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As Crônicas de Alice

O Primeiro Contrato

O cheiro da chuva, ela lembrava o gosto de uvas para a vampira, essa foi a primeira vez
que ela percebeu que seus sentidos tinham se misturado após o seu Abraço e ela nunca vai
esquecer disso, afinal foi numa chuva de tarde de janeiro que ela cumpriu seu primeiro contrato.

Seu Sire tinha lhe dado uma missão, matar um bandeirante que havia trucidado muitos
indígenas e começou a chamar atenção indevida à Camarilla, por isso, eles contrataram seu
mestre para apaga-lo daquela terra de santa cruz.

Com grande orgulho da sua cria, ele designou a tarefa para Alice, nome de sua máscara
até os dias de hoje só mudando de sobrenome, trazer a morte verdadeira de Antônio Raposo
Tavares.

A jovem estava ansiosa para isso, ela passou mais de cem anos somente treinando e
aprendendo a cada assassinato de seu mestre, vendo cada vida sendo ceifada na noite fria, onde
só se via a linda pele de ébano de seu mestre e nada mais.

O plano da assamita era simples, ela ia usar as festas do seu alvo para se enturmar e
passar despercebida e assim em um piscar de olhos entrar em seu quarto e no meio de uma
voraz sedução lhe roubar a não vida.

Seu Sire tinha suas dúvidas, mas ele sabia que sua cria precisava aprender com seus
erros e nada disse, conseguiu o que a jovem vampira precisava e lhe deu o presente que ela leva
até hoje, uma katar, uma arma indiana que tinha a tradição antiga de ser uma excelente motriz
para assassinatos.

Então, Alice botou seu plano em prática, em 15 de janeiro de 1658 se infiltrou em uma
das festas, o bandeirante estava triste por não ter conseguido sua prata, mas como era um
Ventrue, ele ainda tinha seus sussurros e suas manias.
A assassina descobriu o gosto específico de mortal dele, índias desnudas, e prontamente
ela começou a se adaptar e aprender para enganar o Sangue Azul e fazer o abate perfeito.

Entrando na festa com uma nova serva de seu rebanho, ela serviu a todas as visitas, a
casta mais rica de São Paulo, membros da Camarilla, vampiros sedentos por sangue mortal,
senhores da escuridão, eles falavam enquanto a agarrava pelos braços e vociferavam de seus
cadáveres pútridos risos.

A festa era bem-feita, mesmo para um vampiro de 10ª Geração como o bandeirante,
depois de duas horas o anfitrião desceu as escadas em uma roupa de roxo com negro, botinas
que poderiam matar um kindred se o reflexo do sol batesse, uma gola de um branco invejável e
um cabelo em uma arrumação invejável.

O Sangue Azul ficou mais ou menos entre os seus por mais uma hora, mas quando ele
viu a sua nova “mortal” no rebanho ele sentiu um desejo de a consumir ali mesmo, todavia ele
ainda queria manter o decoro, membros da Camarilla demais, ele já tinha matado muitas índias
e seus sussurros da noite o tinha avisado de sua cabeça estar a prêmio.

Por isso, ele recolheu a jovem para seu quarto a segurando pelo braço, lá a assamita
disfarçada falou a sua presa:

- O que eu pode fazer para com um homem tão exuberante como o senhor?

A assassina começa a se aproximar do Ventrue cada vez mais olhando para seus olhos,
Antônio fascinado por tanta beleza não desconfiou no começo, já que a índia começou a colocar
a mão em sua coxa e começo a subir cada vez mais.

- O que sua sinhá não pode dar que eu possa?

Subindo cada vez as mãos para puxar a calça do vampiro, ele apressadamente começa
a cheirar a nuca de sua presa, mas ao sentir um cheiro de licor de laranja ele se espanta chutando
a sua membra de rebanho e ao mesmo tempo tentando usar sua majestade na estranha figura
a afastando:

- Quem é você??
- Seu cheiro, seu gosto, tu nãos és humana, o que és tu criatura torpe?
O corpo de Alice é jogado para trás, suas costas batem na quina da janela e sua cabeça
acerta precisamente o ladrilho da parede, tentando resistir aquele controle mental ela começa
a se encolher no chão como uma criança em posição fetal.

Ao ver ela gritando e não respondendo, o Sangue Azul desesperado pula da janela e
começa a correr, ao cair ele pisa em uma poça, ele não percebera, a chuva de verão paulista cai
devagar como lágrimas na noite.

A jovem assamita, se desenrosca como um caracol e ao se levantar apressadamente


olha para a janela vendo sua caça sumir na escuridão da noite, apressadamente, ela pega a katar
que tinha escondido entre as pratas da casa e começa sua perseguição.

Pulando da janela como ele fizera, ela começa a perseguir a trilha de lama que ele
deixara no chão, e com a chuva ela corria, até que em um beco ela encontra mais pegadas,
usando sua linhagem mortal ela deixa todo o local em silêncio, somente com arma ancestral em
mãos, ela começa um embate com o Ventrue.

Ela se concentra para tentar ser mais rápido que ele, mas como um velho lutador, seu
alvo tinha bastante perícia e a rasga no peito direito, isso fez com que a guarda dele abrisse
fazendo com que Alice desse um golpe certeiro fazendo o vampiro recuar.

Com medo ele começa a fechar suas próprias feridas e a se proteger, todavia os ataques
da sua caçadora eram difícil de ver e pouco a pouco sob aquela chuva ele chegou a seu limite
caindo em um quase torpor.

Assim nesse estado, a caçadora dá a morte final ao seu alvo, varrendo sua existência da
noite sombria, foi assim que ela sentiu um cheiro de lírio da chuva que caía em seu corpo
desnudo e ensanguentado das feridas deixadas pelo seu oponente.

Ela então recolhe o corpo para o quarto, o faz parecer um acidente de um velho patético
que cairá da janela, mas deixando um sinal bem claro para a Camarilla, o serviço estava feito.
Era a primeira vez que ela tinha se machucado de verdade, com medo de ser incriminada
pelos seus contratantes, a jovem vampira voltou para seu mestre que a suturou e começou a
ensinar:

- Entendo porque nós não nos filiamos a seitas minha filha?

Padre Josué fala feliz e ao mesmo tempo preocupado com a sua cria, o ferimento é
fundo, mas ela provavelmente irá se recuperar, pensa ele.

- Perdão meu senhor, eu me desesperei achei que ele não ia perceber, o que é sentir
meu cheiro?

Alice pergunta ao padre confusa, já que é a primeira vez que ouvira sobre tal coisa na
sua não vida, algo que fez seu alvo tremer da cabeça aos pés.

Ao escutar essas palavras, Josué para de a suturar, respira fundo pensando que esse
seria o melhor momento de explicar a maldição do altíssimo a Caim, ele um ancião sabia
exatamente o motivo disso, seu matusa tinha lhe explicado quando ele indagou sobre o ódio
pelos Temeres de seu clã.

- Bom minha amada criança, como sabes eu sou uma criatura da noite, um vampiro, que
teve um outro mestre e assim por diante, cada um de nós kindreds somos amaldiçoados e
acabamos por vontade de devorar uns aos outros para ficarmos mais fortes.

Ele fala isso puxando a linha mais forte sem querer, fazendo a garota tremer um pouco,
então ele olha para a jovem vampira em seus olhos e continua a explicação:

- Você sente algo ao me ver certo?

Ele pergunta a ela que o responde prontamente:

- Sim, muita admiração, você fez o que ninguém pode por mim, todos na minha vida me
abandonaram ou me viam sobre como depósito de sêmen deles.

Ela o responde em uma mistura de ódio e dor, o ancião continua:


- Então criança, um dia talvez você sinta tanta essa admiração que poderá querer tomar
a mim a força para ser como eu...

Ele fala melancólico olhando fixamente para a sutura no peito dela, sem entender ela
retruca:

- Eu jamais faria isso com você padre, seria um egoísmo tremendo de minha parte fazer
isso, foi contigo que finalmente fui livre pela primeira vez...

Ela fala meio incrédula e meia desconfiada do porque ele temer e ficar confusa com a
fala de seu alvo que agora jaz nos braços da morte verdadeira, então o seu Sire fala ao terminar
a sutura:

- Bom, você tem um sangue vampírico grosso pequena Joana, os vampiros com o sangue
mais “fraco” que ti sempre sentirão algo ao te olhar e pelo jeito eles sentiram o cheiro do que
elas mais gostam de comer.

O padre dá uma pequena risada da ironia da sentença que acabara de pronunciar


balançando a cabeça, ele espanta as moscas da ferida recém-fechada, sua pele de ébano é
refletida na pequena vela ao longe dos dois, confusa ainda ela pergunta:

- Porque tu riste? Não é legal deixa sua aprendiz a ver navios.

Ela fala brava cruzando os braços para ele enquanto se veste para se deitar após um
serviço bem feito, ele fica meio envergonhado por tirar sarro de uma criança tão nova, então
ele responde:

- Nós kindreds temos um tabu entre nós pequena, se nós sugarmos todo o sangue de
outro da nossa espécie mais velha que nós em sangue e continuar podemos devorar sua alma e
ficar ainda mais forte...

Ele com um pouco de arrependimento na voz de ter contado a uma moça tão jovem
sobre o diablerie, ela já se deitando o olha nos olhos e fala:
- Para de bobagem, meu mestre deve ter bebido sangue de tabu para estar falando tanta
asneira.

Ela puxa um lençol e se vira para dormir, já que a luz do anjo está para os beijar, com
um suspiro de triste e semblante incrédulo, o padre se mantêm em silencio, paga a vela e vai
para sua cama dormir, enquanto o dia está para nascer ele pensa como aquela criança ainda
mesmo com mais de 100 anos de idade ainda não compreendeu como é o mundo dos filhos de
Caim.

O Dia do Pagamento

O dia naquela manhã seguinte foi perturbador, os lacaios da Camarilla trabalhavam


ferozmente para esconder a única evidência que não se encaixava no acidente, um buraco no
estômago do bandeirante.

O policial em ação, Alfredo, era um rapaz que acaba de assumir o cargo e queria mostrar
serviço para com seus superiores, infelizmente nada sabia que tudo que acontecera ali ia ser
apagado da existência.

Ele argumentou o máximo que conseguiu, pediu análise pericial, sua lógica era
impecável sobre a posição do corpo e a misteriosa marca na barriga, mas os lacaios da Camarilla
conseguiram conter o rapaz pelo dia.

Do outro lado da cidade, Alice acordou antes de seu mestre as seis horas da tarde, e
começou a limpar sua nova arma, ela cuidou da lâmina como se fosse parte de seu ser, uma
extensão de seu próprio braço esquerdo.

A barraca deles precisava ficar bem longe da cidade, a alimentação da assamita era
muito barulhenta, seus alvos se contorciam de dor, então era mais seguro morarem na borda
da cidade.

Ela nem percebeu quando seu mestre acordara, ele se levantou com um pouco de
dificuldade depois de uma hora e meia que ela já tinha levantado, se vestiu e foi para fora do
local, ela sabia o que ele iria fazer, então esperou pacientemente sua volta enquanto limpava
sua arma.
Depois de uma hora, o padre trouxe um caçador em seu ombro imobilizado, o homem
parecia ter um metro e quarenta, tinha roupas marrons com folhas verdes, suas botas negras
estavam um pouco gastar de tanto trabalho, carregava uma espingarda, seu rosto tinha uma
feição europeia, barba a fazer por alguns dias, seus olhos marrons quando Alice abriu as pupilas
dele.

Deitando o homem, seu Sire olhou para a garota e falou:

- Bom, você teve bastante esforço ontem e hoje terá seu pagamento com o contratante,
então para comemorar beba criança, só lembre de para quando já estiver cheia.

Depois de terminar sua frase, ele sai de perto, a kindred olha o homem como olhara
para eu oponente, e assim ela começa, a dança de alimentação da jovem era incomum:

Primeiro ela cheirava o alvo, como se assim conseguisse aprender tudo dele, depois ia
devagarzinho atrás dele, e fazia um abraço por trás mordendo o pescoço do lado esquerdo e
começava como um gato a pressionar o mortal.

Com isso o homem acorda de seu estonteamento e começa a sentir todo seu corpo
formigando, sua visão começa a ficar turva novamente e seu corpo doí como se mil agulhas
simultaneamente estivessem entrando em seu corpo.

O caçador começa a se debater fortemente, mas a posição que a jovem faz impede de
ele ir mais longe, sem poder se mover ele começa a gritar de dor e a pedir ajuda, o mortal
começa a sentir seu coração bater mais forte, desesperado de dor tenta agarrar o que for que
esteja fazendo isso com ele.

O pobre humano até consegue por meio segundo agarrar os cabelos do alvo de sua dor,
mas é como se tentasse pegar um peixe em rio corrente, como o desespero lhe apertando ele
se bater ainda mais forte gritando com toda força por ajuda ficando rouco no processo.

Ela então começa a se sentir satisfeita, tira seus dentes do pescoço da vítima e começa
a alterar sua memória enquanto lambe as marcas igual um gato por algum tempo:
- Você foi caçar alguns cervos para servir de troféu e não encontrou nenhum, assim você
bebeu do seu cantil por um tempo e perdeu a hora de voltar para casa, tu não viste nada e nunca
se lembrará dessa amarga dor.

Após lamber as feridas e elas se fecharem com o tempo, sua posição muda e ela libera
o homem que como se tivesse em transe entra para dentro da floresta.

Levantando, ela se apruma, olha para o padre e fala:

- Vamos, onde é o encontro com o pagador?

O padre pede para a jovem se vestir e assim ela o faz, com roupas simples de freira para
se confundir na multidão só deixando seus olhos dourados de fora da equação, então eles
seguem para o centro da cidade paulista.

Na praça do Patriarca, esperava o jovem tremere Vinícius Marques e seu lacaio dentro
da igreja de Santo Antônio, nervoso o rapaz estava, pois, havia indícios que o Sabá estava
começando a colocar suar garras em São Paulo, então não queria perder tempo naquele lugar.

O jovem vampiro entra na cabana de confissão sentindo um cheiro de vinho tinto perto
que desregulou um pouco os seus sentidos, mas com a vontade ferrenha ele se concentra:

- Perdão padre, pois, eu pequei contra nosso senhor.

Ele fala ríspido e calmo, então o Assamita responde:

- Qual foi seu pecado irmão?

O tremere responde se incomodando com o cheiro novamente:

- Eu matei meu próprio irmão, paguei para que ele não pudesse mais viver nesse mundo,
cometi o pecado do primeiro assassino.

Então padre Josué para encerrar as linhas do pagamento continua o jogo de palavras
com o membro da Camarilla:
- Ele está morto, nada mais importa agora, tu podes rezar para nosso deus pelo “pecado”
de Caim e pagar alguns contos do real português para que mostre compaixão de caridade e
quem sabe O que Está Acima mostre misericórdia de ti.

Assim, o feiticeiro o faz, ao passar pela porta da igreja, sente da pessoa sentada olhando
para frente o odor de vinho que sentiu a pouco tempo, ele olha para seu lacaio e ao sair o
comanda:

- Descubra quem é aquela pessoa que estava sentada na porta da igreja.

O lacaio novo do tremere, Alfredo, ficou ali e começou sua vigília para cumprir a ordem
de seu mestre, louco pela recompensa após sua façanha.

De dentro da igreja, o Sire de Alice sai do confessionário pega o dinheiro e senta do lado
de sua pequena, entrega o valor tirando 10% que precisa ser enviada para o velho mundo, e
sussurra para ela:

- Parabéns querida, seu primeiro pagamento como uma assamita, você agora é uma
verdadeira do nosso clã, será a criatura que caça à noite, o martelo de nobres de nossa raça.

Ele beija a testa da kindred, ficando fascinado pela boa performance de sua cria, ele fica
sentado do lado dela esperando ela falar algo, ela se ajeita do banco da igreja e abre a boca:

- Tá o que faço com isso? É muito dinheiro, nem a senhora dona do bordel iria imaginar
tanto valor na mão de uma pessoa só, porque isso?

Ela pergunta curiosa, seu Sire retruca de forma ríspida:

- Você é quem traz a morte a ele, mas não es tu que deves ficar fazendo juízo de valor,
justiça e misericórdia não andam juntas, se alguém te paga esse valor em suas mãos para
eliminar alguém, provavelmente é para uma boa razão.

Alice confusa com a declaração continua a perguntar:

- Mas para que eu matei aquele vampiro se ele talvez não tenha feito nada??
Perdendo a paciência, Josué cruza o olhar com sua filha e diz de forma incisiva:

- Tu não perguntas o porquê, se mandam você fazer e o preço é bom faça, entendida?

- Você não é ninguém para eles, além de um sangue mais grosso e te devorariam até
não sobrar nada, nessa escuridão que é a nossa vida não há espaço para esse tipo de coisa toda
com juízo de moral, aprende a caçar antes que você seja a caça.

Ela olha espantada para seu mestre, as luzes das velas da igreja batem no rosto dele
deixando seu tom ainda mais horripilante, ela muda de assunto vendo que tocou em um ponto
delicado:

- Bom, eu sempre quis ter uma viola, dá para comprar com esse dinheiro todo ?

Ele a responde mais calmo, vendo que assustara a garota sem querer:

- Dá sim, vamos ver se encontramos algum boêmio disposto a dar o seu instrumento por
uma boa quantia.

Ele se levanta, pede para que a sua kindred guarde os valores na roupa, Alice pega tudo
aquilo e bota embaixo da roupa de freira, e segue com ele para fora da igreja, até o centro da
cidade de São Paulo.

Lá depois de um tempo procurando eles conseguem a viola que a garota pedira, além
de alguns produtos que o padre precisou comprar para chamar menos atenção.

Josué tinha percebido uma presença estranha os seguindo, entretanto ele queria ver o
tempo que sua pupila iria levar para descobrir que existia alguém no encalço dos dois assamitas
pela noite da cidade.

O novo lacaio do feiticeiro era bom, afinal foi ele que quase descobriu a falha da jovem
assassina, ele cobriu quase todos os rastros, conseguiu anotar o comportamento do dois, as
interações.
Só que ele cometeu um erro: subestimou demais Alice, ao tentar chegar mais perto e
ver se sentia o cheiro que o tremere tinha sentido, tentando de fininho chegar mais próximo da
jovem, pouco a pouco, mas o que ele viu depois disso foi só escuridão, a pequena atingiu quando
ele virou a esquina.

- Que porra é essa?

Ela exclama ao seu Sire que a responde rápido:

- Bom, alguém quis saber o porquê só houve um erro no assassinato ou você ganhou um
admirador criança.

O Padre ri de sua própria fala enquanto limpa a vista de algumas pessoas que passavam
do outro lado da calçada, fazendo apagar da memória dos mortais o que acabara de ocorrer,
recolhendo o corpo semi inconsciente a pequena kindred leva ele para a floresta afastada onde
fica a barraca dos dois assassinos.

Acordando o mortal, ela olha em seus olhos e diz:

- Quem é você?

O filho de Seth meio tonto fala:

- Eu... eu devia achar quem tinha um cheiro de vinho maravilhoso de acordo com as
minhas ordens, sou novo nesse ramo da escuridão, não como vocês funcionam, eu sou só um
policial, moça.

A kindred escuta aquilo com atenção para absorver o máximo de informação possível e
tentar analisar onde ela errou para um ser desse ter chegado tão perto dela, em fúria ela dá um
soco que quase quebra o maxilar do policial, ela exclama:

- Diga quem foi e penso se você merece sair vivo desse local...
Mesmo com as intimidações o lacaio tremere não quebrara, então a assamita começou
a quebra-lo fisicamente até que tivesse algum resultado, mas no final da noite ela não conseguiu
obter nada.

Cansada, com sangue nas mãos, seu Sire começou a limpar a bagunça e liberou o
humano para a cidade, na volta ele encontrou Alice já dormindo, ele então se prepara para
descansar, mas sabe que o que sua kindred fez não vai ser perdoado pela Camarilla.

Aquela que Vaga pelo Vazio da Noite

Anos após o seu primeiro assassinato, a assassina já tinha matado mais nove vampiros
que abusaram demais da máscara e a quebraram, a maioria deles capitães do mato, senhores
de engenho e jovens bandeirantes, dois magos que tentaram matar membro da Camarilla em
segredo e conseguiu a façanha de encontrar um esconderijo de lobisomens para o Sabá.

O padre já não precisava lutar ou matar porque sua pupila já fazia tão bem, e como ele
era independente deixava ela escorrer sangue de quem pagasse bem, com o dinheiro das mortes
eles se mudaram para um apartamento no centro da grande São Paulo.

Todavia, tudo nessa vida volta, e no dia 25 de agosto de 1755, a punição pela tortura de
um lacaio Tremere bateu a porta dos dois assamitas.

Uma carta selada com o símbolo da Camarilla foi entregue as 23:00h enquanto Alice
estava atrás de outra vítima de seu contrato, seu Sire aceita de bom grado, achando que seria
mais um contrato.

Ao abrir, um líder de ranque moderado da organização, Vinícius Marques, pede uma


reunião com o sire da assassina dos olhos dourados em particular.

Prontamente, Josué pega suas roupas, já agora com disfarce de um viajante, e vai para
Pinheiros, onde ficava o endereço descrito no endereçamento da carta.

Chegando no local, uma alta gama de lacaios se encontravam na residência, eles


verificaram se o assamita tinha alguma arma branca ou aparatos semelhantes, recolheram seu
casaco e o mandaram para uma sala no terceiro andar daquela enorme casa.
Chegando lá, um homem austero estava sentando lendo um jornal mortal rindo de
alguns escritos no mesmo, ao ver o homem de cor de ébano chegando ele guarda lentamente o
que estava lendo, se vira para sua visita e fala:

- Boa noite Sr. Josué, bem-vindo ao meu lar, sente-se vamos conversar sobre a sua cria.

O assassino obedece quase que instantaneamente ao Tremere, coloca seu chavéu entre
os joelhos e pergunta:

- O que vossa senhoria, um ser tão poderosos quer saber de mim e de meu kindred?

- Bom... a muito ela machucou uma propriedade minha, aquele lacaio tinha meu sangue
e ela o maculou com suas mãos bárbaras e trêmulas a troco de nada.

Josué começa a lembrar do fatídico dia, enquanto isso o feiticeiro continua:

- Agora, depois de pesquisas sobre essa tal de Alice, eu lhe darei um ultimato, ou você
volta com o rabo entre as pernas para o velho mundo e seu mestre ou... eu acabarei com sua
criança e ela receberá visitas de alguns caçadores.

O homem sorri maquiavelicamente para o assamita que engole a seco e responde:

- Quanto tempo eu tenho?

Ele pergunta e em seguida o Tremere responde:

- Você tem três noites.

Se levantando, Josué faz uma reverência profunda e ao sair da sala em velocidade sua
voz sai antes da porta fechar:

- Assim será feito, deixe a garota em paz, ela viveu a vida toda sozinha, vai saber se vivar
na não-vida também.
Com felicidade no rosto, o feiticeiro começa a escrever para o jornal O Gazeta de Lisboa,
pedindo para um de seus lacaios editar uma notícia de uma assassina que suga o sangue de suas
vítimas para ser publicado daqui a uma semana.

Do outro lado da cidade, o velho assamita senta em sua cadeira, e começa a redigir uma
carta, deixa ela, pega seu chapéu e uma mala com um pouco de dinheiro e essa foi a última vez
que Alice sabe de registros dele.

Chegando quase com o sol, ela estranha o sumiço repentino de seu mestre, mas sabe
que ele tem seus próprios afazeres, assim a pequena vai tomar um banho para tirar o sangue do
assassinato bem feito e se deita.

Se passam algumas noites e sem seu sire aparecer Alice começa a se preocupar,
procurando algo que possa a ajudar ela encontra a carta selada, somente escrito pelo velho
assamita que ele precisou ir atender um chamado e que ela podia agora caminhar com as
próprias pernas.

- Sério?

A jovem exclama:

- Depois de anos é isso que você me deixa, nem um adeus pessoal ou algo?

A Assamita começa a chorar sangue e a gritar:

- Eu passei a vida toda negligência pelos meus pais, tive que me tornar uma prostituta
para sobreviver, você me mostra a beleza da não-vida e some!!!!

Ela se ajoelha abraçando suas pernas enquanto continua a chorar:

- Entendo, papai sempre disse que era muito difícil de me amar, porque você que é um
vampiro teria algum amor por mim? Eu só fui uma arma para você e quando cansou foi embora,
nem uma desculpa nem um perdão...
- Só se foi, eu nunca pedi para isso, mas você disse que tudo que não senti em vida eu ia
poder tentar na não-vida, mas pelo jeito não, ser amada parece ser algo que nem os não-vivos
conseguem fazer comigo.

Ela desatina a chorar manchando a roupa e continua a falar sua dor:

- Imagino que você estava fazendo o “melhor” para mim né? Como se me abandonar e
me deixar aqui fosse a coisa certa, como se eu não merecesse sua companhia, você não era só
meu mestre, era meu amigo, nunca te pedi nada a mais que isso, eu só queria um... amigo...

Alice já não aguentando deita sua cabeça sobre o asolho marrom e frio e sua visão fica
vermelha de tanto sangue que se esvai dela, sua roupa simples de dormir, azul com babado
branco, já está quase em cor de salmão, e a jovem assamita fica ali a noite toda, em posição
fetal.

Em sua mente ódio e desprezo pelo seu mestre aumentava cada vez mais, e seus
pensamentos a afogavam como um navio em uma tempestade incontrolável, levando a jovem
para lugares sombrios onde a sua natureza não-viva nunca a tinha levado.

Um novo dia raiava e o vizinho de baixo da assassina reparou gotas de sangue saindo de
seu teto, preocupado ele chama a polícia, a dois dias um homem havia sido morto e seu sangue
totalmente sugado a uma quadra dali.

Um dos lacaios do feiticeiro que tramaram a destruição da garota escutou o chamado


da polícia e conseguiu o caso postergando a investigação e assim o seu mestre começou a mexer
seus pauzinhos, a noite quando Alice se recompôs, um homem bate à sua porta.

Um jesuíta como seu sire era, Tomé de Aquino, se apresenta a porta, ela começa a
esconder evidências de seu verdadeiro eu, se arruma, mesmo não sabendo como por não
enxergar seu reflexo, e abre a porta.

- Boa noite padre, o que veio fazer aqui?

O homem de um metro e quinquenta e cinco, vestindo a roupa tradicional franciscana


se apresenta:
- Boa noite jovem dama, um dos seus vizinhos escutou choros a noite e algo vermelho
pingando, eu escutei a história em um confessionário e resolvi lhe fazer uma divisa, perdeu
alguém minha querida?

Frágil, esmirrada, Alice responde de forma triste sem perceber:

- Sim, ele foi embora sem dizer nada.

O frade responde fazendo sinal para entrar:

- Acontece com todo mundo, mas a vida precisa continuar garota.

Sem perceber, Alice estava com um corte transversal no punho esquerdo que o jesuíta
aponta e ela com medo de ser julgada esconde prontamente e fala:

- É... mas é difícil contar com um amigo e ele te empalar com uma estaca de madeira.

Ela ri da piada que fizera, mas o homem de fé se mantém sério e complacente com ela
fazendo a assamita abaixar ainda mais a guarda:

- Perdão, não era hora para isso, acabo fazendo piada em momentos assim, deixa a dor
menor, eu acho...

Olhando para ela frade sorri e responde:

- Todos nós temos um jeito de encarar a vida, uns mais saudáveis que outros, mas é um
jeito. Bom eu não quero ver uma irmã minha perder a vida por algo então deixe esse velho
jesuíta te escutar.

Assustada por nunca ter escutado tais palavras, ela começa a chegar perto do homem
sentado no seu sofá bem devagar, como um gato, e depois de um tempo ela está frente a frente
dele:
- Eu já falei, era uma pessoa que conheceu os piores segredos sobre mim, me acolheu e
quando achou que a melhor coisa a se fazer era se afastar de mim ele o fez sem pensar duas
vezes.

O jesuíta respira fundo olha nos olhos dourados da vampira e fala:

- Talvez ele só não esteja em seu juízo certo, algumas pessoas não entendem o valor de
si e de como só a sua companhia pode trazer conforto a alguém, eu já escutei tanta coisa criança,
pessoas o tempo todo vem se confessar dizendo tanta bobagem.

- Uma certa vez um rapaz amava mais a moça que trabalhava na sua casa do que sua
esposa, então ele começou a gritar e a xingar sua funcionária até ela pedir demissão.

- Pessoas tem medo de enfrentar seus sentimentos e seu ser interior, era isso que nosso
salvador alertava criança, a mudança de Jesus propõe a todos nós é de dentro para fora, sermos
pessoa melhores, honestas com os próprios sentimentos e vontades.

Meio desconfortável com a conversa por ter um homem de fé na sua frente, Alice estava
muito fragilizada para tentar interromper ou falar algo e só escuta, então o frade continua:

- Algumas vezes as pessoas esquecem que os outros tem sentimentos tanto quanto a
gente e acaba destruindo coisas tão belas por egoísmo.

Alice interrompe o homem que está a sua frente por sentir um cheiro estranho:

- Só um segundo, acho que deixei algo queimar na cozinha.

Rapidamente ela corre para o local, começa a passar um filme na sua cabeça e depois
de identificar os sinais, uma estaca passa seu braço direito, ela se vira como um felino assustado,
e parado na porta está o homem que oferecera palavras tão doces:

- Está pronta para se redimir irmã? O Senhor está pronto para perdoar todos os seus
pecados de uma vida sombria e egoísta, suas lágrimas de crocodilo terão o descanso do Pai
amada, e você será livre do peso que carrega.
Com o braço direito imobilizado entre o móvel da cozinha e à estaca, a assamita pega
rapidamente uma faca gigante de cozinha arremessa no caçador que se esquiva quase pegando
em sua orelha, nesse meio tempo ela força seu corpo o máximo que consegue e retira à estaca,
pulando o vão da janela da cozinha, com seu sangue marcando o chão, mais dois frades
esperavam na frente do seu prédio.

Eles, vendo a vampira fugir começam a perseguir a kindred com maior afinco que
conseguem, preparados, agora a caça, ela corre tentando evitar as armadilhas dos caçadores,
um por um acaba machucando ela, mas perdendo a mesma de vista.

A lua estava em seu ápice, sem ter para onde ir, ela começa a desesperadamente
procurar rotas de fuga, e usando tudo que podia até sua última gota de sangue, ela consegue
sair da grande São Paulo naquela noite, encontrando uma gruta nos arredores da estrada Rio –
São Paulo, onde ali desmaia enquanto a luz do sol toma seu lugar no céu.

A Bradadora da Capitania de São Paulo

Sem saber onde estava, a única coisa que sentia era fome e uma voz dentro de sua
cabeça implorando para sair, algo demoníaco que engolia a sua não-vida com uma força
incomensurável.

Naquela noite de sexta-feira, em estado de uma pessoa quase morta, Alice sente o
cheiro de algo no ar, algo doce, cheiro de metal, macio...

Ela tenta resistir, mas não consegue e aquele odor maravilho a guia, então ela vê um
minerador machucado com a perna quebrada e sangrando em uma descida, o homem de um
metro e sessenta, negro, estava sendo ajudado por outros mineradores de diversas etnias,
tamanhos, a luz da lua deixou eles tão bonitos, tão suculentos para a assamita.

Em um frenesi com seus olhos ficando como de gatos, suas presas saltam para fora, e
ela pula na garganta do homem ferido em uma velocidade que nenhum outro minerador viu, só
perceberam quando seu amigo estava em gritos de dor ecoando por toda a floresta.
Assim que ela retirou toda a vida daquele ferido, os outros com medo começaram a
correr e ela faminta correu atrás de um por um, devorando cada um de uma forma diferente
enquanto seus gritos eram ouvidos por toda a floresta perdo do Rio dos Mortos.

Até o ano de 1806, lenda se formaram dos gritos que aquela floresta trazia e todos os
curiosos que chegaram perto nunca voltavam.

Alice tentava se controlar e acaba por tentar não fazer nada para gastar menos sangue,
mas sempre a fome vinha e um aventureiro estava andando pela noite de sexta naqueles
arredores, o sabor deles era demais para ela resistir.

Para tentar controlar aquilo que não tem controle, Alice criou uma canção de ninar para
tentar acalmar a besta interior, mas era ineficiente e isso só aumentou a curiosidade das pessoas
para escutar tal voz.

A voz era melodiosa e por vezes Alice tentou se matar usando a luz do sol, mas toda vez
que ela chegava no limite de resistir seu instinto a puxava para dentro da caverna de novo, e de
novo.

“Eu nunca pensei que esse ia chegar,


Ver amor no fogo do sol que pode me matar,
O escuro da noite sempre foi meu lar,
Mas agora ele é um tormento que eu preciso sempre olhar. ”

Disso, vinha uma melodia assobiada que tremia a espinha de todos que ouviam, porque
depois disso só gritos ecoavam aquele córrego.

No início do ano de 1807, sabendo que a família real viria fugida para o Rio de Janeiro,
com medo da Camarilla usar isso em seu favor, o Sabá começa a recrutar o máximo de pessoas
possíveis.

Como membros da Camarilla sabiam o que era aquilo que morava no rio, usavam Alice
para matar insubordinados, contando os dias que ela deveria ficar com fome e mandando eles
para a floresta, usando ela como um objeto como antes, só que sem pagamento.
Um templário do Arcebispo foi declarado para entrar naquele lugar e achar quem seria
essa máquina de matar da torre de marfim, então com seu disfarce de caminhoneiro, o La
Sombra Jorge entrou na floresta.

Como ele não fora no dia que Alice estava com fome, ele só escutou uma melodia triste
vindo de uma caverna e ao adentrar nela viu pilha de corpos em decomposição das mais variadas
formas e uma pequena mulher com um colar de ossos estalando os dedos freneticamente.

Com todo cuidado ele aborda a vampira bestial:

- Qual o seu nome criança?

Assustada ela se encosta na parede e vê a figura estranha a sua frente, ela nem se
lembrava como era falar, então ela escreve com seu próprio sangue na terra o nome Alice.

Sentindo um cheiro de álcool daquele sangue, o paladino lembra da história de uma


assamita que seu sangue tinha cheiro de algo que você ama comer, beber ou cheirar, então ele
estende a mão devagar e espera ela chegar perto:

- Venha, você não merece esse lugar, sei da sua história antes daqui as vezes até uma
pessoa tão forte como você precisa de um apoio.

Aquele homem era a primeira pessoa em anos que aparecia ali e oferecia uma saída,
então juntando sua própria coragem e com as palavras de apoio, ela se levanta devagar e
encosta naquela mão, com receio ela recua só um pouco:

- E se eu tentar te devorar?

Falando preocupada a kindred expressa sua dor, mas o desconhecido retruca:

- Não vai, vou levar você para um lugar e você vai poder se alimentar adequadamente,
há uma reviravolta que irá acontecer no Rio e sei que você ama aquele lutar, nós podemos te
ajudar e você poderá ter a vida que perdeu.
Abalada ainda pela única pessoa que ela confiava ter ido embora, ela não deixa que o
sentimento de raiva, inferioridade e abandono a tome, ela volta a apertar a mão do
desconhecido e dali viajando de São Paulo ao Rio no caminhão, a kindred descobriu a tolerar
vampiros de novo, mas algo dentro dela dizia que nunca mais a assamita ia conseguir confiar em
alguém de novo.

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