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Fragmentos
Heloísa Falquete
Cientista Social pela UNESP - Araraquara/SP
Mestranda no Programa de Pós-graduação em
Planejamento e Análise de Políticas Púbicas na UNESP - Franca/SP
heloisa.falquete@unesp.br
RESUMO
ABSTRACT
A place of exchange of ritualistic leaves and herbs, retail trade, various aromas, dendê palm
oil, shrimp and beaded necklaces in honor of Saints and Orishas: the Feira de São Joaquim,
one of the most traditional commercial places in the city of Salvador and in the Bahian
Recôncavo, is inserted as the research field of this article. Located in the neighborhood of
Comércio and bathed by the water of the Baía de Todos os Santos, it constitutes bonds of
continuity with the mercantile past, with the port activities, and with the ebb and flow of ships
and schooners. Portrait of the past in constant dispute in the present, the fair remains in time as
a cultural referential of the senses of Bahianness. In the exercise of recognizing the historical
role played by the Fair and its senses and meanings for the memory of the city of Salvador,
strategies to safeguard its space and dynamics emerge: in 2005 the request for registration of
the fair as a Brazilian Intangible Heritage was made, which is under instruction by the Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPHAN. At the same time, in 2011, the
implementation of the Requalification Project of the São Joaquim Fair was initiated in order to
carry out reforms in its physical structure. The objective of this article, therefore, is to bring
notes and discussions held in the context of the Programa de Pós-graduação em Planejamento
e Análise de Políticas Públicas of UNESP Franca (SP), in which the research project has been
developed that seeks to answer which are the impacts resulting from the Requalification of São
Joaquim, according to the perception of market vendors. The discussions in this article are
based on preliminary observations obtained in the fieldwork. Thus, it is expected to contribute
to the discussions of the Congress in order to think about possible ways of dealing with the
problems that permeate the theme of public policies for the preservation of cultural property in
Brazil.
1. Introdução
III Congresso Nacional para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural – São Paulo/SP – 09 a 12 de nov. 2021
A primeira etapa da Requalificação, ocorrida entre 2011 e 2016, propunha em seus
objetivos realizar reformas nas estruturas físicas de São Joaquim a fim de trazer
melhorias na qualidade do trabalho dos feirantes, na infraestrutura – cujas metas
envolviam contemplar a parte de energia elétrica, gás encanado, proteção contra
incêndios, distribuição e tratamento de água e esgoto, etc. – e no circuito econômico e
comercial, conforme os dados ofertados pelos relatórios da CONDER. Ao decorrer das
reformas, parte dos feirantes teve de ser deslocada para o pavilhão provisório e a
estratégia da requalificação, que inicialmente buscava realizar melhorias em toda a
extensão da Feira, enfrentou diversos desafios ao decorrer de sua implementação,
finalizando a primeira etapa em 2016 com 20% da área contemplada.
Para além, o cenário posterior à requalificação parece ter gerado duas realidades
distintas: a parte requalificada, atrativa para turistas e beneficiada pelas mudanças na
infraestrutura, e a parte não requalificada que continua acometida por problemáticas na
estrutura física, à margem do projeto de manutenção do espaço enquanto referencial
cultural da cidade de Salvador. Dessa forma, este trabalho visa discutir quais os
impactos advindos pelo Projeto de Requalificação e seus limites enquanto estratégia de
salvaguarda da Feira de São Joaquim.
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indissociável aos intercâmbios simbólicos da cultura afro-brasileira, tendo sido retrata
nas artes plásticas, na literatura, na fotografia e no Cinema Novo.
Conforme Edilece Couto (2015, p. 129), o século XX foi marcado por tentativas de
“modificar e controlar o uso do espaço urbano, promover a moralização dos costumes e
a desafricanização das ruas” soteropolitanas, visto que o projeto modernizador assumiu
caráter social, cultural e religioso a partir da premissa de que para atingir a “civilidade”
era preciso reorganizar Salvador e seus espaços. A Feira de São Joaquim pode ser vista
como a resistência do que o projeto modernizador não conseguiu controlar: feirantes,
consumidores, Babalorixás e Ialorixás unidos por um espaço simbólico e por suas
interações e trocas que perpassam o tempo e o espaço.
Considerada um dos locais mais tradicionais do ponto de vista comercial da cidade para
os soteropolitanos, a Feira de São Joaquim de hoje corresponde e se mantém enquanto
referencial cultural mesmo diante das novas dinâmicas e padrões de consumo da
modernidade radicalizada. Embora atualmente sua ligação estreita e direta com o
Recôncavo não seja expressiva, São Joaquim conserva seu papel de abastecimento de
caráter informal. Paralelamente, permaneceu enquanto local de abastecimento de ervas,
folhas, animais vivos e demais produtos para os diversos terreiros de Candomblé
existentes na cidade que é marcada pela presença do povo de Santo: Salvador conta com
mais de mil terreiros registrados, destes, seis tombados pelo Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN enquanto patrimônios culturais.
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como agente responsável de supervisão e orientação das obras o IPAC (Instituto do
Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia).
Figura 03: Rua não contemplada pela primeira etapa do Projeto de Requalificação.
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Dessa forma, no âmbito do desenvolvimento do Mestrado, espera-se delimitar: a) as
intenções de ação presentes nos documentos da CONDER e do IPAC acerca do Projeto
de Requalificação da Feira; b) os impactos da Requalificação conforme as impressões
de consumidores. Ainda, tratando-se de um Mestrado Profissional, será apresentado o
produto que consiste na realização do Relatório de Análise Política da Implementação
do Projeto de Requalificação da Feira de São Joaquim (BA).
Conclusão:
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Pensando na proposta de Grupo de Trabalho intitulado “Fragmentos” no qual este artigo
busca contribuir para as discussões, podemos elucidar a constatação realizada por
Walter Benjamin (1987), que destaca que “a cada geração foi-nos concedida uma frágil
força messiânica para a qual o passado dirige um apelo. Esse apelo não pode ser
rejeitado impunemente.” (p. 222). As inquietações que motivam a pesquisa no ambiente
da Feira de São Joaquim vão justamente ao encontro do sentido de Benjamin: o apelo
do passado que não pode ser rejeitado. Dessa forma, ao buscar analisar a Requalificação
e seus efeitos podemos destacar os possíveis malefícios que ainda acometem a “parte
velha” da Feira, bem como o contraste existente em relação à “parte nova”, a ausência
de infraestrutura, proteção contra possíveis incêndios, acidentais ou ilegais, incêndios
estes que já destruíram suas feiras antecessoras, a Feira do Sete e a Feira de Água de
Meninos.
Para além, pensar sobre o ambiente de São Joaquim também traz reflexões sobre as
possiblidades de pensar novos paradigmas no que diz respeito à proteção e salvaguarda
do Patrimônio Cultural brasileiro que possam ofertar a partir de uma noção de
patrimônio cultural integradora (CHUVA, 2012, p. 147). Isto porque a trajetória
realizada no campo do patrimônio no Brasil, uma vez que levou à divisão dicotômica
entre os âmbitos material e imaterial, também os separou em metodologias distintas de
procedimentos de reconhecimentos, como é o caso do Tombamento (de bens materiais)
e do Registro (de bens imateriais). Na literatura recente sobre patrimônio cultural
podemos afirmar que tal distinção é falaciosa, uma vez que o um bem cultural envolve
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sujeitos, sentidos e significados adquiridos no tempo e no espaço, não sendo possível
separar o simbólico do material.
REFERÊNCIAS
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VERGER, Pierre. Fluxo e Refluxo do Tráfico de escravos entre o Golfo do Benin e a Bahia
de Todos os Santos. São Paulo: CORRUPIO, 1987.
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