cabíveis ao caso; e, 4) avaliar os resultados alcançados.
Uma das fases mais complicada é, de fato, identificar o problema, procurando
um padrão ou ocorrências persistentes ou repetitivas. Os problemas podem ser
similares quando temos uma grande quantidade da mesma infração penal; quando
temos o mesmo “modus operandi”; quando estão localizados no mesmo local ou
áreas específicas; quando são as mesmas vítimas ou infratores; quando ocorreram
no mesmo dia do mês, semana ou horários específicos; e, quando ocorrem em
determinados eventos.
Comumente são identificados vários problemas e, considerando que nem
todos podem ser solucionados, deve-se priorizar um ou dois deles para que possam
ser efetivamente controlados.
Pois bem, identificado(s) e priorizado o(s) problema(s), passamos à segunda

2
Termo em inglês que significa Scanning (Identificar), Analysis (Analisar), Response (Responder) e Assesment
(Avaliar).
26

fase do método IARA, a avaliação de sua causa e conseqüências. Para avaliarmos


causas e conseqüências não podemos deixar de observar o triângulo para análise
do problema (TAP) que leva em consideração três fatores: ambiente, vítima e
infrator. Para que um crime ocorra são necessários esses três fatores, minimizar a
sua repetição pode impedir e prevenir crimes futuros.
A terceira fase é responder, buscar essencialmente a maneira mais adequada
de resolver o problema ora identificado com resultados satisfatórios. Existem cinco
maneiras de se lidar com o problema: eliminá-lo totalmente, reduzir o número de
ocorrências geradas pelo problema, reduzir a gravidade dos danos, lidar melhor com
os velhos problemas e encaminhar o problema para outra autoridade não policial.
Tão importante quanto responder é criar um cronograma de atividades para que
existam prazos a serem observados.
Por fim, deve se realizar a avaliação periódica dos resultados, a fim de
verificar se as medidas colocadas em prática tiveram sucesso ou se precisam ser
revistas. Essa avaliação inclui, dentro outros, a análise estatística, pesquisas de
satisfação e sensação de segurança.
Embora a Análise Criminal seja reconhecida hoje como de suma importância,
tanto pelo policiamento como pelas comunidades acadêmicas, é uma disciplina
jovem e ainda está sendo pleno processo de desenvolvimento em nosso país. Por
isso, é necessário formar novos analistas criminais para adquirirem experiência, com
treinamento e assistência, para que possam melhorar suas habilidades e fornece-
lhes exemplos das melhores práticas de todo o país e do mundo.
De olho nessa situação, o estado de Mato Grosso, através do decreto
estadual n. 268, de 18 de maio de 2007, criou a Coordenadoria de Estatística e
Análise Criminal, na estrutura organizacional da antiga Secretaria de Estado de
Justiça e Segurança Pública (SEJUSP). Não obstante, face à escassez de analistas
criminais, poucos foram os trabalhos de análise criminal realizados àquela época.
Um bom analista criminal, tem que ter, além da vocação, muita capacitação e
treinamento, o que exige muito tempo. Em inteligência, fala-se que não se forma um
bom analista criminal com menos de 05 (cinco) anos de experiência.
27

1.6 A COORDENADORIA DE ESTATÍSTICA E ANÁLISE CRIMINAL DE


SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO

Atualmente, a Secretaria de Estado de Segurança Pública do Estado de Mato


Grosso possui, no nível de Direção Superior, a Secretaria Adjunta de Inteligência
(SAI), que tem com missão assessorar o Secretário de Segurança Pública com
informações para a definição, implantação, acompanhamento e desenvolvimento de
políticas de segurança pública, conforme artigo 8º do decreto estadual n. 502, de 30
de junho de 2011, conforme se observa a seguir:

Art. 8º. O Gabinete do Secretário Adjunto de Inteligência tem como


missão assessorar o Secretário de Estado de Segurança Pública com
informações para a definição, implantação, acompanhamento e
desenvolvimento de políticas de segurança pública, competindo-lhe:
I. – representar a secretaria em conselhos e entidades afins, que
promovam ações de âmbito da segurança pública;
II. – estabelecer acordos e parcerias com outras instâncias e esferas de
poder, quando do interesse da área de inteligência no âmbito da
SESP;
III. – articular ações voltadas ao fortalecimento do Sistema Estadual de
Inteligência de Segurança Pública – SIS/MT;
IV. – elaborar propostas de legislação e regulamentação em assuntos de
inteligência de segurança pública;
V. – estimular e promover a modernização e o reaparelhamento dos
órgãos de inteligência integrantes do Sistema Estadual de inteligência
de Segurança Pública;
VI. – estimular e promover a qualificação técnico-científico dos
integrantes dos órgãos que compõem o sistema estadual de
inteligência de segurança pública;
VII. – promover a integração dos órgãos de inteligência integrantes do
SISP/MT;
VIII. – articular intercâmbio de experiências técnicas e operacionais entre
os serviços de inteligência federais, estaduais e municipais;
IX. – promover e coordenar como órgão central, o Sistema de
Inteligência de Segurança Pública;
X. – manter intercâmbio como órgão central do Sistema Brasileiro de
Inteligência – SISBIN e órgão central do Subsistema de Inteligência
de Segurança Pública – ISP, respeitando as deliberações do
conselho Estadual do SISP/MT (MATO GROSSO, 2011, p. 5)

Para exercer esse mister, a SAI conta com o apoio operacional da


Superintendência de Inteligência (SUPIN), que, por sua vez, possui três
coordenadorias:
a) Coordenadoria de Inteligência (COINT);
b) Coordenadoria de Contrainteligência (COCINT);
c) Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (CEAC).
28

Nos termos do Decreto Estadual n. 1676, de 22 de março de 2013, artigo 2º,


compete à Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (CEAC) a análise de
dados estatísticos relativos à Segurança Pública, no intuito de auxiliar a otimização
da gestão administrativa das Polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros e Politec -
Perícia Oficial e Identificação Técnica do Estado de Mato Grosso.
O citado Decreto insere a CEAC como órgão central para consolidar e
divulgar os dados estatísticos oficiais, bem como analisar e auxiliar o planejamento
de ações de Segurança Pública.
A CEAC encontra-se fisicamente instalada nas dependências da Secretaria
de Estado de Segurança Pública e é composta de 07 servidores públicos efetivos,
sendo: 01 Sargento da Polícia Militar Mestre em Geografia, 01 Tenente da Polícia
Militar com formação em Educação Física e Tecnólogo em Gestão em Segurança
Pública, 01 soldado do bombeiro analista criminal, 01 soldado da polícia militar
especialista em geo-referenciamento, 01 Analista de Desenvolvimento Econômico e
Social da área de Administração, 01 Analista de Desenvolvimento Econômico e
Social da área em Serviço Social e 01 economista com Especialização em
Agronegócio e Gestão em Segurança Pública.
É de responsabilidade da CEAC auxiliar o planejamento da ações de
Segurança Pública, que é realizado através da obtenção e análise de dados
estatísticos, bem como da realização da análise criminal. Competindo também o
acompanhamento da criminalidade em todo o estado de Mato Grosso.
O produto desse trabalho é consolidado em relatórios estatísticos e de análise
criminal, que tem por fim auxiliar o Secretário de Segurança Pública na tomada de
decisão em relação às políticas de segurança pública, visando assim direcionar o
trabalho policial para o problema e, consequentemente otimizando recursos
públicos.
Esses relatórios estatísticos e de análise criminal também são enviados aos
setores de estatísticas e núcleos de inteligências da Polícia Judiciária Civil e Policia
Militar, para que servirem de subsídio aos planejamento táticos e operacionais,
respectivos.
29

2 O CRIME DE ROUBO A BANCO NA MODALIDADE “NOVO CANGAÇO”

2.1 HISTÓRICO

Entre o final do século XIX e começo do XX (início da República), surgiu, no


nordeste brasileiro, grupos de homens armados conhecidos como cangaceiros. O
termo “cangaceiro”, em suas origens, faz referência ao termo “canga”, peça de
madeira usualmente colocada nos muares e animas de transporte. Assim, a palavra
cangaceiro, originalmente, faz uma alusão aos utensílios que os cangaceiros
carregavam em seu corpo (MILITÃO, 2009).
Esses grupos de cangaceiros surgiram em função, principalmente, das
péssimas condições sociais da região nordestina como um todo. O latifúndio, que
concentrava terra e renda nas mãos dos fazendeiros, deixava a maioria da
população às margens da sociedade.
Cangaço era um fenômeno social, caracterizado por atitudes violentas por
parte dos cangaceiros. Estes, que andavam em bandos armados, espalhavam o
medo pelo sertão nordestino. Promoviam saques a fazendas, atacavam comboios e
chegavam a seqüestrar fazendeiros para obtenção de resgates. Aqueles que
respeitavam e acatavam as ordens dos cangaceiros não sofriam, ao contrário, eram
muitas vezes ajudados. Esta atitude, fez com que os cangaceiros fossem
respeitados e até mesmo admirados por parte da população da época.
Esses cangaceiros eram nômades, viviam em movimento, indo de uma
cidade para outra. Ao chegarem nas cidades pediam recursos e ajuda aos
moradores locais. Aos que se recusavam a ajudar o bando, sobrava a violência.
Como não seguiam as leis estabelecidas pelo governo, eram perseguidos
constantemente pelos policiais. Usavam roupas e chapéus de couro para
protegerem seus corpos, durante as fugas, bem como da vegetação cheia de
espinhos da caatinga. Além desse recurso da vestimenta, usavam todos os
conhecimentos que possuíam sobre o território nordestino (fontes de água, ervas,
tipos de solo e vegetação) para fugirem ou obterem esconderijos.
Na época, existiram diversos bandos de cangaceiros, porém, o mais
conhecido e temido da época, foi o comandado por Lampião (Virgulino Ferreira da
Silva), também conhecido pelo apelido de “Rei do Cangaço”. O bando de Lampião
atuou pelo sertão nordestino durante as décadas de 1920 e 1930. Morreu numa
30

emboscada armada por uma volante, junto com a mulher Maria Bonita e outros
cangaceiros, em 29 de julho de 1938. Tiveram suas cabeças decepadas e expostas
em locais públicos, pois o governo queria assustar e desestimular esta prática na
região.
Depois do fim do bando de Lampião, os outros grupos de cangaceiros, já
enfraquecidos, foram se desarticulando até terminarem de vez, no final da década
de 1930.

2.2 CARACTERÍSTICAS

Na segunda metade da década de 2000, aumentaram de forma expressiva os


roubos às agências bancárias em todo o Brasil. Surge então o “Novo Cangaço",
modalidade criminosa em que quadrilhas, geralmente, composta por mais de dez
indivíduos fortemente armados, após sitiarem determinada cidade e render as forças
de segurança pública, deslocam-se até as agências bancárias e subtraem
numerários. Por fim, costumam-se evadir-se da cidade com a tomada de reféns.
Tudo começa com a escolha da cidade alvo. Geralmente, a cidade escolhida
possui um baixo efetivo de servidores da segurança pública, o que facilita muito a
“tomada”3 da cidade.
Uma vez escolhida a cidade, começam os meliantes a fazer o levantamento
das localizações exatas das delegacias de polícia, batalhões da polícia militar e
fórum, identificando, na oportunidade, o números de policias que lá trabalham, bem
como o tipo de armamento que utilizam. Realizam também o levantamento de todas
as rotas de fuga existentes.
Enquanto isso, outra parte da quadrilha, trabalha na obtenção da parte
logística: armas, munições, veículos, comida, etc...
O dia do crime geralmente é escolhido pelo líder da quadrilha, que mediante
obtenção de informações privilegiadas, sabe o exato dia em que existirá a maior
quantidade de numerários nas agências bancárias.
Tendo todas as informações necessárias, começa-se o planejamento
operacional desse tipo de delito. Há informes de que esses indivíduos chegam até a
treinar e simular como executarão o que foi planejado.

3
Forma de expressar o termo sitiar: fazer o cerco de, rodear, cercar; assediar.
31

No dia escolhido, geralmente, no período de abertura das agências bancárias,


os meliantes iniciam a execução do planejamento. Um grupo sitia a cidade e rende
todos os servidores de segurança pública; outro grupo desloca-se até a(s)
agência(s) bancária(s) e faz todos os clientes reféns. Para causar mais pânico,
costumeiramente, efetuam disparos de armas de fogo para cima, enquanto outra
parte do bando adentra ao interior da(s) agência(s) bancária(s) e começa a subtrair
numerários.
Efetuada a subtração do numerário, o bando se reúne e leva consigo, na
carroceria de suas camionetes, policiais, clientes e moradores como reféns, a fim de
dificultar a ação policial, caso sejam eventualmente abordados.
Geralmente, com o objetivo de bloquear rodovia que faz parte da rota de fuga,
os criminosos queimam algum(ns) veículo(s) para dificultar a perseguição e desfazer
eventual vestígio(s) deixado(s).

2.3 MODALIDADE DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Não restam dúvidas de que o “Novo Cangaço" é uma modalidade de


organização criminosa4. Nos termos do artigo 1º, par. 1º, da Lei n. 12.850 de 02 de
agosto de 2013, considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou
mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas,
ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem
de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas
sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.
Conforme descrito nos capítulos acima, o “Novo Cangaço" preenche todos os
requisitos previstos em lei como organização criminosa, já que a prática da infração
penal do crime de roubo, prevista no artigo 157 do código penal, imputa ao infrator
penal máxima de 10 anos e multa.5
No tocante à estrutura, a organização criminosa pode ser classificada em três
modalidades diferentes: a tradicional, a empresarial e a endógena.

4 Não se trata de associação criminosa prevista no artigo 288 do código penal, já que no crime de
roubo a banco na modalidade “novo cangaço” existe uma estrutura ordenada e caracterizada pela
divisão de tarefas.
5
Descrição do artigo 157 do código penal: Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem,
mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa.
32

As organizações criminosas da modalidade tradicional possuem um modelo


de relacionamento entre os membros baseado no apadrinhamento. Um membro
recomenda outro, e a partir de então a carreira dos dois fica interligada. Costumam
praticar qualquer tipo de crime, optando pelo mais rentável no momento.
Na modalidade empresarial, as organizações criminosas utilizam princípios
modernos de administração para o cometimento de crime. As relações entre os seus
membros são puramente de trabalho, sem nenhum vínculo a mais. Ademais, são
geralmente especializados na prática de determinado tipo de crime.
Por fim, as organizações criminosas endógenas são aquelas oriundas do
interior de determinadas instituições ou órgãos públicos, sendo que os seus
integrantes aproveitam da qualidade de funcionários públicos para cometerem os
crimes. Costumam atuar no desvio de dinheiro público, corrupção, favorecimento
real e pessoal, concussão, etc. Esses grupos exercem uma atividade constante e
contam muitas vezes com o auxílio de outros servidores que agem
esporadicamente, através da cooptação.
Essas três modalidades de organização criminosa podem estar presentes na
estruturação do crime de “Novo Cangaço", de forma, isolada ou até mesmo
conjugada.
Contudo, antes de se prosseguir neste estudo, deve-se destacar a existência
de grande controvérsia no Brasil sobre a definição de crime organizado, neste
estudo levou em consideração a definição de Cremonesi, que assim anota:

Ao meu entender, crime organizado caracteriza-se por


ser um grupo de indivíduos que tem as suas atividades ilícitas
sustentadas por atores estatais (por meio do oferecimento de
benesses ou atos de cooperação), onde os sujeitos criminais
desenvolvem ações que exigem a presença do mercado
financeiro, para que isso possibilite, às vezes, a lavagem de
dinheiro, e conseqüentemente, a lucratividade do crime. Por
fim, são grupos que relativamente atuam por um considerável
período de tempo, tendo as suas funções estabelecidas, com
hierarquia, para cada membro (CREMONESI, 2010, p. 3).

Importante também, anotar o estudo de Nunes da Silva, ao abordar o tema da


Sociologia da Criminalidade, que faz a seguinte definição:
33

A sociologia da criminalidade é, portanto, um ramo da


Sociologia, cujo objeto de estudo, como o próprio nome indica,
é estudar os fenômenos sociais como crime e violência [...] A
importância da Sociologia quanto ao crime e a violência está na
possibilidade de oferecer subsídios teóricos e metodológicos, por
meio de pesquisas sobre o crime e a violência nos seus diversos aspectos
(NUNES DA SILVA, 2008, p. 10).

Mesmo com algumas controvérsias existentes, o crime de roubo a banco, na


modalidade “novo cangaço”, reúne todas as características legais e sociológicas de
um crime organizado.

2.3 “NOVO CANGAÇO” NO BRASIL

Fonseca de Souza assim define “Novo Cangaço”:

O novo cangaço é uma das modalidades de assalto a


banco que vem causando terror nos interiores [...] vem do
antigo cangaço por serem bem característicos, na época de
lampião, eles faziam saques em cidades, escolhiam cidades
que não tinham uma estrutura do estado para combater,
reprimir e esse dinheiro eram aferidos por eles e distribuíam
para algumas pessoas, hoje se deu o nome novo cangaço
àqueles grupos criminosos que usam Hilux (carro de luxo
potente), armamento pesado, invadem a cidade do interior
saqueiam os bancos e a policia não tem condições de enfrentar
por que o armamento é inferior, por isso que vem a estrutura
novo cangaço, e essa modalidade ocorre tanto nos interiores
do nordeste como do norte, são grupos de (12 a 15) homens
fortemente armados em caminhonete (FONSECA DE SOUZA,
ett all, 2013. p. 46).

Vários estados brasileiros já foram vítimas deste tipo de crime, suas ações
não se restringiram ao um local específico.
Não existe no Brasil uma estatística específica de roubo a banco, na
modalidade “Novo Cangaço”, todos os casos são recepcionados como sendo
“roubos à instituição financeira”, já que a Secretaria Nacional de Segurança Pública
(SENASP)6 não especificou parâmetros para esse tipo de roubo.
A tabela abaixo especifica a quantidade de registros de ocorrências de roubos
à instituição financeira em todo o Brasil, nos anos de 2011, 2012 e 2013:
6
SENASP é um órgão público superior de nível federal, vinculado ao Ministério da Justiça,
responsável pela política de segurança pública no país.
34

Tabela 1: Quantitativo de Ocorrências de Roubos em Instituições Financeiras -


2011/2012/2013

Roubo a Instituição Financeira


2011 2012 2013
Unidade da Federação PC - Qtde. Ocorrências
ALAGOAS 30 61 32
AMAZONAS 64 47 28
AMAPÁ 1 7 4
BAHIA 118 91 137
DISTRITO FEDERAL - 1 2
ESPÍRITO SANTO 29 14 10
GOIÁS 31 17 -
MARANHÃO 20 116 -
MINAS GERAIS 197 238 75
MATO GROSSO DO SUL 8 5 10
MATO GROSSO 52 40 20
PARÁ 43 - -
PARAÍBA 45 41 48
PERNAMBUCO 36 87 73
PIAUÍ 7 6 2
PARANÁ 366 475 367
RIO DE JANEIRO 50 50 71
RIO GRANDE DO NORTE - 3 7
RONDÔNIA 14 1 -
RORAIMA - - 1
RIO GRANDE DO SUL 28 51 52
SANTA CATARINA 36 65 62
SERGIPE 14 34 40
SÃO PAULO 252 222 243
TOCANTINS 25 34 36
Total Brasil: 1.466 1.706 1.320
Fonte: Relatório Sinesp/SENASP – MJ

Fazendo uma breve análise quantitativa, percebe-se pela tabela acima, um


acréscimo de 16% de 2012 em relação a 2011, porém se quando compara os dados
de 2013 em relação a 2012 temos uma redução em 22% do número de roubos a
instituições financeiras no Brasil.
Dentre os estados com maior registro de roubos a instituições financeiras
temos: Paraná, São Paulo, Minas Gerais e Bahia.
35

A Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN)7 estima que os prejuízos


com roubos à Instituições bancárias tem gerado prejuízo de cerca de 72 milhões de
reais, ao ano, além dos danos morais que causam aos clientes e bancários que lá
trabalham.
Embora não seja o objeto deste trabalho, não se pode deixar de consignar
que grande parte da subtração de numerários ocorre através de meios eletrônicos, a
própria FEBRABAN, apontou que no ano de 2012 as perdas dos bancos brasileiros
decorrentes de fraudes eletrônicas somaram cerca de R$ 1,4 bilhão. E que, cerca de
95% da subtração de numerários de instituições financeiras, é realizada através de
meios eletrônicos.
Não é por acaso que os investimentos em segurança eletrônica vêm
ganhando espaço no orçamento de tecnologia de informação nos bancos.

Para se ter uma idéia, em 2011, os gastos com tecnologia da


informação (TI) dos bancos atingiram a marca de R$ 18 bilhões (incluindo
soluções de segurança), volume 27% maior que o de 2009, segundo dados
da pesquisa Ciab FEBRABAN – Setor Bancário em Números (FEBRABAN,
2012)

De outro lado, podemos deduzir, a contrário senso, que o investimento em


prevenção a roubos e furtos à Instituição Financeira em outras modalidades, que
não sejam eletrônicas, seria bem inferior ao desejado, já que apenas 5% dos
prejuízos financeiros são deles decorrentes.
Essa falta de investimento em segurança bancária é um dos fatores que pode
influenciar no aumento de roubos às instituições financeiras.

2.4 “NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO

Embora não exista, em nível de Brasil, uma estatística específica de roubo a


banco, na modalidade “Novo Cangaço”, a Secretaria de Estado de Segurança
Pública do Estado de Mato Grosso, através da Coordenadoria de Estatística e
Análise Criminal, face à gravidade desse tipo de delito e a sensação de insegurança

7
A FEBRABAN - Federação Brasileira de Bancos - é a principal entidade representativa do setor
bancário brasileiro. Foi fundada em 1967, na cidade de São Paulo, com o compromisso de fortalecer
o sistema financeiro e suas relações com a sociedade e contribuir para o desenvolvimento
econômico, social e sustentável do País.
36

e temor que ele causa em toda população, vem monitorando constantemente os


roubos a banco na modalidade “Novo Cangaço” neste Estado de Mato Grosso.
Para se ter uma ideia, no Estado de Mato Grosso, entre janeiro de 2010 a
outubro de 2012 foram registrados um total de 31 ocorrências de roubos a banco na
modalidade “Novo Cangaço”, sendo estas distribuídas da seguinte forma, 05 roubos
em 2010, 16 em 2011 e 10 de janeiro a outubro de 2012.
Essas ocorrências policiais foram distribuídas nos municípios da seguinte
forma:

Gráfico 1: Distribuição por município de roubos a banco – 01/2010 a 10/2012

Fonte: GCCO – PJC

As agências bancárias que sofreram com esse tipo de ação criminosa,


durante o período acima analisado, foram: 21 agências do Banco do Brasil, 07
agências do Sicredi, 02 agências do Bradesco e 01 Casa Lotérica.
37

3 ANÁLISE CRIMINAL DOS CRIMES DE ROUBO A BANCO NA MODALIDADE


“NOVO CANGAÇO” NO ESTADO DE MATO GROSSO, NOS ANOS DE 2010/2012

3.1 SITUAÇÃO

O crime de roubo a banco, na modalidade “Novo Cangaço”, começa a ganhar


expressividade no Brasil no ano de 2010, quando se registra um grande números de
assaltos a banco nessa modalidade, especialmente na região Nordeste do nosso
País.
Conforme acima mencionado, no Estado de Mato Grosso, nos anos de 2010
a outubro de 2012, foram registrados um total de 31 ocorrências, sendo estas
distribuídas da seguinte forma, 05 roubos em 2010, 16 em 2011 e 10 de janeiro a
outubro de 2012.
Esse cenário despertou um sinal de alerta por parte da Secretaria Estadual de
Segurança Pública do Estado de Mato Grosso (SESP-MT), já que esse tipo de
crime, além de causar prejuízos às instituições financeiras, trás uma imensa
sensação de insegurança para a população da cidade alvo.
Todo o aparato de segurança pública da cidade também sofre com essa ação
criminosa, vez que são submetidos à situação vexatória, sendo que, às vezes, são
até mantidos presos em seu próprio cárcere. Como os criminosos costumam agir
com muita violência e mantém alguns habitantes da cidade como reféns, não há
nada para se fazer, a não ser aguardar reforço policial e esperar a liberação das
vítimas.
Em todos os casos de “novo cangaço”, a SESP tem empregado todas as
forças policiais da região, bem como tem lançado mão do uso de forças especiais
como o Batalhão de Operacões Especiais (BOPE), da Polícia Militar (PM) e GOE
(Grupo de Operações Especiais), da Policia Civil. Tudo isso reforçado pela utilização
das aeronaves e helicópteros, do Centro Integrado de Operações Aéreas
(CIOPAER).
Paralelamente a isso, costumeiramente a Gerência de Combate ao Crime
Organizado (GCCO), da policia civil trabalha em conjunto com esses órgãos para
repressão desse crime, a fim de identificar a autoria, circunstâncias, materialidade e
motivação.
38

Embora não exista um levantamento específico sobre o valor gasto com esse
tipo de operação policial, sabe-se que é multo vultoso, pois costumeiramente esse
grupo fica mais de 20 dias em campo, trabalhando dia e noite para o sucesso.
Por conta disso, no final do ano de 2012, a SESP, através da Secretaria
Adjunta de Inteligência (SAI), resolveu solicitar à Coordenadoria de Estatística e
Análise Criminal (CEAC) a realização da análise criminal sobre roubo a banco, na
modalidade “Novo Cangaço”, no Estado de Mato Grosso, nos anos de 2010 a
outubro de 2012.

3.2 A ANÁLISE CRIMINAL: UM ESTUDO DE CASO DO “NOVO CANGAÇO EM


MATO GROSSO – 2010-12

Para realização do referido trabalho de análise criminal, buscou-se,


inicialmente, realizar uma análise geral dos crimes de Roubo a Banco no Estado de
Mato Grosso, na modalidade “Novo Cangaço”, no período de 2010 à outubro de
2012, para, posteriormente, identificar características peculiares nos municípios
específicos com registros de tais ocorrência.
Então, foram consideradas a seguintes variáveis:
a) efetivo das instituições PM e PJC nos municípios com ocorrência;
b) tipo de vegetação dos municípios alvo;
c) densidade demográfica do município;
d) principal atividade Sócio econômica do município;
e) armas identificadas no município;
f) rotas de acesso aos municípios com ocorrências;
g) dias da semana;
h) população e área dos municípios.
Identificadas as características e encontrados os padrões, foi possível apontar
tendências de quais cidades poderiam ser alvos desse tipo de crime, facilitando-se
assim eventuais planejamentos operacionais, a fim se evitar a ocorrência desse
crime.
Com o objetivo de facilitar a metodologia adotada, as variáveis foram
agrupadas, apresentadas e analisadas. Passo a destacar as de maior relevância
para o presente trabalho:
39

Ilustração 2: Mapeamento das ocorrências registradas no período: 2010 a


outubro 2012

Fonte: GCCO – PJC

Percebe-se pelo mapa acima, como as ocorrências estão relativamente


espalhadas em todas as regiões do Estado de Mato Grosso, temos uma pequena
concentração: 03 registros no município de Comodoro e mais outros 06 municípios
com 2 registros; as demais 16 ocorrências não se repetiram nos demais municípios,
ficaram espalhadas em todas as regiões do Estado.
O fato de as ocorrências estarem pulverizadas em todas as regiões do Estado
de Mato Grosso dificultava qualquer trabalho preventivo à época, pois não se tinha
ideia de qual cidade poderia ser alvo desse crime.
Ademais, toda força policial especial (BOPE, GOE, GCCO e CIOPAER) estão
baseadas em Cuiabá, capital do Estado, o que dificulta a repressão, pois cada
descolamento dura, no mínimo, 40 (quarenta) minutos, sendo que cada ação de
roubo a banco, na modalidade novo cangaço, dura, no máximo, 30 (trinta) minutos.
A seguir são apresentados caraterísticas dos municípios do Estado de Mato
Grosso, com registros de ocorrências de ações do “Novo Gangaço”
40

Gráfico 2: Tipo de vegetação

Fonte: IBGE

Percebe-se pelo gráfico acima e pelo mapa abaixo que a maioria dos
municípios com registro de ocorrências de roubo a banco modus operandi “novo
cangaço”, possuem um tipo de vegetação bem característico do Estado, com 60%
das ocorrências o Cerrado e Amazônia, seguido de 23% Amazônia, 10% Cerrado e
Pantanal e 7% Cerrado.
Os municípios pertencentes ao Cerrado e Amazônia são classificados desta
forma, pois são áreas de transição, onde o porte da vegetação dessas cidades não é
tão alto que possa dizer que é da Amazônia, nem muito rasa que caracterize
Cerrado.
Já para os municípios que pertencem ao Cerrado e Pantanal caracteriza-se
por uma vegetação baixa e que no período de chuvas formam regiões alagadas.
O porte da vegetação dos municípios inseridos no Cerrado é
predominantemente baixo e para Amazônia são altas.
41

Ilustração 3: Mapeamento do Tipo de Vegetação

Fonte: IBGE

O fato de 60% das ocorrências incidirem no Cerrado e Amazônia tem a ver


com a “facilidade” de os criminosos adentrarem a uma mata mais fechada, com
árvores altas, para empreenderem fuga. Esse “modus operandi” descrito no item 3.2,
geralmente decorre de um prévio estudo realizado pelos criminosos antes de darem
início à empreitada.

Gráfico 3: Densidade Demográfica (hab/Km²)

Fonte: IBGE
42

Nota-se claramente a “preferência” por municípios pequenos e com baixa


densidade populacional para o cometimento de tal modalidade criminosa, 67% dos
crimes cometidos ocorreram em municípios com aproximadamente 02 pessoas por
km², ao analisarmos a densidade populacional a nível nacional, percebe-se os
Estados da região Centro Oeste e Norte com os municípios menos populosos.
O Estado de Mato Grosso encontra-se na 25º colocação, ou seja, o
antepenúltimo dos Estados com densidade populacional mais baixa, característica
peculiar para a ocorrência deste tipo de crime.
É evidente que a baixa densidade populacional aumenta as chances de
sucesso do evento criminoso, já que o número de pessoas que podem estar em um
estabelecimento bancário é menor e sendo menor, a chance de algum deles estar
armado ou reagir também diminui.

Ilustração 4: Mapeamento da Densidade Demográfica (hab/Km²) – MT

Fonte: IBGE
43

Gráfico 4: Área do Município (Km²)

Fonte: IBGE

Outra constatação que confirma a relação de densidade populacional é o


tamanho dos municípios, aproximadamente 35% dos crimes ocorreram em
municípios com área inferior a 6.500 km², ou seja, a preferência por municípios
pequenos fica claramente demonstrada em ambas às análises.

Ilustração 5: Mapeamento da Atividade Sócio Econômica do Município

Fonte: GCCO – PJC


44

De todos os municípios com ocorrências registradas, 52% possuem atividade


agropecuária e 48% serviços.

Gráfico 5: Com a Distribuição por Dia da Semana de Roubo a Banco - Novo


Cangaço

Fonte: GCCO – PJC

Percebe-se pelo gráfico acima que 38% das ocorrências foram cometidas às
terças feiras e 22% às quintas feiras, os demais dias da semana exceto domingo
que não houve registros e sábados que houve apenas 01 ocorrência.
Outro fator relevante quanto a roubos a bancos neste modus operandi são os
dias do mês, 56% das ocorrências aconteceram nos primeiros 10 dias de cada mês.
Merece destaque aqui o fato de a grande maioria dos casos ocorrerem até o
dia 10 de cada mês, possivelmente pela grande quantidade de dinheiro que circula
nesse período, uma vez que muitos moradores recebem seus salários nessa época.
Isso também faz com que as instituições financeiras armazenem grande quantidade
de dinheiro em seus cofres e caixa eletrônicos.
45

Gráfico 6: Meio Empregado – Armas identificadas

CRIMES QUANTIDADE
COM ARMAS IDENTIFICAS 21
COM ARMAS NÃO IDENTIFICADAS 10
TOTAL 31

Fonte: GCCO – PJC

Percebe-se pelas informações acima que, dos 31 registros de roubos a banco


em 67% dos casos foram identificadas e/ou apreendidas as armas utilizadas, o que
demonstra-se a violência e gravidade de tal modalidade criminosa. Das 35 armas
identificadas nesse tipo de delito, 17, ou seja, 54%, foram Fuzil, 16% pistola e 16%
espingarda calibre 12. O que demonstra o alto poder de fogo dessas quadrilhas
especializadas no “Novo Cangaço”.
Além do poder de fogo, esses tipos de armas causam uma grande
intimidação, tanto para a população, quanto para os órgãos de segurança pública
local.
46

Gráfico 7: Efetivo Policial (PM e PJC)

Fonte: Unidades Policiais PM e PJC

Percebe-se pelo gráfico acima que 9 ocorrências foram registradas em


municípios que somados a PJC e PM possuem um efetivo de até 09 servidores, ou
seja, em média no máximo 04 policiais diariamente, considerando a escala de
serviço, férias etc.
Em 13 dos casos temos um efetivo que varia de 30 a 39 policiais, novamente
agregados PM e PJC o que demonstra que de acordo com a realidade da maioria
dos municípios do Estado, possui um efetivo razoável.
Contrariando, e muito, o que se pensava antes da realização dessa análise
criminal 13 desses crimes de um total de 31 ocorreram em cidades com efetivo
policial razoável para as condições deste Estado de Mato Grosso, o que demonstra
que a força policial não seria um fator de escolha utilizado pelos criminosos.
47

Tabela 2: Datas e locais coincidentes – Roubo a Banco “Novo Cangaço"

Ano Mês Dia Dia da Agência Município


do Mês Semana
2012 1 9 Segunda Banco do Brasil Confresa
2012 1 9 Segunda Sicredi Confresa
2012 10 30 Terça Banco do Brasil Comodoro
2012 10 30 Terça Bradesco Comodoro
2012 10 30 Terça Casa Lotérica Comodoro
2011 3 10 Quinta Banco do Brasil Poconé
2011 3 10 Quinta Banco do Brasil Querência
2011 7 5 Terça Banco do Brasil Nova Monte Verde
2011 7 5 Terça Banco do Brasil Paranatinga
2011 7 5 Terça Banco do Brasil Poconé
2011 11 10 Quinta Sicredi Colniza
2011 11 10 Quinta Bradesco Colniza
Fonte: GCCO – PJC

Percebe-se pela tabela acima que 12 ocorrências de roubos a banco no


Estado coincidiram quanto ao dia do fato.
Em 03 das coincidências identificadas, foram realizados 07 roubos, sendo 02
em Confresa, 03 em Comodoro e 02 em Colniza, mesmo município porém agências
bancárias diferentes.
Em outras 02 coincidências, temos novamente 05 roubos no mesmo dia,
porém em municípios distintos, sendo estes, Poconé e Querência, Nova Monte
Verde, Paranatinga e Poconé.

Tabela 3: Municípios do Estado com características atrativas para este crime

Município Área da Unidade Densidade Tipo de Vegetação


Territorial (Km²) demográfica
(hab/km²)
Bom Jesus do Araguaia 4.274,21 1,24 Cerrado e Amazônia
Campos de Júlio 6.801,21 0,76 Cerrado e Amazônia
Canabrava do Norte 3.452,68 1,39 Cerrado e Amazônia
Conquista D’Oeste 2.672,21 1,27 Cerrado e Amazônia
Ipiranga do Norte 3.467,05 1,48 Cerrado e Amazônia
Nova Lacerda 4.735 1,15 Cerrado e Amazônia
Porto Estrela 2.062,76 1,77 Cerrado e Amazônia
Reserva do Cabaçal 1.337,04 1,92 Cerrado e Amazônia
Santa Terezinha 6.467,37 1,14 Cerrado e Amazônia
Serra Nova Dourada 1500,39 0,91 Cerrado e Amazônia
Vale de São Domingos 1.933,05 1,58 Cerrado e Amazônia

Fonte: IBGE

Dentre as principais variáveis analisadas quanto às características dos


municípios que são mais atrativas para o cometimento do crime de Roubo a Banco
48

“Novo Cangaço”, temos: área territorial do município inferior a 7.000 Km², Densidade
Populacional inferior a 2 habitantes por Km e vegetação do tipo cerrado e Amazônia.
Ou seja, municípios onde a zona urbana não é tão densa populacionalmente,
os residentes do munícipio se dividem e se espalham entre a zona urbana e zona
rural.
A vegetação tipo cerrado e Amazônia demonstra uma zona de transição,
porém com predominância de matas altas e fechadas, o que facilita a atividade
criminosa no momento da fuga, onde constantemente os fugitivos se escondem nas
matas por vários dias.
Com base nesse detalhamento de possíveis cidades alvo para o crime de
“novo cangaço” foram realizados pelas forças de segurança pública planejamentos
táticos e operacionais, com o fim de reduzir os números de crimes dessa espécie.
Entretanto, por se tratarem de documentos reservados, esses planejamentos
não serão objeto de estudo do presente trabalho.

3.3 RESULTADO DO RELATÓRIO E SUA UTILIZAÇÃO

O trabalho de análise criminal denominado Relatório de Análise Criminal –


Roubo a Banco – “modus operandi” Novo Cangaço - Mato Grosso - Período:
2010/2011 e 2012 aponta que, embora o citado crime ocorra de forma difusa em
todo Estado de Mato Grosso, 60% deles ocorreram em municípios que possuem
vegetação mista, cerrado e floresta amazônica, possivelmente pelo fato de os
criminosos poderem inserir em sua rota de fuga uma mata densa, com vegetação
alta, com o intuito de despistar a polícia.
De fato, uma perseguição em mata fechada dificulta bastante o trabalho da
polícia, já que requer, não apenas uma preparação técnica da equipe policial, como
também uma grande logística para manter a equipe de trabalho em campo.
Esses municípios que foram alvos do crime de roubo a banco, na modalidade
“novo cangaço”, possuem uma densidade populacional baixa, sendo que 67%
dessas cidades possuíam menos de 2 habitantes por Km². E em 35% dos casos, a
área total do município era inferior a 6.500 km². Isso demonstra a preferência dos
criminosos em escolher cidades pequenas e com baixa densidade populacional, fato
esse que reduz o risco de eventual reação por parte da população e da força policial
local.
49

Como descrito acima no item 3.2, a escolha da cidade é um fator


preponderante para o sucesso da empreitada. O fato de os criminosos escolherem
cidades com baixa densidade demográfica é uma característica dessa modalidade
de crime.
A grande maioria das ocorrências foi registrada nas terças e quintas-feiras,
nos primeiros 10 (dez) dias do mês, período este entendido como de maior
movimentação bancária.
Normalmente, os empregados costumam receber no começo do mês, entre
os dias 01 e 10, fazendo com que a instituição bancária planeje ter ou colocar à
disposição, uma quantidade maior de numerários em espécie.
Uma característica marcante desse tipo de crime é o uso da extrema
violência, causando grande sensação de insegurança. O principal meio empregado
nessa ação criminosa é o uso de arma de fogo, geralmente de grosso calibre. Em
54% dos casos, os criminosos utilizaram fuzil, em 16% pistolas, em 16%
espingardas calibre 12, sendo ainda identificadas 02 metralhadoras e 02
submetralhadoras.
Contrariando o que se pensava, em 13 casos, os municípios alvos contavam
com efetivo razoável em relação à realidade do Estado; em 09 dos casos, constatou-
se que os municípios contavam com efetivo reduzido. Isso nos leva a crer que os
criminosos nem sempre escolhem a cidade que possui o menor efetivo policial.
Uma vez finalizado, esse relatório foi distribuído para todos os órgãos de
segurança pública, para que, de maneira integrada e sob a coordenação da
Secretaria de Estado de Segurança Pública do Estado de Mato Grosso, fossem
elaborados os planejamentos táticos e operacionais, visando prevenir o crime de
roubo a banco, na modalidade “novo cangaço” e, caso ocorresse, fossem criados os
protocolos de atendimento e repressão.
Embora não seja objeto de estudo do presente trabalho, até por que se trata
se assunto reservado, grande parte do planejamento tático e operacional ficou
concentrado nas ações preventivas, levando-se em conta as características dos
municípios que já foram alvos desse tipo de ação criminosa e os dias de semana
que mais ocorrem, principalmente com foco nas cidades que seriam mais atrativas,
conforme tabela 3.
Essa concentração de esforços dos órgãos de segurança pública orientado
para o problema apresentou bons resultados, não somente em relação ao número
50

de ocorrências registradas, como também na integração das forças de segurança


pública, atuando de forma mais coordenada.
Para se ter uma ideia, após a realização desse trabalho de análise criminal,
no ano de 2013 foram registrados tão somente 02 casos de roubo a banco, na
modalidade “novo cangaço”, no estado de Mato Grosso. Apenas relembrando, em
2010 foram registrados 05 roubos, em 2011 registrou-se 16 e em 2012 foram
registrados 10 roubos nessa modalidade. Percebe-se, claramente, no ano de 2013
uma redução considerável no número de ocorrências desse tipo de crime, tudo
conforme gráfico abaixo:

Gráfico 8: Roubo a banco modalidade "Novo Cangaço" - Total Mato Grosso

Fonte: GCCO – PJC

Evidente, destacar também, que, por se tratar de uma relação de causa e


efeito, não se pode inferir que a análise criminal, por si só, foi o único fator que teria
influenciado na redução desse crime, outros fatores podem ter contribuído para o
resultado, a exemplo da repressão qualificada, realizada pela Polícia Judiciária Civil,
através da Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO), com a identificação
e indiciamento de todos os membros da organização criminosa, bem como a sua
respectiva privação da liberdade.
51

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na atualidade, não se pode mais pensar em desenvolver políticas de


segurança pública de forma reativa, aguardando a consumação de um determinado
crime para depois tentar solucioná-lo, buscando a materialidade, circunstâncias,
autoria e motivação. Torna-se imprescindível, a cada dia que passa, a proatividade
nas ações, buscando padrões criminais e, assim, encontrando tendências, para que
sejam traçadas estratégias para prevenir a ocorrência de outros delitos.
Necessitamos mais ainda trabalhar com cenários prospectivos, que nos
demonstre de que maneira a criminalidade tende a evoluir no tocante à localização,
motivação, circunstâncias e outros fatores que possam ser avaliados.
A evolução já tem sido significativa, antes a estatística criminal (EC) continha
apenas dados brutos de ocorrências criminais registradas em uma delegacia de
polícia. Com a análise estatística (AE), esses dados passaram a ser agrupados e
analisados de forma metodológica, onde então foram identificados padrões de
criminalidade. Por fim, veio a análise criminal que, revolucionando a forma de criar
políticas e diretrizes de segurança pública, tem contribuído para a redução da
criminalidade com o policiamento orientado ao problema.
O estado de Mato Grosso tem dado muita importância à Analise Criminal
como ferramenta para redução da criminalidade, tanto que o Decreto Estadual n.
1676, de 22 de março de 2013, eleva a Coordenadoria de Estatística e Análise
Criminal (CEAC), à condição de órgão central para consolidar e divulgar os dados
estatísticos oficiais, bem como analisar e auxiliar o planejamento de ações de
Segurança Pública, através da análise criminal. Tudo isso com o objetivo de
legitimar as análises criminais realizadas pela CEAC.
52

Percebeu-se que a análise criminal é uma excelente ferramenta para o


combate à criminalidade, pois através dela, foi possível identificar os padrões dos
crimes estudados em relação aos dias do mês, horários, circunstâncias, locais e
modo de agir. Fatores que, uma vez analisados e somados a outras variáveis,
possibilitam a projeção de tendências, auxiliando assim a elaboração de políticas de
segurança pública.
Nos anos de 2010 a 2012, as cidades do interior do estado de Mato Grosso
sofreram com diversas ocorrências do crime de roubo a banco, na modalidade “novo
cangaço”, ocasião em que um grupo de indivíduos, fortemente armados, após sitiar
determinado município e render os policiais, deslocam-se até as agências bancárias
e subtraem numerários. Sendo que geralmente costumam evadir-se do local com
reféns.
Trata-se de uma espécie de organização criminosa, estruturalmente ordenada
e caracterizado pela divisão de tarefas, que trouxe às cidades do interior do estado
de Mato Grosso uma grande sensação de insegurança e temor, já que em 54% dos
casos analisados, os criminosos utilizaram o fuzil como principal armamento.
Nesse sentido, a Secretaria de Segurança Pública, através da Coordenadoria
de Estatística e Análise Criminal (CEAC) realizou no final do ano de 2012 a análise
criminal de roubo a banco, na modalidade “novo cangaço”, objeto do presente
estudo. Esse relatório de análise criminal, após consolidado, foi encaminhado o
Secretário de Segurança Pública, que tomou decisão de difundi-lo aos órgãos de
segurança pública para que, de forma integrada e sob a coordenação da Secretaria
de Estado de Segurança Pública, fossem adotadas as medidas de planejamento
tático e operacionais para conter especificamente esse tipo de crime e, caso
ocorresse, que fossem tomadas as medidas de repressão qualificada.
Ao tomarem conhecimento desse relatório, todos os comandante regionais da
Polícia Militar e Delegados de Polícia Regionais, passaram a elaborar de forma
integrada os respectivos planejamentos táticos e operacionais de prevenção e
repressão, com base nos dados e informações apontados no relatório de análise
criminal.
Grande parte desse planejamento consistiu em ações preventivas de combate
a esse tipo de crime, levando-se em consideração especificamente as cidades que
possuíam as características atrativas para esse crime e os dias do mês e da semana
que mais ocorriam. E, caso o crime fosse consumado, também foram criados os
53

protocolos de atendimento integrado entre as polícias civil e militar, para procederem


a repressão de forma mais padronizada e qualificada.
Com base nesses planejamentos, subsidiados pelo relatório de análise
criminal, no ano de 2013 foi possível reduzir em 400% o número de ocorrências de
roubo a banco, na modalidade “novo cangaço”, registradas no estado de Mato
Grosso. Para se ter uma ideia, no ano de 2012 foram registradas 10 ocorrências
dessa natureza, após a análise criminal, no ano de 2013, foram registradas apenas
02 ocorrências.
Uma dessas ocorrências foi registrada no Distrito de Água Limpa, na região
de Nova Ubiratã e outra na cidade de Vila Rica. No Distrito de Água Limpa foram
presos em flagrante delito 03 pessoas, sendo que outras duas faleceram no
confronto policial. Já na cidade de Vila Rica todos os envolvidos, ao total 10
pessoas, foram identificados e tiveram as prisões preventivas decretadas. Como o
foco das ações preventivas, face à análise criminal, ficou para as cidades
mencionadas na tabela 3, muito provavelmente elas ficaram isentas dessa ação
criminosa.
Evidente que o trabalho em conjunto e integrado, com foco no policiamento
preventivo orientado para o problema contribuiu sobremaneira para redução desse
crime, além de propiciar a aproximação das policias militar e civil na realização dos
trabalhos.
Essa forma de trabalho evidenciou que a análise criminal pode influenciar
também na redução dos custos da segurança pública, proporcionando o
direcionamento de ações preventivas, com a alocação de viaturas policiais e
recursos humanos para os locais, dias e horas indicados no relatório de análise.
Embora não haja estatística do número de crimes evitados, podemos dizer
que o simples policiamento orientado para o problema nesses locais, pode ter inibido
a prática do delito, algo que, de forma imensurável, contribui para o aumento da
sensação de segurança.
Ainda bem que muitos estados brasileiros, a exemplo de Minas Gerais, Rio de
Janeiro e São Paulo, já estão utilizando a análise criminal como instrumento para
planejar diretrizes e políticas de Segurança Pública com o intuito de combater a
criminalidade.
Em Mato Grosso não é diferente, a Secretaria de Estado de Segurança
Pública já vem a certo tempo utilizando a análise criminal não somente no combate
54

a crimes contra instituições financeiras, como também no combate a roubos em


residência, furto de veículos, tráfico de drogas, homicídios e qualquer outro tipo de
delito.
Cada vez mais, fica evidente a importância da análise criminal, de modo que
se torna necessária não apenas a capacitação de servidores, mas mormente a
inclusão de agentes externos como sociólogos, estatísticos, geógrafos, sociedade
organizada e outros que possam contribuir, direta ou indiretamente, na realização
dessas análises, evitando assim uma visão apenas com viés de segurança pública.
55

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