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Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP

MBA Marketing Político e Eleitoral

Rhafanny Charllytow Vasconcelos Damasceno

UMA ANÁLISE DA LEI 14.208/2021 (LEI DAS FEDERAÇÕES


PARTIDÁRIAS) E SEUS POSSÍVEIS IMPACTOS NAS ELEIÇÕES
MUNICIPAIS DE 2024

07 de julho de 2023

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1. INTRODUÇÃO

Com a implementação da Lei nº 14.208/21, que instituiu as federações partidárias, que


diz que a reunião de dois ou mais partidos políticos poderão reunir-se em federação, a
qual, após sua constituição e respectivo registro perante o Tribunal Superior Eleitoral,
atuará como se fosse uma única agremiação partidária. Esse processo de união partidária
deve ocorrer em período de 4 anos.
Antes de iniciar a discussão sobre os impactos da federação nas eleições de 2024, é
necessário apontar as diferenças em relação a coligação partidária. A agência da Câmara
dos Deputados define da seguinte forma:

As coligações têm natureza eleitoral, são efêmeras e se extinguem após as eleições. Os


partidos ainda podem se coligar para lançar candidatos nas eleições majoritárias: para
prefeito, governador, senador e presidente da República. Nas eleições proporcionais
(vereador, deputado estadual, deputado distrital e deputado federal), não há possibilidade
de coligação. Os partidos que quiserem se unir antes da eleição devem formar federações.

As federações têm natureza permanente — são formadas por partidos que têm afinidade
programática e duram pelo menos os quatro anos do mandato. Se algum partido deixar a
federação antes desse prazo, sofre punições, tais como a proibição de utilização dos
recursos do Fundo Partidário pelo período remanescente. Federações devem ter
abrangência nacional, o que também as diferenciam do regime de coligações, que têm
alcance estadual e podem variar de um estado para outro. Federações são equiparadas a
partidos políticos — elas podem, inclusive, celebrar coligações majoritárias com outros
partidos políticos, mas não os partidos integrantes de forma isolada. A lei prevê que todas
as questões de fidelidade partidária que se aplicam a um partido se aplicam também à
federação — o que significa que, se um parlamentar deixar um partido que integra uma
federação, ele estará sujeito às regras de fidelidade partidária que se aplicam a um partido
político qualquer. Elas deverão ter um estatuto, assim como um partido político, que
deverá disciplinar questões como fidelidade partidária ou à federação. Esse documento
deverá prever eventuais punições a parlamentares que não seguirem a orientação da
federação numa votação, por exemplo, lembrando que a expulsão de um parlamentar do
partido não implica qualquer prejuízo para o mandato (mas apenas o desligamento
voluntário e sem justa causa).

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2. AS FEDERAÇÕES E SUAS PARTICULARIDADES

Com a extinção das coligações em eleições proporcionais, através da Emenda


Constitucional 97/17, teve-se uma percepção na dificuldade de migração do voto,
impactando os resultados eleitorais, e favorecendo os candidatos que não possuíam
ligação de nenhuma espécie com seu preferido, por isso, as federações surgem para tentar
aglutinar os votos dos semelhantes, em princípio por afinidade ideológica.

Segundo a Agência da Câmara dos Deputados, como são equiparadas a partidos políticos,
as federações funcionarão dentro das Casas legislativas por intermédio de uma bancada
que, por sua vez, constitui suas lideranças de acordo com o estatuto do partido e com o
regimento interno de cada Casa legislativa. Cada federação deve ser entendida como se
fosse um partido. Nesse sentido, para todos os efeitos de proporcionalidade partidária,
como a distribuição das comissões, cada federação deverá ser tratada como uma bancada.

Em 2023, no ato de elaboração desse estudo, existe no país três federações, que são a
Federação Brasil da Esperança (Fé Brasil), composta por PT, PV, e PCdoB, a Federação
PSDB Cidadania e a Federação PSOL Rede. Todas seguem a Resolução Nº 23.670/21 do
Tribunal Superior Eleitoral.

O art. 7 da legislação que instituiu as federações diz que o partido que se desligar da
federação antes do tempo mínimo previsto no caput do art. 6º desta resolução ficará
sujeito à vedação de ingressar em federação, de celebrar coligação nas 2 (duas) eleições
seguintes e, até completar o prazo mínimo remanescente, de utilizar o fundo
partidário (Lei nº 9.096/1995, art. 11-A, § 4º). Além disso, traz esses destaques:

§ 1º Na hipótese de desligamento de 1 (um) ou mais partidos, a federação continuará em


funcionamento, sem prejuízo à sua participação na eleição seguinte, desde que nela
permaneçam 2 (dois) ou mais partidos (Lei nº 9.096/1995, art. 11-A, § 5º) .

§ 2º O partido político que se desligar da federação até 6 (seis) meses antes da eleição
poderá dela participar isoladamente, sem prejuízo da aplicação das sanções previstas no
caput deste artigo.

§ 3º As sanções previstas no caput deste artigo não serão aplicadas a(os) partido(s)
político(s) em caso de a extinção da federação ser motivada pela fusão ou incorporação
entre eles.

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Para o advogado João Araújo Filho, os principais argumentos utilizados para a criação
das federações partidárias foram a redução da fragmentação partidária, visto que no Brasil
existem muitos partidos e os eleitores possuem dificuldade de identificar quais as ideias
de cada organização partidária; e permitir a continuidade institucional dos pequenos
partidos que poderiam não atingir a clausula de barreira, norma que impede ou restringe
o funcionamento parlamentar ao partido que não alcançar determinado percentual de
votos, para as eleições de 2022.
Além disso, os partidos políticos enfrentam uma corrida contra o tempo em busca de
garantir uma fatia do fundo partidário, agora com foco no pleito eleitoral de 2024. As
negociações para formação de novas federações são pautas constantes nos principais
veículos de comunicação nacional, ou até mesmo as discussões de fusões, como foi o
caso do PSL e o DEM. Mas, vale destacar que nem tudo é só flores, pois o União Brasil,
fruto da fusão citada, vive uma rebelião generalizada, pois mesmo existindo uma
afinidade ideológica a linha democrata liberal, os dois partidos viviam um modelo de
gestão totalmente diferente, onde o PSL era comandado por Luciano Bivar, atual
deputado federal por Pernambuco, de perfil mais autocrático, e o DEM por Antônio
Carlos Magalhães Neto (ACM), ex-prefeito de Salvador, onde tinha no partido diversos
participantes nas tomadas de decisões, como o Governador Ronaldo Caiado, o Dep.
Mendonça Filho, o Ex-Governador José Agripino Maia, entre outros nomes.
Para Isaac Kofi Medeiros, numa coligação, partidos se reúnem para a eleição e a aliança
praticamente se encerra com a proclamação do resultado, ao menos do ponto de vista
jurídico. Não fosse o funcionamento parlamentar unificado, seriam a mesma coisa.
Federação sem funcionamento parlamentar unificado nada mais é do que uma coligação,
modelo que, para eleições proporcionais, é inconstitucional conforme § 1º do artigo 17
da Constituição. Apesar disso, as três federações brasileiras ainda não definiram com
clareza de que maneira exercerão a função parlamentar unificada. Além de exemplos
atuais, há hipóteses futuras mais problemáticas. Se a eficácia jurídica das federações não
está clara hoje, imagine depois das eleições municipais de 2024.

3. ELEIÇÕES DE 2024 E AS FEDERAÇÕES

Quando as coligações na eleição proporcional foram extintas, o objetivo foi frear o


surgimento de novas legendas, que dificultam a formação de coalizões no Congresso e,
consequentemente, a criação de consensos para o avanço de propostas legislativas.

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Porém, levantaram a hipótese das federações serem o retorno das coligações
proporcionais, foi ajuizada Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7021 pelo Partido
Trabalhista Brasileiro, questionando a constitucionalidade da Lei nº 14.208 de 2021
levantando que houve afronta formal pela possibilidade de criação de federações em
eleições proporcionais e afronta material diante da sua verticalização partidária em
detrimento da previsão constitucional. Argumenta-se que a extinção das coligações
proporcionais se deu através de emenda constitucional, logo, não poderia uma lei
ordinária posterior promover a criação de um instituto que notadamente afronte esse novo
parâmetro constitucional, no caso, as federações em eleições proporcionais, já que nada
mais seriam do que uma coligação proporcional com nome alterado. Nesse ponto, o
Supremo Tribunal Federal, em sede de medida cautelar proferida na ADI 7021,
manifestou-se monocraticamente pela inexistência de inconstitucionalidade formal
(PEREIRA, 2023).

Assim, as federações já nasceram com inúmeros problemas. Outro problema já anunciado


se refere a cláusula de barreira, onde atualmente temos 18 partidos e apenas 14 irão
receber os recursos do fundo partidário em 2023, que estão orçados em mais de R$ 1
bilhão. O PL, maior partido do país, deve receber R$ 200 milhões, a Federação Fé Brasil
R$ 150 milhões e o União Brasil R$ 120 milhões. Para a jornalista Alessandra Castro, do
Diário do Nordeste, foi por conta da cláusula de barreira e das restrições ao Fundo
Partidário e ao tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV que o Pros e do
Solidariedade se uniram para sobreviver. Em fevereiro deste ano, o Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) homologou a incorporação do Pros pelo Solidariedade. Com isso, o
Solidariedade passou a ter direito a verba do Fundo Partidário de 2023. Os partidos PTB
e o Patriota também estão tentando se fundir para poderem sobreviver. As siglas fizeram
um e quatro deputados federais, respectivamente. Juntas, elas querem formar o "Mais
Brasil". O processo está em trâmite no TSE. Já o PSC está buscando ser incorporado pelo
Podemos diante da dificuldade de continuar se custeando sozinho. De linha conservadora,
o PSC é uma das legendas que vem perdendo espaço para outras maiores com o mesmo
viés ideológico. Na eleição de 2022, a legenda fez apenas 6 deputados e ficou de fora do
Fundo Partidário. Já o Podemos fez 12 e conseguiu ter direito a uma fatia do Fundo.

Quem também enfrenta uma série de dificuldades internas é a Federação REDE-PSOL,


conforme define Isaac Kofi Medeiros, o estatuto prevê de forma ampla que a bancada
deve representar sempre que possível a síntese da posição dos seus integrantes por meio
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de consenso; não havendo, cada partido manterá sua orientação original. Aqui também o
funcionamento parlamentar parece optativo. Também não há especificações sobre o
procedimento. No entanto, diferente das demais, o estatuto institui mecanismos não-
obrigatórios de uso compartilhado de tempo de fala e rodízio de lideranças da bancada, o
que representa um detalhamento um pouco maior. No geral, o que se percebe nos três
estatutos é o uso de uma linguagem genérica e abstrata para o tema da unidade de atuação
parlamentar – diferente das regras para a eleição, vale dizer. Métodos claros de
deliberação dão lugar a termos como diálogo, consenso e negociação. Em 2 dos 3
estatutos, a definição específica do funcionamento foi protelada. Na mesma proporção, a
atuação parlamentar unificada aparenta ser facultativa. Em apenas um deles (PSOL-Rede)
há previsões mais detalhadas sobre mecanismos de compartilhamento de prerrogativas
regimentais dos deputados e senadores. Mesmo o exemplo mais avançado da federação
PSOL-Rede tem dificuldade de se consolidar na prática. Recentemente, depois de muita
divergência, a bancada do PSOL aprovou uma resolução declarando que será base de
sustentação do governo Lula no Congresso. A nota foi discutida, elaborada e assinada
somente pela bancada do PSOL, sem nenhum sinal de participação da Rede, o que
demonstra certa ineficácia jurídica da federação, considerando que essa decisão — ser
governo, oposição ou independente — é a primeira e mais fundamental do exercício
parlamentar.

No caso de São Paulo, encontra-se uma resistência no nome de Boulos (PSOL) e um


contraponto na apresentação de Eduardo Jorge, sendo fortemente influenciado pelo PT
por resistirem ao candidato psolista. Em Recife, a situação também é semelhante, onde o
Deputado Federal Túlio Gadelha (REDE) tem interesse em disputar a vaga de prefeito da
capital, porém, o PSOL apresenta a Deputada Estadual Dani Portela, como candidata ao
pleito. O comentário nos bastidores da política local pernambucana é que existe um
“acordo” de quem mais conseguir filiar gente, tem a preferência na disputa. Não é atoa
que Dani, como é conhecida pelos íntimos, já fez mutirão de filiação dentro da própria
ALEPE, pedindo ajuda dos pares, mesmo que de outros partidos. Já Túlio, rodou o estado
promovendo atos de filiação, e faz campanha massivamente nas suas redes sociais para
conseguir o espaço.

A complexidade formada pelas federações é oriunda também da falta de clareza nas


diretrizes que fundamentam os seus funcionamentos, ocasionando diversos problemas.

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4. CONCLUSÃO
Deste modo, deverão haver inúmeros conflitos entre as federações partidárias nas
montagens das chapas para as eleições municipais de 2024, buscando superar as
divergências locais na escolha do nome consensual e a busca pelo comando do fundo
eleitoral. Pois, em um modelo pluripartidário, que passou por um cenário polarizado, as
eleições de 2024 com suas micro situações, incluindo prefeitos e vereadores no centro da
disputa, poderão enfrentar diversos problemas.

Por fim, o que podemos garantir é que para haver um melhor funcionamento das
federações é necessário um estatuto robusto, contemplando as divergências e com
possibilidade de melhoria continua, havendo espaço democrático para a tomada de
decisão. A linguagem deve ser feita de forma objetiva, não abrindo brechas para
interpretações que possam ocasionar problemas internos.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGÊNCIA CÂMARA DOS DEPUTADOS. Entenda as diferenças entre coligações e
federações e veja como funcionarão. Brasília, 2021. Disponível em
<https://www.camara.leg.br/noticias/811671-entenda-as-diferencas-entre-coligacoes-e-
federacoes-e-veja-como-funcionarao/>. Acessado em 07 de julho de 2023.

ANJOS FILHO, João Araújo. O impacto das federações partidárias no pleito eleitoral de
2022.

DE SOUZA PEREIRA, Nathália Mariel Ferreira. AS FEDERAÇÕES PARTIDÁRIAS:


VANTAGENS E DESVANTAGENS NO CENÁRIO POLÍTICO. Disponível em <
https://www.alcanceconcursos.com.br/noticiapdf/52/Artigo-Nathlia-Mariel-As-
Federaes-Partidrias-Vantagens-e-Desvantagens-no-Cenrio-Poltico.pdf>. Acessado em 07
de julho de 2023.

MARTINS, Karine. O que são federações partidárias? Disponível em


<https://www.politize.com.br/federacao-partidaria/>. Acessado em 07 de julho de 2023.

MEDEIROS, Isaac Kofi. Federações ainda não definiram funcionamento parlamentar.


Conjur, 2023. Disponível em <https://www.conjur.com.br/2023-jan-30/direito-eleitora l-
federacoes-ainda-nao-definiram-funcionamento-parlamentar>. Acessado em 06 de julho
de 2023.

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TURTELLI, Camila. ABEL, Victória. Divididas, federações partidárias já tem disputas
locais para montar chapas de 2024. O GLOBO, 2023. Disponível em <
https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2023/05/divididas-federacoes-partidarias-ja-
tem-disputas-locais-para-montar-chapas-de-2024.ghtml>. Acessado em 07 de julho de
2023.

TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Resolução nº 23.670/2021 – Dispõe sobre as


federações de partidos políticos. Brasil, 2021.

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