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Métodos e
Técnicas de
Pesquisa
Métodos e
Técnicas de
Pesquisa
COORDENAÇÃO REITOR
Luís Paulo Leopoldo Mercado Eurico de Barros Lôbo Filho
Fernando Sílvio Cavalcante Pimentel
VICE-REITOR
Rachel Rocha de Almeida Barros
UAB
Ministério da
Educação
COORDENAÇÃO EDITORIAL:
Fernanda lins
PROJETO GRÁFICO
Raphael Pereira Fernandes de Araujo
DIAGRAMAÇÃO
Mario Silvestre Rodrigues
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL:
Fabiana Camargo dos Santos
COORDENAÇÃO DE CURSO:
Luciana Santana
SUPERVISÃO TEÓRICA:
Luciana Santana
REVISÃO DE CONTEÚDO:
Evaldo Mendes da Silva e Luciana Santana
Editora afiliada:
,
Livro Conteúdo
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Métodos e Técnicas de Pesquisa
Concepção da Disciplina
PLANO DE DISCIPLINA
EMENTA:
OBJETIVO GERAL:
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
AVALIAÇÃO
Para fins de avaliação serão realizadas duas provas escritas (AB1 e AB2), de onde será extraída uma
média final, que deverá ser igual ou superior a 7,0 (sete). É importante destacar que no processo ava-
liativo também será levado em consideração a assiduidade, bem como o envolvimento do estudante com
as atividades extras desenvolvidas pelos professores, através do tutor.
METODOLOGIA DE ENSINO
Visando a articulação das modalidades de ensino presencial e a distância, construímos duas estra-
tégias para a apreensão do conteúdo da disciplina.
Aulas presenciais: O curso consistirá em aulas expositivas e dialógicas, com ênfase na discussão de
textos, apresentação de relatos de leituras feitas pelos/as estudantes e exposições de seminários sobre
a bibliografia trabalhada na disciplina.
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Métodos e Técnicas de Pesquisa
Entenda a Disciplina
Ao longo do Conteúdo da Disciplina você irá encontrar no livro ícones que irão orientá-lo nos estudos.
Conheça cada ícone:
Metas da aula – o que o aluno irá Exercício – indica uma atividade que
ver (pequeno resumo do conteúdo), está associada aos conteúdos estuda-
destacando os objetivos que o aluno dos, que irá conter questões objetivas
deverá alcançar ao final do conteúdo; e subjetivas;
I Unidade:
A PESQUISA SOCIAL
Metas de aula
Nesta unidade o estudante revisará os principais fundamentos filosóficos que fundam a pes-
quisa social e aprofundará sua definição. Saberá como se constituem os saberes científicos,
tradicionais e o senso comum e aprenderá a diferenciar problema social de problemática
sociológica.
1. Introdução
Pensadores clássicos das Ciências Sociais como Auguste Comte, Emile Durkheim e Max Weber enfati-
zam em seus trabalhos que uma das grandes dificuldades de fazer uma análise científica dos fenômenos
sociais possui relação com o fato de estarmos completamente imersos nesses fenômenos. Vivemos em
sociedade e para conviver com as outras pessoas produzimos e reproduzimos ideias e conceitos, que
nos ajudam a compreender os pequenos e os grandes eventos que marcam a nossa existência. Porém, os
sentidos que construímos em nossa vida ordinária resultam da acumulação de um conhecimento prévio
sobre as coisas que nos cercam, um conhecimento apreendido através dos processos de socialização a
que todos nós somos submetidos, ao longo de nossas vidas. Raramente nos perguntamos de onde vieram
os nossos pensamentos, hábitos e costumes; quem os criou, ou por que muitas pessoas os reproduzem
sem maiores questionamentos. Acreditamos que estes são produtos de nossa vontade; agimos de uma
determinada forma e fazemos determinadas coisas, porque assim decidimos.
A pesquisa social nasceu do esforço de pensadores que não se conformavam com a ideia de que
nossas ações são simplesmente motivadas conscientemente (ou inconscientemente). Para estes, somos
produzidos pelas regras que regem a vida em sociedade. Ao fazer essa afirmação, eles inauguraram uma
nova forma de enxergar os indivíduos, que agora seriam analisados mais como “produzidos” do que
“produtores” de suas vidas. Porém, seria necessário demonstrar, empiricamente, em que medida somos
de fato coagidos pelas regras da vida social. Foi a partir dessa inquietação que Comte, inicialmente, e
posteriormente Durkheim, construíram suas teorias e metodologias, visando a confirmação de suas hi-
póteses sobre a gênese da vida social. Surgia, dessa forma, a ciência social, e mais especificamente, a
sociologia, a ciência que deu um duro golpe no sujeito, retirando-o de sua zona de conforto.
Para conquistar o status de ciência legítima e, consequentemente, o reconhecimento da comuni-
dade científica, a Sociologia, em um primeiro momento, precisou extrair seu modelo explicativo das
chamadas ciências naturais, que até o início do século XIX era o único modelo considerado válido. A
objetividade do conhecimento na pesquisa social só se concretizaria afastando qualquer resquício de
subjetividade que pudesse atrapalhar o resultado do trabalho. No livro As regras do método sociológico,
Emile Durkheim apresenta aquelas que seriam os corolários decisivos para uma compreensão cientifica
dos fatos sociais. São eles: afastar as prenoções, tratar os fatos sociais como coisas, bem como analisar
os fatos sociais a partir de suas características exteriores.
É importante destacar que esse modelo metodológico, pautado naquele das ciências naturais, não é
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Pesquisa educacional
consenso entre todos os cientistas sociais do final do século XIX. Na Alemanha, por exemplo, berço do
romantismo e do idealismo, viu-se florescer uma perspectiva metodológica que voltava sua atenção para
as ações subjetivas, ou melhor, para os sentidos que os indivíduos investem em suas ações. Como repre-
sentantes desse posicionamento teórico-metodológico podemos destacar os nomes de Wilhelm Dilthey,
Georg Simmel e Max Weber; críticos ferrenhos do positivismo de conotação francesa, todos defendiam
que os processos qualitativos também deveriam ser objeto de estudo da sociologia geral.
Sem mais delongas, uma vez que vocês já tiveram acesso a essa discussão teórica em cursos ante-
riores (Metodologia das Ciências Sociais, Sociologia I e Sociologia II), apresentaremos, de maneira deta-
lhada e direcionada, a concepção de pesquisa social.
2. A pesquisa social
Como enfatizamos anteriormente, nossos pensamentos, hábitos e costumes são definidos pelo grupo
social onde vivemos e atuamos. Você já deve ter percebido, ao longo das disciplinas de teorias clássicas
e contemporânea, o quanto somos resultado de construções sociais e culturais. São essas construções e
os problemas relacionados a elas que tomamos como objeto de pesquisa nas Ciências Sociais.
Dessa forma, chamamos de pesquisa social as investigações científicas, cujo objeto de análise está
relacionado à realidade social em um dado espaço e tempo histórico.
Um caminho interessante para entender melhor a importância das pesquisas, no âmbito das ciên-
cias sociais, é a partir de uma diferenciação entre aquilo que denominamos de “senso comum”, “saber
científico” e “saber tradicional”.
A título de exemplificação, podemos trazer um tema recente que tem despertado fortes discussões
em todo o país, trata-se da proposta de redução da maioridade penal que tramita no congresso nacional.
Não pretendemos entrar no mérito do conteúdo da proposta, vamos nos deter apenas na maneira como
a mesma é interpretada através de dois pontos de vista: a saber, o ponto de vista do senso comum e o
ponto de vista do investigador social.
Como também já foi apontado no início do texto, construímos sentidos sobre tudo que nos cerca,
porém, raramente nos perguntamos “o por que?” de as coisas se apresentarem a nós de uma determinada
maneira. Assim, vamos produzindo reflexões apressadas e conclusivas sobre questões que, do ponto de
vista das ciências sociais, são extremamente complexas. Em nosso país, mas não somente nele, há uma
crença exagerada e difundida de que a punição é o melhor caminho para a promoção de uma cultura de
paz. Parte-se do argumento que o problema da violência urbana é resultado de uma ineficácia no sistema
penal, que também é reconhecido por ser “conivente com a ação de criminosos”, no caso em questão,
criminosos adolescentes. Estes, do ponto de vista do senso comum, delinquem, porque não há uma
punição severa, já que estes são amparados pelo ECA (Estatuto da criança e do adolescente). Paralelo
a essa argumentação surge outra, que culpabiliza os direitos humanos, ou melhor, as instituições e os
representantes oficiais desses direitos, como os agentes responsáveis pela impunidade no país, pois, os
mesmos investiriam seus esforços para libertar infratores, principalmente jovens.
O modo de pensar do senso comum tem, como referência, valores, ideias e concepções de mundo,
que os indivíduos consideram adequados. Pierre Bourdieu o define como doxa, ou seja, aquilo sobre o
que todos os agentes estão de acordo. “A doxa contempla tudo aquilo que é admitido como ‘sendo assim
mesmo’: os sistemas de classificação, o que é interessante ou não, o que é demandado ou não” (BOUR-
DIEU, 1984, p. 82). O conceito de doxa também substitui a concepção marxista que relaciona “ideologia”
à “falsa consciência”. Existiria sob a ótica deste uma representação falseadora da realidade, que faz com
que os indivíduos percam de vista os processos materiais definidores da existência social. Para Bourdieu
a doxa resulta da própria condição de “estarmos situados” em um campo social, e todo campo social
produz uma doxa, ou seja, nomos, leis gerais que o governa.
10 Licenciatura em Ciências Sociais
Livro Conteúdo
Voltando ao nosso exemplo, diferente do senso comum, que discorre sobre os mais diversos fenôme-
nos de maneira espontânea e sem uma reflexão mais apurada, o saber científico é construído a partir da
utilização de teorias, conceitos e uma metodologia científica adequada à leitura do fenômeno estudado.
No que diz respeito ao tema da redução da maioridade penal, o cientista social só emitirá seu parecer
sobre a questão depois de coletar dados que lhe permita refletir sobre a eficácia ou ineficácia da lei.
Buscará pistas através de estatísticas sobre a diminuição do índice de violência urbana em diferentes
contextos sociais onde tal lei foi aplicada, analisará as distintas realidades socioeconômicas, como tam-
bém o perfil dos jovens envolvidos em atos delituosos, investigará os elementos culturais, políticos e
históricos que ajudaram a fomentar um discurso a favor da redução da maioridade penal, etc. As análises
também vão depender do recorte do objeto, do grupo a ser pesquisado, da influência teórica e metodo-
lógica do pesquisador, entre outras coisas (mais adiante voltaremos a esses elementos). Por enquanto,
nosso objetivo é mostrar as diferenças entre o ponto de vista do senso comum e o ponto de vista do
pesquisador social.
A discussão fica ainda mais complexa quando os chamados “saberes tradicionais” entram em jogo.
Diferente do senso comum, os saberes tradicionais podem ser definidos como um tipo de conhecimento
que é produzido coletivamente e cujas ideias são transmitidas intergeracionalmente, mediante a circu-
lação de discursos e práticas. São os saberes das comunidades indígenas e de outras comunidades locais
como quilombolas e populações ribeirinhas; saberes que marcam o pertencimento dos indivíduos a de-
terminados grupos, mas que também apresentam uma maneira diferenciada de produzir conhecimento
sobre os mais diferentes fenômenos, estejam estes no plano da natureza ou da cultura.
Por muito tempo, os saberes tradicionais foram rechaçados pelo discurso científico hegemônico,
sendo equiparado ao senso comum. Ambos, diziam os cientistas mais impetuosos do século XIX, pa-
deciam do mesmo germe da ignorância, que deveria ser eliminado por intermédio de procedimentos
analíticos rigorosos. Atualmente, os saberes tradicionais gozam de um status privilegiado, pois são
valorizados enquanto patrimônio cultural de um povo, como também por oferecer explicações que, sob
alguns aspectos, equiparam-se às descobertas científicas. Foi a própria ciência antropológica que bus-
cou, de maneira mais intensa, romper com essa visão ocidentalizante de que o saber científico é superior
ao saber tradicional, mostrando que a diferença não está na lógica que organiza seus pressupostos e
sim nas diferentes formas do conhecer empreendidas por ambos. Podemos destacar os nomes de Evans
Pritchard e Claude Lévi-Strauss como pesquisadores que se empenharam em produzir análises, visando
a construção de pontes entre essas diferentes formas de saber.
Em seu clássico “Bruxaria, Magia e Oráculo entre os Azande”, Evans-Pritchard volta sua atenção
para o papel exercido pela bruxaria em uma sociedade africana, mas não apenas, ele também nos faz re-
fletir como as respostas dadas pelos Azande para a solução dos mais diversos problemas que os acometia
formavam um sistema racional de explicação daquela realidade. Claude Lévi-Strauss por sua vez, no livro
“O Pensamento Selvagem”, mostra que o saber tradicional e o pensamento científico repousam sobre
a mesma lógica, e que a diferença está nas estratégias desenvolvidas para extração de conhecimento
sobre o mundo. Enquanto o conhecimento tradicional opera com uma lógica perceptiva (cheiros, cores,
sabores, etc.), o conhecimento científico funciona a partir de uma lógica conceitual.
O fato de esses pensadores perceberem ambos como semelhantes, no que diz respeito à produção
de sistemas lógicos, com o objetivo de dar respostas para situações vivenciadas por diferentes grupos,
não implica dizer que esses sistemas são iguais, em relação às respostas obtidas. A antropóloga Manuela
Carneiro da Cunha afirma que essa diferença não compreende apenas os resultados que ambos podem
fornecer, por exemplo, o pensamento científico pode nos ajudar a fabricar aeronaves que nos levam a
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Métodos e Técnicas de Pesquisa
qualquer parte do mundo, enquanto o pensamento tradicional nos permite identificar determinadas
ervas que atuam na promoção do bem estar dos seres humanos. Ela chama a atenção para uma diferença
mais profunda e que compreende um embate universal x local. O conhecimento científico se afirma como
uma verdade per si, até o momento que outro paradigma venha sobrepujá-lo, ou seja, há uma pretensão
à universalidade. Já o conhecimento tradicional permite uma maior flexibilização dos seus argumentos,
reconhecendo o seu limite de alcance. A benzedeira, por exemplo, não submete a sua prática a uma
série de experimentos com o intuito de comprovar universalmente a sua eficácia, esta é garantida pelas
respostas positivas dos próprios enfermos. Ela não pretende demonstrar que o seu saber possui validade
universal, tal como um representante da ciência médica.
Atualmente, vemos experiências interessantes no Brasil que demonstram a aproximação entre co-
nhecimento científico e conhecimento tradicional, como a inclusão da prática da medicina popular no
Programa da Saúde da Família, do Ministério da Saúde, em alguns estados do país. Apesar de esta figurar
como parte do que se entende como saberes não formalizados, podemos entender essa inclusão como um
passo importante para o reconhecimento de saberes ditos não-científicos.
Esperamos que com essa breve exposição, vocês consigam classificar as diferentes formas de conhe-
cimento, mostrando em que medida elas se distanciam ou se aproximam. No próximo tópico, discutire-
mos uma questão muito importante para todo aquele que pretende se aventurar no campo da pesquisa
social, a saber, o que diferencia um problema social de uma problemática sociológica.
4. Do problema à problemática
Um dos grandes problemas enfrentados por muitos estudantes que adentram um curso de Ciências
Sociais compreende uma dificuldade de definir o que é um problema sociológico. Muitos entendem que
problema sociológico é a mesma coisa que problema social, logo, as ciências sociais, e principalmente
a sociologia teria como objetivo a resolução dos problemas produzidos em sociedade. Certamente, essa
ideia não é tão absurda quanto parece, basta conhecermos um pouco dos textos de Auguste Comte e
Karl Marx para vermos que, além de produzir conhecimento, a ciência da sociedade deveria transformar a
vida das pessoas, e para melhor. Em Comte, a ciência positiva seria fundamental para que a humanidade
pudesse dar seu passo rumo ao progresso decisivo. Já para Marx, a ciência deveria construir ferramentas
que permitissem a homens e mulheres romperem com as amarras responsáveis pela produção da servidão
de ordem material. “Não basta conhecer o mundo, é preciso transformá-lo”, dizia o pensador alemão.
Sem dúvidas, o pensamento marxista foi um dos grandes responsáveis pela construção do pensamento
crítico e intervencionista das Ciências Sociais.
A questão que trazemos para vocês pensarem é a seguinte: todo problema social é potencialmente
um problema sociológico, porém nem todo problema sociológico é, necessariamente, um problema so-
cial. Vamos por partes.
Quando afirmamos que todo problema social é potencialmente um problema sociológico, fazemo-lo
no sentido de esclarecer que o fenômeno em questão só se torna sociológico, quando lançamos um
olhar reflexivo sobre o mesmo. Exemplo: pensemos no fenômeno da violência urbana, especificamente,
o envolvimento de jovens com o tráfico de drogas. É consenso entre os diferentes segmentos da so-
ciedade, que esse é um problema que traz consequências nefastas à vida dos envolvidos. Os meios de
comunicação (TV, jornal, e internet) a todo instante apresentam casos de assassinatos de jovens; sejam
por disputas de território ou em decorrência do que se convencionou chamar de “acerto de contas”,
que compreende as mortes decorrentes da cobrança de uma dívida com traficantes. Cotidianamente
expomos nossa opinião sobre qual seria a solução para o problema, culpamos os jovens, as famílias, os
traficantes, a polícia, mas não possuímos uma reflexão mais apurada sobre as motivações que fazem os
jovens a adentrarem nessa rede criminosa. Quando fazemos uma pergunta dessa natureza, já estamos
12 Licenciatura em Ciências Sociais
Livro Conteúdo
dando os primeiros passos para a passagem de algo que se configura como um problema social, para uma
problemática sociológica. Obviamente que isso não é suficiente. Após fazermos a pergunta, buscamos
reunir pistas sobre o grupo que pretendemos estudar, a localidade onde este se encontra, as técnicas de
pesquisa que deverão ser utilizadas para coleta dos dados e, claro, as ferramentas teórico-conceituais
que guiarão nosso olhar durante a pesquisa. Enquanto não investigarmos o fenômeno, tratando-o como
um objeto a ser estudado, ele não passará de um problema social.
É importante destacar que, muitas vezes, nossas pesquisas são guiadas por uma espécie de compro-
misso com as populações consideradas vulneráveis e aquelas que são vítimas de diferentes formas de
injustiça. Não existe nenhum problema em ser guiado subjetivamente por um senso de compaixão ou
indignação provocado por um determinado problema social, isto só pode ser considerado prejudicial - do
ponto de vista da pesquisa sociológica, obviamente – caso o pesquisador faça dessa militância o propó-
sito da pesquisa, informando que a finalidade do seu empreendimento intelectual é resolver o problema
de um determinado segmento da população, pois saímos dessa ciência e entramos em outro campo, a
saber, o da política.
Quando, por sua vez, dizemos que nem todo problema sociológico é necessariamente um problema
social, estamos explicitando que nem todo fenômeno estudado pelas ciências sociais compreende um
problema que aflige um grupo social, ou a sociedade mais abrangente. São esses fenômenos que apresen-
tam maiores armadilhas no exercício da pesquisa, uma vez que, geralmente, são percebidos como “menos
importantes”, logo destituídos de complexidade. Exemplo: um estudo que se propõe a fazer uma etno-
grafia dos relacionamentos afetivo-amorosos em festas de forró eletrônico em uma capital do nordeste.
Se perguntássemos a uma turma do primeiro período (e não apenas) de um curso de Ciências Sociais
qual pesquisa eles consideram mais importante, o envolvimento de jovens com o tráfico de drogas ou os
relacionamentos afetivo-amorosos em festas de forró eletrônico? Penso que a primeira opção receberia o
maior número de votos. Porém, do ponto de vista sócio-antropológico, ambas possuem o mesmo valor,
ou seja, elas são importantes por constituírem fenômenos a serem estudados. Assim como a pesquisa
descrita anteriormente, a etnografia dos relacionamentos amorosos poderia nos dizer muita coisa sobre
a relação entre homens e mulheres no interior dessas festas, sobre a relação entre homossexualidade e
heterossexualidade, sobre a produção da indústria de entretenimento para o público jovem, sobre a re-
lação entre estilo de vida e classe social, entre outras coisas. Para que essas questões possam vir à tona,
faz-se necessário romper com preconceitos em relação a determinados objetos de estudo.
Com esse tópico, esperamos ter esclarecido que nas Ciências Sociais não existe uma escala que
define os fenômenos “mais” ou “menos importantes”, todos devem receber o mesmo valor a partir do
momento que uma observação aguça as ideias do pesquisador, levando-o a formular um problema de
pesquisa.
Na próxima unidade discutiremos questões mais pontuais em relação aos métodos e técnicas de
pesquisa utilizados pelos cientistas sociais, para a apreensão da realidade.
Atenção
É importante esclarecer que a discussão em torno da relação entre saberes científicos e sa-
beres tradicionais foi iniciada pela Antropologia. A crítica ao evolucionismo e a constatação
que os povos se diferem culturalmente, iniciada por Franz Boas, ainda no limiar do século XX,
foram decisivas para o entendimento de que as diferenças entre os ocidentais e os não-oci-
dentais possuem relação com a maneira como ambos estruturam o pensamento. O contato
com povos tradicionais, de continentes distantes da Europa, fez com que antropólogos ti-
vessem a oportunidade de conhecer a organização social e o sistema simbólico destes. Logo
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Métodos e Técnicas de Pesquisa
entenderam que não se tratava de diferenças culturais, mas também de lógicas na produção
do conhecimento.
Leia mais
Para uma melhor compreensão sobre a pesquisa social, discussões sobre saber
científico versus senso comum, bem como as dificuldades enfrentadas pelo
cientista social, leiam o livro “O ofício do sociólogo” de Pierre Bourdieu, Je-
an-Claude Chamboredon e Jean-Claude Passeron.
Exercício
2. Procure exemplos de saberes tradicionais na região onde mora e mostre em que medida
eles podem dialogar com os saberes científicos.
Referências
QUINTANEIRO, Tânia; BARBOSA, Maria Lígia de O.; OLIVEIRA, Márcia Gardênia. Um toque de
clássicos: Durkheim, Marx e Weber. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1995.
II Unidade:
– TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO
NA PESQUISA SOCIAL –
PESQUISA QUANTITATIVA E
QUALITATIVA
Metas de aula
A origem das Ciências Sociais está profundamente marcada pelo embate entre objetividade versus
subjetividade. De viés marcadamente positivista, a Sociologia surge no final do século XIX, na França,
com uma proposta de investigação semelhante à das ciências naturais. A crítica ao modelo especulativo
comum a grande parte dos filósofos, de Platão a Descartes, era a principal argumentação dos defenso-
res de uma ciência que pudesse explicar os fenômenos sociais, da mesma forma que um físico explica
a combustão, ou um astrônomo explica o movimento dos astros. Como já foi apresentado na primeira
unidade, Auguste Comte foi o primeiro pensador a defender essa proposta, mas foi com Émile Durkheim,
que a Sociologia ganhou método de pesquisa que permitia analisar os fatos sociais como “coisa”, ou
seja, algo cuja propriedade pode ser observada, medida e quantificada. Nas palavras do próprio autor é
“tudo aquilo que o espírito não pode chegar a compreender, a menos que saia de si mesmo, por meio de
observações e experimentações” (2007, XVII).
Publicado em 1895, As Regras do método sociológico foi o primeiro livro a apresentar a sistema-
tização de um conjunto de ideias em um método que permitiria aos cientistas sociais, traçar relações
de causa e efeito, produzir regularidades, visando a descobertas de leis, bem como construir regras de
ação para o futuro. Vocês já devem conhecer as regras relativas à observação dos fatos sociais, mas não
custa nada relembrar, são elas: afastar sistematicamente todas as prenoções, tratar os fatos sociais como
coisas; definir previamente os fenômenos que devem ser tratados a partir dos caracteres exteriores que
lhes são comuns e considerá-los independentemente de suas manifestações individuais.
Porém, faltava ainda um teste definitivo, onde essas “regras” pudessem ser testadas, a partir de
um fenômeno empiricamente observável. Foi então que em 1987, Durkheim publicou “O Suicídio”, estu-
do cuja proposta seria analisar, sociologicamente, um fenômeno que sempre foi tratado como subjetivo,
apontando, dessa maneira, as determinações sociais responsáveis pelas motivações dos seres humanos
em atentarem contra sua própria vida. Valendo-se de dados estatísticos extraídos de documentos judi-
ciários, o autor elencou algumas variáveis que ajudaram a traçar um perfil do suicida: mais homens do
que mulheres, mais ricos do que pobres, mais solteiros e divorciados do que casados, etc. Sem querer
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Métodos e Técnicas de Pesquisa
retomar toda a discussão a respeito das causas sociais responsáveis pela produção do fenômeno e os
tipos de suicídio apontado pelo autor, pois a discussão já foi feita em disciplinas anteriores, queremos
mostrar como o trabalho de Durkheim influenciou, de maneira decisiva, no desenvolvimento de aborda-
gens quantitativas, no campo das ciências sociais.
Paralelo ao avanço de uma ciência social de viés mais normativo e quantitativo, florescia, na
Alemanha, um movimento que buscava a todo custo afastar a ciência social do domínio das ciências na-
turais, mostrando que a chave para a compreensão dos fenômenos estava na compreensão dos sentidos.
Um dos grandes representantes e críticos da razão positivista foi Wilhelm Dilthey, que contrapôs a esta,
a razão histórica. Compreender um fenômeno social para esse pensador é recuperar o sentido que está
intrinsecamente ligado a uma temporalidade e a um ponto de vista. Na sociologia, o grande represen-
tante do paradigma da compreensão, sem dúvida, foi Max Weber. Influenciado por filósofos como Marx e
Nietzsche, o sociólogo alemão escreveu seu nome entre os chamados clássicos da disciplina. Diferente de
Durkheim que possuía como objeto privilegiado de suas investigações o fato social e que fazia uso de um
método com características positivistas, Weber voltava seu olhar para a ação social, buscando traduzí-la
a partir de um método interpretativista. A subjetividade era o elemento primordial das análises do au-
tor, e, para compreendê-la, fazia-se necessário um mergulho nas significações sociais que esta trazia. É
importante ter clareza sobre o conceito de subjetividade abraçado pelo autor, que difere das concepções
usuais centradas numa razão a-histórica ou na ideia de interioridade (inconsciente) que habita todos os
seres humanos. Em Weber, a subjetividade é historicizada, possui espacialidade e temporalidade, e pode
ser expressada através de valores e ideais definidores de uma conduta.
Engana-se quem percebe o autor como um opositor da objetividade do conhecimento, pelo con-
trário, esta era fundamental em seu projeto de ciência. Em um dos seus famosos textos cujo título em
português é “A objetividade do conhecimento na ciência social e na ciência política” (1904-[2001]),
vemos a preocupação do autor em apresentar uma distinção entre “julgar” e “conhecer”. A subjetividade,
que sob a ótica positivista, é essa dimensão que pode levar o cientista a perder o foco de suas análises,
é incorporada ao trabalho de Weber como elemento cujo pesquisador precisa encarar, pois ela está no
cerne do processo de investigação científica. Quando investigamos um tema, somos inspirados por nos-
sos valores e ideais, porém devemos ter clareza para saber discernir o que é julgamento de valor e saber
empírico. Não podemos confundir o trabalho de investigação com atividade política, esta produzida pelo
homem de vontade e de ação, não pode vir disfarçada de ciência social. O saber empírico busca construir
suas respostas a partir dos meios e dos métodos considerados adequados e não tem como objetivo a
construção de modelos e normas, que deverão guiar as ações, ele não nos convida a pensar sobre o que
deve ser feito e sim, sobre o que pode ser feito. Contrariando a posição que sugere o descarte dos valores
da investigação científica, Weber incorpora estes à pesquisa, sob o argumento de que eles nos orientam
nas escolhas de nossos temas, porém deixa claro que devemos controlá-los mediante a procedimentos
rigorosos de análise. Funciona de maneira simples: escolhemos nossos temas de pesquisa, produzimos
hipóteses e fazemos conexões lógicas, mas, para que estas não sejam apenas especulações, devemos sub-
metê-las ao crivo dos canônes científicos. Observem, na perspectiva weberiana é o próprio pesquisador
que se apropria de um aspecto da realidade e traça relações de causalidade entre certos fenômenos, pro-
duzindo o tipo ideal, ou seja, uma espécie de recorte da realidade formada a partir de elementos histori-
camente agrupados. Esse trabalho é bem diferente daquele desenvolvido pelo cientista da natureza, que
tem como objetivo o conhecimento das leis que se sobrepõe ao fenômeno. Em uma versão sociológica,
podemos nos referir ao trabalho de Durkheim e sua árdua tarefa de encontrar os determinantes sociais.
Após essa breve explanação sobre as duas tradições sociológicas que fundamentaram as perspec-
tivas quantitavistas e qualitativistas, apresentaremos, conforme exposto nos objetivos, algumas técni-
cas de investigação utilizadas pelos cientistas sociais para a apreensão dos dados empíricos. Para essa
unidade fizemos opção pela pesquisa quantitativa.
16 Licenciatura em Ciências Sociais
Livro Conteúdo
A pesquisa quantitativa em Sociologia é aquela que se vale de dados estatísticos e de amostras re-
presentativas da população, visando a construção de um quadro explicativo para análises posteriores. Os
dados podem ser coletados pelo próprio pesquisador, ou por instituições públicas ou privadas, através
de questionários que são chamados de surveys, e que, por sua vez, são armazenados em planilhas ele-
trônicas. A pesquisa do tipo survey é a mais utilizada pelos cientistas sociais, pois permite a obtenção
de dados sobre características da população pesquisada, por meio de um questionário. Como o objetivo é
coletar dados que possam ser tabulados e transformados em índices, o questionário, nesse caso, é defi-
nido como fechado, ou seja, as perguntas exigem respostas objetivas. Exemplo: idade, cor, renda mensal,
escolaridade, etc. É importante destacar que há também os questionários conhecidos como “abertos”;
eles permitem que o entrevistado desenvolva a questão a partir do seu ponto de vista, e os semi-abertos,
que mesclam os dois tipos.
De acordo com Freitas (2000), a survey é apropriada como método de pesquisa quando se dese-
ja responder questões mais objetivas sobre o fenômeno estudado. Collares (2013) indica que uma das
justificativas mais utilizadas para o uso desse método possui relação com a “maleabilidade que estas
proporcionam ao pesquisador, para responder as questões sociológicas e realizar inferências causais nas
ciências humanas, ao utilizar um grande número de casos.” (p.111). Mas mesmo em situações como essa,
os resultados obtidos não podem simplesmente ser apresentados sem uma reflexão mais apurada. Os
dados funcionam como indicadores e não como decalque fiel da realidade; eles não falam por si. Atual-
mente possuímos softwares hiper sofisticados que permitem, dentre outras coisas, o teste de hipóteses
a partir de equações. É incontestável que o uso dessa tecnologia revolucionou, de maneira profunda, o
trabalho do cientista social, que foi simplificado em virtude da rapidez que obtém os dados. Ele pode
trabalhar com amostras maiores da população, com um maior número de variáveis, combinar dados
buscando a produção de padrões sociais, e tudo isso sem ter que se preocupar em fazer equações, uma
vez que é o próprio software que faz o serviço. Mas há também aspectos negativos que precisam ser sa-
lientados. A “matematização” do mundo, ou seja, o uso abusivo dessas ferramentas faz com que muitas
vezes esqueçamos do raciocínio sociológico. Outro fator negativo produzido pelo uso indiscriminado de
modelos estatísticos, é a possibilidade de perder de vista as relações que os cálculos estão apresentando.
Outro tipo de técnica da pesquisa quantitativa é o experimento controlado, que é mais utilizado
em pesquisas no campo das ciências naturais, mas também tem sido utilizada no campo das ciências
sociais aplicadas. Alguns cientistas sociais ao redor do mundo acreditam que este tipo de experimento
é a maneira mais segura de obter relações causais, uma vez que você tem a possibilidade de analisar
dois grupos, um grupo experimental e um grupo de controle. Um dos grupos é submetido a um ou mais
valores de uma condição variável qualquer, já o outro grupo será submetido às mesmas condições, po-
rém, não possuirá a condição variável, desse modo, o pesquisador terá a possibilidade de comparar os
dois grupos buscando perceber as diferentes maneiras de reação, no que diz respeito a presença ou não
dessa variável. Apesar de haver aqueles que defendem esse tipo de técnica, é inegável que experimen-
tos controlados nas ciências sociais são bastante complicados, pois há impasses éticos que precisam ser
discutidos.
Após essa sucinta apresentação sobre algumas técnicas da pesquisa quantitativa, apresentaremos
também, de maneira breve, algumas técnicas implementadas pela pesquisa de cunho qualitativo, são
elas: a etnografia, a história de vida.
17
Métodos e Técnicas de Pesquisa
3.2.1 Biografia
Trata-se da narrativa de uma vida pessoal, feita por outrem, a partir de documentos, hipóteses e
orientação teórica. É uma prática que remete à antiguidade, especificamente à civilização grega, mas
que ganha status de pesquisa somente no início do século XX, com os trabalhos de pesquisadores ligados
a Escola de Chicago.
3.2.2 Autobiografia
É uma história de vida escrita pela própria pessoa sobre si mesma, mas que também pode ser re-
gistrada por outrem, a partir do que foi exposto pelo narrador. O autor, no caso, aquele que narra, tem
voz privilegiada, pois é ele que seleciona os fatos, os acontecimentos, as contingências que marcaram
sua trajetória.
3.2.3 Etnobiografia
Nessa perspectiva, o discurso narrado pelo sujeito constitui uma versão primeira da realidade. Esta
deverá se juntar a análises de documentos e outras informações sobre a realidade sóciohistórica, ao qual
o mesmo está inserido. De acordo com Chizzoti (2006) a pesquisa etnobiográfica não visa apenas a sua-
vização da voz do narrador e de seus elementos subjetivos, mas principalmente assegurar a objetividade
do relato, mostrando como se dá a vinculação desse sujeito com a sociedade, através dos fatos relatados.
19
Métodos e Técnicas de Pesquisa
Atenção
Apesar das técnicas de pesquisa quantitativa e qualitativa serem diferentes no que diz res-
peito as diferentes matérias primas coletadas, isso não significa dizer que elas não possam
ser combinadas, pelo contrário, elas podem e devem ser articuladas. Não é nenhuma novida-
de a junção de técnicas, pois muitos pesquisadores entendem que a junção permite resulta-
dos mais satisfatórios.
Leia mais
Para examinar
Exercício
1. Escolha um fenômeno social aleatoriamente e indique uma ou mais técnicas para analisá
-lo, fundamentando os motivos de sua escolha.
Referências
BERTAUX, Daniel. Les récits de vie. Paris: Nathan; Coll. 128, 1997.
CAIAFA, J. “A pesquisa etnográfica” in: Aventura das cidades. Rio de Janeiro: Editora FGV,
2007.
FREITAS, H. O método da pesquisa survey. In: Revista de Administração, São Paulo, v.35,
n°3, p. 105-112, Jul/Set, 2000.
MAGNANI, J.G.C. De perto e de dentro: notas para uma etnografia urbana. In: RBCS, vol.
17, n. 49. São Paulo: jun. 2002.
MALINOWSKI, Bronislaw. Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Abril Cultural, 1976
[1922].
21
Métodos e Técnicas de Pesquisa
III Unidade:
ANÁLISE DE CONTEÚDO,
ANÁLISE DE NARRATIVA E
ANÁLISE DE DISCURSO.
Metas de aula
Priorizamos, nessa unidade, as distintas formas de análise das produções orais e textuais, por
entendermos que elas formam um capítulo à parte da pesquisa qualitativa. O estudante co-
nhecerá seus usos e especificidades, como também aprenderá sobre a importância do estudo
de caso nas Ciências Sociais.
Os sentidos expressados pelas formas de comunicação oral e escrita podem ser definidos
como a matéria prima do cientista social que faz opção pela metodologia qualitativa. Aná-
lise de conteúdo, análise de narrativa e análise de discurso são formas de interpretação do
texto, que variam no que diz respeito às distintas orientações filosóficas, que vão das teorias
linguísticas, passando pela hermenêutica, estruturalismo e pós-estruturalismo. Analisadas
superficialmente, essas formas de interpretação podem ser percebidas como semelhantes,
já que elas possuem como foco a matéria prima, porém há especificidades importantes que
precisam ser salientadas, e é isso que veremos a seguir.
1. Análise de conteúdo
Trata-se de uma ferramenta metodológica para analisar conteúdos de um texto sob uma perspectiva
quantificável. Bernard Berelson, um dos seus divulgadores, afirma que se trata de um esforço de supe-
ração das análises subjetivas, oferecendo uma descrição objetiva e sistemática do conteúdo textual. O
texto possui sentidos e significados ocultos que devem ser decodificados pelo pesquisador e ele deverá
fazer isso “a partir de uma extração dos significados temáticos ou os significantes lexicais, por meio dos
elementos mais simples de um texto” (CHIZZOTI, 2006, p. 14). O pesquisador deverá fazer uma decodi-
ficação da mensagem a partir das unidades mais simples, que podem ser palavras, termos ou frases, que
possuem certa recorrência.
Essas técnicas de decomposição do textos a partir de unidades simples teve início nos EUA, nos
anos 1920. O objetivo era encontrar, nos meios de comunicação, especialmente nas mensagens jornalís-
ticas, no discurso publicitário e na literatura, referências ao conteúdo político e militar. Alguns pesqui-
sadores da Escola de Chicago fizeram uso dessa ferramenta para a interpretação de documentos, como
atesta o trabalho sobre imigração de Thomas e Zananiecki. Para esse trabalho, foram analisadas cartas
pessoais, arquivos paroquiais, relatórios de tribunais, etc.). A decomposição de mensagens com intuito
de encontrar significados políticos e militares também foi utilizado na Alemanha e Inglaterra, entre
1939 e 1945 (JANEIRA, 1972). Além de significantes textuais, a análise de conteúdo também é utilizada
para a pesquisa com imagens, como por exemplo, análise de filmes e capas de revista.
2. Análise de narrativa
Compreende a história que é contada em uma linguagem aberta; um conjunto de fatos e aconteci-
mentos reais ou imaginários mais ou menos encadeados por intermédio de palavras e imagens. Segundo
Chizzotti (2013) a análise compreende duas orientações fundamentais: uma que é derivada do formalis-
mo estruturalista (Jakobson e Bakhtin), que sugere uma coerência textual a partir de códigos, sintaxes
e formas, e outra, de tradição hermenêutica, que se volta para a narrativa das experiências vividas em
sociedade, mediada por interações. Um exemplo importante vem do trabalho do folclorista russo Vladi-
mir Propp, que procurou analisar a coerência textual e os elementos formais presentes nas narrativas
de contos de fadas russos. Ele elaborou um conjunto de princípios básicos que permitia uma leitura
universalizante desses contos. Propp percebeu uma estrutura semelhante entre diversos contos de povos
distantes geográfica e culturalmente, logo ele chegou à afirmação que havia um modelo estrutural, que
sustentava esse tipo de produção. O conto passa a ser analisado a partir de uma única narrativa (forma)
que é preenchida por diferentes personagens em diferentes situações. Para entendermos a perspectiva
desenvolvida por Propp, pensemos nos contos infantis dos irmãos Grimm como Cinderela, Branca de
neve, a bela adormecida e Rapunzel. Apesar de possuírem diferentes enredos e personagens, a narrativa
parte de uma mesma estrutura, ou seja, a função dos personagens se repetem: a jovem sofredora que é
resgatada pelo príncipe encantado.
Já do ponto de vista dos etnometodólogos, as narrativas são conversações situadas e contextuali-
zadas. As unidades de análises são extraídas do contexto em que são ditas Chizzotti (Ibid.). A sociologia
americana do início do século XX foi diretamente influenciada por essa abordagem. Pensadores como
Herbert Blumer, George Mead e Erving Goffman destacaram, em suas análises, que as narrativas devem
ser compreendidas a partir dos sentidos construídos nas interações face-a-face. Os indivíduos possuem
uma espécie de mascara social, que eles utilizam para cada situação. No cotidiano, assumimos diferentes
“fachadas”, visando uma harmonização das relações sociais, logo, para entender como se constitui uma
narrativa devemos compreender em que situação ela foi/está sendo produzida.
3. Análise do discurso
23
Métodos e Técnicas de Pesquisa
peito à criação de um conceito de poder, que confronta aquele desenvolvido pelo pensamento político
clássico, e que percebe o mesmo materializado em uma instituição, no caso, o Estado. Para Foucault,
o poder não é uma propriedade, um atributo que pode ser passado de pai para filho (o príncipe que se
torna rei) e nem possui uma localização fixa, ele é uma relação social, e como toda relação, produzida
historicamente. Inspirado pelo livro Genealogia da moral, do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, que
empreende um mergulho profundo nas origens dos princípios morais que regem o ocidente, Foucault se
pergunta, assim como Nietzsche, quais as origens dos saberes científicos que visam, dentre as coisas, a
produção de verdades sobre tudo que se move? A preocupação do pensador, nesse momento, recaía sobre
os discursos científicos que produziram uma concepção clínica da loucura. Para isso ele se volta para o
século XVII, quando foram constituídas as primeiras formas de tratamento médico-científico para essa
condição, que até então não era medicina, encabeçada percebida como patológica. A pela Psiquiatria,
ao criar as condições que permitiam o diagnóstico, inventaram, dessa forma, uma concepção de loucura
que até então não existia. Assim, a análise genealógica serviu para identificar as condições históricas
que fizeram emergir um determinado discurso, e como esse discurso passou a ser visto como superior
aos demais.
Assim, vemos se desenhar uma concepção de discurso que se distancia daquela puramente lin-
guística ou semântica, ele resulta de embates políticos em contextos sociais e históricos e específicos.
O discurso produz saberes e esses saberes funcionam como dispositivos de poder que visam a produção
de diferentes formas de sujeição. Os discursos fundam instituições e estas os reproduzem. Escolas,
hospitais e prisões, não são apenas construções arquiteturais, são, antes de tudo, materializações dis-
cursivas. Uma formação discursiva opera em um registro binário, pois, ao mesmo tempo que possui uma
função includente, ou seja, identificar qual tipo de enunciado é legítimo, ele também possui uma fun-
ção excludente, pois desconsidera outros enunciados. Exemplo: a inadequação entre corpo e expressão
de gênero (que é subjetiva) entre indivíduos transgêneros é percebida como patológica para o discurso
psiquiátrico, logo, se funda um enunciado de que a normalidade passa por uma adequação entre essas
duas instâncias.
A perspectiva foulcaultiana pode dar excelentes contribuições em trabalhos de sociologia da
criminalidade, sociologia da saúde, sociologia do corpo e pesquisas no campo do gênero e sexualidade.
4. Análise Crítica
Assim como a proposta desenvolvida pela análise do discurso de matriz foucaultiana, os adeptos
da análise crítica se voltam para as formações discursivas que visam a produção de diferentes formas de
opressão, porém o direcionamento teórico advém da Teoria Crítica. Essa perspectiva teórica, fortemente
influenciada pelo marxismo, ganhou destaque a partir dos trabalhos desenvolvidos na década de 20 pela
Escola de Frankfurt, que reunia intelectuais como Theodor Adorno, Max Horkheimer, Herbert Marcuse,
entre outros. A ideia era apresentar uma alternativa crítica à chamada teoria tradicional, que na con-
cepção de Horkheimer, teve origem no pensamento de Descartes, e que postula um ideal de ciência como
sistema de dedutivo. A teoria crítica ultrapassaria o subjetivismo e o realismo presente nessa abordagem
a partir de uma análise que privilegia a práxis histórica.
Estendendo essa perspectiva ao estudo da Linguagem, Fairclough (2005), sugere que a língua
é um elemento integrante do processo social material, está se junta a imagens e linguagem corporal e
atua na produção de sentidos. Cada formação social possui uma semiose característica, e são essas sig-
nificações que produzem as instituições sociais e culturais. Desse modo, se o discurso resulta desse ma-
terialismo histórico, logo, essas instituições reproduzem elementos ideológicos que visam a manutenção
dessa estrutura socioeconômica que separa os possuidores e os destituídos dos meios de produção. Para
os frankfurtianos “a relação entre significante e significado, os rituais e discursos estão envoltos na
24 Licenciatura em Ciências Sociais
Livro Conteúdo
ideologia dominante, e moldam as práticas, os discursos e a própria realidade (CHIZZOTTI, Ibid., 127).
Assim, a tarefa da análise crítica do discurso é considerar a linguagem como um elemento conec-
tado a estrutura social e entender como esse discurso opera ideologicamente na produção, manutenção
e transformação das relações sociais de poder. Somente agindo dessa maneira será possível trazer à tona
os elementos obscurecidos pela ideologia dominante, colaborando para a construção de um pensamento
crítico.
Encerrada essa breve discussão sobre os três modelos de análise (Conteúdo, narrativa e discurso),
passaremos ao nosso último tópico da unidade, que apresenta alguns elementos sobre o estudo de caso.
5. Estudo de caso
Trata-se de uma estratégia de pesquisa bastante comum entre as diversas áreas do saber, da clínica
médica passando pela atividade educacional, da atividade jurídica à jornalística, e claro, nas pesquisas
desenvolvidas pelas Ciências Sociais. O estudo de caso é mais uma perspectiva desenvolvida nas pesqui-
sas sociais de cunho qualitativo, cujo objetivo é coletar dados relevantes, do ponto de vista das ciências
sociais sobre o objeto de estudo, que pode ser uma pessoa, uma comunidade, um evento, uma organi-
zação, etc. Geralmente, essa estratégia é utilizada em pesquisas financiadas por empresas públicas ou
privadas, que visa utilizar esses dados para uma intervenção concreta na realidade. Por exemplo: uma
comunidade ribeirinha que possui um alto índice de contaminação pelo vírus HIV. Realiza-se um estudo
de caso dessa comunidade com o objetivo de compreender os mais diversos agentes responsáveis pela
produção do índice alarmante, com o objetivo de traçar metas adequadas para a resolução do problema.
É comum, nas ciências sociais, o estudo de caso ser confundido com etnografia, pesquisa de cam-
po ou observação participante, pois as três estratégias partem de uma aproximação intensa com o objeto
estudado. Porém, há particularidades que torna esse tipo de estudo singular em relação às perspectivas
elencadas. O estudo de caso se preocupa com um determinado aspecto de um problema e visa aprofundar
o conhecimento sobre o mesmo, daí ser fundamental distinguirmos objeto de estudo e estudo de caso.
“O caso pode ser único e singular ou abranger uma coleção de casos, especificados por um aspecto ocor-
rente nos diversos casos individuais...” (CHIZZOTTI, Ibid., p.136). Pode ser um caso de uma pessoa ou
de um grupo, por exemplo, uma ocorrência isolada de suicídio em um bairro, ou muitas ocorrências do
mesmo fenômeno em uma cidade. O que o pesquisador que opta por essa estratégia precisa saber é que
os limites do que se define como caso é dado pelo mesmo, a partir daquilo que se pretende estudar.
Robert Stake (1994) apresenta três definições para as diferentes possibilidades elencadas pelos
pesquisadores na escolha de um estudo de caso, são elas: intrínseca, instrumental e coletiva.
Intrínseca: O pesquisador procura estudar o caso porque este possui alguma particularidade que
chama sua atenção, mesmo que não seja representativo em outros casos. O autor cita o livro “Argonautas
do Pacifico Ocidental, de Bronislaw Malinowski, como exemplo de um estudo de caso “singular”, vide
a escolha do antropólogo por uma população situada nas Ilhas Trobriand, situada ao longo da costa
oriental da Nova Guiné.
Instrumental: Quando o caso é escolhido e estudado para esclarecer um problema ou para o refi-
namento de uma teoria. Nessa perspectiva, o caso estudado possui interesse secundário. Como exemplo,
Stake cita o trabalho Boys in white: student culture in medical school, de Howard S. Becker, Blanche
Geer, Everett C. Hughes e Anselm Strauss, um clássico da pesquisa qualitativa. A pesquisa tem como
recorte os jovens estudantes de medicina, mas o foco de análise é a escola médica como organização
social.
Coletiva: Consiste em estudar, de maneira instrumental, diversos casos, buscando uma ampliação
do estudo. Não se trata de um estudo acerca de um coletivo, mas de um estudo direcionado para vários
casos. Stake cita o trabalho Children of Crisis de Robert Coles como exemplo. Nesse estudo, o psiquiatra
25
Métodos e Técnicas de Pesquisa
infantil analisa crianças de diferentes culturas e etnias que vivem nos Estados Unidos buscando enten-
der como elas aprendem e se desenvolvem em um contexto de mudanças tão intensas.
Como toda estratégia de pesquisa, o estudo de caso nas Ciências Sociais possui pontos positivos
e negativos. Como positivos podemos destacar: Possibilidade de um maior aprofundamento sobre uma
especificidade apresentada por um fenômeno social; Serve para identificar características de um tema de
pesquisa em um estudo exploratório; Testar hipóteses visando o aprofundamento em pesquisas poste-
riores. Já em relação aos pontos negativos destacamos a sua pouca consistência empírica, uma vez que
esse carece de base para generalizações. E outra, que consideramos mais preocupante, que é o fato do
estudo de caso gerar, no pesquisador, impressões falseadoras. O envolvimento intenso e encantamento
com o caso estudado pode levar o pesquisador a estender seus achados a fenômenos mais abrangentes,
produzindo generalizações arbitrárias.
Encerramos a discussão da unidade com o desejo de que vocês consigam operacionalizar as estra-
tégias apresentadas em futuras pesquisas. Existe um pensamento equivocado em parte dos estudantes
de Ciências Sociais de que pesquisa quantitativa e qualitativa são estratégias opostas e inconciliáveis,
onde o pesquisador que optar por uma delas, automaticamente excluirá a outra. Entendemos que propo-
sições como essa confundem os estudantes e colocam obstáculos ao desenvolvimento da pesquisa social.
O método e a técnica de pesquisa vai depender do objeto escolhido e dos objetivos implementados pelo
pesquisador. É possível que o pesquisador encontre seu porto seguro utilizando exclusivamente uma
das técnicas, o que é legítimo. O que não pode e nem deve acontecer, é a desqualificação de uma, em
detrimento da outra. Ambas possuem importantes ferramentas de acesso ao mundo empírico, e é dessa
forma que devemos percebê-las.
Para a terceira e última unidade elegemos a discussão sobre as etapas da pesquisa social.
Atenção
Leia mais
Exercício
1. Escolha uma das propostas de análise das formações discursivas (discurso, narrativa, con-
teúdo ou crítica) e utilize suas ferramentas para a leitura de uma matéria jornalística (jornal
ou revista).
Referências
FAIRCLOUGH, N. Peripheral Vision: Discourse Analysis in Organization Studies: The Case for
Critical Realism. Organization Studies (Sage Publications Inc.) 2005. 26(6): 915–939.
JANEIRA, Ana Luísa. A Técnica de análise de conteúdo nas ciências sociais : natureza e
aplicações. Análise Social. Lisboa. 2ª série. 9:39 (1972) 370-399.
STAKE, R.E. Case Studies. In: DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. (ed.) Handbook of qualitative
research. London: Sage, 1994. p. 236-247.
27
Métodos e Técnicas de Pesquisa
IV Unidade:
ÉTICA E AUTORIZAÇÃO NA
PESQUISA SOCIAL
Metas de aula
Não há dúvidas de que um bom conhecimento teórico aliado às ferramentas metodológicas certas
são elementos cruciais para o desenvolvimento de uma pesquisa, seja ela qualitativa ou quantitativa.
No entanto, é importante refletir sobre a viabilidade daquilo que nos propomos a investigar. Pois, de-
pendendo das nossas escolhas, não existe técnica de pesquisa, por mais sofisticada que seja, que torne
viável uma pesquisa.
Por exemplo: é possível traçar um perfil socioeconômico dos alunos e alunas da rede de ensino de
Alagoas? A resposta é sim. Mas trata-se de uma pesquisa ampla que depende de uma mobilização de
um grupo de pesquisadores que irá atuar em cada município do Estado. Além disso, será necessário um
orçamento generoso, pois a pesquisa demanda seleção de pesquisadores, remuneração, auxilio de pes-
quisa para deslocamento e alimentação, custos com impressão de questionários a serem aplicados, etc.
Ou seja, em se tratando de um trabalho de conclusão de curso, a ser realizado por uma pessoa apenas,
essa pesquisa se torna inviável. Mas se repensarmos o recorte “Perfil socioeconômico dos estudantes
de ensino médio da escola municipal Monteiro Lobato no bairro Jacintinho, na cidade de Maceió-AL”, é
possível perceber que a pesquisa se torna mais viável para realizar como trabalho de conclusão de curso.
Se a primeira opção era ampla, a segunda apresenta:
1) Um recorte etário (jovens, meninos e meninas, do ensino médio).
2) Um recorte da esfera da escola (pública).
3) Um recorte de localização e número de escolas (uma escola de um bairro popular da capital de
Alagoas).
Dessa forma, passamos a recortar e construir o objeto de pesquisa para algo possível de realizar em
um trabalho de conclusão de curso.
Entretanto, além de um recorte viável, é importante também destacar a relevância e a originalidade
da pesquisa. Ou seja, se a pesquisa já foi realizada anteriormente, se sim, quanto tempo faz e porque o
estudante acredita que ela seja interessante. Viabilidade, originalidade e criatividade são palavras cha-
ves para realização de pesquisas e para a produção do conhecimento nas ciências sociais.
No quadro abaixo apresentamos questões que nos ajudam a delimitar nosso objeto de pesquisa:
Cabe ressaltar também que, quando nos referimos à viabilidade de uma pesquisa, ou seja, a possi-
bilidade real de que ela possa ser executada e apresentada em um texto científico (artigo, monografia,
dissertação, tese, livro, relatório, etc.), devemos levar em consideração também o grupo que estamos
interessados em estudar. Por exemplo: índios, crianças, idosos, pessoas portadoras de necessidades es-
peciais dentre outros grupos, demandam uma discussão específica. Por um lado porque muitas vezes as
estratégias metodológicas devem ser rigorosamente pensadas, por outro, porque estudar esses grupos
nos traz desafios, tanto do ponto de vista ético, quando do ponto de vista da autorização. Diferente de
um adulto que quando abordado por um pesquisador pode tomar a decisão de participar ou não de uma
pesquisa, esses outros grupos são o que chamamos de “sujeitos tutelados”, ou seja, o Estado, pais ou
responsáveis devem autorizar a participação desses indivíduos em uma pesquisa. Dessa forma, a seguir,
mostraremos os caminhos para autorização de uma pesquisa.
Trata-se de um documento que deve ser apresentado aos indivíduos que irão participar da pesquisa,
assinado, tanto pelo participante, quanto pelo pesquisador e arquivado juntamente com os dados e todo
o material recolhido ao longo da pesquisa, para uma possível consulta.
29
Métodos e Técnicas de Pesquisa
Modelo do TCLE
Eu, (nome completo do pesquisador), responsável pela pesquisa (título do projeto de pesqui-
sa), convido para participar como voluntário deste estudo.
Esta pesquisa pretende (objetivo). Acreditamos que ela seja importante porque (justificativa).
Para sua realização será feito o seguinte: (procedimentos metodológicos). Sua participação constará
de (participação do voluntário).
Durante todo o período da pesquisa você tem o direito de tirar qualquer dúvida ou pedir qualquer
outro esclarecimento, bastando para isso entrar em contato, com algum dos pesquisadores.
Você tem garantido o seu direito de não aceitar participar ou de retirar sua permissão, a qualquer
momento, sem nenhum tipo de prejuízo ou retaliação, pela sua decisão.
As informações desta pesquisa serão confidencias, e serão divulgadas apenas em eventos ou pu-
blicações científicas, não havendo identificação dos voluntários, a não ser entre os responsáveis pelo
estudo, sendo assegurado o sigilo sobre sua participação.
Autorização:
Eu, ,após a leitura deste documento e ter tido
a oportunidade de conversar com o pesquisador responsável para esclarecer todas as minhas dúvidas,
acredito estar suficientemente informado, ficando claro para mim que minha participação é voluntária
e que posso retirar este consentimento a qualquer momento sem penalidades ou perda de qualquer be-
nefício. Estou ciente também dos objetivos da pesquisa, dos procedimentos aos quais serei submetido,
dos possíveis danos ou riscos deles provenientes e da garantia de confidencialidade e esclarecimentos
sempre que desejar. Diante do exposto expresso minha concordância de espontânea vontade em parti-
cipar deste estudo.
________________________________________________
Assinatura do voluntário ou de seu representante legal
________________________________________________
Assinatura de uma testemunha
Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e Esclarecido deste vo-
luntário para a participação neste estudo.
_________________________________________________
Assinatura do pesquisador(a)
O projeto de pesquisa tem em sua redação compromissos em não ferir a ética da elaboração de tex-
tos científicos. Um dos comportamentos antiéticos mais comuns é a prática do plágio, isto é, usar ideias,
expressões, dados de outros autores sem citar a fonte de onde se originam.
Outra espécie de procedimento antiético é a fraude, ou seja, quando o pesquisador inventa delibe-
radamente dados inexistentes a fim de justificar ou embasar suas propostas.
Além da elaboração do texto em si, o projeto da pesquisa que virá a ser realizada também deve ter
a preocupação de não causar malefícios aos sujeitos envolvidos no estudo, preservando sua autonomia
em participar ou não do estudo e garantindo seu anonimato. Algumas áreas de conhecimento instituem
que o projeto, antes de ser realizado, deva ser submetido a um comitê de ética em pesquisa. Na área da
Saúde, por exemplo, este é um procedimento obrigatório (DESLANDES, 2011, p.55-56).
3. A Plataforma Brasil
A Plataforma Brasil é um sistema eletrônico criado pelo governo federal, para cadastrar projetos de
pesquisas que envolvam seres humanos, nos termos da resolução Nº466, de 12 de dezembro de 2012.
“É o sistema oficial de lançamento de pesquisas para análise e monitoramento do Sistema CEP/CONEP”.
Os projetos são submetidos à comissão de ética em pesquisa (CEP) das respectivas instituições do
país e devidamente cadastrados. Como dito anteriormente, nos casos de pesquisa na área da saúde, a
submissão e aprovação junto aos comitês é obrigatória. Por outro lado, para as outras áreas essa ainda é
2 Trecho extraído do livro “Pesquisa social: teoria, método e criatividade”, de Minayo, Deslandes e Gomes (2011).
31
Métodos e Técnicas de Pesquisa
uma questão que vem sendo fortemente debatida e ainda restrita à opção do pesquisador. Ou seja, trata-
se de uma escolha do próprio pesquisador, em acordo com demais integrantes da pesquisa e orientador,
cadastrar seu projeto nos comitês de pesquisa.
É importante ressaltar que grande parte das agências de pesquisa vem exigindo esse cadastro como
requisito para financiamento de pesquisa em todas as áreas e não apenas para a Saúde.
http://aplicacao.saude.gov.br/plataformabrasil/login.jsf
Resumo da unidade
Exercício
Referências
MINAYO, M.C. (org.) Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes,
2011.
V Unidade:
Metas de aula
O escritor e educador Rubem Alves, em um pequeno texto chamado “Curiosidade é uma coceira nas
ideias”, relata que enquanto tentava “esfriar a cabeça” fazendo um trabalho manual, uma criança se
aproximou e começou a perguntar o que ele estava fazendo. Apesar de Rubem Alves responder que ele
estava construindo uma estante de madeira, sua resposta não era suficiente para a menina.
Assim se iniciou uma das mais alegres experiências de aprendizagem que tive na vida. A Dio-
néia queria saber de tudo. Não precisei fazer uso de nenhum artifício para que ela estivesse
motivada. O que a movia era o fascínio daquilo que eu estava fazendo e das ferramentas que
eu estava usando. Seus olhos e pensamentos estavam coçando de curiosidade. Ela queria
aprender para se curar da coceira... Os gregos diziam que a cabeça começa a pensar quando
os olhos ficam estupidificados diante de um objeto. Pensamos para decifrar o enigma da vi-
são. Pensamos para compreender o que vemos. E as perguntas se sucediam. Para que serve o
esquadro? Como é que as serras serram? Por que é que a serra gira quando se aperta o botão?
O que é a eletricidade? (ALVES, 2002).
A cada etapa do trabalho de carpintaria, a menina questionava Rubem Alves e nunca parecia estar
satisfeita. Para o autor, o fazer científico é comparável à curiosidade de uma criança como Dionéia, que
assim como outras crianças, rodeiam os adultos com perguntas incessantes com o intuito de conhecer o
mundo a sua volta e como as coisas acontecem. De fato, fazer pesquisa é algo que demanda, em primeiro
lugar, a curiosidade, ou seja, a vontade ou desejo de descobrir algo, ou responder uma questão. Assim,
toda pesquisa se inicia com questões. Quando falamos de pesquisa social, em grande parte das vezes ela
é despertada através da nossa imersão na vida cotidiana.
Mas a curiosidade, de maneira isolada, não é suficiente para a construção do fazer científico, pois
estamos tratando de uma atividade rigorosa, cujas ferramentas analíticas e estratégias de investigação
são fundamentais (como expomos na unidade 1). É o rigor teórico e metodológico que vai diferenciar
uma simples curiosidade de uma pesquisa científica.
Em termos objetivos podemos traçar 10 etapas importantes para a realização de uma pesquisa (seja
ela qualitativa ou quantitativa):
1) escolha do tema ou fenômeno social;
33
Métodos e Técnicas de Pesquisa
2) pesquisa bibliográfica;
3) pesquisa exploratória;
4) formulação do projeto de pesquisa;
5) coleta de dados;
6) Tratamento dos dados;
7) Discussão dos dados;
8) Análise dos resultados;
9) Redação;
10) Apresentação e divulgação dos resultados.
Fique atento!
É importante destacar que as etapas enumeradas, na maioria dos casos, integram o andamento de
uma pesquisa, especialmente as de cunho qualitativo e na área das Ciências Sociais. Mas, nem sempre
seguem uma ordem exatamente igual à que expomos. Cabe ressaltar, também, que alguns temas de
pesquisa dispensam algumas dessas etapas. Elas servem para ilustrar um modo de organizar nossas
ideias e realizar uma boa pesquisa social.
É a partir da escolha do tema ou do fenômeno social a ser investigado que nossas áreas de interesse
vão surgindo e se consolidando, na medida em que nos propomos a desvendar questões que nos chamam
atenção e despertam a nossa curiosidade. Nesse ponto inicial buscamos tentar responder a seguinte
pergunta: qual é o tema a ser estudado?
Nem sempre a escolha do tema ou do fenômeno é o ponto de partida de uma pesquisa. Muitas vezes
nos deparamos com um problema ou uma questão e somente depois disso nos vemos diante de um tema
de fato. Por exemplo, a partir da nossa experiência como professores do ensino médio e do convívio
diário com os dilemas da juventude, podemos optar por tentar entender a produção da sociabilidade
entre esses jovens, as características dos seus vínculos de amizade, seus gostos, etc. Nesse caso, uma
curiosidade anterior e uma relação próxima com um grupo específico levou o pesquisador à temática
da juventude na escola, com atenção à sociabilidade, no eixo de estudos da Juventude. Ou seja, a es-
colha do tema surge a partir da aproximação do pesquisador de um determinado fenômeno social. Esse
exemplo é para mostrar que nem sempre essas etapas ocorrem em uma sequência rigorosa, isto é, o
objeto de pesquisa pode ser escolhido antes mesmo de nos darmos conta de que estamos interessados
em determinado fenômeno social. Dessa forma, é importante ressaltar que uma pesquisa também pode
se desenvolver a partir da escolha de um tema, sem necessariamente ser algo que nos é muito próximo.
O tema é o aspecto mais amplo do objeto de estudo, que congrega mais de um objeto ou questão
para se pesquisar. Abaixo temos alguns exemplos de temas de pesquisa:
Gênero na escola
Segregação Urbana
Educação Indígena
Movimentos Sociais
3. A pesquisa bibliográfica
Definido o tema da pesquisa, o próximo passo é realizar uma pesquisa bibliográfica relacionada ao
tema. Essa pesquisa nos ajuda a compreender possíveis conceitos e categorias com as quais se trabalhará
Disciplinada porque devemos ter uma prática sistemática - um critério claro de escolha dos
textos e autores. Quais serão as chaves temáticas de busca? Serão incluídos somente textos
mais recentes? Serão textos oriundos somente de uma área de conhecimento? Haverá algu-
ma forma de escolha dos autores? Aqueles, por exemplo, que defendem determinada linha
de pensamento? Responder a estas perguntas ajuda a definir um certo escopo de pesquisa
bibliográfica.
Crítica porque precisamos estabelecer um diálogo reflexivo entre as teorias e outros estudos
com o objeto de investigação por nós escolhido - uma revisão não pode ser diletante, mas
precisa estar atenta à correlação entre os métodos propostos e os resultados encontrados por
outros pesquisadores. Desenvolver essa capacidade comparativa e analítica em relação aos
outros estudos nos ajuda a melhor delimitar nossa proposta.
Ampla porque deve dar conta do “estado” atual do conhecimento sobre o problema - espe-
ra-se que o pesquisador saiba dizer o que é consenso sobre o assunto em debate e o que
polêmico; o que já é tido como conhecido e o que pouco se sabe. E como se apropriar, sele-
tivamente, de tantos conhecimentos? Os fichamentos são um bom procedimento, mas, como
já dito, devem ter um foco e sempre estabelecer um diálogo com o tema e o objeto de estudo
desejado (DESLANDES, 2011, p. 36).
A fase exploratória
Entendemos que é imperativo conhecer o contexto de pesquisa, antes mesmo de estudá-lo, ou co-
nhecê-lo de maneira mais profunda. Soa esquisito sugerir que para pesquisar algo, devemos conhecê-lo
antes, afinal, é exatamente por isso que propomos a pesquisa, mas falamos de níveis de conhecimento
distintos. Esse é um movimento que o antropólogo carioca Gilberto Velho resume na expressão “estra-
nhar o familiar”, ou seja, “o que sempre vemos e encontramos pode ser familiar, mas não é necessaria-
mente conhecido [...]” (VELHO,1981, p. 126).
A fase exploratória consiste, nesse primeiro movimento, de estranhamento com aquilo que é fami-
liar, mas que não é conhecido em profundidade (por exemplo, no caso do professor de ensino médio que
resolve estudar a sociabilidade entre seus alunos), ou conhecer algo que é absolutamente estranho (por
exemplo, o antropólogo da cidade, branco, que decide estudar índios na Amazônia). É a partir desses
movimentos que as questões e objetivos da pesquisa começam a se desenhar.
Minayo (2011) destaca que a fase exploratória de uma investigação científica envolve também a
produção do projeto de pesquisa:
35
Métodos e Técnicas de Pesquisa
te, a colocar hipóteses ou alguns pressupostos para seu encaminhamento, a escolher e a
descrever os instrumentos de operacionalização do trabalho, a pensar o cronograma de ação
e a fazer os procedimentos exploratórios para escolha do espaço e da amostra qualitativa.
(p. 26)
O projeto de pesquisa
Um bom projeto de pesquisa deve responder todas essas questões citadas no guia. Por isso, um ca-
minho interessante para a construção do projeto de pesquisa começa com a tentativa de responder essas
questões, ainda que de maneira breve. É a partir do desenvolvimento dessas respostas que o projeto vai
surgindo. Segue o modelo que serve de parâmetro sobre como podemos apresentar de maneira clara e
objetiva as respostas a essas perguntas do guia:
3 Esse guia de questões para a produção de um projeto é inspirado no texto “O projeto de pesquisa como exercício científico e
artesanato intelectual” de Suely Ferreira Deslandes, publicado no livro Minayo (2011).
ALUNO (A)
ORIENTADOR (A) (SUGESTÃO!)
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO:
(POLÍTICA, ANTROPOLOGIA, SOCIOLOGIA OU EDU-
CAÇÃO EM SOCIOLOGIA DO ENSINO MÉDIO)
X. ESTRUTURA DO TCC
XI. REFERÊNCIAS
XII. CRONOGRAMA
6. A Coleta de dados
Já descrevemos, nas Unidades II e III, as principais técnicas de pesquisa qualitativa, mas é impor-
tante ressaltar também os principais métodos de coleta de dados que são utilizados nas ciências sociais,
aliados às referidas técnicas descritas anteriormente. Por exemplo: a entrevista e observação participan-
te figuram entre os principais.
37
Métodos e Técnicas de Pesquisa
Definimos observação participante como um processo pelo qual um pesquisador se coloca
como observador de uma situação social, com a finalidade de realizar uma investigação
científica. O observador, no caso, fica em relação direta com seus interlocutores no espaço
social da pesquisa, na medida do possível, participando da vida social dele, no seu cenário
cultural, mas com a finalidade de colher dados e compreender o contexto da pesquisa. Por
isso, o observador faz parte do contexto sobre sua observação e, sem dúvida, modifica esse
contexto, pois interfere nele, assim como é modificado pessoalmente (MINAYO, 2011, p. 70).
A entrevista e a observação participante são formas de coletar dados, quando fazemos a pesquisa
de fato. Se com a observação participante coletamos dados da vida social que ali acontece diante dos
nossos olhos, com a entrevista gravada aprofundamos esses dados, na medida em que temos a possibi-
lidade de ouvir os nossos interlocutores (grupo pesquisado) de maneira mais específica, questões que
apenas a observação participante não responde. Essas entrevistas podem ser guiadas por um roteiro com
perguntas abertas ou fechadas, gerais ou específicas. Assim, essas questões dependem daquilo que o
pesquisador pretende coletar.
Por exemplo, para traçar o perfil sócio-econômico de eleitores de um candidato político X, deve-se
apresentar questões fechadas com as opções dos candidatos e os dados sócio-econômicos (como a renda)
dos participantes da pesquisa.
Por outro lado, se pensarmos em uma pesquisa sobre o envolvimento de jovens com tráficos de dro-
gas e outras atividades criminosas, ao entrevistar esses jovens as questões serão mais abertas e gerais,
por exemplo: Fale sobre trajetória de vida até aqui (quando, como e porque você se envolveu com o
mundo do crime?).
Vale ressaltar que no caso das entrevistas elas podem ser estruturadas ou semi-estruturadas. As
estruturadas são mais parecidas com o primeiro exemplo de pesquisa, ou seja, elas são fechadas e espe-
cíficas. As semi-estruturadas são abertas e mais gerais, dando margem para que o próprio entrevistado
apresente seus sentidos sobre aquilo que investigamos, assim como em alguns casos nos faça repensar
nosso roteiro de perguntas. No último caso, o uso do gravador é fundamental.
Atenção
Finalizada a pesquisa, a sistematização dos dados e a análise dos resultados são o próximo
passo antes da redação do texto. E a redação de um bom texto é fundamental para a apre-
sentação dos dados obtidos. Afinal, é através dele que nossos pares terão acesso a nossas
pesquisas.
Resumo da unidade
O objetivo da Unidade V foi mostrar, de maneira objetiva, como a pesquisa nas Ciências
Sociais pode se concretizar na prática. Para isso, mostramos que a curiosidade é um dos pri-
meiros movimentos quando nos aventuramos por esse caminho. Mas o desejo de conhecer ou
mesmo descobrir elementos para problematizar a realidade social da qual somos produtos e
produtores, é um caminho que demanda também rigor, organização e sobretudo conhecimen-
tos teóricos e metodológicos. Vimos também as etapas básicas necessárias para realização
de uma pesquisa social: da temática a apresentação dos resultados. Apresentamos um guia
Saiba mais
MINAYO, Maria Cecília de Souza. Análise qualitativa: teoria, passos e fidedignidade. Ciênc.
saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 17, n. 3, p. 621-626, Mar. 2012 .
Exercício
Referências
MINAYO, M.C. (org.) Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes,
2011.
VELHO, G. “Observando o familiar”. In: Individualismo e Cultura: Notas para uma Antropo-
logia da Sociedade Contemporânea. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1981.
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Licenciatura em Ciências Sociais
Realização
UAB
Ministério da
Educação
Oferecimento