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PENAL 2ª FASE 35º EXAME

Direito Penal e
Processual Penal
Aulas complementares
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Bons estudos,

Abraços, Equipe Ceisc


2ª FASE OAB | PENAL | 35º EXAME

Direito Penal e Processual Penal


Prof. Nidal Ahmad; Mauro Stürmer;
Arnaldo Quaresma e Letícia Neves

SUMÁRIO

Princípios constitucionais........................................................................................................... 9
1.1 Introdução............................................................................................................................. 9
1.2 Princípio da legalidade....................................................................................................... 10
1.3 Demais princípios............................................................................................................... 16

Inquérito Policial ....................................................................................................................... 29


2.1 Conceito.............................................................................................................................. 29
2.2 Persecução Penal.............................................................................................................. 29
2.3 Natureza Jurídica do Inquérito Policial ............................................................................. 29
2.4 Espécies de Inquéritos ...................................................................................................... 30
2.5 Destinatários....................................................................................................................... 31
2.6 Finalidade ........................................................................................................................... 31
2.7 Instauração do Inquérito Policial ....................................................................................... 31
2.8 Características ................................................................................................................... 34
2.9 Prazo do Inquérito Policial ................................................................................................. 38
2.10 Vícios no Inquérito Policial............................................................................................... 40
2.11 Procedimentos ................................................................................................................. 40
2.12 Indiciamento ..................................................................................................................... 43
2.13 Encerramento do Inquérito Policial................................................................................. 43

Acordo de não persecução penal ........................................................................................... 48


3.1 Conceito.............................................................................................................................. 48
3.2 Requisitos ........................................................................................................................... 48
3.3 Infração penal com pena mínima cominada inferior a quatro anos ............................... 48
3.4 Infração penal praticada sem violência ou grave ameaça.............................................. 49
3.5 Confissão formal e circunstanciada.................................................................................. 49
3.6 Condições........................................................................................................................... 50
3.7 Vedações à celebração do acordo de não persecução penal ....................................... 50
3.8 Direito subjetivo do acusado? ........................................................................................... 51
3.9 Descumprimento do acordo.............................................................................................. 51
3.10 Cumprimento do acordo.................................................................................................. 52

Cadeia de Custódia ................................................................................................................. 53


4.1 Da prova ............................................................................................................................. 53
4.2 Do exame de corpo de delito, da cadeia de custódia e das perícias em geral ............. 53

Da conduta ............................................................................................................................... 61
5.1. Introdução.......................................................................................................................... 61
5.2. Conceito............................................................................................................................. 61
5.3. Ausência de conduta ........................................................................................................ 62
5.4. Dos crimes omissivos....................................................................................................... 64

Da relação de causalidade ...................................................................................................... 70


6.1. Introdução.......................................................................................................................... 70
6.2. Causas absolutamente independentes .......................................................................... 70
6.3. Causas relativamente independentes............................................................................. 73
6.4. Dúvida mais recorrente .................................................................................................... 76

Teoria do dolo e culpa.............................................................................................................. 83


7.1 Do crime doloso ................................................................................................................. 83
7.2 Do crime culposo ............................................................................................................... 84

Princípio da insignificância....................................................................................................... 94
8.1 Introdução........................................................................................................................... 94
8.2 Princípio da insignificância no crime de descaminho ...................................................... 95
Descriminante putativa ............................................................................................................ 98
9.1 Conceito.............................................................................................................................. 98
9.2 Espécies ............................................................................................................................. 98
9.3 Consequências ................................................................................................................ 100

Conflito aparente de normas ................................................................................................. 103


10.1. Introdução...................................................................................................................... 103
10.2. Conflito aparente de normas x concurso de crimes................................................... 104
10.3. Princípios para dirimir o conflito aparente de normas ................................................ 104

Concurso de pessoas ............................................................................................................ 116


11.1. Conceito de concurso de pessoas .............................................................................. 116
11.2. Requisitos...................................................................................................................... 116
11.3. Modalidades de atuação no concurso de pessoas.....................................................119
11.4. Punibilidade do concurso de pessoas......................................................................... 129
11.5. Comunicabilidade das elementares e circunstâncias do crime ................................ 130

Concurso de crimes ............................................................................................................... 135


12.1. Introdução...................................................................................................................... 135
12.2. Concurso de crimes e a relação com outros institutos .............................................. 135
12.3. Concurso material de crimes ....................................................................................... 137
12.4. Concurso formal............................................................................................................ 139
12.5. Crime continuado.......................................................................................................... 144

Lesão Corporal ....................................................................................................................... 154

Crimes em Espécie contra a honra ...................................................................................... 155

Crimes contra a Dignidade Sexual ....................................................................................... 156

Crimes funcionais contra a Administração Pública.............................................................. 157

Crimes praticados por particular contra a Administração Pública ...................................... 158

Crimes contra a Administração da Justiça ........................................................................... 159


Crimes contra a Fé Pública ................................................................................................... 160

Efeitos da sentença condenatória......................................................................................... 161


13.1 Nota introdutória............................................................................................................. 161
13.2 Efeitos principais ............................................................................................................ 161
13.3 Efeitos secundários ....................................................................................................... 161

Extinção da punibilidade ........................................................................................................ 167


14.1 Introdução....................................................................................................................... 167
14.2 Causas de extinção da punibilidade............................................................................. 167

Emendatio Libelli e Mutatio Libelli ......................................................................................... 179


15.1 Introdução....................................................................................................................... 179
15.2 Emendatio libelli ............................................................................................................. 179
15.3 Mutatio libelli ................................................................................................................... 182

Reformatio In Pejus................................................................................................................ 188


16.1 Introdução....................................................................................................................... 188
16.2 Recurso da acusação.................................................................................................... 188
16.3 Recurso da defesa......................................................................................................... 189
16.4 Reformatio in pejus direta.............................................................................................. 189
16.5 Reformatio in pejus indireta........................................................................................... 190

Lei de Drogas ......................................................................................................................... 192

Organização Criminosa e Colaboração Premiada.............................................................. 193

Lei de Abuso de Autoridade .................................................................................................. 194

Lei dos Crimes Hediondos .................................................................................................... 195

Crimes de trânsito .................................................................................................................. 196

Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo ............. 197
Embargos infringentes e de nulidade ................................................................................... 198
17.1 Conceito ......................................................................................................................... 198
17.2 Identificação ................................................................................................................... 199
17.3 Base Legal ..................................................................................................................... 199
17.4 Legitimidade ................................................................................................................... 200
17.5 Cabimento ...................................................................................................................... 200
17.6 Prazo............................................................................................................................... 200
17.7 Forma e competência para o julgamento......................................................................201
17.8 Estruturação ................................................................................................................... 202

Embargos de declaração ...................................................................................................... 208


18.1 Cabimento/conteúdo ..................................................................................................... 208
18.2 Identificação ................................................................................................................... 209
18.3 Base legal....................................................................................................................... 209
18.4 Prazo............................................................................................................................... 209
18.5 Efeito interruptivo..............................................................................................................210
18.6 Estruturação do recurso ................................................................................................ 210

Recurso Especial ................................................................................................................... 215


19.1 Conceito ......................................................................................................................... 215
19.2 Identificação ................................................................................................................... 215
19.3 Base legal....................................................................................................................... 216
19.4 Cabimento/conteúdo ..................................................................................................... 216
19.5 Prazo, interposição e processamento.......................................................................... 217
19.6 Prequestionamento ....................................................................................................... 218
19.7 Estruturação do Recurso Especial ............................................................................... 219

Recurso Extraordinário .......................................................................................................... 223


20.1 Conceito ......................................................................................................................... 223
20.2 Identificação ................................................................................................................... 223
20.3 Base legal....................................................................................................................... 224
20.4 Cabimento/Conteúdo .................................................................................................... 224
20.5 Prazo e interposição ...................................................................................................... 225
20.6 Prequestionamento ....................................................................................................... 225
20.7 Repercussão geral das questões constitucionais ....................................................... 226
20.8 Estruturação do Recurso Extraordinário ...................................................................... 226

PADRÃO DE RESPOSTAS ................................................................................................. 231

Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado com base nas aulas do curso preparatório para
a 2ª Fase do 35º Exame da OAB e deve ser utilizado como um roteiro para as respectivas aulas.
Além disso, recomenda-se que o aluno assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.

Bons estudos, Equipe Ceisc.


Atualizado em junho de 2022.
Princípios constitucionais

Prof. Arnaldo Quaresma


@profarnaldoquaresma

1.1 Introdução
Princípios são valores fundamentais que direcionam a criação do sistema normativo,
indicando os critérios para a compreensão da norma, bem como servindo de base para limitar a
atuação do legislador ordinário e, até mesmo, do órgão julgador e, assim, preservar os direitos e
garantias fundamentais do cidadão.

Os princípios podem ser explícitos, ou seja, expressamente previstos no ordenamento


jurídico, como, por exemplo, o da ampla defesa e do contraditório, disposto no art. 5º, LV, da
Constituição Federal/88; pode ser, ainda, implícito, que derivam daqueles expressamente
positivados, como, por exemplo, o da proporcionalidade entre a gravidade da infração e da pena
cominada pelo legislador ou aplicada pelo julgador.

O principal objetivo dessa fonte é limitar o poder punitivo estatal, razão pela qual os
princípios penais são verdadeiros instrumentos do Estado Democrático de Direito.

Na concepção de Cezar Roberto Bitencourt:

Poderíamos chamar de princípios reguladores do controle penal princípios constitucionais


fundamentais de garantia do cidadão, ou simplesmente de Princípios Fundamentais de
Direito Penal de um Estado Social e Democrático de Direito. Todos esses princípios são
de garantias do cidadão perante o poder punitivo estatal e estão amparados pelo novo
texto constitucional de 1988 (art. 5º). (BITENCOURT, 2011, p. 40)

Conforme ensina Luiz Regis Prado, os princípios “servem de fundamento e de limite à


responsabilidade penal” (PRADO, 2013, p. 156).

Com a mudança de paradigma jurídico, em especial a vivenciada após a 2° Guerra Mundial,


os princípios passam a adquirir força normativa, passando de meras orientações ao legislador e
assumindo um caráter de norma, possuindo força cogente e, inclusive, servindo de parâmetro
para o controle de constitucionalidade em nosso sistema jurídico.
1.2 Princípio da legalidade

O princípio da legalidade encontra-se previsto no art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição


Federal, o qual determina que “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem
prévia cominação legal.” Trata-se da fórmula latina nullum crimen sine lege, que impossibilita a
punição por fato não previsto em lei.

O Código Penal tem idêntica previsão no art. 1º: “Não há crime sem lei anterior que o defina.
Não há pena sem prévia cominação legal.”

Para Cezar Roberto Bitencourt, “pelo princípio da legalidade, a elaboração de normas


incriminadoras é função exclusiva da lei (BITENCOURT, 2011, p. 41).

Princípio: Nullum crimen, nulla poena sine praevia lege.

Base constitucional: Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXIX.

Cabe, portanto, à lei a tarefa de definir e não proibir o crime, propiciando ao agente
prévio e integral conhecimento das consequências penais da prática delituosa e evitando,
assim, qualquer invasão arbitrária em seu direito de liberdade.

OBSERVAÇÕES
1) Como só há crime quando presente a perfeita correspondência entre o fato e a
descrição legal, torna-se impossível sua existência sem lei que o descreva. Conclui-se
que só há crime nas hipóteses taxativamente previstas em lei (PRÍNCÍPIO DA
TAXATIVIDADE).

2) Vale destacar que sanção penal é gênero, do qual são espécies as penas e as medidas
de segurança. Entretanto, em que pese as medidas de segurança não sejam penas,
possuem um caráter aflitivo, eis, que na prática, restringem a liberdade de locomoção dos
inimputáveis em razão de doença mental (artigo 26 do CP), constituindo uma verdadeira
forma de controle social, razão pela qual para a maioria da doutrina também se sujeitam
ao princípio da legalidade.
1.2.1 Vertentes do princípio da legalidade
O princípio da legalidade, tendo em vista o seu conteúdo limitador do direito punitivo estatal,
apresenta algumas vertentes, que surgem como decorrência de sua aplicação:

A) 1° VERTENTE – EXIGÊNCIA DE UMA LEI PRÉVIA (praevia): NÃO HÁ CRIME SEM LEI
ANTERIOR QUE O DEFINA NEM PENA SEM PRÉVIA COMINAÇÃO LEGAL.

Essa vertente nada mais é do que o princípio da proibição da retroatividade da lei penal
insculpido no artigo 5°, inciso XL da Constituição da República, o qual dispõe que a lei penal não
retroagirá, salvo para beneficiar o acusado.

Desta feita, a lei penal mais grave (seja a lei incriminadora ou a novatio legis in pejus) para
incidir a determinado fato tem que ser anterior a ele, justamente para evitar a surpresa e garantir
a segurança jurídico aos cidadãos.

Neste sentido, podemos elencar a súmula 471 do STJ, a qual dispõe que os condenados
por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da lei 11.464/2007
sujeitam-se ao disposto no artigo 112 da LEP.

B) 2° VERTENTE – EXIGÊNCIA DE UMA LEI ESCRITA (scripta)

Essa vertente proíbe a criação de crimes e a imposição de penas por meios dos costumes,
tendo em vista que todo o crime e toda a pena devem estar escritos na lei.

Desta feita, proíbe-se o costume incriminador, não devendo de forma alguma um costume
criar uma infração penal.

Ademais, para a maioria da doutrina e da jurisprudência também é vedado o costume


abolicionista, ou seja, a possibilidade de um costume revogar uma infração penal diante do
princípio da simetria (se há a necessidade de lei para criar um crime também deve existir lei para
revogar uma infração penal).

Neste sentido, o STF já decidiu que não cabe a revogação do crime previsto no artigo 229
do CP pelo princípio da adequação social, tendo em vista que não cabe ao órgão julgador
descriminalizar uma conduta tipificada formal e materialmente pela legislação penal (HC
104.467/ Julgado em 08/02/2011, 1º Turma do STF, Informativo 615).
Também já decidiu o STJ no sentido de se reconhecer a impossibilidade de absolvição da
contravenção penal de jogo do bicho pelo costume em razão do Princípio da Supremacia da Lei
Escrita ( RESP 30705/SP).

FINALIDADE DOS COSTUMES NO DIREITO PENAL MODERNO

Tendo em vista que os costumes não podem criar nem revogar uma infração penal,
podemos destacar que tais fontes servem como vetor interpretativo das normas jurídicas
(por exemplo para interpretar o conceito de repouso noturno como majorante do furto
prevista no artigo 155, parágrafo 1° do CP) bem como para fundamentar uma futura lei
penal abolicionista (como por exemplo no caso do adultério que era tipificado como crime
no artigo 240 do CP e foi revogado posteriormente pela lei 11.106/2005).

C) 3° VERTENTE – EXIGÊNCIA DE UMA LEI ESTRITA (stricta)


Essa vertente se refere a exigência de uma lei estrita, ou seja, uma lei formal (ordinária ou
complementar) oriunda do Poder Legislativo da União.

Desta feita, como uma das consequências dessa exigência, podemos elencar a proibição
da Analogia in malam partem no Direito Penal.

A analogia é uma forma de suprir uma lacuna legislativa, na qual diante de um caso de
omissão legislativa o intérprete se utiliza de uma norma aplicada a um caso semelhante. No
direito penal, diante do princípio da legalidade, há a proibição da analogia em prejuízo ao réu, só
podendo ser utilizada para benefício do acusado.
OBSERVAÇÃO
A medida provisória não é uma lei formal oriunda do Poder Legislativo da União, razão
pela qual, nos termos do artigo 62, parágrafo 1°, inciso II da Constituição da República é
vedada a edição de medida provisória em matéria penal. Neste sentido podemos afirmar
que:

i) Uma medida provisória não é lei em sentido estrito, razão pela qual jamais poderá
veicular matéria atinente a uma norma penal incriminadora, ou seja, não pode criar crime
em hipótese nenhuma.

ii) Há controvérsia doutrinária a respeito da possibilidade de uma medida provisória


veicular matéria penal de caráter não incriminador como por exemplo prever uma
extinção de punibilidade, alguma excludente de ilicitude: a) Uma primeira corrente
defendida por Cléber Masson e Rogério Greco defende que não, uma vez que diante da
redação do artigo 62, parágrafo 1°, inciso II da Constituição haveria vedação absoluta de
medida provisória em matéria penal; b) Já uma segunda corrente defendida por Rogério
Sanches e Luís Flávio Gomes defende que a medida provisória pode veicular matéria
penal não incriminadora, em benefício ao réu.

Cumpre ressaltar que o STF já se pronunciou pela legalidade da MP 1571/97 no informativo


220 (antes da EC 32/01 que expressamente previu a vedação de MP em matéria penal) que
extinguia a punibilidade em razão da reparação do dano em crimes de natureza previdenciária e
tributária, bem como já se manifestou pela legalidade da MP 417/08 (após a EC 32/01) que
estendia a vacatio legis do delito de posse irregular de arma de fogo de uso permitido.

Ademais, o STJ já admitiu medida provisória em favor do acusado (MP 2.187-12 – desconto
direto do Fundo de Participação dos Municípios e repasse mensal ao INSS das parcelas devidas,
equiparando-se ao pagamento do acusado) na PET no Inquérito 512 AC 2004/0177711-8,
Publicado em 08/02/2017).
OBSERVAÇÃO

Competência da União para legislar sobre Direito Penal: Segundo o artigo 22, inciso I
compete privativamente a União legislar sobre direito penal. Entretanto, o artigo 22,
parágrafo único admite que lei complementar federal pode autorizar os Estados a
legislarem sobre direito penal em questões específicas. Entretanto, adverte a doutrina que
essa delegação não pode abranger assuntos referentes à missão fundamental do direito
de penal.

D) 4° VERTENTE – EXIGÊNCIA DE UMA LEI CERTA

A Lei penal deve ser certa, clara, precisa, proibindo-se a incriminação através de conceitos vagos
e imprecisos, justamente para evitar a insegurança jurídica.

Nada mais é do que o princípio da Determinação.

Exemplo: Artigo 5° da Lei 13260/16 – realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito
inequívoco de consumar tal delito.

D.1) PRINCÍPIO DA DETERMINAÇÃO E NORMA EM BRANCO

O Princípio da Determinação exige que a lei penal seja precisa e certa, incriminando a conduta
com precisão, razão pela qual discute-se se a norma penal em branco viola esse princípio.

Norma Penal em Branco é aquela que para ter aplicabilidade necessita de um complemento
normativo:

1) Norma penal em branco homogênea, em sentido amplo ou imprópria – ocorre quando o


complemento tem origem em uma outra lei em sentido formal da União:

Pode ser homovitelina

quando se origina da mesma instância legislativa, como por exemplo, no caso dos crimes
funcionais contra a administração pública (312 a 326 do CP) precisamos buscar o conceito
de funcionário público que também se encontra no CP – artigo 327.
Pode ser heterovitelina

quando se origina de uma estrutura legislativa diversa, como por exemplo, no crime de
bigamia previsto no artigo 235 do CP precisamos ir ao Código Civil para entender o
conceito jurídico de casamento.

2) Norma penal em branco, em sentido estrito ou própria – ocorre quando o complemento


tem origem em órgão sem competência legislativa, como por exemplo, no crime de tráfico de
drogas, precisamos da Portaria 344/98 da Anvisa para entender o que pode ser considerado
como droga).

Desta feita, podemos destacar que a maioria da doutrina entende pela constitucionalidade da
norma penal em branco, inclusive no caso da norma penal em branco heterogênea cujo
complemento se origina de órgão sem competência legislativa diversa.

1.2.2 Princípios inerentes ao princípio da legalidade:


A) PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL

Somente a lei, sem seu sentido estrito, pode definir crimes e cominar penalidades, uma vez
que “a matéria penal deve ser expressamente disciplinada por uma manifestação de vontade
daquele poder estatal a que, por força da Constituição, compete a faculdade de legislar, isto é,
poder legislativo”. (BETTIOL, 1974, p. 108).

B) PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE

Aqui, “para que haja crime e seja imposta pena é preciso que o fato tenha sido cometido
depois de a lei entrar em vigor” (JESUS, 2013, pp. 51-52).

I) PRINCÍPIO DA TAXATIVIDADE – dispõe que o rol incriminador é taxativo, não se admitindo


a incriminação através da analogia e dos costumes.

II) PRINCÍPIO DA DETERMINAÇÃO – a lei penal deve ser precisa e determinada, não se
admitindo a edição de tipos penais abstratos e genéricos.
1.3 Demais princípios
A) PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

O art. 5º, XLVI, da Constituição Federal dispõe que “a lei regulará a individualização da
pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição de liberdade; b) perda de
bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.”

Segundo Queiroz (2013, p. 448), “individualizar a pena significa assim tornar individual uma
situação, algo ou alguém, isto é, particularizar o que antes era geral, a evitar a estandardização.”

Em outras palavras, tal princípio surge da necessidade de individualização da pena para


encontrar a pena justa e se desdobra em 3 fases:

I - 1º Fase: Cominação – é realizada pelo legislador ao estipular uma pena mínima e uma pena
máxima em abstrato na lei penal incriminadora;

II – 2° Fase: Aplicação da pena – é realizada pelo julgador do processo criminal ao proferir uma
sentença condenatória, devendo fixar a pena definitiva (critério trifásico – 68 do CP), estabelecer
o regime inicial de cumprimento de pena (artigo 33, parágrafo 2° do CP), a possibilidade ou não
de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (artigo 44 do CP) e se há a
possibilidade de suspender a execução da pena privativa de liberdade (artigo 77 do CP);

III – 3° Fase: Execução da pena – é realizada pelo juízo da VEC que irá acompanhar e decidir
sobre o cumprimento da pena.
OBSERVAÇÃO

O princípio da individualização da pena já foi utilizado pelo STF inúmeras vezes para se
reconhecer a inconstitucionalidade de uma lei, dentre as quais podemos citar, em
especial:

I – STF HC 82959/SP – 23/02/06: O STF reconheceu a inconstitucionalidade do regime


integralmente fechado estabelecido pela redação original da lei 8072/90, por entender que
a imposição genérica de um mesmo regime sem considerar as circunstâncias do caso
concreto violava a individualização da pena. Desta feita, foi permitida a progressão de
regime utilizando-se como parâmetro o requisito de 1/6 do cumprimento da pena
estabelecido no artigo 112 da LEP;

II – STF HC 111840/ES – INFORMATIVO 672: O STF reconheceu a inconstitucionalidade


da lei 11464/07 (que alterou a lei dos crimes hediondos, passando a admitir a progressão
de regime, entretanto previu a obrigatoriedade do regime inicial fechado) ao impor de
maneira obrigatória o regime inicial fechado nos crimes hediondos e equiparados (artigo
2°, parágrafo 1° da lei 8072/90 com redação determinada pela lei 11464/07);

III – STF HC 97256 – INFORMATIVO 604: O STF reconheceu a inconstitucionalidade dos


artigos 33, parágrafo 4° (vedava a substituição da pena privativa de liberdade por pena
restritiva de direito no tráfico privilegiado) e do artigo 44 da lei 11343/06 (vedação da
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos crimes dos artigos
33, caput, 33 parágrafo 1°, 34 a 37 da lei de drogas por violar a individualização da pena.
Posteriormente, o Senado Federal editou a resolução 5 de 2012 suspendendo a execução
parcial do parágrafo 4º do artigo 33 em relação ao trecho que vedava a conversão em
pena restritiva de direitos.

B) PRINCÍPIO DA PERSONALIDADE OU DA INTRANSCENDÊNCIA

Acerca deste importante princípio, o art. 5º, XLV, da Constituição Federal dispõe que
“nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a
decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra
eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.”
Esse princípio representou um verdadeiro marco no Direito Penal, impondo que a
responsabilização penal é individual e intransferível, não podendo passar da pessoa do
condenado.

Assim, a sanção penal não é transmitida de uma pessoa para a outra, mas as obrigações
cíveis oriundas do ilícito penal podem transferida aos sucessores.

Consiste na expressão do senso comum de que cada um responde pelos seus próprios
atos. Nas palavras de SALIM (2008, p. 224), tal princípio significa, em outras palavras, que só o
autor da infração penal pode ser responsabilizado criminalmente, ou seja, ninguém pode ser
punido por delito cometido por outra pessoa.”

Consequências jurídicas:

1) Em razão do princípio da personalidade ou instranscendência da pena havendo a morte do


agente haverá a extinção da punibilidade, nos termos do artigo 107, inciso I, CP;

2) Em razão desse princípio, a peça acusatória deve individualizar o acusado e descrever de


forma específica o fato a ele imputado, sob pena de não recebimento pela inépcia (CPP, art. 395,
I).

C) PRINCÍPIO DA HUMANIDADE
Fruto da humanização do Direito Penal, o agente (suspeito/indiciado/réu/condenado) deve
ser tratado como pessoa humana e sujeito de direitos fundamentais.

Decorre do art. 1º, III, da Constituição Federal, que especifica a dignidade da pessoa
humana como fundamento do Estado Democrático.

Mais especificamente, advém da vedação às penas de morte (salvo no caso de guerra


declarada), de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis ou degradantes
(art. 5º, XLVII, da CF).

Podemos citar a influência desse princípio com a edição da súmula vinculante 56 do STF,
a qual dispõe que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do
condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os
parâmetros fixados no RE 641.320/RS:
Teses de Repercussão Geral: Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema
normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no
ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, a
obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em
decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.

Ademais, podemos falar que a súmula vinculante 56 também se fundamenta nos princípios
da legalidade e da individualização da pena:

Precedente representativo: Cumprimento de pena em regime fechado, na hipótese de


inexistir vaga em estabelecimento adequado a seu regime. Violação aos princípios da
individualização da pena (art. 5º, XLVI) e da legalidade (art. 5º, XXXIX). A falta de
estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime
prisional mais gravoso. 3. Os juízes da execução penal poderão avaliar os
estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como
adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como
“colônia agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou
estabelecimento adequado” (regime aberto) (art. 33, § 1º, b e c). No entanto, não deverá
haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do
regime fechado. 4. Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados: (i) a saída
antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente
monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por
falta de vagas; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao
sentenciado que progride ao regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas
alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado. [RE
641.320, rel. min. Gilmar Mendes, P, j. 11-5-2016, DJE 159 de 1º-8-2016]

D) PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE OU DA LESIVIDADE


Por esse princípio, não é possível a criminalização de atos que não ofendam seriamente
bem jurídico (QUEIROZ, 2013, p. 100). Também é necessário que tal ato ofenda bem jurídico de
terceiro.

Enquanto o princípio da legalidade fornece o limite formal ao poder de punir do Estado,


dizendo como o Estado deve exercer o seu poder punitivo (através de uma lei prévia, escrita,
estrita e certa), o princípio da ofensividade ou da lesividade fornece o limite material a esse poder
de punir, dispondo sobre quais condutas não devem ser objetos de punição, em especial aquelas
que não possuem o condão de ofender materialmente o bem jurídico tutelado.
Há na doutrina quem defenda que o princípio da lesividade ou ofensividade possui dois
princípios decorrentes, quais sejam o princípio da alteridade ou da transcendentalidade e o da
insignificância ou bagatela, os quais serão explorados a seguir de maneira específica.

E) PRINCÍPIO DA ALTERIDADE OU DA TRANSCENDENTALIDADE

Por este princípio teorizado por Claus Roxin, “a prática criminosa pressupõe uma conduta
que transcenda a esfera individual do agente, sendo capaz de atingir interesse alheio” (SALIM,
2008, p. 226).

Nesse esteio, a conduta puramente interna, ou seja, que não sai da esfera do agente, não
tem lesividade, não devendo ser objeto do Direito Penal.

Como efeito prático desse princípios, o suicídio e a autolesão não são puníveis.

Vale lembrar que induzimento ao suicídio (art. 122 do CP) é crime, pois o agente pratica
uma conduta que ofende direito de outrem. Da mesma forma, a autolesão para fraudar seguro
(art. 171, §2º, inciso V, do CP) é crime, uma vez que o indivíduo estará, ao gerar lesão em si
mesmo, objetivando receber vantagem ilícita em prejuízo da seguradora.

Por fim, esse princípio é um argumento utilizados por aqueles que entendem pela
inadmissibilidade do delito de posse de drogas para uso próprio (art. 28 da Lei de Drogas),
porquanto o usuário não causaria lesão aos direitos de outras pessoas, mas apenas a si próprio.

Neste sentido, o STF está para concluir o julgamento do RE 635.559/SP (com repercussão
geral reconhecida), o qual visa o reconhecimento da inconstitucionalidade do delito previsto no
artigo 28, sendo que até agora três ministros já votaram e a tese que está prevalecendo até o
momento é a de reconhecer a inconstitucionalidade da posse de maconha para uso pessoal (o
relator, ministro Gilmar Mendes, votou pela inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas
(Lei 11.343/2006), que define como crime o porte de drogas para uso pessoal, enquanto o
ministro Edson Fachin e Roberto Barroso votaram para descriminalizar apenas o porte de
maconha para consumo próprio).
F) PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Também idealizado por Claus Roxin, é assim definido por Queiroz (2013, p. 91):

O princípio da insignificância constitui, portanto, um instrumento por cujo meio o juiz, em


razão da manifesta desproporção entre crime e castigo, reconhece o caráter não criminoso
de um fato que, embora formalmente típico, não constitui uma lesão digna de proteção
penal, por não traduzir uma violação realmente importante ao bem jurídico tutelado.

Em suma, pelo princípio da insignificância, o fato é materialmente atípico, apesar de estar


previsto na lei como infração penal, em razão da pequena (insignificante) lesão ao bem jurídico
tutelado. A insignificância afeta a tipicidade material.

O principal exemplo seria o furto de 10 reais praticado contra uma pessoa de boas
condições financeiras.

Segundo o STF (HC 92.961/SP), são requisitos:

i) a Mínima ofensividade da conduta;

ii) a Ausência de periculosidade social da ação;

iii) o Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento;

iv) a Inexpressividade da lesão jurídica.


OBSERVAÇÃO
1) Crimes contra a Administração Pública: O STJ entende inadmissível a aplicação da
insignificância, nos termos da súmula 599 do STJ. Entretanto, o próprio STJ já afastou a
incidência da súmula 599 e reconheceu o princípio em questão nos crimes contra a
administração pública, em um caso ocorrido em novembro de 2013, na cidade de Gravataí
(RS), quando o denunciado passou o carro por cima de um cone de trânsito ao furar um
bloqueio da Polícia Rodoviária Federal.

O relator do recurso no STJ, ministro Nefi Cordeiro, ressaltou que o réu era primário, tinha
83 anos na época dos fatos e o cone avariado custava menos de R$ 20, ou seja, menos
de 3% do salário-mínimo vigente à época. “A despeito do teor do enunciado 599, as
peculiaridades do caso concreto justificam a mitigação da referida súmula, haja vista que
nenhum interesse social existe na onerosa intervenção estatal diante da inexpressiva
lesão jurídica provocada”, entendeu o ministro. (RHC 85.272, 6° TURMA DO STJ,
31/08/2018)

2) Crimes contra a ordem tributária: é aplicável, havendo um limite de R$ 20.000,00,


que é o valor que a Fazenda pode requerer o arquivamento (STF e STJ).

3) Crimes com violência ou grave ameaça: não é aplicável.

4) Posse de drogas para uso próprio: Normalmente a jurisprudência da 1° turma do


STF e do STJ vem entendendo pela inaplicabilidade do princípio da insignificância, ainda
que a quantidade de drogas seja ínfima.

Entretanto, vale destacar que recentemente a 2° Turma do STF (12/11/2019, em sessão


virtual, anulou a condenação por tráfico de drogas imposta a uma mulher flagrada com 1g de
maconha. Por maioria, o colegiado concedeu o Habeas Corpus (HC) 127573, seguindo o voto
do relator, ministro Gilmar Mendes, que entendeu aplicável ao caso o princípio da insignificância,
pois a conduta descrita nos autos não é capaz de lesionar ou colocar em perigo a paz social, a
segurança ou a saúde pública.

O juízo da 1º Vara de Bariri (SP) condenou a mulher à pena de seis anos e nove meses de
reclusão, em regime inicial fechado, pelo crime de tráfico, previsto no artigo 33 da Lei de Drogas
(Lei 11.343/2006). A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-
SP). A Defensoria Pública paulista então impetrou habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça
(STJ) alegando a desproporção da pena aplicada e buscando a incidência do princípio da
insignificância. Negado o pedido por decisão monocrática daquela corte, a defensoria impetrou
o habeas corpus no Supremo.

Em seu voto, o relator destacou que a resposta do Estado não foi adequada nem necessária
para repelir o tráfico de 1g de maconha. Segundo Gilmar Mendes, esse é um exemplo
emblemático de flagrante desproporcionalidade na aplicação da pena em hipóteses de
quantidade irrisória de entorpecentes, e não houve indícios de que a mulher teria anteriormente
comercializado quantidade maior de droga. De acordo com o ministro, no âmbito dos crimes de
tráfico de drogas, a solução para a desproporcionalidade entre a lesividade da conduta e a
reprimenda estatal é a adoção do princípio da insignificância.

O relator observou que o STF tem entendido que o princípio da insignificância não se aplica
ao delito de tráfico, ainda que a quantidade de droga apreendida seja ínfima. Porém, considerou
que a jurisprudência deve avançar na criação de critérios objetivos para separar o traficante de
grande porte do traficante de pequenas quantidades, que vende drogas apenas em razão de seu
próprio vício.

Para ele, se não houver uma clara comprovação da possibilidade de risco de dano da
conduta, o comportamento não deverá constituir crime, ainda que o ato praticado se adeque à
definição legal. “Em verdade, não haverá crime quando o comportamento não for suficiente para
causar um dano ou um perigo efetivo de dano ao bem jurídico, diante da mínima ofensividade
da conduta”, explicou.

Seu voto foi seguido pelos ministros Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Ficaram
vencidos os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia.
OBSERVAÇÃO
5) Crimes patrimoniais cometidos sem violência ou grave ameaça: O STJ vem
reconhecendo a possibilidade de se reconhecer a insignificância se o valor da res é até
10% do valor do salário-mínimo vigente na época dos fatos.

6) Furto qualificado: Em regra a jurisprudência no furto qualificado diante da


reprovabilidade maior da conduta vem negando a aplicação do princípio da insignificância.

Entretanto recentemente, o STJ admitiu a insignificância de um furto qualificado pelo


concurso de agentes, tendo em vista que os objetos subtraídos eram do gênero alimentício e
foram avaliados aproximadamente em 69 reais:

Informativo 665 do STJ de março de 2020: A despeito da presença de qualificadora no


crime de furto possa, à primeira vista, impedir o reconhecimento da atipicidade material da
conduta, a análise conjunta das circunstâncias pode demonstrar a ausência de lesividade do fato
imputado, recomendando a aplicação do princípio da insignificância. No julgamento do HC
553.872/SP (j. 11/02/2020), o STJ admitiu a insignificância de um furto qualificado pelo concurso
de agentes, tendo em vista que os objetos subtraídos eram do gênero alimentício e foram
avaliados em aproximadamente sessenta e nove reais:

A admissão da ocorrência de um crime de bagatela reflete o entendimento de que o Direito


Penal deve intervir somente nos casos em que a conduta ocasionar lesão jurídica de certa
gravidade, devendo ser reconhecida a atipicidade material de perturbações jurídicas
mínimas ou leves, estas consideradas não só no seu sentido econômico, mas também em
função do grau de afetação da ordem social que ocasionem.
O referido princípio deve ser analisado em conexão com os postulados da
fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal, no sentido de
excluir ou afastar a própria tipicidade penal, observando-se a presença de “certos vetores,
como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade
social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a
inexpressividade da lesão jurídica provocada” (HC n. 98.152/MG, Rel. Ministro Celso de
Mello, Segunda Turma, DJe 5/6/2009).

Na hipótese analisada, verifica-se que os fatos autorizam a incidência excepcional do


princípio da insignificância, haja vista as circunstâncias em que o delito ocorreu. Muito embora
esteja presente uma circunstância qualificadora — o concurso de agentes — os demais
elementos descritos nos autos permitem concluir que, neste caso, a conduta perpetrada não
apresenta grau de lesividade suficiente para atrair a incidência da norma penal, considerando a
natureza dos bens subtraídos (gêneros alimentícios) e seu valor reduzido.

G) PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA

No conceito de Damásio de Jesus , tal princípio significa que a “criação de tipos delituosos
deve obedecer a imprescindibilidade, só devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito
Penal, quando os outros ramos do Direito não conseguirem prevenir a conduta ilícita.”

Logo, o Direito Penal é subsidiário, sendo a ultima ratio, ou seja, o último meio de
regulamentação a ser utilizado.

Há na doutrina quem defenda que o princípio da intervenção mínima possui dois princípios
decorrentes, quais sejam o princípio da subsidiariedade e o princípio da fragmentariedade, os
quais serão explorados a seguir de maneira específica.

H) PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE

O princípio da subsidiariedade constitui uma variação do princípio da intervenção mínima.

Pelo princípio da subsidiariedade, o Direito Penal deverá incidir somente em último caso,
quando os demais ramos do direito falharam na tutela do bem jurídico. Busca-se, primeiro, adotar
medidas mais brandas, menos invasivas à liberdade do agente que praticou um ilícito. Se
necessário, o Direito Penal é chamado a atuar como último recurso para a proteção do bem
jurídico violado.

Num primeiro momento, pode parecer que o princípio da subsidiariedade se assemelha ao


da fragmentariedade. A diferença, no entanto, reside no plano de atuação. O princípio da
fragmentariedade se projeta no plano abstrato, ao passo que o princípio da subsidiariedade se
verifica no plano Concreto, quando os demais ramos não se mostrarem eficazes para tutelar o
bem jurídico.

Vê-se, pois, que em relação ao princípio da subsidiariedade, a infração penal já foi


praticada, devendo, no plano concreto, o Direito Penal ser aplicado se outro ramo do direito for
ineficaz. Assim, se a aplicação de outro ramo do direito se mostrar suficiente, não haverá
legitimidade para a aplicação da lei penal.

Como já julgou o Superior Tribunal de Justiça:

A desobediência à ordem de parada emitida pela autoridade de trânsito ou por seus


agentes, ou mesmo por policiais ou outros agentes públicos no exercício de atividades
relacionadas ao trânsito, não constitui crime de desobediência, pois prevista sanção
administrativa específica no art. 195 do Código de Trânsito Brasileiro, o qual não
estabelece a possibilidade de cumulação de sanção penal. Assim, em razão dos princípios
da subsidiariedade do Direito Penal e da intervenção mínima, inviável a responsabilização
da conduta na esfera criminal (AgRg no REsp 1803414/MS, Superior Tribunal de Justiça,
Rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, julgado em 07/05/2019).

I) PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE
Em razão do princípio da fragmentariedade, o Direito Penal protege apenas um fragmento
dos interesses jurídicos, que são os casos de maior gravidade e de bens jurídicos mais
relevantes. É uma decorrência dos princípios da reserva legal e da intervenção mínima (JESUS,
2013, p. 52).

Trata-se de um princípio mais abstrato e referente a forma de legislar. Assim, as leis penais
devem ser feitas de forma fragmentária, tutelando os bens jurídicos mais importantes.

Podemos citar como exemplo do princípio da fragmentariedade o crime de dano, o qual o


legislador somente pune o dano doloso, sendo o dano culposo atípico, ensejando a atuação da
esfera cível e não penal.

Entretanto, vale destacar que em determinados bens jurídicos há uma proteção ampla do
direito penal, por exemplo, no caso da vida, na qual o legislador protege a vida humana
extrauterina ou intrauterina.

J) PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE
No Direito Penal o termo culpabilidade pode ter diferentes acepções:

i) Culpabilidade como elemento integrante do conceito analítico de crime (fato típico, antijurídico
e culpável);
ii) Culpabilidade como elemento medidor da aplicação da pena (artigo 59 do CP: O juiz,
atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos
motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima,
estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime);

iii) Culpabilidade como elemento que visa afastar a responsabilidade penal objetiva – Princípio
da Responsabilidade Penal Subjetiva, o qual será analisado neste item.

J.1) PRINCÍPIO DA RESPONSABILIZAÇÃO PENAL SUBJETIVA

É a base do direito penal moderno, o qual não admite a responsabilização penal objetiva,
ou seja, o agente só pode ser responsabilizado penalmente se tiver agido com dolo ou culpa.

Desta feita, podemos dizer que se não há dolo ou culpa no caso em questão não haverá
conduta penalmente relevante para o direito penal, razão pela qual o fato será atípico, uma vez
que com o finalismo penal tanto o dolo como a culpa fazem parte do conceito de conduta.

Logo, além da necessidade de demonstrar que a conduta foi praticada pelo agente, em
consonância com o princípio da responsabilidade pessoal, deve-se ainda comprovar ter ele agido
com dolo ou culpa, conforme o princípio da responsabilidade penal subjetiva. Neste sentido, por
exemplo, nos crimes de trânsito, não basta que o Ministério Público descreva na denúncia que o
acusado estava na direção do veículo automotor e causou a lesão corporal ou a morte de alguém,
devendo o MP descrever em que consistiu a conduta culposa do agente, ou seja, qual foi a
violação do dever de cuidado em que este agente incorreu (se foi negligente, imperito ou
imprudente), sob pena de inépcia e responsabilidade penal objetiva (Informativo 553, 6° Turma
do STJ, HC 305194, 01/12/2014).

Não obstante isso, identificam-se resquícios da responsabilidade objetiva no contexto da


rixa qualificada (CP, art. 137, parágrafo único), na embriaguez voluntária ou culposa decorrente
da actio libera in causa (CP, art.28, II, do CP), na responsabilidade penal da pessoa jurídica por
crimes ambientais (artigo 3° da lei 9605/98), no artigo 73, parágrafo 2° da lei 4728/65 (lei de
mercado de capitais) ao dispor que a responsabilidade penal recairá sobre todos os diretores da
pessoa jurídica, dentre outros.
K) PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

Trata-se de princípio oriundo de Hans Welzel, consistindo na ideia de que, mesmo que
uma conduta esteja prevista na lei como infração, não será considerada típica se for socialmente
adequada ou reconhecida, isto é, se a sociedade aceitar a conduta. Gera, portanto, a exclusão
da tipicidade.

Exemplos de condutas adequadas socialmente (em algumas há divergência): pequenas


lesões desportivas, corte de cabelo de calouro, oferecimento de bebida alcoólica a adolescentes,
manutenção de casa de prostituição.

Vale destacar que, consoante informado no princípio da legalidade, o STF não aplica o
princípio da adequação social, tendo em vista o princípio da simetria, uma vez que se há a
exigência de lei para criar crimes, também deve existir lei para revogar essa infração penal.

L) PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO BIS IN IDEM

Em matéria penal ninguém pode ser punido duas vezes pelo mesmo fato. Assim, não pode
sofrer duas penas em face do mesmo crime, tampouco ser processado e julgado duas vezes
pelo mesmo fato.

É pacífico que a reincidência, ao ser utilizada como agravante (art. 61, I, do CP), não é bis
in idem. Logo, pode ser aplicada como agravante.

Esclarecendo o alcance do referido princípio, QUEIROZ (2013, p. 89) menciona que


“semelhante princípio proíbe, portanto, a multiplicidade de sanções para o mesmo sujeito, por
um mesmo fato e por sanções que tenham um mesmo fundamento, isto é, que tutelem um
mesmo bem jurídico.”

Como decorrência deste princípio dispõe o artigo 8° do CP que a pena cumprida no


estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é
computada, quando idênticas.
Inquérito Policial

Prof. Mauro Stürmer


@prof.maurosturmer

2.1 Conceito

O processo penal não serve apenas para que o Estado aplique o seu direito de punir, mas
também para que o indivíduo possa defender-se deste Estado.

O inquérito policial é um procedimento administrativo, preparatório e inquisitivo, presidido


pela autoridade policial, que tem por finalidade reunir elementos necessários à apuração da
prática de uma infração penal e sua autoria, a fim de propiciar a propositura da denúncia ou
queixa.

2.2 Persecução Penal

O caminho a ser percorrido pelo Estado para exercer seu direito de punir:

1ª etapa – extraprocessual – inquisitiva – inquérito.

2ª etapa – judicial – contraditória – processo.

2.3 Natureza Jurídica do Inquérito Policial

O que é natureza Jurídica? (o que é isso para o direito).

É um procedimento administrativo – não é processo, pois não se constitui de uma


relação trilateral (delegado – parte A, parte B contraria – contraditório e ampla defesa), por isso
se fala em investigado, que pode ser o objeto de uma investigação.

Cuidado: isso não permite ao delegado desrespeitar direitos e garantias fundamentais


compatíveis com o procedimento.
2.4 Espécies de Inquéritos

→ Policiais: Inquérito Policial; Delegados de Polícia de Carreira – PC ou PF.


→ Não Policiais: Inquéritos Parlamentares – Súmula 397 do STF (Crime ocorrido na
CD ou SF); Inquéritos Presididos por Autoridades Judiciárias ou do MP; Inquérito
civil - MP; Inquéritos Policiais Militares – IPM.

Art. 4º - CPP - A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de
suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua
autoria.
Parágrafo único: A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades
administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.

INVESTIGAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO – Possibilidade

“O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por
prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e
garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do
Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de
jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso
País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV
e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado democrático de Direito
– do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula
Vinculante 14), praticados pelos membros dessa instituição”.

STF. Plenário. RE 593727/MG, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 14/5/2015.
2.5 Destinatários

MP (Ação Penal Pública)

Imediatos

Ofendido ou
Representante legal
(Ação Penal Privada)
Destinatários

Juiz – para
Mediatos fundamentar decisões
cautelares (prisão
preventiva, busca e
apreensão, etc...)

2.6 Finalidade

Fornecer elementos de convicção para que o titular da ação penal (Ministério Público ou
Ofendido) ingresse em juízo.

2.7 Instauração do Inquérito Policial

Art. 5o: Nos crimes de ação pública (incondicionada) o inquérito policial será iniciado:
I - de ofício;
II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a
requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.
§ 1o O requerimento a que se refere o no II conterá sempre que possível:
a) a narração do fato, com todas as circunstâncias;
b) a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de
convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou nomeação das
testemunhas motivos de impossibilidade de o fazer;
c) a, com indicação de sua profissão e residência.
§ 2o Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso
para o chefe de Polícia.
§ 3o Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal
em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade
policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito.
§ 4o O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação
(condicionada a representação), não poderá sem ela ser iniciado.
§ 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a
inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la.

A) Ação Penal Pública Incondicionada

→ De ofício – a autoridade inicia o Inquérito Policial sem a necessidade de que alguém o


informe, toma conhecimento da infração sem a necessidade da ação penal, a peça inaugural é
uma portaria e se trata de uma cognição imediata.

→ Requisição – do juiz ou do Ministério Público – o delegado age provocado pelo juiz ou


pelo Ministério Público – a peça inaugural pode ser a própria requisição, ou pode ser uma
portaria, faz em cima da requisição uma portaria, é uma cognição mediata.

Importante saber para os casos de HC. Autoridade Coatora.

→ Requerimento da vítima ou do seu representante legal – Art. 5º, inciso II, do CPP. A
peça inaugural pode ser a petição da vítima, ou o delegado inaugura por portaria, trata-se de
uma cognição mediata.

Art. 5º, § 1º, CPP: O requerimento a que se refere o no II conterá sempre que possível:
a) a narração do fato, com todas as circunstâncias;
b) a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de
convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou nomeação das
testemunhas motivos de impossibilidade de o fazer;
c) a, com indicação de sua profissão e residência.

§ 2o Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso


para o chefe de Polícia.

→ Flagrante – pode ser instaurado mediante prisão em flagrante. A peça inaugural auto de
prisão em flagrante, trata-se de uma cognição coercitiva.

→ Notícia formulada por qualquer do povo – Art. 5º, § 3º, do CPP.

§3º Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de


infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por
escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das
informações, mandará instaurar inquérito
A notícia pode ser anônima?
Notícia anônima pode fundamentar a instauração de Inquérito Policial, desde que apurado
preliminarmente a viabilidade da notícia, investigado antes, realizado rápida diligência
para verificar a veracidade da notícia e, se procedente, elabora portaria e instaura o
Inquérito Policial.

B) Ação Penal Pública Condicionada: Art. 5º, §4º, do CP

§ 4o O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação (Ação


Penal Pública Condicionada), não poderá sem ela ser iniciado.

C) Ação Penal de Iniciativa Privada: Art. 5º, §5º, do CPP

§ 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a


inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la.
2.8 Características

Instrumental

Obrigatório

Discricionário

Dispensável

Informativo
Características
Escrito

Sigiloso

Inquisitivo

Indisponível

Temporário

a) Instrumental: o Inquérito Policial tem por finalidade apurar a materialidade da infração


penal e indícios da autoria;

b) Obrigatório: havendo justa causa, o delegado não pode deixar de instaurar o


procedimento investigatório, a autoridade não pode deixar de instaurar:
Art. 5º: Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado:
§ 2º Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso
para o chefe de Polícia.

c) Discricionário: os atos de investigação são da análise exclusiva da autoridade policial,


que estudará sua conveniência e oportunidade; a discricionariedade diz respeito às diligências:

Art. 14: O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer
diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade.

Cuidado: no caso de o crime deixar vestígios (não-transeunte) o ECDL será obrigatório.

d) Dispensável: se o titular da ação penal tiver provas da materialidade e indícios da


autoria por outro meio, o Inquérito Policial é dispensável:

Art. 39, § 5o: O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a


representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e,
neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 dias.

e) Informativo: os elementos colhidos no IP servirão apenas para subsidiar a ação penal:

Art. 155: O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em
contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não
repetíveis e antecipadas.

Exclusivamente com base no Inquérito Policial não cabe condenação, mas junto com
outras provas cabe – Art. 155 do CPP – o Inquérito Policial não pode ser a única fonte para a
condenação.

f) Escrito: Art. 9o: Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado,
reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.
g) Sigiloso: Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à
elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.

Não é sigiloso para:

1) Juiz;

2) Ministério Público: pode acompanhar o inquérito e ser o mesmo promotor na ação penal –
Súmula 234 STJ.

Súmula 234: A participação de membro do ministério público na fase investigatória criminal não
acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

3) Advogado: Art. 7º, inciso XIV, do EOAB e Súmula Vinculante 14.

Art. 7 XXI (EAOB): assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações,
sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e,
subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes
ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva
apuração:
a) apresentar razões e quesitos; (perguntas...)
Art. 7, XIV da Lei 8.906/94 (EOAB): examinar, em qualquer instituição responsável por
conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de
qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo
copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital;

Súmula Vinculante 14: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo
aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório

realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito
de defesa.

É direito do advogado de acompanhar e auxiliar seu cliente durante o interrogatório ou


depoimento no curso da investigação
• Direito do advogado de examinar os autos de investigação

Estatuto da OAB (Lei nº 8.906/94)


ANTES AGORA

Art. 7º São direitos do advogado: Art. 7º São direitos do advogado:


(...) (...)
XIV – examinar em qualquer XIV – examinar, em qualquer
repartição policial, mesmo sem instituição responsável por
procuração, autos de flagrante e de conduzir investigação, mesmo sem
inquérito, findos ou em andamento, procuração, autos de flagrante e de
ainda que conclusos à autoridade investigações de qualquer
podendo copiar peças e tomar natureza, findos ou em andamento,
apontamentos; ainda que conclusos à autoridade,
podendo copiar peças e tomar
apontamentos, em meio físico ou
digital.

Art. 7º, § 11 do EOAB: No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá
delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em
andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de
comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências.

Art. 7º, § 12 do EOAB: A inobservância aos direitos estabelecidos no inciso XIV, o


fornecimento incompleto de autos ou o fornecimento de autos em que houve a retirada de
peças já incluídas no caderno investigativo implicará responsabilização criminal e
funcional por abuso de autoridade do responsável que impedir o acesso do
advogado com o intuito de prejudicar o exercício da defesa, sem prejuízo do direito
subjetivo do advogado de requerer acesso aos autos ao juiz competente.
A nova legislação trouxe a necessidade de o advogado estar presente no Inquérito
Policial?

Não. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o


inquérito policial é procedimento inquisitivo e não sujeito ao contraditório, razão pela qual
a realização de interrogatório sem a presença de advogado não é causa de nulidade. (...)
STJ. 6ª Turma. HC 139.412/SC.

É possível alegar suspeição do Delegado que preside um Inquérito Policial?

Não. Art. 107 do CPP: Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos
do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal.

h) Inquisitivo: não havendo acusado, mas somente suspeito, não se aplica ao


Inquérito Policial o contraditório e a ampla defesa.

i) Indisponível: Art. 17 do CPP: A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos
de inquérito.

j) Temporário: é uma garantia constitucional. Art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88 – duração
razoável do processo.

Art. 5º, inciso LXXVIII: a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a
razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

O Inquérito Policial, estando o investigado solto, pode ser prorrogável enquanto for
necessário, devendo se comprovar a justa necessidade em cada prorrogação.

2.9 Prazo do Inquérito Policial

Regra geral:

Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em
flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do
dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto,
mediante fiança ou sem ela.
§ 3º Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá
requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas
no prazo marcado pelo juiz.

Indiciado preso – 10 dias. Improrrogável


Indiciado solto – 30 dias. Prorrogável

2.9.1 Prazos especiais

Lei nº 5.010/66: prazo de conclusão do Inquérito Policial na Justiça Federal – Art. 66:

• Indiciado preso: 15 dias, prorrogáveis por mais 15 dias;

Segundo o artigo 66, o preso deverá ser apresentado ao Juiz para a prorrogação.

• Indiciado solto: 30 dias, prorrogáveis a critério do juiz – segue o Código de Processo


Penal.

Lei 11.343/06 – lei de drogas:

• Indiciado preso: 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias;


• Indiciado solto – 90 dias, prorrogáveis por mais 90 dias.

2.9.2 Prazo máximo para instauração

Art. 13-B. Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de


pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderão requisitar,
mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como
sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do
delito em curso.
§ 3º Na hipótese prevista neste artigo, o inquérito policial deverá ser instaurado no prazo
máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado do registro da respectiva ocorrência
policial.
2.10 Vícios no Inquérito Policial

Não sendo o Inquérito Policial um ato do Poder Judiciário, mas sim um procedimento
administrativo, os vícios que existam nesta fase da persecução penal não acarretam
nulidade processual.

Cuidado: a irregularidade poderá, entretanto, acarretar a invalidade de um ato. É o que


ocorre com a prisão em flagrante irregular etc.

2.11 Procedimentos

Conforme previsão do art. 6º do CPP:

Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial
deverá:
I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação
das coisas, até a chegada dos peritos criminais;
II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos
criminais;
III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas
circunstâncias;
IV - ouvir o ofendido;
V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III
do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas
que Ihe tenham ouvido a leitura;
VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se
for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;
VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e
fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e
social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e
durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu
temperamento e caráter.

• Observações quanto aos procedimentos:

a) Local dos fatos: Exceção – Lei nº 5.970/73 – no seu artigo 1º, diz que no caso de
acidente de trânsito, que esteja colocando em perigo pessoas ou atrapalhando o trânsito,
não precisa manter o estado de conservação;
b) O interrogatório policial, primeiro, se houver defensor, é possível entrevista
reservada, mas no interrogatório policial é dispensável a presença do defensor (prerrogativa do
advogado); primeiro o delegado pergunta sobre o suspeito, depois pergunta sobre o fato, mas
não há contraditório, não existe reperguntas, pois o Inquérito Policial é inquisitivo; tem
delegado que autoriza as reperguntas;

c) Acusado menor de 21 anos, no interrogatório judicial não precisa de curador, porque a


Lei nº 10.792/03 aboliu a figura do curador no interrogatório judicial (aboliu porque a presença
do advogado mostra que é totalmente dispensável, pois faz às vezes de curador); no Inquérito
Policial, artigo 15 do Código de Processo Penal prevê que precisa de curador, mas este
artigo foi implicitamente revogado pelo Código Civil/02, não sendo mais preciso de
curador: “Art. 15. Se o indiciado for menor, ser-lhe-á nomeado curador pela autoridade policial.
(implicitamente revogado pelo CC/02)”;

d) Identificação criminal: Parece que todo o indiciado deve “tocar piano”, mas não é
assim, mudou com a Constituição Federal/88. Até a Constituição Federal/88 – o artigo 6º, inciso
VIII, do Código de Processo Penal – qualquer indiciado tocava piano; com a Constituição
Federal/88, no artigo 5º, inciso LVIII – diz que: “o civilmente identificado não será submetido a
identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”. Previu como regra a identificação
civil, sendo a exceção a identificação datiloscópica; casos expressos em lei – Lei nº 12.037/09.
Com a Constituição Federal/88 a regra é a identificação civil, por documento hábil; a
exceção é a identificação datiloscópica.

Atenção: novo inciso no artigo 6º do CPP:


X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem
alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos,
indicado pela pessoa presa.

e) Reprodução simulada dos fatos, (reconstituição) – art. 7º, CPP


Previsão legal:

Art. 7º, CPP: Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de
determinado modo, a autoridade policial poderá (discricionariedade) proceder à
reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem
pública.

Não pode realizar o expediente se contrariar a moral (exemplo: reconstituição de estupro)


e a ordem pública (exemplo: reconstituição de um acidente de avião – quer que dois aviões se
choquem no ar), é a reconstituição que coloque em perigo a sociedade;
Importante:
O suspeito não é obrigado a participar do ato de reconstituição, quer dizer tomar parte
no ato, produzindo prova contra si mesmo.
Novidade Legislativa: Art. 13, CPP:

Art. 13-A: Nos crimes previstos nos arts. 148, 149 e 149-A, no § 3º do art. 158 e no art.
159 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e no art. 239 da
Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), o membro
do Ministério Público ou o delegado de polícia poderá requisitar, de quaisquer órgãos do
poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da
vítima ou de suspeitos.
Parágrafo único. A requisição, que será atendida no prazo de 24 (vinte e quatro) horas,
conterá:
I - o nome da autoridade requisitante;
II - o número do inquérito policial; e
III - a identificação da unidade de polícia judiciária responsável pela investigação.

Art. 13-B: Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de


pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderão requisitar,
mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como
sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do
delito em curso. (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016)

§ 1o: Para os efeitos deste artigo, sinal significa posicionamento da estação de cobertura,
setorização e intensidade de radiofrequência.

§ 2o: Na hipótese de que trata o caput, o sinal:


I - não permitirá acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza, que
dependerá de autorização judicial, conforme disposto em lei;
II - deverá ser fornecido pela prestadora de telefonia móvel celular por período não superior
a 30 (trinta) dias, renovável por uma única vez, por igual período;
III - para períodos superiores àquele de que trata o inciso II, será necessária a
apresentação de ordem judicial.

§ 3o: Na hipótese prevista neste artigo, o inquérito policial deverá ser instaurado no prazo
máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado do registro da respectiva ocorrência
policial.

§ 4º: Não havendo manifestação judicial no prazo de 12 (doze) horas, a autoridade


competente requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados –
como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos
suspeitos do delito em curso, com imediata comunicação ao juiz.
2.12 Indiciamento

Conceito: é o ato pelo qual o delegado atribui a alguém a prática de uma infração penal,
baseado em indícios da autoria e prova da materialidade.

Lei 12.830/13:

Art. 2, § 6o: O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato


fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria,
materialidade e suas circunstâncias.

STF. 2ª Turma. HC 115015/SP, rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 27/8/2013 (Info 717).
O indiciamento é ato privativo da autoridade policial, segundo sua análise técnico-
jurídica do fato. O juiz não pode determinar que o Delegado de Polícia faça o
indiciamento de alguém.

2.13 Encerramento do Inquérito Policial

Previsão legal:

Art. 10, §1º: A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará
autos ao juiz competente.

§ 2º: No relatório poderá a autoridade indicar testemunhas que não tiverem


sido inquiridas, mencionando o lugar onde possam ser encontradas.

O Inquérito Policial encerra com a apresentação de minucioso relatório, faz um resumo do


que foi feito.

Se o relatório não foi feito?

Não gera a nulidade, é mera irregularidade.

O Inquérito Policial é, então, encaminhado para o juiz competente.


O juiz deve verificar se a caso de Ação Penal de Iniciativa Pública ou Ação Penal de
Iniciativa Privada – Art. 19 do CPP – se for ação penal privada fica aguardando o requerente,
se for ação penal pública é remetido ao Ministério Público.

Art. 19: Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão
remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu
representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado.

2.13.1 Procedimentos no encerramento

Ao receber os autos o Juiz (poder judiciário) deve:

1) No caso de ação penal pública, encaminhar os autos ao Ministério Público;

2) Ação Penal Privada (art. 19, CPP), deixar os autos em cartório aguardando
manifestação.

O Ministério Público ao receber os autos do Inquérito Policial deve:

1) Requerer diligências: “Art. 16. O Ministério Público não poderá requerer a devolução do
inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da
denúncia.”

2) Oferecer a denúncia (peça que inaugura a ação penal pública);

3) Requer o arquivamento;

4) Alegar ausência de atribuição (Ministério Público) ou competência (Juízo).

• Pacote Anticrime (ainda suspenso por decisão do STF):

Art. 28: Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos


informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao
investigado e à autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de revisão
ministerial para fins de homologação, na forma da lei.
§ 1º: Se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do
inquérito policial, poderá, no prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação,
submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme
dispuser a respectiva lei orgânica.
§ 2º: Nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e
Municípios, a revisão do arquivamento do inquérito policial poderá ser provocada pela
chefia do órgão a quem couber a sua representação judicial.

O STF (Min. Luiz Fux) suspendeu o trecho que modificou o Artigo 28 do Código de
Processo Penal (CPP) e estabeleceu regras para o arquivamento de inquéritos policiais.
Com a norma, o Ministério Público (MP) deveria comunicar a vítima, o investigado e a
polícia no caso de arquivamento do inquérito, além de encaminhar os "autos para a
instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei". Para Fux, a
medida desconsiderou os impactos financeiros no âmbito do MP em todo o país.

Arquivamento na antiga redação do CPP, mas ainda aplicada em face da suspensão do


STF:

Quem pode arquivar? Somente o Juiz.

Se o Juiz não concordar com o pedido de arquivamento do MP? Neste caso o


magistrado lança mão do artigo 28 do Código de Processo Penal, a saber:

Art. 28: Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o


arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso
de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de
informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do
Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então
estará o juiz obrigado a atender.

Entendendo o artigo 28 do Código de Processo Penal: No caso de o Juiz discordar ele


encaminha os autos ao PGJ (Chefia do Ministério Público).

Justiça Estadual: O PGJ poderá adotar três procedimentos:

1) Concordar com o Juiz e ele mesmo oferecer a denúncia;


2) Designar outro representante do Ministério Público para oferecê-la (não pode ser o mesmo
que pediu o arquivamento);

3) Discordar do Juiz (concordando ser caso de arquivamento). Nesta situação o MM é obrigado


a arquivar.

• Desarquivamento do Inquérito Policial

Fundamento legal:

Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por
falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas,
se de outras provas tiver notícia

Motivo do ARQUIVAMENTO: Pode ser DESARQUIVADO?


Sim (súmula 524/STF). Arquivado o
inquérito policial, por despacho do juiz, a
1) Insuficiência de provas requerimento do promotor de justiça, não
pode a ação penal ser iniciada sem
novas provas.
2) Ausência de pressuposto processual
Sim
ou de condição da ação penal
3) Falta de justa causa para a ação
penal (não há indícios de autoria ou Sim
prova da materialidade)
4) Atipicidade (fato narrado não é crime) Não
5) Existência manifesta de causa STJ – Não (REsp 791471/RJ)
excludente de ilicitude STF – Sim (HC 125101/SP)
6) Existência manifesta de causa
Não – posição doutrinária
excludente de culpabilidade
7) Existência manifesta de causa Não (STJ, HC 307.562/RS) e (STF, Pet
extintiva da punibilidade 3943) Exceção: certidão de óbito falsa.
Decisão do STF:
O arquivamento de inquérito policial por excludente de ilicitude realizado com base em
provas fraudadas não faz coisa julgada material.
STF. Plenário. HC 87395/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 23/03/2017
(Info 858).
Observação 1: o STF entende que o inquérito policial arquivado por excludente de ilicitude
pode ser reaberto mesmo que não tenha sido baseado em provas fraudadas. Se for com
provas fraudadas, como no caso acima, com maior razão pode ser feito o
desarquivamento.
Observação 2: ao contrário do STF, o STJ entende que o arquivamento do inquérito
policial baseado em excludente de ilicitude produz coisa julgada material e, portanto, não
pode ser reaberto. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. RHC 46.666/MS, Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior, julgado em 05/02/2015.
Acordo de não persecução penal

Prof. Me. Mauro Stürmer


@prof.maurosturmer

3.1 Conceito

Trata-se de negócio jurídico extrajudicial, celebrado entre o Ministério Público e o autor


da infração penal, devidamente acompanhado por advogado, e, revestindo-se de todas as
formalidades, homologado pelo juiz competente, no caso, a princípio, pelo juiz de garantias (Art.
3º- B, inciso XVII, do CPP).

Em outras palavras, verificando-se que não se trata de caso de arquivamento do inquérito


policial, o Ministério Público e o indiciado poderão entabular acordo, com a finalidade de evitar o
oferecimento da denúncia, e desencadeamento da ação penal, mediante o cumprimento de
determinadas condições.

3.2 Requisitos

Nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal, o acordo de não persecução
penal poderá ser celebrado desde que preenchidos os seguintes requisitos:

3.3 Infração penal com pena mínima cominada inferior a quatro anos

Aqui um especial cuidado. O requisito leva em conta a pena mínima e não a máxima
cominada ao delito.

Para verificação deste requisito, deverão ser consideradas as causas de aumento e


diminuição da pena, bem como o concurso de crimes.

Em se tratando de causa de aumento de pena, deve-se utilizar a fração que menos


aumenta. Assim, se a infração penal previr causa de aumento de pena de 1/6 a 1/2, deve-se
considerar a fração de 1/6.
Em relação à diminuição da pena, deve-se utilizar a fração que mais diminua (exemplo:
se o crime for tentado a redução será de 1/3 a 2/3 - artigo 14, parágrafo único, do Código Penal.
Nesse caso, deve-se considerar a fração que mais diminua: 2/3). Tudo isso para se chegar à
pena mínima. Se superar 01 ano, o agente não terá direito à suspensão condicional do processo.

É o que se extrai das Súmulas 723 do STF1 e 243 do STJ2.

3.4 Infração penal praticada sem violência ou grave ameaça

A expressão “infração penal” constitui gênero das espécies crime e contravenção. Logo,
o acordo de não persecução penal poderá ser celebrado no contexto de crimes e contravenções
penais.

Além disso, a violência deve ser considerada na conduta e não em relação ao resultado.
Logo, a exigência de crime praticado sem violência ou grave ameaça está relacionada aos crimes
dolosos, não alcançando os crimes culposos.

Assim, seria possível, desde que preenchidos os demais requisitos, o acordo de não
persecução penal em relação a crime de homicídio culposo (Art. 121, § 3º, do CP), já que não
há dolo no resultado.

3.5 Confissão formal e circunstanciada

Havendo interesse em celebrar o acordo, o indiciado deverá contribuir para a elucidação


dos fatos, confessando formal e circunstanciadamente a prática delituosa.

1Súmula 723 STF: "Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena
mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano."
2Súmula 243 STJ "O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas
em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo
somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.”
3.6 Condições

Além de preencher os requisitos previstos em lei, o indiciado deverá concordar em cumprir


as condições ajustadas, cumulativa e alternativamente.

Nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal, as condições são as seguintes:

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como


instrumentos, produto ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à


pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo
juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
(Código Penal);

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº


2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a
ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens
jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde
que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

3.7 Vedações à celebração do acordo de não persecução penal

Nos termos do artigo 28-A, § 2º, do Código de Processo Penal, o acordo de não
persecução penal não se aplica nas seguintes hipóteses:

I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos
termos da lei;

II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem


conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais
pretéritas;
III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da
infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do
processo; e

IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados


contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.

3.8 Direito subjetivo do acusado?

Há quem sustente que, preenchidos os requisitos legais, a possibilidade de acordo de não


persecução penal constitui direito subjetivo do indiciado, devendo, pois, ser viabilizado pelo
Ministério Público a celebração do instituto.3

Todavia, adotando posição contrária, Renato Brasileiro entende que não se trata de direito
subjetivo do indiciado, já que se trata de instituto que deve resultar da convergência de vontades,
com necessidade ativa das partes.4

Além disso, nos termos do artigo 28-A, § 14, do Código de Processo Penal,

No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução
penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28
deste Código.

3.9 Descumprimento do acordo

Nos termos do artigo 28-A, § 10, do Código de Processo Penal,

Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal,


o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento
de denúncia.

3 LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva. 2020, p. 221.
4 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 276
Assim, a consequência do descumprimento do acordo de não persecução penal será o
oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, que poderá utilizar essa circunstância para o
não oferecimento da proposta de suspensão condicional do processo (Art. 28-A, § 11, do CPP).

3.10 Cumprimento do acordo

Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará


a extinção de punibilidade (Art. 28-A, § 13, do CPP).

O acordo de não persecução penal não gera maus antecedentes e muito menos
reincidência, e não constará na certidão de antecedentes criminais do imputado, salvo para
verificação da possibilidade de novo acordo por fato distinto (Art. 28-A, § 12, do CPP).
Cadeia de Custódia

Prof. Arnaldo Quaresma


@profarnaldoquaresma

4.1 Da prova
4.2 Do exame de corpo de delito, da cadeia de custódia e das perícias em geral

Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos


utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais
ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu
reconhecimento até o descarte. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com
procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial fica responsável por sua preservação. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido,
que se relaciona à infração penal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes


etapas: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar
o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime; (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no
corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias,
filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo
perito responsável pelo atendimento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando
suas características e natureza; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado
de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e
biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou
a coleta e o acondicionamento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições
adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a
manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser
documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e
unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o
vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo,
assinatura e identificação de quem o recebeu; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a
metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se
obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do
material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou
transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação
vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial. (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)

Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial,
que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for
necessária a realização de exames complementares. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 1º Todos os vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser tratados
como descrito nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza criminal
responsável por detalhar a forma do seu cumprimento. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 2º É proibida a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios
de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo tipificada
como fraude processual a sua realização. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento do vestígio será determinado pela


natureza do material. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Todos os recipientes deverão ser selados com lacres, com numeração individualizada,
de forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade do vestígio durante o transporte.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas características, impedir
contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de
informações sobre seu conteúdo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º O recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e,
motivadamente, por pessoa autorizada. (Incluído Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º Após cada rompimento de lacre, deve se fazer constar na ficha de acompanhamento
de vestígio o nome e a matrícula do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como
as informações referentes ao novo lacre utilizado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 5º O lacre rompido deverá ser acondicionado no interior do novo recipiente. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
Art. 158-E. Todos os Institutos de Criminalística deverão ter uma central de custódia
destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão deve ser vinculada diretamente
ao órgão central de perícia oficial de natureza criminal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 1º Toda central de custódia deve possuir os serviços de protocolo, com local para
conferência, recepção, devolução de materiais e documentos, possibilitando a seleção, a
classificação e a distribuição de materiais, devendo ser um espaço seguro e apresentar
condições ambientais que não interfiram nas características do vestígio. (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º Na central de custódia, a entrada e a saída de vestígio deverão ser protocoladas,
consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito que a eles se relacionam.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º Todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado deverão ser
identificadas e deverão ser registradas a data e a hora do acesso. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 4º Por ocasião da tramitação do vestígio armazenado, todas as ações deverão ser
registradas, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, a destinação,
a data e horário da ação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Art. 158-F. Após a realização da perícia, o material deverá ser devolvido à central de
custódia, devendo nela permanecer. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Parágrafo único. Caso a central de custódia não possua espaço ou condições de
armazenar determinado material, deverá a autoridade policial ou judiciária determinar as
condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento do
diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)

A) NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
Como se sabe a lei 13.964/19 (pacote anticrime) foi publicada no dia 24/12/2019 e entrou
em vigor 30 dias após a sua publicação, alterando inúmeros dispositivos do Código Penal, do
Código de Processo Penal e da legislação penal especial, dentre os quais analisaremos neste
tópico as modificações inerentes à prova pericial.

A inclusão dos artigos em questão representa um grande avanço em se tratando de prova


pericial, bem como demonstra a intenção do legislador em profissionalizar tanto a prova pericial
bem como a gestão dos órgãos de perícia acerca de tal matéria.

De um modo geral, podemos afirmar que o legislador conferiu um tratamento legal a


questão da cadeia de custódia, positivando-a em nosso CPP, trazendo o seu conceito, no caput
do artigo 158-a, elencando as suas fases ou etapas no artigo 158-B. Podemos elencar também
a previsão da criação do órgão central de custódia responsável pela guarda e controle dos
vestígios encontrados na cena do crime elencada no artigo 158-E do CPP.

B) CADEIA DE CUSTÓDIA
O conceito de cadeia de custódia possui natureza legal e está elencado no artigo 158-A
do CPP:

Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos


utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais
ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu
reconhecimento até o descarte. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Vale destacar que a cadeia de custódia não se trata de uma novidade doutrinária, nem
jurisprudencial, bem como o legislador, de forma esparsa, prevê, de certa maneira, a cadeia de
custódia em alguns dispositivos no CPP:

Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial
deverá:
I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das
coisas, até a chegada dos peritos criminais;

Art. 245. As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador consentir
que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os executores mostrarão e lerão
o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta.
§ 6º Descoberta a pessoa ou coisa que se procura, será imediatamente apreendida e
posta sob custódia da autoridade ou de seus agentes.

Entretanto, vale destacar que com a inclusão dos artigos 158-A e seguintes do CPP houve
uma profissionalização dessa cadeia de custódia, havendo um grande avanço normativo,
devendo destacar que o legislador teve a preocupação de pormenorizar o procedimento da
preservação dessa prova, como podemos notar pela leitura dos seguintes parágrafos do artigo
158 -A do CPP:

§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com


procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial fica responsável por sua preservação. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido,
que se relaciona à infração penal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Ademais, a novel legislação profissionalizou a cadeia de custódia, criando um verdadeiro


procedimento, do ponto de vista normativo. Neste sentido, importante elencar o artigo 158-b do
CPP, o qual dispõe que a cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas
seguintes etapas:

I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a


produção da prova pericial; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar
o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime; (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no
corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias,
filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo
perito responsável pelo atendimento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando
suas características e natureza; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado
de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e
biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou
a coleta e o acondicionamento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições
adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a
manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser
documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e
unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o
vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo,
assinatura e identificação de quem o recebeu; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a
metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se
obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do
material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou
transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação
vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)

De todas estas etapas envolvendo a cadeia de custódia, mister ressaltar a preocupação do


legislador com a coleta do vestígio, seu respectivo acondicionamento e o posterior
armazenamento, etapas pormenorizadas nos artigos 158-c, 158-d e 158-f do CPP:

Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial,
que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for
necessária a realização de exames complementares. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 1º Todos os vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser tratados
como descrito nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza criminal
responsável por detalhar a forma do seu cumprimento. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 2º É proibida a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios
de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo tipificada
como fraude processual a sua realização. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento do vestígio será determinado pela
natureza do material. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Todos os recipientes deverão ser selados com lacres, com numeração individualizada,
de forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade do vestígio durante o transporte.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas características, impedir
contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de
informações sobre seu conteúdo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º O recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e,
motivadamente, por pessoa autorizada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º Após cada rompimento de lacre, deve se fazer constar na ficha de acompanhamento
de vestígio o nome e a matrícula do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como
as informações referentes ao novo lacre utilizado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 5º O lacre rompido deverá ser acondicionado no interior do novo recipiente.
Art. 158-F. Após a realização da perícia, o material deverá ser devolvido à central de
custódia, devendo nela permanecer. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Parágrafo único. Caso a central de custódia não possua espaço ou condições de
armazenar determinado material, deverá a autoridade policial ou judiciária determinar as
condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento do
diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal.
Por último, vale destacar a imposição aos Institutos de Criminalística de criarem uma
central de custódia, bem como a preocupação do legislador com o protocolo de entrada e saída
dos vestígios e o seu competente registro:

Art. 158-E. Todos os Institutos de Criminalística deverão ter uma central de custódia
destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão deve ser vinculada diretamente
ao órgão central de perícia oficial de natureza criminal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 1º Toda central de custódia deve possuir os serviços de protocolo, com local para
conferência, recepção, devolução de materiais e documentos, possibilitando a seleção, a
classificação e a distribuição de materiais, devendo ser um espaço seguro e apresentar
condições ambientais que não interfiram nas características do vestígio. (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º Na central de custódia, a entrada e a saída de vestígio deverão ser protocoladas,
consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito que a eles se relacionam.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º Todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado deverão ser
identificadas e deverão ser registradas a data e a hora do acesso. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 4º Por ocasião da tramitação do vestígio armazenado, todas as ações deverão ser
registradas, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, a destinação,
a data e horário da ação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

C) FINALIDADE DA CADEIA DE CUSTÓDIA

Importante reflexão é o debate envolvendo a necessidade da existência, agora no plano


normativo, da cadeia de custódia, ou seja, qual seria a finalidade e a justificativa deste instituto
no processo penal moderno.

Neste aspecto, a título de comparação, vamos dar o exemplo da produção de uma prova
testemunhal em juízo: esse depoimento, ao ser colhido, se submete prontamente ao contraditório
(real), uma vez que a acusação, defesa e o órgão julgador de fato controlaram a higidez do
conteúdo deste documento. Entretanto, com relação à algumas provas periciais e de natureza
técnica, normalmente a produção ocorre sem a presença dos atores do sistema processual e o
controle do conteúdo ocorrerá a posteriori, havendo o contraditório diferido.

Neste sentido é de suma importância que essa prova seja íntegra, que esse material
probatório seja autêntico, razão pela qual se justifica a existência de um procedimento (cadeia
de custódia) destinado a conferir essa legitimidade/autenticidade ao conteúdo desta prova, sob
pena de tal acervo ser considerado imprestável:

RECURSO ESPECIAL. ART. 305 DO CPM. NULIDADE. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PROVA


EMPRESTADA. QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA DA PROVA. FALTA DE ACESSO À INTEGRALIDADE
DAS CONVERSAS. EVIDENCIADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM A EXISTÊNCIA DE ÁUDIOS
DESCONTINUADOS, SEM ORDENAÇÃO, SEQUENCIAL LÓGICA E COM OMISSÃO DE TRECHOS DA
DEGRAVAÇÃO. FILTRAGEM ESTABELECIDA SEM A PRESENÇA DO DEFENSOR. NULIDADE
RECONHECIDA. PRESCRIÇÃO CONFIGURADA. RECURSOS PROVIDOS. DECRETADA A EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE.
1. A quebra da cadeia de custódia tem como objetivo garantir a todos os acusados o devido processo legal e os
recursos a ele inerentes, como a ampla defesa, o contraditório e principalmente o direito à prova lícita. O instituto
abrange todo o caminho que deve ser percorrido pela prova até sua análise pelo magistrado, sendo certo que
qualquer interferência durante o trâmite processual pode resultar na sua imprestabilidade (RHC 77.836/PA,
Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 05/02/2019, DJe 12/02/2019).
2. É dever o Estado a disponibilização da integralidade das conversas advindas nos autos de forma emprestada,
sendo inadmissível a seleção pelas autoridades de persecução de partes dos áudios interceptados.
3. A apresentação de parcela do produto extraído dos áudios, cuja filtragem foi estabelecida sem a presença
do defensor, acarreta ofensa ao princípio da paridade de armas e ao direito à prova, porquanto a pertinência do
acervo probatório não pode ser realizado apenas pela acusação, na medida em que gera vantagem desarrazoada
em detrimento da defesa.
4. Reconhecida a nulidade, inegável a superveniência da prescrição, com fundamento no art. 61 do CPP.
5. Recursos especiais providos para declarar a nulidade da interceptação telefônica e das provas dela
decorrentes, reconhecendo, por consequência, a superveniência da prescrição da pretensão punitiva do Estado,
de ofício. (RESP 1795341/RS, 6° TURMA STJ, REL, MINISTRO NEFI CORDEIRO, DJE 14/05/2019)
Da conduta

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

5.1. Introdução

Fato típico é o que se amolda ao modelo legal da conduta proibida. É o fato que se
enquadra no conjunto de elementos descritivos do delito contidos na lei penal. Se não se
enquadrar rigorosamente na descrição que consta no tipo penal, o fato será atípico.

CONDUTA

ELEMENTOS DO
TIPICIDADE RESULTADO
FATO TÍPICO

NEXO DE
CAUSALIDADE

Ausente um dos elementos do fato típico a conduta passa a constituir um indiferente penal.
É um fato atípico

5.2. Conceito

Conduta é a ação ou omissão humana consciente e dirigida a determinada finalidade.


5.3. Ausência de conduta

Para a caracterização da conduta, sob qualquer aspecto, é indispensável a existência do


binômio vontade e consciência.

VONTADE é o querer ativo, apto a levar o ser humano a praticar um ato livremente. O ato
voluntário deve ser espontâneo, isto é, mediante um proceder por vontade própria; caso
contrário, será ato coagido e forçado, levando à exclusão do crime.

CONSCIÊNCIA é a possibilidade de o ser humano ter noção clara da diferença existente


entre realidade e ficção.

Ausente vontade ou consciência, não haverá conduta punível. Não havendo conduta
punível, o fato será atípico.

Pode-se dizer que há ausência de conduta nos seguintes casos, por exemplo:

a) Coação física irresistível (“vis absoluta”)

Ocorre quando o sujeito pratica o movimento em consequência de força corporal


exercida sobre ele. Quem atua obrigado por uma força irresistível não age voluntariamente.
Neste caso, o agente é mero instrumento realizador da vontade do coator.

Imaginemos alguém sendo fisicamente forçado a falsificar um documento. Nesse caso,


não haverá conduta punível, por ausência de vontade, sendo o fato atípico em relação ao agente
fisicamente coagido. Somente o coator responderia pelo delito.

Assim, não havendo vontade, não há conduta. Não havendo conduta, não há fato típico.
Não havendo fato típico, não há crime. Logo, o fato praticado pelo fisicamente coagido é atípico.
Não responde por nenhum crime.

Diversa é a situação, contudo, quando se tratar de coação moral.

Na coação moral, não há aplicação da força física, mas de ameaça ou intimidação, feita
através da promessa de um mal, para que se determine o coato à realização do fato criminoso.
O coagido poderá optar.
No caso da coação moral, o fato é revestido de tipicidade, mas não é culpável, em face
da inexigibilidade de conduta diversa.

Portanto, existe o fato típico, pois a ação é juridicamente relevante, mas não há que se
falar em culpabilidade, aplicando-se a regra do art. 22, 1ª parte, do Código Penal (causa de
exclusão da culpabilidade). A coação moral irresistível será estudada no tema culpabilidade.

EM SÍNTESE:

Coação física irresistível: causa de exclusão da tipicidade


Coação moral irresistível: causa de exclusão da culpabilidade
Coação moral resistível: atenuante (art. 65, III, “c”, CP)

COAÇÃO FÍSICA IRRESISTÍVEL COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL COAÇÃO MORAL RESISTÍVEL

Sujeito é forçado Sujeito é ameaçado ou


fisicamente a praticar o fato intimidado a praticar o fato Sujeito é ameaçado ou
típico típico intimidado a praticar o fato
típico, mas poderia resistir

CAUSA DE EXCLUSÃO CAUSA DE EXCLUSÃO DA


DA TIPICIDADE CULPABILIDADE ATENUANTE (ART. 65, III,
"C", CP)

b) Movimentos reflexos

Os atos reflexos não dependem da vontade, uma vez que são reações motoras,
secretórias ou fisiológicas, produzidas pela excitação de órgãos do corpo humano.

EXEMPLO

Tosse, espirro, etc.


c) Estados de inconsciência

Consciência “é o resultado da atividade das funções mentais. Não se trata de uma


faculdade do psiquismo humano, mas do resultado do funcionamento de todas elas”.

Quando essas funções mentais não funcionam adequadamente se diz que há estado de
inconsciência, que é incompatível com a vontade, e sem vontade não há ação.

EXEMPLO

Praticar determinada conduta em estado de sonambulismo.

5.4. Dos crimes omissivos

A conduta delitiva não se limita a uma atividade positiva, ou seja, a uma ação, podendo,
ainda, o agente praticar delito por meio de uma conduta omissiva, por um não fazer, por uma
abstenção de um movimento corpóreo.

Os crimes omissivos podem ser próprios ou impróprios (ou comissivos por omissão).

5.4.1. Crimes omissivos próprios

São os que se perfazem com a simples conduta negativa do sujeito,


independentemente da produção de qualquer consequência posterior.

Há um tipo penal específico descrevendo a conduta omissiva. O verbo nuclear do tipo


descreve uma conduta omissiva. Nesse caso, o crime consiste em o sujeito amoldar a sua
conduta ao tipo legal que descreve uma conduta omissiva. Em síntese, o agente será
responsabilizado por não cumprir o dever de agir contido implicitamente na norma
incriminadora.

Nos crimes omissivos próprios basta a abstenção, é suficiente a desobediência ao dever


de agir para que o delito se consume. A OBRIGAÇÃO DO AGENTE É DE AGIR E NÃO DE
EVITAR O RESULTADO. O resultado que eventualmente surgir dessa omissão será irrelevante
para a consumação do crime, podendo apenas configurar uma majorante ou uma qualificadora.
Exemplo: Omissão de socorro

Art. 135 do CP. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco
pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao
desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da
autoridade pública:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.


Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal
de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

5.4.2. Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão

CONDUTA
OMISSIVA ART. 13, §2º CP RESULTADO

Nos crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão são aqueles em que o tipo
penal descreve uma conduta ativa, ou seja, o verbo nuclear do tipo descreve uma ação. Nesse
caso, o agente será responsabilizado por ter deixado de agir quando estava juridicamente
obrigado a desenvolver uma conduta para evitar o resultado.

Nos crimes omissivos impróprios, o agente não tem simplesmente a obrigação de agir,
mas a OBRIGAÇÃO DE AGIR PARA EVITAR UM RESULTADO, isto é, deve agir com a
finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento. Nos crimes comissivos por omissão
há, na verdade, um crime material, isto é, um crime de resultado.

Ou seja, se o agente que tinha o dever de agir para evitar o resultado mantém-se inerte,
omisso, responderá pelo resultado gerado.
Ressalta-se, no entanto, que somente será atribuído ao agente a responsabilidade por
sua conduta omissiva se, nas circunstâncias, era possível agir para evitar o resultado.

EXEMPLO

Se um médico plantonista deixa de atender um paciente que falece, porque estava


atendendo a outro enfermo em situação de emergência, à evidência, não poderá ser
responsabilizado pela morte do paciente que aguardava atendimento.

O Código Penal regulou expressamente as hipóteses em que o agente assume a condição


de garantidor.

De fato, para que alguém responda por crime comissivo por omissão é preciso que
tenha o dever jurídico de impedir o resultado, previsto no artigo 13, § 2º, do Código Penal:

a) Ter por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância

Nesse caso, por expressa imposição da lei, o agente estará obrigado a agir para evitar o
resultado. Assim, se o agente se omitir, ou seja, deixar de agir, quando lhe era possível,
responderá pelo resultado gerado.

Isso porque, se o sujeito, em virtude de sua abstenção, descumprindo o dever de agir,


não busca evitar o resultado é considerado, pelo Direito Penal, como se o tivesse causado.

É o caso, por exemplo, dos pais em relação aos filhos (art. 1634 e 1566, IV, ambos do
Código Civil) e do dever de mútua assistência entre os cônjuges (art. 1566 do Código Civil).

EXEMPLO

Mãe que deixa de alimentar o filho, que, por conta da sua negligência, acaba
morrendo por inanição. Essa mãe deverá responder pelo resultado gerado, qual
seja, homicídio culposo. Se, de outro lado, a mãe desejou a morte do filho ou
assumiu o risco de produzi-la, responderá por homicídio doloso.
b) De outra forma, assumir a responsabilidade de impedir o resultado

A doutrina não fala mais em dever contratual, uma vez que a posição de garantidor pode
advir de situações em que não existe relação jurídica entre as partes. O importante é que o
sujeito se coloque em posição de garante no sentido de que o resultado não ocorrerá.

Aqui a obrigação de agir para evitar o resultado não decorre de lei, mas do fato de o agente
ter assumido a responsabilidade de impedi-lo.

EXEMPLO

Babá que, por negligência, deixa de cumprir corretamente sua obrigação de cuidar
da criança, que acaba caindo na piscina e, por isso, morre afogada. Nesse caso,
responderá pelo resultado gerado, qual seja, homicídio culposo. Se, de outro lado,
desejou a morte da criança ou assumiu o risco de produzi-la, responderá por
homicídio doloso.

EXEMPLO

Salva-vidas Carlos que presta em clube social, que, com várias crianças brincando
na piscina, fica observando a beleza física da mãe de uma das crianças e, ao mesmo
tempo, falando no celular com um amigo, ficando de costas para a piscina. Se,
nesse momento, uma criança vem a falecer por afogamento, o salva-vidas
responderá por homicídio culposo, diante da sua omissão culposa, já que violou o
seu dever de garantidor.

c) Com o comportamento anterior, criar o risco da ocorrência do resultado

Nesta hipótese, o sujeito, com o comportamento anterior, cria situação de perigo para
bens jurídicos alheios penalmente tutelados, de sorte que, tendo criado o risco, fica obrigado
a evitar que ele se degenere ou desenvolva para o dano ou lesão.

Não importa que o tenha feito voluntariamente ou involuntariamente, dolosa ou


culposamente; importa é que com sua ação ou omissão originou uma situação de risco ou
agravou uma situação já existente.
EXEMPLO

Aluno veterano, por ocasião de um trote acadêmico, sabendo que a vítima não sabe
nadar, joga o incauto calouro na piscina. Nesse caso, contrai o dever jurídico de
agir para evitar o resultado, sob pena de responder por homicídio.

1) (QUESTÃO 2 - V EXAME)
Joaquina, ao chegar à casa de sua filha, Esmeralda, deparou-se com seu genro, Adaílton,
mantendo relações sexuais com sua neta, a menor F.M., de 12 anos de idade, fato ocorrido no
dia 2 de janeiro de 2011. Transtornada com a situação, Joaquina foi à delegacia de polícia, onde
registrou ocorrência do fato criminoso. Ao término do Inquérito Policial instaurado para apurar os
fatos narrados, descobriu-se que Adaílton vinha mantendo relações sexuais com a referida
menor desde novembro de 2010. Apurou-se, ainda, que Esmeralda, mãe de F.M., sabia de toda
a situação e, apesar de ficar enojada, não comunicava o fato à polícia com receio de perder o
marido que muito amava.

Na condição de advogado(a) consultado(a) por Joaquina, avó da menor, responda aos


itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal
pertinente ao caso.
A) Adaílton praticou crime? Em caso afirmativo, qual? (Valor: 0,3)
B) Esmeralda praticou crime? Em caso afirmativo, qual? (Valor: 0,5)
C) Considerando que o Inquérito Policial já foi finalizado, deve a avó da menor oferecer
queixa-crime? (Valor: 0,45)

2) (QUESTÃO 04 – X EXAME)
Erika e Ana Paula, jovens universitárias, resolvem passar o dia em uma praia paradisíaca e, de
difícil acesso (feito através de uma trilha), bastante deserta e isolada, tão isolada que não há
qualquer estabelecimento comercial no local e nem mesmo sinal de telefonia celular. As jovens
chegam bastante cedo e, ao chegarem, percebem que além delas há somente um salva-vidas
na praia. Ana Paula decide dar um mergulho no mar, que estava bastante calmo naquele dia.
Erika, por sua vez, sem saber nadar, decide puxar assunto com o salva-vidas, Wilson, pois o
achou muito bonito. Durante a conversa, Erika e Wilson percebem que têm vários interesses em
comum e ficam encantados um pelo outro. Ocorre que, nesse intervalo de tempo, Wilson percebe
que Ana Paula está se afogando. Instigado por Erika, Wilson decide não efetuar o salvamento,
que era perfeitamente possível. Ana Paula, então, acaba morrendo afogada.
Nesse sentido, atento(a) apenas ao caso narrado, indique a responsabilidade jurídico-
penal de Erika e Wilson. (Valor: 1,25)
O examinando deve fundamentar corretamente sua resposta. A simples menção ou transcrição
do dispositivo legal não pontua.
Da relação de causalidade

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

6.1. Introdução

Pela própria denominação (nexo causal) é possível perceber que consiste no vínculo ou
liame de causa e efeito entre a ação e o resultado do crime.

Via de regra, a conduta do agente produz o resultado criminoso de forma direta. Trata-se
de relação de causa (conduta) e efeito (resultado): Nexo de causalidade.

Todavia, pode ocorrer que, aliada à conduta do agente, outra causa contribua para o
resultado. É a chamada concausa.

Esta “concausa” pode ser absolutamente independente ou relativamente independente,


dependendo se teve ou não origem na conduta do agente.

6.2. Causas absolutamente independentes


6.2.1. Conceito

São aquelas que não tem origem na conduta do agente. A expressão “absolutamente”
serve para designar que a outra causa independente por si só produziu o resultado. São causas
que não se inserem na linha do desdobramento natural da conduta do agente, ou seja, causas
inusitadas, desvinculadas da ação do agente, surgindo de fonte distinta.

Em síntese, por serem independentes, tais causas atuam como se tivessem por si sós
produzido o resultado, situando-se fora da linha de desdobramento causal da conduta.

Há, na verdade, uma quebra do nexo causal.


6.2.2. Espécies de causas absolutamente independentes

a) Preexistentes

Trata-se de causa que existia antes da conduta do agente e produzem o resultado


independentemente da sua atuação. Ou seja, com ou sem a ação do agente o resultado ocorreria
do mesmo modo.

EXEMPLO

O agente desfere um disparo de arma de fogo contra a vítima, que, no entanto,


vem a falecer pouco depois, não em consequência dos ferimentos recebidos, mas
porque antes ingerira veneno com a intenção de suicidar.

Nesse caso, há a conduta do agente (efetuar o disparo), mas o que gerou o resultado
morte foi outra causa (o veneno). Essa outra causa é independente da conduta do agente
(porque por si só produziu o resultado). É absolutamente independente (porque não teve origem
na conduta do agente, pois tendo ou não efetuado o disparo o resultado ainda assim se
produziria). É preexistente porque essa outra causa (veneno) já existia antes da ação do agente.

b) Concomitantes

São as causas que não têm nenhuma relação com a conduta e produzem o resultado
independentemente desta, no entanto, por coincidência, atuam exatamente no instante em que
a ação é realizada.

EXEMPLO

“A” desfere golpe de faca contra “B” no exato momento em que este vem a falecer
exclusivamente por força de uma queda de um lustre sobre sua cabeça.

Nesse caso, há a conduta do agente (desferir o golpe de faca), mas o que gerou o
resultado morte foi outra causa (lustre na cabeça). O lustre na cabeça se trata de causa
independente da conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É absolutamente
independente (porque não teve origem na conduta do agente, pois tendo ou não efetuado
desferido o golpe o resultado ainda assim se produziria). É concomitante porque essa outra
causa (queda do lustre na cabeça) ocorreu exatamente no momento da ação do agente.

c) Supervenientes

São causas que atuam após a conduta. Ou seja, que surgem depois da conduta
desenvolvida pelo agente.

EXEMPLO

“A” ministra veneno na alimentação de “B”. Antes do veneno produzir efeitos,


mas minutos depois de ser ministrado, cai um lustre na cabeça da vítima,
matando-a.

Nesse caso, há a conduta do agente (ministrar veneno), mas o que gerou o resultado
morte foi outra causa (lustre na cabeça). O lustre na cabeça é uma causa independente da
conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É absolutamente independente
(porque não teve origem na conduta do agente, pois tendo ou não ministrado o veneno o
resultado ainda assim se produziria). É superveniente porque essa outra causa (queda do lustre
na cabeça) ocorreu depois da conduta do agente.

6.2.3. Consequências das causas absolutamente independentes

Quando a causa é absolutamente independente da conduta do sujeito, o problema é


resolvido pelo art. 13, caput, do CP: Há exclusão da causalidade decorrente da conduta. Ou seja,
o agente responde somente por aquilo que deu causa.

Nos exemplos, a causa da morte não tem ligação alguma com o comportamento do
agente. Em face disso, ele não responde pelo resultado morte, mas sim pelos atos praticados
antes de sua produção. Isso porque ocorreu quebra do nexo causal. Assim, se o dolo era de
matar, o agente responderia por tentativa de homicídio.
CUIDADO: Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo,
o agente responderá por aquilo que deu causa: lesão corporal (leve,
grave ou gravíssima).

6.3. Causas relativamente independentes


6.3.1. Conceito

Causas relativamente independentes são aquelas que tiveram origem na conduta do


agente. Ou seja, essas causas somente surgiram porque o agente desenvolveu uma conduta.

Como são causas independentes, produzem por si sós o resultado, não se situando dentro
da linha de desdobramento causal da conduta. Por serem, no entanto, apenas relativamente
independentes, encontram sua origem na própria conduta praticada pelo agente.

Aqui não há, de regra, uma quebra do nexo causal, mas uma soma entre as causas, que,
ao final, conduzem ao resultado lesivo.

6.3.2. Espécies de causas relativamente independentes

a) Preexistentes

A causa que efetivamente gerou o resultado já existia ao tempo da conduta do agente,


que concorreu para a sua produção.

EXEMPLO

“A”, com a intenção de matar, desfere um golpe de faca na vítima, que é


hemofílica e vem a morrer em face da conduta, somada à contribuição de seu
peculiar estado fisiológico. No caso, o golpe isoladamente seria insuficiente para
produzir o resultado fatal, de modo que a hemofilia atuou de forma independente,
produzindo por si só o resultado.
Nesse caso, há a conduta do agente (golpe de faca), mas o que desencadeou
efetivamente o resultado morte foi outra causa (hemofilia). Essa outra causa é independente da
conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É relativamente independente
(porque teve origem na conduta do agente, pois, se não tivesse desferido a facada, essa outra
causa não seria desencadeada e o resultado não ocorreria). É preexistente porque essa outra
causa (hemofilia) já existia ao tempo da ação do agente.

Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do nexo causal, o agente
responde pelo resultado pretendido. No caso, homicídio consumado, a menos que não tenha
concorrido para ele com dolo ou culpa.

Isso, porque, segundo doutrina majoritária, a imputação do resultado ao agente exige que
ele tenha conhecimento do estado de saúde do agente (que denota dolo) ou que, pelo menos,
que lhe fosse previsível (indicativo de culpa).

Assim, se, por exemplo, o agente não sabia do estado de saúde da vítima ou não lhe era
previsível, não poderia lhe ser atribuído o resultado morte, responderia, pois, pelo delito de
tentativa de homicídio (se agiu com a intenção de matar).

Se, no entanto, pretendia ferir a vítima, agredindo-a com um soco e, esta em razão da
hemofilia, desconhecida pelo agente, vem a falecer em razão da eclosão de uma hemorragia, o
agente somente será responsabilizado pelo delito de lesão corporal.

b) Concomitantes

A causa que efetivamente produziu o resultado surge no exato momento da conduta do


agente.

EXEMPLO
Considera-se o ataque à vítima, por meio de disparo de arma de fogo, que, no exato
momento da agressão, sofre ataque cardíaco, vindo a falecer, apurando-se que a
soma desses fatores (causas) produziu a morte, já que a agressão e o ataque
cardíaco, considerados isoladamente, não teriam o condão do produzir o resultado
morte.
Nesse caso, há a conduta do agente (disparo de arma de fogo), mas o que desencadeou
efetivamente o resultado morte foi outra causa (ataque cardíaco). Essa outra causa é
independente da conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É relativamente
independente (porque teve origem na conduta do agente, pois, se não tivesse desferido a facada,
essa outra causa não seria desencadeada e o resultado não ocorreria). É concomitante porque
essa outra causa (ataque cardíaco) foi potencializada no exato momento da conduta do agente.

Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do nexo causal, o agente
responde pelo resultado pretendido. No caso, homicídio consumado, a menos que não tenha
concorrido para ele com dolo ou culpa.

c) Supervenientes

A causa que efetivamente produziu o resultado ocorre depois da conduta praticada pelo
agente.

EXEMPLO

O agente desfere um golpe de faca contra a vítima, com a intenção de matá-la.


Ferida, a vítima é levada ao hospital e sofre acidente no trajeto, vindo, por esse
motivo, a falecer. A causa é independente, porque a morte foi provocada pelo
acidente e não pela facada, mas essa independência é relativa, já que, se não fosse
o ataque, a vítima não estaria na ambulância acidentada e não morreria. Tendo
atuado posteriormente à conduta, denomina-se causa superveniente.

Nesse caso, há a conduta do agente (golpe de faca), mas o que desencadeou


efetivamente o resultado morte foi outra causa (traumatismo decorrente do acidente). Essa outra
causa é independente da conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É
relativamente independente (porque teve origem na conduta do agente, pois, se não tivesse
desferido a facada, a vítima não estaria na ambulância e, portanto, não teria falecido por conta
do acidente). É superveniente porque essa outra causa (traumatismo pelo acidente) surgiu
depois da conduta do agente
Na hipótese das causas supervenientes, embora exista nexo físico-naturalístico, a
lei, por expressa disposição do art. 13, § 1º, CP, que excepcionou a regra geral,
exclui a imputação do resultado ao agente, devendo, no entanto, responder pelos
atos anteriormente efetivamente praticados.

Assim, o agente não responde pelo resultado ocorrido, mas somente pelos atos
anteriores, que, no caso, foi tentativa de homicídio.

CUIDADO
Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente responderá
pelos atos anteriores praticados, no caso, lesão corporal (leve, grave ou
gravíssima).

6.4. Dúvida mais recorrente

E se o agente não sabia e não tinha condições de saber da existência da causa


preexistente ou concomitante, como fica?

No contexto do nexo causal, notadamente nas causas relativamente independentes


preexistentes e concomitantes, a responsabilização do agente depende do elemento psicológico
(dolo) ou normativo (culpa). Assim, o agente somente responderá pelo resultado se tiver agido
com dolo ou culpa em relação à morte, sob pena de responsabilidade objetiva.

Assim, para que o agente responda pelo resultado morte e, portanto, a concausa
relativamente independente preexistente e concomitante deve ser conhecida do agente ou ao
menos existir possibilidade de conhecimento, sob pena de responsabilidade penal objetiva. Foi
o que caiu no XXI exame da OAB. O agente não foi responsabilizado pela morte, porque não
tinha conhecimento da causa preexistente, nem lhe era previsível. Responderia apenas por lesão
corporal.
Exemplo de questão

Paulo e Júlio, colegas de faculdade, comemoravam juntos, na cidade de São Gonçalo, o


título obtido pelo clube de futebol para o qual o primeiro torce. Não obstante o clima de
confraternização, em determinado momento, surgiu um entrevero entre eles, tendo Júlio
desferido um tapa no rosto de Paulo. Apesar da pouca intensidade do golpe, Paulo vem a
falecer no hospital da cidade, tendo a perícia constatado que a morte decorreu de uma
fatalidade, porquanto, sem que fosse do conhecimento de qualquer pessoa, Paulo tinha
uma lesão pretérita em uma artéria, que foi violada com aquele tapa desferido por Júlio e
causou sua morte. O órgão do Ministério Público, em atuação exclusivamente perante o
Tribunal do Júri da Comarca de São Gonçalo, denunciou Júlio pelo crime de lesão corporal
seguida de morte (Art. 129,§ 3º, do CP). Considerando a situação narrada e não havendo
dúvidas em relação à questão fática, responda, na condição de advogado(a) de Júlio:

A) É competente o juízo perante o qual Júlio foi denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual tese de direito material poderia ser alegada em favor de Júlio? Justifique. (Valor:
0.60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo
legal não confere pontuação.
GABARITO COMENTADO

A) O(A) examinando(a) deve concluir pela incompetência do Juízo, tendo em vista que o
crime praticado não é doloso contra a vida. Nos termos do Art. 74, § 1º, do Código de
Processo Penal (ou Art. 5º, inciso XXXVIII, alínea d, da CRFB), ao Tribunal do Júri cabe
apenas o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e os conexos. No caso, mesmo de
acordo com a imputação contida na denúncia, o resultado de morte foi culposo; logo, a
competência é do juízo singular.

B) O(A) examinando(a) deve defender que não poderia Júlio responder pelo crime de
lesão corporal seguida de morte, porque aquele resultado não foi causado a título de dolo
nem culpa. O crime de lesão corporal seguida de morte é chamado de preterdoloso. A
ação é dirigida à produção de lesão corporal, sendo o resultado morte produzido a título
de culpa. Costuma-se dizer que há dolo no antecedente e culpa no consequente. Um dos
elementos da culpa é a previsibilidade objetiva, somente devendo alguém ser punido na
forma culposa quando o resultado não querido pudesse ser previsto por um homem médio,
sendo que a ausência de previsibilidade subjetiva, capacidade do agente, no caso
concreto, de prever o resultado, repercute na culpabilidade. Na hipótese, não havia
previsibilidade objetiva, o que impede a tipificação do delito de lesão corporal seguida de
morte. Também poderia o candidato responder que havia uma concausa preexistente,
relativamente independente, desconhecida, impedindo Júlio de responder pelo resultado
causado. Em princípio, a concausa relativamente independente preexistente não impede
a punição do agente pelo crime consumado. Contudo, deve ela ser conhecida do agente
ou ao menos existir possibilidade de conhecimento, sob pena de responsabilidade penal
objetiva.

Agora, se, por exemplo, a intenção fosse de lesionar e resultou morte, tendo ciência da
hemofilia, responde por lesão corporal seguida de morte. Isso já caiu na prova da OAB.

Exemplo de questão

Wallace, hemofílico, foi atingido por um golpe de faca em uma região não letal do corpo.
Júlio, autor da facada, que não tinha dolo de matar, mas sabia da condição de saúde
específica de Wallace, sai da cena do crime sem desferir outros golpes, estando
Wallace ainda vivo. No entanto, algumas horas depois, Wallace morre, pois, apesar de
a lesão ser em local não letal, sua condição fisiológica agravou o seu estado de saúde.
Acerca do estudo da relação de causalidade, assinale a opção correta.
A) O fato de Wallace ser hemofílico é uma causa relativamente independente
preexistente, e Júlio não deve responder por homicídio culposo, mas, sim, por
lesão corporal seguida de morte.
B) O fato de Wallace ser hemofílico é uma causa absolutamente independente
preexistente, e Júlio não deve responder por homicídio culposo, mas, sim, por lesão
corporal seguida de morte.
C) O fato de Wallace ser hemofílico é uma causa absolutamente independente
concomitante, e Júlio deve responder por homicídio culposo.
D) O fato de Wallace ser hemofílico é uma causa relativamente independente
concomitante, e Júlio não deve responder pela lesão corporal seguida de morte, mas,
sim, por homicídio culposo.

Em relação à causa concomitante relativamente independente, a FGV já considerou que


o agente, no contexto do roubo por meio de ameaça, não responderia pelo resultado morte de
um rapaz jovem e de boa saúde, já que não era previsível que a vítima viesse a falecer. Ou seja,
não basta que haja um nexo naturalístico entre a conduta e o resultado. Para imputar ao agente
o resultado, é necessário que tenha agido com dolo ou culpa em relação à morte.

Em síntese, além de não incidir o latrocínio em decorrência da ameaça, já que o artigo


157, § 3º, II, do CP, prevê que o roubo será qualificado quando da violência resulta morte, se
não tinha como prever eventual resultado morte, ou seja, não agiu nem com dolo ou culpa em
relação ao resultado morte, não responderá pela morte, mas por roubo consumado ou tentado,
conforme o caso. Isso já caiu na 1ª fase da OAB, no IX Exame. Note que o enunciado traz a
informação de que a vítima se trata de um rapaz jovem e de boa saúde, sem histórico de doença
cardiovascular.

Exemplo de questão

José subtrai o carro de um jovem que lhe era totalmente desconhecido, chamado João.
Tal subtração deu-se mediante o emprego de grave ameaça exercida pela utilização
de arma de fogo. João, entretanto, rapaz jovem e de boa saúde, sem qualquer histórico
de doença cardiovascular, assusta-se de tal forma com a arma, que vem a óbito em
virtude de ataque cardíaco. Com base no cenário acima, assinale a afirmativa correta.
A) José responde por latrocínio.
B) José não responde pela morte de João.
C) José responde em concurso material pelos crimes de roubo e de homicídio culposo.
D) José praticou crime preterdoloso.
3) (QUESTÃO 03 – EXAME 2010-02)
Pedro, almejando a morte de José, contra ele efetua disparo de arma de fogo, acertando-o na
região toráxica. José vem a falecer, entretanto, não em razão do disparo recebido, mas porque,
com intenção suicida, havia ingerido dose letal de veneno momentos antes de sofrer a agressão,
o que foi comprovado durante instrução processual. Ainda assim, Pedro foi pronunciado nos
termos do previsto no artigo 121, caput, do Código Penal.
Na condição de Advogado de Pedro:
I. Indique o recurso cabível;
II. O prazo de interposição;
III. A argumentação visando à melhoria da situação jurídica do defendido.
Indique, ainda, para todas as respostas, os respectivos dispositivos legais.
4) (QUESTÃO 1 – XXI EXAME)
Paulo e Júlio, colegas de faculdade, comemoravam juntos, na cidade de São Gonçalo, o título
obtido pelo clube de futebol para o qual o primeiro torce. Não obstante o clima de
confraternização, em determinado momento, surgiu um entrevero entre eles, tendo Júlio
desferido um tapa no rosto de Paulo. Apesar da pouca intensidade do golpe, Paulo vem a falecer
no hospital da cidade, tendo a perícia constatado que a morte decorreu de uma fatalidade,
porquanto, sem que fosse do conhecimento de qualquer pessoa, Paulo tinha uma lesão pretérita
em uma artéria, que foi violada com aquele tapa desferido por Júlio e causou sua morte. O órgão
do Ministério Público, em atuação exclusivamente perante o Tribunal do Júri da Comarca de São
Gonçalo, denunciou Júlio pelo crime de lesão corporal seguida de morte (Art. 129, § 3º, do CP).
Considerando a situação narrada e não havendo dúvidas em relação à questão fática,
responda, na condição de advogado(a) de Júlio:
A) É competente o juízo perante o qual Júlio foi denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual tese de direito material poderia ser alegada em favor de Júlio? Justifique. (Valor:
0.60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

5) Durante uma grave discussão, ocorrida no serviço, Licurgo Moicano agrediu Coitinho Lelo com
uma paulada na cabeça, com a intenção de matá-lo. Atendido com rapidez, Coitinho Lelo foi
colocado dentro de uma ambulância que rumou para o Pronto Socorro Municipal. No trajeto, a
ambulância capotou, vindo Coitinho Lelo a falecer em razão do acidente. Diante do fato e à luz
do ordenamento jurídico penal, responda se Licurgo Moicano deve ser responsabilizado
penalmente? Em caso afirmativo, indique qual o crime, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

6) (QUESTÃO 4 – XXV EXAME – REAPLICAÇÃO PORTO ALEGRE)


Vitor efetuou disparos de arma de fogo contra José, com a intenção de causar sua morte. Ocorre
que, por erro durante a execução, os disparos atingiram a perna de seu inimigo e não o peito
como pretendido. Esgotada a munição disponível, Vitor empreendeu fuga, enquanto José
solicitou a ajuda de populares e compareceu, de imediato, ao hospital para atendimento médico.
Após o atendimento médico, já no quarto com curativos, enquanto dormia, José vem a ser picado
por um escorpião, vindo a falecer no dia seguinte em razão do veneno do animal,
exclusivamente. Descobertos os fatos, considerando que José somente estava no hospital em
razão do comportamento de Vitor, o Ministério Público oferece denúncia em face do autor dos
disparos pela prática do crime de homicídio consumado, previsto no Art. 121, caput, do Código
Penal. Após regular prosseguimento do feito, na audiência de instrução e julgamento da primeira
fase do procedimento do Tribunal do Júri, quando da oitiva das testemunhas, o magistrado em
atuação optou por iniciar a oitiva das testemunhas formulando diretamente suas perguntas, sem
permitir às partes complementação. Após
alegações finais orais das partes, o
magistrado proferiu decisão de pronúncia.
Apesar da impugnação da defesa quanto à
formulação das perguntas pelo juiz, o
magistrado esclareceu que não importaria
quem fez a pergunta, pois as respostas seriam
as mesmas. Com base apenas nas
informações narradas, na condição de
advogado(a) de Vitor, responda aos itens a
seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão
proferida pelo magistrado e qual
argumento de direito processual pode ser
apresentado em busca da desconstituição de tal decisão? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Existe argumento de direito material a ser apresentado, em momento oportuno, para
questionar a capitulação jurídica apresentada pelo Ministério Público? Justifique. (Valor:
0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.
Teoria do dolo e culpa

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

7.1 Do crime doloso


7.1.1 Dolo direto
No dolo direto, o agente quer o resultado e desenvolve uma conduta voltada a produção
desse resultado. Aplica-se aqui a teoria da vontade.

Exemplo: o agente desfere golpes de faca na vítima com intenção de matá-la. O dolo se
projeta de forma direta no resultado morte.

7.1.2 Dolo eventual


Em relação ao dolo eventual, adota-se a teoria do consentimento ou assentimento, inserta
na expressão “assumiu o risco de produzi-lo”, encartada no artigo 18, I, do Código Penal.

Ocorre o dolo eventual quando o sujeito assume o risco de produzir o resultado, isto é,
admite e aceita o risco de produzi-lo. No dolo eventual, o agente não quer o resultado (se
desejasse, seria dolo direto), mas, mesmo prevendo a realização do resultado, segue em diante
na sua conduta assumindo o risco de produzi-lo. No dolo eventual, o agente representa como
possível o resultado não desejado, mas assume o risco de provocar lesão a um bem jurídico,
seguindo em diante com a sua conduta, revelando, assim, conformismo com a produção do
evento.

Tomemos como exemplo a conduta do agente que, pretendendo a morte do seu desafeto,
efetua um disparo em sua direção, mesmo visualizando que se encontrava conversando com
uma pessoa bem próxima a ele. O agente prevê que também pode atingir a outra pessoa, mas
segue em diante na sua conduta, assumindo o risco de errar o disparo contra o seu desafeto e
atingir a outra pessoa, sendo-lhe indiferente quanto ao resultado que possa ser produzido em
relação ao terceiro. Se efetuar disparos matando o seu desafeto e também a outra pessoa, o
agente responderá por dois crimes de homicídio: o primeiro, a título de dolo direto; o segundo, a
título de dolo eventual.

Assim, no dolo eventual, o agente, embora não deseje diretamente o resultado, age com
indiferença e desprezo na sua produção, aceitando a sua ocorrência. Prefere arriscar-se a
produzi-lo a se abster e cessar a sua conduta. Age, pois, com dolo eventual, o agente que ofende
a integridade física de mulher grávida, ciente do seu adiantado estado gravídico, causando-lhe
o aborto. Note-se que o agente não quer o resultado, pois se desejasse, agiria com dolo direto,
mas prevê como possível o aborto e mesmo assim segue em diante com a sua conduta,
assumindo o risco de interromper a gravidez com a morte do feto.

7.2 Do crime culposo


7.2.1 Conceito
Extrai-se do artigo 18, inciso II, do Código Penal, que, no crime culposo, o agente
desenvolve uma conduta voluntária, produzindo, no entanto, um resultado involuntário (não
querido ou aceito pelo agente), mas que lhe era previsível (culpa inconsciente) ou
excepcionalmente previsto (culpa consciente) e poderia ser evitado se empregasse a cautela
necessária.

Via de regra, os tipos penais culposos não descrevem a conduta, limitando-se a apontar
que determinado delito é culposo. Trata-se de um tipo penal aberto, sendo, por isso, necessário
empregar um juízo de valor acerca da conduta do agente. Ex: homicídio culposo, previsto no
artigo 121, § 3º, CP.

Nesse sentido, se determinado delito não prevê a modalidade culposa, o fato praticado
será atípico.

Exemplo: O crime de dano (art. 163 do Código Penal) não prevê a modalidade culposa.
Logo, causar, por negligência ou imprudência, dano a patrimônio alheio constitui fato atípico.
7.2.2 Elementos do crime culposo
E São elementos do fato típico culposo: a) Conduta humana voluntária; b) Inobservância
do dever de cuidado objetivo c) Resultado involuntário; d) Nexo de causalidade; e) Previsibilidade
objetiva; f) Ausência de previsão; g) Tipicidade.

a) Conduta humana voluntária

No crime culposo, o agente desenvolve uma conduta voluntária, agindo, porém, sem o
dever de cuidado objetivo. O resultado produzido é involuntário.

Tomemos como exemplo alguém que, atrasado para realizar uma prova na faculdade,
imprime velocidade excessiva em seu veículo, vindo, em razão disso, a atropelar uma pessoa,
causando-lhe a morte. A finalidade do agente, sem dúvida, era lícita (chegar no local da prova).
Contudo, os meios utilizados para alcançar essa finalidade foram inadequados, uma vez que,
para chegar ao local da prova, imprimindo alta velocidade na condução de veículo automotor,
não observou o dever de cuidado objetivo, atropelando e causando a morte de uma pessoa.

Note-se que a conduta voluntária do agente foi desenvolvida para alcançar uma finalidade
lícita, gerando, no entanto, um resultado involuntário.

b) Inobservância do dever de cuidado objetivo

As pessoas, durante as relações de convívio social, devem observar as regras básicas de


cuidado e cautela. Essas regras gerais de cuidado decorrem da vedação de condutas capazes
de gerar riscos a bem jurídico alheio além do que se reputa razoável tolerar.

De fato, as regras de convívio social impõem às pessoas o dever de cautela para não
atingir bem jurídico alheio. Por isso, quem se arriscar a realizar, por exemplo, conduta
imprudente, sobrevindo um resultado típico, incorrerá na prática de crime culposo.

• Modalidades de culpa:
A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra do dever de cuidado imposto
a todos, é manifestada por meio de três modalidades de culpa, todas previstas no artigo 18, II,
do Código Penal: imprudência, negligência e imperícia.
• Imprudência
A conduta imprudente se caracteriza por agir um positivo, sem a observância do dever de
cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso, de forma intempestiva e
precipitada.

É a culpa decorrente de um comportamento positivo descuidado. Trata-se de modalidade


de culpa que incide paralelamente à ação do agente. É, pois, a face ativa ou positiva da culpa,
que se exterioriza de forma concomitante à ação desenvolvida pelo agente. Trata-se, enfim, da
culpa in agendo.

A imprudência é, portanto, um fazer algo perigoso, sem observar o dever de cuidado


objetivo.

Age com imprudência o condutor de veículo automotor, que, imprimindo excessiva


velocidade, perde o controle do veículo, invade a calçada e atropela um pedestre, matando-o.

Da mesma forma, age com imprudência o agente que limpa arma de fogo carregada
próximo a pessoas e, de forma descuidada, aciona o gatilho, matando alguém que estava ao seu
lado.

• Negligência
Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância do dever de cuidado
do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução. É a face omissiva ou negativa da
culpa. Trata-se da culpa in omitendo.

A negligência é, portanto, um não fazer algo, deixando, por isso, de observar o dever de
cuidado objetivo.

Ao contrário da imprudência, que ocorre concomitante à ação, a negligência se revela


sempre antes do início da conduta. Antes de agir, o negligente deixa de tomar as cautelas que
uma pessoa prudente adotaria.

Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de sair de viagem, deixa de
reparar os pneus e verificar os freios. Da mesma forma, age com negligência o pai que deixa
arma de fogo ao alcance de uma criança. Agem, ainda, com negligência os pais, por culpa in
vigilando, que deixam a criança de tenra idade, sem noção do perigo, caminhar vários metros à
sua frente, em acostamento de rodovia de intenso tráfego, culminando o episódio com o trágico
desfecho de um atropelamento, a atravessar o infante, repentina e abruptamente, a pista
asfáltica.

• Imperícia
A imperícia se caracteriza pela falta de capacidade, preparo ou de conhecimentos técnicos
suficientes de agente autorizado a desempenhar determinada arte, profissão ou ofício.

É a chamada culpa profissional, pois decorrente da falta de aptidão para o exercício de


arte, ofício ou profissão. Ocorre quando o agente não tem o adequado conhecimento acerca das
técnicas e regras que todos que se dedicam à determinada profissão, arte ou ofício deveriam
dominar.

Assim, se um médico cirurgião, que não domina determinada técnica inerente à


determinada intervenção cirúrgica, causar a morte do paciente, responderá por homicídio
culposo (CP, art. 121, § 3º), já que agiu com imperícia no exercício da sua profissão.

c) Resultado involuntário

Ao desvalor da ação voluntária, acrescenta-se o desvalor do resultado involuntário, mas


produzido em decorrência da inobservância do dever de cuidado objetivo.

Como nos crimes culposos a conduta voluntária é dotada de finalidade lícita, afigura-se
imprescindível a produção de um resultado naturalístico. Isso porque, se é voltada a uma
finalidade lícita, a conduta do agente constitui um indiferente penal, razão pela qual se mostra
necessário a produção de um resultado involuntário para caracterizar o crime culposo.

d) Nexo de causalidade

O crime culposo depende de um resultado naturalístico, já que se trata de crime material.


E, em se tratando de crime material, exige-se, para a adequada tipificação, o nexo causal entre
a conduta voluntária descuidada e o resultado involuntário.

e) Previsibilidade objetiva

É a possibilidade de uma pessoa comum, com diligência e prudência inerente à média da


população, prever a incidência de determinado resultado. Trata-se da previsibilidade daquilo que
se convencionou chamar de homem médio, considerando-se o grau de atenção e cuidado
exigido das pessoas de mediana inteligência.
A previsibilidade do resultado é aferida a partir de um juízo de valor, comparando a
conduta desenvolvida pelo agente com a de um homem médio.

Assim, se realizar uma conduta sem prever o resultado, mas uma pessoa comum, com
prudência e inteligência mediana, inerente à generalidade dos indivíduos, teria a possibilidade
de prever, o agente terá agido, se presentes os demais elementos, com culpa, uma vez que, nas
circunstâncias, desenvolveu uma conduta sem prever o resultado que era previsível.

Esse juízo de valor deve ser realizado considerando as circunstâncias do caso concreto,
considerando a postura de um homem médio nas mesmas condições em que o agente se
encontrava. Ou seja, a análise não deve levar em conta qualquer homem médio, mas a
possibilidade de antever o resultado nas mesmas circunstâncias e condições em que o agente
estava inserido.

Assim, se o contexto fático envolve acidente de trânsito, deve-se realizar um juízo de valor
acerca da conduta do agente levando-se em conta a generalidade dos motoristas de veículo
automotor. Se a situação fática envolve uma intervenção cirúrgica, o juízo de valor e a
possibilidade de antever o resultado deve ser realizado considerando um cirurgião com diligência
e perspicácia normais à generalidade dos cirurgiões.

f) Ausência de previsão

Para caracterizar o fato típico culposo, é necessário, ainda, que o agente não tenha
previsto o resultado, embora previsível. Se o previu, não há culpa, mas, via de regra, dolo.

Se o agente, dentro da concepção do homem médio, não tinha condições de prever o


resultado, embora previsível, afastada estará a culpa. Se há previsão do resultado, mas ainda
assim o agente desenvolve a conduta, sendo indiferente quanto à produção do evento, há dolo,
e não culpa.

Não se vislumbra, pois, previsibilidade do agente que, conduzindo o veículo dentro das
normas de trânsito, atropela uma pessoa, que, de forma inesperada e repentina, se joga em
frente ao veículo com desejo suicida.

Todavia, de forma excepcional, pode haver previsão do resultado na culpa, quando se


tratar de culpa consciente.
g) Tipicidade

A tipicidade também constitui elemento do fato típico culposo.

Para caracterizar o crime culposo, o fato praticado pelo agente deve encontrar
correspondência num tipo penal que prevê a modalidade culposa da conduta.

E, nos crimes culposos, há a peculiaridade de somente incidirem se expressamente


previstos em lei. É o que se extrai do artigo 18, parágrafo único, do Código Penal, segundo o
qual “salvo os casos expressos em lei, ninguém poderá ser punido por fato previsto como crime,
senão quando o pratica dolosamente”.

De fato, quando o tipo penal descreve um modelo legal de conduta proibida, silenciando
a respeito da modalidade culposa, significa que o crime existe somente na forma dolosa.

Tomemos como exemplo o crime de furto (CP, art. 155). O tipo penal descreve a conduta
proibida (Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel), silenciando quanto à modalidade
culposa dessa conduta. Logo, forçoso concluir que não existe furto culposo, incidindo, pois,
somente na modalidade dolosa.

Da mesma forma, se Adriano, acidentalmente, quebra a tela do celular de Vinicius, seu


colega de trabalho, o fato não constituirá crime, uma vez que não há previsão na lei do crime de
dano culposo.

Assim, para se aferir a tipicidade, deve-se verificar se o fato praticado pelo agente
encontra correspondência numa norma penal incriminadora que prevê a modalidade culposa.
Imaginemos que um motorista, imprimindo velocidade excessiva no seu veículo, dirigindo, pois,
de forma imprudente, perde o controle da direção e atropela uma pessoa, causando-lhe a morte.
Essa conduta imprudente encontra correspondência no tipo penal que define o crime de
homicídio culposo na condução de veículo automotor (Lei 9.503/97, art. 302), havendo, pois,
tipicidade.

7.2.3 Diferença entre culpa consciente e dolo eventual


A culpa consciente se aproxima do dolo eventual, mas com ele não se confunde. Há entre
ambos os institutos uma característica em comum: a previsão do resultado. Todavia, a distinção
fundamental reside no fato de que no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível,
mas segue em diante com a sua conduta assumindo o risco de produzi-lo, aceitando, inclusive,
a incidência de eventual evento lesivo; na culpa consciente, ao revés, o agente, embora tenha
previsto o resultado, não o aceita, pois considera, sinceramente, que não ocorrerá ou que terá
habilidade suficiente para evitar o evento lesivo.

Na culpa consciente, o agente tem consciência do risco da sua conduta, representa a


produção do resultado típico, prevendo-o como possível, mas desenvolve a conduta sem
observar o dever de cuidado objetivo, porque acredita firmemente que nada ocorrerá.

Imaginemos que Felipe e Rogério estejam praticando uma caçada. Em certo momento,
Felipe visualiza um animal próximo a Rogério, e, confiando na sua habilidade no manuseio de
uma arma, refutando a possibilidade de atingir o amigo, faz a mira em direção do animal, aciona
o gatilho, mas acaba acertando Rogério, causando-lhe a morte. Nesse caso, Felipe responderá
pelo crime de homicídio culposo, já que confiou convictamente que atingiria o animal, e não a
vítima.

No dolo eventual, o agente tem a nítida representação do resultado, prevendo-o como


possível realizá-lo, segue em diante na conduta, assumindo o risco e aceitando a produção do
resultado.

Tomemos como exemplo a conduta de Leonardo que, após uma noite inteira ingerindo
bebida alcoólica, estando, portanto, absolutamente embriagado, conduz seu veículo em altíssima
velocidade, arriscando manobras ousadas numa via de intenso fluxo de veículos e pedestres,
quando, ao ultrapassar sinal vermelho, atropela uma pessoa que cruzava a via. Há,
evidentemente, a previsão do resultado e, analisando-se todos os elementos que envolveram a
circunstâncias do caso concreto (embriaguez ao volante, excesso de velocidade em via
movimentada, ultrapassar sinal vermelho), forçoso concluir que o condutor do veículo assumiu o
risco de produzir o resultado, sendo indiferente quanto à sua incidência. Logo, nesse caso,
Leonardo deveria responder por homicídio doloso, na modalidade dolo eventual.

Em síntese, incide a culpa consciente quando o agente prevê o resultado, mas espera,
sinceramente, que não ocorrerá; configura- se o dolo eventual quando a vontade do agente não
está dirigida para a obtenção do resultado, mas, prevendo que o evento possa ocorrer, assume
assim mesmo a possibilidade de sua produção, conformando-se com a sua ocorrência.
7) (QUESTÃO 1 – XIX EXAME)
João estava dirigindo seu automóvel a uma velocidade de 100 km/h em uma rodovia em que o
limite máximo de velocidade é de 80 km/h. Nesse momento, foi surpreendido por uma bicicleta
que atravessou a rodovia de maneira inesperada, vindo a atropelar Juan, condutor dessa
bicicleta, que faleceu no local em virtude do acidente. Diante disso, João foi denunciado pela
prática do crime previsto no Art. 302 da Lei nº 9.503/97. As perícias realizadas no cadáver da
vítima, no automóvel de João, bem como no local do fato, indicaram que João estava acima da
velocidade permitida, mas que, ainda que a velocidade do veículo do acusado fosse de 80 km/h,
não seria possível evitar o acidente e Juan teria falecido. Diante da prova pericial constatando a
violação do dever objetivo de cuidado pela velocidade acima da permitida, João foi condenado à
pena de detenção no patamar mínimo previsto no dispositivo legal. Considerando apenas os
fatos narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão do magistrado, indicando seu prazo e fundamento
legal? (Valor: 0,60)

B) Qual a principal tese jurídica de direito material a ser alegada nas razões recursais?
(Valor: 0,65)

Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

8) (QUESTÃO 4 – EXAME 2010-03)


Caio, professor do curso de segurança no trânsito, motorista extremamente qualificado, guiava
seu automóvel tendo Madalena, sua namorada, no banco do carona. Durante o trajeto, o casal
começa a discutir asperamente, o que faz com que Caio empreenda altíssima velocidade ao
automóvel. Muito assustada, Madalena pede insistentemente para Caio reduzir a marcha do
veículo, pois àquela velocidade não seria possível controlar o automóvel. Caio, entretanto,
respondeu aos pedidos dizendo ser perito em direção e refutando qualquer possibilidade de
perder o controle do carro. Todavia, o automóvel atinge um buraco e, em razão da velocidade
empreendida, acaba se desgovernando, vindo a atropelar três pessoas que estavam na calçada,
vitimando-as fatalmente. Realizada perícia de local, que constatou o excesso de velocidade, e
ouvidos Caio e Madalena, que relataram à autoridade policial o diálogo travado entre o casal,
Caio foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio na modalidade de
dolo eventual, três vezes em concurso formal. Recebida a denúncia pelo magistrado da vara
criminal vinculada ao Tribunal do Júri da localidade e colhida a prova, o Ministério Público pugnou
pela pronúncia de Caio, nos exatos termos da inicial. Na qualidade de advogado de Caio,
chamado aos debates orais, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

A) Qual(is) argumento(s) poderia(m) ser deduzidos em favor de seu constituinte? (Valor:


0,4)

B) Qual pedido deveria ser realizado? (Valor: 0,3)

C) Caso Caio fosse pronunciado, qual recurso poderia ser interposto e a quem a peça de
interposição deveria ser dirigida? (Valor: 0,3)
Princípio da insignificância

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

8.1 Introdução
Muitas vezes, condutas que coincidem com o tipo, do ponto de vista formal, não
apresentam a menor relevância material. São condutas de pouco ou escasso significado lesivo,
de forma que, nesses casos, tem aplicação o princípio da insignificância, pelo qual se permite
excluir, de pronto, a tipicidade material.

Exemplo: furto de produtos de higiene pessoal avaliados em R$ 2,65. Tentar subtrair uma
caixinha de ovos. Subtrair apenas uma lata de sardinha, ou, ainda, na subtração, em
supermercado, de simples escova de dentes ou de um pano de prato, balas, doces, bombons ou
pequenos enfeites de Natal.

Para se admitir o princípio da insignificância, além da irrelevância da ação do agente, é


preciso que o valor da coisa subtraída seja irrisório. Os Tribunais superiores, embora não
estabeleçam parâmetro absoluto, consideram irrelevante o valor equivalente a 10% do salário-
mínimo.

Com efeito, o STF e o STJ apontam quatro requisitos objetivos para a incidência do
princípio da insignificância: a) mínima ofensividade da conduta; b) ausência de periculosidade
social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da
lesão jurídica.

Os Tribunais Superiores elencam tais requisitos, sem, no entanto, estabelecer a diferença


entre eles e especifi car o alcance de cada um. Há, ainda, quem entenda que tais requisitos são
tautológicos, que, em síntese, dizem a mesma coisa.

E, na verdade, parece-nos que não seria realmente adequado estabelecer critérios rígidos
e absolutos para cada requisito, já que os parâmetros estabelecidos para aferição da incidência
do princípio da insignificância podem variar a depender das circunstâncias do caso concreto,
como, por exemplo, o valor do bem atingido, a situação econômica da vítima, as condições
pessoais do autor do fato, bem como as peculiaridades da prática delituosa.

Em outras palavras, a valoração conjunta desses requisitos pode variar de caso a caso, o
que pode parecer insignifi cante num caso, pode não ser em outro semelhante, ou seja, furtar
um objeto no valor de R$ 100,00 (cem reais) pertencente a uma pessoa com situação fi nanceira
confortável pode ensejar a incidência do princípio da insignifi cância, ao passo que subtrair uma
velha bicicleta, avaliada em R$ 100,00 (cem reais), pertencente a um modesto trabalhador que
a utiliza como meio de transporte para se deslocar até o local de trabalho, pode não incidir tal
princípio.

8.2 Princípio da insignificância no crime de descaminho - art. 334, CP


Baseado no art. 20 da Lei 10.522/2002, segundo o qual “Serão arquivados, sem baixa na
distribuição, por meio de requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das
execuções fiscais de débitos inscritos em dívida ativa da União pela Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior àquele estabelecido
em ato do Procurador-Geral da Fazenda Nacional.” (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019).

A Portaria nª 75/MF prevê o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a


Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Logo, incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho


quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a
teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias
n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.

É o entendimento do STF e, recentemente, do STJ.

9) (QUESTÃO 4 – XI EXAME)

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Lucile, imputando-lhe a prática da conduta


descrita no Art. 155, caput, do CP. Narrou, a inicial acusatória, que no dia 18/10/2012 Lucile
subtraiu, sem violência ou grave ameaça, de um grande estabelecimento comercial do ramo de
venda de alimentos, dois litros de leite e uma sacola de verduras, o que totalizou a quantia de
R$10,00 (dez reais). Todas as exigências legais foram satisfeitas: a denúncia foi recebida, foi
oferecida suspensão condicional do processo e foi apresentada resposta à acusação. O
magistrado, entretanto, após convencer-se pelas razões invocadas na referida resposta à
acusação, entende que a fato é atípico. Nesse sentido, tendo como base apenas as
informações contidas no enunciado, responda, justificadamente, aos itens a seguir.

A) O que o magistrado deve fazer? Após indicar a solução, dê o correto fundamento legal.
(Valor: 0,65)

B) Qual é o elemento ausente que justifica a alegada atipicidade? (Valor: 0,60)

10) (QUESTÃO 4 - XXX EXAME)

Maria foi denunciada pela suposta prática do crime de descaminho, tendo em vista que teria
deixado de recolher impostos que totalizavam R$ 500,00 (quinhentos reais) pela saída de
mercadoria, fato constatado graças ao lançamento definitivo realizado pela Administração
Pública. Considerando que constava da Folha de Antecedentes Criminais de Maria outro
processo pela suposta prática de crime de roubo, inclusive estando Maria atualmente presa em
razão dessa outra ação penal, o Ministério Público deixou de oferecer proposta de suspensão
condicional do processo. Após a instrução criminal em que foram observadas as formalidades
legais, sendo Maria assistida pela Defensoria Pública, foi a ré condenada nos termos da
denúncia. A pena aplicada foi a mínima prevista para o delito, a ser cumprida em regime inicial
aberto, substituída por restritiva de direitos. Maria foi intimada da sentença através de edital, pois
não localizada no endereço constante do processo. A família de Maria, ao tomar conhecimento
do teor da sentença, procura você, na condição de advogado(a) para prestar esclarecimentos
técnicos. Informa estar preocupada com o prazo recursal, já que Maria ainda não tinha
conhecimento da condenação, pois permanecia presa. Na condição de advogado(a),
esclareça os seguintes questionamentos formulados pela família da ré.

A) Existe argumento de direito processual para questionar a intimação de Maria do teor


da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,60)

B) Qual argumento de direito material poderá ser apresentado, em eventual recurso, em


busca da absolvição de Maria? Justifique. (Valor: 0,65)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.
Descriminante putativa

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

9.1 Conceito

É a causa excludente da ilicitude erroneamente imaginada pelo agente. Ela não existe
na realidade, mas o sujeito pensa que sim, porque está errado. Só existe, portanto, na mente,
na imaginação do agente. Por essa razão, é também conhecida como descriminante imaginária
ou erroneamente suposta.

Logo, é possível que o sujeito, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias do
caso concreto, suponha encontrar-se em estado de necessidade, legítima defesa, estrito
cumprimento do dever legal ou em exercício regular do direito. Quando isso ocorre, aplica-se o
disposto no art. 20, § 1º, 1ª parte.

9.2 Espécies

A) Descriminante putativa por erro de tipo

É um erro de tipo essencial incidente sobre elementares de um tipo permissivo. Os tipos


permissivos são aqueles que permitem a realização de condutas inicialmente proibidas.
Compreendem os que descrevem as causas de exclusão da ilicitude. São espécies de tipo
permissivo:

Legítima defesa

Estado de necessidade

Exercício regular do direito

Estrito cumprimento do dever legal


Ocorrerá um erro de tipo permissivo quando o agente, erroneamente, imaginar uma
situação de fato totalmente diversa da realidade, em que estão presentes os requisitos de uma
causa de justificação.

Assim, por exemplo, se o agente praticar uma conduta supondo estar diante de uma
agressão injusta, mas, que na verdade, não existe. Trata-se de legítima defesa putativa.

O agente pratica uma conduta supondo estar numa situação de perigo, que, na verdade,
não existe. Trata-se de estado de necessidade putativo.

Os efeitos são os mesmos do erro de tipo, já que a descriminante putativa por erro de tipo
não é outra coisa senão erro de tipo essencial incidente sobre tipo permissivo.

Assim, se o erro for vencível, o agente responde por crime culposo, já que o dolo será
excluído, da mesma forma como sucede com o erro de tipo propriamente dito; se o erro for
inevitável, excluir-se-ão o dolo e a culpa e não haverá crime.

Cuidando-se de erro invencível, há exclusão do dolo e culpa.

Tratando-se de erro vencível, responde o sujeito por crime culposo, se prevista a


modalidade culposa. Provando-se que o sujeito não foi diligente no verificar as circunstâncias do
fato, responde por crime de homicídio culposo (art. 20, § 1º, CP).

B) Descriminante putativa por erro de proibição

O agente tem perfeita noção de tudo o que está ocorrendo. Não há qualquer engano
acerca da realidade. Não há erro sobre a situação de fato. Ele supõe que está diante da causa
que exclui o crime, porque avalia equivocadamente a norma: pensa que esta permite, quando,
na verdade, ela proíbe; imagina que age certo, quando está errado; supõe que o injusto é justo.

O sujeito imagina estar em legítima defesa, estado de necessidade etc., porque supõe
estar autorizado e legitimado pela norma a agir em determinada situação.

Exemplo: uma pessoa de idade avançada recebe um violento tapa em seu rosto, desferido
por um jovem atrevido. O idoso tem perfeita noção do que está acontecendo, sabe que seu
agressor está desarmado e que o ataque cessou. Não existe, portanto, qualquer equívoco sobre
a realidade concreta. Nessa situação, no entanto, imagina-se equivocadamente autorizado pelo
ordenamento jurídico a matar aquele que o humilhou, atuando, assim, em legítima defesa de sua
honra.

Ocorre aqui uma descriminante (a legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude)


putativa (imaginária, já que não existe no mundo real) por erro de proibição (pensou que a
conduta proibida fosse permitida). No exemplo dado, a descriminante, no caso a legítima defesa,
foi putativa, pois só existe na mente do homicida, que imaginou que a lei lhe tivesse permitido
matar. Essa equivocada suposição foi provocada por erro de proibição, isto, por erro sobre a
ilicitude da conduta praticada.

As consequências dessa descriminante putativa encontram-se no art. 21 do CP e são as


mesmas do erro de proibição direto ou propriamente dito.

O dolo não pode ser excluído, porque o engano incide sobre a culpabilidade e não sobre
a conduta (por isso, erro de proibição). Se o erro for inevitável, o agente terá cometido um crime
doloso, mas não responderá por ele; se evitável, responderá pelo crime doloso com pena
diminuída de 1/6 a 1/3.

9.3 Consequências

No contexto das descriminantes putativas, aplica-se a teoria limitada da culpabilidade.

Pela teoria limitada da culpabilidade, quando a descriminante putativa incidir sobre


pressupostos de uma situação de fato (exemplo: o agente imaginar que está diante de uma
injusta agressão, mas que era imaginária. Supor que o desafeto iria sacar uma arma, quando,
na verdade, era um celular), o efeito em relação à conduta do agente é o mesmo do erro de tipo
(art. 20, CP): Se o erro foi invencível, exclui o dolo e a culpa; se vencível, exclui o dolo, mas o
agente responde pelo delito culposo, se previsto em lei. Para Cleber Masson, “acarreta a
atipicidade do fato, pois no finalismo o dolo e a culpa compõem a estrutura da conduta. Sem eles
não há conduta, e sem conduta o fato é atípico”.

Agora, se a descriminante putativa recair sobre pressupostos os limites legais das


excludentes, ou seja, apesar de conhecer a situação de fato, ignora a ilicitude do
comportamento (supõe ser comportamento lícito), o efeito será o mesmo do erro de proibição:
se inevitável, o agente será isento de pena; se evitável, o agente responde pelo delito, mas terá
a pena reduzida (art. 21, CP). Exemplo: um senhor de idade recebe um soco de um jovem rapaz
e acredita estar autorizado a revidar, lesionando-o gravemente por conta do desaforo. O senhor
sabe exatamente o que está fazendo, mas ignora que sua conduta será ilícita (que, no caso, não
se trata de hipótese de legítima defesa). É o caso das descriminantes putativas por erro de
proibição.

11) (QUESTÃO 4 - XXVII EXAME)


Revoltada com o fato de que sua melhor amiga Clara estaria se relacionando com seu ex-
companheiro João, Maria a procurou e iniciou uma discussão.
Durante a discussão, Clara, policial militar, afirmou que, se Maria a xingasse novamente, ela a
mataria gastando apenas uma munição da sua arma. Persistindo na discussão, Maria voltou a
ofender Clara. Esta, então, abriu sua bolsa e pegou um bem de cor preta. Acreditando que Clara
cumpriria sua ameaça, Maria desferiu um golpe na cabeça da rival, utilizando um pedaço de pau
que estava no chão. A perícia constatou que o golpe foi a causa eficiente da morte de Clara.
Posteriormente, também foi constatado que Clara, de fato, estava com sua arma de fogo na
bolsa, mas que ela apenas pegara seu telefone celular para ligar para João.
Após denúncia pela prática do crime de homicídio qualificado e encerrada a instrução da primeira
fase do procedimento do Tribunal do Júri, entendeu o magistrado por pronunciar Maria nos
termos da inicial acusatória.
Com base nas informações expostas, responda, na condição de advogado(a) de Maria,
aos itens a seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão proferida pelo magistrado? Caso tivesse ocorrido a
impronúncia, o recurso pela parte interessada seria o mesmo? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual a tese de direito material a ser apresentada em sede de recurso para combater a
decisão de submeter a ré ao julgamento pelo Tribunal do Júri? Justifique. (Valor: 0,60)
12) (QUESTÃO 1 - VI EXAME)
Ao chegar a um bar, Caio encontra Tício, um antigo desafeto que, certa vez, o havia ameaçado
de morte. Após ingerir meio litro de uísque para tentar criar coragem de abordar Tício, Caio partiu
em sua direção com a intenção de cumprimentá-lo. Ao aproximar-se de Tício, Caio observou que
seu desafeto bruscamente pôs a mão por debaixo da camisa, momento em que achou que Tício
estava prestes a sacar uma arma de fogo para vitimá-lo. Em razão disso, Caio imediatamente
muniu-se de uma faca que estava sobre o balcão do bar e desferiu um golpe no abdome de
Tício, o qual veio a falecer. Após análise do local por peritos do Instituto de Criminalística da
Polícia Civil, descobriu-se que Tício estava tentando apenas pegar o maço de cigarros que
estava no cós de sua calça.
Considerando a situação acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
A) Levando-se em conta apenas os dados do enunciado, Caio praticou crime? Em caso
positivo, qual? Em caso negativo, por que razão? (Valor: 0,65)
B) Supondo que, nesse caso, Caio tivesse desferido 35 golpes na barriga de Tício, como
deveria ser analisada a sua conduta sob a ótica do Direito Penal? (Valor: 0,60)
Conflito aparente de normas

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

10.1. Introdução

O conflito aparente de normas se revela quando se tem a percepção da incidência, em


tese, de duas ou mais normas em vigor sobre determinado fato. Neste caso, surge o que se
denomina conflito aparente de normas penais, também chamado concurso aparente de normas,
concurso aparente de normas coexistentes, concurso ideal impróprio e concurso impróprio de
normas.

Há um fato, em tese, punível, mas que sobre ele podem incidir, aparentemente, duas ou
mais normas penais. Todavia, tendo em vista ser vedada a incidência de mais de uma norma
penal sobre fato único, apenas uma das normas possíveis deverá ser aplicada ao caso concreto.

Assim, no conflito aparente de normas, há a presença dos seguintes elementos: a)


unidade do fato (há somente uma infração penal); b) pluralidade de normas (duas ou mais
normas pretendendo regulá-lo); c) todas as normas em vigor, com a incidência de apenas uma
delas sobre o fato.

Imaginemos o caso de uma mãe matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho,
logo após o parto. Há um único fato sobre o qual, aparentemente, pode incidir o crime de
homicídio, previsto no art. 121 do CP, ou infanticídio, previsto no art. 123 do CP. Eis o conflito de
normas estabelecido, já que apenas uma delas deverá incidir sobre o fato.

A solução do conflito aparente de normas ganha especial importância sobretudo para


evitar o bis in idem, já que não se admite no nosso ordenamento jurídico dupla punição pelo
mesmo fato. Ou seja, não se mostra possível punir a mãe pelo crime de homicídio e de
infanticídio, devendo, no caso, incidir apenas uma dessas normas.

O conflito de normas é aparente, pois será sanado com a aplicação do princípio adequado
ao caso. Em outras palavras, o conflito que se estabelece entre as normas é apenas aparente,
porque, na realidade, somente uma delas acaba regulamentando o fato, ficando afastadas as
demais.

10.2. Conflito aparente de normas x concurso de crimes

No conflito aparente de normas há um único fato, retratado por única conduta, devendo
sobre ela incidir apenas uma das normas vigentes. No concurso de crimes há pluralidade de
condutas, ensejando a incidência de dois ou mais fatos delituosos. Nesse caso de pluralidade
de crimes, evidentemente será possível a aplicação de mais de uma norma penal, uma para
cada fato praticado, resultando na soma ou exasperação da pena final.

O conflito aparente de normas não encontra previsão expressa no ordenamento jurídico,


sendo suas bases construídas pela doutrina e jurisprudência. Já as regras do concurso de crimes
estão expressamente previstas no Código Penal, mais especificamente nos arts. 69 a 72 do
referido diploma legal.

10.3. Princípios para dirimir o conflito aparente de normas

Diante da ausência de expressa previsão legal de regras voltadas a dirimir o conflito


aparente de normas, a doutrina aponta quatro princípios para solucionar tal conflito: a)
especialidade; b) subsidiariedade; c) consunção; e d) alternatividade.

10.3.1. Princípio da especialidade

Trata-se da aplicação da regra de que a lei especial afasta a aplicação da lei geral.

A lei especial, ou específica, caracteriza-se por se revestir de sentido diferenciado,


individualizado, que a particulariza em relação às demais normas. Dito de outro modo, além de
reunir todos os elementos que integram a lei geral, a lei especial contém outros que a torna
específica, que a particulariza, chamados elementos especializantes.

E, nos termos do art. 12 do CP, a lei especial prevalece sobre a lei geral.
Tomemos, novamente, como exemplo o caso de uma mãe matar, sob influência do estado
puerperal, o próprio filho, durante ou logo após o parto. Há um único fato sobre o qual,
aparentemente, pode incidir o crime de homicídio, previsto no art. 121 do CP, ou infanticídio,
previsto no art. 123 do CP. O crime de infanticídio possui núcleo idêntico ao do crime de
homicídio, ou seja, reúne todos os elementos descritos no art. 121 do CP, consistentes em “matar
alguém”. Todavia, além dos elementos da norma geral, prevista no art. 121 do CP, o art. 123 do
CP contém elementos que o especializa e o diferencia do crime de homicídio, quais sejam: autora
do fato ser a própria genitora da vítima; vítima nascente ou neonato; crime praticado sob
influência do estado puerperal.

Note-se que se estabeleceu um conflito entre as normas dos arts. 121 e 123 do CP, mas
que é aparente, pois será solucionado pelo princípio da especialidade, prevalecendo, no caso, a
norma penal que define o crime de infanticídio, já que as elementares contidas neste crime o
torna especial em relação à norma geral que define o homicídio.

As normas genéricas e as específicas não exigem que estejam presentes no mesmo


diploma legal, podendo estar previstas em leis distintas. Ou seja, não se afigura necessário que
a norma geral e a especial estejam previstas no Código Penal, por exemplo. É possível, portanto,
que a norma geral esteja prevista no Código Penal e a especial em legislação extravagante.

É o que ocorre, por exemplo, entre os crimes de contrabando, previsto no art. 334-A do
CP, e o crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei no 11.343/2006. Sobre a
conduta de importar cocaína pode, aparentemente, incidir duas normas: a que define o crime de
contrabando e a que prevê o crime de tráfico de drogas. Todavia, esse conflito é resolvido pelo
princípio da especialidade. O art. 33, caput, da Lei no 11.343/2006 reúne todos os elementos
contidos no tipo penal que descreve o crime de contrabando, acrescido de elementares que o
especializa, qual seja, importar droga, prevalecendo, assim, sobre a norma geral.

Convém destacar que a gravidade de um crime em relação a outro não é determinante


para se definir qual a norma especial. De fato, a comparação entre as leis não leva em conta a
gravidade dos crimes, mas o critério especializante, mediante o confronto dos elementos que
integram a definição abstrata das normas penais.

A comparação não recai sobre o fato, mas entre as normas penais que aparentemente
podem incidir sobre o delito praticado. Assim, deve-se buscar adequar o fato praticado às normas
possíveis. Se, além de se enquadrar na norma geral, o fato praticado apresentar algum elemento
que o especialize, que o destaque, que o especifique em relação à conduta descrita na norma
geral, prevalecerá a incidência da lei especial. Em outras palavras, se, além de abrigar todos os
elementos da lei geral, conter ainda elementos que a especifiquem, a lei especial prevalece sobre
a geral.

10.3.2. Princípio da subsidiariedade

Para melhor compreensão do princípio da subsidiariedade, convém, por primeiro,


estabelecer distinção entre norma primária e norma subsidiária.

A norma primária ou principal é aquela que descreve a conduta de forma mais abrangente,
contemplando, inclusive, aquela descrita na norma subsidiária. Trata-se, pois, de norma que
descreve conduta de forma mais abrangente, que atinge com maior gravidade determinado bem
jurídico.

Considera-se subsidiária a norma que descreve uma conduta que atinge em menor grau
um determinado bem jurídico, sendo, pois, menos grave do que a norma principal. A norma
subsidiária, portanto, além de ser menos grave, descreve conduta que representa parte da
execução do delito previsto na norma principal. A norma subsidiária está abarcada pela norma
principal.

Tomemos como exemplo o tipo penal que define o crime de constrangimento ilegal (CP,
art. 146) em consonância com o crime de estupro (CP, art. 213). O delito de constrangimento
ilegal é menos grave que o de estupro. Além disso, o tipo penal que define o crime de
constrangimento ilegal descreve uma parte da execução do crime de estupro, consistente em
“constranger”. Logo, a norma que define o crime de constrangimento ilegal é subsidiária,
enquanto a que define o crime de estupro é a principal.

Note-se que, ao contrário do que ocorre no princípio da especialidade, a comparação não


é meramente entre as normas (uma mais especial do que a outra), mas em relação ao fato. Ou
seja, para a aplicação do princípio da subsidiariedade, é imprescindível a análise do caso
concreto, sendo insuficiente a mera comparação abstrata dos tipos penais, devendo ser
verificado, por exemplo, a intenção do agente, os meios empregados para a prática do crime,
além de outras circunstâncias que envolvem o contexto fático, a fim de ser verificada a extensão
da gravidade do delito praticado.

Isso porque a norma principal ou primária absorve a norma subsidiária, que incidirá
somente na impossibilidade de aplicação da norma principal mais grave. Primeiro, verifica-se,
considerando as circunstâncias do caso concreto, se não incide a norma primária. Se a conduta
não se enquadrar perfeitamente no tipo penal mais grave, passa-se então a cogitar da incidência
da norma subsidiária. É como, perdoe-nos a analogia, se o jogador titular do grande grêmio
imortal não puder entrar em campo, jogará o reserva.

A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita.

10.3.2.1. Subsidiariedade expressa

A subsidiariedade expressa se caracteriza por estar formalmente declarada na norma. A


própria norma penal prevê expressamente que será aplicável somente quando outra norma de
maior gravidade não incidir. Em outras palavras, a própria lei faz expressa ressalva ao seu
caráter de subsidiariedade, admitindo incidir somente se o fato praticado não caracterizar crimes
mais grave.

O crime de expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente constitui exemplo
de subsidiariedade expressa, porquanto o próprio art. 132 do CP prevê que incidirá a pena de
detenção, de três meses a um ano pela prática de tal delito, “se o fato não constitui crime mais
grave”. Assim, se não restar caracterizada a prática, por exemplo, de tentativa de homicídio
(norma primária), poderá, conforme o caso, incidir o delito previsto no art. 132 do CP (norma
subsidiária).

O crime de lesão corporal seguido de morte também se reveste de caráter de


subsidiariedade, uma vez que, como expressamente consta no art. 129, § 3o, do CP, somente
incidirá se “as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco
de produzi-lo”. Logo, se não restar demonstrado que o agente quis a morte da vítima ou assumiu
o risco de causá-la, o que ensejaria a aplicação do art. 121 do CP (norma primária), incidirá o
crime previsto no art. 129, § 3o, do CP (norma subsidiária).

A norma subsidiária que define o crime de subtração de incapaz, previsto no art. 249 do
CP, somente incidirá “se o fato não constitui elemento de outro crime”. Assim, se, por exemplo,
o agente subtraiu/sequestrou o menor de 18 anos como condição ou preço de resgate, incorrerá
no crime de extorsão mediante sequestro, previsto no art. 159 do CP (norma principal).

O crime de importunação sexual, previsto no art. 215-A do CP, incluído pela Lei no
13.718/2018, incidirá “se o ato não constitui crime mais grave”, conforme expressamente prevê
o referido dispositivo legal. Logo, o delito de importunação sexual somente incidirá se a conduta
do agente não caracterizar crime mais grave, como, por exemplo, estupro (CP, art. 213) ou
estupro de vulnerável (CP, art. 217-A).

Assim, como já decidiu o STJ, a conduta do agente que surpreendeu a vítima, puxando-a
pelo braço, para fazê-la tocar em seu órgão genital, não obtendo êxito porque a vítima conseguiu
dele se desvencilhar, enquadra-se no art. 213 c/c art. 14, II, ambos do CP, já que se trata de ato
mais grave do que aquele previsto no art. 215-A do CP. Poder-se-ia cogitar da incidência do art.
215-A do CP (norma subsidiária), se a ação atentatória contra o pudor praticada com propósito
lascivo contra a vítima tivesse ocorrido sem violência ou grave ameaça.5

10.3.2.2. Subsidiariedade tácita

A subsidiariedade tácita ou implícita ocorre quando a norma penal não ressalva, de modo
expresso, a sua incidência na hipótese de outra norma de maior gravidade punitiva não ser
aplicável ao caso concreto.

Não há previsão expressa da natureza subsidiária da norma, extraindo-se essa condição


do contexto que envolveu o fato praticado, que não se enquadra em norma penal mais grave.
Busca-se, agora, adequar o fato ao tipo penal subsidiário, que prevê tratamento menos grave,
tanto que, não raras vezes, constitui elementar, qualificadora, causa de aumento de pena,
agravante ou meio de execução do crime previsto na norma principal ou primária.

O crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146) é tacitamente subsidiário em relação ao


crime de estupro (CP, art. 213). Assim, se, no caso concreto, não restar caracterizado que o
constrangimento, praticado mediante violência ou grave ameaça, tinha por finalidade a prática
de conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso, possível incidir o crime de constrangimento ilegal.

5 STJ, AgRg no REsp no 1767968/MG, rel. Min. Nefi Cordeiro, 6a T., j. 5-5-2020.
Logo, a conduta do agente que aponta uma arma em direção à vítima maior de idade,
determinando que fique nua, sem o dolo lascivo, mas tão somente para constrangê-la, não se
enquadra no crime de estupro, porque não foi compelida a praticar ou permitir que com ela se
pratique ato sexual. Todavia, porque a vítima foi constrangida a fazer algo contra sua vontade,
incide a norma subsidiária, prevista no art. 146 do CP.

10.3.3. Princípio da consunção ou da absorção


10.3.3.1. Introdução

Diversamente do princípio da subsidiariedade, em que a prática de um ato delituoso deve


ser enquadrada na norma mais grave, o princípio da consunção é aplicado para dirimir conflito
aparente de normas decorrente de uma sequência de fatos delituosos, que, isoladamente,
constituem crime, mas que, ao final, devem ser subsumidos a um único tipo penal. Em outras
palavras, os atos delituosos praticados para alcançar o resultado esperado serão absorvidos
pelo crime desejado, resultando, assim, na responsabilização do agente pela prática de um
crime.

Contextualizando para melhor compreensão. Imaginemos um agente que desfere golpe


de faca na vítima, causando-lhe lesões corporais; na sequência, desfere outro golpe de faca na
vítima, gerando outra lesão corporal; e, por fim, desfere o golpe fatal, matando-a. Temos duas
lesões corporais em sequência e, ao final, o homicídio. Dessa sequência de fatos delituosos
surge o conflito aparente de normas. O agente deverá responder por três crimes (duas lesões
corporais e homicídio) ou apenas pelo crime de homicídio?

Pelo princípio da consunção, ou da absorção, o fato mais abrangente e grave consome,


absorve, o(s) fato(s) menos abrangentes. Os fatos menos abrangentes figuram como meio
necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime. Nesse caso, a norma
consuntiva prevalece sobre a norma consumida. Trata-se da hipótese de o crime meio ser
absorvido pelo crime fim.

Prevalece, nessa hipótese, a norma penal que define o crime mais abrangente, que
absorverá a norma que prevê conduta de menor amplitude, evitando-se a incidência do bis in
idem.
A aplicação do princípio da consunção se justifica, porque o bem jurídico protegido pela
norma menos abrangente já está tutelado pela norma mais abrangente. Além disso, a violação
da norma menos abrangente constitui meio necessário para atingir o bem jurídico tutelado pela
norma mais abrangente.

Assim, considerando o exemplo acima, a integridade corporal (bem jurídico tutelado pelo
art. 129 do CP) também está protegido pela norma mais abrangente prevista no art. 121 do
CP. E, ainda, como a ofensa à integridade corporal constitui meio necessário para alcançar o
crime de homicídio, as lesões corporais previamente praticadas serão absorvidas pelo crime de
homicídio. Em síntese, o agente responderá unicamente pelo crime de homicídio (CP, art. 121).

10.3.3.2. Hipóteses de incidência do princípio da consunção

O princípio da consunção pode ser aplicado em quatro situações distintas: crime


progressivo, progressão criminosa, crime complexo e fatos impuníveis.

a) Crime progressivo

No crime progressivo, o agente, desejando desde o início produzir um resultado mais


grave, pratica previamente sucessão de fatos, que, isoladamente, constituem crime, até alcançar
o resultado final almejado. Ou seja, para alcançar o resultado pretendido, o agente pratica atos
antecedentes de menor gravidade, sem os quais não seria possível atingir a consumação do
delito desejado. O ato final, ensejador do resultado inicialmente pretendido, absorve todos os
anteriores. Trata-se da hipótese dos denominados crimes de passagem.

No crime progressivo há, portanto, unidade de elemento subjetivo, sendo a conduta


composta de vários atos praticados progressivamente até produzir o resultado desejado.

Tomemos como exemplo o agente que pretende desde o início produzir a morte da vítima.
Para tanto, utiliza-se de uma faca, golpeando a vítima em várias partes do corpo, vindo ao final
a aplicar o golpe fatal, causando-lhe a morte. Há um único elemento subjetivo, sendo a conduta
composta por vários atos praticados de forma progressiva até atingir o resultado mais grave.
Surge, assim, o conflito aparente de normas: o agente responderá pelos delitos de lesão corporal
(CP, art. 129) e homicídio (CP, art. 121) ou apenas pelo crime de homicídio (CP, art. 121)??
Nesse caso, aplicando-se o princípio da consunção, o agente responderá apenas pelo crime de
homicídio (CP, art. 121), pois as várias lesões corporais produzidas pelos golpes de faca
constituíram meio necessário para a execução do delito pretendido, sendo, por isso, absorvidas
pelo crime de homicídio.

Convém ressaltar que o princípio da consunção somente poderá ser adotado se


evidenciada relação de dependência ou de subordinação entre as condutas, bem como que os
delitos sequenciais foram praticados no mesmo contexto fático.

Essa premissa é fundamental para a verificação da incidência do princípio da consunção


em relação aos crimes de porte ilegal de arma e homicídio, bem como crime de porte ilegal de
arma de fogo e roubo majorado pelo emprego de arma de fogo.

E, nesse aspecto, o STJ sedimentou entendimento no sentido de que a absorção do crime


de porte ilegal de arma de fogo pelo de homicídio exige que as condutas tenham sido praticadas
no mesmo contexto, guardando relação de dependência ou subordinação, de modo que o porte
tenha como fim unicamente a prática do delito de homicídio.6

Assim, se restar demonstrado que o agente portava a arma em ocasiões distintas da


prática do crime de homicídio, não será aplicado o princípio da consunção, diante da incidência
de crimes autônomos e independentes entre si. Logo, nesse caso, o agente responderá pelo
delito previsto na Lei no 10.826/2003 e crime de homicídio, em concurso material de crimes.

b) Progressão criminosa

A progressão criminosa não se confunde com crime progressivo. Enquanto no crime


progressivo há, desde o início da conduta do agente, único elemento subjetivo, na progressão
criminosa a intenção inicial é praticar o delito menor, e, durante a execução do delito, o agente
delibera por cometer o crime mais grave. Há, portanto, pluralidade de fatos e de desígnios em
progressividade delitiva.

Assim, se o dolo inicial era o de praticar apenas lesão corporal, mas, ao longo da
execução, o agente decidir matar a vítima, haverá pluralidade de desígnios, com modificação do
dolo (primeiro, pretendia lesionar; após, deliberou por matar a vítima) e pluralidade de condutas,

6 STJ, AgRg no AgREsp no 1186399/MS, rel. Min. Nefi Cordeiro, 6a T., j. 3-5-2018.
praticadas em progressividade delitiva. Nesse caso, o agente responderá apenas pelo crime de
homicídio, restando absorvidas as lesões corporais praticadas.

c) Fatos impuníveis

Pode ocorrer de o agente realizar uma conduta anterior ou posterior, previstos como
delitos autônomos, mas que, ao final, são impuníveis. Trata-se das hipóteses dos chamados ante
factum impunível e pos factum impunível.

O ante factum não punível ocorre quando um fato anterior menos grave constitui meio
necessário para a prática de outro fato, mais grave, ficando, por conseguinte, o primeiro
absorvido, sendo o fato antecedente mero indiferente penal.

Tomemos como exemplo o fato de o agente quebrar o vidro de um veículo, caracterizando


fato definido como crime de dano (CP, art. 163), para subtrair uma bolsa feminina que se
encontra no interior do automóvel. Nesse caso, o dano provocado na porta caracteriza o ante
factum impunível, já que funcionou como meio de execução para a subtração da bolsa. Logo, o
agente responderá apenas pelo crime de furto qualificado pelo rompimento de obstáculo (CP,
art. 155, § 4º, I), sendo o fato anterior (dano) absorvido.

Nos termos da Súmula no 17 do STJ, o crime de falso é absorvido pelo de estelionato,


quando nele se exaure

O post factum impunível ocorre quando, após realizada a conduta, o agente pratica nova
conduta voltada a ofender o mesmo bem jurídico, visando apenas tirar proveito da prática
anterior. Trata-se, pois, de mero exaurimento. Assim, se após o furto o agente destrói a coisa
subtraída, só responde pelo furto (CP, art. 155), que absorverá o crime de dano (CP, art. 163).
Neste caso, a lesão ao interesse jurídico causada pela conduta precedente torna indiferente o
crime de dano.

Adotando esse fundamento, o STJ já decidiu no sentido de que o uso de documento


falsificado (CP, art. 304) deve ser absorvido pela falsificação do documento público ou privado
(CP, arts. 297 e 298), quando praticado pelo mesmo agente, caracterizando o delito de uso post
factum não punível, ou seja, mero exaurimento do crime de falso, não respondendo o falsário
pelos dois crimes, em concurso material.7

10.3.4. Princípio da alternatividade


O princípio da alternatividade se aplica nos crimes de ação múltipla ou de conteúdo
variado, no qual o tipo penal descreve duas ou mais condutas como verbos nucleares do tipo.
Nesse caso, o tipo penal descreve várias condutas, que, se praticadas pelo agente, de forma
sucessiva, configura fato único.

Se o agente adquirir, guardar e vender determinada droga, praticando, assim, três das
condutas previstas no art. 33 da Lei no 11.343/2006, deverá ser imputado a ele a prática de um
crime de tráfico de drogas, não incidindo, no caso, concurso de três infrações.

7 STJ, AgRg no RHC no 112730/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 3-3-2020.
13) (XXV EXAME – REAPLICAÇÃO EM PORTO ALEGRE – TESE PRINCIPAL DA PEÇA)
Breno, nascido em 07 de junho de 1945, na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, falsifica
uma assinatura em uma folha de cheque e a apresenta em loja de eletrodomésticos localizada
no bairro de sua residência, com a intenção de realizar compras no valor de R$ 5.000,00 (cinco
mil reais). Após a apresentação do cheque, apesar de a falsificação não ser grosseira e ser apta
a enganar, o gerente do estabelecimento comercial percebe que aquele cheque não fora
assinado pelo verdadeiro correntista do banco, já que o nome que constava do título de crédito
era de um grande amigo seu. Descoberta a fraude, o referido gerente aciona a polícia, e Breno
é preso em flagrante antes de obter a vantagem pretendida. Com o recebimento dos autos, o
Ministério Público opina pela liberdade de Breno e oferece denúncia pela prática dos crimes do
Art. 171, caput, e Art. 297, § 2º, na forma do Art. 69, todos do Código Penal. Após concessão da
liberdade provisória e recebimento da denúncia, houve juntada do laudo pericial do cheque,
constatando a falsidade e a capacidade para iludir terceiros, bem como da Folha de
Antecedentes Criminais, no qual consta uma condenação definitiva pela prática, no ano anterior,
do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, além de uma ação em curso
pela suposta prática de crime de furto. Durante a instrução, todos os fatos acima descritos são
confirmados pelas testemunhas, não tendo sido o réu interrogado, já que, apesar de intimado,
apresentou problemas de saúde no dia e não pôde comparecer à audiência. Ainda durante a
audiência de instrução e julgamento, após a instrução, as partes apresentaram suas alegações,
sendo consignado pela defesa o inconformismo com a ausência do réu, já que foi apresentado
atestado médico, e, em seguida, o juiz proferiu sentença condenatória nos termos da denúncia,
condenando o agente pela prática dos dois delitos em suas modalidades consumadas. No
momento de fixar a pena-base, aumentou o magistrado a pena do estelionato em 02 meses,
destacando que o comportamento de Breno não deixa qualquer dúvida de que agiu com dolo. Já
a pena do uso de documento falso foi aplicada em seu patamar mínimo. Na segunda fase, não
foram reconhecidas atenuantes, mas foi reconhecida a agravante da reincidência, aumentando
a pena de cada um dos delitos em mais 02 meses de reclusão. No terceiro momento, não foram
reconhecidas causas de aumento ou de diminuição. Assim, foi fixada a pena de 01 ano e 04
meses de reclusão e 14 dias-multa, no que tange ao crime de estelionato, e 02 anos e 02 meses
de reclusão e 12 dias-multa para o crime de falsificação de documento equiparado ao público,
restando a pena final em 03 anos e 06 meses de reclusão e 26 dias-multa. O regime inicial de
cumprimento de pena aplicado pelo magistrado foi o semiaberto e não houve substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direito, tudo fundamentado na reincidência do agente.
Intimado da decisão, o Ministério Público apenas tomou ciência de seu teor, não apresentando
qualquer medida. Já a defesa técnica de Breno foi intimada de seu teor em 06 de dezembro de
2017, quarta-feira, sendo quinta-feira dia útil em todo o país. Considerando apenas as
informações narradas, na condição de advogado(a) de Breno, redija a peça jurídica
cabível, diferente de habeas corpus e embargos de declaração, apresentando todas as
teses jurídicas pertinentes. A peça deverá ser datada no último dia do prazo para
interposição. (Valor: 5,00)
Concurso de pessoas

Prof. Nidal Ahmad


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11.1. Conceito de concurso de pessoas

Trata-se de contribuição entre dois ou mais agentes para o cometimento de uma infração
penal. Ocorre quando duas ou mais pessoas, em conjugação de esforços, reúnem-se para a
prática de um ou mais delitos.

A doutrina utiliza também as expressões concurso de agentes e codelinquência.

11.2. Requisitos

Não basta a contribuição de duas ou mais pessoas na prática delituosa para caracterizar
o concurso de pessoas. É necessária, ainda, a presença de determinados requisitos, sem os
quais não há como configurar o concurso de pessoas.

Para a incidência do concurso de pessoas devem estar presentes, cumulativamente, os


seguintes requisitos: a) pluralidade de condutas; b) relevância causal das condutas; c) liame ou
vínculo subjetivo; d) identidade de infrações.

11.2.1. Pluralidade de condutas

Trata-se de requisito elementar do concurso de pessoas: a concorrência de mais de uma


pessoa na execução de uma infração penal.

Assim, para que haja concurso de pessoas, exige-se que cada um dos agentes tenha
realizado ao menos uma conduta relevante. Pode ser autoria e participação, em que há uma
conduta principal e outra acessória, praticadas, respectivamente, por autor e partícipe, bem como
em coautoria, em que há duas condutas principais.
11.2.2. Relevância causal das condutas

Nos termos do art. 29, caput, do CP, quem, de qualquer modo, contribuir para a prática
de um delito incide nas penas a este cominadas. A expressão de “qualquer modo” revela a
amplitude da forma de atuação do agente na empreitada delituosa, seja na forma de contribuição
pessoal, direta ou indireta, física ou moral.

Extrai-se, ainda, do art. 29, caput, do CP, que, para incidir a hipótese de concurso de
pessoas, a conduta do agente deve concorrer para o crime, contribuindo, ainda que
minimamente, para a produção do resultado. É imprescindível, pois, que a conduta do agente
tenha sido relevante para a infração penal, a ponto de, se excluída do curso causal, o resultado
não teria ocorrido da forma como ocorreu.

Em outras palavras, se a conduta não tem qualquer relevância causal, isto é, se não
contribuiu em nada para a produção do resultado, não há que se falar em concurso de pessoas.

A simples manifestação de adesão a uma prática delituosa não configura participação.


Assim, se, sem realizar qualquer outra conduta, simplesmente manifestar que irá concorrer para
a prática de um homicídio que efetivamente foi consumado, o crime não poderá ser imputado ao
agente, por força do concurso de pessoas, uma vez que sua conduta foi absolutamente
irrelevante. Agora, se induzir, estimular, o executor a matar a vítima, o agente será
responsabilizado pelo crime de homicídio, já que sua conduta foi relevante para a produção do
resultado.

Imaginemos que a empregada doméstica de uma residência, profundamente irritada por


ter sido ofendida pela patroa, observa que há uma movimentação suspeita no lado externo da
casa, concluindo que era alguém observando o local para praticar o delito de furto. Para facilitar
o sucesso da subtração, a empregada deixa aberta a porta da frente da residência. Durante a
empreitada criminosa, sem saber que a porta da frente se encontrava destrancada, o agente de
atitude suspeita arrombou a porta dos fundos, ingressou na residência, e subtraiu diversos
objetos. Diante desse quadro fático, a empregada doméstica não deverá responder por qualquer
infração penal, uma vez que a sua contribuição foi absolutamente irrelevante para o sucesso da
subtração.
Para implementação deste requisito, além de ser relevante para o resultado, a
contribuição do agente deve ser antes ou durante a execução do delito. Se posterior ao delito,
não haverá concurso de pessoas, podendo incidir, conforme o caso, um delito autônomo, como,
por exemplo, receptação (CP, art. 180), favorecimento pessoal (CP, art. 348) ou favorecimento
real (CP, art. 149).

11.2.3. Vínculo subjetivo

Além da pluralidade de condutas relevantes para o resultado, afigura-se, ainda,


imprescindível o elemento subjetivo, consistente na conjugação de vontades de cada um dos
agentes para a produção do mesmo resultado.

Os agentes devem atuar conscientes de que participam de crime comum, ainda que não
tenha havido acordo prévio de vontades. A ausência desse elemento psicológico inviabiliza o
concurso de pessoas, ensejando condutas isoladas e autônomas.

A atuação de cada um dos agentes deve ser voltada para a produção do mesmo resultado.
Trata-se do princípio da convergência de vontades dos agentes voltados para a prática do
mesmo crime, ainda que não haja combinação prévia, ou seja, que um dos agentes não saiba
da contribuição do outro.

No vínculo subjetivo, que caracteriza o concurso de pessoas, basta que um dos agentes
tenha conhecimento que está contribuindo para prática delituosa, ainda que não tenha havido
combinação prévia com o outro agente envolvido no delito. Basta, em síntese, um dos agentes
aderir à conduta ou à vontade de outrem, e concorrer, ainda que sem o conhecimento do outro,
para a produção do resultado.

Consideremos o mesmo exemplo acima, com uma pequena e determinante adaptação.


Imaginemos que a empregada doméstica de uma residência, profundamente irritada por ter sido
ofendida pela patroa, observa que há uma movimentação suspeita no lado externo da casa,
concluindo que era alguém observando o local para praticar o delito de furto. Para facilitar o
sucesso da subtração, a empregada deixa aberta a porta da frente da residência. Durante a
empreitada criminosa, sem saber do auxílio da empregada doméstica, o agente de atitude
suspeita ingressou na residência pela porta da frente deixada aberta, e subtraiu diversos objetos.
Agora, diante desse quadro fático, a empregada doméstica deverá responder pelo furto
praticado na residência, já que sua contribuição foi relevante para o resultado (se não tivesse
deixado a porta aberta, o furto não teria ocorrido da forma como ocorreu), estando, ainda,
presente, em relação a ela a qualificadora do concurso de pessoas, diante da concorrência de
vontades, uma vez que aderiu à conduta e à vontade do agente suspeito.

A inexistência do vínculo subjetivo descaracteriza o concurso de pessoas, podendo,


conforme o caso, ensejar a hipótese de autoria mediata, autoria colateral ou crimes autônomos
e independentes em relação a cada um dos agentes.

11.2.4. Identidade de infração para todos os agentes

Nos termos do art. 29, caput, do CP: “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime
incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Significa que, via de regra,
todos aqueles que contribuem para a prática de delito responderão pelo mesmo crime.

É a aplicação da teoria unitária ou monista, segundo a qual haverá um único crime para
os diversos agentes. Assim, o agente que anuncia o assalto e realiza a subtração responderá
pelo mesmo crime daquele que o conduziu até o local do roubo, aguardando-o para empreender
fuga, e daquele que planejou toda a atividade criminosa. Os três agentes responderão pelo crime
de roubo majorado.

11.3. Modalidades de atuação no concurso de pessoas

O agente pode atuar no contexto do concurso de pessoas na condição de autor, coautor


ou partícipe. Logo, as modalidades de atuação no concurso de pessoas são: a) autoria; b)
coautoria; c) participação.
11.3.1. Autoria

Para a adequada imputação do delito ao agente, revela-se necessário identificar o seu


modo de atuação na empreitada delituosa, verificando-se se contribuiu para o delito na condição
de autor.

Todavia, diante da omissão do legislador, estabelecer o conceito de autoria não se revela


tarefa das mais pacíficas, surgindo, em razão disso, várias teorias para a definição do conceito
de autor de um crime.

Dentre essas teorias, merecem destaque: a) teoria objetiva (na qual está alojada a
vertente restritiva); b) teoria do domínio do fato.

11.3.1.1. Teoria objetiva ou dualista

A teoria objetiva ou dualista está estreitamente vinculada a um conceito restritivo de autor,


uma vez que estabelece evidente distinção entre a figura do autor e do partícipe, delimitando a
atuação dos agentes na empreitada delituosa, e restringindo a figura do autor à determinada
forma de atuação.

Com efeito, ao contrário da teoria extensiva, que tratava a autoria como figura única,
ampliando sobremaneira seu conceito, a teoria restritiva limita o conceito de autor à determinada
forma de atuação, estabelecendo nítida distinção em relação à figura do partícipe.

Agora, com a teoria objetiva, na vertente restritiva, não há só a figura do autor, mas a
figura do autor e do partícipe.

Para a teoria objetivo-formal, autor é aquele que realiza a ação ou omissão descrita no
verbo nuclear do tipo penal que define o crime ou contravenção. É, em síntese, aquele que
pratica a conduta descrita no tipo penal incriminador. É aquele que pratica, por exemplo, a ação
de “matar” (CP, art. 121); de subtrair (CP, arts. 155 e 157); de constranger (CP, arts. 146, 158 e
213).

Partícipe é aquele que contribui, de qualquer modo, para a empreitada delituosa, mas sem
realizar a ação ou omissão descrita no verbo nuclear do tipo. É aquele que induz, instiga ou
auxilia o autor a executar a conduta descrita no tipo penal.
Assim, o agente que efetua disparos contra a vítima, atuará no crime de homicídio na
condição de autor, ao passo que aquele que induziu a matá-la atuará na condição de partícipe.

Quem ingressa numa agência bancária e, portando uma arma de fogo, anuncia o assalto
e realiza a subtração do dinheiro, atuará no crime de roubo majorado na condição de autor,
enquanto o agente que se posta no lado externo do prédio e aguarda, com o motor do veículo
acionado, o comparsa para empreenderem fuga, atua no delito na condição de partícipe.

E é justamente na adequação típica da conduta do partícipe que reside a importância do


estudo do concurso de pessoas. Com efeito, em tese, a conduta do partícipe seria atípica, pois,
teoricamente, não se enquadra no modelo legal de conduta proibida descrita no tipo penal. Não
existe tipo penal definindo a conduta de “mandar matar” ou “auxiliar a subtrair”. Se não existisse
a norma de extensão do art. 29, caput, do CP essas condutas vinculadas ao partícipe seriam
atípicas, gerando impunidade.

Por meio dessa norma de extensão, que serve como verdadeira ponte, é possível
adequar, ainda que de forma indireta, a conduta do partícipe ao tipo penal que descreve a
conduta criminosa.

Assim, por exemplo, a conduta do autor intelectual ou do mandante do crime será típica,
por força da norma de extensão (ou ponte de ouro) do art. 29, caput, CP, que estabelece a
ligação entre a sua conduta e o tipo penal correspondente.

11.3.1.2 Teoria do domínio do fato

De acordo com a teoria do domínio do fato, autor é quem tem o controle final do fato. É
quem domina o decurso do crime e decide sobre sua prática, interrupção e circunstâncias. O
partícipe não tem o domínio do fato, pois apenas coopera, induz e incita a prática do delito.

Em síntese, a teoria do domínio do fato amplia o conceito de autor, abarcando também o


agente que realiza uma parte necessária da execução do plano global, com o domínio funcional
do fato, mesmo que não constitua um ato típico em sentido estrito. É aquele que domina a
realização do fato, quem tem poder sobre ele, bem como quem tem poder sobre a vontade alheia.
Assim, para a teoria do domínio do fato, a figura do autor não se restringe somente aquele
que executa a conduta descrita no tipo penal, mas também aquele que tem o controle da ação
típica dos demais agentes, inserindo-se, nesse contexto, o autor executor, o autor intelectual, o
autor mediato, bem como o coautor.

O partícipe é aquele que contribui para o delito alheio, sem realizar a figura típica, nem
tampouco comandar a ação. É quem não domina a realização do fato, mas contribui de qualquer
modo para ele.

EXEMPLO 1:

Clodoaldo, Alan e Patrícia, todos maiores e capazes, deliberaram para assaltar uma
empresa local. Em data e hora combinadas, no período noturno e após o
fechamento, Clodoaldo e Alan arrombaram a porta dos fundos da empresa, na qual
entraram e ficaram vigiando enquanto Patrícia subtraía objetos valiosos, que seriam
divididos igualmente entre os três. Como se vê, a rigor somente Patrícia praticou a
ação nuclear do tipo penal que define o crime de furto, já que somente ela praticou
o ato de subtrair. Não há dúvida que Patrícia atuou no delito na condição de autora.
Clodoaldo e Alan não realizaram a ação descrita no tipo penal, mas, sem dúvida,
tinham o controle de toda a ação delituosa, o domínio final do fato, sendo, portanto,
também autores do delito.

EXEMPLO 2:

Clodoaldo, Alan e Patrícia deliberaram praticar um crime de roubo. Clodoaldo se


encarregou somente de emprestar a arma. Alan ficou responsável por transportar
em seu veículo Patrícia até o local do crime e dar-lhe fuga. Patrícia atraiu a vítima
ao local ermo, anunciou o assalto, apontando a arma para a vítima, e, após, subtraiu
sua carteira. Nesse contexto, pela teoria do domínio do fato, Alan e Patrícia atuaram
na condição de autores, já que tinham o domínio de toda empreitada delituosa, ao
passo que Clodoaldo, por ter somente emprestado a arma, sem o controle de
dominar a ação dos comparsas, responderá pelo crime de roubo majorado na
condição de partícipe.

11.3.2. Coautoria

A coautoria é a modalidade de atuação no concurso de pessoas em que dois ou mais


agentes figuram como autores do crime, desenvolvendo a conduta em busca do mesmo
resultado.

A coautoria pode ser parcial (ou funcional) ou direta (ou material).

A coautoria parcial (ou funcional) é aquela em que há divisão de tarefas entre os agentes,
que, somadas, produzem o resultado desejado por todos.

EXEMPLO:

Um dos agentes segura a vítima, enquanto o outro desfere nela golpes de faca.

A coautoria direta (ou material) é aquela em que todos os agentes executam atos iguais,
voltados à produção do resultado.

EXEMPLO:

Mauro e Arnaldo, ambos portando faca, desferem golpes de faca contra a vítima
até levá-la à morte.

11.3.3. Participação

Conforme a teoria restritiva de autoria, partícipe é quem contribui para que o autor ou
coautores realizem a conduta principal, ou seja, aquele que, sem praticar o verbo nuclear do tipo,
concorre de algum modo para a produção do resultado. De acordo com a teoria do domínio do
fato, participação é a contribuição dolosa de menor relevância, em que o agente contribui para o
fato de outrem, sem ter o domínio do fato.

Assim, considerando a teoria restritiva, adotada pelo Código Penal, autor seria o agente
que pratica a conduta descrita no verbo nuclear do tipo incriminador, ao passo que partícipe seria
aquele que contribui, de qualquer modo, para a atividade delituosa, mas sem realizar a conduta
descrita no tipo penal.

EXEMPLO:

Imaginemos a hipótese de Carlos instigar e encorajar Pedro a matar João. Se


efetivamente praticar a ação de matar João, Pedro responderá pelo crime de
homicídio na condição de autor, enquanto Carlos responderá pelo mesmo crime na
condição de partícipe.

Dessarte, a participação é a atividade acessória daquele que colabora para a conduta do


autor com a prática de uma ação que, em si mesma, não é penalmente relevante no sentido de
realização da conduta descrita no tipo penal. Logo, partícipe de um crime é o sujeito que induz,
instiga ou auxilia na prática do crime, sem praticar a conduta típica.

Como se vê, a participação é conduta acessória à do autor, considerada principal.


Somente haverá participação se o agente der início à execução do delito. Se o crime nem sequer
chegar a ser tentado, não haverá participação punível (CP, art. 31).

11.3.3.1. Formas de participação

O art. 29, caput, do CP não delimitou a forma de atuação dos agentes, estabelecendo,
apenas, que quem, de qualquer modo, concorre para o crime responderá nas penas a este
cominadas.

A expressão concorrer “de qualquer modo” se reveste de forma extremamente genérica


para alcançar a conduta daquele que contribuiu, ainda que minimamente, para a produção do
resultado.
Todavia, em termos de participação, a doutrina aponta a existência de duas espécies: a)
participação moral; b) participação material.

11.3.3.1.1. Participação moral

a) Induzir

A participação moral é aquela vinculada ao apoio psicológico dado pelo partícipe,


induzindo ou instigando o autor a praticar o delito.

No induzimento, o agente introduz na mente do autor a ideia criminosa. O autor não tinha
a representação mental da prática delituosa, sendo induzido pelo partícipe a cogitar a execução
do delito. Em síntese, na indução, o partícipe faz surgir na mente do agente a intenção delituosa.

EXEMPLO:

Suponha-se que tenha ocorrido um desentendimento entre Marcelo e João, sem


maiores consequências. Marcelo conta o ocorrido a Fernando, que passa a induzi-
lo a matar João, introduzindo na sua mente a ideia homicida. Se efetivamente matar
João, Marcelo atuará na condição de autor do homicídio, ao passo que Fernando
responderá pelo mesmo delito na condição de partícipe.

É irrelevante que o executor pratique o fato delituoso imediatamente à determinação ou


que o cometa depois de longo tempo. Pode apresentar-se sob as formas de mandato, paga,
promessa, ordem ou artifício.

b) Instigar

Instigar é reforçar uma ideia criminosa já existente. O agente já cogitava a possibilidade


de praticar o crime, sendo apenas encorajado, instigado pelo partícipe.

O partícipe reforça, estimula, a preexistente resolução delituosa. Pode ocorrer de duas


maneiras: a) mediante reforço da resolução de o executor cometer o delito; b) mediante
promessa de ajuda material ou moral após o cometimento por parte do executor. Do contrário,
há determinação e não instigação, embora as duas formas possam coexistir (o partícipe induz e
depois instiga o autor principal a praticar o delito).

EXEMPLO:
Suponha-se que tenha ocorrido um desentendimento entre Marcelo e João. Marcelo
conta o ocorrido a Fernando, manifestando, ainda, a vontade de matar João.
Fernando, então, passa a instigá-lo, reforçando a ideia criminosa, encorajando
Marcelo a levar adiante a conduta delituosa e consumar o seu desejo de matar João.
Se efetivamente matar João, Marcelo atuará na condição de autor do homicídio, ao
passo que Fernando responderá pelo mesmo delito na condição de partícipe.

Se a pessoa determinada ou instigada a cometer o crime não está sujeita à autoridade do


partícipe, ou é punível (inexistente a impunidade em virtude de condição ou qualidade pessoal),
a sua responsabilidade é igual à do instigador ou determinador.

11.3.3.1.2. Participação material

A participação material se exterioriza na forma de auxílio. O partícipe será aquele que


presta ajuda efetiva na preparação ou execução do delito.
O auxílio é a forma de participação material que corresponde à antiga cumplicidade. Pode
ser prestado na preparação ou execução do delito.
Auxilia na preparação quem fornece a arma ou informações úteis à realização do crime.
Auxilia na execução quem permanece de atalaia, no sentido de avisar o autor da aproximação
de terceiro; quem leva o ladrão em seu veículo ao local do furto; quem empresta a arma ao
homicida.

11.3.3.2. Participação impunível

Para a participação ser punível, afigura-se imprescindível que o ato executório do crime
tenha sido iniciado. Com efeito, o ajuste, a determinação, a indução, instigação e o auxílio
somente serão punidos se o autor der início à execução do delito. Se o crime nem sequer chegar
a ser tentado, a conduta do partícipe não será punível (CP, art. 31).
Imaginemos que Fabrício contrata Félix para matar Mafalda. Félix sai em busca de
Mafalda e, ao avistá-la, apiedado, nem sequer dá início aos atos executórios. Nesse caso, tanto
Fabrício quanto Félix não sofrerão qualquer tipo de punição, uma vez que o delito nem sequer
chegou a ser tentado.
Trata-se de decorrência lógica do caráter de acessoriedade da participação, uma vez que,
para existir participação punível, afigura-se imprescindível que o autor ao menos tenha dado
início à prática de um fato típico e ilícito.
Essa regra, no entanto, comporta exceção, insculpida na expressão “salvo disposição em
contrário”, que consta no art. 31 do CP.
Com efeito, há situações expressamente previstas em lei em que o ajuste, a determinação,
instigação ou auxílio são tipificados como crimes autônomos, como, por exemplo, nos crimes de
incitação ao crime (CP, art. 286) e de associação criminosa (CP, art. 288). Nesses casos, basta,
respectivamente, a incitação ao crime e a associação de três ou mais pessoas com a finalidade
de praticarem crimes para a tipificação da conduta, independentemente se os crimes objeto da
incitação ou da associação vierem a ser praticados.

11.3.3.3. Participação posterior ao crime

A participação em concurso de pessoas exige que a conduta acessória tenha sido


praticada antes ou durante a execução do delito. Isso porque, diante do caráter de
acessoriedade, a participação do agente deve contribuir para o crime praticado pelo executor até
a fase da consumação.
Se a contribuição do partícipe for posterior à consumação do crime, pode configurar,
conforme o caso, o crime de favorecimento pessoal (CP, art. 348) ou real (CP, art. 349), dentre
outros.
E aqui cabe uma ressalva. Pode ser que a conduta do partícipe se limite a encorajar ou
influenciar o executor a praticar o delito, vindo a ter proveito somente após a consumação do
delito. Nesse caso, o partícipe responderá pelo crime praticado pelo autor, uma vez que sua
contribuição, no sentido de influenciar, instigar, encorajar, ocorreu antes da consumação do
delito.
Contextualizando a situação: Imaginemos que uma pessoa estimule o agente a praticar o
crime de furto de um veículo, sob a promessa de que ficaria com o automóvel, mediante
pagamento em dinheiro. Nesse caso, aquele que estimulou responderá, juntamente com o autor,
pelo crime de furto qualificado, uma vez que sua contribuição foi anterior à consumação do delito.
Se, eventualmente, sua conduta se restringir a atos praticados posteriormente à
consumação do delito, o agente não responderá pelo crime praticado pelo autor, podendo,
conforme o caso, responder por delito autônomo. É o caso do sujeito que, sem qualquer
contribuição anterior, adquire o veículo subtraído sabendo ser produto de furto. Evidentemente
não responderá pelo crime de furto, mas de receptação, previsto no art. 180 do CP, já que sua
atuação ocorreu após a consumação do delito de furto.

FIQUE LIGADO

- AUTOR executa a ação descrita no verbo nuclear do tipo: TEORIA RESTRITIVA


- PARTÍCIPE não executa ação descrita no verbo nuclear do tipo.

Não executa ação


descrita no verbo
nuclear do tipo
PARTÍCIPE Moral Induzir; Instigar

Formas

Material Auxiliar
11.4. Punibilidade do concurso de pessoas
11.4.1. Participação de menor importância – Art. 29, §1º

A participação aqui referida diz respeito exclusivamente ao partícipe. Isso porque, ainda
que tenha sido pequena, a contribuição do coautor não pode ser considerada de menor
importância, uma vez que atuou diretamente na execução do crime. A sua culpabilidade,
naturalmente superior à de um simples partícipe, será avaliada nos termos do art. 29, caput, do
CP, e a pena a ser fixada obedecerá aos limites abstratos previstos pelo tipo penal infringido.

O partícipe que houver tido “participação de menor importância” poderá ter sua pena
reduzida de um sexto a um terço, nos termos do art. 29, § 1º.

Trata-se, pois, de uma causa de diminuição da pena.

11.4.2. Da cooperação dolosamente distinta ou desvios subjetivo entre os


participantes – Art. 29, § 2º

O agente que desejava praticar um delito, sem a condição de prever a concretização de


crime mais grave, deve responder pelo que pretendeu fazer, não se podendo a ele imputar outra
conduta indesejada, sob pena de se estar tratando de responsabilidade objetiva.

Esse dispositivo cuida da hipótese de o autor principal cometer delito mais grave que o
pretendido pelo partícipe ou coautor.

EXEMPLO:

“A” determina “B” a espancar “C”. “B” mata “C”. Segundo o art. 29, § 2º, “A”
responde por crime de lesão corporal, cuja pena deve ser aumentada até metade se
a morte da vítima lhe era previsível.

De fato, a solução dada pelo CP leva à punição de “A” pelo delito de lesões corporais, que
foi o crime desejado, cuja pena será elevada até a metade se o homicídio for previsível.
PARTICIPAÇÃO DE COOPERAÇÃO
MENOR DOLOSAMENTE
IMPORTÂNCIA DISTINTA

Autor comete delito


Exclusivamente ao mais grave que o
partícipe pretendido pelo
partícipe ou coautor

Aumenta-se até a
metade, na hipótese
Causa de diminuição de ter sido previsível
de pena de 1/6 a 1/3 o resultado mais
grave.

11.5. Comunicabilidade das elementares e circunstâncias do crime

Via de regra, as circunstâncias e condições pessoais relacionadas a um dos agentes não


se comunica aos outros que contribuíram para a prática delituosa.

Todavia, há determinadas circunstâncias ou condições pessoais que compõem, integram


o tipo penal, figurando, no caso, como verdadeira elementar no tipo penal. Nesse caso, quando
também constituem o tipo penal, ou seja, figuram como elementares do tipo penal, as
circunstâncias ou condições pessoais relacionadas a um dos sujeitos se comunicam aos demais
coautores ou partícipes.

EXEMPLO:
“A”, funcionário público, comete um crime de peculato (art. 312), com a participação
de “B”, não funcionário público. A condição pessoal (funcionário público) é
elementar do crime de peculato, comunicando-se, portanto, ao agente que não é
funcionário público. Logo, os dois respondem por crime de peculato.
De outro lado, as circunstâncias objetivas alcançam o partícipe ou coautor se, sem haver
praticado o fato que as constitui, houveram integrado o dolo ou culpa.

EXEMPLO:

“A” instiga “B” a praticar homicídio contra “C”. “B”, para a execução do crime,
emprega asfixia. O partícipe não responde por homicídio qualificado (art. 121, § 2º,
III, 4ª figura), a não ser que o meio de execução empregado pelo autor principal
tenha ingressado na esfera de seu conhecimento.

Conforme ESTEFAM (2010, p. 285), da regra contida no artigo 30 do Código Penal


podem-se extrair duas conclusões:

a) Todas as elementares do crime, objetivas, normativas ou subjetivas, comunicam-se a


todos os agentes (se por eles conhecidas). Assim, por exemplo, a condição de funcionário
público, elementar do crime de peculato (CP, art. 312), estende-se ao coautor ou partícipe que
não ostente tal qualidade, fazendo com que ele, embora particular, responda pelo delito.

b) As circunstâncias da infração penal comunicam-se apenas quando objetivas (e forem


conhecidas pelos demais concorrentes). Por esse motivo, o emprego de arma por um dos
agentes no crime de roubo provoca, com relação a todos, a incidência da causa de aumento de
pena daí decorrente (CP, art. 157, § 2º, I). Se subjetivas, serão incomunicáveis.

EXEMPLO:

O motivo egoístico, que qualifica o crime de dano (CP, art. 163, parágrafo único, IV,
primeira figura), não se comunica aos demais concorrentes que tenham colaborado
com o fato por outros motivos.
14) (QUESTÃO 01 – IX EXAME)
Raimundo, já de posse de veículo automotor furtado de concessionária, percebe que não tem
onde guardá-lo antes de vendê-lo para a pessoa que o encomendara. Assim, resolve ligar para
um grande amigo seu, Henrique, e após contar toda sua empreitada, pede-lhe que ceda a
garagem de sua casa para que possa guardar o veículo, ao menos por aquela noite. Como
Henrique aceita ajudá-lo, Raimundo estaciona o carro na casa do amigo. Ao raiar do dia,
Raimundo parte com o veículo, que seria levado para o comprador.
Considerando as informações contidas no texto responda, justificadamente, aos itens a
seguir.
A) Raimundo e Henrique agiram em concurso de agentes? (Valor: 0,75)
B) Qual o delito praticado por Henrique? (Valor: 0,50)
15) (QUESTÃO 01 – XXIX EXAME)
Caio e Bruno são irmãos e estão em dificuldades financeiras. Caio, que estava sozinho em seu
quarto, verifica que a janela da casa dos vizinhos está aberta; então, ingressa no local e subtrai
um telefone celular avaliado em R$500,00. Ao mesmo tempo, apesar de não saber da conduta
de seu irmão, Bruno percebe que a porta da residência dos vizinhos também ficou aberta. Tendo
conhecimento que os proprietários eram um casal de empresários muito rico, ingressa no local
e subtrai uma bolsa, avaliada em R$ 450,00.
Os fatos são descobertos dois dias depois, e Bruno e Caio são denunciados pelo crime de furto
qualificado (Art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal), sendo acostadas as Folhas de
Antecedentes Criminais (FAC), contendo, cada uma delas, outra anotação pela suposta prática
de crime de estelionato, sem, contudo, haver condenação com trânsito em julgado em ambas.
Após instrução, a pretensão punitiva do Estado é julgada procedente, sendo aplicada pena
mínima de 02 anos de reclusão e 10 dias-multa, em regime inicial aberto, devidamente
substituída por restritiva de direitos.
Com base nas informações expostas, intimado(a) para apresentação de recurso,
responda, na condição de advogado(a) de Caio e Bruno, aos itens a seguir.
A) Existe argumento de direito material a ser apresentado para questionar a capitulação
jurídica apresentada pelo Ministério Público e acolhida na sentença? (Valor: 0,60)
B) Mantida a capitulação acolhida na sentença (Art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal),
existe argumento em busca da redução da pena aplicada? (Valor: 0,65)
O(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.
16) (QUESTÃO 3 – XIX EXAME)
Sabendo que Vanessa, uma vizinha com quem nunca tinha conversado, praticava diversos furtos
no bairro em que morava, João resolve convidá-la para juntos subtraírem R$ 1.000,00 de um
cartório do Tribunal de Justiça, não contando para ela, contudo, que era funcionário público e
nem que exercia suas funções nesse cartório. Praticam, então, o delito, e Vanessa fica surpresa
com a facilidade que tiveram para chegar ao cofre do cartório. Descoberto o fato pelas câmeras
de segurança, são os dois agentes denunciados, em 10 de março de 2015, pela prática do crime
de peculato. João foi notificado e citado pessoalmente, enquanto Vanessa foi notificada e citada
por edital, pois não foi localizada em sua residência. A família de Vanessa constituiu advogado
e o processo prosseguiu, mas dele a ré não tomou conhecimento. Foi decretada a revelia de
Vanessa, que não compareceu aos atos processuais. Ao final, os acusados foram condenados
pela prática do crime previsto no Art. 312 do Código Penal à pena de 02 anos de reclusão. Ocorre
que, na verdade, Vanessa estava presa naquela mesma Comarca, desde 05 de março de 2015,
em razão de prisão preventiva decretada em outros dois processos. Ao ser intimada da
sentença, ela procura você na condição de advogado(a). Considerando a hipótese
narrada, responda aos itens a seguir.
A) Qual argumento de direito processual poderia ser apresentado em favor de Vanessa
em sede de apelação? Justifique. (Valor: 0,65)
B) No mérito, foi Vanessa corretamente condenada pela prática do crime de peculato?
Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o mero “sim” ou “não”, desprovido de justificativa ou mesmo com a indicação de justificativa
inaplicável ao caso, não será pontuado.
Concurso de crimes

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

12.1. Introdução

Quando um sujeito, mediante unidade ou pluralidade de ações ou omissões, pratica dois


ou mais delitos, surge o concurso de crimes ou de penas.

O concurso pode ocorrer entre crimes de qualquer espécie, comissivos ou omissivos,


dolosos ou culposos, consumados ou tentados, simples ou qualificados e ainda entre crimes e
contravenções.

O concurso de crimes está inserido no Título V do Código Penal, relativo às penas,


justamente porque sua incidência repercute no total da pena aplicada ao agente que praticou
dois ou mais crimes.

Há três espécies de concurso de crimes: concurso material, concurso formal e crime


continuado.

12.2. Concurso de crimes e a relação com outros institutos

As regras do concurso de crimes não repercutem somente na pena definitiva, mas também
influenciam em outros institutos jurídicos, como, por exemplo, na determinação do procedimento,
na concessão da suspensão condicional do processo, na prescrição.

Nos termos do art. 394 do CPP, para determinar o procedimento a ser seguido, deve-se
verificar o máximo da pena cominada ao delito, considerando os critérios do concurso de crimes.
Assim, para definir o procedimento no contexto de concurso material de crimes ou de concurso
formal imperfeito, as penas deverão ser somadas. Tratando-se de concurso formal perfeito e
crime continuado, considera-se a pena mais grave, com a elevação da fração que mais aumenta
a pena (1/2, se concurso formal perfeito; 2/3, se crime continuado).
Para a concessão da suspensão condicional do processo, um dos requisitos é que a pena
mínima cominada ao delito não seja superior a um ano (Lei no 9.099/1995, art. 89), devendo ser
considerado nesse limite o concurso de crimes. No contexto de concurso material de crimes, as
penas mínimas cominadas devem ser somadas. Se as penas mínimas somadas superarem um
ano, o réu não poderá ser beneficiado pela suspensão condicional do processo.

Em relação ao concurso formal de crimes e crime continuado, deve-se considerar a fração


que menos aumenta a pena. É o que dispõe a Súmula nº 723 STF:

Súmula 723 do STF:


Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a
soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto
for superior a um ano.

E também a Súmula nº 243 STJ:

Súmula 243 do STJ:


O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações
penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva,
quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da
majorante, ultrapassar o limite de um (1) ano.

No contexto de concurso de crimes, o prazo prescricional deve ser verificado com base
na pena máxima cominada ou na pena imposta na sentença em relação a cada um dos crimes,
ou seja, isoladamente. É o que se extrai do art. 119 do CP e da Súmula no 497 do STF: “Quando
se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se
computando o acréscimo decorrente da continuação”.
12.3. Concurso material de crimes
12.3.1. Conceito

Ocorre o concurso material, também chamado de real, quando o agente, mediante mais
de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (CP, art. 69, caput), não
sendo necessário que tenham sido praticados no mesmo contexto fático. Há, pois, pluralidade
de condutas e pluralidade de crimes.

12.3.2. Concurso material e penas restritivas de direitos

Conforme dispõe o art. 69, § 1º, do CP, no caso de concurso material, se o agente sofrer
pena privativa de liberdade por um dos delitos, não sendo concedido o sursis, não seria possível
atribuir, em relação ao outro, pena restritiva de direitos, porque, em tese, seria incompatível o
cumprimento simultâneo das penas.

Conclui-se, em sentido contrário, que, se concedido o sursis à pena privativa de liberdade,


será possível a substituição dessa pena pela restritiva de direitos em relação ao outro delito, já
que, uma vez suspensa a execução da pena privativa de liberdade, não haveria impedimento
para o cumprimento da pena restritiva de direitos.

Imaginemos, por exemplo, que o réu tenha sido condenado pelo crime de lesão corporal
grave (CP, art.129, § 1o), com pena aplicada de um ano e oito meses de reclusão, sendo
concedida suspensão condicional da pena, e, no mesmo processo, em concurso material de
crimes, pelo crime de furto (CP, art. 155), com pena aplicada em um ano. Logo, como foi
concedida a suspensão condicional da pena em relação ao crime de lesão corporal grave, pode
o magistrado substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em relação ao delito
de furto.

12.3.3. Cumprimento simultâneo ou sucessivo de penas restritivas de direitos

Nos termos do art. 69, § 2º, do CP, quando forem aplicadas na sentença duas ou mais
penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis
entre si e sucessivamente as demais.
Assim, o condenado pode, por exemplo, cumprir simultaneamente uma pena de prestação
de serviço à comunidade e uma prestação pecuniária. Por outro lado, diante da incompatibilidade
de cumprimento simultâneo, o cumprimento de duas penas de prestação de serviços à
comunidade deverá ser de forma sucessiva.

Imaginemos, por exemplo, que o agente tenha sido condenado pelo crime de furto simples
(CP, art. 155), em concurso material com o crime de estelionato (CP, art. 171). Em relação ao
crime de furto foi aplicada a pena privativa de liberdade de um ano, substituída por prestação de
serviços à comunidade; em relação ao crime de estelionato, foi aplicada pena privativa de
liberdade de dois anos, também substituição por prestação de serviço à comunidade. Nesse
caso, não há possibilidade de cumprimento simultâneo das penas restritivas de direitos, devendo
o condenado cumprir as prestações de serviços à comunidade de forma sucessiva: Assim, por
exemplo, após cumprir a pena do crime de furto, passará a cumprir a prestação de serviços à
comunidade em relação ao crime de estelionato.

12.3.4. Aplicação da pena

Nos termos do art. 69, caput, do CP, quando o agente realiza o concurso real de crimes,
“aplicam-se cumulativamente as penas em que haja incorrido”. Portanto, no concurso material
as penas são cumuladas, somadas.

Aplica-se, pois, o sistema do cúmulo material de crimes.

Na hipótese de crimes conexos apurados na mesma ação penal, a soma das penas, pelo
concurso material, será realizada na própria sentença, após a adoção do critério trifásico para
cada um dos delitos.

Exemplo: O agente pratica o crime de estupro (CP, art. 213) e, para assegurar a sua
impunidade, desfere golpes de faca na vítima, matando-a, praticando o crime de homicídio
qualificado (CP, art. 121, § 2º, V). Imaginemos que o juiz fixe, em relação ao delito de estupro, a
pena de 8 anos de reclusão. Em relação ao crime de homicídio qualificado, a pena de 20 anos.
Ao final, considerando se tratar de concurso material de crimes, o Magistrado deverá aplicar o
sistema do cúmulo material, mediante o somatório das penas. Logo, no caso, a pena definitiva
do réu será de 28 anos de reclusão.
De outro lado, na hipótese de não haver conexão entre os crimes, sendo, por isso,
julgados em processos distintos, a soma das penas será realizada perante o juízo da execução
criminal, por força do disposto no art. 66, III, a, da LEP.

12.4. Concurso formal


12.4.1. Conceito

Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante uma só ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes (CP, art. 70, caput). Há unidade de conduta e pluralidade de crimes.

A unidade de conduta se concretiza quando os atos são realizados no mesmo contexto


espacial e temporal, não sendo necessário que seja praticado em ato único. De fato, pode haver
unidade de conduta mesmo quando fracionada em vários atos, como, por exemplo, agente que
subtrai objetos pertencentes a pessoas distintas, no mesmo contexto fático.

Para incidir o concurso formal de crimes, a única conduta deve produzir duas ou mais
infrações penais, atingindo mais de um bem penalmente tutelado, causando, pois, pluralidade
de resultados.

Assim, quem efetua disparos em direção a uma pessoa, atingindo a vítima pretendida e
também pessoa diversa, terá praticado, mediante uma única ação, dois crimes, uma vez que
violou mais de um bem penalmente tutelado.

Do mesmo modo, o motorista que conduz seu veículo de modo imprudente, vindo a matar
várias pessoas, desenvolveu um único comportamento, do qual resultaram vários crimes.

12.4.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito

O concurso formal perfeito, ou próprio, está previsto na primeira parte do art. 70 do


CP. Ocorre quando o agente pratica duas ou mais infrações penais mediante uma única conduta,
movido por um único desígnio. O agente, por meio de um só impulso volitivo, dá causa a dois ou
mais resultados, sem desígnios autônomos em relação a cada um dos resultados.
Quando a unidade de comportamento corresponder à unidade interna da vontade do
agente, assim compreendido como sendo o desejo de realizar apenas um crime e obter um único
resultado danoso, fala-se em concurso formal perfeito.

Assim, se, por exemplo, o agente, na condução de veículo automotor, atropela e causa a
morte de uma pessoa e lesão corporal em outra, praticará o crime de homicídio culposo na
condução de veículo automotor (CTB, art. 302) e o crime de lesão corporal culposa na condução
de veículo automotor (CTB, art. 303), em concurso formal perfeito, já que não tinha desígnios
autônomos em relação a cada um dos resultados.

No concurso formal imperfeito, ou impróprio, o agente, mediante uma ação ou omissão,


pretende, de forma consciente e voluntária, o resultado em relação a cada um dos crimes. Ou
seja, o agente desenvolve a conduta única com desígnios autônomos em relação a cada um dos
resultados.

Desígnio autônomo se caracteriza pelo fato de o agente pretender, mediante uma única
conduta, atingir dois ou mais resultados. Ou seja, o agente, mediante uma ação ou omissão, age
com consciência e vontade em relação a cada um deles, considerados isoladamente.

EXEMPLO 1:
O agente provoca fogo em uma residência com a intenção de matar todos os
moradores. O agente tem desígnios autônomos (intenção de matar) em relação a
cada um dos moradores da residência.

EXEMPLO 2:
Wilson, maior, capaz, na saída de um estádio de futebol, tendo avistado diversos
torcedores do time adversário embarcados em um veículo de transporte regular,
aproveitou-se da oportunidade e lançou uma única bomba incendiária contra o
automóvel, causando graves lesões em diversas vítimas e a morte de uma delas.
Nesse caso, Wilson será apenado com base no concurso formal imperfeito ou
impróprio.
A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto quanto o dolo eventual.
Assim, haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o delito de homicídio doloso com
dolo direto e outro com dolo eventual.

12.4.3. Aplicação da pena no concurso formal


a) Em relação ao concurso formal perfeito
O concurso formal próprio ou perfeito (CP, art. 70, primeira parte) foi concebido com a
finalidade de conferir tratamento menos severo a agente que, mediante uma conduta, gerou
pluralidade de resultados não derivados de desígnios autônomos, afastando, com isso, os rigores
do concurso material (CP, art. 69).

Por esse motivo, em relação ao concurso formal perfeito, ou próprio, o Código Penal
adotou o sistema de exasperação da pena. Aplica-se a pena do crime a mais grave ou, se iguais,
somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade.

Nesse sentido, se a regra da exasperação da pena se mostrar prejudicial ao réu em


comparação ao cúmulo material, deverá ser afastada. Trata-se, portanto, da regra do concurso
material benéfico como teto do produto da exasperação da pena.

Isso porque, conforme dito:

O concurso formal próprio ou perfeito (CP, art. 70, primeira parte), cuja regra para a
aplicação da pena é a da exasperação, foi criado com intuito de favorecer o réu nas hipóteses
de pluralidade de resultados não derivados de desígnios autônomos, afastando-se, pois, os
rigores do concurso material (CP, art. 69). Nesse diapasão, o parágrafo único do art. 70 do CP
impõe o afastamento da regra da exasperação, se esta se mostrar prejudicial ao réu, em
comparação com o cúmulo material. Nos termos da jurisprudência deste STJ, o aumento da pena
decorrente do concurso formal próprio é calculada com base no número de infrações penais
cometidas, que concretizará a fração de aumento abstratamente prevista (1/6 a 1/2),
exasperando-se a pena do crime de maior reprimenda. Nesses termos, aplica-se a fração de
aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para
5 infrações e 1/2 para 6 ou mais infrações.8

Assim, o critério adotado pela jurisprudência para a fixação do aumento da pena em


decorrência do concurso formal perfeito de crimes tem relação com o número de crimes
cometidos pelo agente.

Número de crimes Aumento da pena


• 2 crimes • 1/6 de aumento
• 3 crimes • 1/5 de aumento
• 4 crimes • 1/3 de aumento
• 5 crimes • 1/3 de aumento
• 6 ou mais crimes • 1/2 de aumento

b) Em relação ao concurso formal imperfeito


Como dissemos, o critério da exasperação da pena visa a favorecer o agente que, por
meio de uma conduta, produz dois ou mais resultados, sem desígnios autônomos em relação a
cada um deles.

No concurso formal imperfeito, ou impróprio, embora tenha desenvolvido uma conduta,


recai sobre o agente maior grau de reprovabilidade, já que revelou desígnios autônomos em
relação a cada resultado, não merecendo, por isso, tratamento menos severo proporcionado pelo
critério da exasperação da pena.

Por isso, no concurso formal imperfeito, o critério adotado é o cúmulo material, devendo
ser somadas as penas aplicadas em relação a cada um dos crimes praticados pelo agente, nos
termos do art. 70, caput, 2ª parte, do CP.

Imaginemos que Wilson, pretendendo matar dois colegas de trabalho que exerciam suas
atividades em uma sala ao lado da dele, inseriu substância tóxica no sistema de ventilação dessa
sala, o que causou o óbito de ambos em poucos minutos. Nessa situação, Wilson, com uma

8 STJ, HC no 325411/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 19-4-2018.


única conduta, praticou dois resultados, com desígnios autônomos em relação a cada um deles.
Trata-se, pois, de dois homicídios dolosos em concurso formal imperfeito.

Nesse caso, o Magistrado terá de realizar a dosimetria da pena em relação a todas as


vítimas, e, ao final, aplicar o critério do cúmulo material. Assim, vamos considerar que, em
relação a vítima “A”, a pena aplicada foi de 12 anos, e, em relação à vítima “B”, a pena aplicada
tenha sido de 15 anos. Como se trata de concurso formal imperfeito, o magistrado terá de adotar
o critério do cúmulo material, somando as penas, ficando a pena definitiva em 27 anos.

12.4.4. Concurso formal e crime único

O concurso formal se caracteriza pela produção de dois ou mais resultados, embora


decorrentes de conduta única. Logo, a partir da conduta do agente, devem resultar dois ou mais
crimes.

Há, no entanto, determinadas situações em que, num primeiro momento, poderia ensejar
a percepção da prática de dois ou mais crimes, quando, na verdade, se trata de crime único.
Quando, por exemplo, há o emprego de violência ou grave ameaça contra várias pessoas, mas
subtração de patrimônio pertencente a apenas uma delas, estaremos diante de crime único de
roubo, já que ocorreu crime contra apenas um patrimônio.

Todavia, se, num mesmo contexto fático, são subtraídos bens pertencentes a vítimas
distintas, não haverá crime único, mas concurso formal, já que com uma conduta, o agente
atingiu patrimônios distintos. caracterizando concurso formal, por terem sido atingidos
patrimônios diversos, nos moldes do art. 70 do CP.9

O STJ tem entendido que a prática do crime de roubo contra vítimas diversas, no mesmo
contexto fático, configura uma única ação, incidindo, por isso, as regras do concurso formal de
crimes.10

9 STJ, HC no 608932/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 6-10-2020.


10 STJ, AgRg no HC no 412140/MG, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6a T., j. 1-3-2018.
12.5. Crime continuado
12.5.1. Conceito

O crime continuado está previsto no art. 70 do CP.

Ocorre o crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, devendo os subsequentes, pelas condições de
tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, ser havidos como continuação do
primeiro.

12.5.2. Requisitos

Para a incidência das regras do crime continuado é preciso verificar a presença de


requisitos dispostos no art. 71 do CP, consistentes: a) na pluralidade de condutas; b) na
pluralidade de crimes da mesma espécie; c) nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira
de execução e outras semelhantes.

12.5.2.1. Pluralidade de condutas

Nos termos do art. 71 do CP, o crime continuado se caracteriza pelo fato de o agente
praticar crimes mediante mais de uma ação ou omissão, exigindo, pois, pluralidade de condutas.

Distingue-se do concurso material, que também exige pluralidade de condutas, por força
da incidência dos demais requisitos, consistentes na prática de crimes de mesma espécie, nas
mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.

12.5.2.2. Crimes da mesma espécie

Crimes da mesma espécie são os que estão previstos no mesmo tipo penal, considerando-
se, inclusive, as figuras simples ou qualificadas, dolosas ou culposas, tentadas ou consumadas.

Além disso, para caracterizar crimes da mesma espécie, é necessário que os crimes
parcelares devem tutelar os mesmos bens jurídicos e possuem a mesma estrutura jurídica. Por
isso, a teor da jurisprudência do STJ, não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os
crimes de roubo e o de latrocínio, porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam
bens jurídicos diferentes, uma vez que o roubo tutela o patrimônio e a integridade física
(violência) ou o patrimônio e a liberdade individual (grave ameaça); o latrocínio, por outro lado,
tutela o patrimônio e a vida.

12.5.2.3. Conexão temporal

Exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal entre as condutas


praticadas para que se configure a continuidade delitiva. Deve existir, em outros termos, uma
certa periodicidade que permita observar-se um certo ritmo, uma certa uniformidade, entre as
ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito, indicações precisas.

A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as infrações penais não
houver decorrido período superior a 30 dias.

12.5.2.4. Conexão espacial

Além dos demais requisitos, para que seja possível reconhecer a continuidade delitiva,
deve, ainda, estar presente a conexão espacial.

A lei não estabelece parâmetros para o reconhecimento da conexão espacial, tendo a


jurisprudência do STJ admitido a continuidade delitiva quando tratarem de crimes praticados na
mesma cidade, bem como em comarcas limítrofes ou próximas.

Assim, a prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não exclui a


continuidade. Crimes praticados em bairros diversos de uma mesma cidade, ou em cidades
próximas, podem ser entendidos como praticados em condições de lugar semelhantes.

12.5.2.5. Maneira de execução

A lei exige que a forma de execução das infrações continuadas seja semelhante,
traduzindo-se no modo, forma e os meios empregados para a prática dos delitos.
Exemplo: Empregado de um estabelecimento comercial que subtrai, diariamente, objetos
da empresa.

Por outro lado, um crime de furto qualificado pela escalada e outro furto qualificado pela
destreza, conquanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a incidência do crime continuado, já
que empregaram modos de execução distintos.

Da mesma forma, verifica-se a diversidade da maneira de execução dos diversos delitos,


quando o agente pratica furto ora sozinho, ora em companhia de comparsas, não configurando,
pois, continuidade delitiva, mas sim a habitualidade criminosa.

12.5.2.6. Unidade de desígnios

Exige-se unidade de resolução, devendo o agente desejar praticar os crimes com


continuidade. Portanto, além dos requisitos objetivos, exige unidade de desígnios, isto é, uma
programação inicial, com realização sucessiva.

É o entendimento adotado pelo STJ11, segundo o qual na prática dos crimes em


continuidade delitiva, exigindo-se, pois, que haja um liame entre os crimes, apto a evidenciar de
imediato terem sido esses delitos subsequentes continuação do primeiro, isto é, os crimes
parcelares devem resultar de um plano previamente elaborado pelo agente.

Com efeito, o próprio Código Penal, ao dispor que os crimes subsequentes devem ser
havidos como continuação do primeiro, sinaliza pela necessidade da ligação subjetiva entre os
diversos crimes praticados pelo agente. Não há como considerar um crime subsequente ao
primeiro sem a presença de liame ou vínculo subjetivo entre eles. Logo, deve restar demonstrado
que o agente agiu com consciência e vontade em praticar crimes da mesma espécie em
sequência, nas mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução.

11 STJ, HC no 419094/RJ, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5a T., j. 15-3-2018.


12.5.3. Crime continuado específico

Além dos requisitos previstos no art. 71, caput, do CP, o crime continuado específico prevê
a necessidade de três requisitos, que devem ocorrer simultaneamente:

a) Contra vítimas diferentes


Admite-se nexo de causalidade entre crimes que lesam interesses jurídicos pessoais,
ainda que praticados contra vítimas diversas.

De fato, a circunstância de os delitos componentes atingirem bens jurídicos pessoais não


impede a continuação. Entretanto, cumpre observar o disposto no parágrafo único do art. 71 do
Código Penal:

Art. 71, parágrafo único, do Código Penal:

Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a
conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as
circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave,
se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art.
75 deste Código.

Assim, admite o Código Penal nexo de continuidade entre homicídios, lesões corporais ou
roubos contra vítimas diversas, podendo o juiz, de acordo com as circunstâncias judiciais do art.
59, caput, do CP, aumentar a pena de um dos delitos até o triplo, desde que a pena não seja
superior à que seria imposta se o caso fosse de concurso material.

b) Com violência ou grave ameaça à pessoa


Mesmo que o crime seja contra vítimas diferentes, se não houver violência – real ou ficta
– contra a pessoa, não haverá a continuidade específica.

c) Somente em crimes dolosos


Se a ação criminosa for praticada contra vítimas diferentes, com violência à pessoa, mas
não for produto de uma conduta dolosa, não estará caracterizado o crime continuado específico.
12.5.4. Aplicação da pena

Tratando-se de crime continuado comum, aplica-se a pena de qualquer um dos crimes,


se idênticas, aumentada de 1/6 até 2/3.

Tratando-se de crime continuado qualificado, aplica-se a pena do crime mais grave,


aumentada de 1/6 até 2/3.

O parâmetro para o aumento da pena entre 1/6 e 2/3 deve ser proporcional ao número de
infrações praticadas. Ou seja, “em se tratando de aumento de pena referente à continuidade
delitiva, aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações;
1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações”. 12

Número de crimes Aumento da pena

• 2 crimes • 1/6 de aumento


• 3 crimes • 1/5 de aumento
• 4 crimes • 1/4 de aumento
• 5 crimes • 1/3 de aumento
• 6 crimes • 1/2 de aumento
• 7 crimes ou mais • 2/3 de aumento

Tratando-se de crime continuado específico, previsto no art. 71, parágrafo único, do CP,
aplica-se a pena do crime mais grave aumentada até o triplo. Todavia, segundo o entendimento
do STF, no crime continuado qualificado, a majoração da pena não está adstrita ao número de
infrações praticadas, uma vez que o art. 71, parágrafo único, do CP, determina que poderá o
juiz, “considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se
idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo”. Logo, a fração de aumento de pena no crime
continuado qualificado lastreia-se nos vetores em questão, e não apenas no número de infrações
praticadas.13

12 STJ, AgRg no EDcl-AgREsp no 1629001/SP, rel. Min. Laurita Vaz, 3a Seção, j. 28-10-2020.
13 STF, HC no 131871/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 2a T., j. 31-5-2016.
Se, da aplicação da regra do crime continuado, a pena resultar superior à que restaria se
somadas as penas, aplica-se a regra do concurso material benéfico (CP, art. 71, parágrafo único,
parte final).

17) (QUESTÃO 04 – XXII EXAME)


Diego e Júlio caminham pela rua, por volta das 21h, retornando para suas casas após mais um
dia de aula na faculdade, quando são abordados por Marcos, que, mediante grave ameaça de
morte e utilizando simulacro de arma de fogo, exige que ambos entreguem as mochilas e os
celulares que carregavam. Após os fatos, Diego e Júlio comparecem em sede policial, narram o
ocorrido e descrevem as características físicas do autor do crime. Por volta das 5h da manhã do
dia seguinte, policiais militares em patrulhamento se deparam com Marcos nas proximidades do
local do fato e verificam que ele possuía as mesmas características físicas do roubador. Todavia,
não são encontrados com Marcos quaisquer dos bens subtraídos, nem o simulacro de arma de
fogo. Ele é encaminhado para a Delegacia e, tendo-se verificado que era triplamente reincidente
na prática de crimes patrimoniais, a autoridade policial liga para as residências de Diego e Júlio,
que comparecem em sede policial e, em observância de todas as formalidades legais, realizam
o reconhecimento de Marcos como responsável pelo assalto. O Delegado, então, lavra auto de
prisão em flagrante em desfavor de Marcos, permanecendo este preso, e o indicia pela prática
do crime previsto no Art. 157, caput, do Código Penal, por duas vezes, na forma do Art. 69 do
Código Penal. Diante disso, Marcos liga para seu advogado para informar sua prisão. Este
comparece, imediatamente, em sede policial, para acesso aos autos do procedimento originado
do Auto de Prisão em Flagrante.

Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado de Marcos,


responda, de acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, aos itens a seguir.

A) Qual requerimento deverá ser formulado, de imediato, em busca da liberdade de Marcos


e sob qual fundamento? Justifique. (Valor: 0,65)

B) Oferecida denúncia na forma do indiciamento, qual argumento de direito material


poderá ser apresentado pela defesa para questionar a capitulação delitiva constante da
nota de culpa, em busca de uma punição mais branda? Justifique. (Valor: 0,60)

18) (QUESTÃO 02 – XXVII EXAME)


Em cumprimento de mandado de busca e apreensão, o oficial de justiça Jorge compareceu ao
local de trabalho de Lucas, sendo encontradas, no interior do imóvel, duas armas de fogo de
calibre .38, calibre esse considerado de uso permitido, devidamente municiadas, ambas com
numeração suprimida. Em razão disso, Lucas foi preso em flagrante e denunciado pela prática
de dois crimes previstos no Art. 16, caput, da Lei 10.826/2003, em concurso material, sendo
narrado que “Lucas, de forma livre e consciente, guardava, em seu local de trabalho, duas armas
de fogo de calibre restrito, devidamente municiadas”. Após a instrução, em que os fatos foram
confirmados, foi juntado o laudo confirmando o calibre .38 das armas de fogo, a capacidade de
efetuar disparos, bem como que ambas tinham a numeração suprimida. As partes apresentaram
alegações finais, e o magistrado, em sentença, considerando o teor do laudo, condenou Lucas
pela prática de dois crimes previstos no Art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/2003,
em concurso formal.

Intimada a defesa técnica da sentença condenatória, responda, na condição de


advogado(a) de Lucas, aos itens a seguir.

A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em busca da desconstituição


da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)

B) Reconhecida a validade da sentença em segundo grau, qual o argumento de direito


material a ser apresentado para questionar o mérito da sentença condenatória e,
consequentemente, a pena aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)

19) (QUESTÃO 03 – XXX EXAME)


Eduardo foi preso em flagrante no momento em que praticava um crime de roubo simples, no
bairro de Moema. Ainda na unidade policial, compareceram quatro outras vítimas, todas
narrando que tiveram seus patrimônios lesados por Eduardo naquela mesma data, com intervalo
de cerca de 30 minutos entre cada fato, no bairro de Moema, São Paulo.

As cinco vítimas descreveram que Eduardo, simulando portar arma de fogo, anunciava o assalto
e subtraía os bens, empreendendo fuga em uma bicicleta. Eduardo foi denunciado pela prática
do crime do Art. 157, caput, por cinco vezes, na forma do Art. 69, ambos do Código Penal, e, em
sede de audiência, as vítimas confirmaram a versão fornecida em sede policial.

Assistido por seu advogado Pedro, Eduardo confessou os crimes, esclarecendo que pretendia
subtrair bens de seis vítimas para conseguir dinheiro suficiente para comprar uma motocicleta.
Disse, ainda, que apenas simulou portar arma de fogo, mas não utilizou efetivamente material
bélico ou simulacro de arma. O juiz, no momento da sentença, condenou o réu nos termos da
denúncia, sendo aplicada a pena mínima de 04 anos para cada um dos delitos, totalizando 20
anos de pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime inicial fechado, além da multa. Ao
ser intimado do teor da sentença, pessoalmente, já que se encontrava preso, Eduardo tomou
conhecimento que Pedro havia falecido, mas que foram apresentadas alegações finais pela
Defensoria Pública por determinação do magistrado logo em seguida à informação do
falecimento do patrono. A família de Eduardo, então, procura você, na condição de advogado(a),
para defendê-lo.

Considerando apenas as informações narradas, responda, na condição de advogado(a)


de Eduardo, constituído para apresentação de apelação, aos itens a seguir.

A) Existe argumento de direito processual, em sede de recurso, a ser apresentado para


desconstituir a sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)

B) Diante da confirmação dos fatos pelo réu, qual argumento de direito material poderá
ser apresentado, em sede de apelação, em busca da redução da sanção penal aplicada?
Justifique. (Valor: 0,60)
FIQUE LIGADO!
Edição 23 STJ – CONCURSO DE CRIMES
4) Não há crime único, podendo haver concurso formal, quando, no mesmo contexto
fático, o agente incide nas condutas dos arts. 14 (porte ilegal de arma de fogo de
uso permitido) e 16 (posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito) da Lei n.
10.826/2003.

5) Não há crime único, podendo haver concurso material, quando, no mesmo


contexto fático, o agente incide nas condutas dos arts. 14 (porte ilegal de arma de
fogo de uso permitido) e 16 (posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito)
da Lei n. 10.826/2003.

7) A apreensão de mais de uma arma de fogo, acessório ou munição, em um mesmo


contexto fático, não caracteriza concurso formal ou material de crimes, mas delito
único.
Lesão Corporal

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Crimes em Espécie contra a honra

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Crimes contra a Dignidade Sexual

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Crimes funcionais contra a Administração Pública

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Crimes praticados por particular contra a Administração
Pública

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Penal”. Para acessar o módulo, clique aqui.
Crimes contra a Administração da Justiça

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Crimes contra a Fé Pública

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Efeitos da sentença condenatória

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

13.1 Nota introdutória

Após a prática de um fato típico, ilícito e sendo o agente culpável, em tese, instaura-se
uma ação penal, que pode ser pública ou privada. Observando as garantias constitucionais do
contraditório, ampla defesa e do devido processo legal, objetiva-se chegar ao final e, se
comprovada a materialidade e a autoria, o Estado, por meio do Poder Judiciário, aplicar uma
sentença ou acórdão condenatório, com a fixação de uma pena.

Essa sentença condenatória, ao transitar em julgado, naturalmente gera efeitos que, direta
ou indiretamente, atingem o condenado. Os efeitos não são apenas na esfera penal, mas
também em outras áreas do direito, como cível, administrativa, eleitoral, por exemplo.

Os efeitos da condenação são divididos em principais e secundários:

13.2 Efeitos principais

Como corolário lógico da sentença penal condenatória, o efeito principal consiste na


aplicação de uma pena privativa de liberdade, restritiva de direitos e/ou multa, além de medida
de segurança, no caso de agente semi-imputável que revela periculosidade.

13.3 Efeitos secundários

Além dos efeitos principais, a sentença condenatória gera efeitos secundários, também
denominados efeitos mediatos, acessórios, reflexos ou indiretos, de natureza penal e extrapenal.
13.3.1 Efeitos secundários de natureza penal

São inúmeros os efeitos secundários da sentença penal condenatória transitada em


julgado, dentre os quais podem ser destacados os seguintes:

a) gerar a reincidência (Art. 63 do CP);

b) configuração de maus antecedentes, se não utilizada para fins de reincidência;

c) fixação do regime inicial fechado na hipótese de prática de novo crime, ressalvada a


hipótese da Súmula 269 do Superior Tribunal de Justiça ;

d) vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na


hipótese de prática de novo crime, ressalvada a hipótese do artigo 44, § 3º, do Código Penal;

e) vedação da concessão da suspensão condicional da pena em relação ao novo crime


(Art. 77, inciso I, do CP), e revogação da “sursis” (Art. 81, inciso I, e § 1º, do CP);

f) causa de revogação do livramento condicional (Arts. 86 e 87, ambos do CP);

g) aumento e interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória, quando


reconhecida a reincidência pela prática de outro crime (Arts. 110, caput, e 117, inciso VI, ambos
do CP);

h) vedação da concessão da transação penal e da suspensão condicional do processo,


em relação ao novo crime (Arts. 76, § 2º, inciso I, e 89, caput, ambos da Lei nº 9.099/95).

13.3.2 Efeitos secundários de natureza extrapenal

Além de gerar efeitos penais, a sentença penal condenatória transitada em julgado gera
efeitos extrapenais, ou seja, em outras áreas do direito, como na esfera cível, administrativa,
trabalhista, eleitoral, etc.

Esses efeitos se dividem em genéricos e específicos:

Os efeitos genéricos incidem sobre todos os crimes e estão previstos no artigo 91 do


Código Penal, consistentes em reparar o dano e confisco. Incidem de forma automática, não
sendo necessário, portanto, o juiz declarar na sentença. É o que se extrai, a contrario sensu, do
disposto no artigo 92, parágrafo único, do Código Penal.

Os efeitos específicos são aqueles previstos no artigo 92 do Código Penal. Nos termos
do artigo 92, parágrafo único, do Código Penal, esses efeitos não incidem de forma automática,
devendo o juiz declará-los motivadamente na sentença.

13.3.2 Efeitos genéricos

a) Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime

Nos termos do artigo 91, inciso I, do Código Penal, constitui efeito da sentença penal
condenatória “tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime”. Trata-se de
efeito automático decorrente da sentença penal condenatória, já que meramente declaratória no
tocante à indenização civil, não sendo necessário mandamento expresso no sentido de o réu
reparar o dano resultante do crime.

A sentença penal condenatória transitada em julgado permite à vítima promover a ação


de execução ex delicto, nos termos do artigo 63 do Código de Processo Penal, já que constitui
título executivo judicial, conforme prevê o artigo 515, inciso I, do Código de Processo Civil de
2015.

Assim, transitada em julgado a sentença penal condenatória a sua execução no juízo cível
visa tão somente estabelecer o quantum da reparação do dano, não sendo, portanto, objeto de
discussão o mérito da causa.

b) A perda em favor da união, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-


fé, dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação,
uso, porte ou detenção constitua fato ilícito

É a hipótese do confisco como efeito da condenação, previsto no artigo 91, inciso II, do
Código Penal. Trata-se da perda em favor da União de bens de origem ilícita, decorrente do
delito praticado.

Constitui efeito automático da sentença penal condenatória transitada em julgado, não


sendo, pois, necessário que o juiz declare expressamente na sentença.
c) Confisco alargado

A Lei nº 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) introduziu mais um efeito da sentença penal


condenatória.

Nos termos do artigo 91-A do Código Penal, na hipótese de condenação por infrações às
quais a lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a
perda, como produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor
do patrimônio do condenado e aquele que seja compatível com o seu rendimento lícito.

Para efeito da perda prevista no caput do referido artigo, entende-se por patrimônio do
condenado todos os bens:

I - de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício direto ou
indireto, na data da infração penal ou recebidos posteriormente; e

II - transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir


do início da atividade criminal.

O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência


lícita do patrimônio.

A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo Ministério Público,
por ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da diferença apurada.

Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença apurada e especificar


os bens cuja perda for decretada.

Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e milícias


deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo da Justiça onde
tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a
ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos crimes.
13.3.2.2 Efeitos específicos

a) A perda de cargo, função pública ou mandato eletivo

O artigo 92, inciso I, do Código Penal, prevê duas hipóteses de perda de cargo, função ou
mandato eletivo como efeito da sentença penal condenatória:

a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos
crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;

b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos
nos demais casos.

A primeira hipótese pode incidir quando o funcionário público praticar o delito no exercício
das suas funções ou em razão dela, e a pena privativa de liberdade seja aplicada por tempo igual
ou superior a um ano.

Não se tratando de crime funcional, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo
poderá incidir quando a pena aplicada for igual ou superior a quatro anos.

Esse efeito, no entanto, não é automático, ou seja, exige para sua incidência que o juiz
declare expressamente em decisão motivada (Art. 92, parágrafo único, do CP).

b) A incapacidade para o exercício do pátrio poder (poder familiar), tutela ou curatela

Além do vínculo entre autor do fato e a vítima, a incidência do efeito específico consistente
na incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, depende de duas
condições: a) que o crime seja doloso; b) que seja cominada pena de reclusão.

Esse efeito não é automático, devendo ser declarado na sentença em decisão motivada,
conforme se extrai do artigo 92, parágrafo único, do Código Penal. Assim, cumpre ao Magistrado,
no caso concreto, avaliar a necessidade da imposição da incapacidade para o exercício do poder
familiar, tutela ou curatela. Exemplo: pai condenado pela prática do crime estupro de vulnerável
(Art. 217-A do CP) contra filha de tenra idade.
c) A inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de
crime doloso.

A aplicação desse efeito específico depende de dois requisitos: a) que o crime seja doloso;
b) que o veículo tenha sido utilizado “como meio” para a sua prática. Logo, não incide esse efeito
no caso de crime culposo.
Extinção da punibilidade

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

14.1 Introdução

Em regra, as causas extintivas da punibilidade só alcançam o direito de punir do Estado,


subsistindo o crime em todos os seus requisitos e a sentença condenatória irrecorrível.

Excepcionalmente, a causa resolutiva do direito de punir apaga o fato praticado pelo


agente e rescinde a sentença condenatória irrecorrível. É o que acontece com a abolitio criminis
e a anistia.

Ordinariamente, as causas extintivas de punibilidade estão previstas no artigo 107 do


Código Penal. Todavia, o rol não é taxativo, uma vez que existem outras causas extintivas de
punibilidade previstas no Código Penal e em leis especiais.

Exemplo: art. 312, §3º, art. 342, § 2º, art. 168-A, § 2º, todos do Código Penal.

No nosso estudo, merece especial destaque a decadência e a prescrição.

14.2 Causas de extinção da punibilidade

Conforme o artigo 107 do Código Penal, são causas de extinção da punibilidade:

• Morte do agente

A morte do agente constitui causa de extinção da punibilidade, por conta do princípio da


personalidade da pena, segundo a qual a pena não pode passar da pessoa do condenado
(CF/88, art. 5º, XLV, 1ª parte).

Essa extinção da punibilidade incide sobre todas as espécies de penas, inclusive a pena
de multa. Assim, se, no curso da execução da pena de multa convertida em dívida ativa, o réu
vier a falecer, deve ser declarada extinta a punibilidade do agente pela sua morte, não sendo
possível, assim, direcionar a execução da pena de multa aos seus sucessores.
Isso porque, em sendo personalíssima a responsabilidade penal, a morte do agente faz
com que o Estado perca o jus puniendi, não se transmitindo a seus herdeiros qualquer obrigação
de natureza penal.

Todavia, a própria Constituição Federal prevê a possibilidade de a obrigação de reparar o


dano e a decretação do perdimento de bens ser estendidas aos sucessores e contra eles
executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido (CF/88, art. 5º, XLV, 2ª parte).

• Da anistia, graça e indulto

A anistia, graça e indulto constituem espécies de indulgência, ensejando a renúncia do


Estado ao direito de punir.

São benefícios concedidos por órgãos diversos do Poder Judiciário, mas que somente
ensejam a extinção da punibilidade após decisão judicial.

a) Anistia

Trata-se de espécie de exclusão da incidência do Direito Penal sobre uma ou mais


infrações penais. Não exclui o crime, mas apenas a possibilidade de o Estado punir o agente que
o praticou, razão pela qual tem efeito retroativo.

A competência para concessão de anistia é exclusiva da União e privativa do Congresso


Nacional (CF/88, art. 48, VIII), com a sanção do Presidente da República, só podendo ser
concedida por meio de lei federal.

Não se aplica aos delitos referentes a “prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos” (CF/88, art. 5º, XLIII; Lei
8.072/90, art. 2º, I).

b) Graça

A graça, ao contrário do indulto, é um benefício concedido a pessoa determinada,


condenada definitivamente pela prática de crime comum, consistente na extinção ou comutação
da pena.

Nos termos do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, a graça não pode ser aplicada em
relação a delitos referentes à prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins,
terrorismo e aos definidos como crimes hediondos.
A Constituição Federal não faz expressa referência à graça, sendo esse instituto tratado
pela Lei de Execução Penal como indulto individual (LEP, art. 188).

A competência para concessão da graça é do Presidente da República, nos termos do art.


84, XII, da Constituição Federal, podendo, nos termos do parágrafo único desse artigo, delegar
a atribuição “aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral
da União”.

c) Indulto

O indulto coletivo constitui modalidade de clemência concedida a todo condenado que


preencher os requisitos previstos no Decreto Presidencial publicado geralmente no final de cada
ano. Como se vê, o indulto, ao contrário da graça, tem caráter coletivo e é concedido
espontaneamente.

Assim como a graça, a competência para conceder o indulto é do Presidente da República,


nos termos do art. 84, XII, da Constituição Federal/88, podendo, nos termos do parágrafo único
desse artigo, delegar a atribuição “aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República
ou ao Advogado-Geral da União”.

Os requisitos para a concessão do indulto variam de acordo com cada decreto publicado,
considerando, invariavelmente, requisitos subjetivos (primariedade e bom comportamento
carcerário, sem registro de falta grave ao longo do ano) e objetivos (tempo de cumprimento de
pena).

O indulto pode ser total, quando ensejar a extinção da pena, ou parcial, na hipótese de
diminuição ou comutação da pena, bem como incondicionado ou condicionado.

Nos termos do art. 2º, I, da Lei 8072/90, o indulto não pode ser aplicado em relação a
delitos referentes à prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e
aos definidos como crimes hediondos. O artigo 44 da Lei 11.343/2006 também veda a concessão
do indulto aos condenados pelo crime de tráfico de drogas.

• Lei posterior que deixa de considerar o fato criminoso (abolitio criminis)

A lei penal retroage, atingindo fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor, sempre que
beneficiar o agente de qualquer modo (CF, art. 5º, XL; CP, art. 2º). Assim, se a lei posterior deixar
de considerar o fato como criminoso, excluindo da seara penal a conduta como sendo delituosa,
retroagirá para alcançar os fatos praticados antes da sua vigência, com a consequente extinção
da punibilidade dos responsáveis.

A Lei nº 11.106/2005, por exemplo, revogou os artigos 217 e 240, ambos do Código Penal,
deixando de considerar como condutas criminosas a sedução e o adultério. Logo, se, por
exemplo, o agente estava cumprindo pena pela prática do crime de sedução (CP, art. 240), o juiz
da execução penal terá de declarar a extinção da punibilidade do condenado, já que o fato não
mais constitui crime.

Nos termos do artigo 2º do Código Penal, a abolitio criminis gera o efeito de fazer cessar
a execução e os efeitos penais da sentença condenatória, como, por exemplo, a reincidência,
maus antecedentes, lançamento do nome do réu no rol dos culpados. Assim, se, após extinta a
punibilidade pela abolitio criminis, o agente praticar novo crime, não será considerado
reincidente.

Todavia, não apaga os efeitos civis da prática delituosa, já que a lei fala em cessação dos
efeitos “penais” da sentença.

Se o fato abolido como crime estiver sendo apurado ainda na fase de inquérito policial ou
na fase judicial em sede de juízo de primeiro grau, cumpre ao juiz competente para conduzir a
persecução penal declarar a extinção da punibilidade. No caso de se encontrar na fase recursal,
ou na hipótese de competência originária dos Tribunais, a competência para declaração de
extinção da punibilidade será do respectivo Tribunal.

Se já foi proferida sentença condenatória, encontrando-se na fase de execução criminal,


a competência para a declaração da extinção da punibilidade será do Juízo da Execução
Criminal, nos termos do artigo 66, I, da Lei 7.210/84, e da Súmula 611 do Supremo Tribunal
Federal.

• Prescrição, decadência e perempção

O artigo 107, IV, do Código Penal prevê como causas de extinção da punibilidade a
prescrição, decadência e perempção.

A prescrição será analisada em capítulo próprio, diante da abrangência do tema.


a) Decadência

A decadência é a perda do direito do ofendido e dos demais legitimados de representar,


no caso de ação penal pública condicionada à representação, e de oferecer a queixa-crime, na
hipótese de ação penal privada, em face do decurso do tempo.

Nos termos do artigo 103 do Código Penal e 38 do Código de Processo Penal, o ofendido
ou seu representante legal decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro
do prazo de seis meses, contados a partir do dia em que veio a saber quem é o autor do crime,
ou, no caso da ação penal privada subsidiária da pública, do dia em que se esgotou o prazo para
o oferecimento da denúncia.

Logo, os legitimados para apresentar representação ou oferecer queixa-crime têm o prazo


de 06 (seis) meses, a contar da inequívoca ciência da autoria do fato, para exercer esse direito.
Escoado esse prazo sem iniciativa do ofendido ou do seu representante legal, incide a
decadência do direito de representação ou de queixa-crime, com a consequente extinção da
punibilidade do agente ofensor.

Como se trata de prazo penal, a contagem segue as regras do artigo 10 do Código Penal,
incluindo-se o dia do começo, excluindo-se o último dia, considerando o calendário comum.
Assim, se, por exemplo, o ofendido tomou ciência da autoria do fato no dia 03/03/2012, terá até
o dia 02/09/2020 para oferecer a representação ou ajuizar a queixa-crime. A partir do dia
03/09/2020 já terá incidido a decadência do direito, com a consequente extinção da punibilidade.

O prazo penal não se suspende e não se interrompe, não podendo, ainda, ser prorrogado
para o primeiro dia útil, se cair no sábado, domingo ou feriado. A partir do momento em que o
ofendido tomou conhecimento da ciência da autoria do fato, começa a correr o prazo
decadencial, não havendo suspensão ou interrupção.

b) Perempção

A perempção é uma causa de extinção da punibilidade que incide por conta da inércia
processual do querelante.

A perempção só é possível na ação penal exclusivamente privada, não sendo aplicável à


ação penal privada subsidiária da pública, já que, diante da negligência do querelante, o
Ministério Público retoma a ação penal (CPP, art. 29, parte final).
As hipóteses de perempção estão elencadas no artigo 60 do Código de Processo Penal.
E, segundo se extrai desse dispositivo, a perempção somente é possível após o ajuizamento da
ação penal privada.

Nos termos do artigo 60, inciso I, do Código de Processo Penal, haverá perempção
quando, iniciada a ação penal, o querelante deixar de promover o andamento do processo
durante 30 dias seguidos. Nesse caso, se, após regular intimação, o querelante não se
manifestar no prazo legal de 30 dias, será decretada a extinção da punibilidade pela perempção.
Tomemos como exemplo o querelante deixar de nomear novo advogado, depois de devidamente
intimado a renúncia do advogado que o representava na ação penal.

A perempção incide também quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua


incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60
dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36 do Código
de Processo Penal (CPP, art. 60, II).

Na hipótese de morte do querelante, a legitimidade para prosseguir na ação penal passa


para o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (CPP, art. 31). Se um desses legitimados
não se habilitar aos autos, a fim de dar prosseguimento ao processo, dentro do prazo de 60 dias,
incidirá a causa de extinção de punibilidade do querelado.

Há perempção quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a


qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de
condenação nas alegações finais (CPP, art. 60, III). A presença do querelante no ato deve ser
imprescindível. Se o ato permitir ser representado por seu procurador, não haverá perempção.

A falta de pedido de condenação e não apresentação das alegações finais no prazo legal,
se devidamente intimado para tanto, também geram a incidência da perempção (CPP, art. 60,
III, 2ª parte). Assim, ao final da audiência de instrução, nos debates orais o querelante não
formular pedido de condenação ou de procedência do pedido, haverá perempção e, por
conseguinte, a extinção da punibilidade do querelado. Da mesma forma, se os debates orais
foram substituídos por memoriais escritos, por força do artigo 403, § 3º, do Código de Processo
Penal, e o querelante não apresentar essa peça no prazo legal, também incidirá a perempção.

Também gera a perempção quando, sendo querelante pessoa jurídica, esta se extinguir
sem deixar sucessor (CPP, art. 60, IV).
• Da renúncia ao direito de queixa ou perdão aceito nos crimes de ação penal
privada

a) Renúncia ao direito de queixa

É a abdicação do ofendido ou de seu representante legal do direito de promover a ação


penal privada. Trata-se de ato unilateral pelo qual o ofendido delibera por não ajuizar a queixa-
crime contra o suposto ofensor.

Nos termos do art. 104, caput, do Código Penal: “o direito de queixa não pode ser exercido
quando renunciado”.

A renúncia ao direito de queixa somente pode ser exercida na ação penal exclusivamente
privada, não sendo possível na ação penal privada subsidiária da pública, uma vez que, se o
ofendido não oferecer a queixa-crime, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia enquanto
não incidir outra causa de extinção da punibilidade do agente, como, por exemplo, pela
prescrição.

A renúncia pode ser: expressa e tácita. A renúncia expressa constará de declaração


assinada pelo ofendido, seu representante legal ou procurador com poderes especiais, que não
precisa ser advogado (CPP, art. 50).

A renúncia tácita ao direito de queixa consiste na prática de ato incompatível com a


vontade de o ofendido ou seu representante legal iniciar a ação penal privada (CP, art. 104,
parágrafo único, 1ª parte). Assim, no crime de injúria, por exemplo, mostra-se incompatível com
a vontade de exercer o direito de queixa o ofendido convidar o ofensor para ser padrinho de
batismo do seu filho.

O fato de o ofendido receber a indenização do dano causado pelo crime não implica
renúncia ao direito de queixa, conforme se extrai do artigo 104, parágrafo único, 2ª parte, do
Código Penal. Todavia, em se tratando de crime de ação penal privada de menor potencial
ofensivo, seguindo o procedimento da Lei nº 9.099/95, a composição civil homologada acarreta
a renúncia ao direito de queixa (Lei 9.099/95, art. 74, parágrafo único).

No caso de concurso de pessoas, a exclusão de um dos ofensores indica renúncia ao


direito de queixa contra todos, não podendo o Promotor de Justiça aditar a queixa para nela
incluir o ofensor excluído.
Com efeito, se, por exemplo, são três os autores do crime de ação penal privada, cumpre
ao ofendido oferecer queixa contra todos ou contra nenhum. A exclusão de um importa renúncia
tácita, estendendo-se aos demais, nos termos do art. 49 do Código de Processo Penal.

Nos termos do art. 50 do Código de Processo Penal, a renúncia do ofendido não impede
que seu representante legal inicie a ação penal privada, nem a renúncia do último excluirá o
direito do primeiro.

Conforme dispõe o artigo 31 do Código de Processo Penal, no caso de morte da vítima,


o direito de oferecer a queixa-crime passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
Nesse caso, a renúncia de um dos legitimados não se reveste de causa impeditiva ao exercício
da ação penal privada pelos demais.

Havendo duas ou mais vítimas, a renúncia de uma delas não impede o exercício do direito
de queixa pelas demais.

b) Perdão do ofendido

O perdão do ofendido ou do seu representante legal consiste na manifestação, expressa


ou tácita, de desistir do prosseguimento da ação penal privada. É a desistência manifestada após
o oferecimento da queixa, que obsta o prosseguimento da ação penal privada, conforme prevê
o artigo 105 do Código Penal.

O perdão aceito do ofendido é causa extintiva de punibilidade que incide somente na ação
penal exclusivamente privada.

Tratando-se de ação penal privada subsidiária da pública (CP, art. 100, § 3º), a desistência
do ofendido de prosseguir com o processo não determina a extinção da punibilidade, mesmo que
o réu aceite o perdão, pois se trata de ação penal pública, devendo o Ministério Público assumi-
la como parte principal (CPP, art. 29).

Depois de iniciada a ação penal privada, o perdão do ofendido pode ser manifestado até
o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (CPP, art. 106, § 2º).

No caso de haver dois ofendidos, o perdão concedido por um não prejudica o direito do
outro (CP, art. 106, II).
O perdão é um ato bilateral, dependendo, pois, da aceitação do querelado, já que poderá
recusar o perdão (CP, art. 106, III), optando pelo prosseguimento da ação penal, a fim de provar
sua inocência.

Quando há dois ou mais querelados, o perdão concedido a um deles se estende a todos,


sem que produza, entretanto, efeito em relação ao que o recusa (CPP, art. 51; CP, art. 106, I e
III).

Assim, havendo dois réus, o perdão aceito por um produz efeito de extinguir a punibilidade
também em relação ao outro, salvo se ocorre recusa. Neste caso, a ação penal continua em
relação ao querelado que o recusou.

Nos termos do artigo 58 do Código de Processo Penal, concedido o perdão, mediante


declaração expressa nos autos, o querelado será intimado a dizer, dentro de três dias, se o
aceita, devendo, ao mesmo tempo, ser cientificado de que o seu silêncio importará aceitação.
Aceito o perdão, o juiz julgará extinta a punibilidade.

• Da retratação do agente

A retratação significa desdizer-se, retirar o que foi dito, confessar que errou.

Em regra, a retratação do agente não tem relevância jurídica, funcionando somente como
circunstância judicial na aplicação da pena. Excepcionalmente, o estatuto penal lhe empresta
força extintiva da punibilidade (CP, art. 107, VI).

A retratação, como causa de extinção da punibilidade, somente incide nos casos


expressamente previstos em lei, como, por exemplo, nos crimes contra a honra, conforme prevê
o artigo 143 do Código Penal.

Nos crimes contra a honra, a retratação só é cabível na calúnia e na difamação, sendo


inadmissível na injúria. Nos dois primeiros casos, importa à vítima que o ofensor se retrate
negando que ela praticou o fato imputado. Na injúria, porém, não há imputação de fato, mas
atribuição ao ofendido de qualidade negativa, não importando a esta a retratação.

A retratação nos crimes de difamação e calúnia só é possível quando se trata da ação


penal privada, pois o art. 143 do Código Penal se refere expressamente ao querelado.
Também incide na hipótese prevista no art. 342, § 2º, do Código Penal, que trata do crime
de falso testemunho ou falsa perícia, segundo o qual o fato deixa de ser punível, se, antes da
sentença o agente se retrata ou declara a verdade. Essa retratação só é possível até a sentença
final do procedimento em que foi praticado o falso testemunho.

• Perdão judicial

Perdão judicial é o instituto pelo qual o juiz, não obstante a incidência da infração penal
praticada por agente culpável, deixa de aplicar a pena nos casos expressamente previstos em
lei.

O perdão judicial pode ser concedido, por exemplo, aos seguintes crimes:

a) art. 121, § 5º, do Código Penal: “Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar
de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave
que a sanção penal se torne desnecessária”;

b) art. 129, § 8º, do Código Penal: “aplica-se à lesão culposa o disposto no §5º do art.
121”;

c) art. 140, § 1º, do Código Penal: em relação ao crime de injúria, “o juiz pode deixar de
aplicar a pena: I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no
caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria;

d) art. 180, § 5º, do Código Penal, em relação à receptação culposa, “Na hipótese do §3º,
se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar
a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no §2º do art. 155.”;

e) art. 242, parágrafo único, do Código Penal, “Dar parto alheio como próprio; registrar
como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito
inerente ao estado civil: Se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza”
20) (QUESTÃO 4 - XXIX EXAME)
Em processo no qual se imputava a Antônio a prática do crime de constituição de milícia privada,
foi designada audiência de instrução e julgamento para oitiva das testemunhas arroladas pela
acusação e pela defesa. No dia da audiência, as testemunhas de acusação não compareceram,
determinando o magistrado, por economia processual, a oitiva das testemunhas de defesa
presentes, apesar de o advogado de Antônio se insurgir contra esse fato. Na ocasião, foram
ouvidas três testemunhas de defesa, dentre as quais Pablo, que prestou declarações falsas para
auxiliar o colega nesse processo criminal. Identificada sua conduta, porém, houve extração de
peças ao Ministério Público, que, em 09 de abril de 2019, ofereceu denúncia em face de Pablo,
imputando-lhe a prática do crime de falso testemunho na forma majorada. No processo de
Antônio, foi designada nova audiência de
instrução e julgamento, ocasião em que foram
ouvidas as testemunhas de acusação;
novamente, Pablo, a seu pedido, prestou
declarações, confirmando que havia mentido
na audiência anterior, mas que agora contava
a verdade, o que veio a prejudicar a própria
defesa do réu. Com base nas declarações das
testemunhas de acusação e nas novas
declarações de Pablo, Antônio veio a ser
condenado. Pablo, por sua vez, em seu
processo pelo crime de falso testemunho,
também veio a ser condenado, reconhecendo
o magistrado a atenuante do Art. 65, inciso III,
alínea b, do Código Penal. Considerando as
informações narradas, responda, na condição de advogado(a) de Antônio e Pablo.
A) Qual argumento de direito processual poderá ser apresentado por você para
desconstituir a sentença condenatória do réu? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual o argumento de direito material a ser apresentado pela defesa técnica de Pablo
para questionar a sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.
Emendatio Libelli e Mutatio Libelli

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

15.1 Introdução

No processo penal, o réu se defende dos fatos, sendo secundário a classificação jurídica
constante na denúncia ou queixa.

Segundo o princípio da correlação, a sentença está limitada apenas à narrativa feita na


peça inaugural, pouco importando a tipificação legal dada pelo acusador.

O princípio da correlação está regulamentado nos arts. 383 e 384 do CPP, que dispõem,
respectivamente, dos institutos da emendatio libelli e mutatio libelli.

Na verdade, o estudo desses institutos está intimamente relacionado a dois princípios


básicos em matéria de sentença penal: primeiro, o princípio da consubstanciação, segundo o
qual o réu defende-se dos fatos descritos na denúncia ou na queixa-crime e não da capitulação;
e, segundo, o princípio da correlação da sentença, traduzindo-se este como a necessidade de
amoldar a sentença aos fatos descritos na inicial acusatória. (AVENA, 2013, p. 1089).

15.2 Emendatio libelli

● Conceito

A emendatio libelli está prevista no artigo 383 do CPP.

Ao oferecer a denúncia ou queixa, o acusador deve descrever o fato criminoso e, após,


conferir a ele a respectiva classificação jurídica. O réu, como visto, defende-se dos fatos
relatados e não da classificação dada.

Nessa hipótese, pode ocorrer de o juiz considerar inadequada a classificação jurídica


atribuída ao fato narrado na inicial acusatória.
O fato delituoso descrito na peça acusatória continua sendo rigorosamente o mesmo,
cabendo ao juiz corrigir a classificação atribuída pelo Ministério Público ou querelante ao fato
descrito.

Desse modo, sem que tenha surgido ao longo da instrução nenhum elemento novo ou
circunstância capaz de modificar a descrição do fato contido na denúncia ou queixa, o juiz poderá
dar aos eventos delituosos descritos explícita ou implicitamente na denúncia ou queixa a
classificação jurídica que considerar correta, ainda que, em consequência, venha a aplicar pena
mais grave, sem necessidade de prévia vista à defesa, a qual não poderá alegar surpresa, uma
vez que não se defendia da classificação legal, mas da descrição fática da infração penal.

Exemplo: A denúncia narra que fulano subtraiu, mediante o emprego de fraude para
diminuir ou burlar a vigilância da vítima sobre o objeto subtraído, classificando, no entanto, tal
conduta como sendo estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal, deixando de propor a
suspensão condicional do processo pelo fato de o agente ter sido condenado pela prática de
outro crime. No caso, deve o Juiz dar definição jurídica diversa à atribuída pelo Ministério Público,
condenando o acusado pela prática do crime de furto qualificado pelo emprego de fraude (art.
155, § 4º, inciso II, do CP), sem ofensa ao contraditório ou ampla defesa, nem tampouco do
princípio da correlação entre acusação ou sentença, já que o acusado se defendia do fato de ter
subtraído objeto mediante fraude, conforme narrado na denúncia.

● Emendatio libelli e suspensão condicional do processo - art. 383, § 1º, CPP

Se a nova definição jurídica do fato é viável inclusive para a aplicação de pena mais grave,
naturalmente, o mesmo se dá para a aplicação de benefícios anteriormente não concedidos por
falta de condições.

Em outras palavras, pode ocorrer (o que é mais comum, inclusive) de com a emendatio
libelli o fato atribuído ao agente se enquadrar em crime menos grave, cuja pena mínima não seja
superior a um ano.

Se o crime inicialmente imputado previa pena mínima superior a um ano, o agente, na


visão da parte acusatória, não fazia jus à suspensão condicional do processo, já que não
preenchia o requisito do art. 89 da Lei 9.099/95.
Porém, com a emendatio libelli, a partir da nova definição jurídica, atribuindo-se delito
menos grave, cuja pena mínima não seja superior a um ano, pode ocorrer de o agente passar a
ter direito à suspensão condicional do processo. Nesse caso, o magistrado não poderá proferir
eventual sentença condenatória, mas proceder conforme prevê a lei, ou seja, conceder vista do
processo ao Ministério Público, a fim de que possa oferecer proposta de suspensão condicional
do processo, se for o caso.

Exemplo: A denúncia narra que fulano empurrou a vítima e arrebatou-lhe a corrente do


pescoço, classificando tal conduta como roubo (art. 157 do CP). Após o encerramento da
instrução, o Magistrado se convence de que o fato descrito na denúncia não constitui violência
ou grave ameaça, interpretando a conduta descrita na inicial acusatória como sendo furto simples
(art. 155 do CP). No momento do oferecimento da denúncia, não era cabível a proposta de
suspensão condicional do processo, uma vez que a pena mínima do crime de roubo é de 04
anos. Ao final de instrução, considerando-se a hipótese de furto simples, cuja pena mínima é de
01 ano, passou-se a aventar a possibilidade de suspensão condicional do processo.

Assim, nesse caso, ao receber os autos conclusos para sentença, vislumbrando hipótese
de definição jurídica diversa da contida na exordial, que, por sua vez, poderá ensejar a
suspensão condicional do processo, o Magistrado deverá operar a desclassificação do delito,
limitando-se exclusivamente à correta tipificação da conduta, sem emitir, portanto, qualquer juízo
de valor acerca do mérito (condenação ou absolvição). Em seguida, deverá determinar vista dos
autos ao Ministério Público para que se manifeste acerca da possibilidade da proposta da
suspensão condicional do processo.

Se o juiz proferir sentença condenatória pelo delito de furto, pode-se, em sede de


preliminar de apelação, arguir a nulidade da sentença, pela inobservância do procedimento do
artigo 383, § 1º, do CP.

● Desclassificação – art. 383, § 2º, CPP

Se o juiz, no momento da sentença, verificar que o fato descrito não corresponde à


classificação atribuída na peça acusatória, promoverá a emendatio libelli. E, se com a nova
definição jurídica, verificar que não é o juiz competente para processar e julgar o feito, deverá
encaminhar o processo para o Juízo competente.
Tomemos como exemplo o fato narrado na denúncia ter sido classificado como tentativa
de homicídio, quando, na verdade, trata-se de lesão corporal grave. Nesse caso, o juiz do
Tribunal do Júri verificará que, com a emendatio libelli, e nova definição jurídica do fato descrito
na denúncia, não será competente para processar o feito, devendo encaminhar para o juízo
competente.

O mesmo ocorrerá se observar tratar-se de crime de menor potencial ofensivo. Nesse


caso, caberá ao juiz, motivadamente, realizar a desclassificação, sem, contudo, emitir juízo de
valor acerca do mérito (condenação ou absolvição), devendo, pois, limitar-se à tipificação do
delito, encaminhando, após, os autos ao juízo competente.

Exemplo: A denúncia narra que determinado funcionário público aceitou promessa de


vantagem indevida para retardar ato de ofício, capitulando a conduta como sendo de corrupção
passiva, prevista no artigo 317 do CP. Após o encerramento da instrução, o Magistrado considera
ter ocorrido, em tese, o delito de corrupção passiva privilegiada, previsto no artigo 317,§ 2º, do
CP, cuja pena varia de 03 meses a 01 ano, sendo, pois, crime de menor potencial ofensivo,
devendo, diante disso, sem emitir qualquer juízo de valor acerca do mérito, remeter o processo
ao Juizado Especial Criminal.

15.3 Mutatio libelli

A mutatio libelli está disciplinada no artigo 384 do CPP.

Aqui não ocorre simples emenda na acusação, mediante correção na tipificação legal,
mas verdadeira mudança, com alteração na narrativa acusatória. Assim, a mutatio libelli implica
o surgimento de uma prova nova, desconhecida ao tempo do oferecimento da ação penal,
levando a uma readequação dos episódios delituosos relatados na denúncia ou queixa.

Exemplo: Um sujeito é denunciado pelo crime de furto. Ao longo da instrução, uma


testemunha afirma ter visto o réu apontando uma arma, circunstância que não estava descrita
na denúncia. O juiz não poderá condenar o réu pelo delito de roubo. Deverá dar vista dos autos
ao Ministério Público, para aditamento da denúncia e inclusão da circunstância da arma, abrindo-
se, após, oportunidade à defesa se pronunciar, procedendo-se, se for o caso, à instrução,
mediante a oitiva de até 03 testemunhas, para, somente agora, o juiz proferir sentença.
Em outras palavras, o que caracteriza a mutatio é o surgimento de fato não descrito na
denúncia, razão pela qual a peça acusatória deve ser aditada, para incluir esse fato ou
circunstância, para viabilizar o contraditório e a ampla defesa.

● Procedimento da mutatio libelli

Considerando a hipótese de mutatio libelli, deve o Ministério Público aditar a denúncia, no


prazo de 05 dias, concedendo-se, após, vista dos autos ao defensor para se manifestar também
no prazo de 05 dias (CPP, art. 384, § 2º).

Em sendo admitido o aditamento da denúncia, o Magistrado designará nova audiência para


inquirição de testemunhas, novo interrogatório, debates e julgamento. Nos termos do artigo 384,
§ 4º, do CPP, na hipótese de aditamento, cada parte poderá arrolar até três testemunhas.

Conforme o artigo 384, § 4º, ao sentenciar o feito, o juiz ficará adstrito aos termos do
aditamento recebido, ou seja, não poderá condenar o réu além dos limites do aditamento.

● Exclusividade dos crimes de ação pública

Veda a lei que o juiz tome qualquer iniciativa para o aditamento da queixa, em ação
exclusivamente privada, pois a iniciativa é sempre da parte ofendida, além de não viger, nesse
caso, o princípio da obrigatoriedade da ação penal, cujo controle é de ser feito tanto pelo
promotor, quanto pelo magistrado.

Ao contrário, regendo a ação privada exclusiva o princípio da oportunidade, não cabe


qualquer iniciativa nesse sentido pelo órgão acusador. Aliás, se o querelante, por sua própria
ação, desejar aditar a queixa, em ação privada exclusiva, deve levar em conta o prazo
decadencial de seis meses.

● Impossibilidade de aplicação da mutatio libelli em grau recursal

A mutatio libelli se aplica somente em 1ª instância, não sendo possível aplicar tal procedimento
em 2ª instância (Tribunal de Justiça). É o que diz a Súmula 453 do STF:
Súmula 453 STF: “Não se aplicam à segunda instância o Art. 384 e parágrafo único do Código
de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de
circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa.”

21) (QUESTÃO 4 – EXAME 2010/01)

Jânio foi denunciado pela prática de roubo tentado (Código Penal, art. 157, caput, c/c art. 14, II),
cometido em dezembro de 2009, tendo sido demonstrado, durante a instrução processual, que
o réu praticara, de fato, delito de dano (Código Penal, art. 163, caput). Considerando essa
situação hipotética, responda, de forma fundamentada, às seguintes indagações.

A) Em face da nova definição jurídica do fato, que procedimento deve ser adotado pelo
juiz?

B) Caso a nova capitulação jurídica do fato fosse verificada apenas em segunda instância,
seria possível a aplicação do instituto da emendatio libelli?

22) (QUESTÃO 2 – XXVII EXAME)

Em cumprimento de mandado de busca e apreensão, o oficial de justiça Jorge compareceu ao


local de trabalho de Lucas, sendo encontradas, no interior do imóvel, duas armas de fogo de
calibre .38, calibre esse considerado de uso permitido, devidamente municiadas, ambas com
numeração suprimida. Em razão disso, Lucas foi preso em flagrante e denunciado pela prática
de dois crimes previstos no Art. 16, caput, da Lei 10.826/2003, em concurso material, sendo
narrado que “Lucas, de forma livre e consciente, guardava, em seu local de trabalho, duas armas
de fogo de calibre restrito, devidamente municiadas”. Após a instrução, em que os fatos foram
confirmados, foi juntado o laudo confirmando o calibre .38 das armas de fogo, a capacidade de
efetuar disparos, bem como que ambas tinham a numeração suprimida. As partes apresentaram
alegações finais, e o magistrado, em sentença, considerando o teor do laudo, condenou Lucas
pela prática de dois crimes previstos no Art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/2003,
em concurso formal. Intimada a defesa técnica da sentença condenatória, responda, na
condição de advogado(a) de Lucas, aos itens a seguir
A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em busca da desconstituição
da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)

B) Reconhecida a validade da sentença em segundo grau, qual o argumento de direito


material a ser apresentado para questionar o mérito da sentença condenatória e,
consequentemente, a pena aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)

Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

23) (QUESTÃO 1 – XX EXAME, PROVA REAPLICADA EM PORTO VELHO/RO)

Jorge, com 21 anos de idade, reincidente, natural de São Gonçalo/RJ, entrou em uma briga com
seus pais, razão pela qual foi morar na casa de sua tia Marta, irmã de seu pai, na cidade de
Maricá/RJ, já que esta tinha apenas 40 anos e “o entenderia melhor”. Após 06 meses residindo
no mesmo local que sua tia, Jorge subtraiu o carro de Marta, levando-o para uma favela em
Niterói, onde pretendia morar no futuro. No começo, Marta não desconfiou da autoria, porém
após alguns dias, teve certeza de que o autor do crime era seu sobrinho, mas nada fez para vê-
lo responsabilizado criminalmente, em razão do afeto que tinha por ele. Apenas, então,
comunicou à seguradora que seu veículo fora furtado. Jorge, 01 ano após esses fatos, estava
na direção do veículo que havia subtraído quando foi abordado por policiais militares que,
constatando que aquele bem era produto de crime pretérito, realizaram sua prisão em flagrante.
Jorge foi denunciado pela prática do crime de receptação, mas, no curso da instrução, foi
descoberto que, na verdade, o acusado era o autor do crime de furto. O Ministério Público aditou
a denúncia para adequá-la às novas descobertas e, após manifestação da Defensoria Pública,
foi o aditamento recebido. Não houve requerimento de novas provas. Jorge o(a) procura para,
na condição de advogado(a), apresentar as Alegações Finais.

Considerando as informações extraídas da hipótese, responda aos itens a seguir.

A) Qual a principal tese defensiva a ser formulada nas Alegações Finais para evitar a
condenação de Jorge? (Valor: 0,65)
B) Na condição de advogado(a) do acusado, o que você alegaria, no campo processual,
caso o juiz viesse a condenar Jorge, após o aditamento, de acordo com a imputação
original de receptação? (Valor: 0,60)

Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

24) (QUESTÃO 3 - VIII EXAME)

João e José foram denunciados pela prática da conduta descrita no art. 316 do CP (concussão).
Durante a instrução, percebeu-se que os fatos narrados na denúncia não corresponderiam àquilo
que efetivamente teria ocorrido, razão pela qual, ao cabo da instrução criminal e após a
respectiva apresentação de memoriais pelas partes, apurou-se que a conduta típica adequada
seria aquela descrita no art. 317 do CP (corrupção passiva). O magistrado, então, fez remessa
dos autos ao Ministério Público para fins de aditamento da denúncia, com a nova capitulação
dos fatos. Nesse sentido, atento(a) ao caso narrado e considerando apenas as informações
contidas no texto, responda fundamentadamente, aos itens a seguir.

A) Estamos diante de hipótese de mutatio libelli ou de emendatio libelli? Qual dispositivo


legal deve ser aplicado? (Valor: 0,50)

B) Por que o próprio juiz, na sentença, não poderia dar a nova capitulação e, com base
nela, condenar os réus? (Valor: 0,50)

C) É possível que o Tribunal de Justiça de determinado estado da federação, ao analisar


recurso de apelação, proceda à mutatio libelli? (Valor: 0,25)

25) (QUESTÃO 3 – 2009-03 EXAME)

Júlio foi denunciado pela prática do delito de furto cometido em fevereiro de 2010. Encerrada a
instrução probatória, constatou-se, pelas provas testemunhais produzidas pela acusação, que
Júlio praticara roubo, dado o emprego de grave ameaça contra a vítima.

Em face dessa situação hipotética, responda, de forma fundamentada, às seguintes


indagações.
A) Dada a nova definição jurídica do fato, que procedimento deve ser adotado pela
autoridade judicial, sem que se fira o princípio da ampla defesa?

B) O princípio da correlação é aplicável ao caso concreto?

C) Caso Júlio tivesse cometido crime de ação penal exclusivamente privada, dada a nova
definição jurídica do fato narrado na queixa após o fim da instrução probatória, seria
aplicável o instituto da mutatio libelli?
Reformatio In Pejus

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal

16.1 Introdução

Todos os recursos possuem efeito devolutivo. Significa que a interposição de um recurso


viabiliza a análise total ou parcial da matéria impugnada em primeiro grau. Em síntese, a
interposição do recurso reabre a discussão da decisão combatida no recurso por um órgão
superior, cuja extensão da apreciação pelo Tribunal depende de quem seja o recorrente, ou seja,
se o recurso foi interposto pela acusação ou defesa.

Especificamente em relação à reformatio in pejus, convém seja feito um estudo articulado


considerando quem foi o recorrente: recurso da acusação ou recurso da defesa.

16.2 Recurso da acusação

Extensão do efeito devolutivo visando a agravar a situação jurídica do réu


condenado:

O efeito devolutivo do recurso da acusação é bastante limitado quando voltado a piorar a


situação do réu. Isso porque não pode o Tribunal, por exemplo, reconhecer contra o réu nulidade
não postulada no recurso da acusação. É nesse sentido, aliás, o teor da Súmula 160 do STF,
segundo a qual é nulo o acórdão que reconhece contra o réu nulidade não arguida no recurso
da acusação, excetuados os casos de reexame necessário (já que no caso de reexame
necessário, a devolução é sempre na íntegra).

Imaginemos que após ser proferida sentença absolutória o MP tenha interposto recurso
buscando exclusivamente a condenação do réu, sem arguir qualquer anulação. Nesse caso, não
poderá o Tribunal reconhecer qualquer nulidade, sob pena de haver reforma da decisão
prejudicial ao réu. Isso porque, com a declaração da nulidade, a sentença absolutória (que
favoreceu o réu) também será nula, gerando a possibilidade de ser proferida outra sentença,
agora condenatória. Eis a razão do teor da Súmula 160 do STF, ao considerar nula a decisão do
Tribunal que reconheceu nulidade não arguida pelo réu.

16.3 Recurso da defesa

a) Extensão do efeito devolutivo visando a beneficiar o réu condenado:

Neste caso, a devolução que se opera pelo recurso defensivo é, em regra, integral, podendo
ser decididas em seu favor, no juízo ad quem, temas não enfrentados na impugnação.

b) O efeito devolutivo do recurso da defesa em face da reformatio in pejus:

Art. 617, CPP: O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos
arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser gravada a pena,
quando somente o réu houver apelado da sentença.

Ocorre a reformatio in pejus quando o Tribunal agrava a situação do réu em face de recurso
interposto exclusivamente pela defesa. A reformatio in pejus pode ser direta ou indireta.

16.4 Reformatio in pejus direta

Ocorre quando o próprio Tribunal profere decisão agravando a situação jurídica do réu ao
julgar recurso exclusivo da defesa.

Embora a apelação permita o reexame da matéria decidida na sentença, o efeito devolutivo


não é pleno, ou seja, não pode resultar do julgamento decisão desfavorável à parte que interpôs
o recurso.

Recorrendo apenas o réu, não é possível haver reforma da sentença para agravar sua
situação; recorrendo a acusação em caráter limitado, não pode o tribunal dar provimento em
maior extensão contra o apelado.

Imaginemos que o réu foi condenado à pena de 2 anos de reclusão, sendo interposto
recurso exclusivamente pela defesa (MP não recorreu). Não pode o Tribunal proferir acórdão
elevando a pena do réu, a pretexto de que o juiz de 1º grau não observou a existência de uma
agravante.

16.5 Reformatio in pejus indireta

Trata-se da anulação da sentença, por recurso exclusivo do réu, vindo outra a ser
proferida, devendo respeitar os limites da primeira, sem poder agravar a situação do acusado.

Assim, caso o réu seja condenado a 5 anos de reclusão, mas obtenha a defesa a anulação
dessa decisão, quando o magistrado – ainda que seja outro – venha a proferir outra sentença,
está adstrito a uma condenação máxima de 5 anos.

Se pudesse elevar a pena, ao proferir nova decisão, estaria havendo uma autêntica reforma
em prejuízo da parte que recorreu.

Em tese, seria melhor ter mantido a sentença, ainda que padecendo de nulidade, pois a
pena seria menor.

Em síntese: Imagine-se que o réu, condenado a cinco anos de reclusão, recorra invocando
nulidade do processo. Considere-se, outrossim, que o Ministério Público não tenha apelado da
decisão para aumentar a pena. Se o tribunal, acolhendo o inconformismo da defesa, dar-lhe
provimento e determinar a renovação dos atos processuais, não poderá a nova sentença, como
regra, agravar a situação em que já se encontrava o réu por força da sentença, sob pena de
incorrer em reformatio in pejus indireta, ou seja, o juiz, na nova sentença, estaria limitado a cinco
anos. Se fixar pena superior a cinco anos, poderá ser alegado, em preliminar de apelação,
nulidade da sentença.

26) (QUESTÃO 2 – XIV EXAME)

Gustavo está sendo regularmente processado, perante o Tribunal do Júri da Comarca de Niterói-
RJ, pela prática do crime de homicídio simples, conexo ao delito de sequestro e cárcere privado.
Os jurados consideraram-no inocente em relação ao delito de homicídio, mas culpado em relação
ao delito de sequestro e cárcere privado. O juiz presidente, então, proferiu a respectiva sentença.
Irresignado, o Ministério Público interpôs apelação, sustentando que a decisão dos jurados fora
manifestamente contrária à prova dos autos. A defesa, de igual modo, apelou, objetivando
também a absolvição em relação ao delito de sequestro e cárcere privado. O Tribunal de Justiça,
no julgamento, negou provimento aos apelos, mas determinou a anulação do processo (desde o
ato viciado, inclusive) com base no Art. 564, III, i, do CPP, porque restou verificado que, para a
constituição do Júri, somente estavam presentes 14 jurados. Nesse sentido, tendo como base
apenas as informações contidas no enunciado, responda justificadamente às questões a
seguir.

A) A nulidade apresentada pelo Tribunal é absoluta ou relativa? Dê o respectivo


fundamento legal. (Valor: 0,40)

B) A decisão do Tribunal de Justiça está correta? (Valor: 0,85)

Utilize os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

27) (QUESTÃO 2 – XI EXAME)

Daniel foi denunciado, processado e condenado pela prática do delito de roubo simples em sua
modalidade tentada. A pena fixada pelo magistrado foi de dois anos de reclusão em regime
aberto. Todavia, atento às particularidades do caso concreto, o referido magistrado concedeu-
lhe o benefício da suspensão condicional da execução da pena, sendo certo que, na sentença,
não fixou nenhuma condição. Somente a defesa interpôs recurso de apelação, pleiteando a
absolvição de Daniel com base na tese de negativa de autoria e, subsidiariamente, a substituição
do benefício concedido por uma pena restritiva de direitos. O Tribunal de Justiça, por sua vez,
no julgamento da apelação, de forma unânime, negou provimento aos dois pedidos da defesa e,
no acórdão, fixou as condições do sursis, haja vista o fato de que o magistrado a quo deixou de
fazê-lo na sentença condenatória. Nesse sentido, atento apenas às informações contidas no
texto, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.

A) Qual o recurso cabível contra a decisão do Tribunal de Justiça? (Valor: 0,55)

B) Qual deve ser a principal linha de argumentação no recurso? (Valor: 0,70)

A simples menção ou transcrição do dispositivo legal não pontua.


Lei de Drogas

ATENÇÃO:

O conteúdo referente à Lei de Drogas está disposto no “E-book: Leis Especiais”, no


módulo “Curso Regular – 2ª Fase Penal”. Para acessar o módulo, clique aqui.
Organização Criminosa e Colaboração Premiada

ATENÇÃO:

O conteúdo referente à Organização Criminosa e Colaboração Premiada está disposto no


“E-book: Leis Especiais”, no módulo “Curso Regular – 2ª Fase Penal”. Para acessar o
módulo, clique aqui.
Lei de Abuso de Autoridade

ATENÇÃO:

O conteúdo referente à Lei de Abuso de Autoridade está disposto no “E-book: Leis


Especiais”, no módulo “Curso Regular – 2ª Fase Penal”. Para acessar o módulo, clique
aqui.
Lei dos Crimes Hediondos

ATENÇÃO:

O conteúdo referente à Lei dos Crimes Hediondos contra a honra está disposto no “E-
book: Leis Especiais”, no módulo “Curso Regular – 2ª Fase Penal”. Para acessar o
módulo, clique aqui.
Crimes de trânsito

ATENÇÃO:

O conteúdo referente à Crimes de trânsito está disposto no “E-book: Leis Especiais”, no


módulo “Curso Regular – 2ª Fase Penal”. Para acessar o módulo, clique aqui.
Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações
de consumo

ATENÇÃO:

O conteúdo referente à Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações


de consumo está disposto no “E-book: Leis Especiais”, no módulo “Curso Regular – 2ª
Fase Penal”. Para acessar o módulo, clique aqui.
Embargos infringentes e de nulidade

Prof.ª Letícia Neves


@prof.leticianeves

17.1 Conceito

Trata-se de recurso privativo da defesa, voltado a garantir uma segunda análise da


matéria decidida pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Federal, por ter havido maioria de votos
contra o réu, ou seja, decisão não unânime desfavorável ao réu, ampliando-se o quórum do
julgamento.

Assim, o recurso obriga que órgão do Tribunal seja chamado a decidir por completo e não
apenas com os votos dos Desembargadores que participaram do julgamento da apelação,
recurso em sentido estrito e agravo em execução.

Em determinados Tribunais de Justiça, por exemplo, as Câmaras são compostas por cinco
Desembargadores, participando da turma julgadora apenas três deles. Dessa forma, caso a
decisão proferida contra os interesses do réu constituir-se de maioria (dois a um) de votos, cabe
a oposição de embargos infringentes, chamando-se os demais desembargadores a participarem
do julgamento da matéria divergente.

Tecnicamente, o recurso de embargos infringentes guarda relação com a hipótese em


que o acórdão embargado tenha apresentado divergência em matéria de mérito, atribuindo-se
a nomenclatura embargos de nulidade à impugnação de acórdãos divergentes em matéria de
nulidade processual.

A Banca FGV já cobrou o presente recurso em questão, indicando como resposta


correta a nomenclatura de Embargos Infringentes, considerando que se tratava de conteúdo
envolvendo o mérito, veja a questão n. 04 do Exame XVIII.
17.2 Identificação

Palavras mágicas!
Decisão favorável
Maioria dos votos
Desfavorável ao réu

Apelação
Peça de
interposição

Recurso em
Sentido Embargos
Estrito Decisão não infringentes
Tribunal
unânime / nulidade

Razões de
Agravo em embargos
Execução infringentes ou
de nulidade

17.3 Base Legal

Artigos 609, parágrafo único, do Código de Processo Penal.


17.4 Legitimidade

Dispondo a lei que os embargos infringentes ou de nulidade só podem ser apresentados


pela defesa, não é cabível tal recurso da acusação ou da assistência.

Recurso privativo da defesa

17.5 Cabimento

Considerando que a previsão legal desses embargos se encontra no Capítulo V do Título


II do Código de Processo Penal, que trata “do processo e do julgamento dos recursos em sentido
estrito e das apelações”, os embargos infringentes e de nulidade referem-se apenas ao recurso
em sentido estrito e à apelação e, segundo a jurisprudência majoritária, em agravo em execução,
já que segue o processamento do recurso em sentido estrito.

É pacífico na doutrina e na jurisprudência que não é cabível em revisão criminal e em


habeas corpus.

Não cabe recurso de embargos infringentes nos julgamentos realizados pelas turmas
recursais, porque não possuem natureza de tribunais.

Também não cabem embargos infringentes contra acórdãos de primeiro grau, ou seja,
aqueles proferidos no julgamento de crimes de sua competência originária (nos casos de foro
com prerrogativa de função). Isso porque o próprio artigo 609, parágrafo único, do Código de
Processo Penal, faz expressa alusão às decisões de segunda instância.

Assim, no caso, por exemplo, de determinado prefeito, no exercício do mandato, ser


julgado e condenado pelo Tribunal de Justiça por maioria dos votos, não poderão ser opostos
embargos infringentes, cabendo somente recurso especial e/ou extraordinário, conforme o caso.

17.6 Prazo: art. 609, parágrafo único, CPP

O prazo para a oposição dos embargos infringentes é de dez dias, a contar da


publicação do acórdão, sendo desnecessária a intimação pessoal do réu e de seu defensor,
salvo, no caso deste último, quando se tratar de defensoria pública. A intimação do Ministério
Público também é pessoal.

Por ocasião da interposição, deve o recurso ser devidamente instruído com as razões,
pois não será aberta vista para essa finalidade

Prazo: 10 dias
A contar da publicação do acórdão

17.7 Forma e competência para o julgamento

Os embargos infringentes somente poderão ser opostos por petição, sendo inadmissível
por termo nos autos, já que as razões devem acompanhar a peça de interposição no momento
do protocolo do recurso.

A petição de interposição deve ser endereçada ao Desembargador-Relator do acórdão


embargado, enquanto as razões devem ser dirigidas ao respectivo órgão julgador.

A competência para o julgamento nos Tribunais de Justiça Estaduais depende do Código


de Organização Judiciária de cada Estado. Por isso, sugere-se que as razões sejam
endereçadas ao Tribunal de Justiça. Em sede de Tribunal Regional Federal, o julgamento dos
embargos infringentes opostos contra decisão das turmas incumbe, normalmente, às seções
criminais.
17.8 Estruturação

A estrutura do recurso de embargos infringentes ou de nulidade segue dois momentos,


sendo peça bipartida:

1) interposição do recurso (afirmar que pretende recorrer) e as;

2) razões de recurso.

1) Interposição – para o Desembargador Relator do Acórdão Embargado

Endereçamento: Desembargador Relator da Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça


do Estado de (se crime de matéria da Justiça Estadual) ou Desembargador Federal Relator da
Turma Criminal do Egrégio Tribunal Regional Federal da Região (se crime da competência da
Justiça Federal);
Preâmbulo: nome (desnecessário qualificar, pois já qualificado nos autos), capacidade
postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (art. 609, parágrafo único,
CPP), nome da peça (Recurso de Embargos Infringentes ou de Nulidade), frase final (pelos fatos
e fundamentos jurídicos a seguir expostos);

Parte final: (Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede deferimento,
data, advogado e OAB).

2) Razões recursais

Endereçamento: para Tribunal, dependendo do Regime Interno será dirigido ao Grupo


Criminal na Justiça Estadual / Seção Criminal na Justiça Federal 14

Tribunal de Justiça (se da competência da Justiça Estadual); Tribunal Regional Federal (se da
competência da Justiça Federal);

Identificação: embargante, embargado, nº processo...;

Saudação:

Justiça Estadual: Egrégio Tribunal de Justiça – Colendo Grupo Criminal – Eméritos Julgadores;

Justiça Federal: Egrégio Tribunal Regional Federal – Colenda Seção – Eméritos Julgadores

Corpo da peça: I. DOS FATOS: breve relato; II. DO DIREITO: Buscar no enunciado informações
voltadas a prevalecer o voto vencido (favorável ao réu).

Pedido: reforma da decisão + provimento do recurso + pedido específico parte final: termos em
que pede deferimento, local, data e OAB...

14No Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul a competência para julgamento é atribuída ao Grupo
Criminal. Já no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a competência para julgamento é das Câmaras
Criminais. Portanto, a matéria depende da situação local, conforme Art. 35 do Assento Regimental nº 560/2017.
Art. 35: As Câmaras julgam os recursos das decisões de primeiro grau, os embargos declaratórios opostos a seus
acórdãos, as ações rescisórias, as reclamações por descumprimento de seus julgados, os agravos internos e
regimentais, “habeas corpus”, mandados de segurança e demais feitos de competência originária.”
28) (QUESTÃO 04 - XVIII EXAME)

John, primário e de bons antecedentes, foi denunciado pela prática do crime de tráfico de drogas.
Após a instrução, inclusive com realização do interrogatório, ocasião em que o acusado
confessou os fatos, John foi condenado, na forma do Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, à pena
de 1 ano e 08 meses de reclusão, a ser cumprido em regime inicial aberto. O advogado de John
interpôs o recurso cabível da sentença condenatória. Em julgamento pela Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça, a sentença foi integralmente mantida por maioria de votos. O Desembargador
revisor, por sua vez, votou no sentido de manter a pena de 01 ano e 08 meses de reclusão,
assim como o regime, mas foi favorável à substituição da pena privativa de liberdade por duas
restritivas de direitos, no que restou vencido. O advogado de John é intimado do acórdão.

Considerando a situação narrada, responda aos itens a seguir.

A) Qual medida processual, diferente de habeas corpus, deverá ser formulada pelo
advogado de John para combater a decisão da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça?
(Valor: 0,65)

B) Qual fundamento de direito material deverá ser apresentado para fazer prevalecer o
voto vencido? (Valor: 0,60)
Peça de interposição:

A) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR RELATOR DO


ACÓRDÃO Nº DA ... CÂMARA CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO
ESTADO DE ... (se crime da competência da Justiça Estadual)

B) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR RELATOR DO


ACÓRDÃO Nº DA ... TURMA CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL
FEDERAL DA REGIÃO (se crime da competência da Justiça Federal)

Processo nº...

FULANO DE TAL (não inventar dados), já qualificado nos autos, por seu
procurador infra-assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, a
presença de Vossa Excelência, inconformado com a decisão de fls., opor o presente
EMBARGOS INFRINGENTES E/ OU NULIDADE com base no artigo 609, parágrafo
único, do Código de Processo Penal, requerendo seja recebido e processado o presente
recurso, pelos fatos e fundamentos expostos nas razões inclusas.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Local..., data...

ADVOGADO...
OAB...
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO... (se da competência da Justiça
Estadual);
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA ... REGIÃO (se da competência da Justiça
Federal).
Embargante: FULANO DE TAL
Embargado: MINISTÉRIO PÚBLICO
Processo nº...

RAZÕES DE RECURSO DE EMBARGOS INFRINGENTES OU NULIDADE


Colenda Câmara Criminal (Justiça Estadual) / Colenda Seção (Justiça Federal)

I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
Deverá ser exposto os motivos que deverá prevalecer o voto vencido.
Por exemplo: O acórdão ora recorrido não merece prosperar, devendo prevalecer os
fundamentos do voto vencido, senão vejamos.
III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja CONHECIDO e PROVIDO o presente, acolhendo o voto vencido,
reformando o acórdão recorrido, para o fim de...:

Nestes termos, pede deferimento.

Local..., data...
Advogado... OAB...
Observações:
Ver competência da Justiça Federal no art. 109 da CF/88;

Nos “fatos”, fazer breve relato dos fatos ocorridos, conforme os dados do enunciado (não inventar
nada nem simplesmente transcrever o enunciado). Importante: Justificar o cabimento e
admissibilidade do recurso de embargos infringentes;

O mérito deve guardar relação com o voto vencido (basicamente o que poderia ser alegado em
sede de apelação, recurso em sentido estrito e agravo em execução);

E o pedido também deve estar relacionado ao voto vencido.


Embargos de declaração

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18.1 Cabimento/conteúdo

Trata-se de recurso posto à disposição de qualquer das partes, voltado ao esclarecimento


de dúvidas surgidas no acórdão, quando configurada ambiguidade, obscuridade, contradição ou
omissão, permitindo, então, o efetivo conhecimento do teor do julgado, facilitando a sua aplicação
e proporcionando, quando for o caso, a interposição de recurso especial ou extraordinário.

Ambiguidade: é o estado daquilo que possui duplo sentido, gerando equivocidade e


incerteza, capaz de comprometer a segurança do afirmado. Assim, no julgado, significa a
utilização, pelo magistrado, de termos com duplo sentido, que ora apresentam uma
determinada orientação, ora seguem em caminho oposto, fazendo com o leitor, seja ele
leigo ou não, termine não entendendo qual o seu real conteúdo.

Obscuridade: é o estado daquilo que é difícil de entender, gerando confusão e


ininteligência, no receptor da mensagem. No julgado, evidencia a utilização de frases e
termos complexos e desconexos, impossibilitando ao leitor da decisão, leigo ou não,
captar-lhe o sentido e o conteúdo.

Contradição: trata-se de uma incoerência entre uma afirmação anterior e outra posterior,
referentes ao mesmo tema e no mesmo contexto, gerando a impossibilidade de
compreensão do julgado.

Omissão: é a lacuna ou o esquecimento. No julgado, traduz-se pela falta de abordagem


do magistrado acerca de alguma alegação ou requerimento formulado, expressamente,
pela parte interessada, merecedor de apreciação.
18.2 Identificação

Trata-se de recurso posto à disposição de qualquer das partes, voltado ao esclarecimento


de dúvidas surgidas no acórdão, quando configurada ambiguidade, obscuridade, contradição ou
omissão, permitindo, então, o efetivo conhecimento do teor do julgado, facilitando a sua aplicação
e proporcionando, quando for o caso, a interposição de recurso especial ou extraordinário.

PEDIU PRA PARAR

Peça:
Expressão mágica:

“decisão obscura, contraditória,


Embargos de
omissa ou ambígua...” Declaração

PAROU!

18.3 Base legal

Artigo 382 ou artigos 619 e 620, ambos do Código de Processo Penal.

18.4 Prazo

Os embargos devem opostos no prazo de 02 (dois) dias perante o próprio juiz prolator da
sentença (art. 382, CPP), ou, no caso dos tribunais (art. 619, CPP), endereçados ao próprio
relator do acórdão embargado.

Cuidado: No procedimento do Juizado Especial Criminal, o prazo para oposição dos


embargos de declaração é de 05 (cinco) dias, nos termos do artigo 83, § 1º, da Lei nº 9.099/95.
1º grau tribunal JEC

02 dias
02 dias 05 dias

18.5 Efeito interruptivo

Por analogia ao disposto no artigo 1.026 do Código de Processo Civil, os Embargos de


Declaração possuem o efeito de interromper o prazo para interposição de recurso.

Com a redação do artigo 83, § 2º, da Lei nº 9.099/95, dada alterada pelo Código de
Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), os embargos de declaração no âmbito do Juizado
Especial Criminal passaram também a ter efeito interruptivo.

18.6 Estruturação do recurso

Os embargos de declaração deverão ser interpostos em peça única, já com as razões da


interposição.
I) Endereçamento
Embargos de Declaração contra sentença (art. 382 do CPP)
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara do Tribunal do Júri da Comarca (se crime
doloso contra a vida da competência da Justiça Estadual) ou da Seção Judiciária (se crime
doloso contra a vida da competência da Justiça Federal)

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara Criminal da Comarca ... (se crime da
competência da Justiça Estadual);
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da Vara Criminal da Seção Judiciária de ... (se crime
da competência da Justiça Federal);

Embargos de Declaração contra Acórdão (art. 619 e 620 CPP)

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator do Acórdão nº... da Câmara Criminal do Egrégio


Tribunal de Justiça do Estado de ... (se crime de matéria da Justiça Estadual);

Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Relator do Acórdão nº .... da Turma Criminal do


Egrégio Tribunal Regional Federal da ... Região .... (se crime da competência da Justiça
Federal).

II) Preâmbulo: nome (desnecessário qualificar, pois já qualificado nos autos), capacidade
postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (arts. 382 ou 619 e 620,
todos do Código de Processo Penal), nome da peça (Recurso de Embargos de Declaração),
frase final (pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos...);

III) Corpo da peça: I) DOS FATOS: breve relatório; II) DO DIREITO: apontar a contradição,
obscuridade, ambiguidade ou omissão – demonstrar o vício da decisão;

IV) Pedidos: declaração dos embargos, com a correção da contradição, obscuridade,


ambiguidade ou omissão;

V) Fechamento: termos em que pede deferimento, local, data, advogado... e OAB...


Estruturação dos embargos de declaração:

A) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA DO TRIBUNAL


DO JÚRI DA COMARCA ... (se crime doloso contra a vida da competência da Justiça
Estadual) OU DA SEÇÃO JUDICIÁRIA ... (se crime doloso contra a vida da competência da
Justiça Federal)
B) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA CRIMINAL DA
COMARCA ... (se crime da competência da Justiça Estadual)
C) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ... VARA CRIMINAL
DA JUSTIÇA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE ... (se crime da competência da Justiça
Federal)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONTRA ACÓRDÃO – Art. 619 e 620, ambos
do CPP

A) DESEMBARGADOR RELATOR DA ... CÂMARA CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL


DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ... (se o crime é de matéria da Justiça Estadual)
B) DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DA ... TURMA CRIMINAL DO EGRÉGIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA ... REGIÃO (se crime da competência da Justiça
Federal)

FULANO DE TAL (não inventar dados), já qualificado nos autos, por seu procurador infra-
assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, a presença de Vossa
Excelência opor o presente EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, com base no artigo 382 ou
619 e 620, todos do Código de Processo Penal, pelos fatos e fundamentos jurídicos a
seguir expostos.

I) DOS FATOS
II) DO MÉRITO

III) DOS PEDIDOS


Ante o exposto, requer sejam recebidos os presentes Embargos e, ao final, declarada a
sentença ou acórdão embargado, corrigindo-se a (omissão, contradição, obscuridade ou
ambiguidade) como medida de inteira justiça.

Nestes termos,
Pede deferimento.

Local..., data...

Advogado...
OAB...

Observação:
No mérito, demonstrar a obscuridade, contradição, omissão ou ambiguidade.
Recurso Especial

19.1 Conceito

Conceitua-se o recurso especial como o recurso destinado a devolver ao Superior Tribunal


de Justiça a competência para conhecer e julgar questão federal de natureza infraconstitucional,
suscitada e decidida perante os Tribunais Federais e pelos Tribunais dos Estados e do Distrito
Federal.

Daí o enunciado corrente na doutrina de que o recurso especial, a exemplo do recurso


extraordinário, não devolve ao STJ o conhecimento de questões de fato, mas tão-só de direito.
Perfeita adequação possui, nessa sede, o enunciado da Súmula 279 do STF: “Para simples
reexame de prova não cabe recurso extraordinário”.

19.2 Identificação

Enquanto couber algum recurso, não cabe recurso especial. Esse pressupõe o
exaurimento das vias recursais. Essa regra inclui, também, os embargos infringentes. Em
síntese, somente depois de esgotados os recursos perante o Tribunal dos Estados e do Tribunal
Regional Federal terá cabimento o recurso especial, quando, basicamente, envolver matéria de
direito prevista em lei federal.

Peça de
Apelação interposição
Recurso em
Sentido Estrito Esgotados os Recurso
recursos no Especial
Agravo em Tribunal
Execução Lei Federal Razões de
Recurso
Embargos Especial
Infringentes/Nulidade
19.3 Base legal

Art. 105, inciso III, da CF/88

Com a vigência do novo Código de Processo Civil, os artigos 26 a 29 da Lei nº 8.038/90,


que disciplinavam o processamento do recurso especial e extraordinário, foram revogados,
passando a ser conduzida a matéria no contexto do novo Código de Processo Civil,
especificamente nos artigos 1029 a 1041.

19.4 Cabimento/conteúdo

Conforme dispõe o artigo 105, inciso III, da Constituição Federal/88, o recurso especial
será cabível contra as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais
Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal.

A) Decisão que contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência


Art. 1°, Decisão contrária é aquela que viola a lei federal, enquanto a que nega vigência
é a que deixa de aplicar a lei federal ou aplica outra norma. Entende-se por lei federal
aquela emanada do Congresso Nacional (Art. 22 da CF/88). Assim, não cabe recurso
especial contra decisões que tenham violado resoluções administrativas, portarias,
resoluções, ainda que editadas por órgãos federais.
Também não cabe recurso especial quando a norma violada decorrer do legislativo
estadual ou municipal.
Ex: Se o acórdão do Tribunal de Justiça considerar válida a perícia realizada por apenas
um perito não oficial em processo por crime de lesões corporais graves, estará
contrariando o disposto no artigo 159, § 1º, do Código de Processo Penal.
B) Decisão que julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal
Há, nessa hipótese, um conflito entre uma lei federal e um ato editado por autoridade
municipal ou estadual. Trata-se de hipótese rara no âmbito penal, uma vez que compete
à União legislar sobre direito penal e processual penal.
Conforme exemplifica Avena (2013, p. 1229), há alguns anos, o Governo do Estado do
Rio Grande do Sul editou portaria estabelecendo que desenvolver velocidade superior a
96 km/h (20% da máxima permitida no País à época) importava em prática de direção
perigosa. A condenação do motorista com base nessa portaria estadual, quando mantida
em grau de recurso, ensejou dezenas de recursos especiais sob o fundamento de que,
ao assim proceder, estava o tribunal validando um ato de governo local contestado em
face da Lei das Contravenções Penais (à época, direção perigosa não era crime, mas
contravenção), lei esta que estabelecia o critério velocidade como elemento ou
circunstância do tipo penal.

C) Decisão que der à lei federal interpretação divergente da que lhe tenha atribuído
outro tribunal
Trata-se da hipótese de recurso especial fundado na divergência jurisprudencial entre
tribunais diversos. Não cabe recurso especial se a divergência ocorrer entre órgãos
do mesmo tribunal, conforme a Súmula 13 do STJ: “A divergência entre julgados do
mesmo tribunal não enseja recurso especial”.
Trata-se da hipótese de recurso especial fundado na divergência jurisprudencial entre
tribunais diversos. Não cabe recurso especial se a divergência ocorrer entre órgãos
do mesmo tribunal, conforme a Súmula 13 do STJ: “A divergência entre julgados do
mesmo tribunal não enseja recurso especial”.

19.5 Prazo, interposição e processamento

O prazo para a interposição é de 15 dias, a partir da publicação do acórdão.

A petição, que deve ser dirigida ao presidente do tribunal que proferiu a decisão recorrida,
deve ser fundamentada e conter a exposição do fato e do direito, a demonstração do cabimento
do recurso e as razões do pedido de reforma da decisão. Simultaneamente com a petição de
interposição, apresentam-se as razões, que devem ser dirigidas ao Superior Tribunal de Justiça.

Recebida a petição pela Secretaria do Tribunal, o recorrido será intimado para apresentar
as contrarrazões no prazo de 15 dias, nos termos do artigo 1030 do Código de Processo Civil.

Com as contrarrazões, os autos serão conclusos ao presidente do tribunal a quo para a


realização do juízo de admissibilidade (juízo de prelibação), destinado à verificação do cabimento
do recurso, que deverá ser feito dentro do prazo de 5 dias. No juízo de prelibação, o julgador
deve conhecer de todos os fundamentos do recurso, sendo que a admissão por apenas um deles
não prejudica o seu conhecimento por qualquer outros (Súmula 292 do STF).

19.6 Prequestionamento

O prequestionamento também é requisito de admissibilidade do recurso especial, ou seja,


é indispensável que o acórdão recorrido tenha apreciado a questão que constitui objeto do
recurso.

Se o Tribunal que proferiu a decisão recorrida se omitiu na apreciação da matéria, cabe à


parte interessada opor embargos de declaração sob pena de não conhecimento do recurso
especial (Súmula 211 do STJ).

Acerca do prequestionamento, afigura-se interessante o disposto no artigo 1025 do


Código de Processo Civil, segundo o qual se consideram incluídos no acórdão os elementos que
o embargante suscitou, para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração
sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão,
contradição ou obscuridade.
19.7 Estruturação do Recurso Especial

A) INTERPOSIÇÃO

a) Endereçamento: Ao Presidente do Tribunal que proferiu a decisão recorrida

a) Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do


Estado (se crime da competência da Justiça Estadual)

c) Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Federal Presidente do Egrégio Tribunal


Regional Federal da ... Região (se crime da competência da Justiça Federal)

b) Preâmbulo: nome (desnecessário qualificar, pois já qualificado nos autos), capacidade


postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (Art. 105, inciso III, alínea
– indicar a alínea, da Constituição Federal), nome da peça (Recurso Especial), frase final
(pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos);

c) parte final (Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede deferimento,
data, advogado e OAB)

B) RAZÕES

a) Endereçamento: para o Superior Tribunal de Justiça

b) identificação: recorrente, recorrido, nº recurso recorrido

c) saudação:

Colendo Superior Tribunal de Justiça – Douta Turma – Eméritos Ministros

d) corpo da peça (breve relato, expor a admissibilidade do recurso extraordinário e a


repercussão geral e o mérito propriamente dito)

e) pedido: reforma da decisão + provimento do recurso + pedido específico

f) parte final: termos em que pede deferimento, local, data e OAB


Peça de interposição
A) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO ... (se crime da competência da Justiça
Estadual)
B) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR FEDERAL
PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA ... REGIÃO (se crime
da competência da Justiça Federal)

7 a 10 linhas

FULANO DE TAL, já qualificado nos autos, por seu procurador


infra-assinado, vem, respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, interpor o presente
RECURSO ESPECIAL, com base no artigo 105, inciso III, alínea (indicar a alínea), da
Constituição Federal/88, requerendo seja o recurso recebido e processado e, ao final,
remetido ao Superior Tribunal de Justiça.

Nestes termos
Pede deferimento

Local..., data...
Advogado...
OAB...
Razões de Recurso Especial
COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Recorrente: Fulano de Tal


Recorrido: Ministério Público

RAZÕES DE RECURSO ESPECIAL


Douta Turma
Eminentes Ministros

I) DOS FATOS
II) DO DIREITO
Lembrar que a matéria discutida envolve questão de direito. Não
se discute matéria de fato, que reclama análise de provas.

III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja conhecido e provido o presente recurso
especial, para o fim de que seja reformado o acórdão e, consequentemente, ... (pedido
específico).

Nestes termos,
Pede deferimento.

Local..., data...
ADVOGADO...
OAB...
Recurso Extraordinário

Reitera-se que, com a vigência do Código de Processo Civil, os artigos 26 a 29 da Lei nº


8.038/90, que disciplinavam o processamento do recurso especial e extraordinário, foram
revogados, passando a ser conduzida a matéria no contexto do Código de Processo Civil,
especificamente nos artigos 1029 a 1041.

20.1 Conceito

Trata-se de recurso destinado a impugnar qualquer decisão proferida em única ou última


instância que afronte a Constituição Federal. Em outras palavras, é aquele interposto perante o
STF das decisões judiciais em que não mais caiba outro recurso.

Entende-se por decisão final, para fins aqui propostos, aquela proferida após esgotadas,
por quem a impugna, todas as vias recursais ordinárias. Desta forma, não se conhece de recurso
extraordinário contra acórdão em recurso de apelação do qual ainda caibam embargos de
declaração, ou embargos infringentes.

Este o teor da Súmula 281 do STF: “É inadmissível o recurso extraordinário quando


couber, na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada”.

20.2 Identificação

Enquanto couber algum recurso, não cabe recurso extraordinário. Esse pressupõe o
exaurimento das vias recursais. Essa regra inclui, também, os embargos infringentes. Em
síntese, somente depois de esgotados os recursos perante o Tribunal dos Estados e do Tribunal
Regional Federal terá cabimento o recurso extraordinário, quando, basicamente, envolver
matéria de direito prevista na Constituição Federal.
20.3 Base legal

Art. 102, inciso III, da CF/88

20.4 Cabimento/Conteúdo

Para que o recurso extraordinário possa ser conhecido pelo STF, é preciso que a causa
decidida em única ou última instância suscite questão federal de natureza constitucional. A
própria Constituição Federal/88, no artigo 102, inciso III, cuida de arrolar as questões que
ensejam o julgamento do recurso em tela. São as chamadas hipóteses de cabimento do recurso
extraordinário, que, para fins de OAB, merecem destaque as hipóteses das alíneas “a” e “b”, do
artigo 102, inciso III, da Constituição Federal/88.
A) contrariar dispositivo desta Constituição
A decisão de instância inferior contraria dispositivo constitucional sempre que afrontar
regra ou princípio, implícito ou explícito, de natureza constitucional.

B) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal


É preciso, portanto, que a decisão recorrida de extraordinário expressamente os afirme
incompatíveis com a Constituição.
Qualquer juiz ou tribunal tem competência para exercer o controle incidental de
constitucionalidade (ou difuso), afastando a incidência de leis ou atos normativos sob o
fundamento de que violam dispositivo, princípio ou garantia constitucional.

20.5 Prazo e interposição

O prazo para a interposição é de 15 dias, a partir da publicação do acórdão.

Recebida a petição pela Secretaria do Tribunal, o recorrido será intimado para apresentar
as contrarrazões no prazo de 15 dias.

Com as contrarrazões, os autos serão conclusos ao presidente do tribunal a quo para a


realização do juízo de admissibilidade (juízo de prelibação), destinado à verificação do cabimento
do recurso, que deverá ser feito dentro do prazo de 5 dias. No juízo de prelibação, o julgador
deve conhecer de todos os fundamentos do recurso, sendo que a admissão por apenas m deles
não prejudica o seu conhecimento por qualquer outros (Súmula 292 do STF).

20.6 Prequestionamento

Pressuposto específico jurisprudencial, que, em verdade, deflui do acima analisado. A ele


respeitam as Súmulas 282 e 356, ambas do STF.

Pelo prequestionamento, como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário,


entende-se que não pode ser objeto desta questão que não haja sido expressamente conhecida
e decidida pela instância inferior.
Se, por exemplo, o apelante, ao oferecer suas razões, solicitou do Tribunal o
pronunciamento sobre determinada questão federal constitucional e o acórdão a omitiu, é
necessário, para que se possa interpor recurso extraordinário, que o sucumbente oponha
embargos de declaração, a fim de alcançar o prequestionamento. Esse é o conteúdo da Súmula
356 do STF.

20.7 Repercussão geral das questões constitucionais

Como repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, deve-se


entender somente aquelas que transcendam os interesses meramente particulares e individuais
em discussão na causa, e afetem um grande número de pessoas, surtindo efeitos sobre o
panorama político, jurídico e social da coletividade.

Trata-se de um requisito de admissibilidade previsto no artigo 102, § 3º, da Constituição


Federal/88, quando prevê que o “recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das
questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine
a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus
membros”.

20.8 Estruturação do Recurso Extraordinário

A) INTERPOSIÇÃO

Endereçamento: Ao Presidente do Tribunal que proferiu a decisão recorrida

a) Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do


Estado (se crime da competência da Justiça Estadual)

b) Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Federal Presidente do Egrégio Tribunal


Regional Federal da ... Região (se crime da competência da Justiça Federal)

b) Preâmbulo: nome (desnecessário qualificar, pois já qualificado nos autos), capacidade


postulatória (por seu procurador infra-assinado), fundamento legal (art. 102, inciso III, indicar
a alínea, da Constituição Federal), nome da peça (Recurso Extraordinário), frase final (pelos
fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos);

c) parte final (Nesses termos, requer o processamento do presente recurso. Pede deferimento,
data, advogado e OAB)

B) RAZÕES

a) Endereçamento: para o Supremo Tribunal Federal

b) identificação: recorrente, recorrido, nº recurso recorrido

c) saudação:

Colendo Supremo Tribunal Federal – Douta Turma – Eméritos Ministros

d) corpo da peça (breve relato, expor a admissibilidade do recurso extraordinário e a


repercussão geral e o mérito propriamente dito)

e) pedido: reforma da decisão + provimento do recurso + pedido específico

f) parte final: termos em que pede deferimento, local, data e OAB


Peça de interposição do Recurso Extraordinário

Endereçamento: Ao Presidente do Tribunal que proferiu a decisão recorrida

A) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO


EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO ... (SE CRIME DA COMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA ESTADUAL)
B) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR FEDERAL
PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA ... REGIÃO (SE
CRIME DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL)

7 a 10 linhas

FULANO DE TAL (não inventar dados), já qualificado nos autos, por


seu procurador infra-assinado, vem, respeitosamente, a presença de Vossa Excelência,
interpor o presente RECURSO EXTRAORDINÁRIO, com base no artigo 102, inciso III,
alínea (indicar a alínea), da Constituição Federal, requerendo seja o recurso recebido
e processado e, ao final, remetido ao Supremo Tribunal Federal.

Nestes termos,
Pede deferimento.

Local..., data...
Advogado...
OAB...
Razões do Recurso Extraordinário
COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Recorrente: Fulano de Tal


Recorrido: Ministério Público

RAZÕES DE RECURSO DE EXTRAORDINÁRIO


Colendo Supremo Tribunal Federal
Douta Turma
Eminentes Ministros
I) DOS FATOS
Expor a admissibilidade (cabimento) do recurso extraordinário e a
repercussão geral e o mérito propriamente dito.

II) DO DIREITO
1º parágrafo: Indicar a tese
2º parágrafo: fundamentar a tese
Lembrar que a matéria discutida envolve questão de direito. Não
se discute matéria de fato, que reclama análise de provas.

III) DO PEDIDO
Ante o exposto, requer seja conhecido e provido o presente
recurso, para o fim de que seja reformado o acórdão e, consequentemente, ... (pedido
específico).

Nestes termos,
Pede deferimento.

Local..., data...
ADVOGADO...
OAB...
PADRÃO DE RESPOSTAS
1) (QUESTÃO 2 - V EXAME)
Joaquina, ao chegar à casa de sua filha, Esmeralda, deparou-se com seu genro, Adaílton,
mantendo relações sexuais com sua neta, a menor F.M., de 12 anos de idade, fato ocorrido no
dia 2 de janeiro de 2011. Transtornada com a situação, Joaquina foi à delegacia de polícia, onde
registrou ocorrência do fato criminoso. Ao término do Inquérito Policial instaurado para apurar os
fatos narrados, descobriu-se que Adaílton vinha mantendo relações sexuais com a referida
menor desde novembro de 2010. Apurou-se, ainda, que Esmeralda, mãe de F.M., sabia de toda
a situação e, apesar de ficar enojada, não comunicava o fato à polícia com receio de perder o
marido que muito amava.
Na condição de advogado(a) consultado(a) por Joaquina, avó da menor, responda aos
itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal
pertinente ao caso.
A) Adaílton praticou crime? Em caso afirmativo, qual? (Valor: 0,3)
B) Esmeralda praticou crime? Em caso afirmativo, qual? (Valor: 0,5)
C) Considerando que o Inquérito Policial já foi finalizado, deve a avó da menor oferecer
queixa-crime? (Valor: 0,45)

GABARITO COMENTADO
A) Sim. Estupro de vulnerável, conduta descrita no art. 217-A do CP.
B) Sim. Esmeralda também praticou estupro de vulnerável (artigo 217-A do CP c/c artigo 13, §2º,
“a”, do CP), uma vez que tinha a obrigação legal de impedir o resultado, sendo garantidora da
menor.
C) Não, pois se trata de ação penal pública incondicionada, nos termos do art. 225, parágrafo
único, do CP.

Observação: A Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018 trouxe importantes mudanças em


relação aos crimes contra a dignidade sexual. Agora a ação penal pública incondicionada
é a regra para os crimes contra a liberdade sexual e os crimes sexuais contra vulnerável
(arts. 213 a 218-C) e está prevista no artigo 225, caput, do Código Penal.
DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS
ITEM PONTUAÇÃO
A) Sim. Estupro de vulnerável (0,2) – art. 217-A do CP (0,1) 0 / 0,1 / 0,2 / 0,3
B) Sim. Estupro de vulnerável (0,3) – artigo 217-A do CP c/c artigo 13, §2º, “a”,
do CP OU era garantidora (0,2). 0 / 0,3 / 0,5
Não pontua só artigo ou fundamento isolados.
C) Não, por se tratar de ação penal pública incondicionada (0,35). Art. 225,
0 / 0,35 / 0,45
parágrafo único, do CP (0,1).

2) (QUESTÃO 04 – X EXAME)
Erika e Ana Paula, jovens universitárias, resolvem passar o dia em uma praia paradisíaca e, de
difícil acesso (feito através de uma trilha), bastante deserta e isolada, tão isolada que não há
qualquer estabelecimento comercial no local e nem mesmo sinal de telefonia celular. As jovens
chegam bastante cedo e, ao chegarem, percebem que além delas há somente um salva-vidas
na praia. Ana Paula decide dar um mergulho no mar, que estava bastante calmo naquele dia.
Erika, por sua vez, sem saber nadar, decide puxar assunto com o salva-vidas, Wilson, pois o
achou muito bonito. Durante a conversa, Erika e Wilson percebem que têm vários interesses em
comum e ficam encantados um pelo outro. Ocorre que, nesse intervalo de tempo, Wilson percebe
que Ana Paula está se afogando. Instigado por Erika, Wilson decide não efetuar o salvamento,
que era perfeitamente possível. Ana Paula, então, acaba morrendo afogada.
Nesse sentido, atento(a) apenas ao caso narrado, indique a responsabilidade jurídico-
penal de Erika e Wilson. (Valor: 1,25)
O examinando deve fundamentar corretamente sua resposta. A simples menção ou transcrição
do dispositivo legal não pontua.

GABARITO COMENTADO
Segundo os dados narrados na questão, Wilson, por ser salva-vidas, tem o dever legal de agir
para evitar o resultado e, naquele momento, podia perfeitamente agir. Assim, trata-se de agente
garantidor. Nesse caso, responde por delito comissivo por omissão, qual seja, homicídio doloso
praticado via omissão imprópria: art. 121 c/c art. 13, § 2º, alínea 'a', ambos do CP. Erika, por sua
vez, por ter instigado Wilson a não realizar o salvamento de Ana Paula, responde como partícipe
de tal homicídio, nos termos do art. 29 do CP. Não há que se falar em omissão de socorro por
parte de Erika, pois, conforme dados expressos no enunciado, ela não sabia nadar e nem tinha
como chamar por ajuda.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
Wilson, por ser agente garantidor (0,30) /responde pelo delito de homicídio
0,00/0,30/0,60/0,90
(0,30) / praticado via omissão imprópria. (0,30)
Erika responde como partícipe de tal homicídio (0,35). 0,00/0,35

3) (QUESTÃO 03 – EXAME 2010-02)


Pedro, almejando a morte de José, contra ele efetua disparo de arma de fogo, acertando-o na
região toráxica. José vem a falecer, entretanto, não em razão do disparo recebido, mas porque,
com intenção suicida, havia ingerido dose letal de veneno momentos antes de sofrer a agressão,
o que foi comprovado durante instrução processual. Ainda assim, Pedro foi pronunciado nos
termos do previsto no artigo 121, caput, do Código Penal.
Na condição de Advogado de Pedro:
Indique o recurso cabível;
O prazo de interposição;
A argumentação visando à melhoria da situação jurídica do defendido. Indique, ainda, para todas
as respostas, os respectivos dispositivos legais.

GABARITO COMENTADO
I – Recurso em sentido estrito, nos termos do artigo 581, IV, do Código de Processo Penal. (0,2)
II – 5 dias, nos termos do artigo 586, do Código de Processo Penal. (0,2)
III – deveria ser requerida a desclassificação do crime consumado para tentado, já que a ação
de Pedro não deu origem a morte de José. Trata-se de hipótese de concausa absolutamente
independente pré-existente. (0,4)
Artigo 13 do Código Penal. (0,2)

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
Recurso em sentido estrito (art. 581, IV, CPP) 0/0,2
5 dias (art. 586, CPP) 0/0,2
Consumado para tentado (art. 13 CP) 0/0,2/0,4/0,6

4) (QUESTÃO 1 – XXI EXAME)


Paulo e Júlio, colegas de faculdade, comemoravam juntos, na cidade de São Gonçalo, o título
obtido pelo clube de futebol para o qual o primeiro torce. Não obstante o clima de
confraternização, em determinado momento, surgiu um entrevero entre eles, tendo Júlio
desferido um tapa no rosto de Paulo. Apesar da pouca intensidade do golpe, Paulo vem a falecer
no hospital da cidade, tendo a perícia constatado que a morte decorreu de uma fatalidade,
porquanto, sem que fosse do conhecimento de qualquer pessoa, Paulo tinha uma lesão pretérita
em uma artéria, que foi violada com aquele tapa desferido por Júlio e causou sua morte. O órgão
do Ministério Público, em atuação exclusivamente perante o Tribunal do Júri da Comarca de São
Gonçalo, denunciou Júlio pelo crime de lesão corporal seguida de morte (Art. 129, § 3º, do CP).
Considerando a situação narrada e não havendo dúvidas em relação à questão fática,
responda, na condição de advogado(a) de Júlio:
A) É competente o juízo perante o qual Júlio foi denunciado? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual tese de direito material poderia ser alegada em favor de Júlio? Justifique. (Valor:
0.60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar as respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO
A) O(A) examinando(a) deve concluir pela incompetência do Juízo, tendo em vista que o crime
praticado não é doloso contra a vida. Nos termos do Art. 74, § 1º, do Código de Processo Penal
(ou Art. 5º, inciso XXXVIII, alínea d, da CRFB), ao Tribunal do Júri cabe apenas o julgamento
dos crimes dolosos contra a vida e os conexos. No caso, mesmo de acordo com a imputação
contida na denúncia, o resultado de morte foi culposo; logo, a competência é do juízo singular.
B) O(A) examinando(a) deve defender que não poderia Júlio responder pelo crime de lesão
corporal seguida de morte, porque aquele resultado não foi causado a título de dolo nem culpa.
O crime de lesão corporal seguida de morte é chamado de preterdoloso. A ação é dirigida à
produção de lesão corporal, sendo o resultado morte produzido a título de culpa. Costuma-se
dizer que há dolo no antecedente e culpa no consequente. Um dos elementos da culpa é a
previsibilidade objetiva, somente devendo alguém ser punido na forma culposa quando o
resultado não querido pudesse ser previsto por um homem médio, sendo que a ausência de
previsibilidade subjetiva, capacidade do agente, no caso concreto, de prever o resultado,
repercute na culpabilidade.
Na hipótese, não havia previsibilidade objetiva, o que impede a tipificação do delito de lesão
corporal seguida de morte. Também poderia o candidato responder que havia uma concausa
preexistente, relativamente independente, desconhecida, impedindo Júlio de responder pelo
resultado causado. Em princípio, a concausa relativamente independente preexistente não
impede a punição do agente pelo crime consumado. Contudo, deve ela ser conhecida do agente
ou ao menos existir possibilidade de conhecimento, sob pena de responsabilidade penal objetiva.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
A) O Tribunal do Júri não é o juízo competente, pois o crime imputado não é
doloso contra a vida (0,55), nos termos do Art. 74, § 1º, do CPP OU do Art. 5º, 0,00 / 0,55 / 0,65
inciso XXXVIII, da CRFB/88. (0,10)
B) Júlio não poderia responder pelo resultado morte (0,25), nem mesmo a título
de culpa, em razão da ausência de previsibilidade OU porque existe causa
relativamente independente preexistente desconhecida OU porque a atribuição
do resultado violaria o princípio da vedação da responsabilidade objetiva (0,35).
0,00 / 0,25 /
0,35 / 0,60
Obs.: A mera repetição do enunciado no sentido de que o resultado decorreu de
uma fatalidade em razão de lesão em artéria desconhecida, sem qualquer
fundamentação jurídica, não é suficiente para atribuição do segundo intervalo de
pontuação.

5) Durante uma grave discussão, ocorrida no serviço, Licurgo Moicano agrediu Coitinho Lelo com
uma paulada na cabeça, com a intenção de matá-lo. Atendido com rapidez, Coitinho Lelo foi
colocado dentro de uma ambulância que rumou para o Pronto Socorro Municipal. No trajeto, a
ambulância capotou, vindo Coitinho Lelo a falecer em razão do acidente. Diante do fato e à luz
do ordenamento jurídico penal, responda se Licurgo Moicano deve ser responsabilizado
penalmente? Em caso afirmativo, indique qual o crime, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
GABARITO COMENTADO
O estudante deverá indicar que o crime praticado foi o de tentativa de homicídio, ressaltando que
o caso trata de hipótese de causa superveniente relativamente independente, enfatizando, ainda,
o artigo 13, § 1º, do Código Penal.

6) (QUESTÃO 4 – XXV EXAME – REAPLICAÇÃO PORTO ALEGRE)


Vitor efetuou disparos de arma de fogo contra José, com a intenção de causar sua morte. Ocorre
que, por erro durante a execução, os disparos atingiram a perna de seu inimigo e não o peito,
como pretendido. Esgotada a munição disponível, Vitor empreendeu fuga, enquanto José
solicitou a ajuda de populares e compareceu, de imediato, ao hospital para atendimento médico.
Após o atendimento médico, já no quarto com curativos, enquanto dormia, José vem a ser picado
por um escorpião, vindo a falecer no dia seguinte em razão do veneno do animal,
exclusivamente. Descobertos os fatos, considerando que José somente estava no hospital em
razão do comportamento de Vitor, o Ministério Público oferece denúncia em face do autor dos
disparos pela prática do crime de homicídio consumado, previsto no Art. 121, caput, do Código
Penal. Após regular prosseguimento do feito, na audiência de instrução e julgamento da primeira
fase do procedimento do Tribunal do Júri, quando da oitiva das testemunhas, o magistrado em
atuação optou por iniciar a oitiva das testemunhas formulando diretamente suas perguntas, sem
permitir às partes complementação. Após alegações finais orais das partes, o magistrado proferiu
decisão de pronúncia. Apesar da impugnação da defesa quanto à formulação das perguntas pelo
juiz, o magistrado esclareceu que não importaria quem fez a pergunta, pois as respostas seriam
as mesmas. Com base apenas nas informações narradas, na condição de advogado(a) de
Vitor, responda aos itens a seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão proferida pelo magistrado e qual argumento de
direito processual pode ser apresentado em busca da desconstituição de tal decisão?
Justifique. (Valor: 0,65)
B) Existe argumento de direito material a ser apresentado, em momento oportuno, para
questionar a capitulação jurídica apresentada pelo Ministério Público? Justifique. (Valor:
0,60)
GABARITO COMENTADO
A) O recurso cabível da decisão de pronúncia é o Recurso em Sentido Estrito, nos termos do
Art. 581, inciso IV, do CPP. Em relação ao argumento de direito processual, deveria o candidato
alegar que houve nulidade durante a instrução probatória, tendo em vista que o magistrado
formulou diretamente perguntas às testemunhas, sendo que o Código de Processo Penal prevê
o sistema de cross examination para oitiva das testemunhas, cabendo as partes formularem as
perguntas diretamente para as testemunhas, podendo ser complementados pelo magistrado, na
forma do Art. 411 e do Art. 212, ambos do CPP. No caso, o magistrado formulou diretamente as
perguntas, não oportunizou às partes a complementação e houve devida impugnação em
momento adequado. A conduta do juiz configura cerceamento de defesa, de modo que devem
ser anulados todos os atos desde a instrução.
B) Em relação ao argumento de direito material, deveria a defesa de Vitor questionar a
capitulação jurídica realizada pelo Ministério Público. De fato, Vitor, ao efetuar disparos de arma
de fogo contra José, em direção ao seu peito, tinha a intenção de matá-lo, como o enunciado
deixa claro. Todavia, os disparos de Vitor não foram suficientes para causar a morte de seu
inimigo por circunstâncias alheias à sua vontade, já que os projéteis atingiram a perna de José.
José recebeu atendimento médico e já estava no quarto com curativos.
Posteriormente, José veio a ser mordido por escorpião, sendo que o veneno do animal causou,
exclusivamente, sua morte. Certo é que José só estava no hospital em razão dos disparos de
Vitor, mas houve causa superveniente, relativamente independente, que por si só causou a morte
de José. Diante disso, o resultado fica afastado, mas responde Vitor pelos atos já praticados,
conforme previsão do Art. 13, § 1º, do Código Penal. Assim, por mais que José tenha falecido,
Vitor deveria responder pelo crime de tentativa de homicídio.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO

A1) O recurso cabível da decisão de pronúncia é o Recurso em Sentido Estrito


0,00/0,20/0,30
(0,20), na forma do Art. 581, inciso IV, do CPP (0,10).
A2) O argumento de direito processual a ser apresentado é o de que houve
nulidade com a formulação de perguntas diretas por parte do magistrado, sem
0,00/0,15/0,20/0,35
oportunizar complementação das partes (0,20), o que viola o princípio da ampla
defesa OU o que gera o cerceamento de defesa (0,15).
B) O argumento de direito material é o de que ocorreu causa superveniente
relativamente independente que por si só causou o resultado (0,35), devendo 0,00/0,15/0,25/0,35/
Vitor responder por tentativa de homicídio (0,15), nos termos do Art. 13, § 1º, do 0,45/0,50/0,60
CP (0,10).

7) (QUESTÃO 1 – XIX EXAME)

João estava dirigindo seu automóvel a uma velocidade de 100 km/h em uma rodovia em que o
limite máximo de velocidade é de 80 km/h. Nesse momento, foi surpreendido por uma bicicleta
que atravessou a rodovia de maneira inesperada, vindo a atropelar Juan, condutor dessa
bicicleta, que faleceu no local em virtude do acidente. Diante disso, João foi denunciado pela
prática do crime previsto no Art. 302 da Lei nº 9.503/97. As perícias realizadas no cadáver da
vítima, no automóvel de João, bem como no local do fato, indicaram que João estava acima da
velocidade permitida, mas que, ainda que a velocidade do veículo do acusado fosse de 80 km/h,
não seria possível evitar o acidente e Juan teria falecido. Diante da prova pericial constatando a
violação do dever objetivo de cuidado pela velocidade acima da permitida, João foi condenado à
pena de detenção no patamar mínimo previsto no dispositivo legal. Considerando apenas os
fatos narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.

A) Qual o recurso cabível da decisão do magistrado, indicando seu prazo e fundamento


legal? (Valor: 0,60)

B) Qual a principal tese jurídica de direito material a ser alegada nas razões recursais?
(Valor: 0,65)

Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

GABARITO COMENTADO

A) O recurso cabível da sentença do magistrado que condenou João é o recurso de apelação,


cujo prazo de interposição é de 05 dias e o fundamento é o Art. 593, inciso I, do Código de
Processo Penal.

B) A principal tese jurídica a ser apresentada é o requerimento de absolvição do acusado, pois,


em que pese ter havido violação do dever objetivo de cuidado, essa violação não representou
incremento do risco no caso concreto, pois, ainda que observada a velocidade máxima prevista
para a pista, com respeito ao dever de cuidado, o resultado teria ocorrido da maneira como
ocorreu. Dessa forma, o examinando pode fundamentar o pedido de absolvição com base na
ausência de incremento do risco, sendo essa ausência, de acordo com a Teoria da Imputação
Objetiva, fundamento para absolvição. De qualquer maneira, o cerne da resposta é a indicação
de que não foi a violação do dever de cuidado a responsável pelo resultado lesivo, de modo que
não deveria João ser por ele responsabilizado.

A Banca também considerou como correta a resposta que indicava a inexistência de culpa,
apesar da violação do dever objetivo de cuidado, em razão da ausência do elemento
previsibilidade, sob a alegação de que João não poderia prever que uma bicicleta atravessaria
seu caminho em uma rodovia de tráfego intenso, em local inadequado.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS

ITEM PONTUAÇÃO

A) O recurso cabível da sentença do magistrado é a Apelação (0,35), cujo 0,00/0,15/0,25/0,35


fundamento legal é previsto no Art. 593, inciso I, do CPP (0,10), com prazo de 0,45/0,50/0,60
interposição de 05 dias (0,15).

B) Não foi praticado crime OU deveria João ser absolvido (0,15), razão da
aplicação da Teoria da Imputação Objetiva, pois ainda que não houvesse
violação do dever objetivo de cuidado, o resultado teria ocorrido da mesma 0,00/0,15/0,50/0,65
maneira que ocorreu, não havendo incremento do risco realizado no resultado
OU porque não havia culpa em razão da ausência do elemento previsibilidade
(0,50).

8) (QUESTÃO 4 – EXAME 2010-03)


Caio, professor do curso de segurança no trânsito, motorista extremamente qualificado, guiava
seu automóvel tendo Madalena, sua namorada, no banco do carona. Durante o trajeto, o casal
começa a discutir asperamente, o que faz com que Caio empreenda altíssima velocidade ao
automóvel. Muito assustada, Madalena pede insistentemente para Caio reduzir a marcha do
veículo, pois àquela velocidade não seria possível controlar o automóvel. Caio, entretanto,
respondeu aos pedidos dizendo ser perito em direção e refutando qualquer possibilidade de
perder o controle do carro. Todavia, o automóvel atinge um buraco e, em razão da velocidade
empreendida, acaba se desgovernando, vindo a atropelar três pessoas que estavam na calçada,
vitimando-as fatalmente. Realizada perícia de local, que constatou o excesso de velocidade, e
ouvidos Caio e Madalena, que relataram à autoridade policial o diálogo travado entre o casal,
Caio foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio na modalidade de
dolo eventual, três vezes em concurso formal. Recebida a denúncia pelo magistrado da vara
criminal vinculada ao Tribunal do Júri da localidade e colhida a prova, o Ministério Público pugnou
pela pronúncia de Caio, nos exatos termos da inicial. Na qualidade de advogado de Caio,
chamado aos debates orais, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

A) Qual(is) argumento(s) poderia(m) ser deduzidos em favor de seu constituinte? (Valor:


0,4)

B) Qual pedido deveria ser realizado? (Valor: 0,3)

C) Caso Caio fosse pronunciado, qual recurso poderia ser interposto e a quem a peça de
interposição deveria ser dirigida? (Valor: 0,3)

GABARITO COMENTADO

A) Incompetência do juízo, uma vez que Caio praticou homicídio culposo, pois agiu com culpa
consciente, na medida em que, embora tenha previsto o resultado, acreditou que o evento não
fosse ocorrer em razão de sua perícia.

B) Desclassificação da imputação para homicídio culposo e declínio de competência, conforme


previsão do artigo 419 do CPP.

C) Recurso em sentido estrito, conforme previsão do artigo 581, IV, do CPP. A peça de
interposição deveria ser dirigida ao juiz de direito da vara criminal vinculada ao tribunal do júri,
prolator da decisão atacada.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS

ITEM PONTUAÇÃO
A) Incompetência do juízo, uma vez que Caio praticou homicídio culposo (0,2), pois
agiu com culpa consciente, na medida em que, embora tenha previsto o resultado, 0 / 0,2 / 0,4
acreditou que o evento não fosse ocorrer em razão de sua perícia (0,2)
B) Desclassificação da imputação para homicídio culposo OU declínio de
0 / 0,15 / 0,3
competência (0,15), conforme previsão do artigo 419 do CPP (0,15).
C) Recurso em sentido estrito (0,15), conforme previsão do artigo 581, IV, do CPP. A
peça de interposição deveria ser dirigida ao juiz de direito da vara criminal vinculada 0 / 0,15 / 0,3
ao tribunal do júri (0,15), prolator da decisão atacada.
9) (QUESTÃO 4 – XI EXAME)

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Lucile, imputando-lhe a prática da conduta


descrita no Art. 155, caput, do CP. Narrou, a inicial acusatória, que no dia 18/10/2012 Lucile
subtraiu, sem violência ou grave ameaça, de um grande estabelecimento comercial do ramo de
venda de alimentos, dois litros de leite e uma sacola de verduras, o que totalizou a quantia de
R$10,00 (dez reais). Todas as exigências legais foram satisfeitas: a denúncia foi recebida, foi
oferecida suspensão condicional do processo e foi apresentada resposta à acusação. O
magistrado, entretanto, após convencer-se pelas razões invocadas na referida resposta à
acusação, entende que a fato é atípico. Nesse sentido, tendo como base apenas as
informações contidas no enunciado, responda, justificadamente, aos itens a seguir.

A) O que o magistrado deve fazer? Após indicar a solução, dê o correto fundamento legal.
(Valor: 0,65)

B) Qual é o elemento ausente que justifica a alegada atipicidade? (Valor: 0,60)

GABARITO COMENTADO

A questão objetiva extrair do examinando conhecimento acerca da absolvição sumária, bem


como dos elementos essenciais à configuração da tipicidade penal de uma conduta.

A) O juiz deve absolver sumariamente a ré, devendo fundamentar sua decisão no Art. 397, III do
CPP.

B) Está ausente a tipicidade material. Isso porque, pela moderna doutrina, somente haverá
tipicidade se, além da tipicidade formal (subsunção do fato à norma), estiver presente, também,
a tipicidade material, assim entendida como efetiva lesão relevante ou ameaça de lesão ao bem
jurídico tutelado.

10) (QUESTÃO 4 - XXX EXAME)

Maria foi denunciada pela suposta prática do crime de descaminho, tendo em vista que teria
deixado de recolher impostos que totalizavam R$ 500,00 (quinhentos reais) pela saída de
mercadoria, fato constatado graças ao lançamento definitivo realizado pela Administração
Pública. Considerando que constava da Folha de Antecedentes Criminais de Maria outro
processo pela suposta prática de crime de roubo, inclusive estando Maria atualmente presa em
razão dessa outra ação penal, o Ministério Público deixou de oferecer proposta de suspensão
condicional do processo. Após a instrução criminal em que foram observadas as formalidades
legais, sendo Maria assistida pela Defensoria Pública, foi a ré condenada nos termos da
denúncia. A pena aplicada foi a mínima prevista para o delito, a ser cumprida em regime inicial
aberto, substituída por restritiva de direitos. Maria foi intimada da sentença através de edital, pois
não localizada no endereço constante do processo. A família de Maria, ao tomar conhecimento
do teor da sentença, procura você, na condição de advogado(a) para prestar esclarecimentos
técnicos. Informa estar preocupada com o prazo recursal, já que Maria ainda não tinha
conhecimento da condenação, pois permanecia presa. Na condição de advogado(a),
esclareça os seguintes questionamentos formulados pela família da ré.

A) Existe argumento de direito processual para questionar a intimação de Maria do teor


da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,60)

B) Qual argumento de direito material poderá ser apresentado, em eventual recurso, em


busca da absolvição de Maria? Justifique. (Valor: 0,65)

Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO

A questão exige do examinando conhecimento sobre uma pluralidade de temas, mas em especial
sobre os elementos do fato típico e sobre as formas de intimação das sentenças condenatórias.
Narra o enunciado que Maria foi denunciada pela suposta prática de crime de descaminho, crime
esse que teria gerado um prejuízo aos cofres públicos no valor de aproximadamente R$500,00
(quinhentos reais), estando incursa nas sanções do Art. 334 do CP.

A) O advogado, ao ser procurado pela família de Maria, deveria esclarecer que a intimação de
Maria do teor da sentença condenatória não foi correta, tendo em vista que ela encontrava-se
presa por outro crime, fato do conhecimento do Ministério Público. De acordo com o Art. 392 do
CPP, a intimação da sentença deverá ser pessoal se o réu estiver preso, ainda que a prisão seja
decorrente de outro processo. A intimação por edital deve ocorrer quando o réu estiver em local
incerto e não sabido, quando não for possível sua localização, ou em alguma das situações
previstas no Art. 392, incisos IV, V e V, do CPP, o que não foi o caso. A intimação por edital,
como forma de intimação ficta, prejudicou Maria, que ainda não tinha conhecimento do teor da
sentença condenatória.

B) O argumento seria de que a conduta praticada por Maria é atípica em razão da aplicação do
princípio da insignificância. O conceito de crime envolve um fato típico, ilícito e culpável. Dentro
da tipicidade, está a tipicidade material, que é a lesão relevante ao bem jurídico protegido. Em
relação aos crimes tributários, a jurisprudência é tranquila no sentido de que haveria atipicidade
material sempre que o valor do imposto sonegado não ultrapassar aquele que a Fazenda Pública
considera baixo o suficiente para não justificar uma cobrança através de execução fiscal. Ainda
que exista controvérsia se tal valor seria de R$ 10.000,00 ou R$ 20.000,00, fato é que, na
presente hipótese, considerando que o valor do tributo não ultrapassaria R$ 500,00, o princípio
da insignificância deveria ser aplicado. A lesão constatada não é grave o suficiente para justificar
a intervenção do Direito Penal, diante de sua característica de subsidiariedade/última ratio.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS

ITEM PONTUAÇÃO
A) Sim. Existe, tendo em vista que Maria deveria ter sido intimada pessoalmente
por estar presa (0,50), na forma do Art. 392, inciso I, do CPP (0,10). 0,00/0,50/0,60

B) Atipicidade material da conduta (0,25), em razão do reconhecimento do


0,00/0,25/0,40/0,65
princípio da insignificância/bagatela (0,40).

11) (QUESTÃO 4 - XXVII EXAME)


Revoltada com o fato de que sua melhor amiga Clara estaria se relacionando com seu ex-
companheiro João, Maria a procurou e iniciou uma discussão.
Durante a discussão, Clara, policial militar, afirmou que, se Maria a xingasse novamente, ela a
mataria gastando apenas uma munição da sua arma. Persistindo na discussão, Maria voltou a
ofender Clara. Esta, então, abriu sua bolsa e pegou um bem de cor preta. Acreditando que Clara
cumpriria sua ameaça, Maria desferiu um golpe na cabeça da rival, utilizando um pedaço de pau
que estava no chão. A perícia constatou que o golpe foi a causa eficiente da morte de Clara.
Posteriormente, também foi constatado que Clara, de fato, estava com sua arma de fogo na
bolsa, mas que ela apenas pegara seu telefone celular para ligar para João.
Após denúncia pela prática do crime de homicídio qualificado e encerrada a instrução da primeira
fase do procedimento do Tribunal do Júri, entendeu o magistrado por pronunciar Maria nos
termos da inicial acusatória.
Com base nas informações expostas, responda, na condição de advogado(a) de Maria,
aos itens a seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão proferida pelo magistrado? Caso tivesse ocorrido a
impronúncia, o recurso pela parte interessada seria o mesmo? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual a tese de direito material a ser apresentada em sede de recurso para combater a
decisão de submeter a ré ao julgamento pelo Tribunal do Júri? Justifique. (Valor: 0,60)

GABARITO COMENTADO
A) A questão narra que Maria foi pronunciada pela suposta prática de crime de homicídio
qualificado, sendo que, ao final da primeira fase do procedimento do Tribunal do Júri, entendeu
o magistrado por pronunciar Maria nos termos da denúncia. Da decisão de pronúncia caberá
recurso em sentido estrito, nos termos do Art. 581, inciso IV, do CPP. Caso a decisão proferida
pelo magistrado fosse de impronúncia, não haveria que se falar em recurso em sentido estrito.
Antes da edição da 11.689/08, a decisão de impronúncia também era combatida através de
recurso em sentido estrito. Todavia, houve alteração legislativa e, desde então, da decisão de
impronúncia, por ser terminativa, caberá recurso de apelação, assim como ocorreria na
absolvição sumária, conforme previsão do Art. 416 do CPP.
B) A tese de direito material seria que Maria agiu em legítima defesa putativa, nos termos do Art.
20, §1º do Código Penal (erro de tipo permissivo), tendo em vista que acreditava estar atuando
em legítima defesa. Isso porque Clara havia ameaçado Maria de morte caso essa realizasse um
xingamento, o que foi feito por Maria.
Ainda que diante de eventual injúria, se verídica, a conduta de Clara de efetuar disparo de arma
de fogo configuraria uma injusta agressão, pois, no mínimo, haveria excesso em sua conduta.
Caso, de fato, Clara tivesse pego, em sua bolsa, sua arma de fogo, configurada estaria a legítima
defesa e, consequentemente, a conduta de Maria seria legítima. Todavia, na verdade Maria
supôs situação que não existia, já que Clara apenas pegou seu celular para realizar uma ligação.
Diante disso, a atuação em legítima defesa foi apenas putativa

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
A1) O recurso cabível da decisão de pronúncia é o recurso em sentido estrito (0,30),
0,00/0,30/0,40
conforme Art. 581, inciso IV, do CPP (0,10).
A2) Caso a decisão fosse de impronúncia, o recurso cabível seria de apelação (0,15),
0,00/0,15/0,25
conforme previsão do Art. 416 do CPP (0,10).
B) A tese de direito material seria que Maria agiu em legítima defesa putativa (0,15),
0,00/0,15/0,25/0,35/
estando amparada por descriminante putativa OU erro de tipo permissivo
0,45/0,50/0,60
(0,35), conforme Art. 20, §1º do CP (0,10).

12) (QUESTÃO 1 - VI EXAME)


Ao chegar a um bar, Caio encontra Tício, um antigo desafeto que, certa vez, o havia ameaçado
de morte. Após ingerir meio litro de uísque para tentar criar coragem de abordar Tício, Caio partiu
em sua direção com a intenção de cumprimentá-lo. Ao aproximar-se de Tício, Caio observou que
seu desafeto bruscamente pôs a mão por debaixo da camisa, momento em que achou que Tício
estava prestes a sacar uma arma de fogo para vitimá-lo. Em razão disso, Caio imediatamente
muniu-se de uma faca que estava sobre o balcão do bar e desferiu um golpe no abdome de
Tício, o qual veio a falecer. Após análise do local por peritos do Instituto de Criminalística da
Polícia Civil, descobriu-se que Tício estava tentando apenas pegar o maço de cigarros que
estava no cós de sua calça.
Considerando a situação acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
A) Levando-se em conta apenas os dados do enunciado, Caio praticou crime? Em caso
positivo, qual? Em caso negativo, por que razão? (Valor: 0,65)
B) Supondo que, nesse caso, Caio tivesse desferido 35 golpes na barriga de Tício, como
deveria ser analisada a sua conduta sob a ótica do Direito Penal? (Valor: 0,60)

GABARITO COMENTADO
A) Não, pois atuou sob o manto de descriminante putativa, instituto previsto no art. 20, parágrafo
1º do CP, uma vez que supôs, com base em fundado receio, estar em situação de legítima
defesa. Como se limitou a dar uma facada, a sua reação foi moderada, não havendo que se falar
em punição por excesso.
B) Ainda que tenha procurado se defender de agressão que imaginou estar em vias de ocorrer,
Caio agiu em excesso doloso, devendo, portanto, responder por homicídio doloso, na forma do
artigo 23, parágrafo único, do CP.
DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS
ITEM PONTUAÇÃO
A) Não, pois atuou sob o manto de descriminante putativa, uma vez que supôs estar em
situação de legítima defesa, (0,5) nos termos do artigo 20, §1º, do CP (0,15). 0,00/0,50/0,65
Obs.: A mera indicação do artigo não é pontuada.
B) Ainda que tenha procurado se defender de agressão que imaginou estar em vias de
ocorrer, Caio agiu em excesso doloso (0,45), na forma do artigo 23, parágrafo único, do 0,00/0,45/0,60
CP (0,15).

13) (XXV EXAME – REAPLICAÇÃO EM PORTO ALEGRE – TESE PRINCIPAL DA PEÇA)


Breno, nascido em 07 de junho de 1945, na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, falsifica
uma assinatura em uma folha de cheque e a apresenta em loja de eletrodomésticos localizada
no bairro de sua residência, com a intenção de realizar compras no valor de R$ 5.000,00 (cinco
mil reais). Após a apresentação do cheque, apesar de a falsificação não ser grosseira e ser apta
a enganar, o gerente do estabelecimento comercial percebe que aquele cheque não fora
assinado pelo verdadeiro correntista do banco, já que o nome que constava do título de crédito
era de um grande amigo seu. Descoberta a fraude, o referido gerente aciona a polícia, e Breno
é preso em flagrante antes de obter a vantagem pretendida.
Com o recebimento dos autos, o Ministério Público opina pela liberdade de Breno e oferece
denúncia pela prática dos crimes do Art. 171, caput, e Art. 297, § 2º, na forma do Art. 69, todos
do Código Penal. Após concessão da liberdade provisória e recebimento da denúncia, houve
juntada do laudo pericial do cheque, constatando a falsidade e a capacidade para iludir terceiros,
bem como da Folha de Antecedentes Criminais, no qual consta uma condenação definitiva pela
prática, no ano anterior, do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, além
de uma ação em curso pela suposta prática de crime de furto.
Durante a instrução, todos os fatos acima descritos são confirmados pelas testemunhas, não
tendo sido o réu interrogado, já que, apesar de intimado, apresentou problemas de saúde no dia
e não pôde comparecer à audiência. Ainda durante a audiência de instrução e julgamento, após
a instrução, as partes apresentaram suas alegações, sendo consignado pela defesa o
inconformismo com a ausência do réu, já que foi apresentado atestado médico, e, em seguida,
o juiz proferiu sentença condenatória nos termos da denúncia, condenando o agente pela prática
dos dois delitos em suas modalidades consumadas. No momento de fixar a pena-base,
aumentou o magistrado a pena do estelionato em 02 meses, destacando que o comportamento
de Breno não deixa qualquer dúvida de que agiu com dolo. Já a pena do uso de documento falso
foi aplicada em seu patamar mínimo. Na segunda fase, não foram reconhecidas atenuantes, mas
foi reconhecida a agravante da reincidência, aumentando a pena de cada um dos delitos em
mais 02 meses de reclusão. No terceiro momento, não foram reconhecidas causas de aumento
ou de diminuição. Assim, foi fixada a pena de 01 ano e 04 meses de reclusão e 14 dias-multa,
no que tange ao crime de estelionato, e 02 anos e 02 meses de reclusão e 12 dias-multa para o
crime de falsificação de documento equiparado ao público, restando a pena final em 03 anos e
06 meses de reclusão e 26 dias-multa. O regime inicial de cumprimento de pena aplicado pelo
magistrado foi o semiaberto e não houve substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direito, tudo fundamentado na reincidência do agente.
Intimado da decisão, o Ministério Público apenas tomou ciência de seu teor, não apresentando
qualquer medida. Já a defesa técnica de Breno foi intimada de seu teor em 06 de dezembro de
2017, quarta-feira, sendo quinta-feira dia útil em todo o país.
Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado(a) de Breno,
redija a peça jurídica cabível, diferente de habeas corpus e embargos de declaração,
apresentando todas as teses jurídicas pertinentes. A peça deverá ser datada no último dia
do prazo para interposição. (Valor: 5,00)

GABARITO COMENTADO
Considerando as informações expostas na questão, deveria o candidato formular um Recurso
de Apelação, na forma do Art. 593, inciso I, do CPP, com elaboração da petição de interposição
acompanhada das respectivas razões recursais. A peça de interposição deveria ser direcionada
para o Juízo da Vara Criminal da Comarca de Porto Alegre/RS, enquanto que as razões recursais
deveriam ser endereçadas para o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. A data
indicada deveria ser o dia 11 de dezembro de 2017, tendo em vista o prazo de 05 dias para
interposição da apelação.
Em suas razões recursais, inicialmente deveria o advogado buscar o reconhecimento da
nulidade dos atos praticados a partir da audiência de instrução e julgamento e da sentença, tendo
em vista que o ato foi realizado na ausência do réu, que não pode comparecer justificadamente,
inclusive sendo apresentado atestado médico pela defesa técnica. Dessa forma, houve violação
ao princípio da ampla defesa, em seu elemento autodefesa (direito de presença), de modo que
configurado cerceamento de defesa, pois o réu não foi interrogado.
Em seguida, como tese principal de mérito, deveria o examinando defender a impossibilidade de
condenação do agente pela prática de dois crimes autônomos, tendo em vista que a falsificação
do cheque foi apenas um meio para prática do crime de estelionato, de modo que o delito previsto
no Art. 297, §2º do Código Penal deveria ser absorvido pelo delito do Art. 171, caput, do Código
Penal.
Em princípio, quando um delito é praticado apenas como meio para a prática de outro delito,
aquele deve ficar absorvido por este, em respeito ao princípio da consunção. Trata-se de um dos
princípios que soluciona o conflito aparente de normas.
Uma das elementares do crime de estelionato é exatamente a fraude, a intenção de enganar.
Quando a fraude é utilizada através da falsificação de um documento cuja falsidade se exaure
no estelionato, o delito autônomo de falsificação ficará absorvido pelo estelionato, pois aquele foi
apenas um crime meio para a prática do mesmo e o potencial lesivo do crime meio foi exaurido.
Consagrando tal entendimento, o Superior Tribunal de Justiça editou o Enunciado 17 de sua
Súmula de Jurisprudência, prevendo que “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais
potencialidade lesiva, é por este absorvido”.
Na hipótese apresentada, não há dúvidas de que a intenção do agente era praticar um crime de
estelionato. Ademais, o falso no caso (folha de cheque com assinatura falsificada) se exaure no
estelionato, não mais tendo potencialidade lesiva, de modo que o crime do Art. 297, §2º do
Código Penal deveria ser absorvido, restando apenas o crime de estelionato.
Ressalta-se ser desnecessário encaminhamento dos autos para análise de proposta de
suspensão condicional do processo, tendo em vista que o réu responde a outros processos, não
preenchendo os requisitos do Art. 89 da Lei nº 9.099/90, não havendo prejuízo, porém, caso o
examinando elabore tal requerimento.
Após, deveria o examinando questionar a pena aplicada em relação ao crime de estelionato,
especialmente.
No momento de fixar a pena base do delito, o magistrado entendeu por aumentá-la, de acordo
com as circunstâncias do Art. 59 do Código Penal, sob o fundamento de que o denunciado agiu
com dolo. Ocorre que o delito de estelionato somente é punido em razão de comportamento
doloso, não havendo previsão de punição em caso de conduta culposa, de modo que o elemento
subjetivo dolo já é inerente ao tipo, não podendo o magistrado incrementar a pena sob esse
fundamento.
Na segunda fase, deveria ter sido reconhecida a atenuante em razão da idade do autor do fato,
tendo em vista que o agente era maior de 70 anos na data da sentença, pois nascido em 07 de
junho de 1945 e a sentença foi proferida no ano de 2017.
Já na terceira fase, deveria ser reconhecida a causa de diminuição de pena da tentativa. Isso
porque o crime de estelionato é delito classificado pela doutrina como sendo de natureza
material, ou seja, existe um resultado naturalístico previsto no tipo e ele precisa ocorrer para a
consumação do crime. Na hipótese apresentada, Breno pretendia pagar suas compras através
de cheque de terceiro, falsificando a assinatura do mesmo. Diante disso, pretendia obter
vantagem patrimonial em prejuízo alheio. Todavia, quando buscava realizar, mediante fraude,
compras no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o gerente do estabelecimento descobriu o
ocorrido e acionou a polícia, permitindo a prisão em flagrante de Breno e impedindo a
consumação do delito. Assim, necessária a aplicação do Art. 14, inciso II, do Código Penal, com
redução da pena aplicada.
Após a dosimetria da pena, deveria o examinando defender a possibilidade de substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Isso porque a condenação anterior do
agente, em que pese, de fato, configure reincidência, não impede a substituição, uma vez que o
Art. 44 do Código Penal apenas veda a medida para o condenado reincidente na prática de crime
doloso. Na hipótese, a pena aplicada foi inferior a 04 anos e o agente apenas tinha uma
condenação anterior pela prática de crime culposo, logo possível a substituição.
Caso não acolhido o pleito de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos,
mesmo que mantida a pena aplicada em primeira instância, caberia o pedido de suspensão
condicional da pena, nos termos do Art. 77, § 2º, do Código Penal, tendo em vista que a sanção
aplicada foi inferior a 04 anos e o réu é maior de 70 anos, logo aplicável o sursis etário.
Em razão do exposto, deveria o examinando formular o pedido de conhecimento e provimento
do recurso, com os seguintes fundamentos:
a) Reconhecimento de nulidade em razão da ausência do réu em audiência e não realização de
interrogatório;
b) Afastamento do delito autônomo de falsificação de documento equiparado ao público;
c) Aplicação da pena base no mínimo legal, tendo em vista que o dolo é elemento inerente ao
tipo penal;
d) Reconhecimento da atenuante pelo fato de o réu ser maior de 70 anos na data da sentença;
e) Reconhecimento da causa de diminuição de pena da tentativa;
f) Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista que a
condenação anterior era por crime culposo.
g) Subsidiariamente, aplicação da suspensão condicional da pena.
O prazo a ser indicado na petição de interposição da apelação era o dia 11 de dezembro de
2017, já que o prazo previsto para a interposição do recurso de apelação é de 05 dias.
No fechamento, deveria o examinando indicar local, data, advogado e OAB.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
Petição de Interposição
1) Endereçamento: Vara Criminal da Comarca de Porto Alegre/RS (0,10). 0,00/0,10
2) Fundamento legal: Art. 593, inciso I, do Código de Processo Penal (0,10). 0,00/0,10
Razões Recursais
3) Endereçamento: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (0,10). 0,00/0,10
4) Preliminarmente, nulidade dos atos de instrução ou da sentença (0,30) 0,00/0,30
4.1) porque ocorreu cerceamento de defesa OU porque houve violação ao princípio da
0,00/0,15/025
ampla defesa (0,15), nos termos do Art. 5º, LV, CRFB (0,10).
4.2) porque o réu não pode comparecer ao ato justificadamente e não foi realizado
0,00/0,15
interrogatório OU e o réu não estava presente quando da produção das provas (0,15)
5) No mérito: Absorção do crime de falsificação de documento pelo de estelionato (0,70),
0,00/0,70/0,80
nos termos do Enunciado 17 da Súmula de Jurisprudência do STJ (0,10).
6) Deverá ser aplicado o princípio da consunção (0,15), tendo em vista que se trata do
0,00/0,15/0,20/0,35
crime meio para a prática do crime patrimonial (0,20).
7) Redução da pena base ao mínimo legal (0,40), tendo em vista que o elemento subjetivo
0,00/0,15/0,40/0,55
dolo já é inerente ao tipo (0,15).
8) Reconhecimento de atenuante em razão de o agente ser maior de 70 anos na data da
0,00/0,35/0,45
sentença (0,35), nos termos do Art. 65, inciso I, do CP (0,10).
9) Reconhecimento da tentativa (0,45), tendo em vista que o crime de estelionato é de
0,00/0,10/0,45/0,55
natureza material e não houve obtenção da vantagem ilícita (0,10).
10) Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (0,20), tendo em
0,00/0,15/0,20/0,25/
vista que a condenação anterior foi pela prática de crime culposo (0,15), de acordo com
0,30/0,35/0,45
o Art. 44, inciso II, do Código Penal (0,10).
11) Subsidiariamente, aplicação da suspensão condicional da pena (0,15), tendo em vista
0,00/0,10/0,15/
que a pena aplicada foi inferior a 4 anos e o réu era maior de 70 anos OU em razão do
0,20/0,25/0,35
sursis etário (0,10), nos termos do Art. 77, §2º, do Código Penal (0,10)
Pedidos:
12) Conhecimento (0,10) e provimento do recurso (0,20). 0,00/0,10/0,20/0,30
Prazo:
13) 11 de dezembro de 2017 (0,10). 0,00/0,10
Estrutura e Fechamento:
14) local, data, advogado e OAB. (0,10). 0,00/0,10

14) (QUESTÃO 01 – IX EXAME)


Raimundo, já de posse de veículo automotor furtado de concessionária, percebe que não tem
onde guardá- lo antes de vendê-lo para a pessoa que o encomendara. Assim, resolve ligar para
um grande amigo seu, Henrique, e após contar toda sua empreitada, pede-lhe que ceda a
garagem de sua casa para que possa guardar o veículo, ao menos por aquela noite. Como
Henrique aceita ajudá-lo, Raimundo estaciona o carro na casa do amigo. Ao raiar do dia,
Raimundo parte com o veículo, que seria levado para o comprador.
Considerando as informações contidas no texto responda, justificadamente, aos itens a
seguir.
A) Raimundo e Henrique agiram em concurso de agentes? (Valor: 0,75)
B) Qual o delito praticado por Henrique? (Valor: 0,50)

GABARITO COMENTADO
A) Não há concurso de agentes, pois o auxílio foi proposto após a consumação do crime de furto.
Assim, não estão presentes os requisitos necessários à configuração do concurso de agentes,
mormente liame subjetivo e identidade da infração penal.
B) Favorecimento real (Art. 349, do CP).

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
A) Não, pois o auxílio foi proposto após a consumação do crime de furto (0,75) OU Não,
0,00/ 0,75
pois inexistente liame subjetivo e identidade da infração penal entre ambos (0,75).
B) Favorecimento real OU praticou o delito descrito no Art. 349, do CP (0,50). 0,00/ 0,50

15) (QUESTÃO 01 – XXIX EXAME)


Caio e Bruno são irmãos e estão em dificuldades financeiras. Caio, que estava sozinho em seu
quarto, verifica que a janela da casa dos vizinhos está aberta; então, ingressa no local e subtrai
um telefone celular avaliado em R$500,00. Ao mesmo tempo, apesar de não saber da conduta
de seu irmão, Bruno percebe que a porta da residência dos vizinhos também ficou aberta. Tendo
conhecimento que os proprietários eram um casal de empresários muito rico, ingressa no local
e subtrai uma bolsa, avaliada em R$ 450,00.
Os fatos são descobertos dois dias depois, e Bruno e Caio são denunciados pelo crime de furto
qualificado (Art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal), sendo acostadas as Folhas de
Antecedentes Criminais (FAC), contendo, cada uma delas, outra anotação pela suposta prática
de crime de estelionato, sem, contudo, haver condenação com trânsito em julgado em ambas.
Após instrução, a pretensão punitiva do Estado é julgada procedente, sendo aplicada pena
mínima de 02 anos de reclusão e 10 dias-multa, em regime inicial aberto, devidamente
substituída por restritiva de direitos.
Com base nas informações expostas, intimado(a) para apresentação de recurso,
responda, na condição de advogado(a) de Caio e Bruno, aos itens a seguir.
A) Existe argumento de direito material a ser apresentado para questionar a capitulação
jurídica apresentada pelo Ministério Público e acolhida na sentença? (Valor: 0,60)
B) Mantida a capitulação acolhida na sentença (Art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal),
existe argumento em busca da redução da pena aplicada? (Valor: 0,65)
O(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

GABARITO COMENTADO
A) Sim, a capitulação jurídica realizada pelo Ministério Público e acolhida na sentença poderá
ser questionada, tendo em vista que não deveria ter sido imputada a qualificadora do concurso
de agentes. O Art. 155, § 4º, inciso IV, do CP prevê qualificadora do furto quando este for
praticado mediante concurso de duas ou mais pessoas.
Ocorre que, apesar de Caio e Bruno serem irmãos e terem praticado crimes de furto no mesmo
local, data e horário, não houve concurso de agentes. Dentre os requisitos para configuração do
concurso de agentes está o liame subjetivo, que não restou configurado na hipótese
apresentada. A todo momento o enunciado deixa claro que Caio e Bruno sequer sabiam da
conduta um do outro, não havendo que se falar, então, em comunhão de ações e desígnios e,
consequentemente, concurso de agentes, apesar de configurado o crime de furto simples em
relação a ambos.
B) Mesmo em caso de manutenção da capitulação apresentada, ou seja, de furto qualificado,
seria possível a redução da pena aplicada em razão do privilégio previsto no Art. 155, § 2º, do
CP. Apesar de os agentes responderem a outras ações penais, nos termos da Súmula 444 do
STJ, não havendo sentença condenatória anterior com trânsito em julgado, são considerados
tecnicamente primários e de bons antecedentes. Ademais, as coisas furtadas podem ser
consideradas de pequeno valor, não havendo que se falar em insignificância, na hipótese, seja
pelo valor dos bens seja porque o enunciado indaga sobre a redução da pena aplicada e não
afastamento da tipicidade da conduta.
É preciso, ainda, ressaltar que os Tribunais Superiores pacificaram o entendimento de que a
figura do furto privilegiado poderá ser reconhecida ainda que o crime em questão seja de furto
qualificado, topograficamente localizado após a disciplina do privilégio, nos termos da Súmula
511 do Superior Tribunal de Justiça.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
A) Sim, o argumento seria pela inexistência de liame subjetivo entre os
agentes (0,45), afastando-se a qualificadora do concurso de pessoas 0,00/0,15/0,45/0,60
(0,15).
B) Sim, aplicação do furto privilegiado (0,35), já que a coisa é de pequeno 0,00/0,20/0,30/0,35/
valor e os réus são primários (0,20), conforme a Súmula 511 do STJ (0,10). 0,45/0,55/0,65

16) (QUESTÃO 3 – XIX EXAME)


Sabendo que Vanessa, uma vizinha com quem nunca tinha conversado, praticava diversos furtos
no bairro em que morava, João resolve convidá-la para juntos subtraírem R$ 1.000,00 de um
cartório do Tribunal de Justiça, não contando para ela, contudo, que era funcionário público e
nem que exercia suas funções nesse cartório.
Praticam, então, o delito, e Vanessa fica surpresa com a facilidade que tiveram para chegar ao
cofre do cartório. Descoberto o fato pelas câmeras de segurança, são os dois agentes
denunciados, em 10 de março de 2015, pela prática do crime de peculato. João foi notificado e
citado pessoalmente, enquanto Vanessa foi notificada e citada por edital, pois não foi localizada
em sua residência.
A família de Vanessa constituiu advogado e o processo prosseguiu, mas dele a ré não tomou
conhecimento. Foi decretada a revelia de Vanessa, que não compareceu aos atos processuais.
Ao final, os acusados foram condenados pela prática do crime previsto no Art. 312 do Código
Penal à pena de 02 anos de reclusão. Ocorre que, na verdade, Vanessa estava presa naquela
mesma Comarca, desde 05 de março de 2015, em razão de prisão preventiva decretada em
outros dois processos. Ao ser intimada da sentença, ela procura você na condição de
advogado(a).
Considerando a hipótese narrada, responda aos itens a seguir.
A) Qual argumento de direito processual poderia ser apresentado em favor de Vanessa
em sede de apelação? Justifique. (Valor: 0,65)
B) No mérito, foi Vanessa corretamente condenada pela prática do crime de peculato?
Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o mero “sim” ou “não”, desprovido de justificativa ou mesmo com a indicação de justificativa
inaplicável ao caso, não será pontuado.
GABARITO COMENTADO
A) O examinando deveria alegar que, em relação à Vanessa, o processo é nulo desde a citação.
Quando Vanessa foi citada por edital, ela estava presa em estabelecimento na mesma unidade
da Federação do juízo processante, logo sua citação foi nula, conforme Enunciado 351 da
Súmula de Jurisprudência do STF. Como ela não tomou conhecimento da ação e nem mesmo
foi interrogada, pois teve sua revelia decretada, o prejuízo é claro. Assim, em sede de apelação,
antes de enfrentar o mérito da apelação, deveria o advogado buscar a anulação de todos os atos
após sua citação, inclusive da sentença. Poderia, ainda, o candidato justificar a nulidade na
exigência trazida pelo Art. 360 do CPP, que prevê que o réu preso deve ser citado pessoalmente.
B) Vanessa não foi corretamente condenada pela prática do crime de peculato. Em que pese o
Art. 30 do Código Penal prever que as “circunstâncias” de caráter pessoal se comunicam quando
elementares do crime, não é possível, no caso concreto, a aplicação desse dispositivo, porque o
enunciado deixa claro que Vanessa não tinha conhecimento da condição de funcionário público
de João, não sendo possível responsabilizá-la por peculato. A simples afirmação de que as
circunstâncias pessoais não se comunicam é insuficiente para atribuição da pontuação, pois,
quando elementares, poderá haver comunicação, desde que o agente tenha dessa situação. Da
mesma forma, inadequada a afirmativa no sentido de que o particular não pode ser
responsabilizado pelo crime próprio de peculato, pois insuficiente.
DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS
ITEM PONTUAÇÃO
A) Nulidade dos atos processuais praticados após sua citação OU nulidade da sentença
(0,25), pois a citação por edital foi inválida, já que Vanessa estava presa OU já que a 0,00/0,10/0,25/0,30/
citação de Vanessa deveria ter sido realizada pessoalmente (0,30), nos termos da 0,35/0,40/0,55/0,65
Súmula 351 do STF OU do art. 360, CPP (0,10).
B) Vanessa não foi corretamente condenada por peculato porque não tinha
conhecimento da condição de funcionário público de João, dependendo a comunicação
0,00 / 0,60
da elementar desse elemento subjetivo OU porque não pode ser aplicado o Art. 30 do
CP pela ausência de elemento subjetivo (0,60).

17) (QUESTÃO 04 – XXII EXAME)


Diego e Júlio caminham pela rua, por volta das 21h, retornando para suas casas após mais um
dia de aula na faculdade, quando são abordados por Marcos, que, mediante grave ameaça de
morte e utilizando simulacro de arma de fogo, exige que ambos entreguem as mochilas e os
celulares que carregavam. Após os fatos, Diego e Júlio comparecem em sede policial, narram o
ocorrido e descrevem as características físicas do autor do crime. Por volta das 5h da manhã do
dia seguinte, policiais militares em patrulhamento se deparam com Marcos nas proximidades do
local do fato e verificam que ele possuía as mesmas características físicas do roubador. Todavia,
não são encontrados com Marcos quaisquer dos bens subtraídos, nem o simulacro de arma de
fogo. Ele é encaminhado para a Delegacia e, tendo-se verificado que era triplamente reincidente
na prática de crimes patrimoniais, a autoridade policial liga para as residências de Diego e Júlio,
que comparecem em sede policial e, em observância de todas as formalidades legais, realizam
o reconhecimento de Marcos como responsável pelo assalto. O Delegado, então, lavra auto de
prisão em flagrante em desfavor de Marcos, permanecendo este preso, e o indicia pela prática
do crime previsto no Art. 157, caput, do Código Penal, por duas vezes, na forma do Art. 69 do
Código Penal. Diante disso, Marcos liga para seu advogado para informar sua prisão. Este
comparece, imediatamente, em sede policial, para acesso aos autos do procedimento originado
do Auto de Prisão em Flagrante.
Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado de Marcos,
responda, de acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, aos itens a seguir.
A) Qual requerimento deverá ser formulado, de imediato, em busca da liberdade de Marcos
e sob qual fundamento? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Oferecida denúncia na forma do indiciamento, qual argumento de direito material
poderá ser apresentado pela defesa para questionar a capitulação delitiva constante da
nota de culpa, em busca de uma punição mais branda? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO
A) A defesa de Marcos deverá formular requerimento de relaxamento da prisão, tendo em vista
que não havia situação de flagrante a justificar a formalização do Auto de Prisão em Flagrante.
Narra o enunciado que, de fato, Marcos, mediante grave ameaça, inclusive com emprego de
simulacro de arma de fogo, subtraiu coisas alheias móveis de Diego e Julio, logo praticou dois
crimes de roubo.
As vítimas reconheceram o acusado, de modo que há justa causa para o oferecimento de
denúncia. Todavia, não havia situação de flagrante a justificar a prisão do acusado. Isso porque
o reconhecimento e prisão de Marcos ocorreram mais de 07 horas após o fato, sendo certo que
não houve perseguição e nem com o agente foram encontrados instrumentos ou produtos do
crime. Dessa forma, nenhuma das situações previstas no Art. 302 do Código de Processo Penal
restou configurada. Em sendo a prisão ilegal, o requerimento a ser formulado é de relaxamento
da prisão. Insuficiente, no caso, o examinando apresentar requerimento de liberdade provisória.
Primeiro porque, em sendo a prisão ilegal, sequer deveriam ser analisados os pressupostos dos
Artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal nesse momento. Além disso, a princípio, não
seria caso de reconhecimento de ausência dos motivos da preventiva, já que foi praticado crime
com circunstâncias graves e o agente é triplamente reincidente.
B) O equívoco a ser alegado em relação à capitulação delitiva refere-se ao concurso de crimes.
Sem dúvidas, confirmados os fatos, houve crime de roubo, já que foram subtraídas coisas alheias
móveis e houve emprego de grave ameaça, ainda que apenas através de palavras de ordem e
emprego de simulacro de arma de fogo. Da mesma forma, dois foram os crimes patrimoniais
praticados. Isso porque dois patrimônios foram atingidos e presente o elemento subjetivo, tendo
em vista que Marcos sabia que estava subtraindo pertences de duas pessoas diversas. Todavia,
com uma só ação, mediante uma ameaça, foram subtraídos bens de dois patrimônios diferentes.
Assim, deverá ser reconhecido o concurso formal de delitos, aplicando-se a regra da
exasperação da pena, e não o concurso material, com aplicação do cúmulo material de sanções.
DISTRIBUIÇÃO DE PONTOS
ITEM PONTUAÇÃO
A) O requerimento a ser formulado é de relaxamento da prisão (0,35), tendo em vista
que não está presente nenhuma das situações de flagrante elencadas no Art. 302 do 0,00/0,30/0,35/0,65
CPP (0,30).
B) O argumento é que houve concurso formal de crimes (0,35), tendo em vista que,
0,00/0,15/0,25/0,35/
com uma só ação, foram praticados dois delitos (0,15), nos termos do Art. 70 do CP
0,45/ 0,50/0,60
(0,10).

18) (QUESTÃO 02 – XXVII EXAME)


Em cumprimento de mandado de busca e apreensão, o oficial de justiça Jorge compareceu ao
local de trabalho de Lucas, sendo encontradas, no interior do imóvel, duas armas de fogo de
calibre .38, calibre esse considerado de uso permitido, devidamente municiadas, ambas com
numeração suprimida. Em razão disso, Lucas foi preso em flagrante e denunciado pela prática
de dois crimes previstos no Art. 16, caput, da Lei 10.826/2003, em concurso material, sendo
narrado que “Lucas, de forma livre e consciente, guardava, em seu local de trabalho, duas armas
de fogo de calibre restrito, devidamente municiadas”. Após a instrução, em que os fatos foram
confirmados, foi juntado o laudo confirmando o calibre .38 das armas de fogo, a capacidade de
efetuar disparos, bem como que ambas tinham a numeração suprimida. As partes apresentaram
alegações finais, e o magistrado, em sentença, considerando o teor do laudo, condenou Lucas
pela prática de dois crimes previstos no Art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/2003,
em concurso formal.
Intimada a defesa técnica da sentença condenatória, responda, na condição de
advogado(a) de Lucas, aos itens a seguir.
A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em busca da desconstituição
da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Reconhecida a validade da sentença em segundo grau, qual o argumento de direito
material a ser apresentado para questionar o mérito da sentença condenatória e,
consequentemente, a pena aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)
GABARITO COMENTADO
A) O argumento de direito processual a ser apresentado é o de que houve violação ao princípio
da correlação, o que gera a nulidade da sentença por violação ao princípio da ampla defesa e
ao princípio do contraditório. Isso porque a denúncia narrou que Lucas guardava, em seu local
de trabalho, duas armas de fogo de calibre restrito.
Sem que houvesse aditamento da denúncia, o magistrado condenou o réu pela prática de dois
crimes de posse de arma de fogo de numeração suprimida, previsto no Art. 16, parágrafo único,
inciso IV, da Lei 10.826/03. Apesar do crime imputado na denúncia e o reconhecido na sentença
estarem previsto no mesmo dispositivo legal, eles não se confundem e a narrativa dos fatos é
diferente. O réu somente se defendeu sobre as armas apreendidas como sendo de uso restrito,
não podendo, então, o magistrado modificar os fatos para dar nova capitulação jurídica, nos
termos do Art. 384 do CPP. Se não houvesse alteração dos fatos, poderia o juiz aplicar o Art.
383 do CPP, mas não foi isso que ocorreu na hipótese narrada. Dessa forma, deve ser
reconhecida a nulidade da sentença.
B) Em busca de questionar o mérito da decisão, o advogado deveria argumentar que a conduta
de Lucas de guardar, em seu local de trabalho, duas armas de fogo com numeração suprimida
configura crime único previsto no Art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/03 e não dois
crimes autônomos, seja em concurso material ou formal. As armas estavam sendo guardadas
em um mesmo contexto, logo a violação ao bem jurídico protegido foi única, podendo, porém, a
quantidade de armas ser considerada no momento da aplicação da pena.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS:


ITEM PONTUAÇÃO
A) Houve violação ao princípio da correlação OU não houve aditamento dos fatos
narrados na denúncia, não podendo o magistrado alterá-los (0,40), nos termos do 0,00/0,15/0,25/0,40/
Art. 384 do CPP (0,10), o que representa violação ao princípio da ampla defesa OU 0,50/0,55/0,65
contraditório (0,15)
B) Houve crime único OU Não houve qualquer espécie de concurso de delitos (0,50),
tendo em vista que as armas de fogo foram apreendidas em um mesmo contexto 0,00/0,10/0,50/0,60
(0,10)
19) (QUESTÃO 03 – XXX EXAME)
Eduardo foi preso em flagrante no momento em que praticava um crime de roubo simples, no
bairro de Moema. Ainda na unidade policial, compareceram quatro outras vítimas, todas
narrando que tiveram seus patrimônios lesados por Eduardo naquela mesma data, com intervalo
de cerca de 30 minutos entre cada fato, no bairro de Moema, São Paulo.
As cinco vítimas descreveram que Eduardo, simulando portar arma de fogo, anunciava o assalto
e subtraía os bens, empreendendo fuga em uma bicicleta. Eduardo foi denunciado pela prática
do crime do Art. 157, caput, por cinco vezes, na forma do Art. 69, ambos do Código Penal, e, em
sede de audiência, as vítimas confirmaram a versão fornecida em sede policial.
Assistido por seu advogado Pedro, Eduardo confessou os crimes, esclarecendo que pretendia
subtrair bens de seis vítimas para conseguir dinheiro suficiente para comprar uma motocicleta.
Disse, ainda, que apenas simulou portar arma de fogo, mas não utilizou efetivamente material
bélico ou simulacro de arma. O juiz, no momento da sentença, condenou o réu nos termos da
denúncia, sendo aplicada a pena mínima de 04 anos para cada um dos delitos, totalizando 20
anos de pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime inicial fechado, além da multa. Ao
ser intimado do teor da sentença, pessoalmente, já que se encontrava preso, Eduardo tomou
conhecimento que Pedro havia falecido, mas que foram apresentadas alegações finais pela
Defensoria Pública por determinação do magistrado logo em seguida à informação do
falecimento do patrono. A família de Eduardo, então, procura você, na condição de advogado(a),
para defendê-lo.
Considerando apenas as informações narradas, responda, na condição de advogado(a)
de Eduardo, constituído para apresentação de apelação, aos itens a seguir.
A) Existe argumento de direito processual, em sede de recurso, a ser apresentado para
desconstituir a sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Diante da confirmação dos fatos pelo réu, qual argumento de direito material poderá
ser apresentado, em sede de apelação, em busca da redução da sanção penal aplicada?
Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.
GABARITO COMENTADO
A questão exige do examinando conhecimentos sobre o tema concurso de crimes, além dos
direitos básicos dos acusados.
Narra o enunciado que Eduardo teria praticado cinco crimes de roubo, contra vítimas diferentes,
todos no bairro de Moema, com curto intervalo de tempo entre os fatos, com o mesmo modo de
agir, sendo seu objetivo obter dinheiro suficiente para a compra de uma motocicleta.
A) O argumento a ser apresentado, em sede de recurso, para desconstituir a sentença
condenatória, é o de que haveria violação ao princípio da ampla defesa, em sua vertente de
defesa técnica, tendo em vista que as alegações finais foram apresentadas pela Defensoria
Pública, não sendo o acusado intimado para, querendo, constituir novo patrono. De acordo com
o que consta do enunciado, durante a instrução processual, Eduardo foi assistido por Pedro,
advogado por ele constituído. Ocorre que, ao tomar conhecimento de que Pedro teria falecido,
de imediato o magistrado encaminhou os autos à Defensoria Pública para apresentação de
alegações finais, o que foi incorreto, já que o réu deveria ter sido intimado pessoalmente, pois
estava preso, para esclarecer se teria interesse em ser assistido pela Defensoria ou se pretendia
constituir novo advogado. Ao retirar esse direito do réu, o magistrado violou direito do acusado e
o princípio da ampla defesa.
B) Em sede de apelação, poderia ser buscado o reconhecimento da continuidade delitiva, o que
geraria redução da sanção penal aplicada. De acordo com o que consta do enunciado, de fato
foram praticados cinco crimes de roubo. Mesmo sem emprego de arma de fogo ou simulacro de
arma de fogo, houve grave ameaça na subtração dos bens de cinco vítimas diferentes, logo cinco
patrimônios foram atingidos e cinco crimes autônomos foram praticados. Ainda que Eduardo
tenha confessado os fatos, a pena mínima foi aplicada, não cabendo redução com fundamento
na atenuante do Art. 65, III, d, do CP, nos termos da Súmula 231 do STJ. Todavia, o magistrado
reconheceu o concurso material de crimes e somou a pena aplicada para cada um dos delitos.
De acordo com o Art. 71 do CP, a pena de apenas um dos crimes será aplicada e aumentada de
1/6 a 2/3 quando o agente, mediante mais de uma ação, pratica dois ou mais crimes da mesma
espécie, nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução, sendo os subsequentes
continuação do primeiro. Todas as exigências legais foram preenchidas. Os delitos foram
praticados no mesmo bairro, com intervalo de 30 minutos entre eles, sempre com o mesmo modo
de execução. A intenção do agente sempre foi praticar vários crimes, um em continuidade do
outro, para obter dinheiro suficiente para comprar uma motocicleta. Assim, ao invés do cúmulo
material, deveria o magistrado ter aumentado a pena de um dos delitos (04 anos) em 1/6 a 2/3,
ou, até mesmo, aplicar a previsão do Art. 71, parágrafo único, do CP.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS:


ITEM PONTUAÇÃO
A) Sim. Tendo em vista que Eduardo deveria ter sido intimado para manifestar seu
interesse em constituir novo advogado ou ser assistido pela Defensoria Pública, para
0,00/0,15/0,25/0,40/
oferecimento das alegações finais, em razão do falecimento do antigo patrono (0,40),
0,50/0,55/0,65
houve violação ao princípio da ampla defesa (0,15), nos termos do Art. 5º, inciso LV, da
CRFB (0,10).
B) Reconhecimento da continuidade delitiva (0,35), na forma do Art. 71 do CP (0,10), já
0,00/0,15/0,25/0,35/
que os crimes são da mesma espécie e foram praticados nas mesmas condições de
0,45/0,50/0,60
tempo, local e modo de execução (0,15).

20) (QUESTÃO 4 - XXIX EXAME)


Em processo no qual se imputava a Antônio a prática do crime de constituição de milícia privada,
foi designada audiência de instrução e julgamento para oitiva das testemunhas arroladas pela
acusação e pela defesa. No dia da audiência, as testemunhas de acusação não compareceram,
determinando o magistrado, por economia processual, a oitiva das testemunhas de defesa
presentes, apesar de o advogado de Antônio se insurgir contra esse fato. Na ocasião, foram
ouvidas três testemunhas de defesa, dentre as quais Pablo, que prestou declarações falsas para
auxiliar o colega nesse processo criminal. Identificada sua conduta, porém, houve extração de
peças ao Ministério Público, que, em 09 de abril de 2019, ofereceu denúncia em face de Pablo,
imputando-lhe a prática do crime de falso testemunho na forma majorada. No processo de
Antônio, foi designada nova audiência de instrução e julgamento, ocasião em que foram ouvidas
as testemunhas de acusação; novamente, Pablo, a seu pedido, prestou declarações,
confirmando que havia mentido na audiência anterior, mas que agora contava a verdade, o que
veio a prejudicar a própria defesa do réu. Com base nas declarações das testemunhas de
acusação e nas novas declarações de Pablo, Antônio veio a ser condenado. Pablo, por sua vez,
em seu processo pelo crime de falso testemunho, também veio a ser condenado, reconhecendo
o magistrado a atenuante do Art. 65, inciso III, alínea b, do Código Penal. Considerando as
informações narradas, responda, na condição de advogado(a) de Antônio e Pablo.
A) Qual argumento de direito processual poderá ser apresentado por você para
desconstituir a sentença condenatória do réu? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Qual o argumento de direito material a ser apresentado pela defesa técnica de Pablo
para questionar a sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,60)
Obs.: o(a) examinando(a) deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal
não confere pontuação.

GABARITO COMENTADO
A) O advogado de Antônio poderá buscar o reconhecimento da nulidade da sentença
condenatória em razão da violação ao devido processo legal. Isso porque, de acordo com o Art.
400 do CPP, na audiência, primeiro devem ser ouvidas as testemunhas da acusação. Somente
após a produção de provas pela acusação poderiam ser ouvidas as testemunhas de defesa e
interrogado o acusado. Violando a ordem da oitiva das testemunhas, tendo a defesa se insurgido
contra tal inversão e ficando claro o prejuízo com a condenação e alteração dos fatos por parte
de Pablo, deverá ser reconhecida a nulidade do processo desde a primeira audiência de
instrução e julgamento.
B) A conduta de Pablo de, em audiência de instrução e julgamento de processo criminal, fazer
afirmação falsa como testemunha, a princípio, configura o crime realmente imputado: Art. 342, §
1º, do CP. Ocorre que, até como forma de incentivar a retratação e minorar os prejuízos causados
em processos, previu o legislador, no Art.342, § 2º, do CP, que se o agente se retrata ou declara
a verdade antes da sentença ser proferida no processo em que ocorreu o ilícito, o fato deixa de
ser punível. No caso, Pablo se retratou, narrou a verdade, antes mesmo de ser proferida a
sentença condenatória de Antônio. Dessa forma, não poderia o magistrado reconhecer que tal
retratação funcionaria apenas como atenuante do Art. 65, inciso III, alínea b, do CP, ou
arrependimento posterior, devendo reconhecer a extinção da punibilidade do agente, já que o
fato deixa de ser punível.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO
A) Houve inversão na ordem de oitiva das testemunhas OU que as testemunhas de 0,00/0,15/0,25/0,40/
defesa não poderiam ter sido ouvidas antes das testemunhas de acusação (0,40),
0,50/0,55/0,65
havendo violação ao devido processo legal OU violação à ampla defesa OU
violação ao contraditório (0,15), conforme o Art. 564, inciso IV, do CPP OU Art. 400
do CPP (0,10).
B) Houve retrataçãotes da sentença ser proferida no processo de Antônio (0,35), 0,00/0,15/0,25/0,35/
deixando o fato de ser punível (0,15), nos termos do Art. 342, § 2º, do CP (0,10). 0,45/0,50/0,60

21) (QUESTÃO 4 – EXAME 2010/01)

Jânio foi denunciado pela prática de roubo tentado (Código Penal, art. 157, caput, c/c art. 14, II),
cometido em dezembro de 2009, tendo sido demonstrado, durante a instrução processual, que
o réu praticara, de fato, delito de dano (Código Penal, art. 163, caput). Considerando essa
situação hipotética, responda, de forma fundamentada, às seguintes indagações.

A) Em face da nova definição jurídica do fato, que procedimento deve ser adotado pelo
juiz?

B) Caso a nova capitulação jurídica do fato fosse verificada apenas em segunda instância,
seria possível a aplicação do instituto da emendatio libelli?

GABARITO COMENTADO

No caso, o juiz deverá remeter os autos para o juizado especial competente. Isso porque o delito
de dano (CP, art. 163, caput) é considerado de menor potencial ofensivo (Lei n.º 9.099/1995, art.
61), razão pela qual é aplicável, então, o comando do § 2.º do art. 383 do CPP.

Não existe qualquer impedimento legal para a aplicação do instituto da emendatio libelli em
segunda instância (CPP, art. 383), pois não há que se falar em surpresa para as partes, na
medida em que não há alteração do contexto fático narrado na inicial acusatória (Nesse sentido:
Fernando Capez. Curso de processo penal. 16 ed., São Paulo: Saraiva, p. 466).

22) (QUESTÃO 02 – XXVII EXAME)


Em cumprimento de mandado de busca e apreensão, o oficial de justiça Jorge compareceu ao
local de trabalho de Lucas, sendo encontradas, no interior do imóvel, duas armas de fogo de
calibre .38, calibre esse considerado de uso permitido, devidamente municiadas, ambas com
numeração suprimida. Em razão disso, Lucas foi preso em flagrante e denunciado pela prática
de dois crimes previstos no Art. 16, caput, da Lei 10.826/2003, em concurso material, sendo
narrado que “Lucas, de forma livre e consciente, guardava, em seu local de trabalho, duas armas
de fogo de calibre restrito, devidamente municiadas”.
Após a instrução, em que os fatos foram confirmados, foi juntado o laudo confirmando o calibre
.38 das armas de fogo, a capacidade de efetuar disparos, bem como que ambas tinham a
numeração suprimida. As partes apresentaram alegações finais, e o magistrado, em sentença,
considerando o teor do laudo, condenou Lucas pela prática de dois crimes previstos no Art. 16,
parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/2003, em concurso formal.
Intimada a defesa técnica da sentença condenatória, responda, na condição de
advogado(a) de Lucas, aos itens a seguir.
A) Qual o argumento de direito processual a ser apresentado em busca da desconstituição
da sentença condenatória? Justifique. (Valor: 0,65)
B) Reconhecida a validade da sentença em segundo grau, qual o argumento de direito
material a ser apresentado para questionar o mérito da sentença condenatória e,
consequentemente, a pena aplicada? Justifique. (Valor: 0,60)

GABARITO COMENTADO
A) O argumento de direito processual a ser apresentado é o de que houve violação ao princípio
da correlação, o que gera a nulidade da sentença por violação ao princípio da ampla defesa e
ao princípio do contraditório. Isso porque a denúncia narrou que Lucas guardava, em seu local
de trabalho, duas armas de fogo de calibre restrito.
Sem que houvesse aditamento da denúncia, o magistrado condenou o réu pela prática de dois
crimes de posse de arma de fogo de numeração suprimida, previsto no Art. 16, parágrafo único,
inciso IV, da Lei 10.826/03. Apesar do crime imputado na denúncia e o reconhecido na sentença
estarem previsto no mesmo dispositivo legal, eles não se confundem e a narrativa dos fatos é
diferente. O réu somente se defendeu sobre as armas apreendidas como sendo de uso restrito,
não podendo, então, o magistrado modificar os fatos para dar nova capitulação jurídica, nos
termos do Art. 384 do CPP. Se não houvesse alteração dos fatos, poderia o juiz aplicar o Art.
383 do CPP, mas não foi isso que ocorreu na hipótese narrada. Dessa forma, deve ser
reconhecida a nulidade da sentença.
B) Em busca de questionar o mérito da decisão, o advogado deveria argumentar que a conduta
de Lucas de guardar, em seu local de trabalho, duas armas de fogo com numeração suprimida
configura crime único previsto no Art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/03 e não dois
crimes autônomos, seja em concurso material ou formal. As armas estavam sendo guardadas
em um mesmo contexto, logo a violação ao bem jurídico protegido foi única, podendo, porém, a
quantidade de armas ser considerada no momento da aplicação da pena.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS:


ITEM PONTUAÇÃO
A) Houve violação ao princípio da correlação OU não houve aditamento dos fatos
narrados na denúncia, não podendo o magistrado alterá-los (0,40), nos termos do 0,00/0,15/0,25/0,40/
Art. 384 do CPP (0,10), o que representa violação ao princípio da ampla defesa OU 0,50/0,55/0,65
contraditório (0,15)
B) Houve crime único OU Não houve qualquer espécie de concurso de delitos (0,50),
tendo em vista que as armas de fogo foram apreendidas em um mesmo contexto 0,00/0,10/0,50/0,60
(0,10)

23) (QUESTÃO 1 – XX EXAME, PROVA REAPLICADA EM PORTO VELHO/RO)

Jorge, com 21 anos de idade, reincidente, natural de São Gonçalo/RJ, entrou em uma briga com
seus pais, razão pela qual foi morar na casa de sua tia Marta, irmã de seu pai, na cidade de
Maricá/RJ, já que esta tinha apenas 40 anos e “o entenderia melhor”. Após 06 meses residindo
no mesmo local que sua tia, Jorge subtraiu o carro de Marta, levando-o para uma favela em
Niterói, onde pretendia morar no futuro. No começo, Marta não desconfiou da autoria, porém
após alguns dias, teve certeza de que o autor do crime era seu sobrinho, mas nada fez para vê-
lo responsabilizado criminalmente, em razão do afeto que tinha por ele. Apenas, então,
comunicou à seguradora que seu veículo fora furtado. Jorge, 01 ano após esses fatos, estava
na direção do veículo que havia subtraído quando foi abordado por policiais militares que,
constatando que aquele bem era produto de crime pretérito, realizaram sua prisão em flagrante.
Jorge foi denunciado pela prática do crime de receptação, mas, no curso da instrução, foi
descoberto que, na verdade, o acusado era o autor do crime de furto. O Ministério Público aditou
a denúncia para adequá-la às novas descobertas e, após manifestação da Defensoria Pública,
foi o aditamento recebido. Não houve requerimento de novas provas. Jorge o(a) procura para,
na condição de advogado(a), apresentar as Alegações Finais.

Considerando as informações extraídas da hipótese, responda aos itens a seguir.


A) Qual a principal tese defensiva a ser formulada nas Alegações Finais para evitar a
condenação de Jorge? (Valor: 0,65)

B) Na condição de advogado(a) do acusado, o que você alegaria, no campo processual,


caso o juiz viesse a condenar Jorge, após o aditamento, de acordo com a imputação
original de receptação? (Valor: 0,60)

Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não
confere pontuação.

GABARITO COMENTADO

A) O enunciado narra a prática de um crime de furto simples consumado, praticado por Jorge
contra sua tia Marta, com quem ele coabitava. Diante dessa relação de coabitação e parentesco,
a ação penal pela prática de tal delito tem natureza de ação pública condicionada à
representação. Isso porque o Art. 182, inciso III, do Código Penal prevê que somente se procede
mediante representação a ação penal pela prática de crime contra o patrimônio em desfavor de
tio, com quem o agente coabita. Não houve violência ou grave ameaça e a vítima não era maior
de 60 anos, logo inaplicável o Art. 183 do Código Penal. Sendo a ação condicionada à
representação, e não tendo ocorrido no prazo de 06 meses, ocorreu a decadência, de modo que
a punibilidade de Jorge deve ser extinta (Art. 107, inciso IV, do Código Penal).

B) Não poderia o magistrado condenar o denunciado nos termos da imputação original, pois tal
conduta violaria os princípios da ampla defesa e do contraditório, além, do princípio da
correlação. Ademais, de acordo com Art. 384, §4º, do Código de Processo Penal, o juiz ficará
adstrito aos termos do aditamento.

ITEM PONTUAÇÃO

A) Extinção da punibilidade pela decadência (0,20), pois a ação penal no caso de


0,00/0,20/0,30/
furto praticado por sobrinho contra tio com quem coabite é pública condicionada à
0,45/0,55/0,65
representação (0,35), na forma do Art. 182, inciso III, do CP (0,10).

B) Deveria ser alegada a impossibilidade de condenação na imputação originária, 0,00 / 0,60


pois o juiz está adstrito aos termos do aditamento (Art. 384, §4º, do CPP) OU porque
não foram observados os princípios da ampla defesa e do contraditório OU houve
violação ao princípio da correlação (0,60).

24) (QUESTÃO 3 - VIII EXAME)

João e José foram denunciados pela prática da conduta descrita no art. 316 do CP (concussão).
Durante a instrução, percebeu-se que os fatos narrados na denúncia não corresponderiam àquilo
que efetivamente teria ocorrido, razão pela qual, ao cabo da instrução criminal e após a
respectiva apresentação de memoriais pelas partes, apurou-se que a conduta típica adequada
seria aquela descrita no art. 317 do CP (corrupção passiva). O magistrado, então, fez remessa
dos autos ao Ministério Público para fins de aditamento da denúncia, com a nova capitulação
dos fatos. Nesse sentido, atento(a) ao caso narrado e considerando apenas as informações
contidas no texto, responda fundamentadamente, aos itens a seguir.

A) Estamos diante de hipótese de mutatio libelli ou de emendatio libelli? Qual dispositivo


legal deve ser aplicado? (Valor: 0,50)

B) Por que o próprio juiz, na sentença, não poderia dar a nova capitulação e, com base
nela, condenar os réus? (Valor: 0,50)

C) É possível que o Tribunal de Justiça de determinado estado da federação, ao analisar


recurso de apelação, proceda à mutatio libelli? (Valor: 0,25)

GABARITO COMENTADO

Para garantir pontuação à questão, o examinando deverá, no item “A”, responder, nos termos do
questionado, que a hipótese tratada é de mutatio libelli, instituto descrito no art. 384 do CPP.

Não serão admitidas respostas que tragam emendatio libelli, tendo em vista que o enunciado da
questão é claro ao dispor que “os fatos narrados na denúncia não corresponderiam àquilo que
efetivamente teria ocorrido”. Tal expressão, por si só, ainda afastaria a incidência do disposto no
art. 383, do CPP, uma vez que aquele dispositivo legal traz explicitamente restrição à sua
utilização para hipóteses em que não ocorra modificação na “descrição do fato contida na
denúncia ou queixa”.
Quanto ao item “B”, para garantir a pontuação pertinente, o examinando deverá responder que
o juiz não poderia, na sentença, dar nova capitulação (e com base nela condenar os réus) porque
deve obediência aos princípios da imparcialidade e inércia da jurisdição.

De maneira alternativa e com o fim de privilegiar a demonstração de conhecimento jurídico, será


admitida resposta no sentido de que tal conduta, por parte do magistrado, feriria o
sistema/princípio acusatório ou, ainda, no sentido de que tal conduta feriria o princípio da
correlação/congruência entre acusação e sentença.

Ressalte-se que no tocante ao item “B” a questão solicita análise acerca da conduta do
magistrado que, na sentença, daria nova capitulação aos fatos em decorrência de elemento ou
circunstância da infração penal não contida na acusação.

Nesse sentido, cabe destacar que à luz do sistema acusatório adotado pela Constituição da
República Federativa do Brasil, o julgador deve ser imparcial e, por isso, suas decisões devem
estar balizadas pelo contexto fático descrito na peça acusatória (princípio da correlação entre
acusação e sentença).

Assim, caso o magistrado viesse a condenar os réus com fundamento em fatos não narrados na
denúncia – tal como descrito no enunciado - não só estaria substituindo-se ao acusador (a quem
pertence a atribuição de determinar quais fatos serão imputados aos acusados), mas também
estaria violando as garantias do contraditório e ampla defesa dos réus, uma vez que lhes teria
subtraído a possibilidade de debater as eventuais provas de tais fatos.

Por fim, para garantir a pontuação relativa ao item “C”, o examinando deverá responder que NÃO
é possível que o Tribunal de Justiça, ao analisar o recurso de apelação, proceda à mutatio libelli
pois, nos termos do verbete 453 da Súmula do STF, verbis: “não se aplicam à segunda instância
o art. 384 (...).”.

Tal conclusão, no item “C”, decorre do reconhecimento de que, advindo inovação no contexto
fático que envolve a conduta imputada ao réu no curso da instrução, não pode haver julgamento
com base nesse novo contexto fático antes que as partes possam exercer o contraditório em sua
plenitude.

Nessa esteira, cabe destacar que a sede própria do contraditório acerca dos fatos e das provas
é o primeiro grau de jurisdição, sob pena de supressão de instância. Tomadas essas duas
premissas, alcança-se a conclusão de que eventual modificação da definição jurídica do fato
decorrente de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação não pode
ser realizada diretamente pelo segundo grau de jurisdição.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO

A) A hipótese é de mutatio libelli (0,35), instituto descrito no art. 384 do CPP (0,15). 0,00/0,15/

0,35/0,50

B) Porque deve obediência aos princípios da imparcialidade e inércia da jurisdição


OU Porque tal conduta feriria o sistema/princípio acusatório. OU Porque tal conduta 0,00/0,50
feriria o princípio da correlação/congruência entre acusação e sentença.

C) Não, nos termos do verbete 453 da Súmula do STF (0,25). 0,00/0,25

OU Não, pois nesse caso haveria supressão de instância.

25) (QUESTÃO 3 – 2009-03 EXAME)

Júlio foi denunciado pela prática do delito de furto cometido em fevereiro de 2010. Encerrada a
instrução probatória, constatou-se, pelas provas testemunhais produzidas pela acusação, que
Júlio praticara roubo, dado o emprego de grave ameaça contra a vítima.

Em face dessa situação hipotética, responda, de forma fundamentada, às seguintes


indagações.

A) Dada a nova definição jurídica do fato, que procedimento deve ser adotado pela
autoridade judicial, sem que se fira o princípio da ampla defesa?

B) O princípio da correlação é aplicável ao caso concreto?

C) Caso Júlio tivesse cometido crime de ação penal exclusivamente privada, dada a nova
definição jurídica do fato narrado na queixa após o fim da instrução probatória, seria
aplicável o instituto da mutatio libelli?

GABARITO COMENTADO

A primeira indagação deve ser respondida com base no art. 384 do CPP, que assim dispõe:
“Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em
consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não
contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5
(cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública,
reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente. (...) § 4.º Havendo aditamento,
cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na
sentença, adstrito aos termos do aditamento.” (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008)

Dessa forma, deverá o juiz dar aplicabilidade ao comando do art. 384, e parágrafos, do CPP,
para encaminhar os autos ao Ministério Público, a fim de que haja o aditamento da denúncia,
propiciando ao réu a oportunidade de se defender da nova capitulação do fato.

No que se refere à segunda indagação, deve-se responder que, segundo o princípio da


correlação, deve haver uma correlação entre o fato descrito na denúncia ou queixa e o fato pelo
qual o réu é o condenado. Aplica-se no processo em questão para explicar que o acusado não
se defende da capitulação legal dada ao crime na denúncia, mas sim dos fatos narrados na
referida peça acusatória. (Nesse sentido: Fernando Capez. Curso de processo penal.16 ed., São
Paulo: Saraiva, p. 465)

A resposta à terceira indagação deve ser negativa. O procedimento previsto no art. 384 do
Código de Processo Penal somente se aplica na hipótese de ação penal pública e ação penal
privada subsidiária da pública, sendo inadmissível o juiz determinar abertura de vista para o
Ministério Público aditar a queixa e ampliar a imputação, na ação penal exclusivamente privada,
conforme clara redação do dispositivo:

“(...) o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em
virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública (...).”

26) (QUESTÃO 2 – XIV EXAME)


Gustavo está sendo regularmente processado, perante o Tribunal do Júri da Comarca de Niterói-
RJ, pela prática do crime de homicídio simples, conexo ao delito de sequestro e cárcere privado.
Os jurados consideraram-no inocente em relação ao delito de homicídio, mas culpado em relação
ao delito de sequestro e cárcere privado. O juiz presidente, então, proferiu a respectiva sentença.
Irresignado, o Ministério Público interpôs apelação, sustentando que a decisão dos jurados fora
manifestamente contrária à prova dos autos. A defesa, de igual modo, apelou, objetivando
também a absolvição em relação ao delito de sequestro e cárcere privado. O Tribunal de Justiça,
no julgamento, negou provimento aos apelos, mas determinou a anulação do processo (desde o
ato viciado, inclusive) com base no Art. 564, III, i, do CPP, porque restou verificado que, para a
constituição do Júri, somente estavam presentes 14 jurados. Nesse sentido, tendo como base
apenas as informações contidas no enunciado, responda justificadamente às questões a
seguir.

A) A nulidade apresentada pelo Tribunal é absoluta ou relativa? Dê o respectivo


fundamento legal. (Valor: 0,40)

B) A decisão do Tribunal de Justiça está correta? (Valor: 0,85)

Utilize os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

GABARITO COMENTADO

A questão objetiva extrair do examinando conhecimento acerca da teoria geral das nulidades no
Processo Penal. Nesse sentido, para garantir os pontos relativos à questão, o examinando deve,
na alternativa "A", indicar que a hipótese é de nulidade absoluta, nos termos do artigo 564, III,
alínea "i" c/c 572, ambos do CPP. Em relação à alternativa "B", o examinando deve lastrear sua
resposta no sentido de que não foi correta a atitude do Tribunal de Justiça. Isso porque, de
acordo com o Verbete 160 da Súmula do STF, o Tribunal de Justiça não pode acolher, contra o
réu, nulidade não aventada pela acusação em seu recurso. Assim agir significaria desrespeito
ao princípio da vedação a reformatio in pejus indireta.

O enunciado da questão foi claro ao informar que o recurso do Ministério Público não alegou
nenhuma nulidade. Destarte, levando em conta que o réu foi absolvido em relação ao delito de
homicídio, o reconhecimento de nulidade implicar-lhe-á em prejuízo.

Por fim, com a finalidade de privilegiar a demonstração de conhecimento jurídico, a Banca


convencionou aceitar também, no item “B”, o verbete 713 da Súmula do STF como fundamento
à impossibilidade de o Tribunal acolher, contra o réu, nulidade não aventada pela acusação em
seu recurso.
DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS
ITEM PONTUAÇÃO

A) Nulidade Absoluta (0,30), nos termos do artigo 564, III, alínea "i" c/c 572,
ambos do CPP (0,10). 0,00/0,30/0,40
Obs: A mera indicação de artigo não pontua.

B) Não foi correta a decisão do Tribunal de Justiça, pois o Tribunal não pode
acolher, contra o réu, nulidade não arguida pela acusação em seu recurso
(0,85). OU Não foi correta a decisão, nos termos do Verbete 160 ou 713
0,00/0,85
da Súmula do STF (0,85). OU Não foi correta a decisão, com base no princípio
que veda a reformatio in pejus indireta (0,85).

Obs.: A justificativa é essencial para a atribuição de pontos.

27) (QUESTÃO 2 – XI EXAME)

Daniel foi denunciado, processado e condenado pela prática do delito de roubo simples em sua
modalidade tentada. A pena fixada pelo magistrado foi de dois anos de reclusão em regime
aberto. Todavia, atento às particularidades do caso concreto, o referido magistrado concedeu-
lhe o benefício da suspensão condicional da execução da pena, sendo certo que, na sentença,
não fixou nenhuma condição. Somente a defesa interpôs recurso de apelação, pleiteando a
absolvição de Daniel com base na tese de negativa de autoria e, subsidiariamente, a substituição
do benefício concedido por uma pena restritiva de direitos. O Tribunal de Justiça, por sua vez,
no julgamento da apelação, de forma unânime, negou provimento aos dois pedidos da defesa e,
no acórdão, fixou as condições do sursis, haja vista o fato de que o magistrado a quo deixou de
fazê-lo na sentença condenatória. Nesse sentido, atento apenas às informações contidas no
texto, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.

A) Qual o recurso cabível contra a decisão do Tribunal de Justiça? (Valor: 0,55)

B) Qual deve ser a principal linha de argumentação no recurso? (Valor: 0,70)

A simples menção ou transcrição do dispositivo legal não pontua.

GABARITO COMENTADO

A) Cabível a interposição de recurso especial, com fulcro no Art. 105, III, a, da CRFB/88.
B) Deve ser salientado que não agiu corretamente o Tribunal de Justiça ao fixar as condições do
sursis, pois tal tarefa cabia ao juiz a quo e, como ele não o fez, bem como não houve impugnação
por parte do Ministério Público acerca de tal omissão, a atitude do Tribunal configura verdadeira
reformatio in pejus, vedada pelo Art. 617, do CPP.

28) (QUESTÃO 04 - XVIII EXAME)

John, primário e de bons antecedentes, foi denunciado pela prática do crime de tráfico de drogas.
Após a instrução, inclusive com realização do interrogatório, ocasião em que o acusado
confessou os fatos, John foi condenado, na forma do Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, à pena
de 1 ano e 08 meses de reclusão, a ser cumprido em regime inicial aberto. O advogado de John
interpôs o recurso cabível da sentença condenatória. Em julgamento pela Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça, a sentença foi integralmente mantida por maioria de votos. O
Desembargador revisor, por sua vez, votou no sentido de manter a pena de 01 ano e 08 meses
de reclusão, assim como o regime, mas foi favorável à substituição da pena privativa de liberdade
por duas restritivas de direitos, no que restou vencido. O advogado de John é intimado do
acórdão. Considerando a situação narrada, responda aos itens a seguir.

A) Qual medida processual, diferente de habeas corpus, deverá ser formulada pelo
advogado de John para combater a decisão da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça?
(Valor: 0,65)

B) Qual fundamento de direito material deverá ser apresentado para fazer prevalecer o
voto vencido? (Valor: 0,60)

GABARITO COMENTADO

A) A medida processual a ser adotada pelo advogado de John é a interposição de recurso de


Embargos Infringentes, na forma do Art. 609, parágrafo único, do CPP, considerando que a
decisão proferida em sede de Apelação não foi, em relação à substituição da pena, unânime.

B) Para fazer prevalecer o voto vencido, deverá o examinando demonstrar a possibilidade de ser
substituída a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista que foi
reconhecido que o acusado é primário, de bons antecedentes e que não se dedica ao crime e
nem integra organização criminosa. Em que pese o Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, vedar a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, o Supremo Tribunal Federal,
em sede de controle difuso de inconstitucionalidade, entendeu que tal vedação viola o princípio
da individualização da pena. Ademais, diante dessa decisão o Senado Federal editou a
Resolução nº 05, suspendendo a eficácia da parte da redação do Art. 33, § 4º, da Lei nº
11.343/06, que veda a substituição.

DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS


ITEM PONTUAÇÃO

A) A medida processual é de embargos infringentes (0,55), na forma do Art. 609, 0,00 / 0,55 / 0,65
parágrafo único, do CPP (0,10).
B) O fundamento seria a possibilidade de substituição da pena privativa de 0,00 / 0,60
liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista que o STF considerou
inconstitucional a vedação trazida pelo Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 OU porque
a vedação do Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, viola o princípio da individualização
da pena OU porque a Resolução 5 do Senado suspendeu a eficácia de parte da
redação do Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06. (0,60)

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