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Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC DECISÕES ESTRATÉGICAS

Laboratório de Estudos em Marketing e Produção – LEMAP


Olga Regina Cardoso, Dra. DA ENGENHARIA 1

A FUNÇÃO ESTRATÉGICA DA PRODUÇÃO

Durante anos, a Produção foi considerada quase um mal necessário, suportado pelos outros setores
porque, afinal, uma empresa manufatureira não podia escapar de fazer seus produtos. Os outros setores, por anos
considerados mais nobres, acostumaram-se a enxergar a fábrica como a origem principal de seus problemas.
Segundo a visão de alguns destes setores, por exemplo, a fábrica insistia em grandes lotes de Produção quando
Marketing os queria pequenos; a fábrica não conseguia atingir os níveis de qualidade e confiabilidade de entrega
prometidos e resistia às mudanças de programa solicitadas por vendas; a fábrica dificultava a introdução de novos
produtos projetados pela engenharia, sempre solicitando alterações de projeto, alegando-os infabricáveis; a fábrica
também nunca conseguia livrar-se dos estoques ou atingir as metas de utilização de equipamentos orçamentadas
pela controladoria. Desde o período pós-guerra, o setor de Produção e seu pessoal passaram anos sendo isolados
do processo decisório global da empresa. As decisões estratégicas eram tomadas e apenas comunicadas ao setor
de Produção para o "cumpra-se".
A tecnologia envolvida no processo de Produção foi, por longo período, vista pelos outros setores da
organização como um mistério insondável e desinteressante, escondido por trás das paredes da fábrica, aquela
parte da empresa sem carpete, barulhenta, muitas vezes suja, onde trabalhavam pessoas de pouco glamour,
resistentes à mudança, com aparências cansada e sempre apressadas em resolver o último problema ou, no jargão
das empresas, "apagar o último incêndio".

1 – DETERMINANTES DA REAVALIAÇÃO DO PAPEL DA PRODUÇÃO

Aqui, como exemplo de análise deste sistema administrativo onde mudanças exigidas foram mais críticas,
os termos Produção e manufatura serão utilizados de forma indistinta. Nos últimos 20 anos houve alteração
substancial na forma como o papel da Produção dentro das organizações é percebido. Isto ocorreu por três motivos
básicos:
a) Houve alterações substanciais no panorama competitivo mundial com surgimento de novos competidores,
competindo em bases muito diferentes daquelas vigentes, o que forçou a indústria do mundo ocidental, até
então acomodada na sua posição de liderança, a repensar suas práticas.
b) Houve desenvolvimento acelerado de novas tecnologias de processo que representam um potencial competitivo
formidável, mas que demandam alterações substanciais na forma de gerenciar os sistemas produtivos que delas
se utilizam.
c) Houve progresso notável no entendimento da contribuição que a Produção pode dar ao poder de
competitividade da organização; ampliou-se a ideia do papel estratégico que a Produção pode e deve ter no
alcance dos objetivos globais da empresa. Destacam-se os seguintes aspectos:
*a Produção pode ser uma arma competitiva poderosa, desde que bem gerenciada;
*eficiência em custos não é a única contribuição que a Produção pode dar a competitividade da organização;
*um sistema produtivo não pode atingir desempenho excelente em todos os critérios competitivos
simultaneamente; compromissos entre critérios competitivos devem ser reconhecidos e prioridades
estabelecidas, com base no que o mercado mais preza;
*a Produção deve focalizar esforços e recursos em obter excelência em desempenho em um ou dois critérios
prioritários;
*a complexidade intrínseca da função de Produção demanda gestão estratégica.

Como resultado, surgiu um movimento mundial de desenvolvimento de uma nova área da administração
da Produção, que é a estratégia de manufatura. A melhor definição de estratégia de manufatura talvez seja uma
visão que represente um composto das visões de vários autores.
"Estratégia de manufatura pode ser definida como um quadro de referência com o objetivo central de
aumentar a competitividade da organização, de forma sustentada, contemplando curto, médio e longo prazo,
através da organização dos recursos de Produção e da construção de um padrão de decisões coerente de modo a
permitir que o sistema produtivo e, por conseguinte, a organização, atinja um 'mix' desejado de desempenho nos
vários critérios competitivos".
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Esta nova área surgiu devido à constatação de que havia um elo faltando no processo de planejamento
estratégico das organizações. Pode-se diferenciar o conteúdo das estratégias de manufatura do processo de se
desenvolver estratégias de manufatura.
A realidade competitiva a partir da década de 70 fez com que mundialmente a função da Produção fosse
repensada, inclusive por seus integrantes dentro da estrutura empresarial, reavaliando seus objetivos e
relacionamento interfuncional. Não podendo subsistir isoladamente, sem informações provenientes de
necessidades de clientes e respostas dos clientes, a interface mais evidente estabelecida pela Produção foi com a
área de Marketing. Esta por sua vez, mesmo desde os primórdios de suas teorias já enfatizando a importância de
sua função para as demais áreas administrativas, devido às novas conjunturas competitivas amplia e atualiza seus
enfoques e atuação para fora e dentro das empresas. Particularmente as duas áreas agora se integram para a real
concepção da Qualidade, que deve ser objetivamente produzida no ambiente externo e interno da organização.

2 – RAZÕES DA FALTA DE RESPOSTA COMPETITIVA DA PRODUÇÃO

Durante os últimos 30 anos, as posições relativas em termos de competitividade ocupadas pelos principais
países industrializados mudaram. Algumas nações de longa tradição industrial foram superadas por outras de
menor tradição, dentre as quais o Japão é o exemplo mais eloquente. Os Estados Unidos e a Inglaterra, por exemplo,
tiveram suas confortáveis posições de hegemonia ameaçadas e, em muitos casos, as perderam (por exemplo, no
mercado automobilístico, por muito tempo dominado por empresas americanas e europeias).
Observando a indústria japonesa, nota-se que os setores em que ela mais se sobressai: motocicletas,
eletrodomésticos, automóveis, câmeras fotográficas, aparelhos de som e Produção de aço, tinham, na verdade,
mercados já desenvolvidos e líderes bem estabelecidos. As empresas japonesas teriam tido sucesso, em parte, por
sua habilidade na gestão comercial e financeira, mas, muito mais pela alta qualidade e baixos preços de seus
produtos, conseguidos através de uma excelência em manufaturá-los de acordo com oportunidades de mercado,
excelência esta que a maioria de seus concorrentes ocidentais não conseguiu igualar a tempo. As melhores
empresas japonesas estavam usando as melhorias obtidas com suas peculiares e inovadoras práticas industriais,
com sua principal arma competitiva, em oposição empresas ocidentais que teriam considerado a Produção como
"um problema já resolvido". Estas teriam, então, focalizado sua atenção e esforços no sentido de ganhar vantagem
competitiva através de excelência, por exemplo, exclusivamente em comercializar seus produtos (Marketing) e em
administrar suas finanças.
Embora inicialmente o sucesso competitivo japonês tenha sido atribuído (de forma míope) a seus baixos
custos com mão-de-obra, as empresas japonesas provaram não ser, em média, apenas mais eficientes em custos
do que a maioria de seus concorrentes ocidentais. Os produtos japoneses têm competido e ganhado mercados
baseados, também, em sua superior qualidade e confiabilidade, assim como em sua melhor resposta às
necessidades e oportunidades do mercado. Na introdução de novos produtos, por exemplo, as fábricas japonesas
de automóveis cortaram seus tempos de introdução (o período entre a fase inicial de projeto e a manufatura, em
regime, de um novo modelo) para uma média inferior a quatro anos, comparados aos seis a oito anos na Europa,
Estados Unidos e até mais em países em desenvolvimento como o Brasil e o México.
No Brasil, até pouco tempo atrás, as empresas industriais não tinham muito com que se preocupar em
termos de competição internacional pelo mercado interno, devido às restrições protecionistas às importações. Só
as empresas exportadoras preocupavam-se com aspectos como o benchmarking (comparação de níveis de
desempenho dos produtos e serviços de uma empresa com os dos melhores concorrentes do mercado) em relação
às melhores práticas mundiais. Hoje, com a gradual derrubada das barreiras alfandegárias, este panorama mudou.
De cerveja a automóveis, os produtos importados já competem com os nacionais pelo mercado interno
estabelecendo novas bases para a competição.
Já não basta que as empresas nacionais consigam superioridade competitiva em relação a seus
concorrentes nacionais. É necessário superar os concorrentes em escala mundial. Os concorrentes da empresa
nacional, seja ela exportadora ou não, agora são tanto as empresas líderes tradicionais (como as americanas e
europeias, que agora lutam para recuperar seu poder de competitividade), como as empresas japonesas, novos
líderes, e as empresas das nações em desenvolvimento (como México, Tailândia, Malásia e Hong Kong), que
representam novos atores de crescente importância no processo competitivo mundial.
É importante, neste sentido, analisar os motivos pelos quais os líderes industriais tradicionais se deixaram
superar pelos novos concorrentes, para que se possa, por um lado, entender as formas de reverter este processo
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e por outro, aprender com as lições do passado para não incorrer nos mesmos erros. Do ponto de vista de
administração das operações, as razões por trás da falta de uma resposta efetiva da maioria das empresas
ocidentais, que se viram ameaçadas pelas empresas japonesas, podem ser sumarizadas por cinco pontos principais
a seguir:

a) Medidas de desempenho
A avaliação do desempenho de empresas e seus administradores, baseada em considerações de curto prazo
(levando em consideração, por exemplo, relatórios trimestrais de desempenho), teria induzido os administradores
a evitar investimentos de longo prazo, já que os resultados destes investimentos demoraria a aparecer. Isto resultou
em prejuízo para a eficácia na manufatura. Os administradores, avaliados amiúde, não se motivam a investir em
melhorias estruturais e infra estruturais cujos resultados apareçam só no longo prazo, porque eles necessitam
apresentar desempenho no curto prazo. Eles preferem, por consequência, investir em publicidade e promoções,
por exemplo, as quais por si só, não garantem vantagem competitiva sustentada. No coração deste problema
encontra-se o incorreto estabelecimento e uso de medidas de desempenho, que pode induzir nos administradores,
atitudes que contrariem os melhores interesses competitivos da própria organização.

b) Considerações tecnológicas
Os administradores ocidentais teriam sido também, menos sofisticados, imaginativos e mesmo
interessados em lidar com considerações tecnológicas do que seus competidores orientais, concentrando sua
atenção em considerações sobre assuntos do âmbito da administração de Marketing externo e financeira. Isto teria
sido um resultado do duradouro desperdício dos profissionais da área de Produção, que como consequência,
raramente chegavam a ocupar posições de alta direção ou a participar de planejamentos estratégicos, de certa
forma reservadas aos egressos dos setores de Marketing, Finanças ou Controladoria. O desinteresse por questões
tecnológicas seria então, um resultado da própria formação e viés profissional daqueles executivos que chegaram
às posições de alta direção. Estes teriam de forma geral, sido preparados de forma deficiente para decidir sobre
questões tecnológicas, o que resultou em importantes decisões tomadas de forma superficial e equivocada.

c) Especialização excessiva e falta de integração apropriada


Influenciados por uma tradição estabelecida pelos modelos de "administração científica" desenvolvidos no
início do século, em grande parte devidos a Frederick Taylor e Henry Ford, os administradores ocidentais teriam
tendido a dividir questões complicadas em questões mais simples e especializadas, sem por outro lado, desenvolver
mecanismos apropriados de integração, que posteriormente juntassem as partes de modo a permitir que se lidasse
com o quadro geral. Isto favoreceu uma excessiva especialização de funções, com o consequente aparecimento de
"paredes" organizacionais, dificultando sobremaneira a comunicação e a integração rápida e eficaz entre setores
que deveriam colaborar e interagir de forma intensa no atingimento dos objetivos da organização.

d) Perda de foco
A mentalidade de separar e especializar colaborou para que muitas empresas ocidentais diversificassem
suas atividades, a ponto de distanciá-las perigosamente de suas principais e bem conhecidas tecnologias e
mercados. Elas teriam além disso, tendido a adotar a abordagem também conhecida como de portfólio, usado por
investidores do mercado de ações. Esta abordagem considera que diversificar é a melhor forma de precaver-se
contra contrariedades aleatórias. A Produção considerada como manufatura entretanto, não está sujeita apenas a
contrariedades aleatórias mas, mais importante, a ataques orquestrados de forma cuidadosa por competidores
que focalizam todos os seus recursos e energia na obtenção de excelência de desempenho num conjunto não muito
diversificado, mas restrito e bem definido, de atividades e objetivos. O conceito de foco na Produção manufatureira
baseia-se no princípio de que só simplicidade, repetição, experiência e homogeneidade na natureza das tarefas
executadas pela manufatura criam competência em sua execução.

e) Inércia
A maioria das fábricas no mundo ocidental não era administrada nos anos 70, (no Brasil, pode-se dizer que
isto vale até os anos 80 ou mesmo 90) de forma muito diferente do que nos anos 40 ou 50. Estas práticas
administrativas do período pós-guerra foram adequadas, enquanto as questões de gestão da Produção eram
centradas básica ou unicamente em obter produtividade e eficiência. Os administradores, entretanto, não deram
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a necessária atenção às mudanças ocorridas no mercado mundial, que passou a demandar maior qualidade e
variedade de produtos. Não se preocuparam também em identificar as maneiras como a manufatura deveria mudar
para atender estas novas necessidades. Consideraram, na verdade, que os problemas de Produção estavam
"resolvidos", e tenderam a direcionar sua atenção para outros assuntos como distribuição, embalagem e
propaganda. Houve uma falha, consciente ou não, de empresas e da sociedade dos países industrializados, em
reconhecer a grandeza do desafio competitivo que eles estavam sofrendo, o impacto que ele estava tendo nas suas
vidas e, portanto, a necessidade de mudanças. A inércia e a acomodação são ainda mais visíveis em mercados
protegidos por barreiras alfandegárias, como se nota em países como o Brasil, onde os administradores de muitas
empresas acomodaram-se em suas confortáveis posições de monopolistas ou oligopolistas no mercado interno até
anos recentes.
O resultado da concorrência destes cinco fatores é que as empresas ocidentais se deixaram obsolescer,
tanto em termos estruturais (máquinas, equipamentos e pessoas), como infra estruturais (sistemas gerenciais e
outros). O que um dia teria sido vantagem tecnológica erodiu pelo declínio de investimentos e atenção para
assuntos como pesquisas e desenvolvimento de novos produtos, novas tecnologias de processo e novas práticas
gerenciais.

3 – BINÔMIO PRODUTO-MERCADO PARA A COMPETITIVIDADE

Empresas na realidade competitiva obtêm melhores posições quando otimizam seus resultados. A despeito
de tão óbvio, esse objetivo foi negligenciado quando mercados absorviam praticamente tudo e qualquer coisa que
se produzia. Otimizar resultados globais de uma empresa, significa intencionalmente em cada uma de suas áreas,
melhorar métodos e processos para o esforço despendido ser mais produtivo (melhor aproveitado). Deixando de
lado definições tecnicamente mais apuradas, o assinalado na frase anterior representa um conceito prático e
simplificado do seja racionalização. Porém esta simplicidade não é tão evidente e fácil na prática.
Ser competitiva implica para uma empresa satisfazer duplo objetivo: satisfazer clientes e viabilizar o retorno
de investimento buscado por quem assumiu o risco do negócio. Colocam-se desta forma frente a frente, dois
critérios objetivos e concretos a s otimizar: oportunidade de mercado versus capacidade da empresa, e ambos
limitados. A saída para a racionalização necessária é a busca de objetivos amplamente difundidos e que estão
relacionados com esses dois critérios - qualidade e produtividade. Qualidade é considerada o principal fator a ser
atendido para a competitividade sendo avaliada pelo mercado; a produtividade é o que além da qualidade, torna
possível melhorar o aproveitamento dos recursos empresariais. É comum por tais razões falar-se em planejamento
estratégico da qualidade e produtividade, onde são delineados ações, objetivos, diretrizes, políticas e filosofias a
serem adotados por uma empresa. Uma recomendação importante neste esforço estratégico é a coerência entre
esses elementos, já que uma empresa pode adotar vários caminhos para seus propósitos.
A escolha da tecnologia adequada de processo é hoje, mais do que nunca, uma decisão estratégica crítica.
A tecnologia de processos tem sido considerada de forma bastante restrita. Engenheiros de áreas tecnológicas e
outros especialistas tendem a pensar em termos técnicos, não dando a necessária dimensão aos fatores que aí
estão envolvidos além do hardware tecnológico; embora indo aos últimos detalhes técnicos de uma dada
tecnologia, eles muitas vezes ignoram suas implicações em termos de impacto sobre o controle ou a
competitividade da organização. O novo paradigma tecnológico demanda uma nova abordagem gerencial.
O principal objetivo de uma estratégia tecnológica suportar a organização no atendimento de vantagem
competitiva sustentada de longo prazo. Esta vantagem competitiva é conseguida através do adequado
gerenciamento dos recursos de forma a prover a organização com um mix de características de desempenho
(prioridades competitivas) adequado a suas necessidades estratégicas. A discussão que segue é a respeito de quais
são os critérios competitivos para os quais se pode contribuir de forma mais objetiva dentro de uma empresa.
Há cinco prioridades competitivas principais, baseadas nas quais a Produção, vista num sentido amplo,
pode contribuir para a competitividade da organização. Contribuir para a competitividade significa:
a) Fazer os produtos gastando menos que os concorrentes, obtendo vantagem em custos.
b) Fazer produtos melhores que os concorrentes, obtendo vantagem em qualidade.
c) Fazer produtos mais rápidos que os concorrentes, obtendo vantagem em velocidade de entrega.
d) Entregar os produtos no prazo prometido, obtendo vantagem em confiabilidade de entrega.
e) Ser capaz de mudar muito e rápido o que se está fazendo, obtendo vantagem em flexibilidade.
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Embora conjuntos de objetivos que as organizações deveriam perseguir para obter vantagem competitiva
sejam freqüentemente mencionados, a importância relativa de cada um dos objetivos varia conforme o particular
mercado em que a empresa está competindo; daí, mais uma vez, a importância da interface com o Marketing para
a Produção estruturar suas tecnologias. Para determinado par produto/mercado o critério mais relevante pode ser
preço, estando o mercado até mesmo disposto a esperar pelo fornecimento. Já para outro par produto/mercado é
possível que prazo seja essencial, estando o cliente disposto a pagar certa quantia pela presteza de atendimento.
Importante distinção a ser feita em termos de critérios competitivos é a divisão dos critérios competitivos entre
critérios de vantagem competitiva e critérios qualificadores

a) Critérios competitivos qualificadores


São aqueles nos quais a empresa deve atingir um nível mínimo de desempenho que vai qualificá-la a
competir por um mercado. Um nível de desempenho inferior ao nível mínimo desqualifica a empresa da
concorrência por aquele mercado, mas um nível muito superior ao mínimo não representa necessariamente
vantagem competitiva. O cliente quer certificar-se de que o nível mínimo é atingido nos critérios qualificadores,
mas não vai decidir seu fornecedor com base em qual apresenta o melhor desempenho nesses critérios.

b) Critérios de Vantagem Comparativa (ou critérios competitivos ganhadores de pedidos)


São aqueles com base nos quais o cliente vai decidir quem vai ser seu fornecedor, entre aqueles
qualificados. A distinção é muito importante, pois assim pode-se avaliar o esforço de aumentar o nível de
desempenho nos critérios qualificadores; uma vez atingida a qualificação é compensar o esforço para aumentar o
desempenho nos critérios ganhadores de pedidos, já que é nestes que o cliente baseia sua escolha de fornecimento.
Alguns autores também os chamam de "fatores de vantagem competitiva"
Um exemplo contemplando o fornecimento de produtos, é o de uma empresa que queria competir pelo
fornecimento de peças para uma usina nuclear. Apenas para se qualificar, o cliente exige que a empresa
fornecedora deva ter níveis de qualidade mínimos (muito rígidos, devido aos grandes riscos envolvidos) em
determinados itens selecionados à segurança da instalação. Entretanto, atingidos estes níveis de qualidade
mínimos (qualificador), é inútil despender esforços ou recursos para apresentar níveis muito superiores de
desempenho naqueles critérios. O cliente espera que os níveis mínimos por si só já garantam a segurança da
instalação. Os critérios de vantagem comparativa serão outros, como o tempo ou a confiabilidade de prazos para
o fornecimento, do qual pode estar dependendo um prazo político (a inauguração da usina, por exemplo), ou
mesmo o funcionamento da instalação, que inativa, pode representar prejuízos enormes.

4 - DECISÕES ESTRATÉGICAS FUNDAMENTAIS NA FUNÇÃO PRODUÇÃO

Resumindo, da discussão em torno de objetivos, o importante é assimilar a nova mentalidade que o


pensamento estratégico para a competitividade incorpora e que, de agora em diante, deve se traduzir em questões
continuamente formuladas pelos gerentes, e cujas respostas invariavelmente exigirão cooperação entre Marketing
e Produção:
*Quais os objetivos que vão fazer com que a organização, por um lado, se qualifique e, por outro, ganhe pedidos
no mercado?
*Como conseqüência do ponto anterior, quais são os objetivos estratégicos da Produção tomada em sentido amplo,
hoje e no futuro?
*Em quais critérios competitivos deve-se buscar níveis mínimos de desempenho e em quais se deve buscar
superioridade clara em relação aos concorrentes?
*Como é que a devem ser reorganizados recursos humanos, tecnológicos e infra estruturais (sistemas de
informação, gerenciais, entre outros) para que uma empresa possa responder (a tempo) às necessidades
atuais e futuras do mercado?
*Como deve ser o padrão de decisões em relação às principais áreas de decisão, de modo que os diversos sistemas
administrativos de uma empresa, cumpram seu papel estratégico?

Os níveis de desempenho desejado nos diversos critérios competitivos de uma empresa, indicam
particularmente ao Sistema de Produção decisões quanto a:
*Capacidade de Produção: que nível, que tipo, como e com que rapidez incrementar.
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*Instalações: arranjo físico, tamanho, localização, especialização, políticas de manutenção.


*Tecnologia: quais equipamentos, que grau de automação, flexibilidade e versatilidade.
*Integração vertical: em que direção e com qual extensão.
*Força de trabalho: quais níveis de especialização, que políticas salariais e planos de carreira.
*Qualidade: que mecanismos de prevenção de falhas, quanta monitoração, que nível de intervenção, quais
padrões, quais mecanismos de benchmarking.
*Fluxo de materiais: que políticas quanto aos fornecedores, que Sistemas de Administração da Produção, qual o
papel dos estoques, que sistema de distribuição.
*Novos produtos: qual o foco, como garantir a frequência e a rapidez necessárias na introdução de novos produtos.
*Medidas de desempenho: quais critérios têm prioridades, que medidas os representam, que padrões adotar, quais
métodos utilizar, com que frequência controlar.
*Organização: que nível de centralização, qual estilo de liderança, como prover a comunicação em níveis
necessários, que processo de tomada de decisão.

Tais decisões visam responder à pergunta:


"Como é que a Produção pode integrar as decisões da organização como um todo, e particularmente de
Marketing, no sentido de permitir que suas capacitações atuais e potenciais sejam exploradas ao máximo pela
empresa, para que esta utilize todo seu potencial como uma arma para competir?"
Respostas a tais perguntas é resultado de um processo de planejamento iterativo, abrangente e
participativo a que a empresa deve dedicar-se diante de uma nova realidade competitiva. Este processo é
atualmente conhecido como Planejamento Estratégico.

5 – ENFOQUE ESTRATÉGICO DESEJADO

A forma de se chegar aos critérios competitivos priorizados e de relacioná-los às diversas áreas de decisão é
através de um processo amplo: o processo de desenvolvimento de estratégias. Este processo deve ter algumas
características principais: deve ser basicamente top-down (ou de cima par abaixo na hierarquia), mas deve também
ter forte componente bottom-up (de baixo para cima), que garanta um papel proativo no processo de
estabelecimento de metas estratégicas da organização, desde os seus estágios iniciais. Algumas características
desejáveis deste processo podem ser listados:
*deve ser explícito;
*deve ser transmitido para toda a organização de modo que se forme um padrão de decisões coerente e, portanto,
que toda e qualquer decisão tomada, não importa o nível ou impacto, considere os objetivos da organização
através dos objetivos de cada setor da empresa e através dos objetivos dos subsetores, e assim por diante
até se chegar ao tomador de decisão;
*deve contemplar um horizonte de planejamento longo prazo (2 a 5 anos);
*deve ser um processo iterativo, baseado em negociações intersetores, no sentido de se chegar a soluções que
acomodem o universo viável de todos os tempos, até o fim do horizonte de planejamento;
*os setores devem negociar com base em critérios que reflitam os serviços e produtos que uns prestam ao outros,
considerando a filosofia de cliente-fornecedor interno. Por exemplo, entre Produção e Marketing, a base de
negociação deve ser o mix de desempenho a ser atingido pelas operações nos critérios competitivos
prioritários. Outras bases de negociação devem ser encontradas para cada par de setores;
*o processo de replanejamento deve ser disparado por eventos relevantes que efetuam a situação competitiva da
organização tanto em seus aspectos internos (desenvolvimento de capacitações novas, alterações nas metas
globais da organização) como externos (surgimento de novos concorrentes, novas tecnologias, legislações,
entre outros).

Concluindo com a ideia básica a ser reforçada, é que o isolamento ao qual a Produção esteve sujeita ao
longo de vários anos deve acabar, dentro das organizações que pretendam competir no mercado mundial de hoje
e do futuro. Estratégias de manufatura enfatizam a integração da manufatura com as outras funções dentro da
empresa. Visa também determinar de forma realística como a empresa tem de competir no mercado e, a partir
desta determinação, procura criar as condições para que esforços sejam focalizados e recursos de manufatura seja
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orquestrados de modo a auxiliar a empresa a obter desempenho excelente (ou melhor que a concorrência) no que
realmente importa.
Todas as decisões tomadas dentro da organização hoje têm, com maior ou menor grau, impacto
estratégico. Portanto, toda e qualquer decisão tomada deve levar em conta os objetivos estratégicos da
organização. A escolha de um Sistema de Gerência da Produção, por exemplo, é uma decisão estratégica por
excelência. Diferentes sistemas de administração terão diferentes potenciais de atingir diferentes conjuntos de
objetivos. As necessidades a serem providas por um sistema variam com a natureza do processo de Produção
envolvido, com as expectativas do cliente e com as necessidades dos tomadores de decisão.
Não só as decisões referentes à seleção do Sistema de Gerência da Produção são "estratégicas", mas
também o são as decisões operacionais tomadas com base em informações fornecidas por ele. Cada escolha de
processo traz consigo implicações estratégicas para e empresa em termos de capacidade e agilidade em responder
às necessidades dos mercados, capacidade (em volume e variedade) e características de Produção, nível de
investimento necessário, custos unitários envolvidos e tipo de controle e estilo gerencial mais apropriado. A escolha
do sistema mais adequado de gestão da Produção ganha então, importância inusitada.
Novas abordagens gerenciais são necessárias para suportar as novas tecnologias e por conseguinte, o novo
papel estratégico da Produção. É neste contexto que ganham relevâncias os Sistemas de Gerência da Produção
alternativos, entre os quais se pode destacar o JIT-Just In Time (Justo a Tempo), o MRP II-Manufacturing Resources
Planning (Planejamento dos Recursos de Manufatura) e a OPT-Optimized Production Technology (Tecnologia da
Produção Otimizada).

REFERÊNCIAS
Material Adaptado de:
CORRÊA, Henrique & GIANESI, Irineu G. N. . Just-in-time, MRPII e OPT: um enfoque estratégico. São Paulo: Atlas,
1993.
HILL, T. . Manufacturing strategy: text and cases. Homewood: Irwin, 1989.

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