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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB

COLEGIADO DO CURSO DE GEOGRAFIA


COMPONENTE: GEOGRAFIA POLÍTICA 2023.1
PROFESSORA: SIRLEIDE DOS SANTOS
AV1: ATIVIDADE 2 TEXTO – GEOGRAFIA POLÍTICA

TEXTO 1 : Geografia política ou geopolítica: reflexão acerca do uso dos termos

Autores: Medeiros, Aline L., N. et al. Geografia Política. Available from: VitalSource Bookshelf, Grupo A,
2021.

Você sabe a diferença entre geografia política e geopolítica? Para dar início a esta seção,
usaremos a diferenciação proposta por Backheuser (1942), que destaca a importância de
diferenciar os termos. O termo geopolítica possui como similares diversas outras palavras que
se utilizam do prefixo “geo” — que denota uma relação com a terra ou elementos do solo —,
como a geologia, geociências, geoquímica, geomorfologia, etc. Apoiando-se na etimologia da
palavra geopolítica, Backheuser (1942) afirma que geopolítica é a política feita em decorrência
das condições geográficas e que, portanto, não é parte ou capítulo ou parágrafo da ciência
geografia, mas da ciência política. Backheuser (1942) baseando-se em Rudolph Kjellén, um dos
principais teóricos da geopolítica clássica pontua que a política tem a função de estudar o estado
por meio de cinco modos diferentes, que, para ele são como os cinco dedos da mão que trabalha
nas épocas de paz e que luta nas épocas de guerra. Desses cinco dedos, o dedo polegar é o
da geopolítica, que tem por função a investigação do país, ou seja, o solo político. Os demais
elementos são: a demopolítica, que estuda o povo e as raças e suas relações políticas enquanto
nação; a ecopolítica, que estuda a exploração dos recursos do país pela nação visando ao
desenvolvimento econômico; a sociopolítica, que estuda a sociedade dentro da nação; e a
cratopolítica, cuja função é estudar as questões de governo e administração, ou melhor, o
regime político e as manifestações da soberania (BACKHEUSER, 1942). Mais à frente em sua
análise sobre os termos geopolítica e geografia política, Backheuser (1942) apresenta a
distinção entre os termos realizada pelo geopolítico alemão Karl Haushofer. Para ele, a
geopolítica é a ciência que estuda as formas da vida política nos espaços vitais naturais,
compreendidos em sua vinculação ao solo e à dependência dos movimentos históricos. Por sua
vez, geografia política é a ciência da distribuição do poder do Estado, por meio dos “espaços”
da superfície da Terra e na dependência da morfologia, clima e revestimento florestal deles.
Apesar de trazer significados diferentes, a íntima relação entre a geografia política e a
geopolítica pode ser explicada pela preocupação dos geógrafos com a análise do território, com
as fronteiras e com o espaço geográfico. Essas categorias, é importante salientar, constituíam
as mais importantes unidades de análise para a ciência geográfica, quando essa se preocupava
mais com os fenômenos da política e do poder, na medida em que a preocupação humana com
a geografia se relacionava mais com as vantagens estratégicas que o conhecimento do espaço,
caracterizado pelo meio e pela fisiografia, davam às comunidades políticas (TEIXEIRA JÚNIOR,
2017). Outros cientistas políticos, em especial o polonês Zbigniew Brzezinski (1928-2017),
afirmam que a geopolítica é a combinação de fatores geográficos e políticos que determinam a
condição de algum estado ou região, focando o impacto da geografia sobre a política (TEIXEIRA
JÚNIOR, 2017). Para Meira Mattos (1913-2007), um dos grandes nomes da geopolítica
nacional, há uma diferenciação entre a geografia política e a geopolítica que se baseia na
maneira como se analisa a interação entre a política e a geografia. Metaforicamente, para ele,
enquanto a geografia política analisa seus objetos como uma fotografia, algo estático, a
geopolítica analisa o seu objeto como sendo um filme. Para esse autor, a geopolítica é o
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resultado da interação dinâmica entre três fatores, que são a política, a geografia e a história, e
que conduz à uma análise das possibilidades de acontecimentos do Estado (TEIXEIRA JÚNIOR,
2017). A geografia política consiste em uma ciência básica, fundamental. Enquanto a geopolítica
é uma ciência prática e aplicada. Indo mais a fundo, o desen-volvimento da geografia política,
enquanto um rol de teorias fundamentais e relativamente universais, sempre se deu por uma
prática acadêmica que procurava manter um distanciamento crítico e uma autonomia ante aos
objetivos mais imediatistas e pragmáticos. Por isso, pode-se dizer que a geografia política é um
conjunto de ideias políticas e acadêmicas sobre as relações da geografia com a política, na
medida em que o conhecimento produzido por esse campo do saber é resultado da
interpretação dos fatos políticos, em momentos distintos da história e em diferentes lugares, se
apoiando em uma reflexão teórica e conceitual desenvolvida na própria geografia ou em outros
campos do saber, como a ciência política, a sociologia, a antropologia, entre outros (CASTRO,
2019). A geopolítica, por outro lado, é dotada de desconfianças, que se relacionam com à sua
utilização na primeira metade do século XX, nas políticas expansionistas, bélicas e coloniais,
consistindo em um saber engajado e comprometido com o poder.

Fundamentos e usos da geografia política

Para Teixeira Júnior (2017), autores importantes para a construção do pen-samento geográfico,
como Vidal de la Blache, são considerados os maiores representantes do que se chama “escola
possibilista”. O possibilismo, campo oposto ao determinismo geográfico, assenta o seu
raciocínio na compre-ensão de que a liberdade causa um impacto na forma e no alcance em
que o espaço geográfico limita ou possibilita a ação dos seres humanos, e o elemento
humano/racional manifesta-se por meio da política. Desse modo, a relação entre o homem e a
geografia é mediada pelo fator político e o que fundamenta essa escola geográfica são o
progresso e a crença na ciência e na técnica, fatores que fazem com que a balança entre a
racionalidade e a geografia penda a favor do homem (TEIXEIRA JÚNIOR, 2017). A escola
possibilista trouxe grandes contribuições para a ciência geo-gráfica e para os alicerces da
geografia política. Porém, foi no determinismo germânico (ou alemão) que a geografia política e
a geopolítica se desenvol-veram enquanto disciplina. Ainda no século XIX, já existia a ideia de
que a política mediava as relações entre o ser humano e o seu meio de vivência. Não obstante,
o determinismo geográfico acreditava que o fator físico, ou seja, o meio natural, os fatores
geográficos, climáticos, etc., tinha um papel preponderante na explicação do processo
civilizatório (COSTA, 2008). Percebe-se, assim, que a escola geográfica alemã, calcada pelo
determi-nismo germânico, foi fortemente influenciada pelo naturalismo e pelas ideias de Charles
Darwin, resultando em uma base teórica-filosófica de conteúdo determinista para a explicação
dos fenômenos, inclusive os políticos (COSTA, 2008). Para Castro (2019), a tradição do
determinismo da natureza na geografia política foi um prolongamento de uma antiga
preocupação de filósofos, como Montesquieu, sobre a possibilidade de explicar a fluidez da vida
política com argumentos embasados em fatores estáveis, quase imóveis como o meio físico
(natureza), e durante muito tempo houve um esforço para mostrar como a distribuição dos
continentes e oceanos, montanhas, rios, climas, etc., afeta-vam a maneira como a humanidade
dividia o mundo em estados e impérios e como essas unidades brigavam entre si para adquirir
poder e influência. Sendo assim, semelhante ao que ocorria nos fenômenos do mundo natural,
o estudo da relação homem-meio, elo criado pela ciência geográfica, seria realizado por meio
da ótica biológica, em que o Estado consistia em um “organismo vivo”, possuindo necessidades
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biológicas, como a busca voraz por recursos e o estímulo natural à expansão.

Esse determinismo geográfico alemão, que condicionava o entendimento da política aos preceitos da
natureza, aproximou, cada vez mais, a geografia da ciência política, estritamente nas manifestações da
política de poder, a exemplo da expansão, a guerra, a conquista de territórios com finalidade de
sobrevivência e aumento de poder do Estado (TEIXEIRA JÚNIOR, 2017). A expressão geografia política
foi utilizada em 1750 pelo filósofo francês Turgot na tentativa de apresentar um “tratado de governo”,
uma formalização da intersecção do político com o geográfico. A preocupação de Turgot era demonstrar
que um governo começa no estudo dos elementos geográficos da política, que é anterior à participação
e à ação política propriamente ditas (CASTRO, 2019). Porém, foi apenas no final do século XIX que a
concepção moderna de geografia política foi estabelecida como terminologia e área de conhecimento
nas ciências sociais, sobretudo pela institucionalização da geografia e o reconhecimento da geografia
política como uma subdisciplina formal na Alemanha, a partir dos trabalhos de Friedrich Ratzel. Na área
da geografia política, poucos autores são tão representativos de uma escola de pensamento como
Ratzel. A sua obra ecoou no pensamento geográfico, passando pela geografia política e pela geopolítica,
e a sua contribuição é fundamental para entender o vocabulário político e estratégico utilizado por
governantes e estadistas, bem como para compreender as grandes guerras da primeira metade do
século XX (TEIXEIRA JUNIOR, 2017). A articulação entre o Estado e a sua geografia, a relevância do
“espaço vital” (Lebensraum) e o imaginário da tendência natural à expansão territorial que os estados
possuiriam, impactou fortemente a elaboração e evolução das teorias geopolíticas, e influenciou as
ciências humanas, de forma geral, sobretudo no campo das relações internacionais e da sociologia.
Ratzel pontuou, assim como outros teóricos da geopolítica, como Kjellén, que o Estado era um ente
naturalmente político, mas também orgânico. Uma vez entendido como entidade viva, um organismo
dinâmico, era constituído por um corpo político e institucional (uma expressão formal do Estado), pelo
território (espaço), e pelo povo (TEIXEIRA JÚNIOR, 2017).

Uma vez considerado como um organismo vivo, o Estado apresenta uma tendência natural à expansão,
como já foi dito, e desse modo, nem sempre reuniria as condições necessárias essenciais à sua
sobrevivência e sustentação. A ausência de recursos e as pressões populacionais se apresentariam
como grandes desafios, mas seriam incluídos no desafio de atingir o espaço vital. Foi observando a
expansão territorial dos Estados Unidos da América, na segunda metade do século XIX, que Ratzel notou
que a expansão do Estado não é uma pulsão natural, mas está assentado na conquista do espaço vital
(COSTA, 2008). Ratzel se esforçou para elaborar uma verdadeira teoria das relações entre a política e
o espaço, lançando o conceito de sentido de espaço, segundo o qual alguns povos tinham maior
capacidade de ordenar as paisagens, valorizar os recursos naturais disponíveis em seus territórios, e de
se fortalecer por meio de seu próprio apego ao território (CASTRO, 2019).

O teórico alemão, assim, elaborou sete pontos que esclarecem o entendimento sobre as motivações,
as causas e os mecanismos por trás do comportamento expansionista do Estado. De acordo com Castro
(1999) estas setes leis seriam:

1. O espaço dos estados deve crescer com a sua cultura.


2. O crescimento do Estado-nação segue outras manifestações de crescimento do povo, devendo, assim,
preceder o crescimento do próprio Estado.
3. O crescimento do Estado se manifesta pela adição de outro Estado dentro do processo de
amalgamação (processo constitutivo da construção e da expansão dos estados).
4. A fronteira é o órgão periférico do Estado.
5. Em seu crescimento, o Estado luta pela absorção de seções politicamente importantes.
6. O primeiro ímpeto para o crescimento territorial vem de outra civilização superior.
7. A tendência geral para a anexação territorial e amalgamação transmite o movimento de Estado para
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Estado e aumenta a sua intensidade.

Pode-se constatar que, olhando o mundo e a geopolítica calcada no evolucionismo darwinista, o


progresso da razão e da cultura ocorre simultaneamente à luta entre povos, estados e culturas por
recursos escassos, onde, em meio a tudo isso está a consolidação de um Estado, do território e da
segurança. Como um corpo vivo, o Estado tende a expandir, originado no crescimento endógeno,
particularmente, na cultura de sua população. Ao atingir o crescimento natural, o corpo do Estado busca
a expansão, incorporando outros Estados e territórios, por meio da amalgamação (TEIXEIRA JÚNIOR,
2017). O comportamento expansionista gera tensões nas zonas de expansão imediata, ou seja, nas
fronteiras, e como Costa (2008) afirma, a constituição dessa forma maior de institucionalização do poder
político determina a fixação, cada vez mais rígida dos limites entre as sociedades-nações. É a fronteira
que mantém o caráter definidor e estratégico do Estado — definidor porque o sentido de fronteira só é
revelado quando a coletividade se identifica e controla determinado território, delimitando o espaço como
resultantes de um antagonismo de necessidades e vontades manifestado por relações de força, poder e
violência; estratégico porque esses mesmos limites apontam para a zona de expansão do Estado
(TEIXEIRA JÚNIOR, 2017). De acordo com Castro (1999), a noção de fronteira, propriamente dita, surge
quando um povo que habita determinado território adquire consciência nacional, ou seja, a noção de
pátria. É essa consciência que dá sentido à ideia de nação, fundamental para a identificação do corpo
político institucional e de seu povo — o Estado-nação. Ratzel, nesse mesmo sentido, afirmava que, como
as culturas estavam contidas dentro de países ou estados, era esperado que as suas fronteiras se
movessem e ocorresse a expansão. Sendo assim, quanto mais desenvolvida fosse uma cultura, maior
era a probabilidade de expansão do Estado para territórios de outros países, provavelmente dotados de
culturas menos adiantadas. Sendo assim, na luta interminável por sobrevivência e segurança, gerada
pelas tensões causadas pela busca do espaço vital, os estados nascem, crescem (expandem) e morrem.
Kjellén, pontuava que o Estado poderia ser compreendido como um organismo vivo, onde o território é
o corpo do Estado, a capital e os centros administrativos compõem o coração e os pulmões; os rios e
estradas, suas veias e artérias; as áreas produtoras de matérias-primas e produtos alimentícios são os
seus membros (CASTRO, 1999). A geografia política de Ratzel tinha, portanto, a tarefa de demonstrar
que o Estado é uma realidade humana que só se completa sobre o solo do país. Nessa perspectiva, os
Estados são percebidos como organismos que mantêm uma relação necessária com o solo e que, por
esse motivo, devem ser considerados sob o prisma geográfico (CASTRO, 2019). Ratzel pontuava, ainda,
que o sentido geográfico jamais faltou aos homens de Estado, sendo dissimulados pelo nome de “instinto
de expansão”, “vocação colonial” ou de “sentido de poder”.

Principais categorias e conceitos utilizados no estudo da geografia política

A geografia política analisa como os fenômenos políticos se territorializam e recortam espaços


significativos das relações e vivências sociais, dos interesses da sociedade, solidariedades, conflitos,
controle, dominação e poder (CASTRO, 2019). Em uma linguagem geográfica, esses espaços podem
ser identificados como fronteiras, centro, periferia, unidades políticas, etc. Apesar das diferenças entre a
geopolítica e a geografia política, ambas
utilizam vocabulários e conceitos em comum, como espaço, território, fronteiras, região e Estado-nação.
Esses termos aparecem com frequência nas bibliografias tanto da geopolítica quanto da geografia
política, e, por isso, se faz necessário o entendimento desses fundamentos.
O espaço (geográfico?)
Segundo Corrêa (2000), o conceito de espaço aparece como vaga, ora associada a uma porção
especifica da superfície terrestre identificada pela natureza, ora por um modo específico como o ser
humano deixou as suas marcas, ou, ainda, como uma referência à mera localização. Mais do que isso,
a palavra espaço tem o seu uso associado a diferentes escalas, desde a global até a um cômodo de uma
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casa (CORRÊA, 2000). Todavia, o espaço, na ciência geográfica, é abordado de modos distintos
entre as diferentes correntes do pensamento geográfico. Na geografia tradicional, por exemplo, o espaço
não se constitui como um conceito-chave, sendo que os debates nessa escola incluíam mais os conceitos
de paisagem, região natural, região-paisagem. A abordagem espacial, naquele momento (1870-1950
aproximadamente), era bastante secundária. A despeito dessa associação coadjuvante dada ao espaço,
esse conceito está presente nas obras dos geógrafos tradicionais. Em Ratzel, por exemplo, o espaço é
visto como uma base indispensável para a vida do homem, encer-rando as condições de trabalho, sejam
essas condições naturais ou condições socialmente produzidas. Desse modo, o domínio do espaço
transforma-se em elemento crucial na história do homem (CORRÊA, 2000). Já para a geografia teorético
quantitativa (aproximadamente em 1950), o espaço é considerado sob duas formas que não se anulam:
a noção de planície isotrópica e a representação matricial.

Para a geografia crítica, o espaço desempenha um papel decisivo na estruturação de uma totalidade, de
uma lógica ou de um sistema. Esse espaço, bastante relacionado com a prática social não deve ser
considerado como um espaço absoluto, vazio, representado por números, como na geografia teorética-
quantitativa, nem como um produto da sociedade. O espaço, aqui, não é ponto de partida, nem o ponto
de chegada. Mas também não é um instrumento político, uma área de ações individuais ou coletivas. O
espaço, para a geografia crítica é mais do que isso, engloba essas concepções e, ainda, as ultrapassa.
É o lócus da reprodução das relações sociais de produção (CORRÊA, 2000). Território: espaços de
poder? A categoria território, segundo Souza (2000), é um espaço definido e delimitado por — e a partir
— de relações de poder. Por sua vez, o poder é uma habilidade humana de não apenas agir, mas de
agir em uníssono, coletivamente, em comum acordo. O poder não é nunca a propriedade de um só
indivíduo: pertence ele a um grupo e existe somente enquanto esse grupo estiver unido (SOUZA, 2000).
Souza (2000) aponta que quando se diz que “alguém está no poder”, está dizendo que essa pessoa se
encontra investida de poder, por determinado número de pessoas, para atuar em seu nome.

Ao considerar o território, a questão principal não é refletir sobre quais são as características geográficas,
ecológicas e os recursos naturais de uma certa área, ou o que se produz, ou quem produz em
determinado espaço, ou mais subjetivamente, quais as ligações de afeto e identidade entre uma
sociedade e o seu espaço. Apesar de esses elementos serem importantes para a compreensão e o
surgimento do território, o cerne da questão é: quem domina ou influência e como se domina ou influencia
esse espaço? Uma vez que o território é um instrumento de exercício de poder, outro questionamento
pode ser feito: quem domina ou influencia quem nesse espaço e como esse exercício de dominação é
realizado? (SOUZA, 2000). Todavia, é necessário aprender a despir o conceito de território da capa
de imponência com a qual se encontra, muitas vezes, vestido. O conceito de território evoca,
normalmente, “território nacional” e nos faz pensar no Estado, que é o gestor do território nacional, em
grandes espaços, sentimen-tos patrióticos, em governo, dominação, guerras, etc. O território pode ser
compreendido, também, em escala nacional e em associação com Estado. Todavia, esse conceito não
precisa e nem deve ser diminuído a essa escala ou à associação com a figura estatal. Os territórios
existem, são construídos e desconstruídos nas diversas escalas (da local à internacional, das ruas e
bairros aos blocos econômicos), dentro dos mais diferentes tempos (dias ou séculos) (SOUZA, 2000).
Na geografia política clássica, o território aparece como espaço concreto em si, ou seja, com os seus
atributos naturais e socialmente construídos, que é apropriado, isto é, ocupado por um grupo social e
essa ocupação é vista como algo gerador de raízes e identidade, no sentido de que um grupo não pode
ser compreendido sem o seu território, no sentido de que a identidade sociocultural dos cidadãos estaria
ligada aos atributos do espaço concreto (natureza, paisagem), isso segundo Souza (2000). Os limites do
território, ainda de acordo com Souza (2000), não são imu-táveis, pois as fronteiras podem ser alteradas,
comumente pela força bruta e pelo uso da violência, mas cada espaço seria, enquanto território, território
durante todo o tempo, isso porque apenas a durabilidade poderia ser geradora da identidade
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socioespacial. Uma outra maneira de se tratar a questão do território, mais abrangente e mais crítica,
pressupõe uma flexibilização da visão do que seja esse conceito: e não propriamente um descolamento
entre as ideias políticas e culturais da sociedade. Sob esse ponto de vista, o território é um campo de
forças, uma teia ou rede de relações sociais que, considerando toda a sua complexidade, define,
simultaneamente, um limite, que é a diferença entre “nós” (membros da coletividade — insider) e os
“outros” (os de fora, outsiders) (SOUZA, 2000). Ao refletir sobre as ideias de território, outros conceitos
são trazidos à tona. Pode-se pensar em soberania, fronteiras, Estado-nação, lugares, região. Uma das
funções do território no século XVII era demarcar o espaço de poder soberano, estabelecendo, assim,
fronteiras e limites. A ideia de soberania está atrelada ao surgimento de uma autoridade suprema
(soberano), que é reconhecida dentro e fora de seus domínios territoriais. Desse modo, as ideias de
território e de fronteira são fundamentais para distinguir a soberania interna, em que a autoridade política
maior é reconhe-cida como detentora do direito de governar o povo dentro de seu território, da soberania
externa, que garante o direito de uma autoridade soberana de governar seu próprio território e seu povo
sem interferência de agentes externos, principalmente por parte de outros estados (TEIXEIRA JÚNIOR,
2017). Na geografia política clássica os elementos primordiais para delimitar os espaços domésticos e
internacionais são os limites e fronteiras. Os limites delimitam formalmente a extensão territorial do
Estado, indicando até onde vai a soberania do Estado. As fronteiras, por sua vez, se confundem com os
limites, uma vez que, apesar de serem o marco divisor entre duas ou mais entidades políticas, apontam
para um horizonte expansionista. As nações podem ser compreendidas como grupos de cidadãos que
são ligadas por fatores culturais, por senso de identidade, religião ou território compartilhado
(GILMARTIN, 2009). Já um Estado-nação é o resultado da con-vergência entre um povo que está
imbuído de identidade nacional para um território organizado, politicamente, por um Estado próprio, que
constitui uma entidade legal e política que exerce poder soberano dentro de seu próprio território.
Gilmartin (2009) acredita que nem todo estado é um Estado-nação, lem-brando que estados com mais
de uma nação, como a Bolívia, que é um estado plurinacional, e de nações sem estado, como o caso do
povo palestino.

Conceito de região Segundo Gomes (2000), a palavra “região” é derivada do latim regere, e composta
pelo radical “reg”, que deu origem a outras palavras, como “regente”, “regência”, “regra”, entre outras.
Nos tempos do Império Romano, regione era a denominação utilizada para designar as áreas que
estavam subordinadas às regras gerais e hegemônicas das magistraturas romanas (GOMES, 2000).
Nesse contexto, o termo “região” surgiu como uma necessidade de um momento histórico, quando, pela
primeira vez, emergiu amplamente a relação entre a centralização do poder em um local e a extensão
desse poder sobre uma área de grande diversidade social, cultural e espacial (GOMES, 2000). Para
Gomes (2000), no senso comum, a noção de região existe relacionada a dois princípios fundamentais:
o de localização e o de extensão. Assim, a palavra região pode ser empregada como uma referência
associada à localização e à extensão de um certo fato ou fenômeno, ou, mais além, ser uma referência
a limites mais ou menos habituais, atribuídos a uma diversidade espacial. A região também tem um
sentido muito conhecido como unidade administrativa, em que a divisão regional é o meio pelo qual se
exerce a hierarquia e o controle da administração dos estados. Na ciência geográfica, o uso da noção
de região é mais complexo à na medida em que se tentou fazer dela um conceito científico, herdando as
indefinições e a força de seu uso na linguagem comum com as diversas correntes epistemológicas da
geografia. Nesse sentido, tem-se o conceito de região natural, que surge da ideia de que o ambiente
exerce um domínio sobre a orientação e o desenvolvimento da sociedade (geografia tradicional); tem-se
a região como uma realidade concreta, física que existe como um quadro de referência para a população
que ali habita (geografia regional francesa); e tem-se a ideia de que a região é um produto mental, uma
forma de ver o espaço que coloca em evidência as bases da organização espacial (GOMES, 2000). Com
a crise da geografia tradicional, a noção de região foi rediscutida, apreendendo que a região não pode
ser vista como uma mera evidência do mundo real-concreto, nem pode ser incluída no mundo científico
sem estar submetida a critérios gerais. Se tornou necessário, então, para que o conceito de região
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passasse a ser considerado como um termo científico, que houvesse uma formulação clara de seu
sentido e de seus critérios. O estabelecimento de regiões, portanto, passou a ser uma técnica geográfica,
um modo de demonstração de uma hipótese e não somente mais um produto de pesquisas. Regionalizar,
assim, passou a ser tarefa de dividir o espaço de acordo com critérios que são devidamente explicitados
e que podem variar segundo as intenções de cada trabalho (GOMES, 2000).

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