Você está na página 1de 13

Universidade Anhembi Morumbi

Curso: Psicologia Bacharelado


Matéria: Cinema, arte e literatura indígena na contemporaneidade

Pedro Lesjak Mammini


RA.: 12522142327

Arte indígena, alteridade e emancipação


Negatividade como resistência em tempos de positividade ideológica

São Paulo - SP
2023
Toda imagem de ser humano é ideologia, exceto a negativa

Theodor W. Adorno

Os índios não têm que estar presos às imagens que os brancos construíram para os índios

Denilson Baniwa

Introdução

Em 2018, na 33ª Bienal de Artes de São Paulo, Denilson Baniwa 1 fez uma
performance artística gravada em que, após circular pelo espaço reservado para as
amostras artísticas, comprou uma obra da autora Susie Hodge chamada “Breve História
da Arte” e logo após retornar a sua posição original, proferiu um discurso de
aproximadamente 4 minutos que confrontava e questionava a própria institucionalização
da arte indígena, rasgando paginas do livro recentemente adquirido e denunciando tanto
a ausência de obras indígenas no exemplar quanto a noção imprópria do indígena como
algo do passado, perdido no tempo:

Breve história da arte. Tão breve, mas tão breve, que não vejo a arte indígena. Tão
breve que não tem indígena nessa história da arte. Mas eu vejo índios nas referências,
vejo índios e suas culturas roubadas. Breve história da arte. Roubo. Roubo. Roubo.
[...] Os índios não pertencem só ao passado. [...] Estamos livres, livres, livres. Apesar
do roubo, da violência e da história da arte. Chega de ter branco pegando arte
indígena e transformando em simulacros! (BANIWA, 2018)

Aqui se denuncia um dos maiores exemplos da falsa consciência contemporânea,


sintoma do neoliberalismo, que mediante tentativas insossas de expor a “arte” e “cultura”
indígena, se elimina o aspecto mais importante da arte — a presença e agência do artista.
Isto é, o “branco” demonstra um paradoxal interesse pelo povo indígena, em que se
esquece simultaneamente sua presença em carne e osso no presente, como ser humano
livre e consciente, produzido por e produtor de sua cultura. O que é demonstrado aqui é
a amoralidade do sistema atual, sua maquinaria social que atravessa a arte, em que se
engendra uma demanda pelo alterno e diferente, mas apenas por uma ótica dominadora
que homogeneíza o alterno, o absorve para dentro de si tacitamente e reduz um povo vivo
e ativo à posição de mero objeto.

Essa gramática de reconhecimento do Outro, em que se imagina como se ele fosse


parte de sua lógica interna de mercado desde sempre ao invés de sua contradição, em que
o objeto que tem em seu bojo potencialidades transformadoras se definha perante
consciências danificadas no capitalismo. Essa questão demonstra uma inautenticidade
que é precisamente o paradigma que o próprio povo indígena enfrenta na atualidade pelas
trincheiras da arte. Um povo que enfrenta uma tendência assoladora que visa não apenas
eliminar objetivamente a agência política e civil de uma população oprimida, mas também
simbolicamente apagar sua voz. Procura-se efetuar essa coisificação sob a égide de uma
lógica econômica, ou seja, o que se enfrenta aqui no paradigma artístico é a redução da
identidade indígena à mercadoria, um objeto fetichizado de consumo ideológico. Uma tal
absorção que isola o contexto sócio-histórico deste povo de sua cultura — sendo este
contexto sócio-histórico, assim como a ainda presente existência dos indígenas, os únicos
aspectos irreconciliáveis.
1
“Pajé-Onça: Hackeando a 33ª Bienal de Artes de São Paulo”: https://youtu.be/MGFU7aG8kgI

2
Aspectos esses que poderiam em certa medida exprimir uma não-identidade entre
o indígena segundo a ótica colonial – que certamente ainda permeia a realidade
contemporânea – e sua presença objetiva no Brasil neoliberal. Em última instância,
estamos vendo os indígenas enfrentarem a própria ideologia de uma sociedade danificada,
com modos de subjetivação que produzem indivíduos alienados. Tal aspecto pode ser
visto claramente na performance da personagem “Pajé-Onça”, em que o agente da cultura
consumida acaba por parecer um transgressor ao invés de autor.

O princípio da identidade, como fiador da ideologia e “doutrina da adaptação”, torna-


se nada mais do que o resultado do esforço do gênero humano voltado “contra si
mesmo”. O que se torna necessário é o questionamento dos conceitos dados, os
quais, em sua unilateralidade, praticam o autoritarismo pela apropriação subjetiva e
objetiva do Outro, retirando o potencial de alteridade de qualquer relacionamento.
(ZWICK, 2015)

Aqui, se abrem questões importantes. Como que o neoliberalismo se apropria


indevidamente do Outro? Como que essa dominação estética, ideológica e cultural se
deu? E a mais importante de todas, qual pode ser seu antídoto? Isto é, mediante uma
específica forma de dominação e uma ausência de formação integral na experiência
estética, qual experiência crítica e formativa tem seu potencial de alteridade resguardado
para constituir um horizonte de transformações sociais?

Negatividade, Totalidade e Ideologia: Uma nova dialética

O filósofo Theodor W. Adorno foi um dos pioneiros de sua época nas emergentes
releituras de Hegel e sua dialética, delineando um percurso entre outros que foram objeto
de intenso debate por todo o século XX, tanto na estética quanto na política. Tendo
inclusive pontos de encontro com muitos outros pensadores pós-modernos como Lacan,
Žižek e Safatle entre muitos outros. A razão para essa exposição se deve principalmente
aos materiais dados em três de suas principais obras: Dialética Negativa, Três estudos
sobre Hegel e Introdução à Dialética, em que se entra em detalhes a específica releitura
que Adorno sujeitou Hegel à. A saber, Hegel foi um pensador influente que moldou direta
e indiretamente o pensamento de muitas das tendências intelectuais futuras, e entre elas,
principalmente o marxismo e a teoria crítica. Seu sistema filosófico de conceitos,
entretanto, foi sujeito à uma série de justas críticas que demonstravam não só as
incongruências entre o Idealismo Alemão e o capitalismo desenvolvido, mas também os
tons ideológicos de sua arquitetura teórica no novo pano de fundo social do século XX.

Adorno lembra que falar em totalidade no interior de uma situação, como aquele em
que Hegel viveu, na qual o Estado nacional era um ganho de racionalidade e de
direito em relação ao arbítrio dos interesses locais, era muito diferente de falar em
totalidade em uma época, como a nossa, de afirmação global da falsa universalidade
do Capital. (SAFATLE, 2013)

As categorias dialéticas hegelianas, a saber, Totalidade, Negação determinada,


Sujeito, Objeto, Conceito, Espírito e Absoluto entre outras, viriam a ser criticadas
principalmente a partir de uma contratendência de certas leituras de Hegel e Marx que
poderiam ser denominadas como ‘estáticas’. Sendo essas entendidas como um possível
determinismo histórico, algo que inclusive chega a ser muito nítido nos textos de Lukács2.
2
Um exemplo claro desse determinismo é encontrado em trechos como: “Ao se relacionar a consciência
com a totalidade da sociedade, torna-se possível reconhecer os pensamentos e sentimentos que os

3
Isto é, o modo de pensar dialético, que executa uma Suprassunção [Aufhebung] a partir
de uma negação determinada sob a égide de uma totalidade objetiva da realidade social,
coloca em questão se as próprias categorias dialéticas não deveriam ser dialetizadas para
escapar de um momento ideológico. Detalhando mais essa questão levantada primeiro
por Adorno e futuramente por muitos outros autores, se foi desenvolvido uma crítica de
que a interpretação da dialética hegeliana – assim como a marxiana – como um mero
processo e método lógico que afirma algo em vigência de uma totalidade, usando a
negação determinada para estruturar um objeto e seu conceito de acordo com a história,
é uma hipostasia do processo de subsunção, que engendra uma figura ideológica.

Ideológica pois a figura total da história só pode ser pensada a partir da própria
superestrutura em que o sujeito está situado, isto é, ser produz uma interpretação absoluta
que sobrepõe um conceito no objeto, de tal maneira que se consome toda particularidade
que o colocaria em contradição interna em primeiro lugar. Aqui se vê uma manifestação
do princípio da identidade como problemático, algo emblemático da razão instrumental
que consome e domina ao invés de propriamente apreender seu objeto.

[...] o conceito só existe como coisificação, uma vez que não pode ser arrancado da
totalidade e nem ela reduzida a conceitos. A identidade se torna “a forma originária
da ideologia (...) transforma-se na instância de uma doutrina da adaptação na qual o
objeto pelo qual o sujeito tem de se orientar paga de volta a esse sujeito aquilo que
ele lhe infringiu” [...] Os elementos da dialética negativa se constituem num “meio-
termo” entre a realidade da vida danificada2 e os aspectos críticos para desbaratá-la.
Eles passam a ser nossos condutores para a análise da colonialidade. (ZWICK, 2015)

Aqui, a dialética clássica do leste – conhecida também como Diamat –, se torna


reducionista e parte da lógica capitalista, pois não comporta em si a autêntica contradição
imanente, que além de ser a pedra de toque do processo dialético, necessariamente deveria
expor o objeto como inesgotável de conceito e a identidade – tanto do sujeito quanto do
objeto – como ilusão. Ilusão, pois, se impõe universalmente sem levar em conta os
“resquícios” deixados pelo objeto, o que resta no objeto, em suas particularidades, mesmo
após conceituá-lo.

[...] é preciso ter em mente que a compreensão da negatividade em Adorno só avança,


ou só poderia avançar, se se dá conta do que significa a positividade combatida por
ele. Trata-se da afirmação do todo sobre tudo que é particular, individual, singular,
cujo sentido é reduzido pela identidade do todo, que, na ordem do conhecimento, é
o sujeito cognoscente e, na ordem material, é a própria sociedade. (REPA, 2011)

O próprio pensamento dialético, portanto, não deveria procurar afirmar de maneira


categórica, ou seja, sem estatuto crítico, que, por conseguinte, iria reduzi-lo ao
racionalismo e cientificismo que dominaram simbolicamente os periféricos na história.
Não se deve, portanto, dar uma forma estática e enrijecida dentro de um arranjo total da
realidade social pensada, mas sim revelar a irreconciliação do pensamento total com a
totalidade, apreender a identidade como sendo consequente de um momento de não-
identidade entre sujeito e objeto. Ou seja, vemos um deslocamento axiomático das
categorias hegelianas – que se distancia daquela estrutura fixa e aplicável vulgarmente a

homens teriam tido numa determinada situação da sua vida, se tivessem sido capazes de compreender
perfeitamente essa situação e os interesses dela decorrentes, tanto em relação à ação imediata, quanto
em relação à estrutura de toda sociedade conforme esses interesses” (LUKÁCS, Gyorg. História e
consciência de classe, São Paulo: WMF Martins Fontes - POD, 2018)

4
todo objeto independente de seu conteúdo –, e, assim, nessa descentralização o primado
da crítica imanente transforma a simples negação em uma finitude que antagoniza o
pensamento totalizante e autoritário que domina o Outro. Vemos aqui a manifestação de
uma dialética dos periféricos, que dá palco aos ‘resquícios’ abandonados que não foram
reconhecidos pela lógica impiedosa do Estado e lei do Capital homogeneizador.

O nome dialética diz de início nada mais senão que os objetos não se esgotam em
seu conceito, que eles entram em contradição com a norma convencional da
adequatio. A contradição [...] é índice da inverdade da identidade, do esgotamento
do conceituado no conceito. No entanto, a ilusão da identidade é imanente ao próprio
pensamento segundo sua forma pura. Pensar significa identificar. [...] Para a
consciência do caráter ilusório da totalidade conceitual resta apenas romper de
maneira imanente a ilusão da identidade total. [...] A dialética é a consciência
consequente da não-identidade. (ADORNO, 2009)

A ideia a ser capturada aqui é que o objeto – em seu movimento concreto na


realidade – é mediado através e pelo Outro, e não pela hipostasia de uma identidade já
configurada por um sujeito racional, isto é, autoritário3. Ou seja, se encontra sua
objetividade na experiência crítica e transformadora do momento de não-identidade do
objeto com seu conceito. Essa experiência traz em seu bojo o real potencial
transformador, aquele que reconhece o Outro de maneira autêntica, que rejeita o
engendramento de uma consciência reificada e uma estética danificada. Portanto, o
encontro do sujeito e objeto, do conceito e conceituado, do particular e universal, não
pode ser executado positivamente, visando efetivar uma estrutura pré-existente da
História, que é nada senão um vir-a-ser4. Ao contrário, para produção de autenticidade,
se deve ter como prisma uma mediação negativa – feito pelos e nos extremos dos
conceitos em contradição –, e isso nos levaria a considerar a totalidade como uma
processualidade contínua5, opaca e que se furta a ser esvaziada por uma afirmação
factual, um conceito total:

Assim, a totalidade não pode ser definida aqui como o que permite a compreensão
semântica de todos os elementos que ela subsume [...], mas como a perspectiva que
permite a compreensão sintática do movimento de reabsorção contínua do que
inicialmente apareceu como indeterminado e contingente. Pois há, no interior mesmo
da ontologia hegeliana, um risco de indeterminação que sempre devemos
inicialmente presumir para poder após conjurar. (SAFATLE, 2013)

Esse novo estatuto crítico e periférico pode ressignificar – ou compreender mais


profundamente – afirmações de Hegel como: “O Eu é o conteúdo da relação e a relação
mesma, defronta um Outro e ao mesmo tempo o ultrapassa; e esse Outro, para o Eu, é
apenas ele próprio”6 e “A consciência-de-si é a reflexão, a partir do ser do mundo sensível

3
Isso se torna claro quando Zwick (2015) remonta Adorno no cenário histórico do Brasil em colocações
como: “Adorno afirma o “caráter manipulador” como elemento típico da personalidade
autoritária, que se resume numa consciência coisificada, por princípio incapaz de qualquer
experiência.”
4
“Se a História progride é para olhar para trás; se é progressão de uma linha de sentido é por
retrospecção [...] a ‘Necessidade-Providência’ hegeliana é tão pouco autoritária que mais parece
aprender, com o curso do mundo, o que eram os seus desígnios” (LEBRUN, Gérard. O avesso da dialética,
São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 34-6)
5
SAFATLE, Vladimir. Os deslocamentos da dialética: Introdução à edição brasileira de “Três estudos sobre
Hegel”, São Paulo: Unesp, 2013
6
HEGEL, G.W.F. Fenomenologia do Espírito, Petrópolis: Vozes, 2014

5
e percebido; é essencialmente o retorno a partir do ser-Outro”7. Safatle destrincha esses
trechos a partir de uma leitura adorniana, tendo como análise que:

Se o Eu é ao mesmo tempo a forma e o conteúdo da relação [sujeito-objeto] é porque


algo da opacidade do conteúdo à forma já é interno ao próprio Eu. [...] O que implica
internalização da alteridade para o âmago do Eu. [...] Podemos compreender tal
passagem da consciência-de-si pela alteridade do ser do mundo sensível percebido,
com seu posterior retorno, levando em conta como, na certeza sensível e na
percepção, a consciência teve a experiência de resistência do objeto às tentativas de
aplicação do conceito à experiência. No próprio campo da experiência, ela
confrontou com algo que negava a aplicação do conceito à experiência, tendo a
experiência de uma diferença em relação ao conceito, uma diferença vinda do objeto.
Retornar de seu ser-Outro é assim internalizar tal diferença, re-orientando não apenas
as relações ao objeto, mas também as relações de identidade no interior do si mesmo.
(SAFATLE, 2013)

Aqui se encontra, portanto, a chave para compreender tanto os momentos de


inverdade ideológica que Adorno denuncia quanto o potencial de resistência dos sujeitos
que a maquinaria social visa cristalizar em vigência de uma totalidade hipostasiada. A
alteridade no reconhecimento agora é dada sua autenticidade que, com efeito, possui certa
potencialidade transformadora para os sujeitos. Essa mesma alteridade, que no caso do
Brasil é latente na história do colonialismo, é capturada pela lógica neoliberal como
objeto de consumo, e assim, o homogeneizando. Apenas a negatividade da experiência
crítica tem um potencial de se furtar da posição de objeto imediato e abstrato, distante
temporalmente e espacialmente, e assim, demonstrar uma opacidade própria, se
demonstrar inesgotável como conceituado. O sentimento alterno se desloca para o
“âmago” dos indivíduos neoliberais; se pode dizer que em uma batalha para consumir
tudo que é, a negatividade que traz a chance dos indivíduos alienados se verem
consumidos pelo objeto e serem confrontados com um momento de não-identidade, com
sua própria opacidade, ao efetivamente sentirem algo que não aparenta ser.

O que é indicado aqui como oportunidade – porém sempre se deve relembras das
dificuldades inerentes à essa tarefa –, é a capacidade da arte – em um movimento dialético
– se apresentar não mais como sintética e completada por unidade, assim manifestando
em seu fenômeno as contradições da arte massificada, que em sua maior sofisticação
burguesa são apontadas por Adorno como o produto sintomático de uma dessemelhança
entre existência e mundo.

Na sociedade antagônica, os seres humanos, cada indivíduo, são não idênticos a si


mesmos, são caráter social e psicológico ao mesmo tempo, e, em virtude de tal cisão,
danificados a priori. Não por acaso a arte burguesa realista possui como tema
originário a incompatibilidade entre existência não afetada, não mutilada, e a
sociedade burguesa: de Dom Quixote, passando por Tom Jones de Fielding, até Ibsen
e a modernidade. O correto se torna falso, puerilidade ou culpa. O que aparece ao
sujeito como sua própria essência – e na qual ele supõe tomar posse de si em
contraste com as necessidades sociais alienadas – é, medido por aquelas
necessidades, mera ilusão. [...] A sociedade atual, entretanto, é “totalitária” também
no fato de nela os seres humanos como tais, talvez de forma mais abrangente do que
antes, igualaram-se a energia do seu eu8 ao movimento da sociedade; de forma a

7
Idem
8
A escolha da transcrição da palavra com todas as letras minúsculas foi intencional, de modo a não
confundir o uso de Adorno do eu freudiano (Ich, Über-Ich e Es) e o Eu hegeliano (Self).

6
impulsionar cegamente sua autoalienação até a imagem ilusória da igualdade entre
o que são para si e o que são em si. (ADORNO, 2015)

Com uma dialética negativa, se revela uma realidade que dá ênfase às minucias e
particularidades do objeto que são frequentemente dispensadas pela consciência
coisificada tão contemporânea. A articulação crítica dessa realidade oferece uma leitura
capaz de ser anti-ideológica em tempos que a próprio discurso e conhecimento estão
suscetíveis para a reprodução e perpetuação de um status quo brutal.

A construção do sujeito-objeto possui uma duplicidade insondável. Ela não se


contenta em falsificar ideologicamente o objeto e em transformá-lo no ato livre do
sujeito absoluto, mas também reconhece no sujeito o elemento objetivo que se
apresenta e com isso restringe anti-ideologicamente o sujeito. (ADORNO, 2009)

Um status quo que é fundação e motor da mentalidade neoliberal que homogeneíza


e absorve para si qualquer alteridade em um ato ideológico, com nenhuma intenção de
abarcar o momento autêntico de não-identidade. Ao contrário, a lógica empresarial sútil
e politicamente tática da atualidade, produz uma ilusão tal como a forma-mercadoria é
quando se manifesta de imediato — um objeto de consumo fetichizado. Nas palavras de
Marx: “À primeira vista, a mercadoria parece ser coisa trivial, imediatamente
compreensível. Analisando-a, vê-se que ela é algo muito estranho, cheio de sutilezas
metafísicas e argúcias teológicas”9. No caso da arte esse fenômeno dá a aparência de algo
fixado no tempo e nutre a ilusão desse objeto ser parte da maquinaria social quando na
verdade é sua contradição, é silenciado o conflito inerente à cultura brasileira danificada,
autoritária e antagonista.

Adorno nos aponta que dessa tendência a cristalizar sínteses, numa imitação mediada
com o conceito, deriva aquilo que se quer em última instância promulgar como
verdadeiro. Mas esse todo pode tornar irreconhecível a realidade concreta, pois é
falso. (ZWICK, 2015)

Em tempos de positividade falsa, em que se é feito afirmações categóricas do que é


e foi o homem, se deve usar dessa leitura negativa. A que define algo pelo que ele não é,
que atravessa e faz mediação da opacidade e particularidade para oferecer – ao invés de
uma figura totalizante do que são as coisas – o que se manifesta ao autenticamente
mimetizar o objeto no sujeito: entendendo o objeto como tanto parte do sujeito quanto o
sujeito é parte do mundo. Se aproximando, portanto, das coisas em seu movimento
próprio – em que se relaciona o todo com as partes e as partes com elas mesmas – e se
afasta de uma identidade afirmada e posta de início, apenas capaz de existir como um
mito reforçado. Assim, o é se torna vir-a-ser, o falso Outro se converte em um momento
de ser-Outro no Eu danificado e a subjetividade vira o elemento crítico de transformação
para manifestar uma verdade objetiva anteriormente latente. Eis aqui o elemento crítico
e antissistema que pode emancipar os periféricos do Brasil, um país historicamente
construído por mitos etnocêntricos e eurocêntricos.

A dialética não é um método, uma visão de mundo ou uma apresentação das regras
do pensamento, ela pretende ir às coisas, ela só pode acontecer nos objetos, e não à
parte, pois se crê subsumida às regras que lhe são impostas por cada um deles, o que
de resto explica as imensas dificuldades, senão a impossibilidade, de se formalizar a

9
MARX, Karl. Livro 1, O Capital, São Paulo: Boitempo, 2023

7
dialética à maneira da lógica tradicional, uma vez que ela não pode ser subtraída por
completo de todo conteúdo. A dialética não pressupõe, de início, uma identidade
entre o Ser e o Pensar. No interior da dialética, a relação Ser-Pensar só pode existir
como mediação, o que significa que ela é um resultado, não uma identidade posta de
início. (HUSSNE, 2021)

Imagem, estética e história: gramáticas de reconhecimento na dimensão simbólica


do Brasil

Já foi aludido inúmeras vezes nesse texto o caráter, cultural e simbólico, das
subjetividades no capitalismo, entretanto, também se referenciou implicitamente como a
constelação dada aqui deve necessariamente ser entendida por uma metodologia negativa,
que dê sentido próprio às periferias do saber. A saber, é imprescindível considerar como
ponto de análise a presença dominadora do pensamento colonial no Brasil
contemporâneo, algo que por vezes tende a ser mal compreendido por uma leitura
dialética vulgar.

Parte da leitura da arte indígena que traz em seu bojo essa potencialidade negativa
deve dar um devido valor à história de dominação colonial. É um período tão marcante
na construção ideológica do que é o Brasil, assim como o que configurou muito de seu
crescimento econômico e político, e ambos ainda persistem tanto na gestão política do
país quanto na percepção dos indivíduos socializados da atualidade. Ainda mais, se deve
entender como essa trajetória de dominação europeia sempre trouxe em si mitos e
justificativas ideológicas, que dentro de todo século com diferentes modalidades,
naturalizou a ainda persistente lógica colonial. Lógica esta que construiu todo espaço
simbólico de expressão cultural do que é o Brasil, assim como criou específicas
gramáticas de reconhecimento do Outro, que além de influenciarem a administração
política contemporânea, pautam muita da falsa consciência frequente no meio artístico.

Estamos falando aqui de consciências reificadas, objetos artísticos fetichizados –


ou seja, reduzidos a mercadoria – e de sujeitos históricos coisificados. Os oprimidos que
produziram a arte são negados de sua devida presença e reconhecimento como aquele que
efetivamente carrega o legado cultural supostamente “valorizado” no ambiente
“humanista”. Entretanto, os sintomas neoliberais produzidos pela sociedade administrada
jamais serão entendidos em sua particularidade sem antes entendermos como essa
dominação simbólica e estética ocorreu, pois só assim que se apreende criticamente a
não-identidade até agora não articulada.

Como foi bem colocado por muitos autores, entre eles mais notadamente a
Marilena Chauí, o Brasil é uma nação construída por mitos fundadores que dão para nós
uma identidade do brasileiro. Isso é tão perceptível que nossa própria origem colonial não
escapa desse caráter ideológico:

A ideia do Brasil nasceu como dominação colonial. Por décadas – ou séculos – a


semiformação escolar ensinou o mito do descobrimento. O ‘descobrimento’, tal
como Dussel se referiu no caso da América Latina, já foi, pela pretensão mesma
daquela palavra, ‘encobrimento do Outro’, negação do diferente, recusa radical do
não idêntico, da vida e dos costumes dos povos que nessas terras viviam em
harmonia com a natureza, algo incompreensível para a retórica do poder do
universalismo europeu. (ZWICK, 2015)

8
Só podemos entender a envergadura desses mitos na dimensão estético ao
apreender os efeitos do colonialismo e modernismo que, continuamente, participaram na
transformação do Brasil colonial para o Estado capitalista de hoje, porém, com as mesmas
feridas ainda não cicatrizadas, ou seja, semiformado e danificado. O próprio país é uma
síntese artificial, utiliza o mito da modernidade – que seria a racionalidade europeia, isto
é, a razão instrumental do esclarecimento – para adquirir identidade, ser reconhecido
como idêntico a si mesmo, assim como fechado em unidade, completo e capaz de ser
afirmado como “ordem” e “progresso”. Simultaneamente se reproduz suas cicatrizes
coloniais e sua totalidade falsa, e assim, sua formação não integral é naturalizada e
encoberta por uma ideologia; nas palavras de Adorno “a ideologia impele cada vez mais
o pensamento a ser positivo”10. Nesse ato, sua violência é censurada e não expressa, é um
mito na medida que esconde sua não-identidade sobre uma lógica falsa.

[...] esclarecimento como organizador das relações modernas pela denúncia do


aniquilamento do não idêntico. [...] um processo de escolha apenas dos valores que
são úteis para perspectivar uma modernidade para poucos porque fomenta um
movimento de busca por certa unidade, que inexiste. (ZWICK, 2015)

Esses elementos constitutivos da identidade nacional só podem ser desmitificados


quando se manifesta com nitidez sua semiformação, sua gestão danificada que esconde
sua não-identidade ainda latente. O encobrimento do Outro desde sua “descoberta”, até
seus mitos da democracia racial, desemboca em nosso paradigma: a percepção do
indígena, aquele que foi dominado, mas é visto apenas como um passado morto e
superado há muito tempo. Simbolicamente não como aquele que ainda sofre, aquele que
ainda é oprimido, aquele que não tem voz nem reconhecimento, pois intencionalmente se
ignora sua existência, que comportaria uma potência de experiência crítica de não-
identidade.

A exploração colonial do trabalho consolida uma determinada distribuição


geopolítica do capitalismo afirmadora do eurocentrismo que, em síntese, implica no
desejo de hegemonia europeia sobre a criação da modernidade. Alia-se a ele o
etnocentrismo, caracterizado pelo sufocamento das culturas locais, em que os povos
europeus capturaram a subjetividade dos povos dominados, cerceando suas histórias,
cultura e valores, num movimento em que aqueles se consideravam uma raça
naturalmente superior. Destarte, em sua construção intersubjetiva, eurocentrismo e
etnocentrismo são também sistemas de ação simbólica que, pelo sufocamento dos
elementos locais na sua reidentificação histórica – a qual pretende apagar os
vestígios do não idêntico –, consolida-se numa verdadeira ideologia da identidade
(ZWICK, 2015)

Se lembrar que esse povo ainda existe, ainda luta por sua agência política, ainda
persiste em viver nos mesmos territórios conquistados, é impossível enquanto houver a
presença daquela mesma ideologia que absorve falsamente para si o que é sua contradição
imanente. Será, com efeito, incapaz de raciocinar sobre a inexistência de uma identidade
brasileira universal e sintética, pois está danificado com a razão irracional, a ausência de
um estatuto crítico e reflexivo difuso largamente no seu saber e cultura é sinal que a
colonialidade ainda persiste. Ao contrário, o neoliberalismo “humanista” e “inclusivo” é
nada mais senão o mais brutal silenciamento da violência implícita em cada afirmação do
que o Brasil é e foi: “Dos tempos de outrora, quando a dominação foi violenta, até sua

10
ADORNO, Theodor W. Dialética Negativa, Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

9
reconfiguração sobre as bases simbólicas da sutileza, seus efeitos não deixaram de se
abater menos sobre o país”11.

Ressignificamos, portanto, o discurso de Baniwa introduzido no início desse texto.


Sua performance que denuncia a história da arte, mostra a constrangedora ausência de
indígenas nos espaços mais “conscientizados” do Brasil, é entendida como um grito
negativo perante uma opressão positiva, é a agonia de séculos de violência e dominação
ainda presentes. A luto desse povo por autonomia e reconhecimento em sua própria
cultura – que é vulgarmente exposta para as falsas consciências da atualidade – é a
constante e sofrida batalha para proporcionar uma experiência crítica do que é o indígena,
é a potencialidade de oferecer um contraposto negativo às imagens positivas do
“brasileiro” e sua “cultura”. A lógica da dialética negativa não revela apenas as marcas
da colonialidade, mas demonstram com surpreendente capacidade a autêntica imagem do
que são essas pessoas e o que elas enfrentam, que a saber, é a própria ideologia: “A
dialética é a dor transformada em conceito devido à pobreza deste mundo”12.

Considerações finais

As ideias sendo desenvolvidas aqui infelizmente dizem respeitos a elementos


extensos demais para serem cobertos em tão poucas páginas. O paradigma do
colonialismo e a gestão danificada da maquinaria social que o move é lato e,
merecidamente, tem sido desenvolvida por vários pesquisadores nos últimos anos. Mas
três coisas foram delineadas por enquanto: uma leitura dialética negativa do colonialismo;
a dominação persistente e atual sobre a imagem e cultura indígena, assim como sua
relação com os conflitos políticos contemporâneos que dizem respeito a esse cenário; uma
linguagem que articula e reconhece a arte indígena como uma não-identidade capaz de
inspirar horizontes de transformação social ao apontar a síntese falsa do que é o Brasil.

Independente das condições politicamente anormais e brutais que se desenrolaram


nessa última década, algo foi apreendido aqui. Tal como foi apontado por Hegel um
reconhecimento dialético entre sujeitos, em que um tenta impor ao outro a posição de
objeto13, se vê aqui algo parecido, porém com uma precisa ressignificação adorniana
consequente do diagnóstico da ideologia capitalista: o conflito invisível, porém existente,
entre identidade e não-identidade. Se revela adicionalmente, encontro com outros
pensamentos decoloniais como o de Grada Kilomba14. Pois afinal, a dialética é:

O ponto de viragem da dialética negativa consiste em esse rumo do conceitual e


torná-lo diferente. [...] revela o que há de falso na identidade e adequação do
conceituado com o conceito (ADORNO, 2009)

11
ZWICK, Elisa. Introdução à Crítica Dialética Negativa da Gestão Pública Brasileira: a Constelação
Colonialidade em suas Bases da Recusa do Não Idêntico, Belo Horizonte: XXXIX Encontro da ANPAD,
2015.
12
ADORNO, Theodor W. Dialética Negativa, Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
13
Para ver uma relação mais clara, basta se lembrar da dialética do senhor e do servo desenvolvida por
Hegel. De maneira análoga, o cenário histórico-social, embora expresso através de dor, é
inevitavelmente impulsionado pela negatividade. Adorno, mesmo criticando Hegel, reconheceu a
negatividade, não-identidade e mimesis como categorias fundamentais para o delineamento de um
novo modelo crítico sob o capitalismo, assim como sua potencialidade formadora de horizontes de
transformação social.
14
A autora aborda as relações sujeito-objeto e suas possíveis inversões no âmbito da arte e política. Para
saber mais, consulte: KILOMBA, Grada. Memórias da plantação Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.

10
O propósito e missão central da arte indígena deve ser o mesmo da dialética
negativa: ser antissistema; ser anti-ideológica; e por fim demonstrar determinação sob a
égide da negação da identidade.

Uma tal semiformação inautêntica [...] diz da acriticidade de uma consciência que
herda e passa a enxergar somente o caráter instrumental da eficácia da técnica, mas
ignora as determinações históricas e contraditórias que a fundam e determinam,
reforçando a subalternidade. É uma relação dialética de recepção e reprodução da
dominação. Na análise da política e da estruturação administrativa no Brasil, os
elementos do colonialismo e da colonialidade perfilam o extenso processo histórico
que impõe, material e simbolicamente, a recusa do não idêntico. [...] A tarefa de uma
crítica dialética negativa é denunciar a atrofia dessa realidade ou vida danificada.
Não a de lhe projetar correções morais ou utópicas preconcebidas, mas apostar que
a negação do que é negado em sua potencialidade positiva é a tarefa aberta e
verdadeiramente crítica que a dialética tem a cumprir. (ZWICK, 2015)

Sua performance e antagonismo representam negatividade na medida em que


retira do jogo conceitual a existência de uma imagem categórica do indígena e sua cultura,
toma agência sobre sua constelação estética, e por conseguinte, confronta os sujeitos
neoliberais em seu âmago ao revelar sua cisão, sua identidade como danificada, sua
consciência como reificada e sua vida como coisificada. Não é coincidência que Davi
Kopenawa chama os brancos de “Povo da mercadoria”.

Em conclusão, a insondabilidade do povo ameríndio a partir da gramática de


reconhecimento neoliberal traz em seu bojo uma crítica imprescindível para a batalha
política a frente. Ela demonstra a possibilidade de outros arranjos e configurações de
reconhecimento a partir da negatividade, ela reconquista – a partir de uma opacidade – o
delineamento de uma alteridade autêntica, isto é, um diferente. Sua substância
inerentemente contraditória as formas de gestão políticas e econômicas atuais, assim
como sua consequente cultura massificada, revelam em última instância a necessidade de
refletir criticamente sobre a identidade e síntese ideológica de nosso país e história. A
resistência e luta indígena, principalmente no campo estético e simbólico, é travada pela
negatividade e não-identidade imanente à sua conceituação imprópria atual, que foi
produzida por uma lógica colonizadora e agora a enfrenta com todo sua força no
neoliberalismo homogeneizador. Nos mesmos tons em que Baniwa grita “Os índios não
têm que estar presos às imagens que os brancos construíram para os índios”, Adorno
disse: “Toda imagem de ser humano é ideologia, exceto a negativa”15.

15
ADORNO, Theodor W. Ensaios sobre psicologia social e psicanálise, São Paulo: Unesp, 2015.

11
REFERÊNCIAS

ADORNO, Theodor W. Dialética Negativa, Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

______. Ensaios sobre psicologia social e psicanálise, São Paulo: Unesp, 2015.

______. Introdução à Dialética, São Paulo: Unesp, 2022.

______. Três estudos sobre Hegel, São Paulo: Unesp, 2013.

BANIWA, Denilson. Pajé-Onça: Hackeando a 33ª Bienal de Artes de São Paulo,


Disponível em: https://youtu.be/MGFU7aG8kgI. Acesso em: 01/06/2023.

CERNICCHIARO, Ana Carolina. Resistir na língua: a literatura indígena contra o


silenciamento monolíngue, Florianópolis: UNISUL, 2022. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/1517-106X/202224111. Acesso em 01/06/2023.

DUNKER, Christian; SAFATLE, Vladimir; SILVA JUNIOR, Nelson da.


Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico, Belo Horizonte: Autêntica, 2021

______. Patologias do social: arqueologias do sofrimento psíquico, Belo Horizonte:


Autêntica, 2018.

FAUSTO, Ruy. Adorno e a dialética negativa, Disponível em:


https://revistarosa.com/4/adorno-e-a-dialetica-negativa. Acesso em: 01/06/2023.

HEGEL, G.W.F. Fenomenologia do espírito, Petrópolis: Vozes, 2014.

HUSSNE, Arthur. Introdução ao curso: Adorno e a dialética negativa, Disponível em:


https://revistarosa.com/4/adorno-e-a-dialetica-negativa-introducao. Acesso em:
01/06/2023.

LEBRUN, Gérard. O avesso da dialética, São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

LUKÁCS, Gyorg. História e consciência de classe, São Paulo: WMF Martins Fontes -
POD, 2018.

MARX, Karl. Livro 1, O Capital, São Paulo: Boitempo, 2023.

REPA, Luiz. Totalidade e Negatividade: a crítica de Adorno à dialética hegeliana,


Curitiba: Dossiê, Cad. CRH 24 (62), 2011. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S0103-49792011000200004. Acesso em: 01/06/2023.

SAFATLE, Vladimir. Os deslocamentos da dialética: Introdução à edição brasileira de


“Três estudos sobre Hegel”, São Paulo: Unesp, 2013.

ZWICK, Elisa. Introdução à Crítica Dialética Negativa da Gestão Pública Brasileira: a


Constelação Colonialidade em suas Bases da Recusa do Não Idêntico, Belo Horizonte:
XXXIX Encontro da ANPAD, 2015.

12
13

Você também pode gostar