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CONSEQUÊNCIAS DA FRAGMENTAÇÃO PARTIDÁRIA NO BRASIL

2014
Os problemas políticos no Brasil são visíveis e são assuntos muito
comentados, principalmente no ano de eleições. Parece presente e solidificado
no imaginário da população uma incredulidade genérica no funcionamento do
sistema político. A relação de representação parece fraca, mesmo com 32 [1]
partidos políticos existentes, não se sabe ao certo se a crise representativa é
devido a essa conciliação partidária. Ou se a fragmentação partidária traz
benefícios ou prejudica ainda mais o ponderado sistema politico brasileiro. A
existência de uma extremada fragmentação partidária possui diversas
consequências, mas para avalia-las deve-se avaliar o princípio histórico antes e
após a redemocratização.

No ano de 1964 aconteceu o golpe militar no Brasil, os militares passaram a


controlar a vida política brasileira, obtiveram o poder com a promessa de, entre
outras coisas, "salvar a democracia", mas acabariam com ela e por duas
décadas se mantiveram o domínio do governo brasileiro.

Os ministros do governo provisório, na época, Almirante Augusto Redemaker, o


Brigadeiro Correia de Melo e o General Costa e Silva, não se encontravam
satisfeitos com as atitudes dos parlamentares. Então com a autoridade que a si
atribuíram de Supremo Comando Revolucionário, publicaram um Ato
Institucional, que estabelecia eleições indiretas para presidente da república; lei
que dava aos comandantes o poder de decretar estado de sítio e suspender as
garantias constitucionais, e suprimir direitos políticos por até dez anos. Em abril
de 1964, o congresso elegeu o Marechal Castelo Branco como presidente e
suas primeiras medidas sancionadas anularam os atos do governo democrático
e continham prováveis opositores [2].

Os militares fizeram o País crescer mais, incentivaram as exportações e


atraíram capitais estrangeiros, o “milagre econômico” foi inegável. Em 16 anos,
o Brasil saltou do 50° para o 10° lugar na lista de nações com maior PIB

1 [1] TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Partidos políticos registrados no TSE. Brasília, agos/2014. Disponível
em: <http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registrados-no-tse>. Acessado em 26 de agosto de 2014.
[2] FICO, Carlos. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar. Revista Brasileira de História, São Paulo,
v. 24, nº 47, 2004

2
(Produto Interno Bruto) e economia brasileira cresceu 11,1% ao ano [3]
. Mas
não diminuíram o déficit da balança de pagamentos, não diminuíram as
diferenças regionais, nem controlaram a inflação.

Por volta de 1974, começou uma crise mundial, com o aumento do preço do
petróleo e outros produtos. O projeto que os militares tinham em mente não
poderia sustentar-se, caso não tivessem poderes excepcionais nas mãos. Eles
apelaram para a legitimidade revolucionária e se atribuíram tais poderes,
mediante Atos Institucionais, como o Ato Institucional nº 2 (AI-2) que dava mais
poderes ao presidente quanto à apresentação de projetos de lei; Justiça Militar
passa a julgar civis incursos em crimes contra a segurança nacional; eleições
indiretas para o futuro presidente; autorização para caçar mandatos e
suspender direitos políticos por dez anos; extinção dos partidos políticos e
autorização para a organização de apenas dois: ARENA (Aliança Renovadora
Nacional) e MDB (Movimento Democrático Brasileiro); e o Ato Institucional nº 5
(AI-5) que dava autorização ao Presidente da República para: decretar o
recesso do Congresso, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais;
intervir nos estados, municípios e territórios; cassar mandatos por dez anos;
decretar estado de sítio; decretar o confisco de bens [4].

Os governos militares resumiram seus grandes objetivos em duas palavras:


segurança e desenvolvimento. Tais métodos são contestados, pois o
desenvolvimento beneficiou a poucos e promoveu a segurança para o Estado,
à custa da insegurança da população. Mas em 1974, MDB ganha forças e o
regime militar, lança o multipartidarismo com os partidos PDS (ex-ARENA),
PMDB (acrescido o “P” por lei) e PDS, para disseminar a preferência popular
por um partido [5].

3[3] CYSNE, Rubens Penha. Economia Brasileira no Período Militar. Est. Econ., São Paulo, v.23, nº 2, 1993.
[4] ALBUQUERQUE, Caio Rodrigo. AI-1, AI-2, AI-5... JP. INTERCOM, Campo Grande/MS, 2001.
[5] REBELLO, Mauricio Michel. A fragmentação partidária no Brasil: visões e tendências. São Paulo, 2012.

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Então depois de vinte anos vivendo sob regime militar, no período de 1964 à
1985, finalmente a população brasileira poderia escolher seus dirigentes
governamentais, passam a viver sob a Constituição da Republica Federativa do
Brasil, sancionada na Câmara dos Deputados, em Brasília no dia 5 de outubro
de 1988. Através do movimento “Diretas Já” foi restaurado o sistema de
eleições democráticas o Brasil deixa de ser bipartidário e passa a ser
multipartidário.

Ou possa se dizer que o Brasil é um país pluripartidário, segundo o


levantamento feiro pelo Jornal Valor Econômico, com a colaboração do
Cebrap, a câmara dos deputados tem um índice de 11,5 partidos efetivos, o
que dá ao legislativo brasileiro o título de mais fragmentado do mundo. Depois
do Brasil o país mais fragmentado é a Bélgica com 8,42 partidos efetivos na
câmara.

Entre as causas da alta fragmentação partidária no Brasil está o sistema


proporcional de votação, no qual as legendas políticas possuem mais facilidade
de eleger debutados em determinadas escolas eleitorais, que os números de
vagas variam de 8 a 70, a omissão da necessidade de uma lei que balize o
acesso dos pequenos partidos políticos ao Legislativo intensifica ainda mais o
pluripartidarismo. Outros países possuem muito mais do que 32 legendas
partidárias, mas muitos sistemas impõem, por exemplo, uma clausula de
desempenho em torno de 5% a 10% de votos validos, no Brasil é necessário
apenas 5%.

A interferência do judiciário nas leis eleitorais é uma das explicações para


fragmentação, primeiro pela criação da fidelidade partidária, que proíbe a troca
de legendas. Depois, e mais importante descumprindo o próprio regulamento
permitindo que o PSD, fundado em 2011, tivesse acesso aos recursos do fundo
partidário e à propaganda do horário eleitoral na proporção do número de
deputados federais que se filiaram à nova legenda. Com isso, o TSE
desconsiderou a própria legislação, que estabelece como critério o
desempenho na última eleição para a Câmara. Sem necessidade de passar
pelo teste das urnas para ter acesso aos dois principais recursos políticos,
siglas novatas tornaram-se o abrigo perfeito para parlamentares que querem
trocar de partido e podem, além disso, fortalecê-las com sua cota do fundo
partidário e do tempo de TV.

No Brasil além do nosso sistema de governo contribuir para a diversidade de


partidos políticos outro fator que também contribui sãos as diferentes
ideologias,

Os cientistas políticos acreditam que os fatores sociais também implicam como


facilitadores de criação de novos partidos, eles afirmam que a fragmentação
partidária deu-se a partir da fragmentação sócio-cutural da década de 80,
acredita-se que o sistema do legislativo deve-se manter dessa forma porque o
eleitorado é heterogênico, visando a população e a tão sonhada democracia [6].

Agora é interessante observar a aversão dos pilares democráticos com a


fragmentação partidária. Alguns teóricos da democracia, caracterizam o
modelo democrático como uma forma de governo inviável, não atingindo sua
intensidade teórica no contexto relativo ao fato jurídico. Duverger possui uma
opinião mais cética a respeito da democracia ele diz que “Nunca se viu e nunca
se verá um povo governar-se por si mesmo” [7]. Tal posicionamento pode até
pecar pela radicalidade, mas possui consistência lógica.

Com a função representativa das legendas, o exercício do mandato político,


conferido pelo povo, se faz por meio dos próprios partidos, ficando, portanto,
entre o povo e o governo, não somente como intermediários, mas como um
instrumento pelo qual o povo se governa. A participação popular no poder se
daria por meio dos partidos. Tamanha construção teórica é bastante frustrante
na prática.

6[6] REBELLO, Mauricio Michel. A fragmentação partidária no Brasil: visões e tendências. São Paulo, 2012.
[7] DUVERGER, Maurice. Os partidos políticos. Rio de Janeiro: Zahar, 1970.

7
Até os próprios deputados divergem opiniões quanto a fragmentação política,
em entrevista ao portal da câmara dos deputados o deputado Marcio França a
fragmentação partidária é reflexo da pluralidade brasileira levando em
consideração que a principal característica do nosso País é a variedade
cultural, política e racial. Já para o deputado Ibsen Pinheiro muitas legendas
geram impasses políticos, onde os grandes partidos perdem poder de
deliberação e as minorias ganham poder de obstrução e barganha [8].

Uma das consequências da crescente fragmentação partidária é a perda da


identidade. Isso por que é perceptível a falta de fidelidade à ideologia política,
quando acontece a migração de integrantes para outros partidos. Segundo
Leôncio Martins aqui no Brasil ainda não assistimos à emergência de um
partido de perfil definido e duradouro. Essa afirmação põe em evidencia a ideia
de que quanto mais um partido político tem conflitos internamente mais terá
sua identidade partidária enfraquecida [9].

Essa instabilidade do sistema político gera desconfiança da parte da


sociedade, pois dessa forma não acredita nas propostas governamentais de
seus representantes políticos, por que os mesmos não são capazes
sustentarem suas próprias ideologias diante deste cenário político de instável.

O fator determinante para o aumento do índice de fragmentação partidária,


localiza-se nos interesses partidaríssimos da maioria dos deputados que
elaboram as leis, e é claro que há a relação com os interesses partidários na
criação e votação dessas leis.

Não é rara a confusão que os políticos fazem entre defesa dos ideais do
partido com defesa dos próprios interesses, essa confusão explica as
ocorrências das divergências internas, pois o que se espera dos
8 [8] PORTAL DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. Deputados e especialistas divergem sobre fragmentação
partidária. Brasilia/DF, 2010. Disponível em <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/150816-
DEPUTADOS-E-ESPECIALISTAS-DIVERGEM-SOBRE-FRAGMENTACAO-PARTIDARIA.html>. Acessado em 26 de
agosto de 2014.

9[9] NETTO, Leôncio Martins Rodrigues. Nome do artigo ou livro em negrito. Cidade ou estado da publicação. Ano
da publicação
representantes sociais é a coesão das suas ideologias e as do grupo político.
As divergências também acontecem entre os partidos afiliados.

A busca por favorecer os interesses particulares é um fator que também


possibilita o processo de fragmentação partidária e evidencia a impossibilidade
de uma representação social uma vez que diante deste cenário não são os
interesses coletivos que são defendidos. Sobre esse aspecto Leôncio faz a
seguinte crítica: À fragilidade dos partidos, expressa pela descontinuidade em
sua existência, meras legendas criadas para atender a projetos pessoais,
“partidos” que pouco tempo depois desapareceriam ou perderiam qualquer
influência na política brasileira, se é que alguma vez tiveram alguma [10]
.

Os partidos políticos deveriam assumir um papel de extremo relevo no


exercício da representação. Contudo, a realidade política brasileira não parece
se conformar de maneira adequada aos posicionamentos teóricos acerca dos
sistemas partidários. O que acarreta em diversos vícios, como a legendas
inoperantes, a crise da representação partidária, desafios da governabilidade
etc.

No entanto, um aumento sem precedentes do número de agremiações


existentes, cria um ambiente instável que confunde a opinião coletiva acerca de
sua utilidade, gera o descrédito do sistema partidário. Diante da
desconsideração de seus próprios fins as agremiações se tornam
disfuncionais.

Cabe ressaltar que a existência de diversos partidos a princípio não pode ser
apontada como trágica ao funcionamento das instituições. Seria mais
democrático, permitindo a representação das opiniões de maneira mais correta,
protegendo melhor os direitos do cidadão, sendo assegurado pela Constituição.
Se a sociedade é heterogênea não há porque homogeneizar a representação
política.

10[10] NETTO, Leôncio Martins Rodrigues. Nome do artigo ou livro em negrito. Cidade ou estado da publicação,
Ano da publicação
Foi criado um neologismo para caracterizar a atual conjuntura do legislativo
brasileiro, o “hiperpartidarismo”, é quando ultrapassam-se as barreiras do que
seria um multipartidarismo, ou uma simples fragmentação partidária. Trata-se
de verdadeira proliferação, onde partidos são criados sem possuir programas
partidários com ideologias indefinidas e nem um compromisso com a
representação de seus eleitores [11].

Ou seja, a fragmentação partidária brasileira não espelha uma fragmentação


social, não reflete verdadeiramente os contrastes do mosaico social existente.
Agremiações parecem não ter representatividade, o mínimo de um autêntico
lastro social que justifique o acesso às cadeiras na câmara.

Existem no Brasil 32 (trinta e duas) legendas distintas, conforme divulgado pelo


TSE- Tribunal Superior Eleitoral[1], quais sejam: PMDB; PTB; PDT; PT; DEM;
PCdoB; PSB; PSDB; PTC; PSC; PMN; PRP; PPS; PV; PTdoB; PP; PSTU;
PCB; PRTB; PHS; PSDC; PCO; PTN; PSL; PRB; PSOL; PR; PSD; PPL; PEN;
PRO; e SDD. Isso porque vetaram a criação do Pros e do Solidariedade neste
ano.

Das 32 (trinta e duas) legendas existentes, pode-se considerar que muitas não
são dotadas de expressividade, contudo só esse fato não desvirtua a ideia do
“hiperpartidarismo”, diante da existência de diversos partidos medianos e da
grande quantidade de pequenos partidos. Tal número de agremiações torna
impossível o exercício do governo sem a existência de uma coalizão, muitas
vezes, com uniões esdrúxulas de partidos, que, a priori, são ideologicamente
opostos. Atingir a maioria em tratativas no Congresso Nacional com apoio à
atuação governamental se torna difícil, sendo necessária a negociação com
uma base partidária heterogênea, acarretando em um alto custo do processo
decisório, com o comprometimento do nível do processo eleitoral e a demora
nas deliberações Legislativas.

11[11] ARRETCHE, Marta; RODDEN, Jonathan. Política Distributiva na Federação: Estratégias Eleitorais,
Barganhas Legislativas e Coalizões de Governo. Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, Vol. 47, nº 3, 2004.
Hoje vive-se o chamado presidencialismo de coalizão [11]. Daí decorrem muitas
consequências positivas como ganhos de representatividade e maior
capacidade efetiva de controle do poder executivo e menor potencial de abuso
de poder presidencial. No entanto, os ganhos marginais decorrentes da
formação de coalizões são decrescentes a partir de um certo limiar e, no limite,
tornam-se negativos. Isto ocorre por duas razões. Em primeiro lugar, pelo
aumento dos custos de transação que podem minar os ganhos de troca no
sistema político. Em segundo, pelo aumento da heterogeneidade ideológica da
coalizão de governo. Mesmo com toda a força do Executivo, para se colocar
em prática determinado programa de governo o apoio do Legislativo é
imprescindível. Diante da necessidade de lei para a realização de reformas e
implementação de diversos projetos, impõe-se alianças excessivas.

A crescente heterogeneidade ideológica das coalizões de governo tem várias


causas, mas ela é também fundamentalmente uma variável de escolha dos
governantes. A heterogeneidade das coalizões é causa fundamental do
descontentamento porque acentua o cinismo patriótico dos cidadãos. Ela
fortalece a convicção que a política é jogo sujo marcado por interesses
corruptos. Esse sentimento é claro quando o governo não tem agenda clara e o
estilo de governo se abastarda no atendimento a demandas setoriais. Assim,
se a fonte da insatisfação são setores empresariais a resposta é redução de
tarifas, desoneração de impostos e etc. Se não há agenda programática clara e
o pragmatismo político não encontra limites, a inteligibilidade da política acaba.

Trate-se de regra não escrita, mas o que se observa na prática. Um ciclo


baseado no “toma lá dá cá” é formado, atuando os Deputados conforme
interesses políticos ou particulares, sendo a introdução de políticas inovadoras
de interesse público bastante difícil, mas não raro torna-se público levantes na
base aliada governista por maior influência.

A fragmentação chegou a um ponto tão elevado que pequenas legendas


utilizam sua influência para barganhas políticas, dá-se um prestígio que muitas
siglas partidárias não deveriam ter diante dos níveis de suas influências na
Câmara. Haveria um caráter eleitoreiro na multiplicação das siglas, gerando as
legendas, sem nenhum compromisso doutrinário ou ideológico.

Conclusão, o eleitor torna-se refém de um regime viciado, onde prevalecem


projetos de poder. Os partidos se mostram como instrumentos de minorias,
compreendido no sentido negativo do termo. O resultado é o extremo
inconformismo social que pôde ser evidenciado nas manifestações de junho de
2013 e ainda está presente no imaginário de todo cidadão. Em pleno ano
eleitoral não resta alternativa senão observar a movimentação do eleitorado na
busca de soluções para seus anseios, não parece uma tarefa fácil.

Diante de um cenário de constantes divisões partidárias a desconfiança social


se faz inevitável, isso por que a identidade partidária fica fragilizada. De certa
forma a fragmentação também traz benevolências, pode até parecer
contraditório, mas a fragmentação cumpre um papel fundamental para
governabilidade do país. A grande quantidade de partidos na câmara gera um
equilíbrio de poderes. Mas em contra ponto gera gastos não previstos,
impasses políticos, corrupção, população desacreditada em um futuro governo
em que possa confiar.

Debater a política Nacional não é uma tarefa simples e as repostas estão longe
de serem certíssimas. Tudo se desenvolve no âmbito da subjetividade não é
mais do que uma questão de perspectiva. Não existem soluções mágicas ou
imediatas, trata-se de um processo de maturação democrática. Espera-se o
desenvolvimento das instituições.

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