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Carlos Biasotti

Crime de Dano
(Doutrina e Jurisprudência)

2a. ed.

2022
São Paulo, Brasil
O Autor

Carlos Biasotti foi advogado criminalista, presidente da


Acrimesp (Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de
São Paulo) e membro efetivo de diversas entidades (OAB, AASP,
IASP, ADESG, UBE, IBCCrim, Sociedade Brasileira de
Criminologia, Associação Americana de Juristas, Academia Brasileira
de Direito Criminal, Academia Brasileira de Arte, Cultura e História,
etc.).

Premiado pelo Instituto dos Advogados de São Paulo, no


concurso O Melhor Arrazoado Forense, realizado em 1982, é autor de
Lições Práticas de Processo Penal, O Crime da Pedra, Tributo aos Advogados
Criminalistas, Advocacia Criminal (Teoria e Prática), Da Prova, Da Pena,
Direito Ambiental, O Cão na Literatura, etc., além de numerosos artigos
jurídicos publicados em jornais e revistas.

Juiz do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo


(nomeado pelo critério do quinto constitucional, classe dos
advogados), desde 30.8.1996, foi promovido, por merecimento, em
14.4.2004, ao cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça.

Condecorações e títulos honoríficos: Colar do Mérito


Judiciário (instituído e conferido pelo Poder Judiciário do Estado
de São Paulo); medalha cívica da Ordem dos Nobres Cavaleiros de
São Paulo; medalha cultural “ Brasil 500 anos”; medalha “ Prof. Dr.
Antonio Chaves”, etc.
Crime de Dano
(Doutrina e Jurisprudência)
Carlos Biasotti

Crime de Dano
(Doutrina e Jurisprudência)

2a. ed.

2022
São Paulo, Brasil
Índice

I. Duas Palavras...........................................................................11

II. Crime de Dano (art. 163 do Cód. Penal): Ementas


(Doutrina e Jurisprudência).....................................................13

III. Casos Especiais (Reprodução Integral do Voto).....................25


IV. O Crime de Dano (Publicação)...............................................75
Duas Palavras

“Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia”, reza o


Código Penal que configura o crime de dano (art. 163).
Os verbos do tipo, na lição de Damásio E. de
Jesus, significam:
I - destruir — demolir, desfazer o objeto material;
II - inutilizar — torná-lo imprestável, inútil, ainda
que parcialmente;
III - deteriorar — arruiná-lo, estragá-lo, causando-
-lhe modificação para pior(1).
Incorre, pois, no caso da lei o preso que
empreende fuga com dano do patrimônio público
(ainda que seja o amor da liberdade expressão
incoercível do espírito humano).

(1) Código Penal Anotado, 18a. ed., p. 622; Editora Saraiva.


12

Também comete o crime de dano o sujeito que,


em ato de cru vandalismo, picha prédio, inutilizando-
-lhe a pintura e deteriorando-o(2).
Mas, nos casos de insignificante a lesão ao bem
jurídico protegido e mínimo o grau de cesurabilidade da
conduta do agente, pode o Magistrado, com prudente
arbítrio, deixar de aplicar-lhe pena (e até mesmo pôr
termo à “persecutio criminis”). É que, nas ações humanas,
o Direito Penal somente deve intervir como providência
“ultima ratio”.
Eis a matéria deste fascículo, singelo compêndio de
votos que proferi na 2a. Instância da Justiça Criminal
do Estado de São Paulo. Dedico-lho, bondoso e gentil
leitor, com um fraterno e sincero abraço. Seja feliz!

O Autor

(2) “Pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação ou


monumento urbano” (art. 65 da Lei nº 9.605/98: Lei do Meio
Ambiente).
Pena — detenção, de três meses a um ano, e multa.
Ementário Forense
(Votos que, em matéria criminal, proferiu o Desembargador
Carlos Biasotti, do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo. Veja a íntegra dos votos no Portal do Tribunal de
Justiça: http://www.tjsp.jus.br).

• Crime de Dano
(Arts. 163 a 167 do Cód. Penal)

Voto nº 891

Apelação Criminal nº 1.094.683/4


Art. 163 do Cód. Penal

— Só a embriaguez acidental e completa elide a responsabilidade


penal, não a voluntária ou culposa (art. 28, nº II, do Cód. Penal).
— Satisfaz-se o tipo do art. 163 do Cód. Penal com o dolo genérico,
sendo de todo despiciendo o específico. “O dolo do dano está na
simples voluntariedade de o sujeito realizar uma conduta que subverte,
torna inútil ou deteriora o objeto material. O tipo não exige nenhum
outro elemento subjetivo além do dolo” (Damásio E. de Jesus, Código
Penal Anotado, 5a. ed., p. 525).
14

Voto nº 2458

Apelação Criminal nº 1.209.491/2


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal

— A confissão livre “é, sem contradição, a prova mais peremptória, aquela


que esclarece, convence e satisfaz, no mais alto grau, a consciência do Juiz:
omnium probationum maxima” (Cons. Vicente Alves de Paula Pessoa,
Código do Processo Criminal, 1882, p. 157).
— Expressão incoercível do instinto humano, o amor da liberdade
elide o caráter de ilicitude penal da fuga do preso, exceto se
empreendida mediante violência contra pessoa ou com dano do
patrimônio público (arts. 352 e 163 do Cód. Penal).
— Tratando-se de pena de curta duração, não é defeso ao Magistrado
conceder ao condenado reincidente o benefício do regime
semiaberto, se mais compatível com o critério de suficiência para
a reprovabilidade e prevenção de novas infrações (art. 33, § 2º, letra
c, do Cód. Penal).

Voto nº 2481

Apelação Criminal nº 1.214.009/1


Art. 155, “caput”, do Cód. Penal;
art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal

— Não há desmerecer o valor da palavra da vítima; ao revés, sua


condição de protagonista do evento delituoso é a que a credencia,
sobre todos, a discorrer das circunstâncias dele.
— Incorre na sanção do art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal o
sujeito que, mediante pontapés, quebra vidro de veículo policial,
pois com o seu ato danificou patrimônio público.
15

Voto nº 5215

Apelação Criminal nº 1.371.961/1


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 386, nº IV, do Cód. Proc. Penal

— A decisão que rejeita a conclusão do laudo, porque realizada


tardiamente a perícia, é incensurável, pois conta com previsão legal
(art. 182 do Cód. Proc. Penal) e tem base em fato de certeza
experimental: a precariedade e contingência de todas as coisas. O
tempo, afirmou o profundo Vieira, “tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo
digere, tudo acaba” (Sermões, 1959, t. IV, p. 289).
—“Sob pena de cometer possível erro judiciário, não pode o Juiz Criminal
proferir condenação sem certeza total da autoria e da culpabilidade”
(JTACrSP, vol. 54, p. 190).

Voto nº 3282

Recurso em Sentido Estrito nº 1.252.691/5


Art. 163, parág. único, ns. I e IV, do Cód. Penal;
art. 44 do Cód. Proc. Penal

— É princípio altamente reputado que não pode a pessoa jurídica


figurar no polo passivo da ação penal de iniciativa privada
promovida para apuração de responsabilidade pela prática do crime
de dano qualificado (art. 163, parág. único, do Cód. Penal).
— Cabe somente ao Estado (que não ao particular) a titularidade da
ação penal, em caso de dano qualificado com violência à pessoa ou
grave ameaça (art. 163, parág. único, nº I, do Cód. Penal).
16

Voto nº 3412

Apelação Criminal nº 1.279.311/5


Art. 163, nº III, do Cód. Penal;
art. 28 do Cód. Penal

— O crime de dano não requer dolo específico, senão genérico, que se


resume à simples voluntariedade de inutilizar ou destruir coisa alheia
(art. 163 do Cód. Penal).
— Tratando-se de bem de uso comum da coletividade, não é lícito ao
particular, ainda nos assomos de cólera e sob o efeito de embriaguez
voluntária, danificar aparelho telefônico (“orelhão”). A preservação
do patrimônio público deve ser apanágio de todo cidadão.
— A substituição de pena corporal por multa é desaconselhável se não
atende aos princípios que lhe devem reger a aplicação: necessidade e
suficiência da reprovação e prevenção do crime e edificação das
pessoas na observância da lei.
17

Voto nº 3963

Apelação Criminal nº 1.316.357/7


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 33, § 2º, alínea c, do Cód. Penal

— A confissão judicial, por seu valor absoluto – visto se presume feita


espontaneamente –, basta à fundamentação do edito condenatório.
— Expressão incoercível do instinto humano, o amor da liberdade
elide o caráter de ilicitude penal da fuga do preso, exceto se
empreendida mediante violência contra pessoa ou com dano do
patrimônio público (arts. 352 e 163 do Cód. Penal).
— Tratando-se de pena de curta duração, não é defeso ao Magistrado
conceder ao condenado reincidente o benefício do regime
semiaberto, se mais compatível com o critério de suficiência para a
reprovabilidade e prevenção de novas infrações (art. 33, § 2º, alínea
c, do Cód. Penal).

Voto nº 4890

Apelação Criminal nº 1.369.073/5


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 44 do Cód. Penal

— Comete o crime de dano e, pois, sujeita-se às penas da lei (art. 163


do Cód. Penal), o indivíduo que, em ato de cru vandalismo, picha
prédio público, inutilizando-lhe a pintura e deteriorando-o.
—“Não exclui a imputabilidade a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo
álcool, ou substância de efeitos análogos” (Damásio E. de Jesus, Código
Penal Anotado, 9a. ed., p. 117).
18

Voto nº 5148

Apelação Criminal nº 1.413.907/8


Arts. 157, § 2º, nº I, e 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 203 do Cód. Proc. Penal

— Tem-se na conta de baldia e rebarbativa a crítica de que o


depoimento policial é geralmente suspeito de parcialidade. Seu
valor, ao contrário, é igual ao de toda a testemunha que, sob palavra
de honra, promete dizer a verdade do que sabe (art. 203 do Cód.
Proc. Penal). O falso testemunho (crime definido no art. 342 do Cód.
Penal) não se presume: requer prova cabal e convincente, a cargo de
quem o alegar.
— Nos casos de roubo, é a palavra da vítima a principal e mais segura
fonte de informação do Magistrado, pois manteve contacto com o
seu autor e não se propõe senão submetê-lo à Justiça. Pelo que,
exceto lhe prove o réu que mentiu ou se equivocou, suas declarações
bastam a acreditar um decreto condenatório.
— O crime de dano não requer dolo específico, senão genérico, que se
resume à simples voluntariedade de inutilizar ou destruir coisa alheia
(art. 163 do Cód. Penal).
— O organismo social, sob pena de arriscar-se à própria ruína, deve
segregar aqueles que, afeitos à vida de crimes, revelam incapacidade
de sujeitar-se às regras que disciplinam o convívio humano.
19

Voto nº 2522

Apelação Criminal nº 1.225.225/6


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 352 do Cód. Penal

— A confissão livre “é, sem contradição, a prova mais peremptória, aquela


que esclarece, convence e satisfaz, no mais alto grau, a consciência do Juiz:
omnium probationum maxima” (Cons. Vicente Alves de Paula Pessoa,
Código do Processo Criminal, 1882, p. 157).
— Expressão incoercível do instinto humano, o amor da liberdade
elide o caráter de ilicitude penal da fuga do preso, exceto se
empreendida mediante violência contra pessoa ou com dano do
patrimônio público (arts. 352 e 163 do Cód. Penal).
—“Responde por dano qualificado o preso que danifica cela a fim de fugir,
uma vez que o motivo tendente à fuga não exclui o elemento subjetivo
próprio do crime” (Damásio E. de Jesus, Código Penal Anotado, 8a. ed.,
p. 548).
20

Voto nº 8126

Recurso em Sentido Estrito nº 858.067-3/8-00


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 43, nº I, do Cód. Proc. Penal;
art. 5º da Lei de Introdução ao Cód. Civil

— Não decai a Justiça de sua grandeza e confiança, antes se recomenda


ao louvor dos espíritos retos, se, aferindo lesão patrimonial por
craveira benigna, rejeita denúncia por delito de dano (art. 163,
parág. único, nº III, do Cód. Penal). Ao Juiz não esqueçam jamais
aquelas severas palavras de Rui: “Não estejais com os que agravam o
rigor das leis, para se acreditar com o nome de austeros e ilibados. Porque
não há nada menos nobre e aplausível que agenciar uma reputação
malignamente obtida em prejuízo da verdadeira inteligência dos textos
legais” (Oração aos Moços, 1a. ed., p. 43).
— Nos casos de insignificante lesão ao bem jurídico protegido e
mínimo grau de censurabilidade da conduta do agente, pode o
Magistrado, com prudente arbítrio, deixar de aplicar-lhe pena (e
talvez pôr termo à “persecutio criminis”). É que, nas ações humanas,
o Direito Penal somente deve intervir como providência “ultima
ratio”.
—“O Direito Penal não deve intervir quando a lesão jurídica é mínima,
reservando-se para as ofensas mais graves” (Damásio E. de Jesus, Código
Penal Anotado, 17a. ed., p. 103).
21

Voto nº 11.631

Apelação Criminal nº 993.08.037132-6


Art. 163, parág. único, nº III, do Cód. Penal;
art. 202 do Cód. Proc. Penal

— Sujeita-se às penas da lei o indivíduo que, em ato de puro


vandalismo, penetra, mediante arrombamento, em prédio escolar
pertencente ao Estado e lhe causa danos (art. 163, parág. único,
nº III, do Cód. Penal).
— Vale o depoimento pelo grau de veracidade que encerra. Com
respeito aos policiais, há decisão histórica do Pretório Excelso: “A
simples condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita”
(HC nº 51.577; DJU 7.12.73, p. 9.372; apud Damásio E. de Jesus,
Código de Processo Penal Anotado, 23a. ed., p. 185).
22

Voto nº 11.682

Apelação Criminal nº 993.07.078574-8


Arts. 163, 109, nº VI, e 110, § 1º, do Cód. Penal;
arts. 203 e 342 do Cód. Proc. Penal

— O crime de dano não requer dolo específico, senão genérico, que se


resume à simples voluntariedade de inutilizar ou destruir coisa alheia
(art. 163 do Cód. Penal).
—“O dolo do dano está na simples voluntariedade de o sujeito realizar uma
conduta que subverte, torna inútil ou deteriora o objeto material. O tipo
não exige nenhum outro elemento subjetivo além do dolo” (Damásio E.
de Jesus, Código Penal Anotado, 18a. ed., p. 623).
— Tem-se na conta de baldia e rebarbativa a crítica de que o
depoimento policial é geralmente suspeito de parcialidade. Seu
valor, ao contrário, é igual ao de toda a testemunha que, sob palavra
de honra, promete dizer a verdade do que sabe (art. 203 do Cód.
Proc. Penal). O falso testemunho (crime definido no art. 342 do Cód.
Penal) não se presume: requer prova cabal e convincente, a cargo de
quem o alegar.
— O decurso do tempo apaga a memória do fato punível e a
necessidade do exemplo desaparece (Abel do Vale; apud Ribeiro
Pontes, Código Penal Brasileiro, 8a. ed., p. 154).
— A prescrição intercorrente (art. 110, § 1º, do Cód. Penal) “constitui
forma de prescrição da pretensão punitiva (da ação), que rescinde a própria
sentença condenatória” (Damásio E. de Jesus, Código Penal Anotado,
18a. ed., p. 358).
— Decretada a extinção da punibilidade do apelante pela prescrição da
pretensão punitiva estatal, já nenhuma outra matéria poderá ser
objeto de exame ou deliberação.
23

Voto nº 11.736

Apelação Criminal nº 993.02.013545-6


Arts. 163, 250, § 1º, nº II, alínea a, e 28, § 1º, nº II, do Cód. Penal

— Desde que acorde com os mais elementos de prova dos autos, a


confissão policial constitui prova idônea de autoria delituosa e
justifica edição de decreto condenatório.
— O argumento da embriaguez não aproveita ao infrator, exceto se
completa e involuntária. A embriaguez voluntária, dispõe a lei que
não elide a responsabilidade criminal do agente, porque não lhe
exclui a imputabilidade (art. 28, nº II, do Cód. Penal).
— À luz do princípio da subsidiariedade, em caso de concurso entre o
crime de dano e o de incêndio, este é o que prevalece, por definir e
punir conduta mais grave: “major absorbet minorem” (arts. 163 e 250
do Cód. Penal).
24

Voto nº 11.932

Apelação Criminal nº 993.03.048631-6


Arts. 163, parág. único, nº III, 352, e 107, nº IV, do Cód. Penal;
arts. 61 e 386, nº III, do Cód. Proc. Penal

— Expressão incoercível do instinto humano, o amor da liberdade


elide o caráter de ilicitude penal da fuga do preso, exceto se
empreendida mediante violência contra pessoa ou com dano do
patrimônio público (arts. 352 e 163 do Cód. Penal).
— O decurso do tempo apaga a memória do fato punível e a
necessidade do exemplo desaparece (Abel do Vale; apud Ribeiro
Pontes, Código Penal Brasileiro, 8a. ed., p. 154).
— Forma que é de prescrição da pretensão punitiva, a prescrição
intercorrente (art. 110, § 1º, do Cód. Penal) rescinde a própria
sentença condenatória, fulminando-lhe os efeitos (cf. Damásio E. de
Jesus, Código Penal Anotado, 17a. ed., p. 358).
Casos Especiais
(Reprodução Integral do Voto)
PODER JUDICIÁRIO

1
T RIBUNAL DE A LÇADA CRIMINAL

DÉCIMA QUINTA C ÂMARA

Apelação Criminal nº 1.209.491/2


Comarca: Avaré
Apelante: MSP
Apelado: Ministério Público

Voto nº 2438
Relator

— “A confissão livre é, sem contradição, a


prova mais peremptória, aquela que
esclarece, convence e satisfaz, no mais
alto grau, a consciência do Juiz: omnium
probationum maxima” (Cons. Vicente
Alves de Paula Pessoa, Código do Processo
Criminal, 1882, p. 157).
28

— Expressão incoercível do instinto


humano, o amor da liberdade elide o
caráter de ilicitude penal da fuga do
preso, exceto se empreendida mediante
violência contra pessoa ou com dano do
patrimônio público (arts. 352 e 163 do
Cód. Penal).
— Tratando-se de pena de curta duração,
não é defeso ao Magistrado conceder
ao condenado reincidente o benefício
do regime semiaberto, se mais
compatível com o critério de suficiência
para a reprovabilidade e prevenção de
novas infrações (art. 33, § 2º, letra c,
do Cód. Penal).

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de


Direito da 1a. Vara da Comarca de Avaré, condenando-
-o a cumprir, sob o regime fechado, a pena de 9 meses
de detenção, além de 15 dias-multa, por infração do art.
163, parág. único, nº III, do Código Penal, apela MSP para
este Egrégio Tribunal, com o intuito de reformá-la.

Nas razões que lhe apresentou dedicado e culto


patrono, alega não procedeu com dolo, visto que não
lhe estava no ânimo destruir, inutilizar ou deteriorar
coisa alheia; tão só o movia o intuito de recobrar a
liberdade, o que não constitui crime.
29

Pelo que, pleiteia à colenda Câmara digne-se


prover-lhe o recurso para o efeito de absolvê-lo (fls.
324/328).

Apresentou contrarrazões o douto representante


do Ministério Público: contrapôs sólidos argumentos à
pretensão da nobre Defesa e propugnou a manutenção
da r. sentença de Primeiro Grau (fls. 330/332).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


sólido, incisivo e criterioso parecer da Dra. Eloisa de
Sousa Arruda, opina pelo improvimento do recurso (fls.
350/352).

É o relatório.

2. Foi denunciado o réu porque, no dia 20 de


fevereiro de 1997, pelas 2h, na Penitenciária Dr. Luciano
de Campos, em Avaré, procedendo em concurso e com
unidade de propósitos com outro indivíduo, destruiu
as barras de ferro da janela da cela, danificando o
patrimônio do Estado.
30

Rezam os autos que o réu e seu comparsa estavam


recolhidos naquele estabelecimento prisional e, na
referida data, serraram as barras de ferro de uma das
celas, destruindo-as.

Instaurada a persecução criminal, foi o réu, ao


cabo, condenado pela r. sentença de fls. 299/303.

Descontente, com a solução do pleito, espera que


esta colenda Corte de Justiça lhe atenda ao apelo,
absolvendo-o.

3. Da materialidade e autoria do fato imputado ao réu


há prova eloquente nos autos: o laudo pericial atesta a
veracidade da alegação da denúncia, isto é, que a grade
metálica de proteção da cela, onde se encontrava
recolhido o apelante, foi serrada (fl. 47).

As fotografias que ilustram o laudo pericial


demonstram-no seguramente (fls. 49/51).

A autoria confessou-a o apelante, acima de todo o


engano: “(...) ajudou a serrar a barra de ferro da cela” (fl.
186 v.).
31

À vista da conclusão técnica irrefutável e da


confissão do réu, que se tem pela rainha das provas,
foi a certeza que serviu de base à prolação do edito
condenatório.

Com efeito, segundo a Doutrina clássica, a


confissão prestada em Juízo tem força absoluta:

“Ora, a confissão livre é, sem contradição, a prova mais


peremptória, aquela que esclarece, convence e satisfaz,
no mais alto grau, a consciência do Juiz: omnium
probationum maxima” (Cons. Vicente Alves de
Paula Pessoa, Código do Processo Criminal, 1882,
p. 157).

4. Ainda que próprio do homem o anseio de


liberdade – “Sempre a liberdade… Algo haverá mais
importante do que ela? Tenho para mim que dela depende
a definição do homem” (Goffredo Telles Junior, A Folha
Dobrada, 1999, p. 321) –, a fuga do condenado
constitui violação de dever inerente a seu estado e falta
disciplinar grave.
32

O detento que – deitando a barra mais longe –


destruir o patrimônio público, mesmo que sob color de
alcançar a amplidão da liberdade, esse comete o crime
previsto no art. 163, nº III, do Código Penal (dano
qualificado).

Damásio E. de Jesus, penalista de grande


suposição, discorreu do ponto nesta substância:

“O elemento subjetivo do tipo do crime de dano é


simplesmente o dolo, vontade de destruir, inutilizar ou
deteriorar coisa alheia. O tipo não exige qualquer outro
elemento subjetivo ulterior. Assim, responde por dano
qualificado o preso que danifica cela a fim de fugir, uma
vez que o motivo tendente à fuga não exclui o elemento
subjetivo próprio do crime. Dizer que o preso não comete
crime porque não tem a intenção específica de causar
prejuízo ao patrimônio público não é correto. Se o preso
tem vontade e consciência de destruir ou inutilizar a
grade que o prende, tem claramente vontade de causar
dano, e, em face disso, de prejudicar. O fim, que é
alcançar a liberdade, não tem força de excluir o
elemento subjetivo próprio do delito qualificado” (Código
Penal Anotado, 8a. ed., p. 548).
33

O Colendo Supremo Tribunal Federal, em ven.


aresto cuja ementa vai a seguir transcrita, proclamou
que:

“Responde por dano qualificado o preso que danifica cela


a fim de fugir, uma vez que o motivo tendente à fuga
não exclui o elemento subjetivo próprio do crime.
Se o preso tem vontade e consciência de destruir
ou inutilizar a grade que o prende, tem claramente
vontade de causar dano e, em face disso, de prejudicar. O
fim, que é alcançar a liberdade, não tem força de excluir
o elemento subjetivo próprio do delito qualificado” (Rev.
Tribs., vol. 731, p. 514; rel. Min. Carlos Velloso).

Pelo mesmo estalão tem decidido este Colendo


Tribunal:

“Responde pelo crime de dano qualificado o preso que


danifica a cela na tentativa de fuga, pois o elemento
subjetivo desse delito que é o dolo não fica excluído
pela alegação de que a evasão tem o fim de alcançar
a liberdade” (Rev. Tribs., vol. 755, p. 661; rel.
Devienne Ferraz).
34

As penas foram fixadas segundo legal e justa


craveira, alguma coisa acima do mínimo, por se
tratar de infrator de quatro costados, cuja folha de
antecedentes o não recomenda a menções honrosas.

Conquanto reincidente, o regime prisional pode


ser o intermediário, havendo consideração à quantidade
e à espécie da pena (9 meses de detenção).

A reincidência, quanta é de si mesma, não obriga


à fixação do regime de extrema severidade:

“O disposto no art. 33, § 2º, a e c, do Cód. Penal, impõe


o regime inicial fechado ao réu reincidente. Há, porém,
que se atender às particularidades do caso, sob pena de
ofensa ao princípio da individualização da pena.
É fundamental observar os requisitos objetivos e
subjetivos, mesmo quando se tratar de reincidência. Não
há por que dar ao réu que não demonstra possuir grau
de culpa intensa, cuja personalidade e conduta não
revelam traços de periculosidade ou temerabilidade
social, o mesmo tratamento dado a quem é participante
de criminalidade de alta periculosidade” (STJ; REsp.
nº 196.940-DF; 6a. Turma; j. 20.4.99, v.u.; DJU
17.5.99, p. 263).
35

5. Pelo exposto, dou provimento parcial ao recurso para


fixar ao apelante o regime semiaberto, mantida no mais
a r. sentença de Primeira Instância.

São Paulo, 12 de setembro de 2000


Carlos Biasotti
Relator
PODER JUDICIÁRIO

2
T RIBUNAL DE A LÇADA CRIMINAL

DÉCIMA QUINTA C ÂMARA

Apelação Criminal nº 1.279.311/5


Comarca: Araraquara
Apelante: TAS
Apelado: Ministério Público

Voto nº 3412
Relator

— O crime de dano não requer dolo


específico, senão genérico, que se
resume à simples voluntariedade de
inutilizar ou destruir coisa alheia (art.
163 do Cód. Penal).
— Tratando-se de bem de uso comum da
coletividade, não é lícito ao particular,
ainda nos assomos de cólera e sob
o efeito de embriaguez voluntária,
danificar aparelho telefônico (“orelhão”).
A preservação do patrimônio público
deve ser apanágio de todo cidadão.
37

— A substituição de pena corporal por


multa é desaconselhável se não atende
aos princípios que lhe devem reger a
aplicação: necessidade e suficiência da
reprovação e prevenção do crime e
edificação das pessoas na observância
da lei.

1. Inconformado com a r. sentença que proferiu o


MM. Juízo de Direito da 2a. Vara Criminal da
Comarca de Araraquara, condenando-o à pena de
6 meses de detenção e 10 dias-multa, substituída a
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos
(prestação de serviços à comunidade), por infração do
art. 163, parág. único, nº III, do Código Penal, interpôs
recurso para este Egrégio Tribunal, com o escopo de
reformá-la, TAS.

Em seu arrazoado recursal, afirma que o fato que


lhe foi imputado praticara-o sem dolo; pelo que,
merecia absolvido.

Acrescenta que, no dia em que danificara o


telefone público, estava embriagado.
38

Pleiteia, destarte, absolvição ou aplicação de pena


de multa somente (fls. 74/78).

A douta Promotoria de Justiça respondeu ao


recurso, refutando-lhe os argumentos; de igual passo,
propugnou a manutenção da r. sentença de Primeiro
Grau (fls. 80/83).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


esmerado e escorreito parecer do Dr. José Eduardo
Diniz Rosa, opina pelo improvimento da apelação (fls.
90/94).

É o relatório.

2. A Justiça Pública meteu em processo o réu porque,


aos 9 de março de 2000, na Rua Deputado Emílio
Carlos (Vila Melhado), na bela cidade de Araraquara,
danificou um aparelho telefônico público (“orelhão”), de
propriedade da Telefônica, concessionária de serviços
públicos.

Reza a denúncia que policiais militares foram


solicitados para atender a uma ocorrência de dano.
39

Constava que certo indivíduo, como não lograsse


completar uma ligação, acabara por seccionar o fone,
mediante uso de força muscular.

De posse das características do autor do fato, a


Polícia entrou a diligenciar e deteve-o nas adjacências.

Instaurada a persecução criminal, transcorreu o


processo na forma da lei; ao cabo, a r. sentença de fls.
66/68, julgando procedente a denúncia, condenou o
réu, o qual, jurando inocência, comparece perante esta
Segunda Instância, sonhando com absolvição.

3. A despeito dos bons esforços de seu ilustre


patrono, não há atender à pretensão do réu, visto que o
incrimina o conjunto probatório.

Na real verdade, em seu interrogatório judicial,


admitiu o réu, por miúdo, a autoria do fato criminoso.
Esclareceu que tentava comunicar-se por telefone com a
ex-mulher, porém não o conseguia. Irritado, dera com o
monofone contra o gancho, quebrando-o (fl. 45).
40

É certo que afirmara não era sua intenção danificar


o aparelho, ajuntando que estava embriagado.

A versão escusatória, no entanto, não merece


acolhida.

A razão é que apenas a embriaguez completa,


proveniente de caso fortuito ou força maior, elide a
imputabilidade penal, consoante a fórmula do art. 28
do Código Penal.

A lição de Damásio E. de Jesus faz muito ao


intento:

“Se o sujeito comete uma infração penal sob o efeito de


embriaguez, voluntária ou culposa, não há exclusão da
imputabilidade e, por consequência, não fica excluída
a culpabilidade. Ele responde pelo crime” (Código Penal
Anotado, 9a. ed., p. 118).

Por outra parte, o crime de dano não requer dolo


específico, senão genérico; este se traduz, como o
ressaltou o abalizado parecer da Procuradoria-Geral de
Justiça, “na simples voluntariedade de causar dano à
propriedade alheia”.
41

Esta, com efeito, é a licão dos mais reputados


autores:

“O resultado de dano é, neste crime, inseparável do


evento. Se há vontade e consciência de destruir,
inutilizar ou deteriorar, há, evidentemente, vontade de
causar dano e, pois, de prejudicar. O que pode ocorrer é
o concurso de outros fins que, se não mudam o título do
crime, são irrelevantes… Não se exige, portanto, um
específico animus nocendi” (Heleno Cláudio Fragoso,
Lições de Direito Penal, Parte Especial, 1980, vol. II,
pp. 26-27).

Comprovada a materialidade do fato (fls. 36/40) e


liquidada a culpa do réu, era sua condenação imperativo
de justiça.

Tratando-se de bem de uso comum da


coletividade, não é lícito ao particular, ainda nos
assomos de cólera ou sob o efeito de embriaguez
voluntária, danificar aparelho telefônico; o respeito ao
patrimônio público deve ser apanágio de todo cidadão.
42

A pena foi imposta segundo craveira módica: a


mínima, substituída por prestação de serviços à
comunidade.

O pedido de substituição da pena corporal por


multa não atenderia ao princípio que lhe deve reger a
aplicação: prevenir novos delitos, expiar a falta cometida
e edificar as pessoas na observância da lei.

Mantenho, por isso, ante os bons fundamentos em


que assenta, a r. sentença proferida pelo distinto e culto
Juiz Dr. Marcos Antonio Corrêa da Silva.

4. Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

São Paulo, 1º de novembro de 2001


Carlos Biasotti
Relator
PODER JUDICIÁRIO

3
T RIBUNAL DE A LÇADA CRIMINAL

DÉCIMA QUINTA C ÂMARA

Apelação Criminal nº 1.369.073/5


Comarca: São Paulo
Apelante: RJLP
Apelado: Ministério Público

Voto nº 4890
Relator

— Comete o crime de dano e, pois,


sujeita-se às penas da lei (art. 163
do Cód. Penal), o indivíduo que, em
ato de cru vandalismo, picha prédio
público, inutilizando-lhe a pintura e
deteriorando-o.
—“Não exclui a imputabilidade a embriaguez,
voluntária ou culposa, pelo álcool, ou
substância de efeitos análogos” (Damásio
E. de Jesus, Código Penal Anotado, 9a.
ed., p. 117).
44

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de


Direito da 15a. Vara Criminal da Comarca da Capital,
condenando-o à pena de 6 meses de detenção,
no regime aberto, e 10 dias-multa, substituída a
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos
(prestação de serviços à comunidade), por infração do
art. 163, parág. único, nº III, do Código Penal (dano
qualificado), interpôs recurso para este Egrégio
Tribunal, no intuito de reformá-la, RJLP.

Nas razões de apelação, apresentadas por esforçada


e talentosa patrona, argui preliminar de extinção de
punibilidade, pelo cumprimento da suspensão do
processo. No mérito, requer absolvição, sob o argumento
de que procedera sem dolo e por ausência de tipicidade
do fato que lhe foi imputado (fls. 133/137).

A douta Promotoria de Justiça respondeu ao


recurso: repeliu a pretensão da nobre Defesa e
propugnou a manutenção da r. sentença de Primeiro
Grau (fls. 139/141).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


minucioso, firme e ponderado parecer do Dr. Fernando
José Marques, opina pelo improvimento do recurso
(fls. 156/158).
45

É o relatório.

2. O órgão do Ministério Público submeteu o réu


a processo porque, pela madrugada de 8 de março de
1999, na Rua Dona Matilde (Vila Matilde), nesta
Capital, obrando em concurso e unidade de propósitos
com três adolescentes, deteriorara coisa pertencente ao
patrimônio do Estado.

Reza a denúncia que o réu se encontrava no


telhado do prédio da 8a. Delegacia de Ensino,
promovendo “pichação”, em companhia dos menores.

Ao perceber a presença de viatura policial, o réu e


seus comparsas intentaram livrar-se dos instrumentos de
pintura (rolos), que tinham à mão para a prática do
delito.

Após instantes apelos, o réu desceu do telhado e,


no mesmo ponto, recebeu voz de prisão.

Ao inspecionar o prédio, confirmaram os policiais


que a parede dos fundos estava danificada.
46

Instaurada a persecução penal, transcorreu o


processo na forma da lei; ao cabo, a r. sentença de
fls. 116/120 decretou a condenação do réu, o qual,
malcontente com o desfecho da lide penal, comparece
perante esta augusta Corte de Justiça, reclamando
absolvição.

3. Ainda que deduzida com brilho, a questão


prejudicial – extinção da punibilidade do réu –, “data
venia”, não procede.

Na real verdade, beneficiário da suspensão


condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei nº
9.099/95 (fl. 42), o r. despacho de fl. 66 prorrogou o
período de prova do réu até julgamento final do
processo que lhe foi instaurado por infração do art. 16
da Lei nº 6.368/76 (fl. 65).

Cumpre ressaltar que, à data do r. despacho que


prorrogou o “sursis” processual – 13.4.99 (fl. 66) –, já
havia notícia nos autos de outro feito instaurado contra
o réu (fl. 58).
47

Assim, quando da condenação definitiva, como


constou da r. sentença, “as condições impostas ainda não
haviam sido cumpridas. Logo, o benefício podia – e pode –
ser revogado” (fl. 117).

Durante a prorrogação do “sursis” processual,


conforme doutrina geralmente recebida, continua
suspenso o prazo prescricional.

Vem a talho de foice a lição de Ada Pellegrini


Grinover et alii:

“O prazo prescricional continua suspenso durante a


prorrogação? Nos termos do § 6º do art. 89, a resposta é
afirmativa. O novo processo, se não concluído até o final
do período de prova, provoca a prorrogação do seu
prazo” (Juizados Especiais Criminais, 4a. ed., pp.
341-342).

E, logo a seguir:

“Enquanto demora o julgamento definitivo no novo


processo, no entanto, não pode correr o prazo prescricional
em relação ao processo anterior (onde houve suspensão)”
(Ibidem, p. 342).
48

Rejeito, destarte, a questão prejudicial.

4. Pelo que respeita ao mérito, não se mostra


atendível, “data venia”, o apelo do réu.

Com efeito, em seu interrogatório judicial,


confessou, sem salvas nem rebuços, a prática da infração
penal (fl. 102 v.).

O laudo do Instituto de Criminalística e as fotos


que o ilustram deram força e relevo ao libelo inicial
(fls. 45/52).

Foi o réu detido naquelas circunstâncias a que a


Doutrina tradicional denomina “certeza visual do crime”
(Tostes Malta, Do Flagrante Delito, 1933, p. 25).

5. O argumento da combativa Defesa de que o réu


não obrara com dolo, visto como se achava embriagado
ao tempo dos fatos, carece de fundamento jurídico sério.
49

A alegação de que estava embriagado, sobre não


ter sido comprovada, não aproveita ao réu.

Faz ao propósito o magistério de Damásio E. de


Jesus, em escólio ao art. 28 do Código Penal:

“Se o sujeito comete uma infração penal sob efeito de


embriaguez, voluntária ou culposa, não há exclusão da
imputabilidade e, por consequência, não fica excluída
a culpabilidade. Ele responde pelo crime” (Código Penal
Anotado, 9a. ed., p. 118).

5. A conduta do réu, portanto, responde ao art. 163,


parág. único, nº III, do Código Penal, pois ao “pichar” o
prédio da 8a. Delegacia de Ensino da Capital deteriorou
coisa pertencente ao Estado.

Incidiu, portanto, na censura da lei, uma vez autor


de crime de dano qualificado.

Este é o entendimento de nossos Tribunais:


50

“Quem picha com tinta spray um muro recém pintado,


no mínimo inutiliza a pintura e, via de consequência,
causa prejuízo ao proprietário já que a pintura
custa dinheiro. Trata-se, pois, de crime de dano”
(RJDTACrimSP, vol. 4º, p. 80; rel. Thyrso Silva).

À derradeira, não se mostra recomendável a


modificação da pena restritiva de direitos (prestação de
serviços à comunidade) por pena só de multa. A razão é
que não atenderia à finalidade da sanção: servir de
exemplo e prevenir novos crimes.

Em suma: quer-se confirmada, por seus próprios


e jurídicos fundamentos, a r. sentença que proferiu o
distinto e culto Juiz Dr. Marcelo Coutinho Gordo.

6. Pelo exposto, rejeitada a preliminar, nego provimento


à apelação.

São Paulo, 27 de agosto de 2003


Carlos Biasotti
Relator
PODER JUDICIÁRIO

4
T RIBUNAL DE A LÇADA CRIMINAL

DÉCIMA QUINTA C ÂMARA

Apelação Criminal nº 1.371.961/1


Comarca: Guararapes
Apelante: Ministério Público
Apelado: PRHS

Voto nº 5215
Relator

— A decisão que rejeita a conclusão do


laudo (porque realizada tardiamente
a perícia) é incensurável, pois conta
com previsão da lei (art. 182 do Cód.
Proc. Penal) e tem base em fato de
certeza experimental: a precariedade
e contingência das coisas. O tempo,
afirmou o profundo Vieira, “tudo faz
esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo
acaba” (Sermões, 1959, t. IV, p. 289).
52

—“Sob pena de cometer possível erro


judiciário, não pode o Juiz Criminal
proferir condenação sem certeza total da
autoria e da culpabilidade” (JTACrSP,
vol. 54, p. 190).

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de


Direito da Comarca de Guararapes, absolvendo, com
fundamento no art. 386, nº VI, do Código de Processo
Penal, PRHS, acusado de ter infringido o art. 163,
parág. único, nº III, do Código Penal, interpôs recurso para
este Egrégio Tribunal, no intuito de reformá-la, o
ilustre representante do Ministério Público.

A douta Promotoria de Justiça, em esmerada peça


jurídica, argumenta que, ao absolver o réu, a r. sentença
fez rosto à prova dos autos.

Acentua mais que o laudo pericial comprovou a


materialidade do delito, cuja autoria foi imputada ao
réu.

Pleiteia, destarte, à colenda Câmara tenha a bem


prover-lhe o recurso para condenar o réu nos termos da
denúncia (fls. 98/102).
53

Apresentou a Defesa contrarrazões de recurso, nas


quais repeliu a pretensão do recorrente, mantida, por
seus próprios fundamentos, a r. sentença de Primeiro
Grau (fls. 105/107).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


firme e escorreito parecer do Dr. Franco Caneva
Júnior, opina pelo improvimento do recurso (fls.
116/118).

É o relatório.

2. Reza a denúncia que o réu, no dia 12 de abril


de 2000, pelas 14h, na Rua Roberto Soliva, em
Guararapes, deteriorou o veículo da marca “GM/
Caravan”, tipo ambulância, placa BNZ-7280, de
propriedade da Prefeitura Municipal de Guararapes.

Consta que o motorista da ambulância, atendendo


a chamado, dirigiu-se ao local dos fatos, de onde
conduziria o réu até à Santa Casa, ocasião em que este
desferiu chutes na lateral do veículo, causando-lhe
amolgamento.
54

Instaurada a persecução penal, transcorreu o


processo na forma da lei; ao cabo, a r. sentença de fl. 88
decretou a absolvição do réu, o que não levou em
paciência o combativo representante do Ministério
Público e, pois, vem a esta augusta Corte de Justiça,
pleiteando-lhe a condenação.

3. Em duas razões precípuas estribou-se a r. sentença


para julgar improcedente a pretensão punitiva: falta de
laudo, que comprovasse o dano, e precariedade da prova
de autoria dos fatos.

Com efeito, exarou a distinta Magistrada de


Primeiro Grau que o laudo não comprovou o dano
imputado ao réu, contra a opinião do apelante, que se
baseou no “exame de constatação de dano em veículo”
(fl. 23).

No entanto – e isto mesmo lembrou ao diligente


e douto subscritor do parecer da Procuradoria-Geral de
Justiça (fl. 119) –, assim o auto de avaliação de fl. 14
como o exame de fl. 23 foram elaborados “quase dois
meses após os fatos”.
55

O decurso de tão largo trato de tempo, não há


para que se negue, deitou a perder a confiança comum a
todo gênero de perícia.

Deveras, o tempo, conforme o profundo Vieira,


“tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba”
(Sermões, 1959, t. IV, p. 289).

Ora, no particular de que se trata, o depoimento


do motorista da ambulância, reduzido a termo (fl. 92),
sugere que o réu desferiu chutes na lateral do veículo,
“amassando e furando a lataria”.

Tal circunstância, porém, como o observou com


rara penetração o lúcido parecer, não foi descrita pelos
expertos, que apenas afirmaram “amolgamento localizado
no terço mediano do flanco direito” (fl. 23).

À derradeira, faz impressão no ânimo o argumento


da r. sentença: havendo o réu libado excessivamente ao
prestigioso Baco – ingerira, segundo afirmou no
interrogatório judicial, “cinco garrafas de pinga” na
companhia de um amigo (fl. 91 v.) –, era pouco
provável tivesse energia para danificar o veículo.
56

4. Toda condenação, de acordo com o geral sentir


dos doutores, deve assentar em prova plena e
incontroversa da autoria, da materialidade do fato
criminoso e da culpabilidade do agente.

No caso sujeito, sem embargo de seus bons


esforços, não se desempenhou inteiramente o órgão da
Acusação do ônus de provar, sem dúvida, sua denúncia.

O conjunto probatório, examinado com tento e


vagar, não induz certeza a respeito da culpabilidade do
réu; pelo que, por amor do princípio universal de
interpretação do fato duvidoso, não havia senão absolvê-
lo, como praticou a r. sentença recorrida.

Isto mesmo têm professado nossos Tribunais:

“Sob pena de cometer possível erro judiciário, não pode o


Juiz Criminal proferir condenação sem certeza total
da autoria e da culpabilidade” (JTACrSP, vol. 54,
p. 190).

Merece confirmada, portanto, a r. sentença que


proferiu a insigne Juíza Dra. Beatriz Pascoal Queiroz.
57

5. Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

São Paulo, 18 de dezembro de 2003


Carlos Biasotti
Relator
PODER JUDICIÁRIO

5
T RIBUNAL DE J USTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

QUINTA C ÂMARA — S EÇÃO C RIMINAL

Recurso em Sentido Estrito nº 858.067-3/8-00


Comarca: Avaré
Recorrente: Ministério Público
Recorrido: DST

Voto nº 8126
Relator

— Não decai a Justiça de sua grandeza


e confiança, antes se recomenda ao
louvor dos espíritos retos, se, aferindo
lesão patrimonial por craveira benigna,
rejeita denúncia por delito de dano (art.
163, parág. único, nº III, do Cód. Penal).
Ao Juiz não esqueçam jamais aquelas
severas palavras de Rui: “Não estejais
com os que agravam o rigor das leis, para
se acreditar com o nome de austeros e
ilibados. Porque não há nada menos nobre
e aplausível que agenciar uma reputação
malignamente obtida em prejuízo da
verdadeira inteligência dos textos legais”
(Oração aos Moços, 1a. ed., p. 43).
59

— Nos casos de insignificante lesão ao


bem jurídico protegido e mínimo grau
de censurabilidade da conduta do
agente, pode o Magistrado, com
prudente arbítrio, deixar de aplicar-lhe
pena (e ainda pôr termo à “persecutio
criminis”). É que, nas ações humanas,
o Direito Penal somente deve intervir
como providência “ultima ratio”.
—“O Direito Penal não deve intervir quando
a lesão jurídica é mínima, reservando-se
para as ofensas mais graves” (Damásio E.
de Jesus, Código Penal Anotado, 17a. ed.,
p. 103).

1. Da r. decisão que proferiu o MM. Juízo de Direito


da 3a. Vara da Comarca de Avaré, rejeitando-lhe a
denúncia que ofereceu contra DST, por infração do
art. 163, parág. único, nº III, conjugado com o art. 29,
do Código Penal, interpôs recurso para este Egrégio
Tribunal, com o intuito de reformá-la, o ilustre
representante do Ministério Público.

Das razões de fls. 33/36, elaboradas com esmero e


elegância, consta que, ao rejeitar a denúncia formulada
segundo os preceitos legais, o MM. Juízo fizera rosto ao
Direito Positivo.
60

Acrescentou o recorrente que isto de ter a coisa


parco valor não significava pudesse livremente ser
destruída em detrimento do patrimônio público. Em
abono de sua argumentação invocou o magistério da
Jurisprudência.

O r. despacho de fl. 51 manteve, por seus próprios


fundamentos, a r. decisão impugnada.

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


soberbo, alentado e profundo parecer do Dr. Luiz
Otavio de Oliveira Rocha, brasão de glória de sua
Instituição, opina pelo provimento do recurso (fls.
54/60).

É o relatório.

2. Foi o recorrido chamado à barra da Justiça


Criminal porque, em 2.2.2004, pela madrugada, no
Terminal Rodoviário localizado na Rua Pará, em Avaré,
obrando em concurso e unidade de propósitos com um
menor, destruiu, com um soco, o espelho do sanitário
masculino, bem pertencente à municipalidade.
61

Instaurada a “persecutio criminis”, foram os autos de


inquérito remetidos a Juízo.

Oferecida a denúncia, rejeitou-a a r. decisão de


fl. 29, sob color de que a “insignificância da conduta”
do acusado não sofria se sujeitasse à jurisdição penal
(art. 43, nº I, do Cód. Proc. Penal).

3. A materialidade e a autoria do fato imputado ao


recorrido não podem ser infirmadas sem imprudência,
pois assentaram em base probatória firme e incontroversa.

A despeito, porém, dos cabedais de talento e zelo


do subscritor das razões de recurso, a solução adotada
pela decisão de Primeira Instância era, a meu aviso,
a que realmente devia caber na alçada da Justiça
Criminal.

Nos casos de insignificante lesão ao bem jurídico


(e mínimo o grau de censurabilidade), o fato não
constitui crime. É que, nas ações humanas, o Direito
Penal apenas intervém como providência “ultima ratio”.
62

Mesmo quando conspirem os elementos constitutivos


do crime, sempre se reconheceu ao Juiz discrição para
atalhar o curso da persecução penal, se esta lhe parecer,
mais do que intolerável absurdo, violação grave do ideal
e dos preceitos da Justiça.

Ao juiz não esqueçam jamais aquelas severas


palavras de Rui:

“Não estejais com os que agravam o rigor das leis, para


se acreditar com o nome de austeros e ilibados. Porque
não há nada menos nobre e aplausível que agenciar
uma reputação malignamente obtida em prejuízo da
verdadeira inteligência dos textos legais” (Oração aos
Moços, 1a. ed., p. 43).

Tal exegese conforma-se com o alto magistério do


Colendo Supremo Tribunal Federal, como está a
persuadi-lo a ementa a seguir reproduzida:

“Por isso, deve o órgão investido do ofício judicante


resistir à tendência de, em época de delinquência
exacerbada, caminhar para a persecução criminal a
ferro e fogo, com desprezo de normas comezinhas, entre
as quais surge, com relevância maior, a alusiva ao
princípio da não-culpabilidade” (Rev. Trim. Jurisp.,
vol. 171, p. 582).
63

4. Ao Juiz a Lei determina – e não apenas assegura


– que, no aplicá-la, atenda “aos fins sociais” e “às
exigências do bem comum” (art. 5º da Lei de Introdução ao
Código Civil).

Casos haverá (sendo o dos autos desse número) em


que ao Magistrado corre o dever de repelir, com retidão
e sabedoria, a ingrata censura, na qual se detinham e
compraziam já nossos maiores, por onde “Regimentos
não se executam senão nos pobres; Leis e prisões não se
guardam, senão contra os desamparados” (Diogo do Couto,
Diálogo do Soldado Prático, 1790, p. 19).

Isto mesmo tem proclamado esta prestigiosa Corte


Criminal, em acórdãos numerosos, subscritos por seus
mais eminentes Juízes:

“A lei penal jamais deve ser invocada para atuar em


casos menores, de pouca ou escassa gravidade. E o
princípio da insignificância surge justamente para
evitar situações dessa espécie, atuando como instrumento
de interpretação restritiva do tipo penal, com o
significado sistemático e político-criminal da expressão
da regra constitucional do nullum crimen sine lege, que
nada mais faz do que revelar a natureza subsidiária e
fragmentária do direito penal” (Rev. Tribs., vol. 733,
p. 579; rel. Márcio Bártoli).
64

O princípio da insignificância como causa de


exclusão de tipicidade penal tem, entre nós, padroeiros
de grande vulto e peso:

“Embora não presente em texto legal, o princípio


da intervenção mínima, de cunho político-criminal,
impõe-se ao legislador e ao intérprete, por sua
compatibilidade com outros princípios jurídico-penais
dotados de positividade, e com os pressupostos políticos
do estado democrático de direito” (Carlos Vico Mañas,
O Princípio da Insignificância como Excludente da
Tipicidade no Direito Penal, 1994, p. 57).

Igual doutrina professa o renomado penalista


Damásio E. de Jesus:

“O Direito Penal não deve intervir quando a lesão


jurídica é mínima, reservando-se para as ofensas
graves” (Direito Penal Anotado, 17a. ed., p. 103).

Por último, Nélson Hungria, o oráculo do Direito


Penal entre nós:
65

“As sanções penais são o último recurso para conjurar


a antinomia entre a vontade individual e a vontade
normativa do Estado. Se um fato ilícito, hostil
a um interesse individual ou coletivo, pode ser
convenientemente reprimido com as sanções civis, não
há motivo para a reação penal” (Comentários ao Código
Penal, 1978, vol. I, t. II, pp. 34-35).

Ainda que lhes não falte o influxo do bom direito,


os argumentos deduzidos no recurso (fls. 33/36) e no
modelar parecer de fls. 54/56 não lograram prevalecer
contra o espírito e a forma da r. decisão atacada.

Em suma, quer-se confirmada, por seus jurídicos e


lógicos fundamentos, a r. decisão que proferiu a distinta
e culta Magistrada Dra. Maria Isabel Romero Rodrigues.

5. Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

São Paulo, 23 de março de 2007


Des. Carlos Biasotti
Relator
PODER JUDICIÁRIO

6
T RIBUNAL DE J USTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

QUINTA C ÂMARA — S EÇÃO C RIMINAL

Apelação Criminal nº 993.02.013545-6


Comarca: Piedade
Apelante: RNS
Apelado: Ministério Público

Voto nº 11.736
Relator

— Desde que acorde com os mais


elementos de prova dos autos, a
confissão policial constitui prova idônea
de autoria delituosa e justifica edição
de decreto condenatório.
— O argumento da embriaguez não
aproveita ao infrator, exceto se
completa e involuntária. A embriaguez
voluntária, dispõe a lei que não elide
a responsabilidade criminal do agente,
porque não lhe exclui a imputabilidade
(art. 28, nº II, do Cód. Penal).
67

— À luz do princípio da subsidiariedade,


em caso de concurso entre o crime de
dano e o de incêndio, este é o que
prevalece, por definir e punir conduta
mais grave: “major absorbet minorem”
(arts. 163 e 250 do Cód. Penal).

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de


Direito da 1a. Vara Criminal da Comarca de Piedade,
condenando-o a cumprir, no regime aberto, 4 anos de
reclusão e 13 dias-multa, por infração do art. 250,
§ 1º, nº II, alínea a, do Código Penal (incêndio doloso
qualificado), interpôs recurso de Apelação para este
Egrégio Tribunal, com o escopo de reformá-la, RNS.

Nas razões de recurso, que lhe apresentou


dedicada patrona, afirma que a prova reunida no
processado não lhe consentia a condenação pelo crime
descrito na denúncia. A admitir-se haja cometido algum
crime, esse terá sido o de dano: requer, por isso,
absolvição, ou a desclassificação do delito que lhe foi
imputado para o tipo do art. 163 do Código Penal.

Acrescenta a Defesa que o réu é sujeito de parca


ilustração e, no dia dos fatos, estava sob o efeito de
embriaguez (fls. 157/158).
68

Apresentou contrarrazões a douta Promotoria de


Justiça, nas quais houve por incabível a pretensão
da nobre Defesa e encareceu, destarte, a manutenção da
r. sentença apelada (fls. 160/165).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


incisivo e escorreito parecer da Dra. Ana Cláudia
Mattos Quaresma e Silva, opina pelo improvimento do
recurso (fls. 172/173).

É o relatório.

2. Foi o réu chamado a prestar severas contas à


Justiça porque, em 19.9.1997, pelas 23h49, na Rua
Laureano da Silveira Baldy, em Piedade, causou
incêndio em casa habitada, expondo a perigo a
integridade física e o patrimônio de Aparecida
Rodrigues de Camargo, Vanessa da Silva Ribeiro e
Emiko Ogassara.

Foi o caso que, inconformado com a separação de


sua ex-mulher – a qual, ao demais, já não queria
restabelecer a vida em comum –, o réu ateou-lhe fogo
à residência.
69

Instaurada a ação penal, transcorreu o processo


na forma da lei; por fim, a r. decisão de fls. 149/152
decretou a condenação do réu que, inconformado com
o êxito adverso da causa-crime, comparece ao templo da
Justiça a implorar clemência, ou refrigério para seu
castigo.

3. Era indeclinável a edição de decreto condenatório


contra o réu, visto que os elementos reunidos no
processado lhe evidenciaram a responsabilidade pela
prática do crime descrito na denúncia.

Em boa verdade, pretender impugnar a


condenação do réu passava por lance a que se não
costuma entregar espírito avisado: uma coisa é ser cego,
outra negar a existência da luz.

Infirmar a responsabilidade criminal do réu seria


desconchavo de grande monta, pois o próprio réu a
admitiu na Polícia, sem salvas nem rodeios (fl. 13).

Tamanha é a força desta inferência lógica imediata,


que retira ao acusado toda a esperança de beneficiar-se
do venerando aforismo “in dubio pro reo”.
70

Por fim, não cabe no entendimento isso de o


apelante, regularmente citado para os atos e termos da
ação penal, ter deixado de comparecer a Juízo para
afastar de si a grave acusação, preferindo a condição de
revel (fl. 56)!

Também a testemunha Anselmo Júlio da Costa


acrescentou prestígio à pretensão punitiva, ao narrar
que viu o réu no local dos fatos com um litro de álcool
nas mãos, derramando-o pela residência da vítima;
ainda: tentou dissuadi-lo, mas o réu negou-lhe os
ouvidos (fl. 114).

A confissão na fase do inquérito projetou-se,


portanto, na ação penal, e tem força de artigo de fé, já
que, revel em Juízo, dela se não retratou o réu.

Conjunto probatório de tal quilate não consentia


outra solução que aquela dada pela r. sentença. Donde a
justeza do reparo de seu douto prolator: “Verifica-se,
destarte, que a conduta delitiva do réu, consubstanciada no
fato de causar incêndio, expondo a perigo o patrimônio de
outrem, está plenamente configurada nos autos, ensejando a
expedição de um decreto condenatório” (fl. 151).
71

Sem embargo de feita na Polícia, tem a confissão


alto valor e, se não provar o confitente que foi obra de
coação, pode servir de base para condená-lo.

Por este padrão têm decidido nossos Tribunais:

“É digna de crédito a confissão do réu na Polícia,


sobrepondo-se às suas declarações em Juízo, quando
aquela é mais consentânea à prova dos autos” (Rev.
Forense, vol. 200, p. 261).

A condenação do réu, portanto, era de preceito.

4. A alegação, a modo de defesa, de que excedera os


limites de seus atos porque se enfrascara em bebida
alcoólica, não lhe aproveita.

Com efeito, consoante a sistemática do Código


Penal, a embriaguez, por álcool ou substância análoga,
só é causa excludente de culpabilidade quando completa,
involuntária ou proveniente de caso fortuito ou força
maior (art. 28, § 1º, do Cód. Penal).
72

A lição de Damásio E. de Jesus faz ao intento:

“Se o sujeito comete uma infração penal sob efeito de


embriaguez, voluntária ou culposa, não há exclusão da
imputabilidade e, por consequência, não fica excluída
a culpabilidade. Ele responde pelo crime” (Código Penal
Anotado, 18a. ed., p. 134).

Em face do que levo expendido, nenhuma outra


solução era compatível com o acervo probatório, exceto
a condenação do réu.

5. A tese subsidiária da Defesa – a desclassificação do


crime de incêndio para dano – não cabe no possível: do
crime do art. 250 do Código Penal é elementar o perigo
(coletivo ou individual), que lhe serve de pedra de toque
e não consta da definição de dano (art. 163).

Ao demais, à luz do princípio da subsidiariedade,


aperfeiçoado o tipo que descreve conduta mais grave,
já não tem lugar a aplicação do que define e sanciona
conduta de menor gravidade (“major absorbet minorem”).
73

Enfim, comprovado o crime que lhe imputou a


denúncia, era força condenar o réu.

A pena foi criteriosamente fixada, em seu grau


mínimo, e substituída a privativa de liberdade por
medida alternativa, o que dá a conhecer o magnífico
senso judicante da Magistrada de Primeiro Grau.

Merece confirmação, portanto, por seus bons e


jurídicos fundamentos, a r. sentença que proferiu a
distinta e culta Juíza Dra. Laís Helena Bresser Lang.

6. Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

São Paulo, 28 de maio de 2009


Des. Carlos Biasotti
Relator
O Crime de Dano

Sumário. Com o intuito de prevenir e reprovar a


ação de sujeitos refratários à boa ordem social e à
garantia do direito de propriedade, o legislador – à
maneira do médico que propina remédio amargo para
mazela renitente – estabeleceu penas aos que praticam
dano, crime em que incorrem vândalos, pichadores,
grafiteiros, etc. Em guarda, pois!

I. O abuso de direito de manifestação (e melhor diria


insensatez) imprimiu, pouco há, a marca do vandalismo
em dois patrimônios ou bens públicos: o monumento a
Borba Gato, na capital do Estado de São Paulo, e o
prédio do Ministério da Agricultura, em Brasília (fotos
ns. 1 e 2).

Não é para aqui atear o archote da crítica acerca


dos méritos artísticos e das razões de ordem histórica
que presidiram à ereção da colossal estátua do
bandeirante Manuel Borba Gato (ao aviso de alguns
ofensiva do bom gosto e do senso estético).

A questão é objetiva e de fato: a mão profana, que


lhe deitou fogo, perpetrou, em tese, ato ilícito penal.
76

Em verdade, “destruir, inutilizar ou deteriorar coisa


alheia”, reza o Código Penal que configura o crime de
dano (art. 163).

Os verbos do tipo, na lição de Damásio E. de


Jesus, significam:

I - destruir — demolir, desfazer o objeto material;

II - inutilizar — torná-lo imprestável, inútil, ainda


que parcialmente;

III - deteriorar — arruiná-lo, estragá-lo, causando-lhe


modificação para pior(1).

Incorre, pois, no caso da lei o preso que


empreende fuga com dano do patrimônio público
(ainda que seja o amor da liberdade expressão
incoercível do espírito humano).

Também comete o crime de dano o sujeito que,


em ato de cru vandalismo, picha prédio, inutilizando-lhe
a pintura e deteriorando-o(2).

Mas, nos casos de insignificante a lesão ao bem


jurídico protegido e mínimo o grau de cesurabilidade da
conduta do agente, pode o Magistrado, com prudente
arbítrio, deixar de aplicar-lhe pena (e até mesmo pôr
77

termo à “persecutio criminis”). É que, nas ações humanas,


o Direito Penal somente deve intervir como providência
“ultima ratio”.

II. No intento de proteger os bens públicos (e


particulares) da ação nefasta de indivíduos de má indole
e refratários à disciplina social e aos bons costumes,
preveniu e reprimiu o legislador tais infratores,
cominando-lhes adequada sanção.

A Justiça Penal, empenhada sempre em dar a cada


um o que merece, não se tem demitido deste árduo e
imperioso ofício, como o ilustram os acórdãos adiante
reproduzidos, do Tribunal de Alçada Criminal do
Estado de São Paulo:
78

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL


DÉCIMA Q UINTA CÂMARA

Apelação Criminal nº 1.279.311/5


Comarca: Araraquara
Apelante: TAS
Apelado: Ministério Público

Voto nº 3412
Relator

— O crime de dano não requer dolo


específico, senão genérico, que se
resume à simples voluntariedade de
inutilizar ou destruir coisa alheia
(art. 163 do Cód. Penal).
79

— Tratando-se de bem de uso comum


da coletividade, não é lícito ao
particular, ainda nos assomos de
cólera e sob o efeito de embriaguez
voluntária, danificar aparelho
telefônico (“orelhão”). A preservação
do patrimônio público deve ser
apanágio de todo cidadão.

— A substituição de pena corporal por


multa é desaconselhável se não
atende aos princípios que lhe devem
reger a aplicação: necessidade e
suficiência da reprovação e
prevenção do crime e edificação das
pessoas na observância da lei.

1. Inconformado com a r. sentença que proferiu o


MM. Juízo de Direito da 2a. Vara Criminal da
Comarca de Araraquara, condenando-o à pena de 6
meses de detenção e 10 dias-multa, substituída a pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos
(prestação de serviços à comunidade), por infração do
art. 163, parág. único, nº III, do Código Penal, interpôs
recurso para este Egrégio Tribunal, com o escopo de
reformá-la, TAS.

Em seu arrazoado recursal, afirma que o fato que


lhe foi imputado praticara-o sem dolo; pelo que,
merecia absolvido.
80

Acrescenta que, no dia em que danificara o


telefone público, estava embriagado.

Pleiteia, destarte, absolvição ou aplicação de pena


de multa somente (fls. 74/78).

A douta Promotoria de Justiça respondeu ao


recurso, refutando-lhe os argumentos; de igual passo,
propugnou a manutenção da r. sentença de Primeiro
Grau (fls. 80/83).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


esmerado e escorreito parecer do Dr. José Eduardo
Diniz Rosa, opina pelo improvimento da apelação (fls.
90/94).

É o relatório.

2. A Justiça Pública meteu em processo o réu porque,


aos 9 de março de 2000, na Rua Deputado Emílio
Carlos (Vila Melhado), na bela cidade de Araraquara,
danificou um aparelho telefônico público (“orelhão”), de
propriedade da Telefônica, concessionária de serviços
públicos.

Reza a denúncia que policiais militares foram


solicitados para atender a uma ocorrência de dano.
81

Constava que certo indivíduo, como não lograsse


completar uma ligação, acabara por seccionar o fone,
mediante uso de força muscular.

De posse das características do autor do fato, a


Polícia entrou a diligenciar e deteve-o nas adjacências.

Instaurada a persecução criminal, transcorreu o


processo na forma da lei; ao cabo, a r. sentença de fls.
66/68, julgando procedente a denúncia, condenou o
réu, o qual, jurando inocência, comparece perante esta
Segunda Instância, sonhando com absolvição.

3. A despeito dos bons esforços de seu ilustre


patrono, não há atender à pretensão do réu, visto que o
incrimina o conjunto probatório.

Na real verdade, em seu interrogatório judicial,


admitiu o réu, por miúdo, a autoria do fato criminoso.
Esclareceu que tentava comunicar-se por telefone com a
ex-mulher, porém não o conseguia. Irritado, dera com o
monofone contra o gancho, quebrando-o (fl. 45).

É certo que afirmara não era sua intenção danificar


o aparelho, ajuntando que estava embriagado.

A versão escusatória, no entanto, não merece


acolhida.
82

A razão é que apenas a embriaguez completa,


proveniente de caso fortuito ou força maior, elide a
imputabilidade penal, consoante a fórmula do art. 28
do Código Penal.

A lição de Damásio E. de Jesus faz muito ao


intento:

“Se o sujeito comete uma infração penal sob o efeito de


embriaguez, voluntária ou culposa, não há exclusão da
imputabilidade e, por consequência, não fica excluída a
culpabilidade. Ele responde pelo crime” (Código Penal
Anotado, 9a. ed., p. 118).

Por outra parte, o crime de dano não requer dolo


específico, senão genérico; este se traduz, como o
ressaltou o abalizado parecer da Procuradoria-Geral
de Justiça, “na simples voluntariedade de causar dano à
propriedade alheia”.

Esta, com efeito, é a licão dos mais reputados


autores:

“O resultado de dano é, neste crime, inseparável do


evento. Se há vontade e consciência de destruir,
inutilizar ou deteriorar, há, evidentemente, vontade de
causar dano e, pois, de prejudicar. O que pode ocorrer
é o concurso de outros fins que, se não mudam
83

o título do crime, são irrelevantes… Não se exige,


portanto, um específico animus nocendi” (Heleno
Cláudio Fragoso, Lições de Direito Penal, Parte
Especial, 1980, vol. II, pp. 26-27).

Comprovada a materialidade do fato (fls. 36/40) e


liquidada a culpa do réu, era sua condenação imperativo
de justiça.

Tratando-se de bem de uso comum da


coletividade, não é lícito ao particular, ainda nos
assomos de cólera ou sob o efeito de embriaguez
voluntária, danificar aparelho telefônico; o respeito ao
patrimônio público deve ser apanágio de todo cidadão.

A pena foi imposta segundo craveira módica:


a mínima, substituída por prestação de serviços à
comunidade.

O pedido de substituição da pena corporal por


multa não atenderia ao princípio que lhe deve reger a
aplicação: prevenir novos delitos, expiar a falta cometida
e edificar as pessoas na observância da lei.

Mantenho, por isso, ante os bons fundamentos em


que assenta, a r. sentença proferida pelo distinto e culto
Juiz Dr. Marcos Antonio Corrêa da Silva.
84

4. Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

São Paulo, 1º de novembro de 2001

Carlos Biasotti
Relator
85

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL


DÉCIMA Q UINTA CÂMARA

Apelação Criminal nº 1.209.491/2


Comarca: Avaré
Apelante: MSP
Apelado: Ministério Público

Voto nº 2438
Relator

— “A confissão livre é, sem contradição, a


prova mais peremptória, aquela que
esclarece, convence e satisfaz, no mais alto
grau, a consciência do Juiz: omnium
probationum maxima” (Cons. Vicente
Alves de Paula Pessoa, Código do
Processo Criminal, 1882, p. 157).
86

— Expressão incoercível do instinto


humano, o amor da liberdade elide
o caráter de ilicitude penal da fuga
do preso, exceto se empreendida
mediante violência contra pessoa ou
com dano do patrimônio público
(arts. 352 e 163 do Cód. Penal).

— Tratando-se de pena de curta


duração, não é defeso ao Magistrado
conceder ao condenado reincidente
o benefício do regime semiaberto, se
mais compatível com o critério de
suficiência para a reprovabilidade e
prevenção de novas infrações (art.
33, § 2º, letra c, do Cód. Penal).

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de


Direito da 1a. Vara da Comarca de Avaré, condenando-o
a cumprir, sob o regime fechado, a pena de 9 meses de
detenção, além de 15 dias-multa, por infração do art.
163, parág. único, nº III, do Código Penal, apela MSP para
este Egrégio Tribunal, com o intuito de reformá-la.

Nas razões que lhe apresentou dedicado e culto


patrono, alega não procedeu com dolo, visto que não
lhe estava no ânimo destruir, inutilizar ou deteriorar
coisa alheia; tão só o movia o intuito de recobrar a
liberdade, o que não constitui crime.
87

Pelo que, pleiteia à colenda Câmara digne-se


prover-lhe o recurso para o efeito de absolvê-lo (fls.
324/328).

Apresentou contrarrazões o douto representante


do Ministério Público: contrapôs sólidos argumentos à
pretensão da nobre Defesa e propugnou a manutenção
da r. sentença de Primeiro Grau (fls. 330/332).

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


sólido, incisivo e criterioso parecer da Dra. Eloisa de
Sousa Arruda, opina pelo improvimento do recurso (fls.
350/352).

É o relatório.

2. Foi denunciado o réu porque, no dia 20 de


fevereiro de 1997, pelas 2h, na Penitenciária Dr. Luciano
de Campos, em Avaré, procedendo em concurso e com
unidade de propósitos com outro indivíduo, destruiu as
barras de ferro da janela da cela, danificando o
patrimônio do Estado.

Rezam os autos que o réu e seu comparsa estavam


recolhidos naquele estabelecimento prisional e, na
referida data, serraram as barras de ferro de uma das
celas, destruindo-as.
88

Instaurada a persecução criminal, foi o réu, ao


cabo, condenado pela r. sentença de fls. 299/303.

Descontente, com a solução do pleito, espera que


esta colenda Corte de Justiça lhe atenda ao apelo,
absolvendo-o.

3. Da materialidade e autoria do fato imputado ao réu


há prova eloquente nos autos: o laudo pericial atesta
a veracidade da alegação da denúncia, isto é, que a
grade metálica de proteção da cela, onde se encontrava
recolhido o apelante, foi serrada (fl. 47).

As fotografias que ilustram o laudo pericial


demonstram-no seguramente (fls. 49/51).

A autoria confessou-a o apelante, acima de todo o


engano: “(…) ajudou a serrar a barra de ferro da cela”
(fl. 186 v.).

À vista da conclusão técnica irrefutável e da


confissão do réu, que se tem pela rainha das provas, foi
a certeza que serviu de base à prolação do edito
condenatório.

Com efeito, segundo a Doutrina clássica, a


confissão prestada em Juízo tem força absoluta:
89

“Ora, a confissão livre é, sem contradição, a prova mais


peremptória, aquela que esclarece, convence e satisfaz,
no mais alto grau, a consciência do Juiz: omnium
probationum maxima” (Cons. Vicente Alves de
Paula Pessoa, Código do Processo Criminal, 1882,
p. 157).

4. Ainda que próprio do homem o anseio de


liberdade – “Sempre a liberdade… Algo haverá mais
importante do que ela? Tenho para mim que dela depende a
definição do homem” (Goffredo Telles Junior, A Folha
Dobrada, 1999, p. 321) –, a fuga do condenado
constitui violação de dever inerente a seu estado e falta
disciplinar grave.

O detento que – deitando a barra mais longe –


destruir o patrimônio público, mesmo que sob color de
alcançar a amplidão da liberdade, esse comete o crime
previsto no art. 163, nº III, do Código Penal (dano
qualificado).

Damásio E. de Jesus, penalista de grande


suposição, discorreu do ponto nesta substância:

“O elemento subjetivo do tipo do crime de dano é


simplesmente o dolo, vontade de destruir, inutilizar ou
deteriorar coisa alheia. O tipo não exige qualquer outro
90

elemento subjetivo ulterior. Assim, responde por dano


qualificado o preso que danifica cela a fim de fugir, uma
vez que o motivo tendente à fuga não exclui o elemento
subjetivo próprio do crime. Dizer que o preso não comete
crime porque não tem a intenção específica de causar
prejuízo ao patrimônio público não é correto. Se o preso
tem vontade e consciência de destruir ou inutilizar a
grade que o prende, tem claramente vontade de causar
dano, e, em face disso, de prejudicar. O fim, que é
alcançar a liberdade, não tem força de excluir o
elemento subjetivo próprio do delito qualificado” (Código
Penal Anotado, 8a. ed., p. 548).

O Colendo Supremo Tribunal Federal, em ven.


aresto cuja ementa vai a seguir transcrita, proclamou
que:

“Responde por dano qualificado o preso que danifica cela


a fim de fugir, uma vez que o motivo tendente à fuga
não exclui o elemento subjetivo próprio do crime.

Se o preso tem vontade e consciência de destruir


ou inutilizar a grade que o prende, tem claramente
vontade de causar dano e, em face disso, de prejudicar. O
fim, que é alcançar a liberdade, não tem força de excluir
o elemento subjetivo próprio do delito qualificado” (Rev.
Tribs., vol. 731, p. 514; rel. Min. Carlos Velloso).
91

Pelo mesmo estalão tem decidido este Colendo


Tribunal:

“Responde pelo crime de dano qualificado o preso que


danifica a cela na tentativa de fuga, pois o elemento
subjetivo desse delito que é o dolo não fica excluído
pela alegação de que a evasão tem o fim de alcançar
a liberdade” (Rev. Tribs., vol. 755, p. 661; rel.
Devienne Ferraz).

As penas foram fixadas segundo legal e justa


craveira, alguma coisa acima do mínimo, por se tratar
de infrator de quatro costados, cuja folha de
antecedentes o não recomenda a menções honrosas.

Conquanto reincidente, o regime prisional pode


ser o intermediário, havendo consideração à quantidade
e a espécie da pena (9 meses de detenção).

A reincidência, quanta é de si mesma, não obriga


à fixação do regime de extrema severidade:

“O disposto no art. 33, § 2º, a e c, do Cód. Penal, impõe


o regime inicial fechado ao réu reincidente. Há, porém,
que se atender às particularidades do caso, sob pena de
ofensa ao princípio da individualização da pena.

É fundamental observar os requisitos objetivos e


subjetivos, mesmo quando se tratar de reincidência. Não
há por que dar ao réu que não demonstra possuir grau
92

de culpa intensa, cuja personalidade e conduta não


revelam traços de periculosidade ou temerabilidade
social, o mesmo tratamento dado a quem é participante
de criminalidade de alta periculosidade” (STJ; REsp.
nº 196.940-DF; 6a. Turma; j. 20.4.99, v.u.; DJU
17.5.99, p. 263).

5. Pelo exposto, dou provimento parcial ao recurso para


fixar ao apelante o regime semiaberto, mantida no mais
a r. sentença de Primeira Instância.

São Paulo, 12 de setembro de 2000

Carlos Biasotti
Relator
93

(Foto 1: Estátua de Borba Gato)

(Foto 2: Prédio do Ministério da Agricultura)


94

Notas

(1) Código Penal Anotado, 18a. ed., p. 622; Editora


Saraiva.
(2) “Pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação
ou monumento urbano” (art. 65 da Lei nº 9.605/98: Lei do
Meio Ambiente).
Pena — detenção, de três meses a um ano, e multa.
Trabalhos Jurídicos e Literários de
Carlos Biasotti

1. A Sustentação Oral nos Tribunais: Teoria e Prática;


2. Adauto Suannes: Brasão da Magistratura Paulista;
3. Advocacia: Grandezas e Misérias;
4. Antecedentes Criminais (Doutrina e Jurisprudência);
5. Apartes e Respostas Originais;
6. Apelação em Liberdade (Doutrina e Jurisprudência);
7. Apropriação Indébita (Doutrina e Jurisprudência);
8. Arma de Fogo (Doutrina e Jurisprudência);
9. Cartas do Juiz Eliézer Rosa (1a. Parte);
10. Citação do Réu (Doutrina e Jurisprudência);
11. Crime Continuado (Doutrina e Jurisprudência);
12. Crimes contra a Honra (Doutrina e Jurisprudência);
13. Crimes de Trânsito (Doutrina e Jurisprudência);
14. Da Confissão do Réu (Doutrina e Jurisprudência);
15. Da Presunção de Inocência (Doutrina e Jurisprudência);
16. Da Prisão (Doutrina e Jurisprudência);
17. Da Prova (Doutrina e Jurisprudência);
18. Da Vírgula (Doutrina, Casos Notáveis, Curiosidades, etc.);
19. Denúncia (Doutrina e Jurisprudência);
20. Direito Ambiental (Doutrina e Jurisprudência);
21. Direito de Autor (Doutrina e Jurisprudência);
22. Direito de Defesa (Doutrina e Jurisprudência);
23. Do Roubo (Doutrina e Jurisprudência);
24. Estelionato (Doutrina e Jurisprudência);
25. Furto (Doutrina e Jurisprudência);
26. “Habeas Corpus” (Doutrina e Jurisprudência);
27. Legítima Defesa (Doutrina e Jurisprudência);
28. Liberdade Provisória (Doutrina e Jurisprudência);
29. Mandado de Segurança (Doutrina e Jurisprudência);
30. O Cão na Literatura;
31. O Crime da Pedra (Defesa Criminal em Verso);
32. O Crime de Extorsão e a Tentativa (Doutrina e Jurisprudência);
33. O Erro. O Erro Judiciário. O Erro na Literatura (Lapsos e
Enganos);
34. O Silêncio do Réu. Interpretação (Doutrina e Jurisprudência);
35. Os 80 Anos do Príncipe dos Poetas Brasileiros;
36. Princípio da Insignificância (Doutrina e Jurisprudência);
37. “Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra?”;
38. Tópicos de Gramática (Verbos abundantes no particípio;
pronúncias e construções viciosas; fraseologia latina, etc.);
39. Tóxicos (Doutrina e Jurisprudência);
40. Tribunal do Júri (Doutrina e Jurisprudência);
41. Absolvição do Réu (Doutrina e Jurisprudência);
42. Tributo aos Advogados Criminalistas (Coletânea de Escritos
Jurídicos); Millennium Editora Ltda.;
43. Advocacia Criminal (Teoria e Prática); Millennium Editora
Ltda.;
44. Cartas do Juiz Eliézer Rosa (2a. Parte);
45. Contravenções Penais (Doutrina e Jurisprudência);
46. Crimes contra os Costumes (Doutrina e Jurisprudência);
47. Revisão Criminal (Doutrina e Jurisprudência);
48. Nélson Hungria (Súmula da Vida e da Obra);
49. Ação Penal (Doutrina e Jurisprudência);
50. Crimes de Falsidade (Doutrina e Jurisprudência);
51. Álibi (Doutrina e Jurisprudência);
52. Da Sentença (Doutrina e Jurisprudência);
53. Fraseologia Latina;
54. Da Pena (Doutrina e Jurisprudência);
55. Ilícito Civil e Ilícito Penal (Doutrina e Jurisprudência);
56. Regime Prisional (Doutrina e Jurisprudência);
57. Alimentos (Doutrina e Jurisprudência);
58. Estado de Necessidade (Doutrina e Jurisprudência);
59. Receptação ((Doutrina e Jurisprudência);
60. Inquérito Policial. Indiciamento ((Doutrina e Jurisprudência);
61. A Palavra da Vítima e seu Valor em Juízo;
62. A Linguagem do Advogado;
63. Memorando aos Colegas da Advocacia e da Magistratura;
64. Código de Defesa do Consumidor (Casos Especiais em Matéria
Criminal);
65. Crime de Dano (Doutrina e Jurisprudência);
66. Nulidade Processual (Doutrina e Jurisprudência);
67. Da Coação no Direito Penal (Doutrina e Jurisprudência);
68. Violação de Domicílio (Doutrina e Jurisprudência);
69. Indenização (Doutrina e Jurisprudência);
70. Desistência Voluntária (Doutrina e Jurisprudência);
71. A Embriaguez e o Direito Penal (Doutrina e Jurisprudência).
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Crime de Dano (Doutrina e Jurisprudência) Carlos Biasotti

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