Nestas aulas faremos alguns paralelos entre a história do Ramayana e a nossa vida prática, de tal maneira que perceberemos como estes símbolos podem nos ensinar. Queremos trazer os simbolismos clássicos para mais perto de nós, a fim de vive-los. Junto ao Mahabharata, o Ramayana de Valmiki é considerado o maior clássico da literatura épica sânscrita; consiste de 24.000 versos em sete cantos, datado pelos historiadores como tendo sido composto entre 500 a.C. a 100 a.C., ou quase contemporâneo às versões mais antigas do Mahabharata. Mas, há quem diga que o Ramayana foi apenas redigido nesta data, e que era transmitido oralmente muito antes disso, possuindo uma antiguidade muito maior que essa. O Ramayana se tornou popular no sudeste asiático e se manifestou em texto, arquitetura e performance, recebendo muitas versões. A versão mais importante foi a de Tulsidas, poeta hindi do século XVI. Podemos traduzir “Ramayana” como: “Rāma” e “ayana”, "indo, avançando", cuja tradução é “A viagem de Rama“ Narayana também tem um significado interessante, aquele que caminha sobre as águas. Boia no oceano primordial, em cima da sua serpente Sesha (terá um papel importante na história), como o grande demiurgo. Nasce um lótus do seu umbigo, e dele o deus Brahma, o criador. Completam sua tríade: Vishnu e Shiva. O Ramayana é formado por versos escritos numa métrica de trinta e duas sílabas, em Slokas. Sloka é um poema em estrofes de quatro versos, escrito em sânscrito, usado para compor a maioria dos clássicos da literatura védica. Trata-se da história de Rama, príncipe de Ayodhya, que nada mais era do que uma encarnação do Deus Vishnu, o Senhor Narayana (o que flutua sobre as águas), descido à terra com a finalidade de derrotar o demônio Ravana, que, indestrutível pelos deuses, desafiava e ameaçava todo o Universo com seu terror e destruição. Na realidade trata-se do mistério da consciência humana e da sua relação com Deus, trata da história de todo ser humano. Em síntese, o Ramayana é um canto ao Dharma, uma ode ao Dharma. Mas, quem não fala a língua do simbolismo, provavelmente não perceberá estas coisas. A nossa proposta é entrarmos juntos nesta nova linguagem, os simbolismos, que nos permite aprofundar nos clássicos indianos e também de muitas outras tradições. A consciência humana é que é o “Ayana”, que viaja por essa história, que faz sua viagem de encontro a si mesmo, de encontro a Deus.
Aula 02) Ravana e os pedidos à Brahma
Falaremos da história do príncipe de Ayodhya, Rama, filho do rei Dasaratha, e predestinado a tornar-se rei. Mas, dentro da sua história, acaba se vendo envolvido em uma grande aventura, onde terá que lutar contra o poderoso Ravana, o rei Rakshasa. Rakshasa (em português, raxasa) é uma raça de seres mitológicos humanoides ou espíritos malignos na religião Budista e Hindu. Nem todos os Rakshasas são maus, mas Ravana era considerado o pior e mais poderoso deles. Rama terá sua esposa, Sita, raptada por Ravana, e toda a sua aventura será em busca de recuperá-la. Mas nossa história se inicia bem antes disso, com o rei Dasaratha, o pai de Rama. Dasaratha era o rei de Ayodhya e reinava ao lado de suas três esposas: Kausalya, Sumitra e Kaikeyi. O que lhe preocupava era que não possuía filhos, e consequentemente, não tinha descendência para governar o seu reino. Ele pede que Vasishta, Brâmane, faça sacrifícios junto a Indra, e peça a ele filhos, pois disso depende a continuidade do reino. Vasishta tem uma capacidade especial de pronunciar o nome dos deuses, e força Indra a estar presente, quando então pede os filhos de Dasaratha. Porém, ele não sabia das dificuldades que o próprio Indra passava naquele momento. Num tempo muito anterior a esse que estamos falando, Ravana resolveu, junto com seus dois irmãos, fazer um sacrifício para obter pedidos do deus Brahma. Ravana (10 cabeças e 10 pares de braços), Kumbakarna (irmão gigante, muito forte e com um grande apetite) e Vibishana (irmão sábio e justo) fazem juntos dez mil anos de sacrifícios. A cada mil anos, Ravana cortava uma das suas cabeças. Brahma vem a presença dele, quanto faltava apenas uma das suas cabeças a serem cortadas, e diz que atenderá seu pedido, pois já demonstrou sua vontade implacável. Nem mesmo Brahma poderia ignorar tamanha vontade de um ser. Ravana pede, então, para não ser morto por deuses ou demônios. Não pede proteção contra homens ou animais. Aqui parece que ele foi descuidado, mas mais adiante vamos perceber a importância desta escolha. Kumbakarna: Brahma percebe que se der mais poder a ele, destruirá todo o mundo, pois já tem uma força enorme e um apetite capaz de devorar muitas coisas e seres. Faz com que um sopro entre nos pensamentos de Kumbakarna e através de sua boca faz um pedido: dormir durante 364 dias e acordas apenas no dia seguinte, se alimentar muito bem e voltar a dormir. Vibishana: faz o pedido que é uma das passagens mais bonitas do Ramayana. Pede a Brahma, diante do qual ele poderia pedir qualquer coisa no Universo, e pede para que a sua Vontade nunca esteja um passo nem a direita nem a esquerda do Dharma. Pede que sua vontade nunca se desvie da lei do Universo. Brahma se deslembrou com a resposta, e além do que Vibishana pediu, deu a ele também a Eternidade. Depois disso, Ravana faz guerra com deuses, aprisiona Indra, escraviza, dá ordens a Vishvakarman, semeia destruição. Ravana também tem um filho, Indrajit, o senhor das ilusões. Esse filho ajuda Ravana a prender o deus Indra e levá-lo como prisioneiro. Para libertar Indra, Brahma coloca um pensamento dentro da sua mente: “eu estou livre”. Somente mudar o pensamento bastou para libertá-lo das ilusões de Indrajit. Brahma sobe aos céus de Narayana e faz um pedido: encarna como homem (pois Ravana não pediu proteção contra os homens), como um dos filhos de Dasaratha! Os 4 filhos de Dasaratha são a encarnação dos atributos de Narayana, sendo Rama, o mais velho, aquele que detém os principais e a maior lucidez e sabedoria. Kausalya dá a luz à Rama; Sumitra dá a luz a dois filhos: Lakshmana e Shatrughna; Kaikeyi dá a luz a Bharata. Rama já nasce predestinado. O que faz Rama partir em direção a Ravana, na nossa história, parece uma injustiça. Mas, para quem olha de cima, do ponto de vista dos deuses, pensa: estava escrito, já estava predestinado desde o seu nascimento. Rama nasce para ser esse que pode enfrentar Ravana e pôr fim às suas injustiças. Muitas das circunstâncias dolorosas da nossa vida são desta mesma forma: percebemos que existe uma razão, estas experiências têm algo a nos ensinar. As vezes são as coisas que mais nos fazem crescer.
Aula 03) O Príncipe Rama e o casamento com Sita
Existe uma história importante de Dasaratha, quando era jovem: em certa ocasião, mata acidentalmente um jovem, que era o único filho de um casal. Ao comunicar aos pais do jovem sobre a tragédia, o pai lhe diz que não lhe deseja nenhum mal, mas que o Karma é inexorável. Portanto, que se cuide, porque pode ser que um dia, perca o seu mais querido filho por uma injustiça. Isso de fato acontecerá. Retornando ao ponto da nossa história, cada um dos príncipes de Ayodhya tem uma função específica. Rama sempre é seguido e servido por Lakshmana. Bharata é constantemente seguido por Shatrughna. Todos são excelentes príncipes, e todos tem muita devoção a Rama, que era o filho predileto do rei e o predileto por todo o reino! Todos percebiam que ele nasceu para ser rei. Em um certo momento, Dasaratha se sentia cansado e velho, e decidiu colocar Rama ao seu lado para governarem juntos. Chamou os melhores homens para perguntar o que as pessoas pensariam de Rama como rei. Todos ficaram muito felizes, e transcrevemos a fala de Sumantra, abaixo: “Quando Rama olha para nós, nossas dúvidas se dissipam, nossas dívidas se pagam. Tenho visto Rama cavalgando pelos campos e, como pai que indaga dos filhos bem- amados, pergunta aos professores: “Teus alunos te obedecem? E pergunta aos preceptores de armas: “Teus alunos nunca caminham sem as suas armas?”(...) Ele conhece todos os nossos nomes. Dar-nos-ia todo o seu tempo alegremente, se quiséssemos tomá-lo. Pergunta pelas nossas lojas, deseja o bem de nossos filhos, de nossos lares, de nossas esposas e mais. Eu, Sumantra, o auriga, tenho-o visto chorar nossas mágoas; eu o vi rir-se conosco em nossos festivais. (...) Se Rama me diz alguma coisa, posso acreditar nela.” Dasaratha fica muito contente com as respostas, e resolve anunciar Rama em um co- reinado com ele. Neste mesmo período, Vishvamitra pede ajuda ao rei, pois a floresta está um caos, cheia de Rakshasas, e ninguém mais consegue fazer suas oferendas, pois estão saqueando, matando, etc. Pede emprestados Rama e Lakshmana, para que destruam esses seres. Os dois príncipes conseguem combater todos os exércitos de Rakshasas que se lançaram na floresta. Vishvamitra, muito satisfeito, leva-os ao reino de Mithila, para conhecer o rei. O rei de Mithila tinha uma filha, a belíssima Sita, filha da Terra. Sita era a encarnação de Lakshmi, a esposa de Narayana, mas ninguém sabia disto. Quando os príncipes chegaram em Mithila, estava havendo um torneio pela mão em casamento da princesa Sita. A prova era conseguir envergar o Arco de Shiva. Isso é um símbolo muito especial que se repete na mitologia. Envergar um arco e lançar a flecha é a própria personalidade se dobrando diante da vontade, do poder espiritual de um ser humano. A vontade humana, como uma flecha, pode realizar seus objetivos, seus sonhos. Nenhum dos competidores consegue sequer levantar o arco. Rama, além de levantar, o quebra. Todos ficam impressionados e Rama se casa com a princesa Sita.
Aula 04) O exílio de Rama e a aceitação do Dharma
Kaikey, influenciada por Manthara (sua serva), pede que Rama seja banido por 14 anos, e que seu filho Bharata seja rei. Manthara foi um veículo do próprio Dharma, pois não era o destino de Rama ser rei naquele momento. Ele necessitava encontrar com Ravana para combatê-lo. Dessa forma, os defeitos de Manthara foram importantes. Kaikey recebeu do rei Dasaratha dois pedidos, em uma ocasião anterior onde salvou sua vida. É utilizando esses dois pedidos, a promessa de Dasaratha, que Kaikey pede para que seu filho Bharata seja rei. Todos se revoltam com isso, menos Rama. Entende que é seu Dharma, e se submete. O próprio rei pede para que Rama se revolte e o mate. Rama responde: “Cumpre a tua palavra e preserva os três mundos, mantém-nos seguros. A cada promessa rompida, quebra-se um pouco do Dharma, e cada ruptura do Dharma torna mais próximo o dia em que os mundos também terão que ruir. Quando o Dharma se tiver partido de todo, os três mundos acabarão; serão destruídos mais uma vez. Se o homem faltar à sua palavra, por que haverão as estrelas, lá em cima, de cumprir suas promessas de não cair? Por que o Fogo não nos queimará a todos ou o Oceano não saltará sobre as praias e nos afogará?” A vida só é viável porque todos se submetem ao Dharma, e isso gera harmonia. Se qualquer ser descumpre o seu Dharma, o Universo entra em caos. Há que manter a ordem. Sumantra, o auriga, submete sua revolta e aceita cumprir o Dharma, levando em seu carro Rama, Lakshmana e Sita para viver na floresta. cumprimento de Vasishta: “Com que, então, ainda existe um bom coração no reino de Kosala! Vejo honra, vejo de novo o Dharma de orgulhosos guerreiros, o Dharma da bondade e da bravura, e que alegremente se desfaz do corpo no campo de batalha. Vejo lealdade, habilidade e coragem mais uma vez! Este é o Dharma Xátria de que me lembro. É bom de se ver, meu velho, é bom de se ver!” É a saudação à coragem e dignidade de servir ao Dharma independente das pressões das circunstâncias. Quem mereceria ouvir estas palavras de Vasishta?
Aula 05) As histórias de Guha
Assim que Rama sai de Ayodhya, Dasaratha morre de desgosto. Quando Rama, Lakshmana e Sita entram na floresta, encontram com Guha, Rei da Floresta de Dandaka, que foi muito amigo de Dasaratha. Lakshmana ficou 14 anos sem dormir, para proteger Rama e Sita. Em uma das noites, Lakshmana conversa com Guha, contando sobre seu sentimento de injustiça sobre o exílio de Rama, que deveria ser rei. Guha, então, lhe conta histórias muito bonitas: No passado, Dasaratha estava com Guha e Kaikey na floresta. Um animal falou, e apenas Dasaratha e Guha, que conheciam a linguagem dos animais, entenderam. Kaikey pediu que lhe ensinasse a linguagem, mas se Dasaratha fizesse isso, morreria. Nessa ocasião, optou por não atender o pedido da esposa. Portanto, poderia não ter atendido novamente, na ocasião em que pediu que Bharata fosse o rei. Se o rei Dasaratha aceitou o pedido, é porque ele também sentiu que existia um Dharma que necessitava ser cumprido, através do exílio de Rama. Em outra história, Guha diz que conversou com o oceano, e que os rios trazem a ele arrastadas todo tipo de plantas rígidas, árvores. Mas há algo que ele nunca viu, que nunca foi arrancado e trazido até ele: um ramo de relva flexível. Nem os rios, nem o vento podem arrancá-lo. É flexível e por isso se mantém, porque tem a sabedoria de se dobrar às vozes do Dharma. Conta também sobre a sua morte. Não participava dos cultos dos Brâmanes, era infiel à religião. Em certa ocasião, necessita ficar em cima de uma árvore durante muito tempo, durante a chuva, no frio, porque havia lobos abaixo prontos para lhe atacar. Começou a derrubar os frutos dessa árvore no chão, próximo a uma estátua de Shiva. Nesse processo, ficou doente e faleceu. Yama veio buscar sua alma, e o Touro Nandi, a mandato de Shiva, não deixa Yama levá-lo. Diz que esse era o seu servidor mais fiel, que mesmo na noite mais fria, onde os seus adoradores esqueceram de sua estátua, Guha foi o único que passou a noite jogando frutos, folhas e frutas para Shiva, e que não esquecia dele nem um único dia. Ou seja, para Shiva não era uma questão de formalidades, de cumprimento de ritos, era uma questão de que ainda que não o entendesse, não deixar de lembrar dele. Decide então, dar a Guha uma segunda chance e o devolve à vida.
Aula 06) Sequestro de Sita
Bharata, ao retornar para Ayodhya, e perceber o que aconteceu e fica revoltado com sua mãe. Então, vai ao encontro de Rama para pedir que retorne. Rama responde: “A primeira traição pode ser fácil ou difícil, mas, à primeira traição, as outras logo se seguirão. O coração, Bharata... atenta para o teu coração, e não o sufoques. Lá vive a alma, clara, nunca manchada, vendo tudo o que fazemos ou tencionamos fazer. Assim, deixa que o homem fique em silêncio e encontre seu coração. Esta é a única salvação segura. (...) A vida é brilhante e colorida por um momento fugaz, como o pôr de sol. Depois, se vai, e quem pode impedi-la de ir-se? Por conseguinte, Bharata, já que estás neste corpo perigoso, deplora tua própria condição. Pranteia o teu eu, e não lamentes mais nada.” A traição ao Dharma é quebrar o fio de condução da vida. Diante da recusa de Rama, Bharata volta a Ayodhya e coloca suas sandálias no trono. Sempre que tem uma dúvida, pergunta às sandálias de Rama, e elas respondem. Durante o exílio de Rama, todo o povo de Ayodhya, inclusive o rei Bharata, se vestem de eremitas, à imagem de Rama. Todos participam, de certa forma, do exílio junto com ele. Bharata vai para uma vila chamada Nandigrama, próxima a Ayodhya. Faz um voto de morrer, caso Rama não voltasse para ser rei após seu tempo de exílio. Felizes no belo bosque de Chitracuta, Rama e Lakshmana destroem ocasionalmente alguns Rakshasas que perturbam oferendas dos sábios. Surphanaka tenta seduzir Rama e Laksmana. Rejeitada, volta para falar com seu irmão, Ravana, rei de Lanka, e lhe conta sobre a beleza de Sita. Maricha, a pedido de Ravana, se transforma no veado de ouro e Sita pede-o a Rama, que vai ao encontro do animal, enquanto Lakshmana protege Sita. Porém, Maricha, quando é capturado por Rama, emite um som igual à voz de Rama chamando por socorro. Sita insiste para que Lakshmana a deixe e vá ajudar seu esposo. Neste momento, Ravana se aproxima, a enganando, e a sequestra. Jatayu, rei dos abutres, percebe o sequestro e luta contra Ravana. Porém suas asas são atingidas e ele cai na terra agonizando. Rama e Lakshmana, ao procurar por Sita, encontram Jatayu, que lhes explica o que ocorreu.
Aula 07) A capacidade de reconhecer a voz da sabedoria
Na sua busca, Rama e Lakshmana encontram uma anciã que lhes dá uma mensagem: devem encontrar dois macacos, Sugriva e Hanuman, e ajudar o primeiro a recuperar o trono, roubado por seu irmão Vali. Em troca, os macacos irão ajudar-lhes a procurar Sita. Assim é feito: Sugriva se torna realmente o rei, ajudado por Rama, e coloca seu exército em busca de Sita. Hanuman, que era filho do Vento (pode voar e tomar o tamanho que quiser), voa até a ilha de Lanka e conversa com Sita, prisioneira. Leva consigo o anel de Rama e diz que foi à procura dela, por isso pede que retorne com ele até onde Rama a espera. Porém Sita se recusa, porque além dela há vários outros prisioneiros, e Rama deve ir até lá libertar todos. Hanuman, antes de ir embora, tenta negociar com Ravana, em vão, pedindo para que devolva Sita, já que sua ação é contrária ao Dharma. Ravana tenta matá- lo, mas Hanuman consegue fugir. O irmão de Ravana, Vibhishana, une-se ao exército de Rama. O exército não o aceita, por ser um Rakshasa. Rama explica: Combaterei Ravana, mas não combaterei os inocentes. (...) Devemos censurar os que merecem censura e favorecer os bons, onde quer que se encontrem. Sugriva, o rei dos Macacos, afirma: - Sem o Dharma, não há força nem poder. Isso não é prodígio para ti, Rama. Jaya, vitória para ti! Porém, existia um empecilho: como fazer o exército de animais atravessar o mar até Lanka? Por um momento, Rama duvida. Percebe isso e logo se reposiciona: com o Dharma tudo é possível, jamais me entristecerei novamente! Percebe que estava com o Dharma, portanto era absurdo que se deixasse abater por uma dificuldade.
Aula 08) Nala e a construção da ponte até Lanka
Varuna, deus do Oceano, reconhece que Rama é Narayana, e lhe diz o que fazer: existe um macaco no exército, chamado Nala, filho de Vishvakarman. Tudo aquilo que ele jogar no oceano, será sustentado como chão firme. Assim, os animais foram construindo uma ponte, onde todos ajudavam, entregando pedras para Nala jogar nas águas. Todos os animais queriam ajudar na ponte, até mesmo os esquilos. Porém, são tão pequenos, que os animais maiores achavam que eles estavam atrapalhando e não queriam lhes dar passagem. O esquilo vai reclamar para Rama, e este lhe faz uma marca branca nas costas, passando seu dedo. É a marca de Rama. Todos os animais veem agora que tem essa marca, e todos começam a trata- los de outra forma. É um simbolismo muito rico. Quando vemos algo, uma pessoa, situação, que achamos que nos atrapalha, temos que observar o dedo de Rama, o dedo do divino, porque assim poderemos entrar em harmonia com elas e respeitá-las como são. Finalmente, chegam à ilha de Lanka. Ravana se recusa a qualquer negociação. Os animais são as forças dentro do ser humano. Todos nós temos uma “caixa de ferramentas” dentro de nós, que devem ser usadas no momento adequado. Este era o momento adequado para Rama libertar a fúria dos animais. A guerra inicia. Nala, a pureza, aquilo que está acima das águas da matéria, é capaz de derrotar o ódio. Kumbhakarna é acordado por Ravana. Até mesmo ele percebe que Ravana está contra o Dharma, e em seguida também é derrotado. Então Ravana chama sua melhor arma, seu próprio filho Indrajit. Era o rei das ilusões, então lutava invisível. Mata milhares de animais e chega a matar o próprio Rama e Lakshmana. Hanuman vai até a montanha Dronagiri, repleta de ervas medicinais, capazes de trazer os mortos novamente a vida. Decide se transformar em um ser enorme, e arranca a montanha, levando até lanka. O seu vôo é tão rápido que esquenta a montanha, e faz chover sobre os mortos todas aquelas ervas, trazendo todos novamente à vida. Agora teriam que travar uma outra batalha contra indrajit. No passado, Indrajit havia recebido um pedido de Brahma, e pediu para ser invencível. Brahma atendeu em partes, colocando uma exceção: a pessoa que iria derrotá-lo tinha que interromper seu ritual para obter seu carro invencível, e deveria ter permanecido acordado por pelo menos 12 anos. Esse era exatamente Lakshmana. Lakshamana, avisado por Vibhishana, interrompe o ritual de Indrajit para obter a invencibilidade. Dessa forma Indrajit é finalmente vencido.
Aula 09) A carta do rei morto
Ravana vai até o terraço do seu castelo e começa sua dança cerimonial. Depois, desce as escadas disposto a enfrentar Rama. No caminho, encontra Kala, o deus do tempo, que lhe diz que finalmente, depois de muitas atrocidades, não irá escapar da morte. Ravana responde de forma comovente e majestosa: “- O Amor é eterno, e nós estamos fora do teu alcance.(...) Desta feita, foste tu quem cometeu o engano...enfrentaste erradamente Ravana, aquele que jogou a vida por amor...e sempre jogará, creio eu. (...) Toda perda de amor ou de vida é uma mentira, a velhice é uma ilusão, e apenas as coisas más perecem. (...) Sê cuidadoso, vira-te e vai, recua diante de Ravana, que morrerá por amor...pois o Bom Amor nunca morre. Oh Kala, afasta-te para um lado. Finge governar os estilos e as modas, se quiseres, mas não fales em ficar sobre mim. Não passas de um pobre escravo. Nada significas para mim. Ordeno- te que vás. Qual era o verdadeiro amor que Ravana tinha? Parece ser algo verdadeiro, porque Kalla reconhece e vai embora.” O grande confronto entre Rama e Ravana acontece. Finalmente, Rama o derrota. Mas, antes de morrer, Ravana tinha escrito uma carta testamento e pediu para que seu general entregasse esta carta a Rama, assim que ele falecesse. Segue abaixo, a carta do rei morto: “Senhor Narayana, és a testemunha, fazes a Lua caminhar em resplendor e as estrelas se desvanecerem à luz do dia. Querido Rama, Senhor dos Mundos...pensa e recorda que prometeste a Indra matar-me para sempre... nada é para sempre, senão tu mesmo. Se não morresse por tua mão, de que outra maneira poderia eu fazer para me aceitares em teu próprio Eu? Eu era apenas um rakshasa, e tu eras muito difícil de abordar. Entretanto, buscando a sabedoria, aprendi muita coisa. Não sabes de novo quem és. Eu o soube durante todo o tempo, mas mesmo assim não o sabes. Nada que fazes se malogra, basta um olhar dos teus olhos para que o povo torne a cantar as boas e velhas canções. Não pedi proteção contra os homens. Vais a toda a parte e conheces todas as coisas que já foram feitas ou que o serão um dia. Por que fui tão descuidado? Eu não era descuidado em parte alguma! Óh Narayana, olha, eu olhei, maravilhei-me...Os Homens são minas, os homens são minas preciosas. Ó Rama, julgaste que o escuro era mau? Vês tudo o que acontece e amparas todas as criaturas. Vi que o céu era impermanente, e que o próprio Inferno não perdurava. Descobri que o tempo de cada existência é apenas um dia cheio, e vi que todas as criaturas, separadas de ti, de quando em quando, renascem, sempre mudando. Não gosto das coisas que vêm e vão, e passam com o Tempo, e odeio o próprio Tempo. Adverti-o, quando nos encontramos pela primeira vez, que eu o tomava por inimigo, eu mesmo lhe disse isso. Oh tu, que és o melhor dos homens, existem muitas espécies de Amor, e nunca as feri. Vali-me de Lakshmi a fim de atrair-te para cá. Ofereci-te minha vida, e tu a aceitaste. És Narayana que se move sobre as águas. Fluis através de todos nós. És Rama e Sita nascida da Terra, e Ravana, o Rei dos Demônios; és Hanuman como o Vento, és Lakshamana como o espelho, és Indrajit e Indra, és o Poeta e os Atores e a Peça. E, nascido como homem, tu te esqueces disso, perdes a memória e enfrentas de novo a ignorância do homem, como a enfrentarás sempre. Portanto, acolhe de volta, com amor, a tua Sita. A guerra acabou, e assim, fechamos a nossa carta.” Ravana venceu o tempo. O que ele combateu foi todos os homens esquecidos de si mesmo, para que lembrem que são Narayana. Quem é Ravana? Aquele que nos confronta, para despertar o divino em cada um de nós.
Aula 10) O reinado de Rama
Resgatando Sita, Rama volta a Ayodhya e reina com sabedoria por 11.000 anos. Sita engravida, e Rama, para atender ao seu desejo, a manda visitar os Brâmanes de um eremitério que conheceram durante o exílio. Em um momento, Rama conversa com seus ministros e pergunta como está seu povo, se estão satisfeitos com seu rei. Os ministros lhe informam que o povo considera um absurdo o rei aceitar Sita como esposa, depois de ela ter estado nos braços de Ravana. Rama entende que um rei não tem direito a desejos pessoais, e decide que, por mais que confie na pureza de Sita, ela deve ser deixada no eremitério onde iria visitar. O rei é um referencial que não poderia ser maculado. Para consolar Sita, Sumantra a explica sobre uma guerra antiga, em que Narayana (muito antes de nascer como Rama), matando os demônios sem piedade, acidentalmente mata a esposa de um Brâmane. Este Brâmane o amaldiçoa. Diz a Narayana que ele nascerá como homem, e também perderá sua esposa. Narayana reconhece que descumpriu o Dharma, e nem ele está acima do Dharma. Tudo é Dharma, e nada pode contra ele. Sumantra diz: “Esta é a obra do Destino, que não pode ser superada. Fiquei zangado quando o rei Dasaratha baniu Rama, mas, desta vez, não protestei, pois é o destino. Estava tudo previsto, e eu já o sabia há muito tempo. (...) Senhora, todo o Universo é apenas um sinal para ser lido corretamente: as cores e as formas são postas aqui só para falar-nos, e tudo é Espírito, nada mais existe. Guerra e paz, amor e separação são portas escondidas para outros mundos e outros tempos. Não envelheçamos acreditando ainda que a verdade é o que a maioria das pessoas vê à sua volta...” Valmiki é acordado, para que possa encontrar Sita e levá-la ao seu eremitério. Educa os filhos de Rama, ensinando-os a memorizar o poema do Ramayana, onde constam todas as histórias e aventuras do rei. Várias pessoas que os ouvem os jovens cantando ficam encantadas com a beleza do Ramayana.
Aula 11) O festival em Ayodhya
Rama resolve fazer um festival em Ayodhya e convida os jovens sem saber que são seus filhos. Kusa e Lava cantam o poema de Valmiki, o Ramayana, e Rama os reconhece. Sita aparece e pede para que a Terra, sua mãe, prove sua inocência. A Terra se abre e surge um trono, onde Sita senta-se e é levada. Após anos de reinado, Rama decide que é hora de se retirar. Se despede de todos aqueles que o ajudaram. Para se despedir de Hanuman, aquele que sempre o ajudou, dá um bracelete de ouro, mas Hanuman lhe diz que isso não tem valor, pois não tem nele escrito o nome de Rama. Vibhishana pergunta-lhe: “por acaso seu corpo não tem valor, por que não está escrito o nome de Rama?” Então, Hanuman abre seu peito e mostra que em todos os ossos do seu corpo está escrito: “Rama”. Rama fecha seu corpo e lhe dá um anel de presente, onde está escrito seu nome. Se abríssemos nosso peito, o que seria lido? Qual a nossa identidade? Rama sobe aos céus, e o nosso livro finaliza com este belo trecho: “Ouvindo ou lendo o Ramayana, obtereis de Rama o que desejardes, mas precatai-vos! Não peçais muito pouco! Boa sorte para todos. Este é o primeiro melhor poema do mundo. (...) O futuro lerá isto. Por conseguinte, eu lhes direi: quando tudo estiver soçobrando em torno de vós, dizei apenas “Rama”. Passamos do espiritual para o apaixonado. Depois, virá a ignorância. Guerra universal. Dizei “Rama” e vencereis! O vosso tempo não pode tocar-vos!” Não pedir pouco: peça eternidade, consciência. Peça dons reais, não seja um vassalo de Indrajit, a ilusão. Esperamos que mastiguem com cuidado esses ensinamentos, pois de fato se tratam de um território sagrado. Ótimas reflexões!