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STAKEHOLDERS EM EMPRESAS DE

MODA
VERDADE: A melhor maneira de reduzir sua
Introdução pegada é comprar menos. Tire o máximo
proveito de seu guarda-roupa atual
Você já imaginou quantas questões éticas e consertando ou alterando roupas velhas,
de responsabilidade social uma empresa estilizando peças gastas e trocando itens
tem que trabalhar? O que é ser sustentável? com amigos ou fazendo reuniões (após a
Quais questões são importantes para a pandemia) para trocas. Se você precisar
indústria de vestuário? Já existem comprar um novo item, tente encontrá-lo de
iniciativas no setor? segunda mão. Algumas empresas até
oferecem programas de concerto, como o
Essas e outras reflexões levarão aos três ‘Worn Wear' da marca norte-americana
pilares da sustentabilidade. Por fim, serão Patagônia, ou ajudam a vender peças
abordadas as principais normas, usadas. Pesquisar marcas sustentáveis é
regulamentações, além dos selos e demais útil, mas comprar algo novo deve ser a
legislações do setor de moda. última opção, não a primeira.
Para pensar sobre a gestão de moda, é
essencial conhecer questões éticas e de MITO: A moda de luxo é mais sustentável do
responsabilidade social, afinal, atualmente, que a moda rápida
os consumidores têm exigido cada vez mais
transparência. Além disso, as empresas
precisam repensar processos e trazer novas VERDADE: Gastar dinheiro com moda de
soluções para problemas que impactam a luxo não garante sustentabilidade. Algumas
sociedade como um todo. casas de moda, incluindo a Burberry, fazem
desfiles “neutros em carbono”. A Gucci
NOTÍCIA - 9 mitos comuns sobre moda também afirmou recentemente que suas
ética e sustentável operações ficaram totalmente neutras em
carbono. A Stella McCartney tem
trabalhado em direção a práticas mais
Comprar de marcas ecológicas não é a verdes por anos e é uma das marcas que
melhor maneira de adotar um estilo assinou a Carta da ONU para Ação
sustentável. Suas devoluções online não Climática da Indústria da Moda,
terminam onde você pensa que estão. comprometendo-se a reduzir as emissões
Investir em moda de luxo em vez de moda coletivas de carbono em 30% até 2030. Mas
rápida não impede necessariamente a o setor de luxo ainda tem muito trabalho a
exploração de trabalhadores. fazer. Um relatório divulgado no início deste
ano pela Ordre, empresa especializada em
showrooms online, revelou como as
Erros comuns sobre moda, ética e
semanas de moda são de fato
sustentabilidade podem impedir os
insustentáveis. Ao medir a pegada de
consumidores de realizar ações
carbono dos compradores de moda de
significativas no que diz respeito a seu
2.697 marcas de varejo e 5.096 designers de
estilo de vida. Aqui estão nove mitos
peças prontas para usar que participaram
comuns e os fatos atrás de cada um.
de semanas internacionais de moda
durante um período de doze meses, o
MITO: Comprar de marcas “ecologicamente relatório descobriu que as 241 mil toneladas
corretas” e "sustentáveis" é a melhor de gás carbônico (ou equivalente em gases
maneira de reduzir sua pegada de carbono de efeito estufa) emitidas representam a
com o vestuário mesma quantidade da de um país pequeno,
ou a energia suficiente para manter as luzes
acesas em 42 mil residências por ano.
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MITO: Quanto mais cara a roupa, menos “banho verde”) podem ser mal utilizadas
provável que os trabalhadores tenham sido para atrair consumidores ávidos por reduzir
explorados seu impacto ambiental no planeta. A
ferramenta de pesquisa de moda Lyst
relatou em 2019 que viu um aumento de 75%
VERDADE: Na verdade, muitas marcas nos termos de pesquisa relacionados à
premium e de preços médios produzem nas sustentabilidade em comparação com o
mesmas fábricas que as marcas de ano anterior. “Faltam critérios objetivos
descontos e fast fashion. Isso significa que para classificar a moda sustentável”,
tudo, dos direitos dos trabalhadores às afirmou Saskia Hedrich, da McKinsey 's, à
condições em que trabalham, pode ser CNN. E usar materiais reciclados ou buscar
exploratório, independentemente do preço. a neutralidade de carbono nem sempre é
Além do mais, o preço de uma roupa não suficiente. “Uma vez que a sustentabilidade
garante que os trabalhadores sejam pagos abrange uma ampla gama de questões na
de forma justa, porque o custo da mão de cadeia muito fragmentada de suprimentos
obra representa apenas uma pequena da moda, outros consumidores muitas vezes
fração dos custos totais de produção. não entendem totalmente o que
‘sustentabilidade’ realmente significa”.
MITO: Doar roupas velhas é uma forma
sustentável de limpar seu armário MITO: A maioria das roupas pode ser
reciclada
VERDADE: Embora instituições de caridade
e brechós distribuam ou vendam uma parte VERDADE: As roupas podem ser difíceis de
das roupas que recebem, suas roupas reciclar, em parte por causa de como são
doadas provavelmente acabarão sendo feitas. Por um lado, muitos tecidos são feitos
enviadas para o exterior para mercados de de mesclas (de algodão e poliéster, por
revenda em países mais pobres, o que pode exemplo), que devem ser separados para
impactar negativamente as indústrias que o material seja transformado em uma
locais ou lotar os aterros sanitários. Apenas nova vestimenta. Nos EUA, menos de 14%
10% das roupas dadas a brechós são das roupas e sapatos descartados acabam
realmente vendidas. Só os EUA enviam 450 sendo reciclados. Mas “reciclagem” também
milhões de toneladas de roupas usadas por é um termo amplo que pode ser dividido em
ano para outros países. A África recebe 70% “downcycling” (virando produto de menor
das roupas de segunda mão globais. valor) e “upcycling” (maior valor), e a
diferença é importante. As roupas
Um projeto de pesquisa feito em 2016, recicladas muitas vezes acabam como
intitulado “Roupas de homens brancos fibras usadas para isolamento doméstico
mortos" descobriu que em Kant Manto, o ou tapetes. Na Europa, menos de 1% das
maior mercado de peças de segunda mão roupas coletadas são realmente recicladas
de Gana, 15 milhões de itens são em novas roupas, de acordo com a Circle
descarregados a cada semana. A equipe Economy.
responsável pela pesquisa concluiu que
40% das roupas em cada fardo se MITO: Não vale a pena consertar roupas
transformam em lixo, jogado em aterros já baratas.
transbordando, no Golfo da Guiné, ou
queimado nas favelas de Acra.
VERDADE: Consertar um item de moda
rápida pode significar gastar o que você
MITO: Marcas que promovem a pagou por ele, mas manter as roupas em
sustentabilidade são sustentáveis uso é a melhor coisa que você pode fazer
para reduzir sua pegada de carbono. Você
VERDADE: “Sustentabilidade” e outros também pode aprender a fazer pequenos
termos chamativos de greenwashing (ou reparos em casa para manter os custos

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baixos, incluindo a substituição de botões, precisam repensar processos e trazer novas
consertar zíperes quebrados, reparar soluções para problemas que impactam a
costuras soltas e fazer barras e bainhas em sociedade como um todo.
calças.

MITO: Suas devoluções online são


revendidas para outros clientes

VERDADE: Suas devoluções podem acabar


incineradas ou em aterros. Geralmente é
mais barato para as empresas descartar as
devoluções do que inspecioná-las e
embalá-las novamente, e as marcas podem
não querer doar os itens por medo de A partir dos anos 70, houve um aumento no
barateá-las ou prejudicar sua exclusividade. grau de amplitude de inclusão e de
Em 2019, um relatório da CBC destacou essa consideração pela empresa quanto a suas
prática, apontando que o volume de relações com seus públicos. Ashley (2018)
devoluções online também aumentou 95% coloca que hoje "a empresa socialmente
nos últimos cinco anos. responsável é aquela que está atenta para
lidar com as expectativas de seus
MITO: Suas roupas são do país que aparece stakeholders atuais e futuros, na visão mais
na etiqueta radical de sociedade sustentável."

ÉTICA E SUSTENTABILIDADE X INDÚSTRIA


VERDADE: Suas roupas podem ter sido DE MODA
montadas naquele país, mas a etiqueta não
revela a complexa cadeia de trabalho que Considerando nosso sistema econômico
envolveu sua fabricação. “Sua etiqueta não atual, o ato de consumir é o que faz a
vai dizer em país no qual o algodão foi economia funcionar. A indústria de moda
cultivado, onde a fibra foi transformada em por si só já é uma indústria que estimula o
um fio, onde o fio foi tecido ou onde foi consumo, pois trabalha com tendências
tingido e estampado”, afirmou o relatório da que mudam de tempos em tempos. Isso faz
Fashion Revolution “How to Be a Fashion com que a indústria têxtil utilize recursos
Revolutionary” (“Como ser um revolucionário naturais, não os repondo. Além disso,
da moda”, sem tradução em português). “Ela empresas de moda produzem muitas peças
não diz de onde vieram os fios, tintas, e há pouca preocupação sobre o descarte
zíperes, botões, contas e outros recursos.” delas.
Para incentivar as marcas a serem
transparentes sobre suas cadeias de Hoje em dia, é crescente o número de
suprimentos, a Fashion Revolution tem estudos científicos a respeito de recursos
promovido a hashtag #whomademyclothes? naturais. Em resumo, acredita-se que, para
(#quemfazminhasroupas?), pedindo aos que ocorra a preservação de recursos
usuários que identifiquem as marcas em naturais, é imprescindível a promoção de
selfies mostrando as etiquetas de roupas modificações estruturais nas esferas
visíveis. econômica e social.

Elkington (2001) desenvolveu o conceito


RESPONSABILIDADE SOCIAL denominado Triple Bottom Line,
defendendo a ideia de que a
Para pensar sobre a gestão de moda, é sustentabilidade é o equilíbrio distribuído
essencial conhecer questões éticas e de entre os três pilares: ambiental, econômico
responsabilidade social, afinal, atualmente, e social.
os consumidores têm exigido cada vez mais
transparência. Além disso, as empresas
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Tendemos a pensar sobre sustentabilidade
apenas no âmbito da natureza, porém, os O Fashion Revolution é um movimento
outros pilares são tão importantes quanto. global que trabalha para que a moda
Na indústria de moda, é essencial que se conserve e restaure o meio ambiente,
pense não apenas na matéria-prima ou nos valorizando as pessoas acima do
resíduos, mas também devemos crescimento e do lucro. O objetivo é que a
compreender se o negócio é sustentável indústria da moda seja limpa, segura, justa,
economicamente e se tem responsabilidade transparente, diversa e responsável para
social.Um negócio de moda, ao pensar todos e todas. Esse movimento está
sobre ser sustentável, precisa levar em presente no Brasil desde 2014, e vem
consideração a pré-produção, produção, desenvolvendo projetos importantes. Em
distribuição, uso e descarte. Além disso, é 2018, originou o Instituto Fashion Revolution
preciso se perguntar: essa empresa é Brasil, uma organização da sociedade civil.
economicamente viável? Qual impacto ela
traz para a sociedade? Sobre a responsabilidade social, vale
destacar os diversos escândalos
No sistema da moda, especificamente, envolvendo marcas de moda e as condições
vemos uma crise que se origina na de trabalho de seus funcionários.
efemeridade devido à sazonalidade Infelizmente, esse ainda é um problema
imposta pelo sistema. Com as tendências muito sério e acontece por diversos
volúveis e mutáveis, um grande volume de motivos, mas principalmente por conta da
consumidores é movido a estar sempre à terceirização de serviços. Grandes marcas
procura do novo, da novidade, o que perderam o controle de sua produção, e o
acarreta a necessidade do aumento da trabalho escravo na cadeia produtiva da
produção, que, por sua vez, tem gerado moda, infelizmente, ainda é uma realidade.
impactos ambientais significativos.
Você sabia que existe um app que nos
Existe uma conscientização crescente de mostra o envolvimento das marcas de
que se deve deter a degradação ambiental, roupa no trabalho escravo?
porém, ainda há muito o que fazer para
minimizar ou eliminar esse tipo de 'A proposta é trazer ao público, de forma
destruição. Segundo Souza (2006), um ágil e acessível, as medidas que as marcas –
pensamento sistêmico a respeito da as principais varejistas de roupas do país e
perpetuação da qualidade de vida de empresas que já foram flagradas pelos
gerações futuras deve existir na mente dos fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego
profissionais da área. Tal perpetuação está (MTE) – vêm tomando para evitar que as
diretamente ligada à forma como os
peças vendidas em suas lojas sejam
recursos naturais são utilizados, assim
produzidas por mão de obra escrava.' diz a
como à demanda atual.
descrição do aplicativo.

Ele se chama Moda Livre e está disponível


para download na App Store e Google Play.
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No âmbito ambiental, já existem algumas empresas a demonstrar em qual fábrica (e
iniciativas dentro do setor que reduzem os não apenas o país) foi produzido aquilo
impactos negativos oriundos da produção que vendem. Desafiamos as marcas com
de vestuário, por exemplo: estas perguntas: “Qual significado, qual
visão o seu produto está comunicando?”;
“Além da estética, qual visão de mundo
● NOVAS TECNOLOGIAS TÊXTEIS transmite com esse produto?”
Há várias iniciativas buscando novas
fibras sustentáveis ou até mesmo a
utilização de resíduos têxteis na O slow fashion busca preservar os
fabricação de novos tecidos. recursos naturais; promove e defende a
“atitude sem pressa”, que não diz respeito
● METODOLOGIA ZERO WASTE necessariamente a diminuir o fazer, mas
É quando não há nenhum sobre de trabalha para que ocorram melhorias na
tecido. É projetada uma modelagem produtividade por meio de processos mais
para que não haja sobra de tecidos criativos e com qualidade elevada.
depois do corte de uma peça.
SELOS DO SETOR DE MODA
● UPCYCLING
Modificação/transformação de peças
que já existem em produtos com uma Como foi apresentado, já existem várias
estética nova. iniciativas sustentáveis dentro da área de
moda, porém, algumas empresas têm feito
o que é chamado atualmente de
Além disso, há um crescimento do greenwashing. Mas, o que isso significa? É
movimento de slow fashion. O conceito de uma estratégia de marketing onde uma
slow design busca aprimorar os processos empresa promove uma propaganda
de design para obter um processo lento, enganosa sobre um produto.
reflexivo e focado nos resultados do
projeto que está sendo executado. De
acordo com Paoliello (2013), também busca E como fugir disso? Em primeiro lugar, o
promover o entendimento de que é consumidor deve questionar as marcas,
importante que o processo de design seja mas isso pode não ser suficiente. Então,
democratizado, alcançando todo o leque foram criados vários selos que garantem
de interessados. Trata-se, portanto, de alguns critérios. Alguns selos que
desenvolver projetos com foco nas certificam tecidos, outros processos,
pessoas, tendo fatores como a venda dos condições do trabalhador etc. Veja alguns
produtos finais em segundo plano. exemplos:

Veja o que Enrico Cietta fala sobre o slow ● SELO ABVTEX:


fashion: A Associação Brasileira do Varejo Têxtil
(Abvtex) possui um programa de
certificação que estimula práticas
Em suma, acho que o consumo “slow” seja
ambientalmente corretas dentro do
uma consequência e não um objetivo: não
varejo de moda. O programa combate
devemos forçar a consumir menos,
também o trabalho análogo à
devemos primeiramente tornar a
escravidão e trabalho infantil.
produção mais sustentável e
responsabilizá-la com o conteúdo
cultural/criativo (o significado) que está
● OEKO TEX STANDARD 100:
É uma norma que garante que os
transmitindo(...) Para mim, exaltar o
materiais usados ​na fabricação de
significado cultural do produto significa
têxteis não sejam prejudiciais aos seres
não diabolizar o fast-fashion e os
humanos, sendo seguro para o
consumidores que compram em lojas
consumidor e trabalhador.
fast-fashion, mas obrigar, por exemplo, as
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● GOTS (Global Organic Textile Standard): transporte por parte do trabalhador, com
Selo que demonstra que um tecido é o fim de retê-lo no local de trabalho; ou
orgânico e garante que toda a cadeia mantém vigilância ostensiva no local de
de abastecimento atenda a rígidos trabalho ou se apodera de documentos ou
padrões sociais e ambientais. objetos pessoais do trabalhador, com o
fim de retê-lo no local de trabalho.
● Better Cotton Initiative (BCI):
Os agricultores são treinados sobre Fonte: BRASIL. Lei 10.803, de 11 de dezembro
como usar a água de maneira eficiente, de 2003. Altera o art. 149 do Decreto-Lei nº
cuidar da saúde do solo e dos habitats 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código
naturais, reduzindo o uso dos produtos Penal, para estabelecer penas ao crime
químicos. nele tipificado e indicar as hipóteses em
que se configura condição análoga à de
● PETA (People for the Ethical Treatment escravo. Brasília, DF, 2003.
of Animals):
Certifica que roupas e acessórios não
são feitos de matérias primas de origem ➔ Questões Ambientais
animal.

Guimarães (2021) destaca que o artigo 6º


FASHION LAW da Lei nº 12.305/10 apresenta princípios da
Política Nacional de Resíduos Sólidos e
propõe “a redução do impacto ambiental e
O Fashion Law é uma área do Direito que do consumo de recursos naturais a um
vem estudando a legislação relacionada nível, no mínimo, equivalente à
ao setor de moda. Como as empresas de capacidade de sustentação estimada do
moda vêm crescendo cada vez mais, planeta” e “o reconhecimento do resíduo
várias questões jurídicas ganharam sólido reutilizável e reciclável como um
destaque e precisam ser discutidas. bem econômico e de valor social, gerador
de trabalho e renda e promotor de
cidadania.” (BRASIL, 2010, Art. 6º).
➔ Direitos Trabalhistas

Em relação ao uso de agrotóxicos nas


Infelizmente, dentro da indústria de
plantações de fibras têxteis, a Lei nº
confecção, há casos de exploração de
7.802/89 estabelece normas; e no artigo 3º,
funcionários ou até mesmo escravidão.
§4º, diz que o Brasil deve seguir as
Existem diversos casos de oficinas com
orientações de organizações
trabalhadores que não têm seus direitos
internacionais responsáveis pela saúde,
fundamentais.
alimentação ou meio ambiente quando
estas alertarem para os riscos de
Segundo Cunha et al. (2020), na legislação agrotóxicos e seus componentes (BRASIL,
brasileira, é o artigo 149 do Código Penal 1989).
que melhor define as condutas
caracterizadoras do trabalho em
➔ Propriedade Intelectual
condições análogas ao trabalho escravo.

Reduzir alguém à condição análoga à de Dentro do mercado de moda, uma prática


escravo, quer submetendo-o a trabalhos muito comum é copiar. Marcas que se
forçados ou a jornada exaustiva, quer destacam em desfiles ou na mídia, muitas
sujeitando-o a condições degradantes de vezes, são copiadas por outras marcas. O
trabalho, quer restringindo, por qualquer Brasil não tem uma legislação específica
meio, sua locomoção em razão de dívida para esses casos da área de moda, mas
contraída com o empregador ou preposto; segue uma conduta de proteção aos
ou cerceia o uso de qualquer meio de produtos.
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Pita e Leal (2019) destacam a Lei da
Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/1996),
que regula os direitos e obrigações
inerentes à propriedade industrial,
disciplinando sobre as criações humanas
direcionadas à produção em massa,
patentes de invenção e de modelos de
utilidade, registro dos desenhos
industriais e das marcas, exclusividade na
exploração da criação, além de reprimir a
concorrência desleal e as falsas
indicações geográficas.

As autoras, ainda, colocam que não são


todas as criações que podem ser
patenteáveis, pois a lei atende invenções
com requisitos de novidade, atividade
inventiva e aplicação industrial. Criações
estéticas, entre outras, são excluídas da
proteção. Há também a Lei dos Direitos
Autorais (Lei nº 9.610), mas, infelizmente, o
foco é na proteção dos direitos autorais
referentes às obras escritas.

Assim, chegamos ao fim da unidade Ética,


normas e legislação em moda.

Durante esta unidade, foram


apresentados os conceitos de
responsabilidade social, ética e
sustentabilidade na indústria da moda.
Além disso, foram mostradas iniciativas e
novas formas de pensar a indústria da
moda, além dos principais selos usados
por negócios de moda, sobre Fashion Law
e sobre as principais áreas e legislações
que podem guiar uma empresa de moda.

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★ Livro: Ética, responsabilidade social e impactos ambientais, gerados não apenas
sustentabilidade nos negócios pela produção, consumo e descarte de
roupas e outros detritos têxteis, mas
CONSUMO CONSCIENTE, tam-bém pela poluição e degradação de
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL, recursos não renováveis e de
ÉTICA, MODA E ECONOMIA CRIATIVA: biodiversidade causada pelo uso de metais
pesados encontrados nos tingimentos e
MUDANÇAS NO CENÁRIO
processo de estampagem.
Este capítulo aborda as transformações no Entretanto, a questão ambiental se mostra
consumo de moda e, consequentemente, uma questão social e ética na medida em
em seu mercado. Mediante as constantes que o uso de agrotóxicos neuropatológicos
críticas e denúncias de precarização do (de alta periculosidade para a saúde mental
trabalho e impactos ambientais no setor, humana) nas plantações de algodão (fibra
compreendemos que as transformações em natural mais consumida no mundo) vem
curso tornam necessária a adequação das causando um crescente número de
empresas às demandas de um novo suicídios entre os agricultores que
consumidor, mais consciente e politizado. O trabalham e vivem nos entornos de
consumo de roupa e os mecanismos da cotonicultores onde o uso desses pesticidas
indústria da moda, pela proximidade e é comum. De acordo com o relatório
importância da roupa, configuram um bom Fashion Sustain publicado em 2015 pela
exemplo da agência do consumidor e da organização da sociedade civil Forum for
importância da responsabilidade social the Future, com sede no Reino Unido, as
corporativa e da ética como respostas a práticas predatórias da produção do
essas demandas. Foram analisadas algodão implicam o suicídio de milhares de
empresas transnacionais e nacionais em pessoas ao redor do mundo. As estatísticas
suas posturas de implementação de do governo indiano relatam mil suicídios
projetos de sustentabilidade, de ética e de mensais entre os trabalhadores rurais
criação de valor, vetores característicos da envolvidos com o cultivo de algodão; a
economia criativa. Os resultados apontam Organização Mundial da Saúde, por sua
para uma mudança estratégica no mercado vez, afirma que na Índia e na China morrem
e para a politização do consumo como uma anualmente 20 mil trabalhadores por
das principais chaves explicativas para tais intoxicação nas cotonicultores. Nesse
mudanças. Esse cenário é um exemplo sentido, a questão ambiental se transmuta
importante para entender as dimensões em social quando somos intoxicados pelo
atuais do consumo de bens e serviços e, contato com resíduos de agrotóxicos e com
especialmente, como o consumo pode ser químicas provenientes dos processos de
um ato cívico, político e transformador. estampagem e tingimento, encontrados nas
nossas camisetas de malhas, as t-shirts do
A TRANSIÇÃO NO MERCADO DA MODA dia a dia, que costumam pesar por volta de
250 g e consomem 160 g de agrotóxico para
Assim como as áreas de alimentação, serem produzidas.
locomoção urbana, construção civil,
energia e outras, a área de moda também São importantes, também, outras críticas
vem passando por mudanças e direcionadas às práticas da produção e do
adequações. No cenário contemporâneo, mercado e aos aspectos culturais da moda,
seu mercado, entranhas e mecanismos como o uso de pele e pêlos de animais,
estratégicos têm sido repensados. Com a criados em cativeiros e usados como
urgência da questão ambiental, as recursos renováveis não somente pela
constantes críticas sociais à indústria da indústria de alimentos como também na
moda denunciam vários aspectos do setor, indústria do couro e das peles; sua ligação
mas dão especial ênfase a dois pontos com os transtornos alimentares (bulimia e
centrais: suas cadeias produtivas, com anorexia) e, também, a exclusão de pessoas
redutos de trabalho precários, exploração com deficiências físicas, idosos e obesos.
de mão de obra infantil e condições de
Nesse contexto, observamos uma
trabalho análogas à escravidão; e seus
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reconfiguração das denúncias ambientais e potências da economia global. O
sociais, em que as questões ambientais consumidor, dentro desse jogo, ganha um
parecem se mesclar às sociais. A voz peso diferenciado e passa a não ser mais
daqueles que exercem a crítica social, em visto apenas como uma estatística
geral pró-responsabilidade e ética, numérica, demográfica e geracional. Estilos
somou-se à de ambientalistas e, de vida e perfis estéticos e éticos entram em
posteriormente, embora ainda mantido o jogo para entender a nova geração de
formato tradicional de manifestações consumidores.
públicas e boicotes, adotou o buycott como
forma de protesto. Como Portilho nos Mesmo considerando que tratamos aqui de
esclarece, em seus estudos sobre consumo um consumidor informado e com
e cidadania, a distinção entre boicote e posicionamento político e cívico, não
buycott, o boicote ou boicotagem é o ato de desprezamos o fato de que, na moda, a
recusar quaisquer relações com um legião de pessoas a serem vestidas é maior
indivíduo ou uma coletividade (grupo de do que o contingente de consumidores
pessoas, empresa, país etc.) como forma de conscientes que vem se formando na área.
protesto ou coerção a quem se pretenda Assim, consideramos que, apesar da
punir ou constranger a algo, por razões existência de uma questão de classe e de
econômicas, políticas, ideológicas e sociais. diferenciação entre o consumo de massa e
Enquanto o buycott é o contrário e de nicho, não podemos negar que o
refere-se ao ato de comprar como uma consumo é um tema central na sociedade
escolha de compra, em uma determinada contemporânea e, mesmo que apresente
empresa, loja etc., movida por valores e aspectos diferentes do consumo de massa
ideologias. ou do hiperconsumo, é o principal vetor de
transformação dos mercados.
Como boicote e buycott são ações que
envolvem diretamente a compra ou a não A aparência do indivíduo, em tempos de
compra, as relações das manifestações da integração em rede e de hiperconsumo,
crítica social com o consumo, neste caso, ganhou uma centralidade até então não
são explícitas. Assim, o termo “consumo percebida. Nesse sentido, a ideia de moda
consciente” ou, em uma visão mais ampla, a continuou sendo atrelada mais à aparência
“politização do consumo” vem ocupando um do que a qualquer outro atributo humano
lugar de destaque entre as forças da ou área específica, e a ideia do consumo,
agenda social contemporânea. embora mais ampla, passou a acompanhar
as aparências e a moda com uma
Uma vez reconfiguradas sob a luz do proximidade tal que moda e consumo
conceito das questões socioambientais, chegam a ser confundidos. Ainda, como
essas denúncias e críticas vêm trazendo à desde os primórdios do vestuário, ambos
tona uma miríade de informações que se gozem da mesma função de sinalizadores
mostram necessárias ao entendimento do de classe social e funcionam como símbolos
cenário atual do consumo e do mercado de de distinção, como bem enfatiza Bourdieu.
moda. Simultaneamente, essas Portanto, apesar de serem fenômenos
reconfigurações adequaram-se ao formato diferentes, moda e consumo têm atributos
conexionista do mundo: integração em rede, similares e, algumas vezes, entrelaçados.
informação gerenciada em mídias sociais Ambos passaram a ser confundidos,
digitais em que são compartilhados e/ou relacionados, subestimados ou
difundidos documentários, publicações, superestimados e, em tempos de urgências
artigos e matérias de cunho crítico e ambientais, delatados como vilões de
relatórios. Assim, assustadas com todo um impactos socioambientais sem precedentes.
manancial de denúncias, várias empresas A junção consumo/moda tornou-se
de moda, movidas pela necessidade de se responsável pelas milhares de toneladas
adequar a um novo consumidor, anuais de roupas (entre outros detritos
empoderado pelas práticas de boicote ou têxteis industriais, como retalhos, estopas,
buycott, buscam as adequações e as têxteis do segmento de cama, mesa e banho
transformações para sua manutenção em etc.) jogadas nos lixões, pela poluição de
um mercado considerado uma das recursos hídricos fundamentais à
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sobrevivência humana e, especialmen-te, socioambientais e a investimentos em
pela manutenção da precarização do sustentabilidade; e o surgimento de
trabalho nas produções de roupas por meio empresas que trazem, em sua essência, os
da exploração de mão de obra infantil e valores da ética e da sustentabilidade.
execução de práticas trabalhistas análogas
à escravidão, sobre as quais falaremos MODA E CONSUMO
adiante.
Sim, moda e consumo mantêm laços
Entretanto, por ser a “moda” um fenômeno
estreitos. Lipovetsky, que levou a moda à
também ligado às identidades, às
análise filosófica contemporânea, relaciona
inovações, ao novo, ao moderno e ao futuro,
o sistema de moda à dinâmica temporal da
assistimos à emergência de novas formas
modernidade e, em especial, aos seus
de consumo, o que gerou a demanda por
sentidos de efemeridade e obsolescência,
novas formas de criar, produzir e
termos frequentemente associados às
comercializar moda. Novos modelos de
práticas de consumo de moda. Apesar da
negócios bem como novas estratégias
estreita proximidade, constituem-se de
competitivas surgiram no início do século
aspectos socioculturais que se distinguem
XXI, período também chamado por alguns
conforme o momento em que são
atores do campo de “nova era”. Essas
analisados, ou seja, a cada época, moda e
formas implicam o entendimento do
consumo estabelecem novas e distintas
consumo também como uso, no sentido de
relações, que nos apontam como esses
fruição e fim em si mesmo, e se estendem às
fenômenos não são dissociados.
ideologias anticapitalistas, às atividades de
caráter cívico, ético e, finalmente, político. Polêmico, instigante e revestido de
Entretanto, o fenômeno do consumo é moralidades, o consumo de moda parece,
reduzido – de forma geral e, em especial, acima de tudo, misterioso. Embora seja um
nas análises de marketing – a um processo fenômeno social universal e exista desde o
individual, quantificável e de satisfação de início do Renascimento, a moda que
necessidades. O reducionismo da conhecemos hoje, chamada por Campbell
complexidade de um fenômeno como o de moderna, surgiu na metade do século
consumo extrapola as áreas de marketing e XVII, período a partir do qual a moda
migra para a área da economia, em que, na passou a apresentar uma dinâmica de
maioria das vezes, ele é entendido e tempo acelerado, ou seja, rapidez nas
analisado sob uma visão utilitarista, que mudanças da forma, do material e do estilo.
também o reduz a um fenômeno derivado
Vamos mostrar aqui, para não desviar de
da produção, cujo determinismo econômico
nosso foco, duas abordagens importantes
passa por cima dos fatores sociais,
no entendimento da moda: a abordagem
culturais e simbólicos.
sociológica e a antropológica, além de uma
Neste capítulo, os aspectos relacionais e abordagem que vem da filosofia, mas que
mediadores das roupas, em seu consumo e se refere apenas à moda. A sociologia
práticas de uso, assim como o consumo iniciou seu papel na investigação da moda
consciente de moda, servem de base para com George Simmel, que, ainda em 1904,
refletir sobre as transformações no elaborou uma teoria que explicaria então a
consumo e no mercado de moda em geral. moda e sua difusão, o trickle down.
Nosso objetivo é tentar chegar próximo à Construída sob o véu da estratificação
chave explicativa do consumo consciente social, concentrando-se na emulação social
na área de moda, seus desdobramentos e edificando a teoria da verticalização dos
tanto em termos de negócios quanto em gostos, a teoria de Simmel complementa e
termos de produtos. Analisamos, assim, a corrobora a de Veblen, que percebe no
importância do mercado enquanto inserido gosto das classes abastadas uma espécie
no âmbito da economia criativa, de regra normativa a ser seguida pelo resto
alterando-se em função dessa nova da sociedade. Essa teoria se alinha às
percepção; a adesão das empresas a percepções de Bourdieu quanto à noção da
projetos de responsabilidade moda como um campo de lutas de classe e

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de distinção social. A ostentação do status culturais, postula que a explicação para
das classes ociosas e o consumo conspícuo
destas gerou a percep-ção, na sociologia e o surgimento da moda moderna estaria nas
posteriormente nos historiadores, de que o transformações culturais dos valores e
surgimento da moda estaria definitivamente moralidades relacionados ao consumo,
ligado à disputa por capitais simbólicos e à subtraindo, assim como McCracken, o
difusão vertical dos gostos, uma teoria que debate da visão econômica utilitarista
foi explicitamente defendida por Bourdieu, tradicional e posicionando-o numa esfera
mas que não explica o surgimento da moda, mais ampla. Nesse contexto, o início da
ainda no século XIV. aceleração do consumo estaria vinculado a
uma série de transformações nos valores
O contraponto das teorias sociológicas vem morais e éticos que teriam propiciado a
com a abordagem filosófica de Lipovetsky, substituição do ascetismo, característico de
que afirma que o que deu origem à moda períodos anteriores, pelo hedonismo,
foi a soma de vetores culturais atrelado à ambição material e ao sonho de
característicos do Renascimento e ligados opulência e sofisticação. O ascetismo que
ao despontar de uma subjetividade caracterizou esse deu lugar ao poder do
antropocêntrica, que eclipsou a período específico, tido como tradicional
subjetividade teocêntrica, característica da por Campbell, imaginação e do devaneio,
Idade Média. sua ligação com as emoções, sonhos e
fantasias. Assim, o consumo de moda, para
A antropologia, por meio dos estudos de o autor, vale-se do hedonismo imaginativo
Colin Campbell e Grant McCracken, dissocia contemporâneo.
o surgimento da moda dos modelos de
emulação e estratificação associando-os à Também no escopo da antropologia, nas
cultura, como o fez Lipovetsky. Entretanto, pesquisas de Douglas e Isherwood,
ambos fazem suas considerações com base compreendemos que as “coisas”, ou
no fenômeno de crescimento do consumo mercadorias, no caso roupas e objetos da
no século XVII, período em que a forma de moda, são neutras. As relações que essas
consumo de moda assume um diferencial coisas medem são as que importam, pois,
significativo. De acordo com McCracken, ao serem usadas, podem significar, ou
essa nova forma de consumo, chamada funcionar, como barreiras ou pontes entre
moda, seria o substituto moderno da pessoas e/ou grupos. Nesse sentido, o
pátina: um padrão estético permeado de filósofo Svendsen também confere ao uso o
valores de tempo, coberto por camadas de papel de principal agente relacional das
anos, usado pelas classes dominantes para roupas e argumenta que, em seus
mostrar seu “valor distintivo”. A pátina significados durante o uso, elas apresentam
constituiu um sistema de consumo que tanto as barreiras que afastam quanto as
garantia a manutenção das distinções pontes que aproximam,
sociais, mas que se verá eclipsado pelo concomitantemente.
valor da novidade, que fez da moda um
novo sistema de consumo. McCracken Dentre as várias subáreas dos estudos da
considera, sobretudo, a cultura como a cultura material, os estudos do consumo e
grande diretriz moduladora do consumo; uso de roupas e de moda relacionam
assim, ele revisa a teoria de Simmel, objetos a pessoas por meio do uso de uma
mostrando que o movimento de cascata linguagem simbólica e como forma de
também poderia ser ascendente, num comunicação e interação social.
movimento que o marketing Consideramos o consumo de moda como
contemporâneo chama de bubble up, ou um dos principais aspectos da construção
seja, os mais pobres também são copiados de identidades, em que roupas e acessórios
pelos mais ricos e vice-versa, num também são manipulados no sentido de
movimento contínuo de ascendência e estabelecer fronteiras, distinções e
descendência das cópias e imitações. identidades. Dessa maneira, a análise do
consumo de moda tem um papel
Campbell também baseado nos padrões fundamental na análise da reprodução

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social, da construção das identidades e das fashion nos anos 2000. Entretanto, a moda
formas de comunicação das hierarquias não é só luz, também tem outro lado, áreas
sociais. sombrias que mostram impactos
ambientais e sociais de vastas
As interfaces sociais e antropológicas entre consequências; áreas férteis para a
consumo e moda possibilitam-nos perceber disseminação da miséria em toda a sua
dimensões tanto do sentido moralmente amplitude – da questionada “falta” de
negativo atribuído ao consumo e, em geral, valores das classes dominantes globais e
à moda, quanto do prazer, atribuído ao locais à miséria material de povos
consumo contemporâneo, ao glamour da considerados pobres.
moda e a seu lado “sonho”. Tais interfaces
indicam que a moralidade do consumo de A MODA E A SOMBRA
moda depende, sobretudo, das
representações dela na vida social. Para pensar o fenômeno da moda e do
consumo de roupas de forma mais
Sendo assim, para discutir consumo de abrangente, é interessante entender que,
moda e adentrar suas alterações e atualmente, a grande contradição no
desdobramentos, como o consumo campo da moda é que ele, bem como as
consciente, é necessário, antes, entender empresas nele inseridas, apresentam
que a relação entre moda e consumo se facetas distintas, muitas vezes dicotômicas.
deu por inúmeros fatores. Entretanto, Se, por um lado, luz, glamour, modernidade
reconhecemos que aqueles relacionados à e sonho; por outro, sombra, escravidão,
genética da própria moda foram os mais exploração, poluição e miséria, como
importantes. A lógica efêmera da moda, seu veremos.
caráter relacional e distintivo, e sua estreita
ligação com a identidade são aspectos que O mercado de moda, que fez o termo
se construíram e fortaleceram juntamente “indústria da moda” ser usado como
com os valores da modernidade. Contribui substituto do termo “indústria têxtil”,
para esse amálgama o aumento do apresenta a contemporaneidade da
consumo e, consequentemente, da flexibilização, ou seja, empresas que
atividade de “compras”, a partir do século trabalham dentro do conceito de economia
XVII, período determinado por Campbell flexível, com fábricas espalhadas pelo
como aquele da moda moderna. globo, matrizes e filiais em pontos
estratégicos e um sistema de gestão
Entretanto, foi apenas no século XX, com o totalmente baseado em redes de tecnologia
surgimento do negócio da moda, da informação que gerenciam estoques,
especificamente por meio da criação, produção e lançamentos de roupas e
regulamentação e legitimação da acessórios desde a década de 1980, o que
alta-costura na França, que moda e possibilitou o agigantamento dos grandes
consumo se amalgamaram, abrindo áreas varejistas globais. Nesse mesmo contexto,
de intervenção na sociedade. Essas temos avanços em termos de inovações,
intervenções nos propiciaram a como impressoras 3-D têxteis e tecidos
possibilidade de globalização dos jeitos de tecnológicos, que beneficiam tanto a área
vestir e, posteriormente, a possibilidade do esportiva como a área da estética e da
estilo próprio, com a chegada do medicina; ainda existe a liberdade criativa,
movimento do prêt-à-porter, de seus o glamour dos desfiles, a idolatria a seus
negócios e da produção em escala de ícones fashionistas, como top models e
roupas em tamanhos e, especialmente, diretores artísticos (como são chamados
estilos diversos. hoje os estilistas), e a incon-dicional
possibilidade de representações livres e de
Essas áreas iluminadas da moda
comunicação que a roupa, inserida no
manifestaram a voz da juventude dos anos
contexto da moda, torna possível.
1960, a subversão punk dos anos 1970, a
explosão das marcas e do consumo nos No entanto, esse campo apresenta um dos
anos 1980, a angústia gótica dos 1990 e a maiores flagelos das sociedades
democratização, inquestionável, do fast
GESTÃO DE MODA | | 12
contemporâneas: condições de trabalho produção, lançamento, comercialização e
questionáveis e obscuras que remontam à consumo acelerado de roupas barateadas
Revolução Industrial e às tecelagens e, frequentemente, descartáveis, presentes
inglesas, as quais, já no século XIX, usavam na maior parte dos varejistas globais de
mão de obra infantil e exploravam ao moda, esse sistema caracteriza-se pelos
máximo seus trabalhadores, a maioria deslocamentos produtivos para onde se
mulheres jovens. Tais fatos continuam produz mais roupas (e outros) por um preço
ocorrendo, entretanto, não mais em menor. Seu modelo de negócio trouxe uma
território britânico ou em territórios nova realidade: a tônica das tecnologias da
europeus ou norte-americanos, principais informação, os intercâmbios econômicos e
redutos das marcas de moda. Há sociais e a flexibilização do trabalho. Tais
aproximadamente três décadas, tais dispositivos encurtaram as distâncias entre
práticas migraram para o sul, para o cerne as produções e reorganizaram a lógica
de países em desenvolvimento ou, para ser competitiva dos negócios.
mais clara, para países pobres.
Hoje, esse sistema vem passando por
Isso aconteceu da seguinte forma: desde o severas críticas baseadas, especialmente,
final dos anos 1980 e começo dos anos 1990, em dois pontos: uma economia flexível do
assistimos a grandes mudanças na gestão século XXI e uma produção fordista, nos
empresarial das empresas de moda, que se modelos do século XIX, obscurecida pela
tornam flexíveis, móveis e terceirizam suas luminosidade do branding das empresas de
produções, transferindo custos e moda, das digital influencers da moda (ou
responsabilidades. Tais transformações blogueiras) e de toda a mídia que essa
foram consequências naturais do sistema indústria gera diariamente. Ou seja, os
capitalista global, em busca de maior lucro princípios organizacionais, como o sistema
em um menor espaço de tempo e, também, just in time, diminuem cada vez mais o
de não arcar com os custos que a tempo que engloba a cópia dos
implantação de novas legislações lançamentos das marcas europeias, a
trabalhistas e ambientais europeias produção externa, a distribuição, o
acrescentaram a partir dos anos 1990. Tais lançamento, o consumo e o descarte de
mudanças alteraram todo o mercado da produtos de moda. Entretanto, os
moda barateando bens de vestuário e mecanismos e a prática da produção
acessórios, ampliando a difusão de estilos e locada no Oriente e nos países pobres em
elevando em muito o consumo de roupas. geral apresentaram-se muito distanciados
do conceito de flexibilização pregado,
No período entre 1980 e 2016, instauraram-se adotado e difundido pelas empresas por
no mercado mecanismos para baratear os meio da construção da imagem de suas
produtos de moda que constituem o marcas. Condições de trabalho análogas à
chamado sistema fast fashion, ou moda escravidão, uso de mão de obra infantil e
rápida, um sistema baseado na cópia, na uma poluição ambiental que só não é maior
produção e no consumo acelerado de do que a do setor de petróleo e gás
roupas baratas e descartáveis. Esse sistema mostraram-se como o outro extremo da
busca o menor custo, em um menor espaço modernização estrutural dessas empresas e
de tempo de fabricação, distribuição e geraram novas críticas sociais, que se
venda, baseando-se em trabalho precário concretizariam a partir da década de 1990.
(muitas vezes, em condições análogas à
escravidão); na promoção do hiperconsumo Nos últimos 20 anos, os negócios da moda
e do descarte rápido de roupas e, reconfiguraram-se em conglomerados
consequentemente, no consumo de empresariais, ou seja, grupos econômicos
recursos naturais em escala vertiginosa, detentores de um portfólio de marcas de
com impactos ambientais de grande moda, e viram o agigantamento dos
extensão; e, ainda, na padronização do varejistas globais. O agigantamento dessas
corpo e na difusão de uma sutil empresas e grupos, em parte,
homogeneização do parecer promovida caracterizou-se pela grande integração das
pelas mídias de moda. Baseado na cópia, tecnologias da informação em seus

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processos tanto produtivos como design, por sua vez, pode ter sido criado na
gerenciais, tanto midiáticos como de Itália, e assim por diante, o que caracteriza
interação com o consumidor. Para anunciar bem o deslocamento produtivo, não apenas
e divulgar semanalmente novos produtos e direto, relacionado à produção das peças,
incentivar seu consumo, campanhas são mas também indireto, considerando-se a
feitas em redes sociais; desfiles são origem das matérias-primas. Esse conjunto
transmitidos ao vivo; ações de marketing, de deslocamentos produtivos, ou seja, a
como patrocínios e/ou parcerias, são constatação de que um único produto pode
realizadas com marcas internacionais, conter elementos oriundos de vários países,
atletas e equipes esportivas em geral e é uma das características do sistema de
grupos de subculturas urbanas; seminários produção pós-fordista. Entretanto, a
empresariais, financiados pelas próprias maioria de nossas roupas é produzida em
marcam para discussão de seus cases, são série, obedecendo a uma combinação das
montados etc.; revistas, jornalistas, lógicas “fordista e pós-fordista” de
catálogos, glamour, festas, top models, produção. Para melhor explicar como esse
fotógrafos famosos, atrizes, atores e demais sistema funciona na fabricação de uma
celebridades integram o casting – o mundo roupa, é importante entender que a roupa
fashion é visível e conectado. que compramos em varejistas globais é, em
geral, confeccionada por fábricas
Entretanto, essas empresas não terceirizadas e quarteirizadas, nem sempre
apresentam em suas cadeias produtivas a legais, nem sempre visíveis, pois não se sabe
mesma visibilidade fundamentada e onde se localizam exatamente; por adultos
conectada que mantêm em seus modelos e crianças sentados em máquinas de
de negócio e em suas ações de branding e costura, executando funções rotinizadas,
marketing. Logo, o que os mais importantes dentro de linhas de produção rígidas, com
e volumosos negócios da moda nos uma quantidade excessiva de horas de
mostram como parte de suas trabalho e, geralmente, em ambientes
modernizações mantém-se, por outro lado, insalubres e desprovidos de qualquer tipo
atrelado à estrutura fordista de produção, de segurança contra incêndios,
mesmo que inserido no modelo keynesiano desabamentos e alagamentos, entre outros.
de gerenciamento. Essa estrutura é invisível, Esse tipo de produção em série e rotinizado
desterritorializada, longínqua. São milhares é análogo ao regime fordista, enquanto o
de cadeias têxteis de confecção de roupas, deslocamento produtivo e a super
tecidos, tingimento, estamparia e bordados, aceleração da produção são característicos
em que a mão de obra é análoga à do pós-fordismo e da flexibilização da
escravidão. produção.

Além disso, a atuação midiática dessas O uso de mão de obra em subcondições,


empresas parece impactar culturalmente a especialmente a feminina, assim como mão
sociedade, em especial as adolescentes, de obra infantil, não é exclusividade das
institucionalizando o culto à magreza cadeias têxteis, mas um problema
mórbida e fomentando transtornos recorrente em países pobres, em especial
alimentares como anorexia e bulimia. Ainda, nos setores de agricultura e mineração. No
a maioria dessas empresas parece caso das cadeias têxteis, o uso de mão de
compreender a questão ambiental e o obra infantil e em subcondições é
impacto de suas produções como encontrado tanto na agricultura,
externalidades. diretamente ligada à moda por conta do
cultivo das fibras naturais, como o algodão,
Se pararmos para olhar as etiquetas de a lã e a seda, quanto na área da fabricação
nossas roupas, constataremos que, de roupas. De acordo com a Organização
provavelmente, uma parte de nossa Internacional do Trabalho (International
vestimenta foi fabricada em algum país do Labour Organisation), a eliminação do uso
Oriente; que o tecido, embora não esteja de mão de obra infantil na indústria têxtil
escrito na etiqueta, pode ser oriundo do ainda é um dos maiores desafios mundiais.
Paquistão; o metal do fecho vem do Chile; o Devido à dificuldade de monitorar
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subcontratações, trabalhadores indiretos e têxteis globais endossam e justificam uma
trabalhadores externos (aqueles que severa crítica social à moda: seres humanos
trabalham em suas próprias residências), explorados nos países em desenvolvimento,
mesmo a mais bem-intencionada das excluídos da legitimação dos direitos
marcas, se não dispuser de profissionais trabalhistas e sindicais; suicídio de
que façam o rastreio e a supervisão de agricultores contaminados pelos
todas as atividades da cadeia, pode agrotóxicos usados nas cotoniculturas e um
estimular esse flagelo. A mão de obra cenário de degradação ambiental
feminina, por não ter nenhuma ou quase contundente, que se estende da agricultura
nenhuma qualificação, é bastante ao volume de roupas descartadas
vulnerável a várias formas de abusos. Essas anualmen-te. Com esse cenário,
mulheres, frequentemente, não sabem ou adentramos o terceiro milênio: miséria,
não são capazes de requerer seus direitos poluição e degradação ambiental e
como trabalhadoras. humana constituindo o lado sombrio da
iluminada e glamourosa moda.
De acordo com o Departamento Americano
de Trabalho, os países considerados “em O fato de existir, simultaneamente, um
desenvolvimento” são responsáveis por cenário grave de degradação ambiental e
aproximadamente 75% das roupas humana (oriundo de um microssistema
produzidas no mundo. Em países como fordista de produção, que, por sua vez, se
China, Índia, Nepal, Tailândia, Malásia, encontra dentro de um cosmo maior de
Jordânia e Argentina, encontram-se mão de produção global flexibilizada), de consumo
obra infantil e trabalho forçado na hedônico e de estruturas empresariais
confecção de roupas, sapatos, artigos de flexíveis, é um dos que melhor nos ajudam a
couro e bordados. A Organização compreender a emergência de novas
Internacional do Trabalho considera que a denúncias e novas críticas sociais ao
área têxtil é a que apresenta a maior segmento, o que, em grande parte, explica
concentração de trabalho em as mudanças de padrões no consumo de
subcondições. Esse tipo de trabalho tem moda.
sido caracterizado por vários organismos
internacionais como análogo à escravidão, O CONSUMO CONSCIENTE NA MODA, A
sendo hoje considerado como a forma IMPLICAÇÃO FUNDAMENTAL
moderna de escravidão.
Em geral, nas lógicas do funcionamento do
O consumo, por sua vez, flexibilizou-se mercado de moda, o consumidor é visto
tanto nas práticas de compra (podemos como um ator econômico específico,
escolher produtos altamente diferenciados baseado em premissas hedonistas (a roupa
de várias marcas, cores, tamanhos e estilos bonita que dá prazer) e funcionais (a roupa
e comprá-los e pagá-los usando diferentes necessária às adequações sociais ou
tecnologias, como as de e-commerce) físicas, tais como proteção etc.). Entretanto,
quanto nas práticas de uso (podemos fazer o consumo de moda parece não funcionar
inúmeras combinações daquilo que apenas no mercado, ou seja, apesar de
usamos), no desejo que inspira o consumo suas lógicas e da forma pela qual o
(sonhamos, imaginamos e associamos mercado entende o consumo de moda, este
experiências imaginárias com o desejo), parece apresentar características que
resultante, sobretudo, do hedonismo fogem ao entendimento utilitarista,
imaginativo postulado por Campbell. estatístico e, muitas vezes, engessado do
mercado.
Nos últimos 40 anos, as denúncias à moda
vêm se transformando em função da Para compreender as mudanças no
reformulação do contexto ambiental e das consumo de moda, apoiamo-nos nas
lutas sociais. Atualmente, tanto os reflexões teóricas sobre a ambientalização
impac-tos ambientais, o consumo de e politização do consumo recentemente
recursos naturais e o descarte de produtos emergidas dos movimentos democráticos
quanto os aspectos sociais das cadeias de ampliação da cidadania. Segundo
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Portilho, o conceito de “cidadania e materiais orgânicos ou agroecológicos,
participação política não é apenas ligado à comercializadas no contexto de
estrutura formal da sociedade, mas também movimentos como o fair trade, ou dentro
às práticas sociais e culturais que dão dos conceitos de reuso ou upcycle,
sentido de pertencimento e identidade proposto pelos brechós, entre outros
social”. Nessas reflexões, as práticas de exemplos.
consumo são compreendidas como formas
de materializar valores e preocupações Nesse novo cenário, as críticas dirigidas à
ambientais e sociais, logo, elas nos são moda, à indústria têxtil e ao consumo de
preciosas no entendimento das mudanças moda ampliaram-se e tornaram-se mais
do consumo. Para entender as mudanças robustas com o processo de politização do
que o mercado vem apresentando, consumo, fazendo surgir um novo
apoiamo-nos no conceito da nova comportamento de consumo de moda que
sociologia econômica, que considera que as escapa das análises que desconsideram os
empresas nascem e se constroem movimentos maiores dentro desse contexto,
socialmente com base nos contextos como os movimentos anticonsumo e
culturais, morais e sociais em que emergem. anticapitalistas.

Na última década, pessoas comuns, não Para pensar o cenário atual do mercado de
necessariamente ligadas a associações, moda e da moda não podemos apenas
instituições, ONGs e/ou movimentos sociais, analisar o consumo, temos também de
aderiram às ideias e percepções de avaliar a produção. Dessa maneira, o
consumo de movimentos como o slow caráter ativista do design, evidenciado nas
fashion, o fashion revolution e outros posturas do movimento slow fashion
ligados ao consumo consciente. Enquanto quando este aborda a interação
consumidores, passaram a aderir e a criar produção/consumo, precisa ser
manifestações e frequentes campanhas de considerado. A produção global de roupas
boicote às marcas de moda que tenham vem apresentando mudanças no sentido de
produção baseada na precarização do tornar-se mais responsável, como veremos a
trabalho, na degradação ambiental e/ou no seguir; entretanto, o slow fashion é o
uso de peles e pelos animais. Essas pessoas movimento que melhor congrega todas as
vêm apontando a falta de ética da indústria mudanças propostas de Responsabilidade
da moda e reformulando, ainda que Socioambiental Corporativa (RSC) e que
lentamente, o consumo de roupas. melhor se vale de toda abordagem ética no
setor. Ele não é tão simples quanto parece,
Ainda sobre esse tema, entendemos que nem é apenas o outro lado do fast fashion,
existem tensões entre o que é percebido apesar de ter surgido como uma
como uma questão ética e o que é contratendência ao fast fashion, posto que
percebido como uma questão estética. Essa “devagar” (slow) é o antônimo de “rápido”
tensão vem permeando tanto a produção (fast), logo, a antítese. Portanto, é
como o consumo de moda e traz à tona o fundamental que também consideremos o
termo eticização. Tal termo foi usado pela slow fashion como um movimento que vai
antropóloga Lívia Barbosa em relação à além do antagonismo ao fast, mas que
comida, já estetizada pelos chefs e pelas funciona como um guarda-chuva ideológico
tendências gastronômicas atuais e que, de todos os movimentos que integram ética
agora, vem ganhando dimensões éticas social e ambiental à moda, como moda
relacionadas à origem, à saúde, à sustentável, eco moda, moda ética etc., e
sustentabilidade e ao bem-estar animal. que congrega, também, uma proposta de
Poderíamos, então, por analogia, também solução, tanto ideológica quanto prática,
falar de um processo de etnicização no para o mercado.
campo da moda. O termo nos ajuda a
conceituar o recente movimento que Na tentativa de encontrar uma chave para
concerne ao “vestir ético”, ou seja, aquele explicar o surgimento de um movimento de
que envolve roupas produzidas em cadeias produção e consumo de moda que
de produção sustentáveis, feitas com confronta o mainstream e entender as

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novas formas de consumo de moda, “consumo artesanal”. Talvez possamos
precisamos adentrar os fluxos do mercado afirmar que a percepção deles foi
de moda. A lógica do mercado dos últimos deslocada para outros sentidos e valores
20 anos viu-se contestada por um nicho de dos produtos e, portanto, do consumo de
consumidores que não concordavam com moda.
ela e que também se opunham a ser
circunscritos à esfera de sua dominação. A Para entender as alterações no consumo de
partir dos anos 1990, e especialmente da moda ligado não apenas à compra de
primeira década do século XXI, um roupas e acessórios mas à aparência do
movimento crítico formado por indivíduo contemporâneo, precisamos ir
consumidores que, sentindo-se presos além das abordagens economicistas,
numa estética singular pluralizada, baseadas na análise de um indivíduo
dominada por forças econômicas e por isolado, racionalizado e independente, e
diretrizes que normatizam o pluralismo de daquelas marxistas e frankfurtianas, que
estilos, tornou-se central na crítica à lógica criticam a supremacia do mercado sobre o
do supermercado e do self-service na Estado e a vida pública, destituindo o
moda. indivíduo de uma autonomia mais profunda
em suas escolhas. Os fenômenos de
A padronização do estilo próprio fez surgir alteração do consumo de moda estão
no campo da moda o mote “tudo sempre ligados à reprodução social e à produção
novo de novo”, ou seja, a padronização da da cultura, logo, ressaltam a necessidade
diversificação, que, embora controversa, de uma análise sociológica e, também, de
passou a existir, pois se padronizou em uma abordagem culturalista.
massa o novo: “a moda está na moda”,
afirmavam as mídias. Na ânsia de se opor O surgimento desse consumidor na área de
ao consumo de diversas mercadorias que, moda confirma a construção de uma nova
mesmo com o caráter de “diversificação”, cultura de consumo, em que o mercado é
atingiram a padronização das mercadorias ressignificado com base em valores e
“massificadas”, esse consumidor escolheu o escolhas individuais. Relacionamos essas
que não estava na moda ainda. Ele mudanças com o surgimento de novos
escolheu fazer um investimento em sua movimentos sociais e econômicos, como
individualidade. economia solidária, comércio justo,
indicação geográfica e slow food, os quais,
Possivelmente, o que entrou em jogo nesse segundo Portilho, são movimentos que
momento foi uma mudança de paradigma constroem uma nova cultura de ação
na percepção do consumidor: o des política e visam à reapropriação do
fetichismo do produto, ou seja, o retorno ao mercado com base em valores próprios, tal
produto em si e o retorno ao “eu”, não mais como o faz o slow fashion. Tais movimentos
aquele eu do individualismo, mas o eu da têm sido considerados novos atores
individualidade. estratégicos no mercado e estão presentes
também no mercado de moda.
Inseridos em um tempo de complexidades,
conectividades e globalização, esses É preciso considerar que, na moda, esse
consumidores contestaram a invisibilidade movimento foi construído em um âmbito
da produção e, assim, passaram a escolher maior do consumo em geral. Contribuíram
produtos que estreitam as esferas entre o para isso os movimentos de consumidores,
consumo e a produção, ou seja, roupas e tais como os movimentos de defesa dos
acessórios que tivessem, além de atributos direitos dos consumidores, ou
estéticos, origens visíveis ou reconhecíveis. consumerismo; os movimentos
Procuraram por produtos que anticonsumo, atrelados à crítica à
apresentassem, para eles, valores preciosos, “sociedade de consumo”; os movimentos
como os produtos orgânicos, artesanais, pró-consumo responsável, que se propõem
oriundos do fair trade, encontrados em a construir uma nova cultura de ação
brechós, herdados de família ou feitos por política por meio das práticas de consumo.
eles mesmos, o que Campbell chamou de A ambientalização e a politização do

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consumo, ou seja, a percepção e o uso das na eficácia de suas ações.
práticas de consumo como formas de
materializar valores e preocupações Embora não exista uma concordância geral
ambientais e sociais, também são centrais entre os autores desse campo, a politização
na compreensão de uma nova cultura de do consumo pode representar novas formas
consumo de moda. Entretanto, dentre esses de participação política, equivalentes ao
movimentos, destacamos que, voto, aos protestos de rua ou a campanhas
possivelmente, foram os de conscientização para algum candidato. Considerando as
e ambientalização do consumo, emergidos divergências discursivas e conceituais em
dos movimentos democráticos de torno da conscientização e politização do
ampliação da cidadania, como já vimos, consumo, acreditamos que a
que contribuíram para o surgimento de um ressignificação do produto e das práticas
novo consumo de moda. de consumo de moda com base em valores
éticos se apresenta, hoje, sob várias formas:
A transformação da esfera do consumo fala-se em vestir ético, verde, sustentável,
individual em materialização de valores, crítico, responsável, consciente, político ou
virtudes e ética no consumo de moda cidadão, da mesma maneira que se
reconfigura o caráter de individualismo debatem as várias vertentes discursivas do
desse tipo de consumo nas últimas décadas consumo consciente e crítico, responsável
do século XX. Parte das esferas do consumo etc.
de moda desloca-se da busca por status,
ou da reprodução das estruturas sociais As possibilidades de lutas e bandeiras que
distintivas, e migra para a esfera de essas formas de consumo de moda
produção individual de significados outros, agregam vão desde aquelas do veganismo
como ética e virtude, materializadas às de defesa do consumidor, da pegada
publicamente na aparência. ecológica e aquecimento global às relações
sociais envolvidas na produção. Embora os
Possivelmente, no lugar da exibição pública movimen-tos na moda que se ocupam
competitiva de estilo próprio e distinção desses temas se confrontam
social, o consumo de moda pode, também, discursivamente – tais como aqueles da
ser uma prática individual, que confere área dos estudos do consumo –, todas as
visibilidade pública às estruturas de valores noções de práticas de consumo de moda
como solidariedade, responsabilidade que fogem ao fast fashion ou não se
socioambiental e ética. Nesse contexto, a encontram circunscritas nos ditames do
incorporação desses valores nos discursos mercado podem estar localizadas sob o
das aparências e nas práticas de consumo guarda-chuva do consumo político, uma
de moda pode ser percebida como uma nova forma de fazer política por meio das
forma inovadora de ação política e interlocuções, ou negociações, entre as
participação na esfera pública. Essa esferas do privado e do público. Essas
incorporação confere ao vestir um novo negociações, presentes nas práticas
sentido de consumo: participação política. alternativas de consumo, produção e
reprodução de moda, apresentam um grau
Segundo Portilho, podemos rastrear de autenticidade e de crítica, que se
algumas características dos consumidores configuram como uma forma de agência
políticos: grande envolvimento em causas e social. Nessas novas formas de consumo
questões socioambientais; apropriam-se de estão inseridos os boicotes e os boycotts.
responsabilidades e obrigações em relação Dessa maneira, as alterações e
à melhoria do meio ambiente e da alternatividades no consumo de moda
qualidade de vida; não se apresentam, representam um deslocamento perceptivo
necessariamente, engajados em causas ou do consumo, da produção e,
movimentos sociais institucionalizados; principalmente, da cidadania. Essa
escolhem agir na esfera do consumo em vez representatividade pode estar construindo
de agir por meio de ações políticas um novo consumo na área de moda, pois
convencionais; identificam-se como atores ele significa a desestabilização das lógicas
sociais e, finalmente, acreditam no valor e que permeiam esse mercado específico.

GESTÃO DE MODA | | 18
Em muitas formas de consumo alternativo opressão da massificação do fast fashion e
existem, em graus diferentes, tentativas de de escolha pelos mercados alternativos ou
estabelecer uma relação direta com a por práticas alternativas ao mercado em
mercadoria. Tais tentativas podem ter como geral, esse consumidor não deixa de ser um
objetivo aguçar a percepção do “risco” e a consumidor de moda, pois a moda não está
percepção de que já não se está apenas no mercado, mas também na
controlando o próprio mundo material, mas expressão da aparência. Por meio de uma
o todo, o coletivo. A expansão da cultura singularização real, ele exerceria a
levou a uma separação entre as esferas de liberdade de escolha e poderia, enfim,
produção e consumo. No entanto, também exercer livremente sua liberdade estética,
serviu para sinalizar que as fronteiras fora dos parâmetros do in e do out da
simbólicas que têm definido o “consumidor” cartilha do mercado de moda.
como uma identidade econômica
específica, que vive em um mundo Esse empoderamento leva também a outras
particular, onde a produção foi removida, dimensões: ao escolher conscientemente
estão sendo desestabilizadas. uma roupa feita pela costureira, ou uma
roupa feita com tecido orgânico, ou uma
Como afirma Sassatelli, as práticas de peça de brechó, ou uma roupa herdada, em
consumo, apesar de não serem todas de detrimento da roupa do grande varejista
cunho político, compõem o repertório fast fashion, ele estaria colaborando para a
contemporâneo de participação política. Os diminuição dos trabalhos em regime
discursos construídos pela “crítica social ao análogos à escravidão, com a conservação
consumo”, não perdendo de vista as do meio ambiente, a melhoria da qualidade
escolhas estéticas, construíram a de vida do coletivo e do planeta e, até, com
identidade de um consumidor político, a valorização do conceito de moda.
promovendo novos princípios e visões de
qualidade e, especialmente, mobilizando Neste ponto, ao que tudo indica, todos os
consumidores, aproximando-os da natureza termos relativos à conscientização do
e de valores pessoais distintos do mercado, consumo, guardados sob o guarda-chuva
e legitimando-os como atores sociais. conceitual do consumidor político,
representam a agenda social
Considerando o consumo político como contemporânea; logo, é possível que essas
uma forma de empoderamento, talvez novas formas de consumo sejam a chave
possamos compreender melhor o conceito para uma crescente etização do mercado.
de consumo autoral, de Morace, e da Em um sentido mais amplo, o consumidor
experiência ativa que este pressupõe. político, seja na moda, seja em outras
Morace, que dirige uma agência italiana de instâncias, parece figurar como um dos
estudos de consumo e tendências, com principais atores sociais na produção de
grande foco em moda, atribui ao transformações do mercado, daí ser tão
consumidor a dimensão de autor com voz comum o compreendermos, também, como
ativa nas suas escolhas e, também, de um consumidor “ético”.
recusa à opressão de um consumo
massificado. Trazendo esse tema para a Talvez por ter como lógica a mudança e o
esfera do consumo de moda, o consumidor novo, e a exemplo de outros setores, embora
teria voz ativa nas suas escolhas e seria um em menor grau e com menos frequência,
ator importante na recusa à opressão da algumas empresas de moda, a partir do
pressuposta “ditadura” da paradoxal início dos anos 2000, reavaliaram e vêm
pluralidade de estilos, assim como na reavaliando sua postura e direcionamento
recusa à inconsciência daquilo que é velado no mercado, adotando posturas de
na produção e no consumo mainstream em responsabilidade socioambiental, visíveis
favor de uma experiência particular, tanto nas etiquetas de seus produtos
autêntica e ativa, que pressupõe as quanto nas mídias que os divulgam. Por
experiências estéticas íntimas e a meio das tecnologias de informação e de
politização do consumo, postulada por integração na comunicação com seus
Sassatelli. Ao exercer seu poder de recusa à consumidores, às novas estratégias

GESTÃO DE MODA | | 19
competitivas das empresas de moda cabe globalização e a saturação de ofertas de
assumir a responsabilidade por algumas acesso instantâneo a milhares de produtos
externalidades, como poluição de efluentes, e serviços criaram níveis de expectativas
consumo de água e energia, e, sem precedentes. É nesse cenário que surge
especialmente, a precarização das o consumidor consciente. As críticas aos
atividades humanas em todas as cadeias impactos ambientais e sociais que o setor
produtivas têxteis, que não são poucas. vem recebendo se configuram como uma
Segundo Ashley, as empresas que adotam mudança importante na percepção do
tais posturas visam agir de forma proativa consumidor e, especialmente, na sua
na busca das oportunidades geradas pela formação.
maior consciência sobre as questões
culturais, ambientais e de gênero, pela Segundo Robin Lewis e Michael Dart, o setor
antecipação, evitando confrontos com passa por uma mudança estrutural e
futuras regulações governamentais fundamental, e o impacto dela é tão
restritivas à ação empresarial, e pela profundo que 50% dos varejistas de bens de
diferenciação de seus produtos diante de consumo não sobreviverão nos próximos
seus competidores menos responsáveis. anos. Entre as forças por trás dessas
mudanças, os autores identificam a
Nesse ponto, compreendemos que o necessidade de visibilidade das cadeias
consumidor não desempenha apenas o produtivas e do valor a elas atribuído, assim
papel circunscrito na compra, antes, ele se como os cuidados com a questão
posiciona ideologicamente em relação ao ambiental. Tais ideias e previsões de Lewis e
mundo e, nesse posicionamento, define o Dart congregam respostas às críticas das
que consome, quando e onde. É nesse últimas décadas e apontam a incorporação
contexto, para adequar aos novos de seus temas por meio de novas posturas
consumidores e escapar de toda e qualquer em relação à sociedade. Na intenção de
denúncia e crítica, que as empresas vêm reverter o quadro recessivo pelo qual os
começando a compreender a necessidade autores acreditam que o varejo das
de alteração em seus processos e de se empresas de moda esteja passando, ambos
transformarem. reconhecem a necessidade de adequação a
um novo consumidor, para quem a compra
Tais adequações e transformações, que passa a ser uma atividade política
locam sustentabilidade e ética nos importante. Os autores, assim como outros
negócios, seriam também respostas às pesquisadores, compreendem que a
críticas e denúncias, dentro do quadro representatividade política do consumidor
teórico de Boltanski e Chiapello; a escapa às análises tradicionais (utilitaristas
incorporação desses temas pelo mercado, e e economicistas) e se faz presente na
por todo o campo do design de moda, regulação das empresas, o que faz com que
reflete não apenas a incorporação de considerem o poder do consumidor e,
décadas de crítica e uma resposta a elas ainda, que este poder deriva da
mas também uma nova postura em termos conectividade deste ator e de seu acesso à
de ativismo e consciência coletiva. informação.

Entretanto, o mercado de moda apresenta Com normatizações ambientais insipientes


diversas facetas. O varejo, principal e legislações trabalhistas e ambientais que
segmento do mercado, mantém seus fogem ao controle do Estado, além da
padrões tradicionais de produção e ausência de políticas públicas que regulam
comercialização em quase todo o o mercado e as atividades fabris e de
segmento. Esses padrões vêm sendo serviço da moda – como tinturarias,
considerados obsoletos pelas instâncias estamparias, confecções e facções, entre
críticas da moda, que apontam soluções outros menos centrais –, o papel da
para o possível colapso do varejo de moda, politização do consumo no Brasil e nos
segmento que vem passando por demais países em desenvolvimento é
mudanças significativas nas últimas essencial. Nesse sentido, os autores
décadas. A evolução da tecnologia, a entendem que os consumidores que têm

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suas necessidades básicas atendidas estão do bom design de moda. Assim,
procurando algo além de apenas adquirir consideramos que, além das novas formas
mais coisas; saciados, estão se de consumo, a área do design e seu papel
preocupando cada vez menos consigo na produção dos produtos também têm
mesmos e cada vez mais com a comunidade uma implicação nas mudanças em curso.
e o bem comum.
Considerando os aspectos acima, e para
Reconhecendo as variáveis culturais chegar aos nossos resultados, fizemos uma
envolvidas nesse tema, entendemos que, à análise geral do mercado. Nessa
medida que os varejistas implementam averiguação, percebemos que o conceito de
regras desprovidas de atenção às RSC, além de ter se expandido para a área
demandas da agenda social, apenas as ambiental, apresenta, em vários casos,
marcas que carregam significados ações e projetos que se relacionam com
verdadeiros na percepção dos termos como economia criativa, logo com
consumidores sobreviverão. Dentre os compartilhamento e, especialmente, criação
valores reais identificados, há ênfase na de valor.
experiência, na autenticidade (exclusividade
e customização), na comunidade, no O surgimento de novas marcas (éticas) e as
compartilhamento, no meio ambiente e na reformulações dos varejistas de moda, em
ética. curso, relacionam-se com os conceitos de
design social, slow fashion, fair trade,
O MERCADO MOSTRA SUAS reciclagem, reúso, materiais sustentáveis
TRANSFORMAÇÕES e/ou biodegradáveis, transparências nas
cadeias produtivas, modelos de negócios
A moda, muito mais do que imposição de diferenciados (tanto em termos de gestão
padrões, é um sistema de linguagem, um quanto em relação à expansão de ofertas
discurso de ideias transformado em aos consumidores idosos, deficientes,
produtos. Assim, ela reflete valores e transgêneros e pessoas com manequins
preocupações socioculturais de uma maiores) e, finalmente, relacionam-se com
determinada época. Nos últimos 15 anos, parcerias com novas empresas (construídas
expressando as conjunturas socioculturais, sobre alicerces de cunho ético), centros de
surgiram inúmeras marcas de moda que se pesquisas universitários e ONGs, tanto as
configuram dentro do escopo da de cunho crítico quanto as de cunho
sustentabilidade e da ética. Segundo Sass educativo.
Brown, as novas marcas, suas estratégias e
A discussão relevante sobre as mudanças
modelos de negócios, assim como as
nas empresas de moda é que, denunciadas
iniciativas alternativas, são
em rede sociais pelas instâncias críticas
posicionamentos políticos. Brown acredita
(ONGs, cidadãos comuns, agências de
que o design se manifesta política e
notícias e inúmeros sites, blogs, grupos em
socialmente, desde o uso emblemático de
rede e perfis) e atingidas em suas vendas
jaquetas de couro preto pelos membros do
pela agên-cia do consumidor em boicotes,
Partido Black Panthers, passando pelas
boycotts e difusão de informações, várias
roupas criadas por Vivienne Westwood para
delas vêm incorporando a sustentabilidade
a banda Sex Pistols, até os movimentos por
em suas missões e visões e em seus
uma moda sustentável ou ética.
processos. Isso vem acontecendo com o
Todas essas manifestações são construções apoio de consultorias sérias, ligadas a
que, interagindo em meio às condições instituições de classe,76 por meio de
ambientais, políticas, econômicas e sociais, certificações gerais, parcerias entre si e/ou
reconstroem o mercado e a percepção dos com as instâncias acadêmicas, como
consumidores. O mote das ideias de Brown centros de pesquisas, projetos de extensão
é que o que vemos hoje no campo da moda, e pesquisadores em geral, e/ou unindo-se
mesmo que ainda timidamente, encoraja as às ONGs de cunho declaratório e às
mudanças na sociedade capitalista e instâncias públicas.
conforma-se como o retorno, ou a resposta,
Tais empresas elencam consultorias para
GESTÃO DE MODA | | 21
minimizar ou banir seus impactos transformações no mercado.
ambientais e sociais e os dos produtos por
elas vendidos; para se antecipar a toda e No entanto, existem aquelas que, por serem
qualquer mudança legislativa nesse setor; criadas e gestadas por pessoas ou grupos
no caso das empresas brasileiras, para que compartilham das ideias e das
conseguir certificações que abram as demandas da agenda social, já têm
portas para feiras internacionais em países incorporados ou passam a incorporar os
onde esses documentos são necessários valores da RSC, as premissas da
(tanto para a participação nesses eventos sustentabilidade e da ética nos negócios.
quanto para a importação de roupas); e Elas têm esses valores como genuínos e,
para se manter atuantes no mercado por assim, constituem-se inseridas,
um longo prazo. Eventualmente, os gestores genuinamente, no contexto de moralidades
procuram parcerias e consultorias no de novos modelos de negócios, dentro de
sentido de aplacar um sentimento interno um novo capitalismo, mais responsável.
de desajuste entre o que consideram uma
visão centrada no lucro e a realidade Entendemos como empresas do primeiro
emergencial da qual são conscientes segmento, a maioria dos grandes varejistas
(mudanças climáticas, exaustão de globais de moda, como Nike, H & M, C & A,
recursos, poluição, miséria etc.). Tais Primark, Zara, Michael Kors, Topshop e as
parcerias e consultorias funcionam também nacionais Renner, Riachuelo, Hering e
como um regulador para as empresas, pois Malwee, entre outras. Consideramos aqui
trazem à tona em quais segmentos recaem também grande parte das marcas que
as denúncias e ajudam a identificar quais pertencem aos conglomerados LVMH,
as implementações necessárias, onde, como Kering Grupo e Richemont, como Dior, Yves
e quando fazê-las. Em geral, são esses os Saint Laurent e outras. Consideramos ainda
pontos-chave: origem das matérias-primas; grande parte das marcas de luxo que se
cadeias produtivas; produtos; logística; configuram como grupos, como Chanel,
pontos de venda; estratégias de venda e proprietária da Paraffection, Prada e
marketing; comunicação; precificação; Hermés.
formação de pessoas (funcionários e
Em nossos resultados, observamos que as
fornecedores diretos e indiretos) e,
marcas acima, consideradas
finalmente, valores e missões. Para entender
transnacionais, vêm criando e ampliando
esses processos de incorporação das
projetos de sustentabilidade e buscando
posturas de RSC e ética, precisamos,
certificações que envolvem códigos de
primeiro, entender que empresas de moda
conduta éticos. Importa a elas o rastreio e a
apresentam dimensões variadas (de
transparência nas cadeias produtivas;
pequenas empresas a conglomerados) e
matérias-primas e materiais sustentáveis ou
também são muito diferentes – usando uma
menos impactantes que também sejam
expressão do mercado – “em seus DNAs”.
oriundos de cadeias produtivas éticas;
Existem empresas que, para atingir suas aquisição de produtos considerados ou
metas de venda e aumentar seus certificados como fair trade; logísticas
quantitativos financeiros, valem-se das reversas; pesquisas no desenvolvimento de
pesquisas de tendências de consumo e produtos inovadores e upcycling. C&A, H&M,
comportamento que incorporam dimensões Marks & Spencer e Topshop são marcas que
associadas ao consumidor consciente sem, já comercializam “roupas éticas”, como a
no entanto, terem de fato incorporado em Conscious Collection, da H&M; observamos
seus valores e na essência da marca, ou em também roupas com etiquetas que indicam
seus DNAs, os valores da RSC e da ética. o uso de algodão orgânico, algumas vezes
Essas marcas vêm se transformando aos provenientes de projetos da própria
poucos, ainda com resistência, mas empresa, como é o caso da C&A. Nas
atendendo, de alguma forma, à demanda demais marcas, apenas há indicação de
social. Na incorporação de valores éticos e organicidade da matéria-prima, com selos
de premissas da RSC, mesmo que certificativos (Mark Spencer e H & M); peças
timidamente, acabam promovendo algumas com inserção de artesanato ou com

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certificações de fair trade (Marks & Spencer propostas de práticas alternativas à cultura
e Topshop). No campo, foi observado o convencional do algodão.
aumento das ofertas de t-shirts de algodão
orgânico e a diminuição do valor delas Observamos, também, nas certificações
entre 2012 e 2018, chegando ao mesmo preço existentes, iniciativas de verificação,
daquelas produzidas com algodão de normatização e certificação focadas
cultivo convencional. Entretanto, a apenas nos aspectos sociais, envolvendo
produção de algodão orgânico ainda é diferentes segmentos de marcas, produtos e
apenas de 1% no âmbito geral da produção têxteis, em geral. Como exemplo, podemos
global, logo, o desenvolvimento de culturas citar aquelas focadas no segmento de
de algodão orgânico e de bioagricultura comércio como: Fair Label Association
mostra-se muito importante no segmento (Associação das Marcas Justas), Fair Wear
têxtil. Foundation (Fundação das Marcas Justas),
Ethical Trade Iniciative (Iniciativa de
A ONG Textile Echange esforça-se para Comércio Ético) e SA 8000; e outras
aumentar o mercado dessa fibra por meio relacionadas à ecoeficiência dos produtos,
de iniciativas e parcerias com a C & A e a H tais como BlueDesign, Made in Green e Öko
& M (dois gigantes do varejo global). Após Tex 1000. As principais certificações que
mais de uma década de esforços e surgiram nessa área com o propósito de
parcerias, o aumento do valor desse regular o mercado e oferecer às marcas
mercado passou de U $240 milhões (valor condições de confiabilidade são a Öko-Tex
estimado em 2002) para U $8,9 bilhões (valor 100, EU Eco Flower (Flor Verde), OE Organic
estimado em 2012). Exchange (Mudança Orgânica), Global
Recycled Standard (Padrão Global de
Nessa área específica, em que a fibra Reciclados) e Global Organic Textile
algodão, quando cultivada com Standard (Padrão Global de Têxteis
agrotóxicos, é considerada um dos Orgânicos).
principais vilões da moda por causa da sua
relação com dados sobre suicídios de Outro ponto de mudança em curso no
trabalhadores rurais, surgiram certificações consumo de moda e, consequentemente, no
e iniciativas também específicas, tais como mercado, são aspectos ligados aos
projetos e parcerias de cooperação mútua, maus-tratos aos animais, que emergiu
ligados apenas ao algodão. A justificativa ainda com mais força após a crescente
dessa especificidade é que o algodão onda de veganismo que se instaurou no
representa, aproximadamente, 90% do total Ocidente. Após anos de denúncias oriundas
de fibras naturais consumidas da Peta, foram as informações contidas em
mundialmente. A principal classe de vídeos e veiculadas nas redes sociais que
agrotóxicos usados nas culturas de trouxeram a conscientização de
algodão convencional é chamada de maus-tratos aos animais, ao consumidor de
organofosforados e carbamatos. Tais moda e aos consumidores em geral. Boa
agrotóxicos causam efeitos neurológicos parte do alvo das denúncias de maus-tratos
retardados após a exposição aguda e animais implicava os fornecedores chineses.
crônica. A sintomatologia inclui confusão Com base nessas denúncias e nas novas
mental, fraqueza muscular e distúrbios demandas de um novo consumidor, vegano,
neurológicos, como depressão e ansiedade, verificamos que a empresa C&A não usa
sendo ainda associados ao aumento do mais pelos de coelhos angorás; que couros
índice de suicídios nas regiões onde são animais só são usados quando originários
utilizados, como já visto. Assim, é da produção de carne (alegam que seu
compreensível que surjam iniciativas que se curtimento é feito sem metais pesados,
esforçam para mudar esse cenário. As prática que sempre caracterizou a
principais são: Fair Trade Certified Cotton insustentabilidade ambiental dos
(Algodão certificado em comércio justo), curtumes); as penas e plumas, usadas na
Better Cotton Iniciative (Iniciativa por um confecção de tênis e casacos, só são
algodão melhor) e Cotton Made in África aprovadas para uso quando originárias
(Algodão feito na África), todas com também da produção de carne; a lã,

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proveniente de caprinos (especialmente econômica. Também nesse segmento
ovelhas e cabras), só é usada quando as aparecem as empresas de comercialização
práticas dos fornecedores, na tosa dos de roupas usadas, conhecidas como
animais, estão adequadas aos padrões brechós, assim como as de aluguel e
defendidos pela Textile Echange e a reforma de roupas.
empresa não usa mais nenhuma pele
animal em seus produtos (salvo couro, aqui Entre os dois segmentos, um ponto em
não considerado pele com pêlos, produto comum se faz presente: ambos apresentam
geralmente usado em casacos de pele, parcerias com associações, cooperativas,
chamado de fur), tendo substituído esses universidades e ONGs. Também
produtos por peles sintéticas, em geral identificamos que as ações, em ambas as
poliéster. modalidades de empresas, giram em torno
da criação de valores: reais ou não reais.
Em relação à poluição gerada por químicas, Verdadeiro, como a exibição de uma
surge o projeto Roadmap, da Fundação certificação orgânica conferida à fibra de
ZDHC (Zero Discharge of Hazardous uma camiseta, por exemplo, ou falsa, como
Chemicals – Zero Descarga de Químicos etiquetas de eco friendly penduradas em
Perigosos), que, nesse projeto, proporciona camisetas confeccionadas em cadeias
soluções alternativas para o uso de produtivas difusas e não rastreáveis,
químicas perigosas na produção de divulgadas por blogueiras e digital
vestuário e acessórios. Integram o Roadmap influencers que, além de pagas pelas
C & A, Adidas, Gap, H & M, Inditex (Zara), marcas para abordar produtos, em geral
Levis Strauss, Nike e Puma (até o momento). nada sabem de sustentabilidade ou
Tais empresas se comprometeram a questões ambientais e sociais chave da
eliminar de seus processos metais pesados contemporaneidade.
e químicas desfavoráveis à saúde humana
até 2020. Surge também a campanha Detox A criação de valor relaciona-se com a
Fashion (Desintoxique a Moda), do economia criativa. A inserção do setor
Greenpeace Internacional, que congrega produtivo da moda nesse contexto foi
um acordo de ajuste de conduta a curto, analisada e definida, recentemente, nos
médio e longo prazo, dependendo dos documentos do Relatório de Economia
processos e produtos, com Criativa 2010, publicado pela Conferência
aproximadamente 100 empresas. das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento, no qual são apresentadas
Dentro do segundo segmento, encontramos as definições de economia e indústria
marcas que, ao lado dos grandes varejistas, criativa. Nesse relatório está em jogo o
são percebidas como pequenas, mas capital cultural da manifestação de moda,
apresentam dimensões mais amplas, como presente nas criações e nos valores criados
Patagônia, People Tree, Noir, Braintree, From em torno da marca, e sua reversão em
Somewhere, Stella McCartney, Edun, capital econômico por meio do vestuário.
Vivienne Westwood, Raven & Lily, Alabama Dessa forma, a economia criativa refere-se
Chanin, Goodone, Rapanui, IOU Project, Veja, também a uma economia de trocas
entre outras. Finalmente, somente com a simbólicas, na qual está inserida nossa
finalidade de exemplificar, as nacionais abordagem. As alterações promovidas pelos
Osklen, Doisélles, Tiê Moda Sustentável, movimentos do mercado em suas parcerias
Será o Benedito, Movin, Flávia Aranha, com ONGs e com a academia na criação e
Comas, Artérias, Grama e Projeto Re-Roupa, difusão de novos valores apresentam
entre outras. Essas marcas, nascidas nos também essa reversão de capitais
últimos 20 anos ou reestruturadas nas simbólicos em capitais econômicos.
últimas décadas (como é o caso da marca Observamos que hoje os capitais
Vivienne Westwood, que sempre se simbólicos e culturais permeiam o mercado
posicionou como uma marca crítica), de forma institucionalizada, não apenas em
conformam as principais transformações relação à criatividade, à arte e à inovação,
no mercado em termos de incorporação mas também em relação à sustentabilidade
das críticas e da gerência delas na esfera e à ética.

GESTÃO DE MODA | | 24
É com base nas características das trocas incubados pela iniciativa, destacamos:
simbólicas que emergem outros tecidos feitos de leite talhado; velcros com
movimentos responsáveis pelas alterações ciclos de vida mais longos e sem resíduos;
no mercado. Tais movimentos, em geral “couro” feito com cascas de árvores;
provenientes de organizações sem fins transformação de roupas usadas em
lucrativos, começaram a ser biofibras para substituição de tecidos
institucionalizados no início da década de novos, projeto que envolve a capacitação
2000. Hoje, o número de eventos regulados de comunidades em risco ao redor do
pela moda sustentável, e suas mundo; seda feita de casulos de abelhas.
nomenclaturas correlatas, cresce em todo o
mundo por meio de movimentos do Como uma das mais significativas
mercado na busca de criação e difusão de mudanças no consumo no mercado de
novos valores atrelados à ética, à moda, o slow fashion nos parece o que
responsabilidade e à sustentabilidade. melhor se valeu dos conceitos de RSC, de
Dentre eles, o que melhor expressa esta sustentabilidade e de ética. Com base nas
interlocução e que teve um papel premissas da economia criativa, uma das
importante na origem e na difusão da características do slow fashion é a noção de
preocupação socioambiental no campo foi trocas de capitais simbólicos por capitais
o Ethical Fashion Show (Desfile de Moda financeiros. As empresas e produtos do
Ética), hoje uma extensão da Ethical segmento slow fashion apresentam uma
Fashion Initiative (Iniciativa para a Moda predominância do capital simbólico
Ética) – programa ligado à Agência atrelado à ética e ao ativismo
Internacional de Comércio, da ONU. Esse socioambiental, dois pontos que tanto os
evento inspirou, entre outros, a criação das grandes varejistas de moda quanto as
feiras alemãs Innatex e Source Expo. e da grandes marcas europeias vêm
britânica C.L.A.S.S., focada em têxteis implementando em suas gestões.
sustentáveis. Complementam o cenário as
semanas de moda ética, ou sustentáveis, Como exemplos desse segmento, gostaria
chamadas de Ethical Fashion Weeks, em de ressaltar as coleções do estilista mineiro
que novas empresas dispõem da Ronaldo Fraga e das marcas brasileiras
possibilidade de formalização desse Projeto Re-Roupa e Doisélles. Iniciativas
mercado, ainda considerado alternativo, como brechós, marcas de troca,
segundo a modelagem do mercado compartilhamento e roupas sob medida
mainstream. Organizadas por segmentos também estão no segmento, uma vez que
do terceiro setor e financiadas por marcas desfrutam de atributos comuns ao slow
e/ou pelo Estado, surgem também fashion, ou seja, artesania; produção e uso
produções diferenciadas, como a de fibras orgânicas; reúso de roupas e
Conferência de Moda de Copenhague materiais; inclusão da diversidade social e
(Copenhagen Fashion Summit), organizada cultural em pareceres individualizados;
pelo Instituto de Moda Dinamarquesa e diversidade de estilos; respeito às fases do
pela Associação Nórdica de Moda (uma ciclo de vida do corpo (caso dos idosos e
instância pública), e patrocinada por crianças) e às suas diferenças (caso dos
varejistas globais, especialmente a sueca tamanhos maiores e de pessoas com
H&M. deficiência); produções locais; preservação
de práticas têxteis tradicionais; cuidado na
Agregando valor ambiental aos produtos, e confecção e manutenção das roupas;
atendendo a uma demanda do consumidor, estabelecimento de relações de confiança
o mercado e suas parceiras investem em entre produtores e consumidores; difusão
materiais e matérias-primas. Um bom da ideia de “retorno à roupa”, em vez de
exemplo é a parceria entre a agência proeminência dos ciclos da moda; respeito
americana Nasa, o Usaid, o Departamento às histórias e memórias das roupas;
de Estado dos Estados Unidos e a Nike. Em consciência acerca dos impactos gerados
colaboração, os envolvidos focaram-se no pelo uso e fabricação das roupas;
desenvolvimento de inovações sustentáveis minimização de impactos ambientais e
que incluem a área têxtil. Dentre os projetos sociais e maximização de capitais culturais

GESTÃO DE MODA | | 25
e sociais; parcerias com ONGs e associadas à ética, à sustentabilidade e à
associações; aderência a processos de RSC.
compartilhamento de saberes e
empoderamento; prática de fair trade e/ ou Consideramos como transformação o fato
precificação real, incorporando custos de que, além do mercado mainstream,
ambientais e sociais; produção em escalas outros mercados, com novos modelos de
pequenas e médias e, finalmente, ativismo negócios e DNAs, surgem e se alinham com
político. as premissas éticas e estéticas da
sustentabilidade. Esse segmento pode ser
MUDANÇAS NO CENÁRIO DO MERCADO DE considerado como alternativo ao
MODA mainstream da moda; é nele que
reconhecemos o slow fashion, suas práticas
O mercado de moda está mudando e de produção e consumo como um
parece que essas mudanças decorrem movimento de mercado que nasce baseado
especialmente da politização do consumo, nas premissas da responsabilidade e do
ou seja, das novas formas de consumo respeito à interdependência global, tanto
baseadas em ética e em sustentabilidade, e humana quanto ambiental.
da formação de um consumidor, sobretudo,
Finalmente, consideramos que a pergunta
informado. Hoje, incluindo os grandes
“Onde, como, quando e quem fez minha
varejistas, o mercado já apresenta
roupa?”, proposta pela ONG Fashion
segmentos em que é possível comprar
Revolution, pode figurar como uma das
roupas e acessórios originais, autênticos e
principais agências do consumidor nas
criativos, produzidos em cadeias éticas
transformações contemporâneas do
e/ou com materiais menos impactantes.
mercado de moda.
Atualmente encontramos roupas orgânicas,
eco friendly, veganas e/ou simplesmente
★ Artigo TCC: Da Inspiração à Cópia: A Proteção
ecologicamente corretas.
do Design de Moda no Brasil e na Europa
Os grandes varejistas globais do setor
parecem adotar, ao menos de forma https://mediacdns3.ulife.com.br/PAT/Upload
discursiva em seus sites oficiais, blogs e /1777748/4141131/images/70c8a39eedef806e7
perfis de redes sociais, parte das premissas 0bd4cbe8929fa92.pdf
da RSC e da criação de valores, prática
reconhecida nas indústrias criativas, nas
quais se insere o design de moda.

As denúncias em redes têm um papel


constitucional na formação e informação
de um novo consumidor, assim, as
transformações do mercado ocorrem em
resposta às denúncias e também no sentido
de atender às demandas do consumidor.
Sobressai nesse contexto o
comprometimento dos gigantes do varejo
global com fibras de culturas orgânicas; a
passagem integral do uso do algodão
convencional ao do algodão orgânico; a
redução do uso de químicas perigosas à
saúde humana; o incentivo a pesquisas
relativas à inovação de materiais têxteis e
de processos; a criação de departamentos
que se ocupam de segmentos de roupas
sustentáveis das marcas, e, finalmente, a
criação de valores suscitados em todas as
atividades e criações que possam ser
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