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12º Ano - Módulo 8 (Pág.

110-146)

A primavera marcelista:

Substituindo Salazar em 1968, Marcello Caetano apresentava-se como um político mais liberal,
capaz de alargar a base de apoio do regime. Logo no seu discurso de tomada de posse, definiu
como linhas orientadoras o continuar a obra de Salazar, mas sem prescindir da necessária
renovação política: um “evoluir na continuidade”.

Nos primeiros meses de mandato, deu sinais de maior abertura do regime: fez regressar do
exílio vários presos políticos (como Mário Soares e o Bispo do Porto), moderou-se a atuação da
polícia política (que se passou a chamar Direção-Geral de Segurança – DGS), ordena o
abrandamento da censura (agora designada Exame Prévio), abriu a União Nacional (que se
passou a designar Ação Nacional Popular-ANP) a políticos de ideias mais liberais.

Este clima de mudança ficou conhecido como “primavera marcelista”. As eleições legislativas
de 1969, foram anunciadas neste clima de maior abertura: o sufrágio foi alargado às mulheres
alfabetizadas, deu-se maior liberdade à campanha da oposição, que podia consultar os cadernos
eleitorais e fiscalizar as mesas de voto.

No entanto, o ato eleitoral acabou por revelar vários atropelos ao espírito democrático e o
resultado foi o mesmo de sempre: a totalidade dos deputados eleitos pertencia à União Nacional.

Deste modo, goravam-se as expetativas criadas no sentido de uma verdadeira democratização


do regime. Marcello Caetano começa a ser criticado: os mais liberais acusam-no de incapacidade
para tomar as reformas necessárias, os mais conservadores criticaram a “abertura” do regime,
que provocara instabilidade no país.

Entretanto, acontece um significativo surto de agitação estudantil, greves e até ataques


bombistas, o que levou Marcello Caetano a infletir a sua política: mandou encerrar as
associações de estudantes mais ativas, alguns opositores são novamente remetidos ao exílio, a
polícia política intensifica a sua ação…

Incapaz de evoluir para um sistema mais democrático, o regime tinha ainda outro problema
entre mãos: a guerra colonial. Quando assumiu o cargo, Caetano foi de encontro às pretensões
das altas patentes das Forças Armadas, ou seja, continuar a defender os territórios ultramarinos,
para salvaguardar os interesses da população branca. Paralelamente, foi redigido um projeto para
encaminhar esses territórios para uma “autonomia progressiva”, o que desagradou à maioria
conservadora da Assembleia Nacional, que boicotou o projeto.

A luta armada ia endurecendo e externamente crescia o isolamento português: em 1970, o Papa


Paulo VI recebeu os líderes dos movimentos de libertação e, em 1973, a ONU reconheceu a
independência da Guiné-Bissau. Nesse mesmo ano, Caetano foi alvo de manifestações de
desagrado quando visitou Londres. Internamente, também aumentou a contestação: os
deputados mais liberais da ANP começam a abandonar a Assembleia Nacional e as próprias
Forças Armadas dão sinais de inquietação: o general Spínola publica, em 1974, a obra “Portugal e
o futuro”, que proclamava que não havia solução militar para a guerra colonial.

Da revolução à estabilização da democracia

O Movimento das Forças Armadas e a eclosão da revolução

A conjuntura política: em 1974, enquanto o regime agonizava, o problema da guerra colonial


persistia. Na Guiné, o PAIGC já tinha, unilateralmente, proclamado a independência. Em Angola e
Moçambique, a situação mantinha-se num impasse. Internacionalmente, crescia a condenação da
política colonial portuguesa e aumentavam os apoios políticos e militares aos movimentos
independentistas.

É neste contexto, que os militares entenderam que se tornava urgente pôr fim à ditadura e abrir
caminho para a democratização do país.

Em consequência, a partir de 1973, começa a organizar-se um movimento clandestino de


militares, onde predominavam os de baixa patente (maioria capitães), que prepararam um golpe
de estado para derrubar o regime e para criar condições para a resolução pacífica da questão
colonial.

Inicialmente, o autodenominado Movimento dos Capitães teve como motivação o protesto


contra a integração na carreira militar de oficiais milicianos, tendo feito apenas um curso
intensivo na Academia Militar, enquanto eles tinham cursado durante anos.

O “Movimento das Forças Armadas”: os altos comandos das Forças Armadas (Costa Gomes
chefe e António Spínola Vice-Chefe), recusaram-se a participar numa manifestação de apoio ao
Governo. Como retaliação, foram exonerados dos cargos. Foi desta forma que o inicial
Movimento dos Capitães vai receber a adesão das principais unidades militares, evoluindo para
um “Movimento das Forças Armadas – MFA”.

O “25 de Abril”

As Forças Armadas saíram à rua na madrugada de 25 de abril de 1974, levando a cabo uma
ação revolucionária que pôs fim à ditadura que vigorava desde 1926.

A ação militar foi coordenada pelo major Otelo Saraiva de Carvalho, tendo tido início por volta
das 23h do dia 24, com a transmissão pela rádio da canção “E depois do adeus”, de Paulo de
Carvalho. Às 0:20 era transmitida a canção “Grândola, Vila Morena”, de José Afonso. Estava dado
o sinal que as unidades militares podiam avançar para a ocupação dos pontos considerados
estratégicos, como as rádios, a RTP, os aeroportos…

A única força que saiu em defesa do governo foi o Regimento de Cavalaria 7, derrotada pelo
destacamento da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, comandada pelo capitão Salgueiro
Maia. Entretanto, no Terreiro do Paço, Marcello Caetano entregou pacificamente o poder ao
General Spínola. Entretanto, já o golpe militar era aclamado nas ruas pela população, cansada da
guerra e da ditadura. Foi uma revolução pacífica, conhecida como a “Revolução dos Cravos”.

O desmantelamento das estruturas do Estado Novo

De imediato, deu-se início ao processo para acabar com as estruturas que tinham suportado o
regime deposto. Esta tarefa coube à Junta de Salvação Nacional, com Spínola na presidência, na
qualidade de representante do MFA. Medidas tomadas:

- Destituição do Presidente Américo Tomás e do chefe do governo Marcello Caetano, presos


e mais tarde exilados para o Brasil;

- Dissolução da Assembleia Nacional;

- Revogação da Constituição de 1933;


- Destituição de todos os governadores civis e da Ação Nacional Popular;

- Extinção das estruturas repressivas do Estado Novo (PIDE, Censura e Legião Portuguesa) e
das estruturas de arregimentação (Mocidade Portuguesa) e de propaganda do regime)

- Preparação de eleições livres para eleger uma Assembleia Constituinte, para redigir uma
nova Constituição;

- Nomeação do general Spínola para Presidente da República e de Adelino da Palma Carlos


para presidir ao I Governo Provisório.

Tensões político-ideológicas na sociedade portuguesa e no interior do movimento


revolucionário

Os 2 anos que se seguiram à revolução foram bastante conturbados politicamente: vieram ao


de cimo as divergências ideológicas, que originaram graves confrontos sociais e políticos, com
ameaça de guerra civil.

Poucos dias depois da revolução, explodia uma onda de reivindicações por parte dos
trabalhadores, depois de décadas fortemente reprimidos. Cometiam-se excessos e a autoridade
política sentiu muitas dificuldades em controlar a situação. Muitos patrões eram pura e
simplesmente afastados das fábricas, das terras, a roçar a justiça popular…

Perante a instabilidade social, demitiu-se o I Governo Provisório, 2 meses após ter tomado
posse. O II Governo, liderado por Vasco Gonçalves, tinha uma forte tendência de esquerda.

Politicamente, eram visíveis as divergências: de um lado, o Presidente Spínola (que tinha o


apoio das forças mais conservadoras), do outro o MFA, mais identificado com a esquerda
revolucionária. Spínola defendia, para as colónias, a progressiva autonomia; o MFA defendia a
“independência pura e simples”.

Depois de ter reconhecido, contra a sua vontade, a independência dos povos africanos, Spínola
acabará por se demitir. A Junta de Salvação Nacional, indigitou Costa Gomes para o cargo.

A radicalização do processo revolucionário: a partir deste momento a Revolução tende a


radicalizar-se. O estratega da revolução, Otelo Saraiva de Carvalho, aparece cada vez mais ligado
à extrema-esquerda. À frente do COPCON (força militar criada em julho de 1974, com o objetivo
de dotar o poder de uma força de intervenção, já que a GNR e a PSP estavam conotados com o
Estado Novo), ordena arbitrariamente a prisão de elementos moderados.

O 1º Ministro, Vasco Gonçalves, muito ligado ao Partido Comunista, revela as suas intenções de
transformar Portugal numa “democracia popular”, tal como na Europa de Leste.

28 De setembro de 1974 – primeiros sinais de confrontação civil: os setores moderados


organizaram uma manifestação de apoio a Spínola. O MFA proibiu essa manifestação (seguiu-se
a demissão de Spínola). Estava confirmada a aliança MFA/Povo (Partido Comunista).

O 11 de março de 1975: militares afetos a Spínola e sob o seu comando, tentam levar a cabo
um golpe de estado com o objetivo de travar o ímpeto revolucionário de esquerda. O golpe foi
facilmente dominado pelo MFA e Spínola teve de se refugiar em Espanha.

O verão quente de 1975 – prenúncios de guerra civil: o MFA cria o Conselho da Revolução, em
substituição da Junta de Salvação Nacional e do Conselho de Estado (extintos). O Conselho da
Revolução, com clara ligação aos ideais comunistas propõe-se orientar o Processo
Revolucionário em Curso (PREC) rumo ao socialismo.

Entretanto, as eleições para a Assembleia Constituinte realizadas a 25 de abril de 1975,


revelaram resultados surpreendentes – o PS foi o partido mais votado (38%), seguido do PPD
(26%). O Partido Comunista só obteve 12,5% dos votos. Deste modo, os dois partidos mais
votados começaram a reclamar maior intervenção política. Todavia, a preponderância política
continuava a ser detida pelos comunistas, ligados ao MFA e ao Conselho da Revolução que se
constituíam como os verdadeiros detentores do poder.

Num ato de protesto, PS e PPD abandonam o governo passando a afirmar-se como oposição a
Vasco Gonçalves.

O “Processo Revolucionário em Curso”


Expressão usada para designar a vaga de atividades revolucionárias levadas a cabo pela
esquerda radical com vista à conquista do poder e ao reforço da transição para o socialismo
marxista.

Assim, vamos assistir a uma forte intervenção do Estado na economia, com o objetivo de
eliminar a débil economia capitalista portuguesa:

- Todos os setores chave da economia foram nacionalizados (indústria, banca, seguros,


transportes, comunicações, …) e eliminados os grandes grupos económicos;

- O Estado passou a intervir na gestão das pequenas e médias empresas (afastamento de


muitos patrões e proprietários, substituídos por comissões nomeadas pelo governo);

- Reforma agrária: expropriação dos latifundiários do sul, transformando as propriedades


em unidades coletivas de produção (UCP), seguindo o lema “a terra a quem a trabalha”;

-direito à greve e liberdade sindical, instituição do salário mínimo, redução do horário de


trabalho, generalização dos subsídios sociais…

O “Documento dos nove” – inversão do processo revolucionário

Face à crescente radicalização do processo revolucionário e aos excessos cometidos rumo ao


socialismo, um grupo de 9 oficiais que faziam parte do Conselho da Revolução, liderados por
Melo Antunes, publicou um manifesto protestando contra o rumo que o país estava a tomar,
recusando a adoção de um regime semelhante aos da Europa Oriental.

O “25 de novembro” – o fim da fase extremista

Golpe militar protagonizado pela ala mais radical, em defesa de Otelo Saraiva de Carvalho.
Fracassou e foi o fim da preponderância política dos mais extremistas. O VI Governo Provisório é
entregue a Pinheiro de Azevedo. Era o fim da fase extremista da revolução.
A Constituição de 1976

Foi elaborada em pleno clima de radicalização política atrás descrito. Por isso, tem bem
presente o caráter ideológico no sentido do socialismo, principalmente nos aspetos económicos.
Assim, a Constituição reitera a “transição para o socialismo” e considera “irreversíveis” as
nacionalizações e as expropriações de terras já efetuadas. Também manteve como órgão de
soberania o Conselho da Revolução.

No entanto, consagra o Estado português como uma república democrática, reconhecendo o


pluripartidarismo, garantindo as liberdades individuais, a realização de eleições livres e
universais.

Podemos concluir que a Constituição de 1976, ao procurar conciliar os interesses das várias
ideologias políticas, foi o documento fundador da democracia portuguesa.

No seguimento da promulgação da Constituição, realizaram-se eleições para a Assembleia da


República, vencidas pelo PS, tendo sido Mário Soares nomeado 1º Ministro; eleições para a
presidência da República, ganhas por Ramalho Eanes e as eleições para as autarquias locais. Os
arquipélagos da Madeira e dos Açores foram dotados de governos e assembleias regionais.

O reconhecimento dos movimentos nacionalistas e o processo de descolonização

A resolução do problema da guerra colonial, que tinha estado na origem da revolução, foi
também um aspeto que muito dividiu o MFA. Logo na noite de 25 de abril de 1974, o
reconhecimento do direito à autodeterminação (que estava no programa elaborado pelo MFA) foi
eliminado, por pressão de Spínola. Em seu lugar surgiu a intenção de implementar “uma política
ultramarina que conduza à paz”.

Entretanto, após o eclodir da revolução, aumentaram as pressões internacionais: a ONU e a OUA


(Organização de Unidade Africana) reclamam a imediata independência das colónias. Os
movimentos de libertação unem-se no mesmo sentido. Internamente, a maioria dos partidos
políticos que se legalizaram defendia a independência pura e simples.

É nesta conjuntura que, no dia 27 de julho de 1974, o Conselho de Estado aprova a lei que
reconhece a independência das colónias. De imediato, intensificaram-se as negociações com os
movimentos reconhecidos por Portugal: PAIGC (Guiné e Cabo Verde), FRELIMO (Moçambique) e
MPLA, a FNLA e a UNITA (Angola). Em janeiro de 1975, assinou-se o acordo, no Alvor, que
determinava a data das várias independências.

Devido à instabilidade política e social vivida no país, à desmotivação do exército e às más


relações entre os militares portugueses e os africanos, Portugal encontrava-se numa situação
débil, o que não lhe permitiu acautelar devidamente os interesses dos portugueses residentes no
Ultramar, durante este período de transição.

Em Moçambique, o governo português apenas reconheceu a FRELIMO (acordo de Lusaca em 7


de setembro de 1974), que estabelecia o cessar-fogo e a constituição de um governo de
transição. Os confrontos começaram quase de imediato através da RENAMO (opositores da
FRELIMO, conotada com o comunismo), assumindo um caráter racial, o que desencadeou a fuga
da população branca. O território viu-se envolvido numa guerra civil o que originou o denominado
“movimento dos retornados”.

O caso mais grave foi o de Angola: os 3 movimentos foram incapazes de ultrapassar as suas
divergências, o que originou uma guerra civil. Neste cenário, em setembro e outubro de 1975
estabeleceu-se uma autêntica ponte aérea entre Angola e Portugal, para os portugueses que
pretendiam regressar.

A revisão constitucional de 1982 e o funcionamento das instituições democráticas

Em 1982, a democracia portuguesa dava claros sinais de que o processo revolucionário tinha
assumido definitivamente uma feição pluralista. Os tempos do “Verão quente” de 75 iam sendo
ultrapassados e as forças políticas mais moderadas finalmente estavam a entender-se em
relação ao rumo a dar ao país.

É nesta conjuntura que o revolucionário pacto MFA/Povo é substituído por um novo pacto
MFA/Partidos, que iria permitir esbater o excessivo comprometimento com o comunismo e a
forte presença militar no exercício do poder político, que havia no texto constitucional de 1976.

Assim, em 1982, o PS, o PSD e o CDS chegaram a acordo sobre as alterações a introduzir na
Constituição: relativamente a alguns princípios socializantes não houve novidades (o processo de
nacionalizações foi considerado irreversível, bem como a reforma agrária), mas esta revisão
suavizou os aspetos mais marcadamente ideológicos de esquerda revolucionária e alterou
bastante o funcionamento e a organização do poder político – o Conselho da Revolução foi
extinto (deste modo, os militares deixavam de interferir no poder político).

Os órgãos de soberania passaram a ser o Presidente da República (chefe de Estado), que tem
como principais funções: comandante supremo das Forças Armadas, nomear o 1º ministro,
dissolver a Assembleia da República e demitir o Governo em casos de irresolúvel crise política,
convocar novas eleições, promulgar as leis ou exercer o direito de veto sobre as mesmas.

A Assembleia da República: órgão legislativo por excelência, constituído por 230 deputados,
mandatados por 4 anos.

O Governo: órgão que superintende a administração do país.

Os Tribunais: exercício do poder judicial, incluindo o Tribunal Constitucional ao qual compete


zelar pelo cumprimento da Constituição.

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