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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE BELAS-ARTES
Ano Lectivo
2009/2010

Mestrado de Museologia e Museografia

_________________________________________________________

Conservação Preventiva

Docente: Prof. Doutora Luísa Arruda

Discente: Maria Alice Pereira dos Santos


Quatro Esculturas de
Pedra existentes no pátio
da cisterna da Faculdade
de Belas Artes de
Lisboa_______________
AGRADECIMENTOS

Agradeço à Dr.ª Nazaré Escobar, do Instituto de Conservação e


Restauro de Lisboa, assim como à Dr.ª Rita Sáez, do Atelier-
Museu António Duarte de Caldas da Rainha ,todo o apoio,
informações e orientações concedidas, o que contribuiu para
melhorar muito o meu trabalho
Introdução_________________________________
Proponho-me neste trabalho, estudar as esculturas de pedra existentes no pátio
da cisterna da Faculdade de Belas Artes de Lisboa.

São peças de muito valor que pertencem ao património da Faculdade, e das quais
tive um interesse particular em trabalhar, pela sua importância escultórica, se
encontrarem em mau estado de conservação, por existir um único documento de
estudo chamando à atenção das condições em que se encontram, e por até hoje,
ainda nada ter sido feito. Refiro-me ao trabalho rigoroso e exigente do escultor
António Duarte.

Efectuei pesquisa, no Centro de documentação do Museu António Duarte em


Caldas da Rainha, e conheci o percurso fotográfico e escrito que o escultor fez
pelas fachadas do Mosteiro dos Jerónimos e Igreja da Conceição Velha,
encontrando paralelismos e procurando hipóteses da possível localização original
das esculturas, dos materiais, técnicas, prováveis autores e do estabelecimento
de conclusões Apoiei-me nos seus textos escritos para a realização do trabalho.

Procurei encontrar soluções para conservação/prevenção e consolidação das


esculturas, depois de percorrer vários caminhos, entrei em contacto com a
empresa Nova Conservação, na pessoa de Nuno Proença. Do contacto, foi
referida a importância de se realizar um trabalho do mesmo género do portal da
Igreja de Santa Cruz de Coimbra nos anos 90 -- foram realizadas cópias em
cimento das esculturas do portal, pelos Edifícios e Monumentos Nacionais ,
encontrando-se os originas no claustro do mesmo Convento.

Em anexo encontra-se uma fotocópia do registo de entrada das esculturas na A.


B. A, L, em 1837, para serem beneficiadas.

II- Caracterização do Espaço___________________

O Convento de S. Francisco, onde se encontram as quatro esculturas de pedra,


remonta quase à nacionalidade de Portugal, pelo menos, há memória do primeiro
convento nesse espaço. Sendo das primeiras casas dos Franciscanos em Lisboa,
localizado num espaço que estava a ser povoado, situado junto à cidade a norte
da primeira igreja dos Mártires, no denominado Monte Fragoso, ermo e
despovoado. As casas franciscanas formavam uma custódia dependente da
província de Espanha e há registos de que já em 1277 se ensinava teologia no
Convento de S. Francisco.

O edifício teve várias fases de construção ao longo dos tempos. No séc. XIII teve
a primeira ampliação, mas do período medieval, apenas resta vestígios
arqueológicos.

No séc. XIV, em função da muralha fernandina, abriram-se novas ruas e o


Convento de S. Francisco passou a estar incluído no perímetro urbano.

O Convento esteve sempre ligado à história de Portugal, era apelidado de


“cidade de S. Francisco” devido à sua grande extensão. Depois de obras do séc.
XVI, os limites do espaço conventual eram definidos a poente pela rua Serpa
Pinto a sul pela rua Vítor Cordon e a norte pela actual rua Capelo. O Convento
,com um grande conjunto de construções, comportava várias dependências,
entre elas, o Hospital dos Terceiros de S. Francisco, o Hospício da Terra Santa e
a Igreja que possuía várias capelas. O edifício comportava 3 andares com largos
corredores de abóbadas de berço abatido, característico da arquitectura
conventual do séc. XVI e XVII

Ao longo dos séculos, especialmente no séc. XVIII o Convento e a Igreja a ele


associada, foram palco de vários incêndios e derrocadas. Com o terramoto de
1755, 25% do conjunto dos edifícios foi destruído, afectando especialmente a
Igreja conventual, conservando-se intacta a cisterna

Quando em 1834, foram extintas as ordens religiosas, O Convento de S.


Francisco comportou os bens dos extintos conventos, tendo sido instalado nesse
espaço alguns serviços públicos como a Academia Nacional de Belas Artes e a
Biblioteca Pública.

O Convento no essencial mantém as características físicas do séc. XIX. Foi nesse


período, em 1837 que deu entrada as quatro esculturas vindas do Convento do
Desterro para serem valorizadas, ficando inicialmente junto ao claustro do piso
térreo da Escola sendo depois mudadas para o pátio da cisterna onde
permanecem até hoje, ladeadas pelos três andares com arcadas e janelas deste
espaço do Convento.

.
III – Caracterização das Esculturas_______________

Proveniência/Atribuição e Datação
Não se sabe se as quatro esculturas formaram conjunto na época em que
estiveram integradas na arquitectura, mas pensa-se ser possível, pela sua
unidade formal. É difícil, devido à escassez de dados, proceder de uma forma
precisa à identificação do autor das quatro esculturas, - porque são do mesmo
autor1 e do local de proveniência das peças. Contudo, se tivermos em conta a
época atribuída à execução – claramente expressa pelo estilo a sua inclusão na
nossa escultura da primeira metade do séc. XVI2 – podemos por comparação com
outras obras da época, levantar algumas hipóteses quanto ao seu autor e local de
origem.

O escultor António Duarte analisou as hipóteses, de terem estado integradas na


Igreja do antigo Convento de S. Francisco da Cidade, destruído em 1755, área
onde hoje se encontram; ou removidas para esse local como salvados de portal
da Igreja da Conceição Velha, também destruía pelo terramoto. No percurso de
exposição das hipóteses referidas, foi sumariamente analisada a imaginária do
portal lateral da Conceição Velha, e dos portais do Mosteiro dos Jerónimos; no
portal lateral dos Jerónimos foi sublinhada a existência de estátua de apóstolo,
atribuída pela primeira vez sem prova documental, ao escultor francês Nicolau de
Chanterene, por comparação morfológica com obras identificadas deste escultor,
na Igreja de Santa Cruz de Coimbra

Concluiu-se que aos Jerónimos não pertenceram e ao edifício do Desterro


também não , dado este ser do séc. XVII e consequentemente posterior ás
esculturas. É possível terem pertencido ao portal principal desaparecido da Igreja
da Conceição Velha, por falta de um S. Pedro e S. Paulo no portal lateral desta
Igreja, por ser regra a sua presença em portais; pelas suas dimensões que o
portal desaparecido não seria menor em altura que o lateral existente.
Relativamente à Igreja do Convento de S. Francisco, parece não haver espécies
de imagens para confronto, alem de elementos decorativos, pelo facto de se
encontrar Santa Clara de Assis filha espiritual de S. Francisco, e por se
encontrarem no local da Igreja destruída e não no Convento do Carmo onde se
encontram obras da Conceição Velha .

Concluiu também que as esculturas são de oficina da passagem da primeira


metade do século XVI ao segundo de características que as agrupam entre si3
Proprietário/Número de Inventário/Material
As esculturas estão integradas no património da Faculdade de Belas Artes da
Universidade de Lisboa. Têm o registo de entrada número 172 no livro das actas
da A. B. A. L. com a data de 20 de Dezembro de 1837 (conforme fotocópia em
anexo)

O material é muito semelhante em todas as esculturas – Calcário da encosta da


Ajuda4

Identificação:

Denominação: São Pedro

Representação iconográfica – Apresenta-se sempre


como um homem de compleição robusta, maduro ou velho.
Tem barbas fortes e curtas, calvície ou uma tonsura. Ou
aparece vestido de papa ou então como apóstolo. Os seus
atributos são numerosos, sendo as chaves o mais
preponderante.

Descrição: Escultura de vulto: imaginária


Imagem de São Pedro esculpida de pé. Manto traçado da
esquerda, com bordadura de motivo relevado. A barba e o
cabelo espessos dão forma quase quadrangular à cabeça
A mão direita achatada segura livro aberto e a mão
esquerda prende chave. A face posterior é dado o tratamento a ideia que
esteve inserida num recanto ou janelão

Dimensão: Mede um metro e cinquenta de altura


Denominação: S. Paulo

Representação iconográfica: apresenta-se com barba e


compleição robusta. Apoia-se, por regra a uma espada nua
(alusão ao seu martírio) e ocasionalmente uma cesta.
Também tem um livro como os apóstolos

Descrição: Escultura de vulto imaginária


S. Paulo está fracturado mais ou menos na zona superior do
tórax, ficando os ombros incorporados no bloco superior .No
plano inferior parte do manto é saliente pelo avanço do joelho.
Segura ligeiramente com a mão esquerda espada com punho
destruído. O pé direito encontra-se recuado nele fazendo o
equilíbrio da figura. A mão direita segura pela parte de cima
um livro aberto.

Denominação: Santa Clara de Assis

Representação iconográfica: É apresentada quer


jovem quer idosa. Veste o hábito de clarissa com manto.
Os seus atributos são uma cruz com um ramo de oliveira
– alusão ao seu amor pelo crucifixo e uma flor-de-lis.

Descrição: Escultura de vulto imaginário


Manto traçado da esquerda para a direita e envolvendo a
cabeça. Segura na mão esquerda à altura da cintura cruz
em diagonal e na mão direita um pouco acima da cintura
redução de um edifício de dois andares referente à
fundação
Denominação: Santa Maria Madalena(?)

Representação iconográfica: Apresenta-se umas vezes


vestida com ricos trajes, ou então como penitente. Como
atributo tem um vaso de perfumes, uma caveira ou uma
coroa de espinhos

Descrição:
Actualmente sem atributos de mais difícil definição, no
entanto traja com vestes de dama de elevado nível social,
manto cruzado caindo sobre ponta de pé direito calçado.
Corpete com tecido fino pregueado, chapéu em forma de
turbante e cabelos compridos encaracolados

IV- Conservação preventiva____________________

Estado de Conservação
As esculturas estudadas, têm estado ao longo destes quinhentos anos
submetidas ao impacto de diferentes factores deteriorantes como são: contínua
interacção com os agentes atmosféricos (humidade, ampliações térmicas) e
poluição; impacto de efeitos destruidores de catástrofes naturais como foi o caso
do terramoto de 1755; factores derivados da natureza estrutural do material,
restaurações incorrectas de isolamento de fracturas com cimento; conservação
preventiva inexistente. A interacção de todos estes factores descritos traduziu-se
em alterações das propriedades físico-químicas e mecânicas das peças e
consequentes danos irreversíveis

Da observação directa verifica-se: presença de fungos com pigmentação e


desagregação dos suportes. Apresentam também lacunas de matéria, fissuras,
fracturas, oxidação e mutilação.
Medidas propostas
Estas esculturas foram concebidas para o exterior, no entanto, dado a sua
existência ser aproximadamente de quinhentos anos e continuarem ao arbítrio de
alterações provocadas pelos factores referidos, proponho as seguintes medidas:

1º-Retirar as esculturas do local onde se encontram actualmente, coloca-las


em espaço a determinar no interior da Faculdade e colocar cópias em cimento
no pátio da cisterna, para preservar a memória da sua existência no local.

2º- Restauração/Consolidação dos originais

Restauração/Consolidação

Com base no diagnóstico do estado de conservação das peças, propõem-se


efectuar um tratamento que deverá seguir o princípio da reversibilidade, isto é
removendo determinado material que possa vir a causar danos ou acelerar o
estado de degradação das esculturas.

Será necessária uma intervenção mínima, devendo limitar-se ao estritamente


necessário e respeitar as esculturas no que se refere ao seu aspecto estético e
histórico e à sua matéria original. Deverá ser feito o registo do historial de
intervenção de conservação e consolidação e sua justificação. A documentação
pode ser textual, fotográfica, radiográfica, ou resultado de análises físico-químicas

V- Conclusão_________________________________
Como se sabe as Esculturas continuam por “ beneficiar” desde 1837, quando
deram entrada no Convento de S. Francisco da Cidade.

O escultor António Duarte contribuiu com o seu trabalho e apelo para uma maior
consciencialização do estado em que se encontram as esculturas, e como não me
foi indiferente o apelo invocado pelo Escultor, decidi fazer este trabalho para me
esclarecer e com o meu modesto contributo, ajudar a preencher de alguma forma
este espaço de diálogo que continua por se fazer, para que a situação se altere.
1-Antóno Duarte, “Esculturas de pedra existentes em espaço do Antigo Convento de S. Francisco da Cidade -
Hipóteses de Integração, 1984,Lisboa pp 150

2-Idem,p150

3-Idem, Ibidem, p158.

Anexo 1
BIBLIOGRAFIA

Escultores séc. XVI

CRAVEIRO, Lurdes, “A escultura das oficinas portuguesas do último gótico” in


O Manuelino (coord. de Pedro Dias) vol. 5 da História da Arte em Portugal,
Lisboa, Alfa, 1986

MARKL, Dagoberto, “A escultura do Renascimento” in O Renascimento”, vol. 6 da


História da Arte em Portugal, Lisboa, Alfa, 1986

GOULÃO, Maria José, “Figuras do Além. A escultura e a tumularia”, in Do “Modo”


Gótico ao Maneirismo, Vol. II, da História da Arte Portuguesa, Circulo de Leitores,
1995

CALADO, Margarida, “O Convento de S. Francisco da Cidade”, Faculdade de


Belas Artes, Lisboa, nº1, Nov.2000

DUARTE, António, “Esculturas de Pedra existentes em espaço do antigo


Convento de S. Francisco da Cidade – Hipóteses de integração”, Lisboa,
Academia Nacional de Belas Artes, 1984

Conservação e Restauro
CARVALHO, Maria João Vilhena, “Escultura – Artes plásticas e artes decorativas
– normas de inventário”, Instituto Português de Museus” 2004

RICO, Juan Carlos, Los conocimentos tècicos – Museus Arquitectura e Arte,


Sílex, 2009

SOUSA, Conceição Borges de, e Outros, Temas de Museologia – Plano de


Conservação Preventiva, Instituto dos Museus e Conservação, 2007

Documentação consultada no Centro de Documentação do Atelier


Museu António Duarte -
AMAD/RES/XXV – 1

AMAD/EST/XXIV -- 9

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