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Resumo
Introdução
Aprender a ser professor é um processo que vai muito além dos conhecimentos
específicos e pedagógicos com os quais os estudantes entram em contato nas licenciaturas,
estando relacionado também com uma diversidade de outros conhecimentos que se aprendem
na inserção em um ambiente de trabalho e na interação com os pares.
Por isso, a aprendizagem de como ser professor e como ensinar, conforme Mizukami
(1996), ocorre, em grande parte, nas situações de sala de aula, a partir de um olhar mais
centrado e profundo sobre a complexidade que se instaura em torno do processo de ensino e
aprendizagem. Entende-se, assim, que para ser professor é preciso exercitar a profissão, atuar
em uma sala de aula, saber conduzir os acontecimentos, saber lidar com as incertezas,
pluralidade de ideias e diversidades que permeiam esse singular espaço, grandioso em suas
manifestações (MAISTRO; ARRUDA; OLIVEIRA, 2009).
Para Tardif (2002, p. 167), “ensinar é entrar numa sala de aula e colocar-se diante de
um grupo de alunos, esforçando-se para desencadear com eles um processo de formação
mediado por uma grande variedade de interações”. Isto fará com que os futuros professores
estabeleçam um exercício de reflexão que contribui para a compreensão do contexto
educativo e para a construção de novos conhecimentos a partir da realidade escolar, pois é no
convívio com os principais sujeitos do processo educativo - os alunos da escolarização básica
e seus professores - que o licenciando mobiliza e produz saberes, constituindo-se profissional
(FIORENTINI; CASTRO, 2003).
Nesse contexto, o Estágio Supervisionado representa a inserção do professor em
formação no campo da prática profissional; um tempo durante o qual ele passa pela
experiência da docência, geralmente pela primeira vez. Nesse tempo, os futuros professores
podem observar, participar, problematizar e trocar ideias com professores regentes na escola
básica, interagir com os alunos e conhecer aspectos gerais do ambiente escolar.
Nesta perspectiva, esse artigo apresenta os resultados de uma investigação cujo tema
principal reflete as situações vivenciadas por licenciandos no contexto do Estágio. A pesquisa
foi desenvolvida objetivando compreender os significados e saberes construídos pelos
acadêmicos na realização do Estágio Supervisionado em Matemática e suas implicações para
a futura atuação docente. Trata-se de um estudo qualitativo, de natureza exploratória,
realizado com alunos do 3º e 4º anos de um Curso de Licenciatura em Matemática, de uma
universidade pública do estado do Paraná.
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Desenvolvimento
O Estágio Supervisionado, dessa forma, deve ter como objetivos proporcionar uma
visão não somente da disciplina de Matemática, mas de tudo o que acontece na escola, por
meio de atividades que “focalizem os principais aspectos da gestão escolar como a elaboração
da proposta pedagógica, do regimento escolar, da gestão dos recursos, da escolha dos
materiais didáticos, do processo de avaliação e da organização dos ambientes de ensino”
(SBEM, 2003, p. 22).
É importante, para tanto, que, nas escolas, os alunos participem de conselhos de classe,
reuniões pedagógicas, reuniões de pais e de professores, das horas atividade e, até mesmo, do
intervalo do “cafezinho” que é quando muitas das angústias, aflições, sucessos e conquistas
são partilhados entre os professores. Além de observar, acompanhar e auxiliar os professores
regentes nas salas de aula e elaborar materiais didáticos, os estagiários devem atuar junto às
turmas com o acompanhamento do professor regente da classe e sob a orientação/supervisão
do professor da Universidade.
O contato com a realidade escolar geralmente não é tranquilo para a maioria dos
acadêmicos; ao contrário, é um momento rodeado de tensões, medos, inseguranças, conflitos,
desafios e até frustrações por se depararem com algo desconhecido, com uma realidade que
até então conheciam somente na teoria ou como alunos (CYRINO; PASSERINI, 2009).
Portanto, esse tempo envolve o conhecimento, a utilização e a avaliação de metodologias e
estratégias de ensinar em situações diversas, além de superação e autodeterminação.
Nesse estudo, por meio da apresentação e sistematização de dados coletados junto a
um grupo de acadêmicos, são tecidas algumas discussões e análises em torno do objetivo
formulado, procurando apontar para as implicações curriculares nos Estágios dos Cursos de
Licenciatura em Matemática.
Metodologia
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Análise
De uma forma geral, o Estágio Supervisionado tem sido avaliado de maneira positiva
pelos acadêmicos do curso de Licenciatura em Matemática, que destacam seu caráter
formativo, desafiador e gratificante, porém complexo, inquietante e contraditório.
Segundo os acadêmicos entrevistados, o Estágio proporcionou aprendizagens variadas
no âmbito social, profissional e cultural. Significou uma rica experiência em que puderam ter
uma visão realista do dia-a-dia da sala de aula e refletir sobre como se aprende e se estão
preparados para ensinar. Esse tempo, representou oportunidades de interação com os alunos,
de aprendizagens das especificidades do processo educativo, de relembrar conteúdos e de
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[...] é através das relações com os pares e, portanto, através do confronto entre
saberes produzidos pela experiência coletiva do(a)s professor(a)es, que os saberes da
experiência adquirem uma certa objetividade: as certezas subjetivas devem então, se
sistematizar a fim de serem traduzidas em um discurso da experiência capaz de
informar ou de formar outros docentes e de responder a seus problemas.
Desse modo, o Estágio tem por finalidade colocar o licenciando em situação de ensino
e aprendizagem, oportunizando um conjunto de conhecimentos e de reflexões, de
informações, de possibilidades e de aprofundamento no estudo das diversas questões
relacionadas à educação.
No Estágio, os alunos entram em contato com a heterogeneidade presente nas salas de
aula e com a complexidade da situação profissional. Com esse contato, o futuro professor
pode ter uma noção real das condições de trabalho e estar ciente das dificuldades que
permeiam o cotidiano de uma sala de aula. Dentre essas dificuldades, os acadêmicos
apontaram nos questionários a indisciplina dos alunos, a falta de interesse no estudo dos
conteúdos matemáticos, a superlotação em algumas salas de aula e a inserção com sucesso de
metodologias inovadoras no ensino da disciplina. Conforme desabafa a acadêmica A, “ao
iniciar o Estágio Supervisionado I, tive vontade de desistir porque me decepcionei muito com
o que presenciei nas escolas, principalmente com relação à falta de educação dos alunos em
sala de aula. Na minha época de estudante, o professor conseguia controlar a disciplina na
turma. Havia respeito, os alunos prestavam mais atenção na explicação do professor e não
atrapalhavam a aula”.
Nesse sentido, a formação não é o simples momento de instrumentalização teórico-
metodológico, mas principalmente o de aprender a enfrentar a contradição, a diversidade.
Conforme constata Tardif (2002), apesar do trabalho do professor ser estruturado por
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situações rotineiras e ritmos escolares, é marcado pela diversidade que irrompe na sala de
aula, causando conflitos e a contradições.
De acordo com os registros dos acadêmicos, o tempo de maior tensão na realização do
Estágio é quando assumem a turma no lugar do professor. Sentem medo das perguntas e
rejeição dos alunos, inseguros se estão explicando o conteúdo de maneira adequada, angústia
por estarem sendo observados, receio de não conseguir controlar a turma e insegurança
quanto a sobrar ou faltar tempo na aula. Outras dificuldades se referem aos planejamentos e à
questão da organização dos horários, especialmente para os que já exercem alguma profissão.
Como diz a acadêmica G, “[...] é um tempo conturbado: horários, distâncias, pressão
psicológica, muitas tarefas, planos de aula, trabalhos, mini-aulas, provas na universidade,
relatório de estágio, leituras... Não sobra tempo para nada!”
Segundo Pimenta e Lima (2008), a formação envolve vários tipos de saberes -
reflexivos, especializados e pedagógicos - que constituem a profissão docente e “comportam
situações problemáticas que requerem decisões num terreno de grande complexidade,
incertezas, singularidades e de conflito de valores” (p. 68).
Outros aspectos relevantes vivenciados no Estágio, apontados pelos acadêmicos,
foram as discussões realizadas nas aulas da disciplina na universidade: os estudos teóricos, os
relatos sobre as diversas realidades encontradas, as reflexões conjuntas, os desabafos e a troca
de experiências. Como indica a acadêmica C, as aulas possibilitaram “enxergar o ambiente
escolar de forma diferenciada”.
Para Cyrino e Buriasco (2003, p. 134), durante as aulas e as atividades de Estágio é
importante oportunizar ao aluno da Licenciatura em Matemática o desenvolvimento “de uma
visão dos conteúdos matemáticos que se destinam a Educação Básica de modo a rever
criticamente algumas práticas educativas vigentes, no que se refere aos conteúdos e
metodologias”. Para tanto, deve-se realizar uma síntese do desenvolvimento das ideias
fundamentais da Matemática na Educação Básica, aspirando uma visão não compartimentada.
Os conteúdos precisam, portanto, ser revisitados numa perspectiva crítica, ou seja,
possibilitando melhores condições de futuramente os acadêmicos desenvolverem um trabalho
nas aulas de Matemática com autonomia e flexibilidade.
Os acadêmicos indicaram ainda que há um distanciamento entre os saberes
trabalhados na universidade e a realidade das escolas, pois aprendem, na maior parte das
disciplinas, conteúdos voltados para o ensino superior e não para o ensino fundamental e
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médio. Reclamaram também que “quando chega à hora de ir para a escola, alguns conteúdos
precisam ser aprendidos para depois serem trabalhados em sala de aula” (acadêmico B). Por
isso, no entender dos licenciandos, a universidade não fornece a base suficiente para o bom
desempenho profissional, pois “a prática acontece mesmo em sala de aula” (acadêmico J).
A partir das falas dos acadêmicos, percebe-se que as indicações das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica (BRASIL,
2002a) para que o planejamento e a execução das práticas no estágio estejam apoiados nas
reflexões desenvolvidas pelas disciplinas curriculares em seu conjunto, não vêm sendo
cumpridas em sua totalilidade. Há ainda uma supervalorização dos conteúdos específicos em
detrimento aos conteúdos pedagógicos. Como assinalam Cyrino e Passerini (2009), dentre as
principais críticas feitas aos Cursos de Formação de Professores de Matemática atualmente
está a falta de “discussão e reflexão sobre elementos da prática pedagógica e a desarticulação
quase total entre teoria e prática” (p. 126).
Como sugestão para o aprimoramento do Estágio Supervisionado, os acadêmicos
indicaram que este componente curricular seja oportunizado desde o primeiro ano do curso,
com o desenvolvimento de projetos em contraturno, oficinas e seminários nas escolas.
Também que seja “realizado no máximo em duas turmas diferentes, para que os estagiários
tenham melhor envolvimento com os alunos” (acadêmica I) e que “abranja escolas da cidade
e do campo” (acadêmico D).
Considerações finais
REFERÊNCIAS
BRASIL. LEI No 9.394 / 1996. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996.
PIMENTA, S. G.; LIMA, M. S. L. Estágio e Docência. 3ed. São Paulo: Cortez, 2008. v. 1.
296 p.