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O Fim do Dinheiro
O fim dos cartões
O fim dos bancos
O fim do sistema financeiro
Será o avanço do capitalismo
O sistema capitalista vive sob constantes crises, gerando graves
conflitos sociais e claramente precisa de mudanças.
www.ofimdodinheiro.com
www.theendofmoney.org
www.elfindeldinero.com
ECONOMIA
ISBN (13) 978-85-920526-0-7
Lendo o discurso que o Papa Francisco fez no Para sua surpresa, com o fim do dinheiro o siste-
Encontro Mundial dos Movimentos Populares, em ma capitalista funcionará com mais eficiência,
Santa Cruz de la Sierra, no dia 9 de julho de 2015, a produtividade aumentará e os conflitos serão
o autor tomou a decisão de escrever este livro, drasticamente reduzidos, a meritocracia passa-
fruto de uma análise que já tinha realizado sobre rá a ser a mola propulsora do desenvolvimento,
o avanço que teria o sistema capitalista com o fim a sociedade ficará mais justa e, certamente, as
do dinheiro, o fim dos cartões, o fim dos bancos, pessoas serão mais felizes.
o fim do sistema financeiro. “A primeira tarefa é pôr a economia a serviço
“Se é assim – insisto – digamo-lo sem medo: dos povos. Os serem humanos e a nature-
Queremos uma mudança, uma mudança za não devem estar a serviço do dinheiro.
real, uma mudança de estruturas. Este sis- Digamos NÃO a uma economia de exclusão
tema é insuportável: não o suportam os e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez
camponeses, não o suportam os trabalha- de servir. Esta economia mata. Esta economia
dores, não o suportam as comunidades, exclui. Esta economia destrói a Mãe Terra”.
não o suportam os povos... E nem sequer o (Papa Francisco)
suporta a Terra, a irmã Mãe Terra como dizia O fim do dinheiro será o avanço do sistema
São Francisco”. (Papa Francisco) capitalista!
A necessidade de mudança no nosso sistema “Esta economia é não apenas desejável e
capitalista parece ser um pensamento dominante necessária, mas também possível. Não é uma
nesse início de século, o sistema capitalista mun- utopia, nem uma fantasia. É uma perspectiva
dial está certamente com problemas e vive sob extremamente realista. Podemos consegui-
constantes crises financeiras, as crises se alternam -la. Os recursos disponíveis no mundo, fruto
entre países, regiões, continentes, porém, todas do trabalho intergeneracional dos povos e
elas, com maior ou menor grau de intensidade, dos dons da criação, são mais que suficientes
têm gerado graves conflitos sociais. para o desenvolvimento integral de ‘todos os
homens e do homem todo’”. (Papa Francisco)
“Está -se a castigar a terra, os povos e as
De forma prática e objetiva O Fim do Dinheiro
pessoas de forma quase selvagem. E por
apresenta os caminhos para a nova sociedade.
trás de tanto sofrimento, tanta morte e des-
truição, sente s-e o cheiro daquilo que Basílio Provavelmente você vai ter muito a contribuir com
de Cesareia chamava ‘o esterco do diabo’: essa nova ideia: o fim do dinheiro!
reina a ambição desenfreada de dinheiro.
O serviço ao bem comum fica em segundo BAIXE O E-BOOK GRATUITO
plano. Quando o capital se torna um ídolo e
dirige as opções dos seres humanos, quando www.ofimdodinheiro.com
a avidez do dinheiro domina todo o sistema www.theendofmoney.org
socioeconômico, arruína a sociedade, condena www.elfindeldinero.com
o homem, transforma o- em escravo, destrói
a fraternidade inter h- umana, faz lutar povo CONTRIBUA COM O DEBATE
contra povo e até, como vemos, põe em risco
esta nossa casa comum.” (Papa Francisco) The end of money
Diagramação
Alan Maia
Revisão
Marcia Benjamim
ISBN: 978-85-920526-0-7
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
AGRADECIMENTO
INTRODUÇÃO...................................................................................................................9
O FIM DO DINHEIRO......................................................................................................11
O SISTEMA DEMOCRÁTICO.................................................................................... 15
O QUE MUDA?............................................................................................................... 29
AS VANTAGENS............................................................................................................47
O PLANETA MARTE....................................................................................................57
A LIVRARIA..................................................................................................................... 65
PROPOSTA RADICAL.................................................................................................73
PRESERVAR A TERRA............................................................................................... 81
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INTRODUÇÃO
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O Fim do Dinheiro
16
O Fim do Dinheiro
O SETOR PÚBLICO
18
O Fim do Dinheiro
O SETOR PRIVADO
20
O Fim do Dinheiro
E por que eu, funcionário, terei que trabalhar sem receber salário?
Exatamente pelo mesmo motivo do empresário, os funcionários
que tiverem mais responsabilidades na sua atividade, que mais
trabalharem e que, portanto, mais produzirem poderão se bene‑
ficiar consumindo mais produtos no seu dia a dia, do que outro
funcionário em função menos qualificada ou que queira trabalhar
menos horas por mês.
22
O Fim do Dinheiro
O TERCEIRO SETOR
28
O QUE MUDA?
NA FAMÍLIA
NO DIREITO À PROPRIEDADE
30
O Fim do Dinheiro
NO DIREITO À HERANÇA
32
O Fim do Dinheiro
Pensando bem, para que uma pessoa precisa falecer com uns bi‑
lhões de dólares na conta? Para nada, não é verdade!
34
O Fim do Dinheiro
36
OS RISCOS DE O DINHEIRO SER
MAIOR DO QUE TODOS NÓS
38
O Fim do Dinheiro
Com o fim do dinheiro, o fim dos cartões, o fim dos bancos, o fim
do sistema financeiro, se uma pessoa trabalha numa função que
será extinta na nova sociedade, o que ela passará a fazer e como
se sustentará?
44
POR QUE O DINHEIRO EXISTE?
NO SETOR EDUCACIONAL
48
O Fim do Dinheiro
O mérito como base para a educação vai gerar uma riqueza para a
sociedade incalculável, somado a isso a facilidade para o empre‑
endedorismo e o estímulo ao trabalho prazeroso, tudo somado,
princípios do sistema capitalista, teremos ao longo do tempo uma
sociedade muito mais culta, rica, produtiva, educada e feliz.
Walter Barretto Jr.
50
O Fim do Dinheiro
O TRÁFICO DE DROGAS
Nós sabemos que parte das pessoas que procuram as drogas se‑
gue este caminho por não encontrarem estímulos e oportunidades
na nossa sociedade atual, com a nova sociedade teremos um setor
educacional com mais oportunidades para os jovens e a atividade
empresarial de mais fácil acesso a todos, ou seja, uma soma de fa‑
tores que certamente fará com que haja uma redução de pessoas
seguindo o caminho das drogas.
CONSUMO CONSCIENTE
52
O Fim do Dinheiro
REDUZIR O CONSUMO
54
O Fim do Dinheiro
MERITOCRACIA
Simples assim!
E se você chegou à conclusão que, de fato, não temos que levar o di‑
nheiro para Marte, acredita agora que podemos estudar caminhos
para melhorar o nosso planeta Terra, e um deles, certamente um
dos mais revolucionários e de melhor benefício para todos, será o
fim do dinheiro?
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COMO IMPLANTAR A MUDANÇA
PRIMEIRA FASE
GERAL
60
O Fim do Dinheiro
A ÁFRICA
SEGUNDA FASE
TERCEIRA FASE
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O PREJUÍZO VAI FICAR PEQUENO
64
A LIVRARIA
Simples assim!
66
O Fim do Dinheiro
68
QUERO TER MAIS TEMPO PARA LER
• Várias vezes por mês tenho que pagar minhas contas pela
internet;
• Uma vez por ano faço uma análise geral sobre as aplicações
dos recursos financeiros;
Walter Barretto Jr.
• Uma vez por ano renovo meus seguros de carro, casa e vida;
• Uma vez por ano faço uma análise sobre o meu plano de
previdência;
• Duas vezes por ano tenho que entrar em algum sistema para
mudar uma senha que esqueci;
70
O SISTEMA DEMOCRÁTICO E
O SISTEMA FINANCEIRO
Quer dizer que poucos atores mundiais, que não foram eleitos nem
escolhidos pelo conjunto da sociedade, podem sim prejudicar uma
sociedade formada por cidadãos que estão trabalhando, produzin‑
do, estudando, vivendo com suas famílias, tendo uma vida real e
digna? Sim.
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PROPOSTA RADICAL
E mais uma vez registro que nós temos uma enorme capacidade
de superação, precisamos somente direcionar esforço e inteligência
para o caminho certo.
POR QUE O FIM DO DINHEIRO?
76
A SABEDORIA DOS MAIS VELHOS
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PRESERVAR A TERRA
E o que todos nós juntos queremos? O que todos nós dessa imensa
Terra mais queremos? Apenas o bem comum e a preservação do
nosso planeta Terra.
Nas vossas cartas e nos nossos encontros, — redentora. Porque é dela que precisamos.
relataram-me as múltiplas exclusões e injus‑ Sei que buscais uma mudança e não apenas
tiças que sofrem em cada actividade laboral, vós: nos diferentes encontros, nas várias via‑
em cada bairro, em cada território. São tan‑ gens, verifiquei que há uma expectativa, uma
tas e tão variadas como muitas e diferentes busca forte, um anseio de mudança em todos
são as formas próprias de as enfrentar. Mas os povos do mundo. Mesmo dentro da mino‑
há um elo invisível que une cada uma destas ria cada vez mais reduzida que pensa sair be‑
exclusões: conseguimos nós reconhecê-lo? neficiada deste sistema, reina a insatisfação
É que não se trata de questões isoladas. e sobretudo a tristeza. Muitos esperam uma
Pergunto-me se somos capazes de reconhe‑ mudança que os liberte desta tristeza indivi‑
cer que estas realidades destrutivas corres‑ dualista que escraviza.
pondem a um sistema que se tornou global.
O tempo, irmãos e irmãs, o tempo parece
Reconhecemos nós que este sistema impôs
exaurir-se; já não nos contentamos com lutar
a lógica do lucro a todo o custo, sem pen‑
entre nós, mas chegamos até a assanhar-nos
sar na exclusão social nem na destruição da
contra a nossa casa. Hoje, a comunidade
natureza?
científica aceita aquilo que os pobres já há
Se é assim — insisto — digamo-lo sem medo: muito denunciam: estão a produzir-se danos
Queremos uma mudança, uma mudança real, talvez irreversíveis no ecossistema. Está-se a
uma mudança de estruturas. Este sistema é castigar a terra, os povos e as pessoas de for‑
insuportável: não o suportam os campone‑ ma quase selvagem. E por trás de tanto so‑
ses, não o suportam os trabalhadores, não o frimento, tanta morte e destruição, sente-se
suportam as comunidades, não o suportam o cheiro daquilo que Basílio de Cesareia cha‑
os povos.... E nem sequer o suporta a Terra, a mava “o esterco do diabo”: reina a ambição
irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco. desenfreada de dinheiro. O serviço ao bem
Queremos uma mudança nas nossas vidas, comum fica em segundo plano. Quando o ca‑
nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa rea‑ pital se torna um ídolo e dirige as opções dos
lidade mais próxima; mas uma mudança que seres humanos, quando a avidez do dinheiro
toque também o mundo inteiro, porque hoje domina todo o sistema socioecónomico, ar‑
a interdependência global requer respostas ruína a sociedade, condena o homem, trans‑
globais para os problemas locais. A globali‑ forma-o em escravo, destrói a fraternidade
zação da esperança, que nasce dos povos e inter-humana, faz lutar povo contra povo e
cresce entre os pobres, deve substituir esta até, como vemos, põe em risco esta nossa
globalização da exclusão e da indiferença. casa comum.
Hoje quero reflectir convosco sobre a mudan‑ Não quero alongar-me na descrição dos
ça que queremos e precisamos. Como sabem, efeitos malignos desta ditadura subtil: vós
recentemente escrevi sobre os problemas da conhecei-los! Mas também não basta assi‑
mudança climática. Mas, desta vez, quero nalar as causas estruturais do drama social
falar duma mudança noutro sentido. Uma e ambiental contemporâneo. Sofremos de
mudança positiva, uma mudança que nos um certo excesso de diagnóstico, que às ve‑
faça bem, uma mudança — poderíamos dizer zes nos leva a um pessimismo charlatão ou a
84
O Fim do Dinheiro
rejubilar com o negativo. Ao ver a crónica ne‑ amargamente, que uma mudança de estru‑
gra de cada dia, pensamos que não haja nada turas, que não seja acompanhada por uma
que se possa fazer para além de cuidar de nós conversão sincera das atitudes e do coração,
mesmos e do pequeno círculo da família e acaba a longo ou curto prazo por burocra‑
dos amigos. tizar-se, corromper-se e sucumbir. Por isso
gosto tanto da imagem do processo, onde a
Que posso fazer eu, recolhedor de papelão,
paixão por semear, por regar serenamente o
catador de lixo, limpador, reciclador, frente
que outros verão florescer, substitui a ansie‑
a tantos problemas, se mal ganho para co‑
dade de ocupar todos os espaços de poder
mer? Que posso fazer eu, artesão, vendedor
disponíveis e de ver resultados imediatos.
ambulante, carregador, trabalhador irregular,
Cada um de nós é apenas uma parte de um
se não tenho sequer direitos laborais? Que
todo complexo e diversificado interagindo
posso fazer eu, camponesa, indígena, pesca‑
no tempo: povos que lutam por uma afirma‑
dor que dificilmente consigo resistir à propa‑
ção, por um destino, por viver com dignida‑
gação das grandes corporações? Que posso
de, por “viver bem”.
fazer eu, a partir da minha comunidade, do
meu barraco, da minha povoação, da minha Vós, a partir dos movimentos populares,
favela, quando sou diariamente discrimina‑ assumis as tarefas comuns motivados pelo
do e marginalizado? Que pode fazer aquele amor fraterno, que se rebela contra a injus‑
estudante, aquele jovem, aquele militante, tiça social. Quando olhamos o rosto dos que
aquele missionário que atravessa as favelas sofrem, o rosto do camponês ameaçado, do
e os paradeiros com o coração cheio de so‑ trabalhador excluído, do indígena oprimido,
nhos, mas quase sem nenhuma solução para da família sem tecto, do imigrante perse‑
os meus problemas? Muito! Podem fazer guido, do jovem desempregado, da criança
muito. Vós, os mais humildes, os explorados, explorada, da mãe que perdeu o seu filho
os pobres e excluídos, podeis e fazeis muito. num tiroteio porque o bairro foi tomado
Atrevo-me a dizer que o futuro da humanida‑ pelo narcotráfico, do pai que perdeu a sua
de está, em grande medida, nas vossas mãos, filha porque foi sujeita à escravidão; quando
na vossa capacidade de vos organizar e pro‑ recordamos estes “rostos e nomes” estre‑
mover alternativas criativas na busca diária mecem-nos as entranhas diante de tanto
dos “3 T” (trabalho, tecto, terra), e também sofrimento e comovemo-nos…. Porque “vi‑
na vossa participação como protagonistas mos e ouvimos”, não a fria estatística, mas as
nos grandes processos de mudança nacio‑ feridas da humanidade dolorida, as nossas
nais, regionais e mundiais. Não se acanhem! feridas, a nossa carne. Isto é muito diferente
da teorização abstracta ou da indignação
2. Vós sois semeadores de mudança. Aqui, elegante. Isto comove-nos, move-nos e pro‑
na Bolívia, ouvi uma frase de que gosto curamos o outro para nos movermos juntos.
muito: “processo de mudança”. A mudan‑ Esta emoção feita acção comunitária é in‑
ça concebida, não como algo que um dia compreensível apenas com a razão: tem um
chegará porque se impôs esta ou aquela plus de sentido que só os povos entendem e
opção política ou porque se estabeleceu que confere a sua mística particular aos ver‑
esta ou aquela estrutura social. Sabemos, dadeiros movimentos populares.
Walter Barretto Jr.
Vós viveis, cada dia, imersos na crueza da rebentos; mas, ao mesmo tempo, com uma
tormenta humana. Falastes-me das vossas perspectiva mais ampla, protegendo o arvo‑
causas, partilhastes comigo as vossas lutas. E redo. Trabalhais numa perspectiva que não
agradeço-vos. Queridos irmãos, muitas vezes só aborda a realidade sectorial que cada um
trabalhais no insignificante, no que aparece de vós representa e na qual felizmente está
ao vosso alcance, na realidade injusta que vos enraizada, mas procurais também resolver,
foi imposta e a que não vos resignais opondo na sua raiz, os problemas gerais de pobreza,
uma resistência activa ao sistema idólatra desigualdade e exclusão.
que exclui, degrada e mata. Vi-vos trabalhar
Felicito-vos por isso. É imprescindível que, a par
incansavelmente pela terra e a agricultura
da reivindicação dos seus legítimos direitos, os
camponesa, pelos vossos territórios e co‑
povos e as suas organizações sociais construam
munidades, pela dignificação da economia
uma alternativa humana à globalização exclu‑
popular, pela integração urbana das vossas
siva. Vós sois semeadores de mudança. Que
favelas e agrupamentos, pela auto-constru‑
Deus vos dê coragem, alegria, perseverança e
ção de moradias e o desenvolvimento das
paixão para continuar a semear. Podeis ter a
infra-estruturas do bairro e em muitas activi‑
certeza de que, mais cedo ou mais tarde, vamos
dades comunitárias que tendem à reafirma‑
ver os frutos. Peço aos dirigentes: sede criativos
ção de algo tão elementar e inegavelmente
e nunca percais o apego às coisas próximas,
necessário como o direito aos “3 T”: terra, tec‑
porque o pai da mentira sabe usurpar palavras
to e trabalho.
nobres, promover modas intelectuais e adop‑
Este apego ao bairro, à terra, ao território, à tar posições ideológicas, mas se construirdes
profissão, à corporação, este reconhecer-se sobre bases sólidas, sobre as necessidades re‑
no rosto do outro, esta proximidade no dia‑ ais e a experiência viva dos vossos irmãos, dos
-a-dia, com as suas misérias e os seus hero‑ camponeses e indígenas, dos trabalhadores
ísmos quotidianos, é o que permite realizar o excluídos e famílias marginalizadas, de certeza
mandamento do amor, não a partir de ideias não vos equivocareis.
ou conceitos, mas a partir do genuíno encon‑
tro entre pessoas, porque não se amam os A Igreja não pode nem deve ser alheia a este
conceitos nem as ideias; amam-se as pes‑ processo no anúncio do Evangelho. Muitos
soas. A entrega, a verdadeira entrega nasce sacerdotes e agentes pastorais realizam uma
do amor pelos homens e mulheres, crianças tarefa imensa acompanhando e promoven‑
e idosos, vilarejos e comunidades... Rostos e do os excluídos em todo o mundo, ao lado
nomes que enchem o coração. A partir destas de cooperativas, dando impulso a empreen‑
sementes de esperança semeadas paciente‑ dimentos, construindo casas, trabalhando
mente nas periferias esquecidas do planeta, abnegadamente nas áreas da saúde, des‑
destes rebentos de ternura que lutam por porto e educação. Estou convencido de que
subsistir na escuridão da exclusão, crescerão a cooperação amistosa com os movimentos
grandes árvores, surgirão bosques densos de populares pode robustecer estes esforços e
esperança para oxigenar este mundo. fortalecer os processos de mudança.
Vejo, com alegria, que trabalhais no que No coração, tenhamos sempre a Virgem
aparece ao vosso alcance, cuidando dos Maria, uma jovem humilde duma pequena
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O Fim do Dinheiro
aldeia perdida na periferia dum grande im‑ economia mata. Esta economia exclui. Esta
pério, uma mãe sem teto que soube trans‑ economia destrói a Mãe Terra.
formar um curral de animais na casa de Jesus
com uns pobres paninhos e uma montanha A economia não deveria ser um mecanismo
de ternura. Maria é sinal de esperança para os de acumulação, mas a condigna administra‑
povos que sofrem dores de parto até que bro‑ ção da casa comum. Isto implica cuidar zelo‑
te a justiça. Rezo à Virgem do Carmo, padro‑ samente da casa e distribuir adequadamente
eira da Bolívia, para fazer com que este nosso os bens entre todos. A sua finalidade não é
Encontro seja fermento de mudança. unicamente garantir o alimento ou um “deco‑
roso sustento”. Não é sequer, embora fosse já
3. Por último, gostaria que reflectíssemos, um grande passo, garantir o acesso aos “3 T”
juntos, sobre algumas tarefas importantes pelos quais combateis. Uma economia verda‑
neste momento histórico, pois queremos uma deiramente comunitária — poder-se-ia dizer,
mudança positiva em benefício de todos os uma economia de inspiração cristã — deve
nossos irmãos e irmãs. Disto estamos certos! garantir aos povos dignidade, “prosperidade
Queremos uma mudança que se enriqueça e civilização em seus múltiplos aspectos”.[1]
com o trabalho conjunto de governos, mo‑ Isto envolve os “3 T” mas também acesso à
vimentos populares e outras forças sociais. educação, à saúde, à inovação, às manifesta‑
Sabemos isto também! Mas não é tão fácil ções artísticas e culturais, à comunicação, ao
definir o conteúdo da mudança, ou seja, o desporto e à recreação. Uma economia justa
programa social que reflicta este projecto de deve criar as condições para que cada pessoa
fraternidade e justiça que esperamos. Neste possa gozar duma infância sem privações,
sentido, não esperem uma receita deste desenvolver os seus talentos durante a juven‑
Papa. Nem o Papa nem a Igreja têm o mo‑ tude, trabalhar com plenos direitos durante
nopólio da interpretação da realidade social os anos de actividade e ter acesso a uma dig‑
e da proposta de soluções para os problemas na aposentação na velhice. É uma economia
contemporâneos. Atrever-me-ia a dizer que onde o ser humano, em harmonia com a na‑
não existe uma receita. A história é construída tureza, estrutura todo o sistema de produção
pelas gerações que se vão sucedendo no hori‑ e distribuição de tal modo que as capacida‑
zonte de povos que avançam individuando o des e necessidades de cada um encontrem
próprio caminho e respeitando os valores que um apoio adequado no ser social. Vós — e
Deus colocou no coração. outros povos também — resumis este anseio
Gostaria, no entanto, de vos propor três gran‑ duma maneira simples e bela: “viver bem”.
des tarefas que requerem a decisiva contribui‑
ção do conjunto dos movimentos populares: Esta economia é não apenas desejável e ne‑
cessária, mas também possível. Não é uma
3.1 A primeira tarefa é pôr a economia ao ser‑ utopia, nem uma fantasia. É uma perspectiva
viço dos povos. extremamente realista. Podemos consegui-la.
Os seres humanos e a natureza não devem Os recursos disponíveis no mundo, fruto do tra‑
estar ao serviço do dinheiro. Digamos NÃO a balho intergeneracional dos povos e dos dons
uma economia de exclusão e desigualdade, da criação, são mais que suficientes para o de‑
onde o dinheiro reina em vez de servir. Esta senvolvimento integral de “todos os homens e
Walter Barretto Jr.
88
O Fim do Dinheiro
direitos do homem, mas também no respeito vez mais impotentes para levar adiante pro‑
pelo direito dos povos, sobretudo o direito à jetos de desenvolvimento a serviço de suas
independência”.[3] populações”.[4] Noutras ocasiões, sob o
nobre disfarce da luta contra a corrupção, o
Os povos da América Latina alcançaram, com
narcotráfico ou o terrorismo — graves males
um parto doloroso, a sua independência po‑
dos nossos tempos que requerem uma ac‑
lítica e, desde então, viveram já quase dois
ção internacional coordenada — vemos que
séculos duma história dramática e cheia de
se impõem aos Estados medidas que pouco
contradições procurando conquistar uma in‑
têm a ver com a resolução de tais problemá‑
dependência plena.
ticas e muitas vezes tornam as coisas piores.
Nos últimos anos, depois de tantos mal-en‑
tendidos, muitos países latino-americanos Da mesma forma, a concentração mono‑
viram crescer a fraternidade entre os seus po‑ polista dos meios de comunicação social
vos. Os governos da região juntaram seus es‑ que pretende impor padrões alienantes
forços para fazer respeitar a sua soberania, a de consumo e certa uniformidade cultu‑
de cada país e a da região como um todo que, ral é outra das formas que adopta o novo
de forma muito bela como faziam os nossos colonialismo. É o colonialismo ideológico.
antepassados, chamam a “Pátria Grande”. Como dizem os bispos da África, muitas
Peço-vos, irmãos e irmãs dos movimentos vezes pretende-se converter os países po‑
populares, que cuidem e façam crescer esta bres em “peças de um mecanismo, partes
unidade. É necessário manter a unidade con‑ de uma engrenagem gigante”.[5]
tra toda a tentativa de divisão, para que a Temos de reconhecer que nenhum dos graves
região cresça em paz e justiça. problemas da humanidade pode ser resolvi‑
Apesar destes avanços, ainda subsistem do sem a interacção dos Estados e dos povos
factores que atentam contra este desen‑ a nível internacional. Qualquer acto de en‑
volvimento humano equitativo e coarctam vergadura realizado numa parte do Planeta
a soberania dos países da «Pátria Grande» repercute-se no todo em termos económicos,
e doutras latitudes do Planeta. O novo co‑ ecológicos, sociais e culturais. Até o crime e a
lonialismo assume variadas fisionomias. Às violência se globalizaram. Por isso, nenhum
vezes, é o poder anónimo do ídolo dinhei‑ governo pode actuar à margem duma respon‑
ro: corporações, credores, alguns tratados sabilidade comum. Se queremos realmente
denominados “de livre comércio” e a im‑ uma mudança positiva, temos de assumir
posição de medidas de “austeridade” que humildemente a nossa interdependência.
sempre apertam o cinto dos trabalhadores Mas interacção não é sinónimo de imposição,
e dos pobres. Os bispos latino-americanos não é subordinação de uns em função dos
denunciam-no muito claramente, no docu‑ interesses dos outros. O colonialismo, novo e
mento de Aparecida, quando afirmam que velho, que reduz os países pobres a meros for‑
“as instituições financeiras e as empresas necedores de matérias-primas e mão de obra
transnacionais se fortalecem ao ponto de barata, gera violência, miséria, emigrações
subordinar as economias locais, sobretudo forçadas e todos os males que vêm juntos...
debilitando os Estados, que aparecem cada precisamente porque, ao pôr a periferia em
Walter Barretto Jr.
função do centro, nega-lhes o direito a um países, se empenham por apagar, talvez por‑
desenvolvimento integral. Isto é desigualda‑ que a nossa fé é revolucionária, porque a nos‑
de, e a desigualdade gera violência que ne‑ sa fé desafia a tirania do ídolo dinheiro. Hoje
nhum recurso policial, militar ou dos serviços vemos, com horror, como no Médio Oriente e
secretos será capaz de deter. noutros lugares do mundo se persegue, tortu‑
ra, assassina a muitos irmãos nossos pela sua
Digamos NÃO às velhas e novas formas de
fé em Jesus. Isto também devemos denun‑
colonialismo. Digamos SIM ao encontro entre
ciá-lo: dentro desta terceira guerra mundial
povos e culturas. Bem-aventurados os que
em parcelas que vivemos, há uma espécie de
trabalham pela paz.
genocídio em curso que deve cessar.
Aqui quero deter-me num tema importan‑
Aos irmãos e irmãs do movimento indígena
te. É que alguém poderá, com direito, dizer:
latino-americano, deixem-me expressar a
“Quando o Papa fala de colonialismo, es‑
minha mais profunda estima e felicitá-los por
quece-se de certas acções da Igreja”. Com
procurarem a conjugação dos seus povos e
pesar, vo-lo digo: Cometeram-se muitos e
culturas segundo uma forma de convivência,
graves pecados contra os povos nativos da
a que eu chamo poliédrica, onde as partes
América, em nome de Deus. Reconheceram-
conservam a sua identidade construindo, jun‑
no os meus antecessores, afirmou-o o CELAM
tas, uma pluralidade que não atenta contra
e quero reafirmá-lo eu também. Como São
a unidade, mas fortalece-a. A sua procura
João Paulo II, peço que a Igreja “se ajoelhe
desta interculturalidade que conjuga a reafir‑
diante de Deus e implore o perdão para os
mação dos direitos dos povos nativos com o
pecados passados e presentes dos seus fi‑
respeito à integridade territorial dos Estados
lhos”.[6] E eu quero dizer-vos, quero ser muito
enriquece-nos e fortalece-nos a todos.
claro, como foi São João Paulo II: Peço humil‑
demente perdão, não só para as ofensas da 3.3 A terceira tarefa, e talvez a mais impor‑
própria Igreja, mas também para os crimes tante que devemos assumir hoje, é defender
contra os povos nativos durante a chamada a Mãe Terra.
conquista da América.
A casa comum de todos nós está a ser sa‑
Peço-vos também a todos, crentes e não queada, devastada, vexada impunemente. A
crentes, que se recordem de tantos bispos, covardia em defendê-la é um pecado grave.
sacerdotes e leigos que pregaram e pregam a Vemos, com crescente decepção, sucederem‑
boa nova de Jesus com coragem e mansidão, -se uma após outra cimeiras internacionais
respeito e em paz; que, na sua passagem por sem qualquer resultado importante. Existe
esta vida, deixaram impressionantes obras um claro, definitivo e inadiável imperativo éti‑
de promoção humana e de amor, pondo-se co de actuar que não está a ser cumprido. Não
muitas vezes ao lado dos povos indígenas se pode permitir que certos interesses — que
ou acompanhando os próprios movimentos são globais, mas não universais — se impo‑
populares mesmo até ao martírio. A Igreja, os nham, submetendo Estados e organismos in‑
seus filhos e filhas, fazem parte da identida‑ ternacionais, e continuem a destruir a criação.
de dos povos na América Latina. Identidade Os povos e os seus movimentos são chama‑
que alguns poderes, tanto aqui como noutros dos a clamar, mobilizar-se, exigir — pacífica
90
O Fim do Dinheiro
[1] JOÃO XXIII, Carta enc. Mater et Magistra (15 de Maio de 1961), 3: AAS 53 (1961), 402.
[3] PONTIFÍCIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”, Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 157.
[4] V CONFERÊNCIA GERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE (2007), Documento de Aparecida, 66.
[5] JOÃO PAULO II, Exort. ap. pós-sinodal Ecclesia in Africa (14 de Setembro de 1995), 52: AAS 88 (1996), 32-33. Cf. IDEM,
Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 22: AAS 80 (1988), 539.
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