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As relações entre cultura e comunicação:


núcleo epistêmico e forma simbólica*

Jean Caune
Professor emérito da Université Stendhal, Grenoble 3
Groupe de Recherche sur les Enjeux
de la Communication (Gresec)
E-mail: jean.caune@wanadoo.fr

Resumo: Este artigo visa destacar as relações internas entre os con-


ceitos de cultura e de comunicação a partir de questões ligadas à
inovação e à experimentação social, às indústrias culturais e à trans-
missão e apropriação do patrimônio. Essas relações são igualmente
examinadas tanto a partir da dimensão de enunciação do sujeito,
A s relações entre as noções polissê-
micas de cultura e de comunicação
configuram-se, no campo das Ciências da In-
quanto nos processos de recepção. Argumentamos que o resultado formação e da Comunicação, em torno de dis-
das relações entre cultura e comunicação intervém como um ana- cursos que tratam dos mesmos objetos reais:
lisador das interacções, influências e mediações consideradas como
modalidades de transmissão entre o passado e o presente, entre os os meios de comunicação, as práticas culturais,
espaços públicos e a vida privada. os objetos artísticos, as políticas de comuni-
Palavras-chave: enunciação, forma simbólica, mediação cultu-
ral, práticas culturais, recepção, significância.
cação… Existem pelo menos duas grandes
perspectivas, duas “formações discursivas”,1 no
Le couple culture-communication: noyau épistémique et sentido atribuído por Foucault, nas quais os
forme symbolique
Resumen: Cet article vise à mettre en évidence les relations in-
discursos eruditos sobre a cultura e a comuni-
ternes entre les concepts de culture et de communication à partir cação se cruzam, se imbricam e se hibridam.
des questions de l’innovation et de l’expérimentation sociale, des Uma primeira perspectiva, que aqui será
industries culturelles et de la transmission et appropriation du pa-
trimoine. Ces relations sont examinées aussi bien à partir de la di- somente indicada – uma vez que ela é rica,
mension d’énonciation de la personne, que dans les processus de profunda e diversa –, foi traçada pelo pensa-
réception. En effet, le couple de notions culture/communication
intervient comme analyseur des interactions, des influences, des
mento antropológico e filosófico contempo-
médiations considérées comme des modalités de transmission en-
tre le passé et le présent, entre les espaces publics et la vie privée. *
Este artigo é uma versão revista e ampliada de uma comunica-
Palabras clave: énonciation, forme symbolique, médiation ção feita no XVI Congresso da Sociedade Francesa das Ciências
culturelle, pratiques culturelles, réception, signifiance. de Informação e Comunicação (Société Française des Sciences
de l’Information et de la Communication – SFSIC), ocorrido
The relations between culture and communication: episte- em junho de 2008. Seu objetivo é de precisar o “estado da arte”
mic core and symbolic form referente às contribuições teóricas – em primeiro lugar france-
Abstract: This article aims at highlighting the internal relations sas, mas também latino-americanas, a partir do pensamento
between the concepts of culture and communication starting de Jésus Martin-Barbero – que nos permitem refletir a respeito
from the questions of innovation and social experimentation, das relações entre cultura e comunicação.
cultural industries, and the transmission and appropriation of Traduzido do francês por Ângela Cristina Salgueiro Marques,
inheritance. These relations are principally examined from the Doutora em Comunicação Social pela UFMG e atualmente
dimension of a stating person, as well in the reception proces- em estágio pós-doutoral junto ao Groupe de Recherche sur les
ses. Indeed, the culture/communication couple intervenes like Enjeux de la Communication (Gresec), Université Stendhal,
an analyzer of the interactions, influences and mediations that Grenoble 3 – França.
are considered as a transmission modality between past and 1
Por “formação discursiva” Michel Foucault tinha em mente o
present, public spaces and private life. caso dos enunciados dispersos nos quais seria possível detectar
Key words: enunciation, symbolic form, cultural mediation, certa regularidade entre os objetos de discursos, as condições de
cultural practices, reception, significance. enunciação, os conceitos e as escolhas temáticas (Foucault, 1969).

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râneo, que se interroga sobre a experiência da mistura ou do hibridismo que configura


vivida oriunda da relação que o sujeito falante “a trama atual da modernidade e da disconti-
estabelece com o mundo social. Os discursos nuidade culturais”,2 Martín-Barbero conjuga
que fazem parte dessa perspectiva vão buscar a sociologia da cultura (meios de comunica-
nos saberes específicos da antropologia, da ção de massa), a estética (do folclore às formas
sociologia, da psicologia, da lingüística e da populares) e a filosofia da linguagem (práticas
de recepção) e, desse ponto de vista, ele pode
ser considerado como um filósofo da globali-
dade da cultura.
Martín-Barbero conju-
Por outro lado, podemos identificar os
ga sociologia da discursos que tomam diretamente por objeto
cultura, estética e os fenômenos culturais do ponto de vista dos
filosofia da linguagem, suportes, dos atores, dos efeitos sobre os re-
podendo ser conside- ceptores, da constituição das formas… Meu
rado um filósofo da objetivo neste artigo é o de, em um primeiro
momento, indicar brevemente as contribui-
globalização da cultura
ções trazidas pelas Ciências da Informação e
da Comunicação dentro dessa segunda pers-
pectiva. Em seguida, tentarei definir as liga-
psicanálise uma grande parte de seus concei- ções possíveis entre as noções de cultura e
tos. Eles buscam identificar o que, no campo de comunicação. Enfim, procurarei revelar o
da cultura – tomada em seu sentido amplo centro de conhecimento e a estrutura formal
–, diz respeito às trocas simbólicas. Assim, as presentes nos discursos do primeiro tipo, no
interações, as influências e as mediações cul- que diz respeito à cultura e à comunicação.
turais são consideradas como modalidades
de transmissão entre o passado e o presente, 1. As práticas culturais do ponto de
entre os espaços públicos e a vida privada… vista comunicacional
Esse pensamento, para utilizar uma expressão
do lingüista Émile Benveniste, que desenvolve Podemos apontar, sem sombra de dúvida,
uma linguística de segunda geração, funda- três domínios de práticas que, antes de serem
da no coneito de enunciação, distingue dois temáticas de discursos sobre nossa sociedade,
modos de “significância”, que correspondem à foram objetos concretos, elementos de sua
distinção entre língua e discurso. A primeira, a transformação: a industrialização da cultura,
significância semiótica, está ligada à lógica do os processos de inovação e a valorização do
signo. A segunda, a significância semântica, patrimônio. As Ciências da Informação e da
ligada ao sentido, resulta do mundo da enun- Comunicação souberam construir um olhar
ciação e do universo do discurso (Benveniste, esclarecedor e específico sobre esses domí-
1969). Esses dois modos conferem à cultura nios. Contentar-nos-emos aqui de mencio-
sua dimensão de mediação que se manifesta, nar brevemente algumas direções de pesqui-
ao mesmo tempo, como produção do sentido sa que desempenharam um papel pioneiro.
e como construção da forma. Eles permitem
aos processos culturais funcionarem como 1.1 A inovação técnica e a experimentação
espaços nos quais são transmitidas as diver- social
sas formas da experiência humana. Para dar Para um grande número de pesquisado-
um exemplo, me parece que o pensamento res das ciências sociais, o modelo da detemi-
de Jesús Martín-Barbero, dentro da literatu-
ra produzida na América Latina, diz respeito 2
Cf. Jésus Martin-Barbero, Des médias aux médiations: com-
a essa segunda perspectiva (Martín-Barbero, munication, culture et hégémonie, p.20 tr. francesa, 2002, Paris,
2002). De fato, para além de um pensamento CNRS éditions.

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nação causal que faz com que as transforma- instituições, da admnistração do político, e
ções da organização de um empreendimento também no setor do lazer e da cultura.
dependam das inovações técnicas, tanto no
domínio da produção quanto no domínio da 1.2 As indústrias culturais
administração, não é viável. As inovações técnicas, em matéria de pro-
A experimentação das novas tecnologias dução e de difusão das imagens e dos sons,
ou, mais precisamente, de sua difusão, foi participaram da emergência e do desenvolvi-
abordada segundo dois procedimentos: mento da “época da reprodutibilidade técni-
• aquele da oferta que se preocupa com os ca”, da qual Walter Benjamin foi um dos mais
meios de assegurar a penetração das no- apurados analistas. Seu mérito foi o de ressal-
vas tecnologias; tar a recepção feita pelo espectador (Benja-
• aquele da demanda que, contrariamente, min, 1939). Essa época deu origem às indús-
tem sua base nas necessidades hipotéticas trias culturais que constituem a sua principal
dos indivíduos e se questiona sobre a ca- fonte de valor e de lucros. As pesquisas de
pacidade das tecnologias em dar respos- Martín-Barbero se situam nessa perspectiva.
tas a tais necessidades. De fato, este autor se recusa a examinar a cul-
Essa última orientação tem seus funda- tura em sua simples dimensão de enunciado,
mentos em uma visão determinista e fun- e a situa como um momento da construção
cionalista da natureza das necessidades cul- do sujeito individual e coletivo. A cultura, se-
turais que mostrou seus limites. Ela supõe, gundo ele, requer ser avaliada em função de
na verdade, que o lugar dos novos produtos sua recepção, das apropriações e dos desvios
está profundamente inscrito nas demandas que ela ocasiona. Estes dois últimos pontos
sociais. Ela constrói a hipótese de que cada de vista realizam um descentramento da
nova tecnologia corresponde a determinadas análise cultural. Esse descentramento ques-
atividades ou comportamentos que podem tiona o modo como a análise cultural pode
ser isolados. ser conduzida tanto pelas pessoas que des-
A inovação é o fruto do encontro entre valorizam a cultura de massa e as indústrias
uma técnica, uma organização e um quadro culturais ilustradas por uma certa esquer-
cultural dentro do qual ela se desenvolve. A da radical, na França e nos Estados Unidos,
técnica, incluindo as relações sociais e a or- quanto pelos setores corporativistas que, na
ganização, são constituídas através da me- França, consideram que a cultura de massa é,
diação das técnicas, sejam elas materiais ou em si mesma, um instrumento de alienação
relacionais. A convergência entre os fatores (Lasch, 2001). Cinqüenta anos depois, Ben-
técnicos e as condições culturais deram lu- jamin, assim como Martín-Barbero, rejeita
gar a inúmeros trabalhos, em particular para esse ponto de vista funcionalista, que perce-
pensar as condições de difusão da inovação be o processo de comunicação de maneira
(Flichy, 1995). O modelo “difusionista” da determinista, unívoca e essencialmente de-
inovação parece ultrapassado, uma vez que terminado pela difusão de conteúdos.
a inovação se apresenta como um processo Os primeiros trabalhos franceses sobre as
atravessado por conflitos permanentes, pelas indústrias culturais souberam escapar à visão
estratégias de atores e pelas alianças e com- elitista de Theodor Adorno e de Max Horkhei-
promissos estabelecidos entre eles (Callon, mer, os quais culpavam a indústria cultural de
1989; Latour, 1992). Se considerarmos as desvirtuar a criação artística (1974). Assim, a
práticas sociais e as relações sociais institu- tese fundadora da obra Capitalisme et indus-
ídas, veremos que a inovação, que não deve tries culturelles (Huet et alii, 1978) desenvolvia
ser reduzida à produção de bens, se desen- uma lógica baseada nos atores, na qual os edi-
volveu de maneira desigual nos domínios da tores assumem uma função central ao garantir
produção e da difusão do saber, da gestão das a articulação das atividades artísticas, técnicas,

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financeiras… As Ciências da Informação e da 1.3 Da conservação do patrimônio à sua


Comunicação ocuparam um lugar específi- exposição
co na análise do setor das indústrias culturais.
Nesse sentido, a contribuição de Bernard Miè- Um exemplo significativo dessa imbri-
ge foi a de apreender essas indústrias através cação/distinção entre cultura e informação
dos métodos da sociologia e da economia ao pode ser dado pelas duas modalidades de
situar-lhes dentro das lógicas próprias da co- apresentação museológica das obras do pas-
municação (recepção das mensagens, distinção sado. Jean-Louis Déotte distingue os “mu-
dos suportes técnicos, efeitos de sentido etc.). seus miméticos”, que apresentam as obras do
As temáticas dessa formação discursiva, passado em sua identidade cultural a partir
relativa aos objetos produzidos pelas indús- de uma reconstrução do ambiente vivaz an-
trias culturais, podem se ligar à questão dos teriomente existente, dos “museus didáticos”,
usos dos produtos que dizem de uma expe- que conferem destaque aos objetos do passa-
riência de recepção sensível e inteligível. A do em sua dimensão informativa através de
perspectiva que gera uma intersecção (regard uma mediação que os retira das condições
croisé) entre o cultural e o comunicacional contextuais (Déotte, 1993). Tal distinção
reside, de um lado, no caráter aleatório (ou – que diz respeito aos processos de exposi-
incerto) dos valores de uso gerados pelos ção das obras – não aborda os objetos em si
produtos culturais industrializados e, de ou- mesmos, mas o dispositivo que os transfor-
tro, no fato de que “a criação artística ten- ma, para o visitante, em um objeto cultural
de a se transformar na fase de concepção da e/ou um objeto de saber inscrito dentro de
produção das mercadorias culturais” (Miège, um discurso museológico.
2000:26). Esse ponto de vista, necessário e A questão da apresentação do objeto tra-
singular, que conjuga lógica editorial, especi- dicional ou técnico está igualmente em pau-
ficidade dos suportes técnicos de produção e ta na concepção e na análise museográficas
experiências de recepção sensível, inspirou a que Élisabeth Caillet define como um “jogo
obra de Flichy, Les industries de l’imaginaire a três” entre o objeto (isolado de sua função
(1999). Ela deu origem a alguns trabalhos inicial), o receptor (localizado em uma posi-
que dizem respeito tanto à transformação do ção de expectativa mental e afetiva) e, enfim,
espetáculo animado em mercadoria (Bou- o idealisador da exposição, que deseja “pas-
quillon, 1992), quanto à indústria do disco sar uma mensagem” (Caillet, 1995). A expo-
clássico (Vandiedonck, 1999). sição, considerada como uma enunciação de
Não podemos ignorar, nessa rápida evo- seu organizador (commissaire),3 é analisada
cação, a oferta tecnológica e mercadológica por Bernadette Dufrêne como uma mídia,
no setor da educação. A introdução das novas ou seja, como um dispositivo tecnológico
mídias, em particular aquelas que mobilizam a que comunica informações e organiza rela-
informática, foi analisada segundo duas pers- ções com um público dentro do quadro de
pectivas. A primeira ressalta o deslocamento um sistema institucional (Dufrêne, 2000).
da função educativa fora da instituição escolar Esse intuito de compreensão da exposição
e a segunda interroga o processo de formação como uma mídia só adquire sentido se exa-
das necessidades educativas e de sua adequa- minamos, de um lado, a articulação entre
ção às normas das indústrias da cultura e da o dispositivo técnico desenvolvido em um
comunicação (Moeglin, 1998). Esse domínio espaço e, de outro lado, as condições que
em expansão constante e o desenvolvimento determinam sua concepção e sua realiza-
das formações online abrem um extenso cam- ção. Jean Davallon, ao considerar a exposi-
po de pesquisa no qual se intercruzam dife- ção como artefato, ou seja, como um objeto
rentes lógicas editoriais. Estas últimas, por sua
vez, dependem dos conteúdos e da interativi- 3
N.d.T: O termo “commissaire” indica aqui uma pessoa encarre-
dade possibilitada pela escrita multimídia. gada de verificar o bom desenvolvimento de um projeto.

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que resulta da criação e da utilização de uma se como um conteúdo veiculado pela comu-
técnica, transforma-a em uma produção nicação – nem situados em planos paralelos,
cultural específica. Ele coloca em evidência em correspondência analógica.
a intencionalidade comunicacional presente
na produção da exposição (Davallon, 2000). 2.1 Abordagem pretendida
Tal concepção, que confere à exposição uma As distinções necessárias entre cultura e
dupla dimensão de significação e de comuni- comunicação se definem em um campo de
cação, possui uma natureza semântico-prag- conhecimento trabalhado pelas ciências hu-
mática. Assim, o sentido da exposição con- manas e sociais e delimitado pelas condições
siste em investigar os efeitos que ela provoca materiais, técnicas e políticas de uma socie-
sobre o receptor: ao mesmo tempo no plano dade. Dito de outra maneira, essas distinções
sensível e no plano inteligível. O estatuto da devem remeter a uma inscrição dentro de
exposição como um agenciamento de coisas uma história dos modos de produção e de
não a define como um objeto semiótico a difusão das informações, das técnicas de co-
priori. Ela se transforma em tal objeto atra- municação, dos dispositivos de circulação e
vés da atividade de compreensão do visitante de recepção da arte. As questões que aqui se
dentro do quadro comunicacional no qual a apresentam são de duas naturezas.
exposição se inscreve. Essa abordagem, que
conjuga o objeto cultural e a perspectiva
comunicacional, nos obriga a interrogar os
tipos de relações que caracterizam a exposi-
A aproximação entre
ção, independetemente de seus conteúdos e as noções de cultura e
de sua apresentação (mise en scène). de comunicação não é
Meu objetivo é o de efetuar uma operação da ordem das circuns-
de articulação entre os dois tipos de discur- tâncias históricas ou
so acima mencionados, a fim de examinar técnicas. Uma não se
como as noções de cultura e de comunica-
constitui sem a outra
ção se entrecruzam e estabelecem seus con-
tornos dentro do campo das ciências sociais
e humanas. Desejo, portanto, estabelecer as
fronteiras elásticas nas quais os processos A primeira diz respeito à identificação
comunicacionais e os fenômenos culturais dos traços comuns aos processos culturais
se confrontam para tecer os temas de uma e aos processos de comunicação (Caune,
experiência partilhada. 2006). A partir dessa proximidade conceitual
podemos notar que a reflexão sobre os fatos
2. Os modos de articulação da cultura e sobre os modos de comunicação
nos coloca diante da questão das relações en-
A aproximação entre as noções de cultura tre indivíduo e sociedade. Se a cultura é um
e de comunicação não é da ordem das cir- fato de sociedade, só pode existir uma cul-
cunstâncias históricas ou técnicas, ainda que tura manifesta, transmitida e vivida pelo in-
a industrialização da cultura e o desenvolvi- divíduo. Se os suportes de comunicação são
mento das comunicações de massa tenham específicos de uma determinada sociedade,
contribuído a deslocar as fronteiras, a mo- as relações de comunicação envolvem os in-
dificar os atores e a confundir as funções. Na divíduos através das relações intersubjetivas
verdade, a cultura e a comunicação formam e através dos fenômenos de recepção ligados
uma estranha parceria. Uma não se constitui aos meios de comunicação. O segundo ponto
nem se explica sem a outra. Os fenômenos relaciona-se aos respectivos papéis desempe-
não são nem perfeitamente ajustados (um nhados por esses fenômenos na construção
contendo o outro) – a cultura apresentando- da realidade social e do mundo vivido. A con-

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vergência das tecnologias da informação e da 2.2 Um processo em um mundo de relações


comunicação produz vários efeitos sobre os
processos de produção e de difusão do saber, As Ciências da Informação e da Co-
sobre as maneiras de pensar, sobre o lazer e, municação podem ser questionadas por
de modo mais geral, sobre os comportamen- descreverem e oferecerem modelos de
tos e as identidades culturais. Uma das im- compreensão dos fenômenos culturais. O
portantes contribuições de Martín-Barbero, domínio da cultura – extenso, ambíguo e
no que concerne ao plano do poder que a polêmico – deve ser esclarecido, tanto em
cultura possui de construir identidades cole- seus elementos constitutivos e suas relações,
tivas, é a de recusar a oposição entre cultura quanto em suas formas e seus processos. O
fenômeno cultural deve ser compreendido
por meio de uma justaposição, de um lado,
das condições sociais que o determinan e,
A convergência das
de outro lado, dos processos psíquicos e
tecnologias da informa- simbólicos que lhe conferem uma signi-
ção e da comunicação ficação para um dado grupo. A cultura só
produz vários efeitos, de existe como “fato social total” devido à sua
modo mais geral, sobre manifestação como expressão de uma expe-
os comportamentos e as riência individual na qual se combinam o
psiquismo e a coporeidade, os signos e os
identidades culturais
comportamentos, os valores e as normas.
As temáticas comuns à cultura e à comu-
nicação conjugam aspirações e medos, nos-
popular e cultura de massa, ao examinar as talgias e objetivos políticos. Elas focalizam
“matrizes históricas das mediações de mas- as expectativas e conferem uma dimensão
sa”, sendo que a primeira imagem da massa operatória às novas tecnologias de informa-
é dada por uma imagem unificada do popu- ção e comunicação, atualizando as utopias
lar, por exemplo, através do melodrama, esse de transparência e de globalização anuncia-
“grande espetáculo popular” (Martín-Barbe- das pela cibernética desde o fim da Segun-
ro, 2000). A possibilidade de pensar as rela- da Guerra Mundial (Wiener, 1952). Em um
ções que existem entre a cultura de massa e mundo entregue à globalização das trocas,
o popular se realiza por meio da articulação à difusão e à convergência das técnicas de
entre as técnicas de comunicação, tal como comunicação, o espaço ocupado, dominado
elas se mobilizam na narração e na recepção e apropriado pelo homem e suas produções
– nas relações entre a escritura e a leitura. É encontrou seu limite.
assim que para Martín-Barbero se estabelece 2.3 Abordagem cultural da comunicação
a mediação entre real e imaginário efetuada
pela cultura de massa. Nenhuma figura da dualidade, da com-
Enquanto os fenômenos da cultura e plementaridade, da oposição ou da diferença
da comunicação se superpõem de manei- satisfaz a relação de inclusão recíproca que
ra cada vez mais freqüente, uma boa parte faz com que um fenômeno cultural funcio-
da comunicação institucional negligencia o ne também como processo de comunicação,
contexto de recepção e o horizonte de expec- ou que um modo de comunicação seja tam-
tativa daqueles aos quais ela se remete. Em bém uma forma de manifestação da cultura.
outras palavras, muito freqüentemente a Essa implicação recíproca é particularmente
comunicação se mostra como puro objeto, sensível em certas correntes da antropologia
uma transferência de informação, indife- anglo-saxônica (G. Bateson & J. Ruesch, 1988;
rente ao tempo e ao espaço de apropriação E. T. Hall, 1971, 1984). Duas concepções alter-
dos usuários. nativas da comunicação estão particularmen-

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te presentes na cultura americana do século


XIX, sendo que ambas possuem uma origem 3. Orientações epistemológicas e cru-
religiosa: um ponto de vista da transmissão e zamentos teóricos
outro ponto de vista “ritual” (Carey, 1989).
No colóquio Technologies et symboliques
O primeiro ponto de vista concebe a co-
de la communication, Lucien Sfez, seu organi-
municação como processo de transmissão e
zador, fez a seguinte pergunta: “Seria possível
de distribuição de mensagens, a fim de obter
traçar uma configuração de uma episteme,
um controle do espaço e de seus habitantes.
a partir do tema central da comunicação, e
Essa visão possui certamente motivações
nos perguntarmos se existe aí uma episteme
políticas e mercantis, mas, se considerar-
em formação capaz de se transformar no
mos a especificidade da cultura america-
quadro de referência para várias gerações de
na, o primeiro motivo dessa conquista do
pesquisadores?” (1990:10). Sfez concebia a
espaço é trazido pelos puritanos da Nova
comunicação como instalada em um tipo de
Inglaterra que, querendo escapar do Velho
continuidade que vai do núcleo epistêmico à
Mundo, alimentam o desejo de criar uma
forma simbólica, e esta última sendo defini-
nova vida e de fundar uma Nova Jerusalem.
da, tal como propõem Ernst Cassirer e Erwin
O segundo ponto de vista “ritual” nos re-
Panofsky, como um quadro de representa-
mete, evidentemente, a uma dimensão eti-
ções que organiza a visão e o pensamento do
mológica do termo “comunicação”, que evi-
mundo. A noção de forma simbólica, somada
dencia a idéia de partilha, de comunhão. Tal
àquela de configuração da episteme, se apli-
ponto de vista, que podemos qualificar de
caria igualmente aos domínios das atividades
“cultural”, destina-se a organizar o proces-
humanas tais como: “a percepção (visão, au-
so de partilha da crença através do tempo e
dição, olfato, tato), as posições do corpo, as
não do espaço. Ele percebe a comunicação
condutas, as maneiras de falar ou de se com-
como a construção e a manutenção de uma
portar à mesa, até o mais insignificante com-
ordem significante sobre o plano cultural.
portamento social e político” (Sfez, 1990:11).
Essa abordagem privilegia os processos
Essa observação é de grande importância,
simbólicos que projetam os ideais de comu-
pois ela posiciona a cultura vivida no mesmo
nidade e os incorporam sob formas mate-
continuum que a comunicação.
riais e artificiais: dança, teatro, cerimônias,
narrativas etc. 3.1 Duas faces de uma mesma configuração
Carey salienta que esse segundo ponto
de vista sobre a comunicação está longe de O que é heurístico na proposição de Sfez
ser predominante nos estudos dos meios relaciona-se à compreensão do pensamento
de comunicação. Esse ponto cego resulta- comunicacional como a articulação entre
ria da fragilidade e da fluidez da noção de uma episteme e uma forma simbólica. Essa
cultura no pensamento americano. A ex- perspectiva, que ainda está por ser contruída,
plicação construída por Carey é instigante. nos parece fecunda por várias razões:
Segundo ele, o desinteresse pela idéia de • A primeira é que essa associação vale
cultura, no contexto da concepção domi- igualmente para a cultura concebida em
nante da comunicação, seria o resultado de seu sentido antropológico;
um individualismo obsessivo que confere • A segunda é que ela permite uma articula-
à vida psicológica uma dimensão primor- ção, tanto no caso da comunicação quanto
dial; de uma perspectiva puritana que des- no caso da cultura, entre uma razão intele-
denha toda atividade que não é orientada gível e uma razão sensível (Caune, 1997);
pelo trabalho e, enfim, de uma separação • A terceira razão deve ser buscada no fato
entre ciência e cultura: a ciência produzi- de que a forma simbólica se realiza atra-
ria a verdade, enquanto a cultura estaria vés de uma mediação técnica da relação
ligada ao erro etnocêntrico. sujeito-objeto ou sujeito-sujeito;

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• Enfim, essa associação nos permite perce- caracterizado pela intencionalidade, ou


ber os objetos e os processos comunica- seja, a propriedade de focalizar um sentido
cionais através da determinação de seus susceptível de ser identificado.
conteúdos e, ao mesmo tempo, a partir de Essa passagem pela dimensão cultural da
suas estruturas formais, as quais os ins- noção de comunicação e pela dimensão das
crevem em seu espaço de existência. manifestações expressivas (orais, escritas,
As relações entre cultura e comunicação plásticas, lúdicas etc.) e intencionais da ex-
são mais bem teorizadas se elas encontram periência vivida nos conduz a salientar três
a ocasião de se apoiarem em uma aborda- características do fenômeno da comunicação
gem hermenêutica fundada por Wilhelm em sua relação com a cultura.
Dilthey e retomada por Hans G. Gadamer Em primeiro lugar, o uso de um meio
(1996) e Paul Ricœur (1986) à partir da de comunicação não tem por função unica-
idéia de experiência (Caune, 1997). Essa mente fornecer dados informativos. Ao invés
abordagem foi ilustrada por Victor Turner, disso, ele é o lugar de participação e de ação
em particular no âmbito da antropologia sobre um mundo vivo e global, ordenado e
da “performance”, na qual ela ocupa uma constituído. A comunicação, enquanto con-
parte essencial da antropologia da experi- figuração de forças ativas, nos implica, geral-
ência (1982).4 Turner se refere ao concei- mente de maneira indireta, e nos conduz a
to de experiência vivida (Erlebnis) forjado assumir nosso posisicionamento social.
por Wilhelm Dilthey no final do século Em segundo lugar, o processo de comu-
XIX. Este último concebia a experiência vi- nicação é a base de toda construção de uma
vida através de categorias formais: unidade comunidade. John Dewey, um dos fundado-
e multiplicidade, semelhança e diferença, res da filosofia pragmática, fazia da experi-
parte e totalidade. Esses são, para Dilthey, ência sensível o fundamento da construção
os conceitos elementares que organizam es- do ser humano e de sua participação na
sas categorias formais, independentemente constituição da cultura (1939). Ele via, no
se sua manifestação ocorre de forma natu- processo de comunicação, a origem do vín-
ral, em uma instituição cultural ou sob a culo social, pois a comunicação é o caminho
forma de um acontecimento psíquico. As pelo qual os homens partilham suas crenças,
ciências do espírito implicam a capacidade suas aspirações, seus objetivos… (Dewey,
de se colocar dentro da vida psíquica do 1916). A consideração da dimensão cultural
outro. O homem não é radicalmente um da comunicação pode ser definida como a
estranho para outro homem, porque ele consideração do processo simbólico através
dá sinais de sua própria existência. “Com- do qual a realidade se constrói, se mantém e
preender esses sinais é compreender o ho- se transforma.
mem” (Ricœur, 1986:83). Essa perspectiva Enfim, para estabelecermos uma relação
hermenêutica é fundamental para a análise entre, de um lado, os dois pontos de vista
da cultura e da comunicação. As manifes- que constituem a noção de comunicação e,
tações culturais se transmitem e podem ser de outro lado, a hipótese evocada por Sfez,
analisadas devido à natureza do psiquismo é preciso admitir que a realidade do mundo
social não existe de maneira independente
da linguagem e das formas simbólicas. Se
4
A performance, seja ela apresentada através de uma peça de
teatro, de uma coreografia ou ainda de uma conferência da im- queremos conferir uma outra significação
prensa ou da retransmissão televisiva de um atentado contra – além da retórica – a essa afirmação, preci-
um político, é difícil de definir e de localizar, uma vez que o
conceito e a estrutura foram apropriados em todos os domí- samos considerar a comunicação como um
nios. O conceito de performance é étnico e intercultural, histó- fenômeno primeiro, que permite a existência
rico e não-histórico, aestético e ritual, sociológico e político. A do conhecimento e a transmissão de uma ex-
performance é um modo de comportamento e uma dimensão
da experiência vivida. Podemos aproximá-la do conceito de periência. Esses últimos, sem a comunicação,
dramatização (Caune, 1981). estariam fadados ao esquecimento.

Líbero - Ano XI - nº 22 - Dez 2008


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Eu e o Tu, e constrói o Nós. A riqueza da no-


4. Núcleo epistêmico e forma simbólica ção de forma simbólica, do ponto de vista da
incidência do simbólico sobre o imaginário
Para retomar a questão relativa à deter- de uma época, pode ser ilustrada por uma
minação do núcleo epistêmico e da forma das hipóteses mais fecundas dessa proble-
simbólica comuns à comunicação e à cultu- mática aplicada à representação artística: a
ra, gostaríamos de propor duas hipóteses. hipótese da visão em perspectiva desenvol-
A nosso ver, o núcleo epistêmico da co- vida por Erwin Panofsky no início dos anos
municação seria constituído pelo pensa- 1930 (Panofsky, 1975).
mento da relação, da enunciação e da dialé-
tica entre o código e a mensagem ou, para
recuperar a formulação proposta por Claude
Lévi-Strauss (1962), da dialética entre estru- A convergência das
tura e acontecimento. A esses conceitos es- técnicas introduziu nos
truturais é preciso adicionar os conceitos de processos comunica-
semelhança e de contigüidade (metáfora e cionais e culturais uma
metonímia) que encontramos tanto nos ritos nova forma simbólica
miméticos, quanto na linguagem e na poéti-
ca, ou nas estruturas do inconciente (Caune,
que aciona linguagens
1997). Essa dimensão epistêmica estruturou expressivas diferentes
amplamente o primeiro tipo de formação
discursiva abordado anteriormente. Ela de-
veria poder operar como quadro de análise Para concluir, desejamos propor uma hi-
dos objetos de conhecimento da cultura. pótese. Seria possível reconhecer uma forma
Por outro lado, a determinação de uma simbólica dominante da cultura em uma so-
forma simbólica susceptível de caracterizar ciedade de comunicação técnica? A conver-
a modernidade, produzida pela convergên- gência das técnicas introduziu, nos processos
cia das técnicas de informação e de comu- de comunicação e nas manifestações culturais,
nicação, foi pouco trabalhada. Devemos nos um fenômeno novo, o qual as artes plásticas e
lembrar de que Cassirer reconheceu a confi- o cinema já haviam experimentado nos anos
guração e a articulação das formas simbóli- 1920, ou seja, o fenômeno de uma uma forma
cas dentro do que ele chamou de “função ge- simbólica que aciona linguagens expressivas
ral de simbolização”. Ele pretendia estender diferentes. Tal forma simbólica poderia ser
esta última a todas as atividades do espírito exemplificada através do fenômeno da cola-
e, em particular, àquelas que se concretizam gem, tal como ele se desenvolveu no processo
nas produções artísticas (Cassirer, 1923). A de criação artística moderna. Em primeiro
função geral de simbolização manifesta-se lugar, esse desenvolvimento se deu nas artes
através da lógica de significação que associa plásticas, em seguida na mistura entre, de um
a determinação de um conteúdo qualquer lado, as técnicas de montagem do audiovisual
à sua fixação em uma forma perceptível. A e, de outro lado, a multisensorialidade pre-
forma simbólica organiza a percepção que sente na escrita multimídia. Enfim, ele se pro-
o homem tem do mundo que o cerca e de duziu também na evolução das artes da per-
sua experiência. Ela é, ao mesmo tempo, formance: dança, teatro, instalações que têm
uma forma do conhecimento e uma matéria por objetivo produzir acontecimentos (ins-
de conhecimento de sua experiência vivida. tallations événementielles)… que misturam
Através das mediações técnicas, que organi- palavras, sons, cantos, gestos, movimentos e
zam aquilo que está disponível à percepção, imagens em um mesmo espaço de represen-
a forma simbólica configura as relações in- tação para produzir formas híbridas, que não
terpessoais, ela estrutura as relações entre o se prendem às distinções convencionais entre

Jean Caune - As relações entre cultura e comunicação: núcleo epistêmico e forma simbólica
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o teatro (entendido enquanto representação técnica, como uma matriz que gera uma vi-
em ação de um texto), a dança (concebida são específica de uma sociedade na qual os
enquanto arte do movimento no espaço) e o fenômenos da cultura e da comunicação se
happening (visto enquanto intervenção e per- sobrepõem. Falta ainda reconhecê-la nas for-
formance) (Caune, 2006). mas contemporâneas presentes nos meios de
A colagem, compreendida como moda- comunicação, nas exposições, nos espetácu-
lidade particular de representação, pode ser los e em certas modalidades de hibridação de
considerada, para além de sua dimensão práticas culturais.

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