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Augusto Barbosa
Discente do Programa de Pós-Graduação
Mestrado em Ciências da Religião no Centro
de Ciências Sociais e Educação – CCSE da
Universidade do Estado do Pará – UEPA.
augustosbarbosa@yahoo.com.br
RESUMO
Este trabalho propõe analisar a forma de como os sacerdotes do Candomblé de Angola em Belém passaram
a ter envolvimento com a produção de políticas públicas e eleitorais. O objetivo descrever e analisar as
principais formas de organização política dos angoleiros, refletindo sobre como eles se inserem em redes
nacionais de militância política. A política será considerada de um ponto de vista filosófico e antropológico, a
partir das contribuições de autor como Oro (2010). A pesquisa foi desenvolvida através de trabalho de campo
etnográfico, realizado em Belém durante o segundo semestre de 2012, por meio de entrevistas e observação
participante junto a duas lideranças do candomblé angola, as mães de santo Beth de Bamburucema e Kátia
Haddad.
ABSTRACT
This work aims to analyze the way how the priests of Candomblé de Angola in Bélém started to have
involvement with the production of public and electoral politics. The objective to describe and analyze the main
forms of political organization angoleiros, reflecting on how they fall in national networks of political activism.
The policy will be considered a philosophical and anthropological point of view, from the contributions of the
author as Oro (2010). The survey was developed through ethnographic fieldwork conducted in Belém during the
second half of 2012, through interviews and participant observation with the two leaders of Candomblé Angola,
the mothers of the holy Beth Bamburucema and Katia Haddad.
1
Política é essa que desencadeia ao ser humano uma administração das linguagens materiais pressionando assim,
os bens naturais e finitude do ser em um Estado.
atabaques, assim a FEUCABEP tinha a função de legitimação. Com isso Silva (1976) a ponta
os objetivos da instituição descrito no I capitulo do Estatuto,
Art. 1° - A FEDERAÇÃO ESPIRITA UMBANDISTA E DOS CULTOS AFRO-
BRASILEIROS DO PARÁ, fundada a 26 de agosto do ano de mil novecentos e
sessenta e quatro (1964), com a sua sede na cidade de Belém, capital do Estado do
Pará e com jurisdição em todo o território do Estado, filiado à confederação Espírita
Umbandista do Brasil em 10 de setembro de 1964, sob o número 1350, tem por
finalidade reunir todos os TERREIROS, CENTROS, SERAS e CABANAS, com os
seguintes objetivos: a) difundir a doutrina Espírita Umbandista e dos Cultos Afro-
Brasileiros de acordo com a leis vigentes e as autoridades constituídas; b) presta
Assistência Social aos seus sucessores; c) conceder Auxilio Funeral aos seus sócios;
d) prestar conforto espiritual aos que nele necessitarem; e) promover a defesa dos
interesses dos seus associados, concorrendo igualmente para que haja maior UNIÃO,
DISCIPLINA, ORDEM e RESPEITO nos Centros de Trabalho; f) outro benefícios
constantes do Regimento Interno, a critério de sua Diretoria.
Com isso percebemos a diferença que há entre as participações nesse período ficou
marcante essa participação direta. No Congresso houve varias secções para haver uma ampla
discussão nos vários setores da cidade.
Logo percebemos que população esta na ativa, participando de todo o processo para
melhorada cidade. Assim os povos tradicionais do terreiro se afirmaram nesse período e se
inicia a política do afrorreligiosos a partir desses eventos na gestão de Edmilson Rodrigues e
hoje em 2012 volta a se candidatar a Prefeito e com isso os afros dão apoio a sua candidatura.
A partir das entrevistas podemos observa que a associação ainda não está legalizada, não
possui CNPJ. Ao perguntar para a Mãe O que levou a senhora fazer tudo isso na
associação? Obtive a seguinte resposta:
“Eu sempre tive esse espírito de humanidade de querer ajudas às pessoas; eu tenho
trabalhado também com deficiente, tetraplégico; eu redivido as cestas, e contemplo essas
pessoas; eu não trabalho só a minha comunidade do bairro, é em Outeiro, Pratinha, Jurunas,
Cremação; associação não é só essa parte religiosa; é você poder ajudar o ser humano, então
passei a trabalhar e lutei muito para conseguir estas cestas, foi 2,3 dias de trabalho andando
2
Neste elemento deve ser destacado que a única casa afrorreligiosa em Belém que anda juntamente com o
Movimento Negro, diga de passagem, CEDENPA (Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará) que tem uma
forte ligação é o Ilé Axé Iya Omi Ofa Karé liderado pelo candomblecista Ketu Edson Catendê.
por que isso foi um encontro feito da rede de saúde dos terreiros que aconteceu aqui no
Beira-Rio, e veio o ogãn que é secretario de igualdade racial, e perguntou para nós, se o
Pará, já recebi cesta básica. Então dissemos que não, então mandei urgente fazer uma
pesquisa em Belém, e mandar o nome das pessoas necessitadas, para o governo federal. Fui
bater de casa em casa, para saber onde estava os afro-religiosos. Após a pesquisa de três
meses depois veio a cesta; mais para 1000 pessoas, vai pra o INTERCAB, e depois de divide
para casa terreiro. Ficou na casa da mame'to Nangetu. E é um trabalho gratificante porque
você sabe que vai matar a fome de algumas pessoas. Ano passado veio 6 a 8 vezes ao ano;
sempre 50 cestas, este ano já veio três vezes. Agora eu tenho muita vontade de tirar esses
documento e avançar mais para ajudar mais minha comunidade.”
Atividades proposto pela ICBAN: Café da manhã com palestras sobre a Lei Maria da
Penha; Cineclubes; Distribuição de cesta básica; Palestras sobre violência, drogas, DST’s,
AIDS; Distribuição de preservativos, café da manhã para os Dias das Mães com palestras, e
sorteio de cestas básicas.
Mame’tu Bethi participou de vários de eventos ao longo do ano de 2012 como:
Conferencia Nacional de Cultura; Encontro Nacional no Rio de Janeiro sobre Diversidade
Cultural; Oficina de Construção de Projetos, no estado do Maranhão; Congresso Nacional da
Cartografia Social em Manaus e Conferencia das Mulheres.
A ICBAN recebe apoio do Instituto Nangetu (Instituto Nangetu de Tradição Afro-
religiosa e Desenvolvimento Social) por meio do empréstimo de materiais como: data show e
caixa amplificada de som, usados nas reuniões de Cine Clube.
Considerações
Indaga-me qual é a necessidade do ser humano se afirmar? Que identidade é essa tão
fluxa tão plástica? Onde esta a legitimidade? Como se dá essa relação intrínseca entre religião
e política? A partir dessas indagações podemos concluir que pensar nas religiões de matrizes
africanas é perceber primeiramente que buscam um espaço legitimo de ordem. Segundo que
podemos afirmar a partir desse analise que religião é política, pois religião é poder.
Com tudo no Brasil essas religiões que um dia foi perseguido dentro de um padrão, legal
hoje se encontram em seu dever prático e legal, dentro das normas que regem a conduta
política do ser humano.
Fazer política é também fazer religião, pois esses dois sistemas equivalem para a
formação dos processos infinitos de relações de poder.
Os sacerdotes exemplifiquem esse campo onde há uma corrida de levantamento da
Bandeira do Tempo, bandeira representa toda a identificação da religião e de sua Casa, pois o
que esta em jogo é sua Comunidade.
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Autores:
Fabiane Malato
RESUMO: O Grupo de Estudos de Religiões de Matriz Africana tem como objetivo conhecer
e promover a aplicação da lei 10 639/03, que trata da obrigatoriedade do estudo e do ensino
da história e da cultura africana nos currículos escolares, oferecendo aos graduandos e pós-
graduandos em Ciências da Religião conhecimentos suficientes para a discussão e o ensino
dessa matriz religiosa em sala de aula. A partir do tripé: ensino, pesquisa e extensão,
desenvolve quatro ações permanentes, dentre elas o O Cine Vai à Escola, que surgiu em
2012 como um desdobramento do projeto de extensão “Cine Africanidade” acreditando ser a
sala de aula o espaço em potencial para o fomento da cultura do diálogo. Seu objetivo é fazer
do cinema e da ludicidade mecanismo metodológico para percorrer as escolas públicas e
particulares da capital e do interior do estado do Pará na árdua batalha de combate a
intolerância religiosa. Sua equipe, composta por alunos e professores de antropologia e
ciências da religião que professam diversos credos desenvolve palestras com estudantes, pais
e responsáveis, e formação para professores e técnicos.
Este trabalho visa apresentar o projeto Cine vai à escola, sua metodologia e as atividades
realizadas com o propósito de combater o preconceito, desconstruindo o imaginário existente
no que diz respeito às religiões de matriz africana e de promover a cultura de paz.
CONQUISTAS E FRAGILIDADES DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA DISCIPLINA
ENSINO RELIGIOSO DO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
NA UEPA
RESUMO
________________________
1-
Mestre em Educação na Linha Formação de Professores. Especialista em Docência do Ensino Superior.
Pedagoga. Professora do Departamento de Educação Geral da Universidade do Estado do Pará,
disciplinas Estágio Supervisionado I e II em Ciências da Religião, e Estágio Supervisionado em
Instituições Não Escolares e Ambientes Populares no curso de Pedagogia.
E-mail: edinafialho@yahoo.com.br
DIÁLOGOS PRELIMINARES
Então a educação deve atender as necessidades humanas, já que sua finalidade primeira é
realizar o processo de humanização dos sujeitos. Como os estágios se desenvolvem em espaços
educativos que por natureza são plurais, ele se dá por meio da relação entre pessoas, pois,
educadores e educandos são sujeitos, seres humanos em processo, os quais estabelecem relações
entre si, com o meio em que vivem e com elas se auto - constroem, por isso, o momento do estágio
é importante para estabelecer novas relações, afinal, afirma Freire, (2005, p. 63).
Não há outro caminho senão o da prática de uma pedagogia humanizadora, em
que a liderança revolucionária, em lugar de se sobrepor aos oprimidos e continuar
mantendo-os como quase “coisas”, com eles estabelece uma relação dialógica
permanente.
É preciso refletir algumas posturas no estágio, ás vezes, são professores formadores que
tratam os alunos estagiários e até os educadores dos ambientes de estágios, de forma arrogante,
autoritária e desdenhosa, ignorando que o seu papel é de orientador e formador acadêmico dos
sujeitos. Pimenta e Anastasiou (2005, p.16) acreditam ”o trabalho docente está impregnado de
intencionalidade, pois, visa à formação humana por meio de conteúdos e habilidades, de
pensamento e ação, o que implica escolhas, valores, compromissos éticos”. O que está ligado a
formação pessoal e profissional dos educadores, e devem ser cultivadas no período do estágio,
quando este proporciona ao estagiário, oportunidade de refletir o papel do professor, como
profissional e pessoa, defendido por Nóvoa, (1995, p. 17)
a maneira como cada um de nós ensina, está diretamente dependente daquilo que
somos como pessoa quando exercemos o ensino. E as opções que cada um de
nós tem se fazer como professor, as quais cruzam, á nossa maneira de ser; com
a nossa maneira de ensinar e desvendam, na nossa maneira de ensinar a nossa
maneira de ser. É impossível separar o eu profissional do eu pessoal.
O trabalho docente é definido por Freire, (2006), como uma “especificidade humana”,
assim, no estágio, em contato direto com diferentes ambientes e sujeitos, o aluno deve saber que
sua tarefa é humana e humanizadora, embora, nem sempre isso seja possível, pois, as relações nos
ambientes de trabalho nem sempre são favoráveis, as vezes são desgastantes, somados ao pouco
tempo do estagiário com os sujeitos nos campos de estágios, causando “estranhamento” entre
estagiários e os educadores desses ambientes, os quais têm dificuldades para aceitar a presença do
estagiário em seu ambiente de trabalho, como se este, fosse um “invasor em seu território”.
Todavia, propõe Freire, (1996, p. 65) “a prática docente especificamente humana, é
profundamente formadora, por isso, ética. Se não se pode esperar de seus agentes que sejam santos
ou anjos, pode-se e deve-se deles exigir seriedade e retidão”. O que exige dos estagiários e de seus
professores formadores, posturas mais responsáveis, éticas, humildes, e de abertura ao diálogo
com os diferentes sujeitos dos ambientes nos quais os estágios se realizam, somente assim ele
cumprirá a sua função humnaizadora.
2- É possível formar um Professor reflexivo e pesquisador por meio do estágio
O estágio deve pautar-se pela reflexão e investigação da realidade, pois tem a tarefa de
realizar a integração das teorias com as práticas educativas dos ambientes educativos. Ao refletir
sobre as práticas, o educador desenvolve a observação e a percepção, que são fundamentais no
processo de formação do professor pesquisador. Reflexão no sentido de promover os saberes da
experiência relacionados com a teoria, como comenta Nóvoa, (2005, p. 65): “A pesquisa em
educação precisa atuar para fortalecer esse caráter do trabalho do professor, que anda
enfraquecido”. E o estágio pode contribuir nessa efetivação e evitar esse enfraquecimento.
Enfraquecimento, que não pode ser aceito como definitivo e nem ser ignorado. É preciso
reconhecer que ainda falta para devolver ao professor, o reconhecimento e a valorização de seu
fazer. É preciso refletir, investigar seus dilemas e possibilidades, e delinear novas posturas.
Pimenta e Lima, (2010, p. 236) defendem que: “a pesquisa no estágio como método de formação
dos estagiários, futuros professores, se traduz pela mobilização de investigações que permitam a
ampliação e análise dos contextos onde os estágios se realizam”.
Investigar a realidade pressupõe uma prática orientada para a formação em pesquisa, a
qual exerce um papel extraordinário na articulação entre conhecimento acadêmico conceitual, e
prática profissional, a qual se efetiva pela ação reflexiva e intencional do professor. E para fletir e
investigar as práticas educativas, precisa-se delinear de um novo educador, que articule os
conhecimentos acadêmicos com as experiências dos sujeitos nos ambientes de estágios, para
refletir e ampliar seu olhar de investigador. Contudo, esse olhar, deve ser esperançoso e identificar
possibilidades para que as práticas sejam transformadas e transformadoras e tornem o trabalho
pedagógico mais significativo. Barreira e Gibran, ( 2005, p. 87), defendem a ideia de prática de
ensino e estágio, como:
A prática de ensino e o estágio curricular são elementos aglutinadores na
formação de professores. São considerados modos de fazer docente, são
construídos pelas ações e práticas num processo engenhoso de ir e vir, que
demanda reflexão, construção e embate com a realidade social, educacional e
escolar, e entendimento de como nos tornamos professores.
A concepção de Estágio como elemento formador, reafirma a minha convicção de que ele
é apropriado para que o futuro professor, ou gestor, reflita sobre as possibilidades e dificuldades
da profissão, bem como, das competências, habilidades e atribuições inerentes a docência, além de
propiciar-lhe condições de descobrir se tem identidade com a profissão.
Assim, o estágio deve ser oportunidade de rever nossas práticas como sujeitos capazes de
quebrar paradigmas, de recomeçar, de não compactuar com a crise de valores éticos, e com a
mesmice castradora de projetos significativos. Nessa concepção, Barreira e Gebran, (2005, p. 91)
defendem que: “O estágio deve contemplar a formação do professor capaz de atender às demandas
de uma realidade que se faz nova e diferente a cada dia”.
Portanto, no estágio como tempo de ampliação e produção de novos conhecimentos e
saberes, os professores orientadores devem incentivar os alunos a terem atitude investigativa sobre
as práticas nos estágios, e a de seus professores, buscar nelas, inspiração para vivenciar os
conteúdos conceituais adquiridos na academia, fazendo a relação entre os conteúdos
procedimentais, e atitudinais dos sujeitos no campo de estágio, como defende Pimenta, (2011, p.
44).
dada a natureza do trabalho docente, que é ensinar como contribuição ao processo
de humanização dos alunos historicamente situados, espera-se da licenciatura que
desenvolva nos alunos conhecimentos e habilidades, atitudes e valores que lhes
possibilitem permanentemente irem construindo seus saberes-fazeres docentes a
partir das necessidades e desafios que o ensino como prática social lhes coloca o
cotidiano.
O ser humano precisa estabelecer relações com outros humanos, é a partir delas, que ele
desenvolve seu processo humanizador e garante a sua sobrevivência. Machado, (2007), defende a
ideia de que “a finalidade da educação é realizar o processo de humanização do homem, tirá-lo de
seu estado de natureza pura, biológica e levá-lo, a um estágio mais avançado e humanizado”.
O contraria o modelo de Ensino Religioso Catequético, baseado no tradicionalismo,
proselitismo e intolerância e na concepção de educação dogmática e bancária, que para Freire, “
embrutece, desumaniza e não permite ao homem ser sujeito de sua aprendizagem”, pois não
oportuniza a convivência respeitosa com o diferente e suas diferenças. Muitas instituições
educacionais se dizem abertas a convivência com a diversidade, e parecem politicamente corretas
ao aceitar oficialmente a matrícula de “diferentes”, no entanto, os ignoram como sujeitos de
direitos, como se observa em Skilliar, ( 2003;p.38).
Onde fica o outro irredutível, misterioso, inominável, nem incluído, nem
excluído, que não é regido pela nossa autorização, nem pelo nosso respeito, nem
por nossa tolerância, nem pelo nosso reconhecimento para ser aquilo que já é e/
ou aquilo que está sendo e/ ou aquilo que poderá ser?.
O estágio evidencia uma realidade que precisa ser modificada na docência da disciplina
Ensino Religioso escolar, pois, da maneira como vêm sendo trabalhada, não está cumprindo o seu
papel social, político e pedagógico na formação das pessoas, na convivência respeitosa com a
diversidade e na promoção do diálogo inter-religioso com os diferentes credos. Ao contrário, existe
uma dicotomia entre as recomendações teóricas e a legislação sobre as suas finalidades e com a
postura de proselitismo e dogmatismo dos que a ministram, o que gera confusão nas interpretações
dos alunos e até práticas de discriminação religiosa.
Todavia, temos que comemorar significativas conquistas nesse campo, pois alguns
professores já começam a quebrar esta lógica perversa, e trabalham a disciplina como deve ser: um
canal de reflexão sobre a pluralidade e liberdade religiosa, bem como instrumento formador de um
ser humano mais ético, crítico, defensor, cumpridor e beneficiário da garantia dos direitos humanos
e do exercício da cidadania de homens e mulheres mais humanizados.
REFLEXÕES SOBRE OS ESTÁGIOS DE CIÊNCIAS DA RELIGIÃO NA UEPA
Nessa direção, muitas iniciativas positivas têm sido realizadas pelos professores de
estágio, os quais, vêm tentado melhorar esta disciplina, e propõem a realização de projetos pelos
alunos nas escolas em que estagiam, na busca de qualificar o ensino e as relações estabelecidas
entre a comunidade escolar desses ambientes. Existem também, os projetos desenvolvidos pelos
alunos e professores, os quais são convidados para ministrar cursos, palestras e oficinas nessas
escolas e instituições, como contribuição a formação de seus educandos e educadores, bem como,
em retribuição a acolhida.
Em 2011, fizemos a “Socialização em sala de aula, das experiências vividas pelos alunos
nos campos de estágios”. Em 2012 esta atividade foi mais expressiva, e ganhou respaldo entre os
colegas de turma, porque foi um momento rico de aprendizagem coletiva, porém, carece de maior
organização, mas vêm se qualificando cada vez mais, especialmente como aconteceu no final deste
semestre na turma da tarde, a qual demonstrou competência pedagógica, técnica, teórica, política, e
conceitual, o que nos leva a propor para o ano de 2014 a “I Mostra de Experiências em Estágio
dos alunos do curso de Ciências da Religião”, considerando a sua validade, importância, e
contribuições para a formação dos alunos e da melhoria do processo ensino-aprendizagem na
disciplina de Ensino Religioso nas escolas.
CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS
Na tessitura deste estudo bibliográfico que versa sobre o estágio como elemento basilar na
formação do professor, em especial no curso de Ciências da Religião, na Universidade do Estado do
Pará, no qual realizei um estudo de caso por meio da análise das experiências desenvolvidas nas
disciplinas de Prática de Ensino I e II, comparando-as com as referências teóricos que amparam o
estudo e sustentam as minhas convicções da importância do estágio como elemento destacado na
formação do educador, além de apontar dificuldades, lacunas, e também as conquistas ainda
existentes nos estágios desenvolvidos no curso de Licenciatura em Ciências da Religião.
Nessa perspectiva, é possível afirmar que o trabalho conseguiu evidenciar o quanto os
estágios são importantes no processo de formação do educador, a partir de alguns aspectos
levantados pela pesquisa neste texto, tais como:
1- O Estágio pode ampliar o conhecimento a respeito do ser humano: Os alunos relatam que
por meio do estágio, passam a compreender melhor o ser humano, a partir do convívio nos
ambientes de estágios, considerando que eles se desenvolvem na relação entre as pessoas, e
dentro de um espaço de vivências reais dos sujeitos que se comunicam, se revelam, e nos
desvelam, se assim permitirmos, e criarmos oportunidades para tanto. Portanto, os campos de
estágio têm oportunizado aos alunos e professores de Ciências da Religião na UEPA, condições
reais de ampliar o conhecimento a respeito do ser humano, e de melhor compreendê-lo, além de
nos motivar a rever conceitos, mudar posturas e crescer profissional e humanamente.
1- É preciso fazer revisão no PPP do curso de Ciências da Religião na UEPA: Porque a carga
horária, e a organização curricular das disciplinas de estágios no curso, precisam ser
redimensionadas em especial o de Prática I, para melhorar o seu desenvolvimento, e melhor
atender as necessidades formativas do curso, pois, da maneira como vem acontecendo não
permite ao estagiário cumpri-lo verdadeiramente, considerando a carência de campo de estágio.
2- Ampliar os convênios para Estágio: apesar de já existirem alguns espaços que recebem os
alunos, ainda se tem sérios problemas para conseguir espaços; normalmente, se consegue mais
pelas articulações e prestígio pessoais dos professores, do que pela força dos convênios feitos
pela universidade e pela coordenação dos estágios, situação que precisa se tornar profissional e
institucional, até porque, são poucas as escolas que recebem os alunos, como reclamam os
mesmos e criticam os professores de estágio, entre os quais eu me incluo.
3- Poucos professores para acompanhar a turma no campo de estágio: Essa situação fere aos
princípios, finalidades e responsabilidades do estágio como elemento formador sob a supervisão
e orientação de um professor formador da instituição, pois, é humanamente impossível que
esses professores deem conta de acompanhar todos os alunos ao campo de estágio, dificulta até
mesmo o contato para estabelecer o convênio com as escolas, considerando o número de aluno
que é muito superior ás condições de acompanhamento dos professores, já que os estágios
acontecem em um único dia da semana e no mesmo horário para todos os alunos da turma;
dessa maneira, os mesmos ficam quase sempre desassistidos por parte dos professores, não por
irresponsabilidade desses, mas por imposição da estrutura curricular e da política adotada pelo
Curso e pela instituição formadora que não permite aos professores acompanharem como
deveria ser os estagiários ao seu campo de estágio. Portanto, sugerimos que urgentemente esta
questão seja revista e modificada na UEPA.
6- A disciplina de Ensino Religioso nas escolas ainda tem problemas: Consequência de vários
fatores, sendo o principal deles a questão da formação docente, já que a maioria esmagadora dos
professores não possui formação para ministrar esta disciplina, e desconhecem as suas
finalidades e princípios epistemológicos, axiológicos, e pedagógicos da mesma, o que gera um
outro problema que é a questão do proselitismo fortemente presente nas práticas dos docentes
em salas de aulas, dificultando assim, a convivência, o respeito, e o diálogo inter-religioso com
as diferentes manifestações da religiosidade presente nesses contextos.
Não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas para transformá-lo,
se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto do mundo, devo
usar toda possibilidade que tenho para não apenas falar de minha utopia, mas
para participar de práticas com ela coerentes.
A presente afirmação indica que se temos sonhos e utopias a realizar, temos também um
compromisso profissional com a mudança, todavia, essa mudança só se efetivará, se nós a
construirmos e, construí-la não é tarefa fácil, exige investimento pessoal, vontade política e
condições apropriadas para fazê-lo, o que ainda estamos buscando construir na realização das duas
disciplinas de estágios, com as quais trabalhamos no curso e nas demais licenciaturas, assim como
defendem, Pimenta e Lima, (2011, p. 127).
Desça forma, o estágio passa a ser um exemplo vivo da prática docente e o
professor-aluno terá muito a dizer, a ensinar, a expressar sua realidade e a de seus
colegas de profissão, de seus alunos, que nesse mesmo tempo histórico vivenciam
os mesmos desafios e as mesmas crises na escola e na sociedade.
Em consonância com as autoras, minha reflexão sobre a importância desta pesquisa é que
ela seja provocadora de intervenção positiva nas práticas vividas nos estágio e na formação dos
professores de Ciências da Religião na UEPA. Tenho consciência de que ainda tenho muito para
rever neste trabalho, mas que ele já é instrumento para iniciar a reflexão e as mudanças necessárias
nos estágios, os quais agora também se iniciam nas turmas do Programa Nacional de Formação de
Professores – PARFOR, e esperamos que possam trazer ricas contribuições para a formação dos
alunos-professores. Como aprendiz no campo da educação, faço deste trabalho uma oportunidade
de reflexão e melhorias, tarefa a qual me dedico, por compreender a educação como oportunidade
de formar consciência, e contribuir para que as pessoas sejam de fato cidadãs, o que é possível, por
meio da formação do educador, e acredito que o estágio é um elemento definidor dessa formação.
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RESUMO
Este artigo realiza o diálogo entre as categorias teóricas: corpo, ancestralidade e candomblé diante dos estudos
realizados para o desenvolvimento da dissertação de mestrado em Ciências da Religião, UEPA. O universo da
investigação situa-se no espaço da Nação Jeje Savalu como uma nação recente no cenário amazônico que nasce
em Belém através dos contatos com sacerdotes de Salvador, como de praxe no percurso de Candomblé na
Amazônia. O tratamento teórico está alinhado à etnografia que constituirá a linha teórico-metodológica da
pesquisa, com foco para a história oral. Destaca-se o elemento ancestralidade delineada pelo ethos religioso
reservados a espiritualidade dos indivíduos que se agrupam na Nação Jeje em seus culto às divindades e na
expressão do corpo/ritual. A priori, compreende-se que a sacralização ocorre simbolicamente no próprio corpo
do sacerdote, a partir dos ritos que ele realiza. O estudo das categorias teóricas mencionadas, auxiliam na
elucidação do sentido de sacralidade do corpo para o rodante Jeje a partir de suas memórias orais, assim como,
permite a análise das formas que o rodante sente o sagrado, seus ritos e símbolos. Portanto, a necessidade de
estabelecer um olhar sensível para o contexto da região amazônica, visto que naturalmente vivemos em um
espaço privilegiado pelo universo mítico e pela pluralidade de religiões que se ligam a ele numa dimensão
identitária.
Chave: Ancestralidade, Candomblé, Corpo e Amazônia.
ABSTRACT
This article presents the dialogue between theoretical categories: body, ancestry and Candomblé on the studies
on the development of the dissertation in Religious Sciences, UEPA. The universe of the research lies in the
Nation Jeje Savalu space as a recent nation in the Amazon scenario that is born in Bethlehem through contacts
with priests of Salvador, as usual in the course of Candomblé in the Amazon. The theoretical treatment is aligned
to ethnography that constitute the theoretical and methodological approach of the research, with focus on oral
history. Noteworthy is the ancestral element Reserved religious ethos outlined by the spirituality of individuals
that gather in the Nation Jeje in their worship of deities and body expression / ritual. A priori, it is understood
that the sacralization occurs symbolically in the priest's own body, from the rites he performs. The theoretical
study of the mentioned categories help to elucidate the sense of the sacredness of the body to the undercarriage
Jeje from their oral memories, as well as allow the analysis of the ways that the undercarriage feel the sacred
rites and symbols. Therefore, the need to establish a sensitive look at the context of the Amazon, since naturally
live in a privileged space for the mythical universe and the plurality of religions that bind an identity dimension
to it.
Introdução
1
Funderê: refere-se a casa na nação jeje savalu.
constitutivos de suas expressões e experiência religiosa”. Posso dizer que ela é a metodologia
desta pesquisa, que conta com o auxílio da etnografia.
O Campo de Pesquisa no Brasil
Para conhecer o campo ao qual pretendo me debruçar e para conhecer a produção acadêmica
que promove a interface corpo, sagrado e religião, realizei um levantamento de pesquisas no
Brasil que versam sobre o tema de meu estudo. Como parâmetro temporal, minha orientadora
e eu definimos os três últimos anos, de 2011 a 2013. Surpreendentemente, não encontrei
pesquisas que discorressem sobre o mesmo tema.
No entanto, algumas apontavam algumas categorias como corpo, ou similares, corporeidade.
Percebi, ainda que a área das Ciências da Religião no Brasil ainda possui uma demanda
imensa de pesquisas sobre cristianismo, marcando a forte influência da Teologia.
Esse fato me impulsionou mais ainda a me atirar sobre a minha pesquisa, que não vai procurar
entender algo novo, mas algo pertinente tanto para o candomblé quanto para a própria Ciência
da Religião.
Campo afrorreligioso na Amazônia
A ciência avança há séculos em oposição à existência do sagrado. Luta para vencer as
imprevisíveis ações da natureza. Teme sua fragilidade diante dela. A Amazônia é um lugar no
mundo que se mantém viva, com diversidade de espécies, possui uma diversificada influência
cultural cruzadas com a cultura indígena, impregnada de forte religiosidade. Este espaço,
geográfico e cultural, não se permitiu afastar-se completamente da fauna, da flora e da fé.
Desde o século XVII, segundo Vicente Salles (1969), há registro da chegada de médicos, que
tratavam os pacientes com remédios aprendidos com indígenas. Mais tarde com a presença do
negro, descoberta nos documentos históricos, percebemos a utilização de processos similares
de tratamento de negros e índios.
Com o passar do tempo, o que pertencia à sabedoria religiosa do interior fez romaria para os
centros urbanos, banhando moradores de sagrados remédios, penas, maracás, tambores,
tecidos, ervas, que continuam a resolver problemas de saúde. O que explicaria tamanha
afeição aos segredos religiosos? Talvez o fato de estar à margem do rio, dentro da floresta,
mesmo com grandes diferenças de forma de viver dos que moram protegidos pelas copas das
árvores, ainda sente-se o mana deste lugar.
Não havia registro de africanos e descendentes na região Amazônica, sua religiosidade,
cultura, e tecnologia estavam imersas no cotidiano, mas invisíveis em documentos. Somente
com a caravana de cultura popular de Mário de Andrade que a cultura negra foi promovida a
existência no norte do país.
Nos documentos analisados por Arthur Ramos, sucessor de Nina Rodrigues em pesquisa
africanista, mostra tentativa de documentação de negros nos estados do país e aponta que no
Maranhão no século XIX a população de negros era de 66,6% superando a população de
brancos. Com a proximidade do Maranhão com o Pará, apresenta-se uma possibilidade de
introdução de negros pelas fronteiras do estado vizinho. Embora, haja ainda possibilidades de
entrada pelo arquipélago do Marajó, com negros trazidos da região que atualmente é Bissau,
Munanga (2009).
A aproximação com o Maranhão se deu no campo religioso com a chegada de maranhenses a
Belém que trouxeram o Tambor de Mina, religião que cultua voduns de origem Nigeriana, e
ainda aos caboclos e santos católicos. A Mina, como é costumeiramente chamada,
consolidou-se em Belém e dela saiu a primeira pessoa iniciada no candomblé. Astianax, mas
conhecido como Prego ou Pai Prego, foi iniciado na nação Angola em Salvador, mas não deu
continuidade a religião, prosseguindo somente no Tambor de Mina (Campelo, 2000).
O campo da religião candomblé em Belém é formado com as sucessivas idas de praticantes
dos cultos como pena e maracá á Salvador e a vinda de sacerdotes de Salvador para Belém
que adentraram num universo auspicioso à prática do candomblé pela similaridade da forma
de contado com o sagrado, como o transe2.
O aprendizado no candomblé ocorre através da vivência das práticas litúrgicas da religião,
transmitidos pelos mais velhos, pois eles são os guardiões do saber da religião que não se
aparta do saber da roda da vida. A condução do terreiro, o repasse da tradição passa pelo
ensinamento do corpo das formas de comportamento e vai até os ritos mais secretos.
Como os iniciados em Belém tiveram pouco contato direto com a linhagem familiar religiosa,
causando sensações de desapego às ordens religiosas, que se apresentam com certa ortodoxia.
A dificuldade de acesso às tradições abriu um campo amplo para o surgimento de novas
tradições, ou seja, os sacerdotes formaram sua própria maneira de realizar os rituais. Desse
2
Abro um adendo para me posicionar diante da categoria transe. Neste artigo não utilizarei o termo, pois opto
em tratar como a chegada do sagrado.
modo, pode-se dizer que o candomblé de Belém, cidade muito influente dentro da Amazônia,
possui uma estrutura ritual que se diferencia de Salvador, pois não possui fidedignidade às
tradições de linhagem familiar religiosa como pede as convenções no candomblé.
Com base em outros estudos realizados sobre o candomblé em Belém é possível afirmar que
as casas-referência, que são aquelas casas fundadas pelos primeiros iniciados na religião, não
possui um vínculo com a casa a qual foram iniciados em Salvador, a não ser a memória da
iniciação e das demais obrigações3 dos sacerdotes.
A nação Jeje Savalu aparece em Belém através dos contatos com sacerdotes de Salvador,
como de praxe no percurso de Candomblé na Amazônia. Essa nação apresenta uma questão
relevante, pois os Jeje foram os povos que chegaram primeiro na diáspora africana, tendo seus
saberes agregados às tradições de origem Iorubana, e foi tida como morta.
No Brasil fixaram-se várias etnias africanas como os jeje, fon, bantos e iorubanos que
estruturaram cada um a seu modo, processos ritualísticos que modelam as diferenças, ou seja,
essas etnias possuíam ritualísticas diferentes dentro da religião candomblé. No entanto, com a
última remessa de escravos que chegaram ao Brasil no século XIX, houve maior registro da
cultura iorubana, fortemente expressa nas comidas, linguagem e mitologia. Algumas nações
passaram a beber na fonte iorubana. Embora alguns pesquisadores nos apontarem para o fluxo
de informações entre iorubanos e os jejes ainda em território africano, devido aos fluxos
migratórios naquele lugar no século VII e XVI.
O termo Jeje, segundo Parés (2007) é uma denominação metaétnica designada a uma etnia
minoritária, que com o aumento de outras etnias na área, onde atualmente é a cidade do Porto
Novo, transformou-se em denominação de um grupo de pluralidade.
A nação Jeje Savalu surge em Belém pelas mãos de Carlos Bottas, mais conhecido como Pai
Carlinhos da Oxum. Este sacerdote revelou ao pesquisador o diferencial litúrgico da nação
Jeje Savalu . Eduardo Vega (2013) descreve o ciclo litúrgico da nação:
Podemos listar, por exemplo, cânticos; as rezas, o uso de vestimentas como o devó
(vestes rituais do processo de iniciação); o uso de ileké em suas diversas cores e
tipos; os nomes e epônimos de voduns como ako Bessén; seminu nanã; iroko azaká;
ewa silé; a designação de objetos, coisas e pessoas, além de espaços sagrados e de
rituais; o uso do torso, após o período de recolhimento nas romarias; sacrifícios de
alguns animais que não são utilizados em outras nações como, por exemplo, o
oferecimento de cágados na matança ritual de iniciação de qualquer iaô;
peculiaridades do processo iniciático, incluindo o tempo de recolhimento, o período
de resguardo, a sequência e os tipos de ebós propiciatórios para a iniciação e demais
3
Obrigações: é o termo utilizado pelos candomblecistas quando renovam seu contato cíclico com o sagrado.
obrigações. Por exemplo, os mesmos ebós realizados na iniciação, no total de sete,
são repetidos nas obrigações de três, sete, catorze e vinte e um anos; na iniciação é
realizado um ebó chamado dankó (ebó para saúde); usa-se também o kelé por
dezesseis dias no período de obrigação individual; e os iniciados são proibidos de
atravessar ou se banhar no mar por um período de um ano. (EDUARDO VEGA,
2013)
Desse modo, os voduns são organizados de acordo com o sistema familiar genealógico. O
mais velho do clã é o mais respeitado, ao morrer recebe ritos fúnebres, passa a receber
também oferendas, até um dia chegar à condição de vodun, possui maiores poderes de restituir
a vida social dos vivos, os livrando dos infortúnios como a pobreza, a doença, a morte.
Os cultos reconstituídos no Brasil também foram reestruturados dentro do sistema
genealógico, onde somente pessoas da família biológica eram iniciadas e conheciam os
mistérios dos cultos ancestrais, somente homens e mulheres negros reuniam-se dentro dos
ritos. Atualmente, não é diferente, para ser iniciado na religião, dizem os antigos e teólogos da
religião, tem que ter ancestralidade.
A religião candomblé é um centro de vivência da cultura africana, sobretudo da áfrica negra,
os deuses nela cultuados, são ancestrais divinizados. A ancestralidade é um vínculo
genealógico, logo a morfologia do corpo, fenótipo e memória étnica marcam seu território, o
corpo.
Corpo e ritual
Cabe a esta altura tratar da categoria corpo, na tentativa de entender as possíveis contradições
na sociedade moderna frente ao conceito de corpo, sua compreensão, a forma social e cultural
a qual este é tratado. Como perceber o afastamento deste corpo, marca de individualidade.
Rodrigues (1986) contribui neste artigo com as análises culturais sobre essa estrutura, o
corpo. Para ampliar o nosso olhar sobre o objeto corpo, o autor recorre a estudos sobre a
cultura, seus impactos sobre o inconsciente e consciente, sobre a moral, sobre a ética, sobre o
sagrado e o profano. Mostrando que as regras de uma sociedade determinam de forma
inconsciente pensamentos e formas de relacionar-se com outros e com a natureza. Para este
autor o corpo humano é socialmente concebido, e sua representação social possibilita acessar
a estrutura de uma sociedade particular.
Le Breton (2013) analisa em sua obra a Antropologia do Corpo, o corpo como objeto e ser.
Tece uma crítica diante da promoção do distanciamento do corpo a partir dos filósofos.
Levanta modos de expressão do corpo em várias sociedades, ensinando-nos como a
individuação afasta o ser humano de si mesmo. Ao citar o exemplo da sociedade canaques
diz:
O corpo (karo) é qui confundido com o mundo, ele não é suporte ou prova
de individualidade, porquanto esta não está fixada, uma vez que a pessoa
repousa sobre os fundamentos que o tornam permeável a todos os eflúvios
do meio ambiente. O “corpo” não é fronteira, átomo, mas elemento
indiscernível de um todo simbólico. Não existe aspereza entre a carne do
homem e a carne do mundo. (LE BRETON p.31)
Nesta citação é possível perceber que as sociedades mais isoladas mantém uma visão de
completude, em que o corpo pertence ao universo e o universo o pertence em uma relação de
coexistência e de explicação, onde do mundo retira-se a o entendimento que o ser humano
tem sobre si. A exemplo mais uma vez o autor que identificou que entre os canaques o “corpo
recebe características do reino vegetal. Parcela não destacada do universo, que o banha, ele
entrelaça a sua existência, às árvores, aos frutos, as plantas. [...] Kara designa aos mesmo
tempo a pele do homem e a casca da árvore.”(LE BRETON, 2013)
Martins (2003) apresenta uma possibilidade de entendimento sobre a categoria corpo, “Todas
as realizações, sonhos, criações, emoções, acontecem inequivocamente no corpo. Por isso,
buscar entendê-lo é buscar entender a existência”. Logo, é confortável dizer que o corpo é um
ser, que constrói experiências próprias com seu universo, com pessoas animais, árvores,
coisas em geral. Ou seja, não se tem um corpo, se é um corpo. Somente nele ocorrem as
diversas representações no mundo.
Sem a existência de um corpo não há vida, somente morte. A agourenta morte, que não se tem
explicação, mas que no campo das representações sociais é possível descrever o medo sentido
pelo ser humano diante desse fato. Não há forças contra a morte, ela enfrenta homens e
mulheres, sem temor, manda e desmanda e nada podemos fazer. Ela é a dura face da
fragilidade humana. Várias religiões lutam contra a morte.
Considerações Finais
Esta pesquisa almeja conhecer o sentido do sagrado para os rodantes no candomblé da
tradição Jeje Savalu, que se constitui como uma nação antiga para a história da diáspora,
sendo esta uma das primeiras etnias escravizadas a chegarem ao Brasil. Por isso se mostra
resignificada no espaço amazônico em virtude das muitas alterações ocorridas em decorrência
do tempo.
A pesquisa pretende ainda compreender as concepções de religião, de sagrado, de corpo
dentro do candomblé, religião vivida, fortemente, a tradição no corpo. Corpo este que fora do
ambiente religioso vive a modernidade e todas as outras influências que a cultura da região
proporciona. Entender esta complexidade contextualizada é compreender o ser humano que se
faz corpo, tornando-se a própria expressão do sagrado para cientista, sendo o sagrado para os
viventes da tradição, neófitos e sacerdotes da religião.
Tentar alcançar o olhar de si e do sagrado no candomblé possui um sentido de ampliar a lente
a importância dessa identidade religiosa na Amazônia, aprofundando seus aspectos históricos,
as redes sociais, os aspectos culturais, e, sobretudo o religioso, ainda pouco informado, e
pouco compreendido socialmente. Essa pesquisa, talvez, dê a oportunidade de seus adeptos
enxergarem a sua própria história de vida com a devida importância para o seguimento
religioso ao qual vivem.
Bibliografia
RESUMO: O Grupo de Estudos de Religiões de Matriz Africana tem como objetivo conhecer
e promover a aplicação da lei 10 639/03, que trata da obrigatoriedade do estudo e do ensino
da história e da cultura africana nos currículos escolares, oferecendo aos graduandos e pós-
graduandos em ciências da religião conhecimentos suficientes para a discussão e o ensino
dessa matriz religiosa em sala de aula. A partir do tripé: ensino, pesquisa e extensão,
desenvolve quatro ações permanentes, dentre elas o Projeto Diálogo entre Religiões, que
surgiu em 2014 com o intuito de aproximar a Universidade do Estado do Pará das outras
Instituições de Ensino Superior, estabelecendo um diálogo entre os pesquisadores do Grupo
de Estudos Religiões de Matriz Africana na Amazônia e pesquisadores dos demais fenômenos
religioso. Este trabalho tem por objetivo apresentar o projeto Dialogo entre Religiões e sua
importância para a formação acadêmica dos discentes do curso de Licenciatura Plena em
Ciências da Religião propondo uma discussão sobre a experiência religiosa a partir das
diferentes perspectivas de pesquisa.
ILÈ SÀNGÓ1: Uma análise da estrutura de um Candomblé Keto da cidade Belém.
*Wanderlan Gonçalves do Amaral2
Resumo
O candomblé é a religião de matriz africana mais recente em Belém do Pará, sua
chegada à capital do estado é datada entre o final dos anos 60 e inicio dos 70
(CAMPELO, 2001). A origem das primeiras casas de culto e a história de vida de
seus fundadores foram os títulos dos primeiros trabalhos acadêmicos sobre as três
Nações de Candomblé presentes em Belém (Keto, Angola e Jeje) a partir de 2001.
Toda esta pesquisa ocupou-se apenas da memória, identidade e relações políticas
entre os terreiros candomblecistas da cidade. Neste trabalho proponho uma analise
da estrutura física e ritual do Candomblé originário da Bahia trazido para o Pará por
negros e negras baianos, e por paraenses que migraram do Tambor de Mina para a
religião dos Orixás (LUCA, 2009). Esta analise será feita a partir de um estudo de
caso de uma das principais casas de Candomblé de Belém cujo objetivo visa
identificar as reconfigurações da tradicionalidade baiana ao meio afro-religioso
paraense.
INTRODUÇÃO
1
Casa de Sàngó, orixá da justiça, senhor do fogo.
2
Licenciado em Ciências da Religião pela Universidade do Estado do Pará, aluno do Programa de
Pós Graduação em Ciências da Religião na referida Instituição de Ensino Superior, membro de grupo
de pesquisa Religiões de Matriz Africana na Amazônia – GERMAA, bolsista CAPES.
A história das religiões de matriz africana no Pará e na Amazônia reflete um
panorama bastante diversificado do restante do país. Aqui se desenvolveu um
modelo de religião afro diferente dos demais cultos que se estabeleceram no
restante do Brasil, especificamente na costa atlântica do território brasileiro.
Desafiado por essa lacuna, fui a campo com a proposta de conhecer mais de
perto essa modalidade da tradição afro religiosa brasileira e o modelo de culto
desenvolvido na cidade de Belém, por meio de um estudo de caso do terreiro Ìlé Àsé
Obá Aganju3, casa esta que reclama para si a descendência de um dos mais
tradicionais candomblés baianos o Ìlé Ìyá Omi Àsé Ìyámasé, o terreiro do Gantois.
3
Como forma de preservar a integridade desta pesquisa a partir de agora tanto o nome da casa aqui
estudada, como dos seus lideres e membros, pessoas, grupos e instituições ligadas a ela terão grafia
fictícia.
1. BAIANIDADE, MASCULINIDADE E HOMOAFETIVIDADE: A
ORGANIZAÇÃO DO PODER NO ÌLÉ ÀSÉ OBÁ AGANJÚ
Portanto, mesmo sendo uma religião que ao ser reelaborada no Brasil ganha
um rosto matriarcal, e que em sua origem preservou os homens de exercer o
sacerdócio supremo no culto, destinando esse lugar às mulheres, o Candomblé
agregou em seu seio as pessoas homossexuais, garantindo a elas o direito de
vivenciar sua sexualidade dentro dos seus padrões morais e éticos, se assim posso
dizer, desta religiosidade4.
4
Esse aspecto é característico as primeiras casas de culto fundadas em Salvador, no Pará se
configurou de forma diferente.
Nesse caso, a simbologia da feminilidade ganha um papel bastante amplo,
por tudo que socialmente ela representa, e muito mais ainda no contexto brasileiro.
Por isso, creio que é este aspecto que distingue bastante o papel dos homossexuais
no contexto hierárquico desta religião.
[...] o fato de que as barreiras tenham caído para os homens não derrubam,
porém, o principio fundamental de que somente a feminilidade pode servir
aos deuses. Todos os homens considerados normais na Bahia
continuavam, pois, excluídos. Somente um grupo preenchia os requisitos. O
fato de que constituísse um grupo sujeito à mais rigorosa condenação social
não pesou contra esse princípio básico. Quando se faziam filhos, vinham
eles de entre os homossexuais, que, a despeito do status, eram os únicos
“femininos”. (LANDES, 1967, p. 290).
CARGO FUNÇÃO
Bàbálòrìsà Sumo Sacerdote
Bàbálàsé Aquele que zela pelo àsé
BàbáEgbé Pai da Comunidade
Maé A primeira entre as Ìyároba
Ìyá Kekerê Mãe pequena da casa
Ìyá Ajibonã Mãe criadeira, aquela que cuida dos yaô
durante a iniciação.
Ìyá e BàbáEfun Sacerdotes responsáveis pelas pinturas
rituais corporais durante a iniciação e no
período das obrigações anuais dos
iniciados.
Asogun Sacerdote responsável pelo sacrifício ritual
Osupi Substitui o BàbáEfun em sua ausência.
Ìyágbasse Sacerdotisa responsável pela cozinha
ritual.
Ìyá Singé Auxiliar da Ìyágbasse
Ìyá Teny Sacerdotisa responsável pelas vestes
litúrgicas do terreiro.
Ìyá Oci Sacerdotisa que zela pelo Órìsà Òsóòsì.
Ìyálodé Sacerdotisa da casa de Osùn, nobre
senhora da sociedade.
Ìyá Morô A egbome mais velha das três
sacerdotisas responsáveis pelo ritual do
padê de Èsù.
Ìyá Dagã Uma das três sacerdotias responsáveis
pelo ritual do padê de Èsù.
Sidagã A egbome mais nova dentre as três
sacerdotisasresponsáveis pelo ritual do
padê de Èsù.
ÌyáOdé Sacerdotisa responsável pela casa de
Òsóòsì
Ìyárobá Sacerdotisa responsável por cuidar dos
òrìsà manifestádos.
Bàbá Elemoxô Sacerdote responsável pela casa de
Osàlà.
Ogã Aficodé Um dos sacerdotes do culto a Òsóòsì.
Ogã Assogbá Sacerdote do culto a Omolu.
Oci Assogbá Segunda pessoa depois do Assogbá.
Alagbé Sacerdote responsável pela percussão dos
atabaques.
Oci Alagbe Segunda pessoa depois do alagbé.
Oju Obá Um dos sacerdotes do culto a Sàngó.
Oju Odé Um dos sacerdotes do culto a Òsóòsì.
Olossanyn Sacerdote de Osanyn responsável pela
coleta das folhas sagradas para os rituais.
Yawo Recém iniciado, filho mais novo.
Abian Aspirante.
Fonte: Etnografias realizadas durante as pesquisas de campo deste trabalho.
Hierarquia
8%
Comunidade em geral
4% 2% Egbome Mulheres
2%
Yawo mulheres
4%
Yawo homens
Egbome homens
homossexuais
Egbome mulheres
homossexuais
17%
Yawo (homossexual) -
Mulheres
19% Yawo (homossexual) - Homens
8%
Fonte: dados coletados em campo durante o período das pesquisas deste trabalho,
eles correspondem a frequência dos filhos de santo durante o período da coleta de
dados.
5
Luta política do povo negro contra o racismo e suas ramificações.
A Associação Cultural e Religiosa Obá Aganjú – ACROA, surge junto com o
terreiro em 1987 com o objetivo de fortificar a resistência religiosa e lutar contra
todas as formas de preconceito e discriminação racial. É um instrumento de
participação social deste terreiro. Desenvolve ações como projetos, oficinas de
dança, música e teatro, voltadas para a arte, cultura e cidadania, socializando
politicamente a comunidade.
Entre os projetos que a ACROA executa, destaco o “Íyá Omi: Mãe das
Águas”, cujo objetivo é contribuir para a redução da violência doméstica e maior
cidadania das mulheres, especialmente das mulheres negras e afro-religiosas.
Porém há dois anos,esta iniciativa está parada por falta de verba, pois, nos últimos
editais lançados pelo MINC através da Fundação Cultural Palmares, os projetos
propostos pela associação não foram aprovados.
O Obá Aganjú possui um afoxé, o Apé Odara Ngunzos, nome construído com
palavras em tupi-guarani, iorubá e bantu, que traduzidas para o português significam
“Grande Caminho de Àsé”. Foi criado em janeiro de 2003 por Pai Antonio de Aganjú
e a Mametu Mucumbi,sacerdotisa de um Candomblé Angola da cidade. O Afoxé tem
como patronos Sàngó e Ògún, divindades a quem estão consagrados
respectivamente os referidos sacerdotes, com os seguintes objetivos:
Este Afoxé é criado dentro do bojo das transformações que o governo popular
do Partido dos Trabalhadores trouxe para acidade de Belém durante seu governo
(1997 – 2003). É um instrumento de identidade cultural da comunidade do terreiro
pesquisado, isto é muito explícito na indumentária dos músicos, nos instrumentos
percussivos, atabaques, cabaças, agogôs, xeque-xeque, tímbal, entre outros. O
grupo é constituído em sua maioria por negros, militantes e afro-religiosos membros
do Obá Aganjú:
3. CONCLUSÃO
Para muitos pais e mães de santo da cidade, ser afro-religioso é uma coisa,
ser militante político de um movimento social é outra. Uma é missão, outra é
“politicagem”. Alguns defendem que cultuam a ancestralidade africana, mas não são
africanos. Não concordam com a exposição que alguns pais e mães de santo,
principalmente os que estão ligados ao Movimento Negro, fazem da religião.
Lembram que o candomblé é uma religião de segredos e seus fundamentos devem
ser preservados, falam isso em relação ao aparato estético e simbólico (cordões
rituais, joias, abadas, cantos e rezas) que pais e mães de santo ligadas aos
Movimentos Sociais expõem constantemente.
Assim, observo que ser negro não significa ser afro-religioso e vice versa,
pois estas identidades podem ou não funcionar, dependendo de que forma a
situação vivenciada pelo sujeito venha a exigir seu posicionamento (HALL, 1984). Eu
posso ser afro-religioso sem ser negro, ou posso ser militante do Movimento Negro
sem ser afro-religioso, ou ser os dois com ênfase na pertença a estes dois grupos,
ou a um só.
Não existe uma relação fraterna entre Gantois e Obá Aganjú; o que existe é
uma aproximação intencional que garante para os membros deste Candomblé uma
posição privilegiada no contexto afro-paraense, caracterizando um joguete político-
religioso que lhe favorece historicamente ante as demais casas de culto
estabelecidas na cidade.
Para os membros deste Candomblé com ênfase na hierarquia, ser negro está
intimamente ligado com esta religião afro-brasileira. As lideranças e membros desse
terreiro compreendem que, identificar-se como negro faz parte de um conjunto de
idéias que, para eles, representam a essência do que são; são construídas a partir
das convenções que fazem do presente, ou seja, a luta e militância como forma de
garantir seus direitos, com ênfase nos que estão ligados ao Candomblé e às outras
matrizes africanas, reconhecendo a religião como guardiã da cultura e valores
africanos e como forma de garantir politicamente uma posição de destaque na
sociedade belenense, paraense e brasileira.
4. REFERÊNCIAS
SANTOS, Juana Elbein dos. Os Nagô e a Morte. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
VERGOLINO E SILVA, Anaíza. O Tambor das Flores. São Paulo: UNICAMP, 1976
(Dissertação de Mestrado)
RESUMO: O Grupo de Estudos de Religiões de Matriz Africana tem como objetivo conhecer
e promover a aplicação da lei 10 639/03, que trata da obrigatoriedade do estudo e do ensino
da história e da cultura africana nos currículos escolares, oferecendo aos graduandos e pós-
graduandos em ciências da religião conhecimentos suficientes para a discussão e o ensino
dessa matriz religiosa em sala de aula. A partir do tripé: ensino, pesquisa e extensão,
desenvolve quatro ações permanentes, dentre elas o Cine Africanidade. Nascido no ano de
2011 com o objetivo de promover a aproximação entre acadêmicos e afro-religiosos a partir
da linguagem do cinema, seu público alvo é composto por universitários do curso de
graduação e mestrado em Ciências da Religião e demais licenciaturas, bem como a
comunidade afro-religiosa convidada. Este trabalho tem por objetivo apresentar o projeto de
extensão cine africanidade, suas características (metodologia) e sua importância ao
aproximar os saberes da academia e os saberes da comunidade afro-religiosa do Pará,
esclarecendo a comunidade acadêmica quanto suas teologias, práticas rituais, símbolos e ethos
das religiões afro-brasileiras.
O fenômeno religioso na arte a partir da performance Ritos: surgimento do ator-místico
Amanda Barros Melo
amandacrsearch@hotmail.com
mroselisousa@gmail.com
Resumo
A presente pesquisa tem sua base firmada em dois polos a arte (teatro) e a religião, evidencia-
se no campo da cultura e identidade. A problemática centra-se em compreender se há
elementos oriundos das experiências religiosas dos atores em cena (performer e músico) a
partir das ações realizadas na performance Ritos, que tem suas bases no teatro da crueldade do
teatrólogo francês Antonin Artaud. Objetiva-se neste artigo apresentar o objeto de análise e
suas dimensões simbólicas, posteriormente mostrar a existência do ator-místico, tipo ideal
criado a partir da performance analisada. A metodologia fundamenta-se no aporte teórico que
abarque conceitos oriundos do teatro e das ciências da religião com ênfase na mística, no fator
fenomenológico to ator criador. O resultado esperado consiste em criar o quadro explicativo
com os principais elementos que constituem o ator-místico.
Palavras-chaves: Performance, símbolo, mística.
A performance surge como resultado final de disciplina cursada por sua criadora, a
perfomer Michele Campos1, na Unirio, disciplina que tinha por nome "O teatro da crueldade
de Antonin Artaud", ministrada pela profª Dr. Maria Cristinha Brito. Neste período a
performer/pesquisadora passou acumular conteúdo referente ao teatrólogo frances Antonin
Artaud e seu teatro da crueldade, o que posteriormente se tornou a base para todas as ações
realizadas durante a performance, sendo que todas estas atividades estavam ligadas também a
disciplina "Estudos das Performances Afro-Ameríndias" que foi ministrada pelo Profº Dr.
Zeca Ligiéro, disciplina esta que deu maior suporte ao trabalho de criação da performer,
proporcionando a aproximação desta com diversas linguagens as quais a performance utiliza,
simbologias, dialetos, ligados ao contexto cultural ameríndio e afro-brasileiro, todos estes
dados ligados por meio da crueldade artaudiana. Ao fim da disciplina a performance chamada
de "Ritos uma inspiração artaudiana" realiza sua primeira experimentação, com apenas 15
minutos de giros, plasticidade e poesia.
A base da pesquisa acumulava cada vez mais informações sobre o termo crueldade,
este sendo transportado para o caráter mais atual do gênero performance, através disto a
performer matura cada vez mais sua pesquisa o que proporciona agregação de mais conteúdo
a própria performance. Ocorre então a parceria feita com o musico Marcello Gabbay 2, músico
e sonoplasta que também desenvolvia trabalho autora no contexto musical voltado para as
obras de Artaud.
Em 2009 "Ritos: uma inspiração artaudiana" surge em um evento que ocorreu por
conta do II Encontro de Performance e Política das Américas, organizado pelo Núcleo de
Estudos das Performances Afro-Ameríndias - Nepaa, vinculado a Unirio, ao lado da
performer e antropóloga Regina Pollo Muller e outros importantes artistas. E então as pessoas
comentavam muito, que era Muito interessante, um trabalho de corpo e tal (CAMPOS, 2013).
1
Doutoranda em Artes Cênicas (UNIRIO), mestra em Artes Cênicas (UNIRIO).
2
Doutor em Comunicação Cultural (UFRJ), mestre em comunicação cultural (UFRJ).
Cada momento em que Ritos ainda como uma inspiração artaudiana surgiu, serviu para
maturar a experimentação. Após o ano de 2009, o espetáculo performático fica certo período
sem apresentações, porém em 2011, por conta de uma bolsa de estudos Michele Campos e
Marcello Gabbay seguem para Paris, onde passam a residir na cidade universitária, mais
exatamente na casa do Brasil (Maison du Brésil), isto ocorre por meio do Found pour lês
Initiatives Étudiantes (FIE), pela contemplação de uma bolsa artística dada pela Cité
Internationale Universitaire de Paris, Ritos é recriado, uma nova performance e estudada,
novas informações entram, ganham sentido por estar no país do autor dos escritos malditos, o
trabalho é desenvolvido de forma experimental, uma das mudança mais sensíveis é a duração,
que ganha mais 45 minutos, num total de 1 hora.
A performance se transforma, ganha novos elementos fica mais próxima ao seu cerne
inicial o teatro da crueldade de Antonin Artaud, que é pesquisado pela criadora de Ritos, neste
período ainda denominado como une inspiracione artaudiana, outro elemento forte surge
junto a isto, o encontro da performer com os trabalhos desenvolvidos pelo cineasta, teatrólogo
e místico o chileno Alejandro Jodorowski, o taro surge o caráter esotérico é incorporado na
cena por fazer parte das experiências vividas pela artista. pra cada uma delas bem baixinho e
pra cada uma frente a frente com elas e só repassava para aquela pessoa que ele tirava e aquilo
me deixou LOUCA, ENCANTADA, quem é esse homem?? (CAMPOS, 2013). Além destes
aspectos surgem colaboradores, a musicista mexicana, um musico mexicano ambos residentes
da casa do México, também fazendo parte da cidade universitária, outra contribuição vem de
um filosofo brasileiro ligados a artes visuais que residia na casa do Marrocos.
Tudo isto faz com que a performance além de aumentar, passe a ter um outro corpo,
muito diferente do que foi feito em seus primórdios ainda na Unirio. Ai eu consegui na casa
do Brasil, emprestada a sala do teatro deles, todas as manhãs eu podia usar, até tipo de 8 as 11
da manhã, a sala durante 3 meses e ai eu comecei a fazer o treinamento lá [...] (CAMPOS,
2013). Em novembro de 2011, na semana dos Mortos, a performance ressurge, a primeira
frase dita por Marcello "Esta é a cerimônia da morte", seria então um ritual de vida e morte,
começos e fins, a performance segue em dois dias de ritual, o primeiro na casa do México, em
seguida na casa do Brasil, isto encerra a passagem de Ritos em Paris, mas deixa marcas
fortíssimas no corpo da performance, os elementos permanecem em grande parte.
Em 2012 a criadora da performance e o músico retornam ao Brasil, mais exatamente a
sua terra natal Belém do Pará, e neste ano Ritos é selecionado para fazer parte do grupo de
espetáculos que fizeram parte do projeto pauta mínima 3, em que para cada espetáculo
selecionado, este seria apresentado no Teatro Cuíra 4. E ai o Ritos vem pra cá, pra Belém
depois e já vira uma outra coisa, quando entra toda uma estrutura que em Paris eu não tinha,
uma iluminação pesquisada pra ele, entra o figurino que não tinha (CAMPOS, 2013), o lugar,
o retorno as raízes, a estrutura que surge faz a performance se moldar ao contexto da cidade,
elementos que apenas em Paris foram visto, foram modificados ou retirados, enquanto outros
tornaram-se mais visíveis e fortes do que antes eram. Novos colaboradores surgem, a
iluminadora, o figurinista, a cenógrafa. [...] é isso o trabalho ganha aqui um outro corpo, eu
começo a trabalhar o corpo de uma outra maneira também estando aqui, e entra com essas
pessoas [...] (CAMPOS, 2013). Estes elementos tornaram Ritos, algo diferente de Ritos uma
inspiração artaudiana. Parte da essência permanece, porém o novo surge, o corpo muda, a
energia agora é outra. Ritos se mostra em quatro dias de intensas atividades no teatro,
mostrando ao público sua bagagem, suas mitologias, sua cosmologia.
Após este retorno, a performance faz intervalos menores entre cada ressurgimento,
cada experimentação algo diferente. Em 2013 pisando no palco do teatro universitário
Claudio Barradas, que pertence a Escola de Teatro e Dança da UFPA, como espetáculo
convidado para o conjunto de apresentações do encontro de pesquisa em dança pessoal do
ator Patuanú, tem apenas uma noite de cena, todo o teatro tomado pelo publico enquanto o
ritual ocorria. Seguindo isto no mesmo ano, em Abril Ritos é selecionado ara fazer parte do
Festival de teatro do Maranhão, tendo uma apresentação no teatro Alcione Nazareth em São
Luís. Logo após ressurge no Rio de Janeiro em dois momentos uma versão menor feita na
Unirio e outra completa no morro Santa Marta, a performance segue e retorna a Belém para o
festival de verão, isso fecha as apresentações realizadas em 2013 Atualmente o ritual foi
realizado em São Paulo. Isto marca a trajetória da performance desde sua origem até os dias
atuais, que já somam sete anos de performance Ritos.
3
Financiado pelo Myrian Muniz, Funarte.
4
Teatro localizado no bairro da Campina, na cidade de Belém do Pará.
Em Ritos a expressão do sagrado
A idéia era o que, que passa entre um e o outro que eu possa trazer para esse meu
elemento que eu possa fazer O MEU SAGRADO E O MEU PROFANO, a minha
religião misturada com muitas coisas, e ai foi isso eu ponho elementos como o
circular, eu ponho o giro, a roda como elemento de manipulação, de ter água, tem
todos os elementos que são estudados no tarot, são os elementos básicos, ar, fogo,
água, terra que são também ligados aos signos, são ligados também aos planetas
(CAMPOS, 2013).
Então a idéia era, mostrar isso, suspender essas pessoas nesse lugar, com outro,
ritualístico, mágico e que junto com a música e com aquela iluminação, que ela não
formato do espetáculo, mas que ela dá uma ambientação toda de cor te leva pra um
outro lugar né, ESPIRITUAL, que eu acho muito aquela iluminação da Patrícia
(iluminadora) o azul, o vermelho, te provocar estados, então é isso de a pessoa olhar
e de alguma maneira ser afetado por isso [...] (CAMPOS, 2013).
O corpo que se doa e se movimenta, trânsita entre seus símbolos, mergulha em suas
vivências, mostra o tarot, doa cachaça ao santo, brinca com as lendas indígenas, grita as dez
pragas da mitologia judaica, unindo isto em um espetáculo, que visa expor, mostrar ao
público as historias de vida de sua criadora, moldada pelo caráter performático da cena, é
nisto que o ator-mistico se põe em ação. Estes elementos estão ligados ao que a idealizadora
concebe como parte da base de seu ritual, o uso dos três fatores, mito, símbolo e rito, que
seguindo esta ordem proporcionam a composição deste corpo cênico extremamente poético
que é a performance Ritos. A obra de arte exprime concepção do mundo, nova e original
(LOUREIRO, 1988, p. 15), o caminho escolhido pelo artista criador para expor seu mundo,
isto na realidade contemporânea liga este fator ao que a performance tem como base e aqui
evidencia-se exatamente isto, o fator da vida tornando-se linguagem, algo que se alimentou
em uma vanguarda, mas que transporta e atualiza a mesma, dando outro corpo, outro modo de
ser feita, e isto se renova a cada experimento deste ritual. [...] a primeira função da arte é
exatamente a que eu denominei como a primeira função da mitologia: transportar a mente
experimentadora além dos guardiões [...] (CAMPBELL, 2001, p. 164), a função de ir além e
moldar seu espaço de acordo com sua visão de mundo.
O místico cala, tem em suas experiências o ápice de sua força espiritual, algo
extremamente interno. A doação, por meio do desprendimento, ver e sentir aquilo que na
realidade cotidiana é silenciado. O ator com bases místicas, mergulha em si, e partindo disto,
externaliza com gesto, fala e também no silêncio, em seu rito pessoal. Aqueles que transitam
entre os mundos do visível e o que transcende a este. Os místicos são aqueles que conseguem
captar a dimensão de profundidade presente na vida e reconhecer o outro lado das coisas
(TEIXEIRA, 2004, p. 27). Vivências místicas seriam então aquilo que quebra com o que a
realidade cotidiana nos mostra, por meio dos aspectos culturais, sociais que reverberam nas
mais distintas práxis?
Talvez mudar o termo "quebrar", para algo que seja menos aniquilador, experiências
místicas consistem em romper, às fronteiras delimitadas pelas vivências cotidianas,
provocando assim um mergulho em um mundo de significados. Então sendo assim, ir além
destas fronteiras seria o propósito mais latente do ser místico, abandonar a visão míope que o
cotidiano não restaurado possui.
Todo e qualquer experiência de busca, de encontro com si, pode ser considerado algo
místico, mas é perceptível que no âmbito religioso esta busca, fica mais evidente, e se
distribui entre as mais distintas formas de experiências, que transitam entre os meios mais
tradicionais, a outros que podem ser considerados mais alternativos.
A mística se faz na prática, mesmo que seja algo tão interno que fique complicado
tornar mais objetivo ter de fato forma concreta, porém algumas linguagens podem tornar
visível o que a mística faz. A arte? Sim, esta abarca uma teia de linguagens, formas e
subjetividades, que podem ser consideradas místicas, em alguns aspectos, pois o ser artista
quando produz algo, mergulha em si, para tornar real, concreto o que sente, se utilizando
assim de uma série de alegorias, signos, e símbolos.
Além das características que comumente já interligam arte e religião, é na mística que
ambas podem ser compreendidas da forma mais forte que é possível pensar, pois se trata de
algo que partira do âmbito subjetivo em ambos os contextos, e logo ganha forma, no mito, no
rito, no espetáculo, na performance, é este fator que na mística se faz presente. A magia
produzida por ambos se torna o cerne principal para potencializar o que ocorre no mergulho
interno que tanto o ator/performer, quando o homem da fé fazem. Segundo Teixeira (2004) o
místico é:
Esta dimensão profunda é a realidade interna que pertence apenas ao místico e/ou
performer/ator. Esta capacidade de a partir de si comunicar algo, fazer seu rito, que esta
presente no ser performer, seria então o que faz este, comunicar-se com o meio místico,
mesmo por que assim como o místico o ser artista precisa ver além das coisas, do cotidiano,
para então criar algo, que só quem realmente conhece e sabe dos objetivos daquela prática é o
7
Teatrólogo frances, nascido em Marselha (1896-1940) que ao longo de sua vida produziu uma serie de ensaios,
que dão forma ao seu teatro da crueldade, o novo teatro ou forma de fazer teatral que visa retornar o teatro a sua
verdadeira essência.
próprio performer, assim como o místico, quando este tem seus mergulhos internos. Esta
comunicação entre teatro e mística, se faz no teatro ritualístico de Artaud (1999), que
compreende a energia e poder do teatro da seguinte forma:
O teatro, como a peste, é uma crise que se resolve pela morte ou pela cura. E a peste
é um mal superior porque é uma crise completa após a qual resta apenas a morte ou
a extrema purificação. Também o teatro é um mal porque é o equilíbrio supremo que
não se adquire sem destruição. Ele convida o espírito a um delírio que exalta suas
energias (...) (ARTAUD, 1999, p. 25).
8
A peste tão citada por Artaud em seus escritos sobre teatro, é a peste bubônica que assolou parte da Europa,
causando grande perca populacional.
exposta para o público, é fazer algo totalmente interno ganhar forma, e assim tornar esta
atmosfera mística mais próxima a todos que partilham deste momento.
O molde de Ritos se faz por meio da visão de mundo de sua criadora, que quando
deposita suas experiências em cena, se mostra, porém sempre circundada por todas as
dimensões espetaculares do rito. O impulso de retirar um sentido da experiência, de dar-lhe
forma e ordem, é evidentemente tão real e tão premente como as necessidades biológicas mais
familiares (GEERTZ, 1989, p. 158).
O caráter místico de Ritos se mostra a partir do mergulho feito antes e durante a cena,
e que acaba por proporcionar a exposição das experiências religiosas o ator-mistico que se faz
no palco, aquele que grita suas vivências, e utiliza a potência teatral de Artaud (crueldade,
peste) para manter isso. Fazer o Ritos me levou para um lugar de encanto, de magia através
dos mitos, pela beleza e simplicidade, pureza da mitologia indígena, tão mística e sabia, pelo
lúdico deles fui arrebatada (CAMPOS, 2013). O ator-mistico se torna místico apos repousar
em si, em suas experiências em seu(s) contexto(s) religioso(s) para então ligar estas vivências
místicas, e moldá-las a sua visão de mundo, para depositar isto em seu espaço, e tornando este
plural, por depositar tantas informações, por conta de sua teia de vivências, em Ritos isto se
mostra de forma forte, pois o trânsito entre cada momento vivido pela criadora, os símbolos
que ela cria, os mitos que conheceu por meio de sua caminhada são o que mantém parte do
teor místico da performance, porém o símbolo chave disto, é o corpo da mesma, pois é por
meio dele que os outros símbolos estão interligados e relacionados. Geertz (1989) diz:
9
Entrevista realizada em 28/02/2013.
feita que o ator-mistico o convida a partilhar da cena. Em Ritos, isto ocorre em dois
momentos mais fortemente, a cena do tarot10 e a cena da pintura corporal11.
Em três momentos este processo foi dividido, para cada um destes a transformação, o
mergulho ocorre para então criar um produto, algo com características místicas, na qual se
firma o território do ator-mistico, possibilitando assim a ação ritual. 1) Vida
10
Neste momento a performer, sai de seu espaço central,o circulo menor, se dirige ao lado direito do palco, se
aproxima de um espectador, e o convida para ter sua vida vista por meio da leitura das cartas do tarot de
Marselha. O convite é aceito, ambos se dirigem até o centro do palco, e outro rito se inicia. A performer expõe
seu tarot ao respectivo espectador, acender uma vela, e mantém o contato visual fixo com este que agora esta a
sua frente. As cartas são escolhidas, a leitura é feito. E todos ao redor parecem curiosos, porém cada palavra dita
só é compreendida por aquele que está no circulo menor junto a esta que lê sua vida por meio das cartas, o
passado, presente e o futuro, por meio do simbolismo presente em seu tarot. O máximo que se pode ouvir são
sussurros baixos, que não se fazem entender de tão baixos que são. O mistério é o que toma conta deste
momento. a iluminação muda, os sons emitidos pelo músico que de fora do circulo maior mantém a atmosfera
ritualística da performance com suas músicas.
11
Após a leitura do tarot, o rito termina. A pessoa escolhida se retira do circulo menor. A performer então guarda
o seu tarot, apaga a vela, e tira seu vestido de retalhos, enquanto ela dobra o vestido e o deposita próximo aos
outros elementos, o músico se aproxima, rompe o circulo de guias coloridas, e com uma parte das guias ele toca
a costa da performer que então pega esta sequência de guias vermelhas e com passos duros, que quando tocam o
chão emitem um forte som, esta segue para um pequeno elevado no palco e lá como um fantoche preso as guias,
fica em diversas posições. O músico novamente se aproxima, desta vez com uma paleta de tintas em uma das
mãos e na outra um pincel, este pinta algo no corpo que se faz em movimentos e após isto sede a paleta e o
pincel a algum espectador que esta sentado próximo ao local, e entre idas e vindas de vários espectadores o
corpo da performer esta coberto por linhas, círculos, espirais, aquilo que cada um sentiu vontade de fazer.
(experiência/cotidiano): é o momento que antecede a toda a criação. Onde todas as vivências
religiosas e seculares estão depositadas, por meio desta. A visão de mundo do ator-mistico se
faz. E este como artista, ou seja, aquele que cria a partir do que acumula em sua vida, utiliza o
que acha mais necessário, e aos poucos deposita isto em suas criações, por meio de memórias,
objetos, imagens, músicas, até o silencio. No contexto da performance Ritos, isto se deu a
partir de inúmeros momentos, a descoberta dos escritos de Artaud, a ida a Paris que resultou a
inúmeras visitas ao lugar onde o tarólogo Alejandro Jodorowsky sorteara 22 pessoas todas as
quartas-feiras para terem suas vidas interpretadas no tarot, sendo que em uma destas quartas,
um dia após seu aniversário, o parceiro d Michele Campos, o músico/sonoplasta Marcelo
Gabbay é sorteado, a convivência com os Tembés que proporcionou grande aprendizado
(mitologia, dialetos, costumes etc.), as experiências ligadas a idas a terreiros, observações a
rituais de santo-daime, proximidade com práticas judaicas e inúmeras outras experiências, que
em Ritos foram depositadas e entrelaçadas, dando a impressão que para cada momento
ocorrem saltos, por conta disto a não linearidade entre cada ação. 2) Renascimento
(crueldade/potencialização): este é o momento da preparação física, ordenamento das
sequência de elementos que iram para o rito da idealizadora da atriz. Este mergulho realizado
em suas memórias, o retorno as suas matrizes culturais. A crueldade é o que potencializa estas
ações, trás a estes elementos mais organicidade, proporciona o rompimento com as fronteiras
entre a performer e o público. Por meio disto a torna-se mais ritualística, produzindo ações
que provocam a suspensão de quem realiza a ação para uma nova realidade, ou seja, o
momento que mostra seu mundo de histórias, símbolos, movimentos para os que estão
observando-a. A crueldade artaudiana é o mecanismo que ativa e potencializa o mergulho da
performer em suas vivencias, e possibilidade a sua exposição. 3) Ritos (Nova realidade/
Extra-cotidiano): após as etapas de maturação em que corpo e elementos simbólicos são
ligados, é o momento em que a ação ritual ocorre. Quando o espaço de Ritos está feito e o
público é convidado para partilhar deste momento. Os inúmeros ritos são ligados uns aos
outros, e a performance é feita. O extra-cotidiano se mostra, a partir do momento em que este
mundo de símbolos é feito, esta nova realidade. Que se utiliza da linguagem cênica para
proporcionar este momento de quase suspensão.
A criação do ator-místico se dá por esta serie de etapas, que logo acarretam no ato
representativo. Sobre isto a criadora de Ritos, diz que:
Então como agora eu trabalho muito agora com a linguagem da performance, tudo o
que eu penso, inclusive novos projetos que eu penso, tudo tem muito haver com a
minha relação com as coisas que vem acontecendo, as coisas que eu tenho
conhecido, com a historia dos terreiros que eu tenho ido, então isso pulsa. É a minha
vida, é o meu cotidiano, as coisas que eu faço (CAMPOS, 2013)
É justamente nesse mundo de símbolos, que Ritos foi criado, e fez seus códigos, deu
seus primeiros passos, por meio as vivências de sua criadora, que quando no palco, fala, gira,
se mantém em um bailado constante, se tornando um corpo-simbolo ligado aos outros que
estão distribuídos pela extensão de seu território. É por conta disto que neste mundo, surge o
ator-mistico, este que se faz símbolos, que mergulha em si e mostra suas vivencias religiosas
para os espectadores.
Por meio desta performance é possível perceber o caráter plural do fenômeno religioso
e que os indivíduos estão cercado por inúmeras linguagens que podem ser interpretadas das
mais diversas formas, o rito, o mito, o performático, o lúdico, o estético, todos estes
elementos fazendo parte de um único lugar, o espaço de um ritual múltiplo, que se faz por
meio do corpo-símbolo, do ator-místico, que por meio de expressões artísticas, mostra o
fenômeno religioso, de uma forma menos convencional, que na caixa teatral se faz.
Referências
ARTAUD, Antonin. Vida e Linguagem. São Paulo: Ed. Perspectiva. 1970.
ARTAUD, Antonin. O teatro e seu duplo. Martins Fontes. São Paulo, 1999.
BAZÁN, Francisco García. "A religião e o sagrado". In: Aspectos incomuns do sagrado.
São Paulo: Paulus, 2002.
CROATTO, José Severino. "A experiência religiosa: descrição e implicações". In: As
linguagens da experiência religiosa: uma introdução à fenomenologia da religião. São
Paulo: Paulinas, 2001.
CAMPBELL, Joseph. "Temas mitológicos na arte e na literatura criativa". In: CAMPBELL,
Joseph. (Org). Mitos, Sonhos e Religião. Nas artes, na filosofia e na vida contemporânea.
Tradução de Angela Lobo de Andrade e Bali Lobo de Andrade. Rio de Janeiro: Ediouro,
2001.
GEERTZ, Clifford. . A interpretação das culturas. Rio de Janeiro. Editora da Guanabara.
1989.
LOUREIRO, José de Jesus Paes. "Compreensão histórica da Arte". In: Elementos de
Estética. 3 ed. Belém: EDUFPA, 2002.
SOUZA, Adriana Andrade de. O exterior mais que interior que o mais íntimo: Echkart e a
excelência de Marta. In: TEIXEIRA, Faustino (org). Caminhos da mística. São Paulo:
Paulinas, 2012.
TEIXEIRA, Faustino. "O desafio da mística comparada". In. No limiar do mistério: mítica e
religião / Faustino Teixeira (org.) - São Paulo: Paulinas, 2004.
Título do pôster: “O Grupo de Estudos Religiões de Matriz Africana na Amazônia
(GERMAA) e a aplicação da lei 10.639/2003 nas ciências da religião e no ensino religioso”.
RESUMO
O Grupo de Estudos Religiões de Matriz Africana na Amazônia – GERMAA surge em 2011
com o objetivo de integrar o ensino, pesquisa e extensão na área das Ciências da Religião
dentro do contexto regional, nacional e internacional. Através de atividades sistemáticas são
desenvolvidos estudos e trabalhos que integram a academia e os afro religiosos estabelecendo
um dialogo altero que visa produzir conhecimento e combater a intolerância religiosa,
fomentando uma convivência respeitosa entre as diversas tradições religiosas presentes nas
sociedades. Possibilita aos professores do Ensino Religioso um aporte teórico e pedagógico
no estudo das religiões de matriz africana através da produção e elaboração de subsídios para
discutir intolerância religiosa em sala de aula e dinâmicas sócio educativas para a prática
pedagógica destes professores. Com os projetos de extensão “Cine Africanidade”, “O Cine
vai à escola” e o “Dialogo entre religiões”, expõe documentários e curtas/média metragem
sobre o universo afro brasileiro, além de trabalhos de pesquisadores que estudam o fenômeno
religioso. O GERMAA também promove o dialogo inter religioso através de parcerias com o
Comitê Inter Religioso do Estado do Pará, Federação Espírita e Umbandistas dos Cultos Afro
Brasileiros do Estado do Pará – FEUCABEP, e Associações de Terreiros, assessorando e
dando apoio a eventos de combate a intolerância religiosa e promoção social das religiões de
matriz africana.