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Resumo. A ninguém é lícito violar, sem justa causa, a ordem jurídica; por
isso, aos infratores são cominadas penas, que são o salário do crime. A não
haver punição para o transgressor da lei, tornava-se impossível a vida em
sociedade.
PODER JUDICIÁRIO
Voto nº 10.480
Relator
(1) “Quis ignorat maximam illecebram esse peccandi impunitatis spem?” (“Pro
Milone”, 16, 43).
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a) Introdução
Nos arrazoados forenses, decisões, sentenças e artigos jurídicos,
aproveita muito ao prestígio da forma literária, no caso de vir a ponto,
a citação de brocardos do Direito e máximas da experiência.
Em verdade, o advogado(2), quando deduz em juízo uma
pretensão, e o juiz(3), ao fundamentar suas sentenças e despachos, não
lhes é defeso cultivar em grau assinalado a arte de bem escrever.
Ora, da petição inicial e dos arrazoados forenses sempre foi
apanágio a clareza e a precisão, que por força pressupõem a ciência e o
domínio dos cabedais da língua; numa palavra: a boa exação
gramatical(4). Outro tanto, em referência às decisões do Poder
Judiciário, que serão fundamentadas, “sob pena de nulidade” (art. 93,
nº IX, da Const. Fed.). Neste particular, a expressão verbal apropriada,
exata e escorreita é a que satisfará ao preceito da lei(5).
14. “Qui parcit virgae odit filium suum; qui autem diligit illum instanter
erudit” (Prov. XIII, 24). Aquele que poupa a vara aborrece seu
filho; mas o que o ama, continuamente o corrige (Bíblia
Sagrada, 1881, t. I, p. 677; trad. Antônio Pereira de Figueiredo).
15. “Quos amo, arguo et castigo. A quem amo, advirto e castigo” (apud Rui
Barbosa, A Imprensa e o Dever da Verdade, 1920, p. 67).
16. “Pena de talião — É uma lei que remonta à Antiguidade mais remota,
pois figura nos livros sagrados. A Bíblia esclarece, no Êxodo, que
ela consiste em infligir, ao autor de uma transgressão, punição
em tudo igual ao crime” (R. Magalhães Júnior, Dicionário de
Provérbios e Curiosidades, 1960, p. 213).
17. “Suprima-se a pena (quod Deus avertat) e o crime seria, talvez, a lei da
maioria” (Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, 1978, vol.
I, t. II, p. 196).
18. Não deve contudo a pena ter caráter só retributivo ou de
expiação pelo mal praticado; há de ser também medida salutar
de defesa social e meio de reeducação do infrator. Na frase
original de Platão, deve ser a medicina da alma (cf. Revista da
Faculdade de Direito de São Paulo, vol. 419, p. 96).
19. A pena deve operar no infrator a finalidade que lhe reconhecia
já o divino Platão: medicina da depravação moral (cf. Górgias, cap.
XXIV).
20. “A pena-retributiva jamais corrigiu alguém” (Nélson Hungria,
Comentários ao Código Penal, 1980, vol. I, t. I, p. 14).
21. A prisão é crime pior que o cometido pelo sentenciado, seja qual for
(Bernard Shaw; apud Ataliba Nogueira, Pena sem Prisão, 1956,
p. 9). O cárcere: “la scuola normale del delitto” (Colajanni; apud
Valdemar César da Silveira, Sentenças Criminais, 1941, p. 79).
22. Além de corretivo do infrator, a pena é cominada e aplicada para
aterrar e afastar do crime os espíritos tendentes ao mal (Filangieri;
apud Fernando Nery, Lições de Direito Criminal, 3a. ed., p. 350).
23. Palavras do magistrado francês Osvaldo Bardot: Consultai o
bom-senso, a equidade, o amor do próximo, antes da autoridade e da
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tradição. A lei se interpreta. Ela dirá o que quiserdes que ela diga. Sem
mudar um til, pode-se, com os mais sólidos considerandos do mundo,
dar a razão a uma parte ou a outra, absolver ou condenar à pena
máxima. Desse modo, que a lei não vos sirva de álibi (apud Jucid
Peixoto do Amaral, Manual do Magistrado, 4a. ed., p. 42).
24. A nímia liberalidade na aplicação do texto legal pode desfechar
em impunidade, mas a moderação em impor penas ao réu
passa por pedra de toque do verdadeiro julgador.
25. A jurisprudência dos Tribunais preconiza que, em se tratando
de réu primário, “a regra é partir da pena-base no grau mínimo”
(cf. Celso Delmanto, Código Penal Comentado, 5a. ed., p. 107).
26. Consequência forçosa do delito, a pena é “o meio de garantia
social de reduzir o criminoso à impossibilidade de prejudicar, ou de
torná-lo inofensivo, tendo como fim principal a segurança pública”
(João Vieira; apud Fernando Nery, Lições de Direito Criminal,
1933, p. 356).
27. Justiça excessiva não é senão injustiça, proclamou com assaz
de razão o eloquente Cícero: “Summum jus, summa injuria” (“De
Officiis, I, 10).
28. É incensurável — porque não apenas legítima e justa, mas
também sábia — a decisão que substitui por prestação
pecuniária (consistente em doação de cesta básica) a prestação
de serviços à comunidade imposta a autor de estelionato que,
trabalhador rural, não a podia cumprir sem notável prejuízo
de suas atividades. Não esqueça aos aplicadores do Direito a
advertência de Anatole France: Se a lei é morta, deve-lhe o Juiz dar
vida.
29. “A pena é força de reserva na defesa da ordem jurídica” (Nélson
Hungria, Comentários ao Código Penal, 1980, vol. VII, p. 182).
30. A exasperação da pena do réu, em caso de crime cometido
contra velho, bem se justifica. A velhice é coisa sagrada;
ofender um velho, na elegante expressão de um escritor, “é
apedrejar uma árvore carregada de frutos” (Alberto Pimentel, Vinte
Anos de Vida Literária, 1908, p. 39).
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93. Incorre nas penas da lei (art. 342, § 1º, do Cód. Penal) a
testemunha que, ao depor em processo-crime, falta com a
verdade acerca de fato juridicamente relevante, com o intuito
de favorecer o réu. A mentira não pode ter entrada no templo
da Justiça! Se exerce ocupação lícita e tem filhos menores,
a mulher condenada por falso testemunho, ainda que
reincidente, faz jus à substituição de sua pena privativa de
liberdade por restritivas de direitos, medida socialmente
recomendável (art. 44, §§ 2º e 3º, do Cód. Penal).
94. De presente, já não é lícito ao Juiz dar ao art. 127 da Lei de
Execução Penal outra interpretação que a literal restrita, por
força da Súmula Vinculante nº 9, editada pelo Supremo Tribunal
Federal, que mandou inscrever entre os dogmas jurídicos a
perda, para o condenado “que for punido por falta grave”, do
direito ao tempo remido pelo trabalho.
95. Embora inaptos para configurar a agravante da reincidência
(art. 64, nº I, do Cód. Penal), condenações pretéritas do sujeito
sempre lhe caracterizam maus antecedentes, que o cálculo da
pena-base não pode relegar à sombra. Com efeito, não há ficar
indiferente o julgador ao passado de crimes do indivíduo,
quando lhe examina o perfil moral. Enfim, somos o que
fomos!
96. Mais que meras conjecturas acerca da culpabilidade do
acusado, são necessárias, para sua condenação, provas tão
claras como a luz meridiana: “probationes luce meridiana clariores”
(cf. Giovanni Brichetti, L’Evidenza nel Diritto Processuale Penale,
1950, p. 111).
97. Não cabe censura à decisão do Magistrado que, forte no poder
discricionário que lhe confere a lei, aplica a usuário de drogas a
pena de prestação de serviços à comunidade, em vez de
advertência (art. 28, ns. I e II, da Lei nº 11.343/06). Tal medida
não tem somente caráter retributivo, próprio de toda a pena,
mas atende ao fim precípuo de recuperar o viciado, com
espertar-lhe na consciência o sentido pleno da vida e
fortalecer-lhe a vontade para que evite os malefícios das
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