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Módulo 2: Consumidor

Ao final deste módulo, o leitor deverá ser capaz de entender conceitos básicos
do problema econômico do consumidor.

1. Restrição Orçamentária

a. Conjunto Orçamentário

Os economistas definem um conjunto orçamentário (CO) como a coleção de


bens que um consumidor consegue obter no mercado tomando como dados os
níveis de preços e a sua renda. Em outras palavras, é o conjunto formado
pelas possibilidades de consumo de um indivíduo.

Tomemos como exemplo um cidadão que carrega consigo apenas um cartão


de crédito com limite de R$ 2.500 (nesse exemplo, essa é a sua renda). Ele
entra em uma loja de departamentos e se dirige à seção de eletrônicos, onde
encontra à sua disposição o seguinte conjunto de bens:

• Televisor de 45”UltraHD, no
valor de $ 2.500
• Tablet, no valor de $ 2.000
• Telefone Celular, no valor de $
1.500
• Impressora, no valor de $ 500

Fonte: https://pt.freeimages.com

Haja vista que o limite de seu cartão de crédito é de R$ 2.500 e a somatória


dos valores dos produtos é de R$ 6.500, está claro que foge ao alcance desse
cidadão adquirir todos os bens, pois a somatória é bastante superior ao seu
limite de crédito. Entretanto, existe mais de uma maneira de gastar o seu limite,
eis algumas delas:

• Adquirir apenas o Televisor (R$ 2.500);


• Adquirir o Tablet e a impressora (R$ 2.500);
• Adquirir o Telefone Celulare a Impressora (R$ 2.000).

Essas três possibilidades fazem parte do conjunto orçamentário desse


indivíduo, mas existem outras sete possibilidades desse consumidor efetuar a
sua compra. De maneira esquemática, podemos descrever todo o conjunto
orçamentário(CO) desse consumidor do seguinte modo:

CO = {(Televisor); (Tablet); (Telefone Celular); (Impressora); (Tablet,


Impressora); (Telefone Celular, Impressora); (Impressora, Impressora);
(Impressora, Impressora, Impressora); (Impressora, Impressora, Impressora,
Impressora); (Impressora, Impressora, Impressora, Impressora, Impressora)}

Ou seja, dada a sua renda (no caso, o limite do cartão de crédito) e o conjunto
de bens que tem à disposição (Televisor, Tablet, Telefone Celular e
Impressora), essas dez combinações perfazem todo o conjunto orçamentário
desse consumidor.

Entretanto, na vida real o número de bens que o consumidor encontra ao seu


dispor é quase inumerável. Por esse motivo e também por questões didáticas,
examinaremos conjuntos compostos por apenas dois bens, que
denominaremos por X1 e X2.1

1.1.1Definição Formal

Após essa introdução ilustrativa ao significado de Conjunto Orçamentário, cabe


efetuarmos uma definição mais formal. Tomemos a cesta de consumo de um
consumidor médio por (X1, X2) e supomos que os preços desses bens são
observáveis e valem, respectivamente, (P1,P2.). Indicaremos por R a
quantidade total de dinheiro que o consumidor tem para gastar. Isso nos
permite descrever a restrição orçamentária desse consumidor por meio da
seguinte inequação:

𝑃1𝑋1 + 𝑃2𝑋2 ≤ 𝑅

O primeiro termo, P1X1, representa a quantidade de dinheiro que o consumidor
dispende com o bem 1, e P2X2, o dispêndio com o bem 2. A ideia por trás
dessa inequação é que a soma dos dispêndios com os dois bens (conjunto de
cestas) não pode ultrapassar a quantidade total de dinheiro disponível. Segue
que esse conjunto de cestas de consumo que o consumidor pode adquirir é
denominado Conjunto Orçamentário.

b. Reta Orçamentária

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A hipótese de dois bens é bem mais geral do que possa parecer à primeira vista, dado que podemos
indicar o bem 2 como um bem composto, ou seja, um bem que simboliza todos os demais bens exceto o
bem 1. Como esse conjunto de bens também é medido através de unidades monetárias, obtemos um
caso particular da restrição orçamentária, onde p2=1. A escolha do consumidor basicamente reside
então em adquirir o bem 1 ou continuar com orçamento para adquirir outro bem à disposição.
O conjunto de cestas que custam exatamente R é denominado de Reta
Orçamentária. Matematicamente, podemos descrever a Reta Orçamentária
através da seguinte equação:

𝑃1𝑋1 + 𝑃2𝑋2 = 𝑅

Como se pode constatar, a Reta Orçamentária é formada pelo conjunto de
cestas de bens que esgotam a renda do consumidor (R). Podemos
rearranjar a equação acima para obter uma segunda equação:
𝑅 𝑃1
𝑋2 = − 𝑋1
𝑃2 𝑃2

Ao recordar das suas aulas de geometria, o leitor deve ser capaz de enxergar
uma equação da reta com interceptos vertical e horizontal iguais a 𝑅 e 𝑅 ,
𝑃 2 𝑃 2
𝑃1
respectivamente, além de inclinação igual a − .
𝑃2






D/P2

D/P1

Fig1. A Reta e o Conjunto Orçamentários.

O intercepto vertical mede a quantidade de bens que o consumidor poderia


consumir caso despendesse toda a sua renda no bem 2, estendendo-se a
interpretação para o intercepto horizontal.

A inclinação da reta orçamentária pode ser interpretada como a taxa à qual o


consumidor está disposto a substituir o bem 1 pelo bem 2. O sinal negativo
indica que caso o consumidor queira adquirir mais do bem 1, ele deverá abrir
mão de certa quantidade do bem 2 (a quantidade exata é dada pela razão
entre os preços). Esse “custo implícito” no consumo do bem 1 (que é consumir
menos do bem 2) é denominado pelos economistas por custo de
oportunidade do bem 1.

Variações na Reta Orçamentária

O último aspecto que estudaremos respeito da Reta Orçamentária diz respeito


à sua variação. Há basicamente duas maneiras de impactar a reta
orçamentária: variando-se os preços; ou, variando-se a renda. Vamos analisar
cada caso.

Variações na Renda do consumidor não alteram a inclinação da reta


orçamentária, mas tão somente a deslocam “para dentro” ou “para fora”.
Analiticamente, temos que se os interceptos são razões entre a renda e um dos
preços (R/P1 e R/P2) e a renda é o numerador, é fácil ver que elevações na
renda deslocam a reta no sentido superior direito (“para fora”), ao passo que
diminuições da renda deslocam a reta no sentido contrário, ou seja, inferior
esquerdo (“para dentro”). A figura 2 torna clara essa explanação.

Figura 2 – Deslocamento da Reta Orçamentária a partir de uma variação na


Renda

Por outro lado, as variações nos preços tendem a alterar a inclinação da reta.
Esse resultado é facilmente visualizado ao se recorrer às razões dos
interceptos (R/P1; R/P2). Uma variação apenas em P1 tornará a reta mais ou
menos íngreme, a depender de como esse preço varia. Caso se verifique uma
elevação de P1, o resultado da razão será um número menor, de forma que o
intercepto horizontal se aproximará da origem tornando a reta mais íngreme.
Uma redução em P1 causa obviamente um efeito contrário, tornando a reta
menos íngreme. A figura 3 ilustra o que acabamos de expor.

Figura 3 – Alterações na inclinação da Reta Orçamentária oriundas da variação


em P1

2. Preferências do Consumidor

Os economistas pressupõem certa dose de racionalidade dos consumidores,


de forma que esses são capazes de ordenar as várias possibilidades de
consumo ao qual estão expostos. A essa ordenação dá-se o nome de
preferências de consumo.

Sigamos com um exemplo: dadas duas cestas de consumo quaisquer,


representadas por X=(X1, X2) e Y=(Y1, Y2), o consumidor deve ser capaz de
dizer se prefere X a Y, Y a X, ou se é indiferente a ambas as cestas. No
primeiro caso, diz-se que a cesta X “é preferida” à cesta Y, e utiliza-se a
simbologia 𝑋 ≻ 𝑌. O segundo caso segue a mesma lógica. Com respeito ao
terceiro caso, diz-se que o consumidor “é indiferente” entre as cestas X e Y, e
indica-se por 𝑋 ∼ 𝑌.

Pressupostos sobre as Preferências

No intuito de tornar a análise logicamente consistente, a teoria das preferências


necessita de três axiomas: Completude; Reflexividade e, Transitividade.

Afirmar que as preferências são completas implica simplesmente assegurar ser


possível comparar duas cestas quaisquer. A reflexividade implica supor que as
cestas são ao menos tão boas quanto elas mesmas (ou seja, 𝑋 ∼ 𝑋). Por fim, a
transitividade implica que se o consumidor prefere a cesta X ante Y, e prefere Y
ante Z, então por transitividade ele preferirá X a Z.

3. Curvas de Indiferença

As curvas de indiferença são elementos gráficos que possibilitam uma maneira


conveniente de se estudar as preferências dos consumidores. Basicamente,
essas curvas representam as combinações de quantidades nas cestas de dois
bem, X1 e X2, que proporcionam ao consumidor o mesmo nível de satisfação
(o consumidor é portanto indiferente a quaisquer dessas cestas).

Figura 4 – Curva de indiferença

Para facilitar a nossa análise, faremos algumas suposições acerca das


curvas de indiferença. A primeira delas é a de que estamos tratando de bens e
não de males, ou seja, o consumidor sempre estará diante de um cesta a qual
tem desejo por consumir. A segunda suposição é a de que o consumidor não
está no seu ponto de saciedade, ou seja, consumir mais uma unidade da cesta
trará algum benefício a ele. Por fim, suporemos que o consumidor sempre
preferirá um consumo equilibrado dos bens, ou seja, uma combinação dos
bens traz mais satisfação do que apenas um dos bens.

Essas suposições implicam estarmos estudando curvas de indiferença


bem-comportadas, ou seja, curvas monotônicas e convexas.
Figura 5 – Preferências monotônicas convexas

Taxa Marginal de Substituição

A inclinação da curva de indiferença recebe o nome de Taxa Marginal de


Substituição (TMS), e mede a taxa à qual o consumidor está propenso a
substituir um bem pelo outro em determinado ponto da curva.

Como exemplo, imagine que o consumidor se encontre num ponto da


curva de indiferença, digamos, (X1, X2), e decida variar o consumo do bem 1
em ΔX1 unidades. Por construção, para que o consumidor permaneça na curva
de indiferença, necessariamente deveremos constatar uma variação
proporcional em X2,ΔX2. A TMS é o resultado da razão entre as duas
variações, ou seja, ΔX2/ΔX1, quando essa variação é muito pequena (os
economistas nomeiam essas pequenas variações de “marginais”).

A importância da TMS reside no fato de que ela indica a situação na qual


o consumidor se encontra em equilíbrio, ou seja, está indiferente entre trocar e
não trocar um determinado bem por outro. Caso a taxa de troca entre dois bens
no mercado seja diferente da TMS do consumidor, ele poderá obter alguma
satisfação alterando as proporções de consumo até que sua TMS se iguale à
taxa de troca do mercado.

Figura 6 –TMS e taxa de troca do mercado


Convém apontar que em curvas convexas, a TMS diminui – em módulo – à
medida que nos afastamos da origem. Essa importante propriedade é
conhecida por Taxa Marginal de Substituição Decrescente, e sua implicação
prática é que quanto mais o consumidor tiver do bem 1, menor será a taxa pela
qual ele aceitará abrir mão do bem 2 para obter mais do bem 1.

4. A Função Utilidade

A função utilidade é uma função que atribui um número, também chamado


de índice de utilidade, a todas as cestas da ordenação de preferências do
consumidor. A importância dessa função reside no fato de que a partir dela
podemos ordenar as preferências dos consumidores.

É importante ressaltar que a diferença entre os valores de utilidade de


cestas distintas não nos interessa, mas tão somente saber se uma cesta tem
mais, menos ou a mesma utilidade de outra cesta.

Destacam-se duas propriedades da função utilidade:

1. Se o consumidor é indiferente entre duas cestas D e F, podemos dizer


que o índice de utilidade é igual para as duas;
2. Se o consumidor prefere a cesta D à F, o índice de utilidade de D é
maior que o de F.

Outrossim, a partir de funções de utilidade podemos obter as curvas de


indiferença que representam as preferências do consumidor. Como exemplo,
tomemos a seguinte função de utilidade:

𝑈(𝑥1, 𝑥2) = 𝑥1𝑥2

Para traçar as curvas de indiferença a partir dessa função, basta fixarmos um


valor para a função de utilidade, digamos, k, e então isolarmos as duas
variáveis. Em matemática, esse tratamento é utilizado quando se trabalha com
curvas de nível de uma função. Continuando o exemplo, a partir da função de
utilidade acima descrita, isolamos x e y obtendo:
𝑘
𝑥2 =
𝑥1

Que é uma função hiperbólica cujo gráfico é representado na figura abaixo.

Figura 7 – Curva de indiferença para 𝑈(𝑥1, 𝑥2) = 𝑥1𝑥2 = 𝑘, para diferentes


valores de k

Tendo em vista que não nos interessa a distância entre diferentes


utilidades, mas tão somente saber ordená-las, nos é permitido aplicar
transformações convenientes desde que não se altere a referida ordenação.
Em matemática, esse tipo de operação recebe o nome de transformação
monotônica. Um exemplo simples é multiplicar uma função utilidade por um
escalar positivo. No exemplo acima, a função 𝑈(𝑥1, 𝑥2) = 𝑥1𝑥2 deve possuir a
mesma ordenação que a função 𝑈∗(𝑥1, 𝑥2) = 2𝑈(𝑥1, 𝑥2) = 𝑥1𝑥2.

Utilidade Marginal

É bastante útil estudar como varia a utilidade do consumidor de acordo com


variações no consumo dos bens. A utilidade marginal mede exatamente a
variação da utilidade a partir de uma variação em um dos bens. Formalmente,
as utilidades marginais são descritas como:
Δ𝑈 𝑈(𝑥1 + Δ𝑥1, 𝑥2) − 𝑈(𝑥1, 𝑥2)
𝑈𝑀𝑔𝑥1 = =
Δ𝑥 1 Δ𝑥1
Δ𝑈 𝑈(𝑥1, 𝑥2 + Δ𝑥2) − 𝑈(𝑥1, 𝑥2)
𝑈𝑀𝑔𝑥2 = =
Δ𝑥 2 Δ𝑥2

Dessa forma, para calcular a variação da utilidade relacionada a uma


pequena variação no consumo de x, basta multiplicar a variação pela utilidade
marginal:

Δ𝑈 = 𝑈𝑀𝑔𝑥1 Δ𝑥1

Resta claro que a utilidade marginal depende da forma da função utilidade


que utilizamos para representar o ordenamento das preferências.

Existe uma relação importante entre a utilidade marginal e a taxa marginal


de substituição: a razão entre as utilidades marginais é igual à taxa marginal de
substituição. Formalmente:
𝑈𝑀𝑔𝑥1
𝑇𝑀𝑆 =
𝑈𝑀𝑔𝑥2


5. Escolha ótima do Consumidor

Finalmente, e de posse dos conceitos estudados, analisaremos como o


consumidor efetua a escolha que maximiza a sua satisfação e, por
consequência, a sua utilidade.

Partindo da função de utilidade desse consumidor, obtemos as curvas de


indiferença que representam as suas preferências. Como estamos analisando
curvas de indiferença convexas, o consumidor deverá escolher uma cesta de
consumo contida na curva de indiferença mais alta, restrito ao seu conjunto
orçamentário. Segue que temos aqui uma condição de tangência: a escolha
ótima do consumidor será tal que a sua cesta de consumo deverá repousar na
curva de indiferença que tangencia a reta orçamentária.

E qual será esse ponto? Bom, conforme vimos anteriormente, a TMS indica
a situação na qual o consumidor se encontra em equilíbrio, ou seja, está
indiferente entre trocar e não trocar um determinado bem por outro. Por outro
lado, a inclinação da reta orçamentária é dada pela razão dos preços dos bens.
Assim, o ponto de tangência será tal que:

△ 𝑥2 𝑝1
𝑇𝑀𝑆 =

=
△ 𝑥1 𝑝2

Figura 7 – Condição de Equilíbrio



Do ponto de vista geométrico, a curva mais alta possível é aquela que é tangente à
reta de limitação orçamentária.

Situação Problema

Os economistas costumam utilizar o termo Inflação para um aumento contínuo


e generalizado dos preços em uma economia. Reflita sobre como essa
variação nos preços pode impactar no Conjunto Orçamentário de um dado
consumidor. Para facilitar a análise, tome como constante a quantidade total de
dinheiro (R) disponível para esse consumidor.

Bibliografia Básica

KRUGMAN, P.; WELLS, R. Introdução à Economia Rio de Janeiro: Campus/Elsevier,


2007
CHANG, H-J. Economia: modo de usar - Um guia básico dos principais conceitos
econômicos. São Paulo: Portfolio-Penguin, 2014.
WHEELAN, C. Economia nua e crua: O que é, para que serve, como funciona. Rio
de Janeiro: Zahar, 2O14

Sugestão de vídeo

Encontro do século – Smith e Marx. (disponível no youtube)

Seção de Economia da Khan Academy. (disponível no youtube)

Relação de unidades curriculares aderentes: Interface com a unidade curricular


Economia Brasileira (Curso: Administração).

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