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ISSN: 2519-7207 Vol.

3, Nº 09, Ano III, Julho - Dezembro de 2016

Linchamento na Província de Sofala:


Causas, Consequências e Tipo de Crime

Autor: João Isaías Pagara


Pesquisador do ISCTAC – Delegação da Beira
Email: joaoisaiaspagara@gmail.com

Este artigo versa a questão de anatomia de Linchamento na Província de Sofala, sobretudo na Cidade da
Beira, no período de 2010 a 2015. Observa-se que os linchamentos são os crimes cometidos devido à insegu-
rança da população decorrente do sentimento de esvaziamento e de inaplicabilidade das normas penais. Ana-
lisa-se a atuação dos chamados “justiceiros” que, ao lincharem os criminosos, fazem “justiça com as próprias
mãos”, tendo como justificativa a insegurança e a impunidade existentes nos aglomerados urbanos.

Introdução CP), na esfera da política criminal.


O presente artigo, constitui o cul-
O presente artigo versa sobre o minar de um estudo sobre o Dilema
impacto de linchamento na Província dos Linchamentos em Moçambique,
de Sofala, no intuito de perceber as em particular a cidade da Beira, no
causas e a consequências que este período compreendido entre 2010 a
tipo de crime pode gerar a nível da 2015. Descreve o presente trabalho,
sociedade. A prevalência de alto em linhas mestras, a problemática
índice de crimes de linchamentos, dos linchamentos no Ordenamento
onde por sua vez a capital de Sofala Jurídico Moçambicano, e particular-
(Cidade da Beira) regista um número mente na Cidade da Beira, onde a
12 Casos, de acordo com último infor- evolução deste, ocorre de forma gra-
ma da Procuradoria-Geral da Repú- ve, acentuada e escandalosa. Entre-
blica de 2015, é um dado extrema- tanto, já há muito que se discute, a
mente preocupante. Preocupante problemática de linchamentos em
ainda, reside no facto de, a PGR, no Moçambique, pelo seu histórico
último informe, não ter avançado característico fatigante, no que se
nenhum aspectos ligados a preven- relaciona a solução.
ção dos crimes, e em particular o cri- O estudo cingiu na análise sobre
me de linchamento (Artigo 158 do a anatomia dos linchamentos em

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Moçambique, e teve como estudo chamentos em Moçambique, em
de caso na Província de Sofala, no especial destaque na Província de
período compreendido entre 2010 à Sofala. A escolha do tema deveu-se
2015. Ao longo dos tempos, se tem pela sua pertinência e pela situação
destacado a nível das ciências caótica instalada nesta província.
humanas e sociológicas do direito,
que o crime e a violência, são fenó- Problematização
menos que caracterizam a existência
humana na comunidade políticas e Na actualidade, em Moçambi-
constituem hoje factos problemáticos que, em especial na província de
na sociedade em todo o mundo, ou Sofala verifica-se um aumento subs-
seja, não se trata tão-somente do tancial de casos de linchamentos
problema da Ordem Jurídica sobretudo na cidade da Beira, com
Moçambicana. Todavia entretanto, é focos no Bairro da Munhava e Man-
sempre importante referir que, são ga, este facto tem gerado grandes
inúmeros factores que fazem com consequências, visto que nesta onda
que o mundo, seja caracterizado por de crimes, os populares acabam lin-
casos sempre crescentes e alarman- chando em várias vezes pessoas ino-
tes dos crimes e da violência e na sua centes. A situação acima descrita
maioria, poucos conhecidos ou de tem sido discutida na actualidade
difícil conceptualização. pelo facto que em Moçambique ser
Contudo, queremos recordar que, destacado como um dos países com
a violência e o crime não são simples- maior índice de criminalidade e o lin-
mente fenómenos dos países em chamento como um dos crimes mais
desenvolvimento mas também dos frequentes em especial destaque na
desenvolvidos, pela multiplicidade de Cidade da Beira. E só a paz que
factores que os fazem emergir. Em pode trazer a dignidade e o respeito
quase todo o mundo, subentende-se pelos direitos humanos como o da
apesar de ser de formas variadas, vida e liberdade. Neste contexto, é
que quase são as mesmas causas por isso que se levanta a seguinte
que geram a violência e o crime, questão: Qual é a anatomia dos lin-
dentre as mais comuns as mais anor- chamentos em Moçambique sobretu-
mais. Entretanto, seria necessaria- do na cidade da Beira? Os estudos
mente importante distinguir no pre- centraram-se numa hipótese primá-
sente artigo que, a violência e o cri- ria, segundo a qual a intensificação
me apesar de serem quase parecidas da capacitação dos polícias em
e de difícil conceptualização não sig- matéria criminal sobretudo roubo e
nificam a mesma coisa. E na even- duas hipóteses Secundarias, a forma-
tualidade, alguém poderia questio- ção e capacitação de polícias em
nar: mas porquê? Os factos acima matéria criminal e a sensibilização da
referenciados impulsionaram bastan- população em geral sobre os malefí-
te a elaborar este artigo que tem o cios advogados da prática de crime
intuito de analisar o impacto dos lin- de linchamento.

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Procedimentos Metodológicos Desta forma esta técnica foi usada
na segunda fase onde elaborou-se
Santos (2000, p. 21) explica que as um questionário e usou-se uma amos-
pesquisas podem ser caracterizado tra composta por 120 pessoas, locali-
como exploratórias, descritivas ou zadas na província de Sofala, cidade
explicativas. Comenta que “a pesqui- da Beira. A recolha foi conduzida
sa exploratória é quase sempre ante- segundo a amostragem estratificada,
cedida com o levantamento biblio- a mesma baseada no número total
gráfico, entrevistas com profissionais de inquiridas na Província.
que estudam ou actuam na área,
visitas à web, wesites etc”. Esta pes- Linchamento: Análise do Fenómeno
quisa tratou-se de exploratória. A
metodologia centrou-se na pesquisa O fenómeno desolador designa-
bibliográfica, técnica documental e do linchamento, teve o seu início nos
administração de questionários. A primórdios das coisas, ligados aos
pesquisa bibliográfica, segundo Gil princípios bíblicos, que rezávamos de
(1999, pp. 44-45) “é desenvolvida forma clara e inequívoca a execu-
com base em material já elaborado, ção de indivíduos que se subenten-
constituído principalmente por livros e diam pecadores, ou desobedientes a
artigos científicos”. Nesta pesquisa qualquer ordem normativa a que lhes
baseou-se em livros e manuais que dizia respeito. Esta prática, passou a
abordam a temática em estudo. A ser exercida igualmente pelo poder
técnica documental, segundo Gill do Estado, que servia como forma
(1999), citado por Silva e Menezes sancionatória a prática de actos que
(2001:23), esta técnica consiste na na altura se subentendiam como
recolha de dados sobre o tema de ofensivos as leis e os costumes. De lá
pesquisa. Para Lakatos e Marconi até cá, as práticas foram ganhando
(1979:29), esta técnica consiste na mais apimento, sendo utilizada hoje
recolha e revisão das fontes primárias como forma mais privatizada de justi-
e secundárias. Assim, no primeiro ça informal (Serra, 2008).
momento, foi efectuado o levanta-
mento de dados em documentos, o Violência e o Linchamento
que permitiu conhecer o tema de for-
ma teórica e de seguida foi se ao A violência pela definição da
campo de estudo, neste caso as dife- OMS, trata-se necessariamente de
rentes Instituições e com as diferentes uso intencional da força física ou do
pessoas de vários níveis. Finalmente, o poder real ou ameaças contra pes-
questionário pode ser definido como soa ou contra si próprio, contra outro
uma técnica de investigação social grupo, que resulte ou tenha possibili-
composta por um conjunto de ques- dade em resultar em lesão, morte,
tões que são submetidas a pessoas dano psicológico, deficiência de
com propósito de obter informações desenvolvimento, ou privação. Subs-
sobre conhecimentos (GIL, 1999). crevemos em parte o conceito da

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OMS, mas prefiro definir Moçambicano, em relação a justiça
pelas próprias mãos não param por
Violência como o uso da força, aí. Serra, bombardeia ainda ao referir
seja física ou não, de forma que “linchamento existe quando o
voluntaria ou inconsciente con-
tra outrem podendo causar um
Estado é fraco”. Pode surgir nestas
dano físico ou psicológico, ime- circunstâncias como uma espécie de
diato ou futuro. Implica o uso de privatização da justiça, onde as pes-
força somente, e não da força soas se sentem intranquilas e indigna-
física porque entendo que o uso das. As pessoas muitas vezes não
de forca pode ocorrer não só
de forma física mas também de
confiam na polícia e acabam por
forma psicológica, dai residindo fazer justiça com as próprias mãos. É
a diferença entre a coação e portanto uma indignação, uma puni-
coerção, tratando-se de que ção, uma justificação e é a busca de
ambos são uso de força, mais um bode expiatório também. Acon-
cada um de acordo com a sua
forma de manifestação
tece muitas vezes que quem é lincha-
do não é aquele que roubou, mas
Segundo o Serra (2008), lincha- aquele que se julga que terá rouba-
mento trata-se necessariamente, da do ou é aquele que paga por todas
execução sumária de uma ou mais (Serra, 2008).
pessoas, suspeita ou acusada infor- O código Penal, no seu artigo
malmente da prática de um suposto 159, em relação ao linchamento
crime, por um grupo mais ou menos sublinha:
Aquele que se ajuntar para
esclarecido de pessoas. Estes espan- animar, instigar ou executar,
camentos, que muitas das vezes são com espontaneidade, imita-
mortais, protagonizados por popula- ção, influência mútua, emo-
res contra alegados criminosos, têm ção e fúria, utilizando ou não
ocorrido em algumas cidades instrumentos contundentes, com
o fim de torturar, espancar,
moçambicanas e os especialistas atear fogo a outra pessoa, sob
referem que a população justifica suspeita de criminoso, será con-
estas chamadas "execuções sumárias denado, se pena mais grave
informais" com a falta de confiança não couber, a pena de prisão
no Máquina Estatal que deveria com- de dois a oito anos se tiver agi-
do como executor e dos actos
bater melhor a insegurança das resultar morte da vítima; pena
populações SERRA (2008). de prisão se tiver agido como
Para o Sociólogo Moçambicano animador ou instigador e dos
Carlos Serra, os linchamentos da sua actos resultar a morte da vítima;
versão mais clássica, as vítimas do lin- e a pena de prisão até seis
meses, em qualquer das posi-
chamento frequentemente em ções dos autores referidos nas
Moçambique, jovens desemprega- alíneas anteriores, e dos actos
dos do sexo masculino. Pelo menos resultar ofensas corporais e feri-
até agora ainda não se ouviram mentos”.
situações de mulheres a sofrerem o
linchamento. Os fuzis do sociólogo No que tange a crime de Lincha-

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mento, em Moçambique, verifica-se titular directo na prevenção criminal,
muitos casos mas que nenhum prati- e a segunda, o Estado como titular
camente foi condenado por tal cri- activo. Certamente que, as máquinas
me, o que levanta algumas dúvidas da administração da justiça, estão
na materialização desta posição da circundados por patologias funcio-
lei acima fundamentada. nais graves, mas há que chamar
atenção ao Estado, dos reais proble-
Causas Frequentes dos Linchamentos mas existentes, e resolve-los.
O descrédito monta-se por um
O problema principal nos lincha- lado porque não existe uma conexão
mentos, não consiste em saber como subjectiva entre os órgãos da admi-
pode o Estado, fazer face ao vulcão nistração da justiça e a comunidade
deste fenómeno, em saber quais são política, por outro lado, a maioria dos
as causas primordiais, ou seja causas membros da comunidade não estão
das causas. E assim sendo, pode-se providos de cultura jurídica. Quando
apontar como as seguintes, principais a comunidade, executa por critério
causas dos linchamentos apontados próprio um individuo, não só arran-
pelo sociólogo Moçambicano, Carlos cam o papel punitivo do Estado,
Serra: elevado índice de criminalida- como também, bloqueiam a este
de em Moçambique; deficiente fun- como o único detentor do IUSE IMPERI
cionamento dos aparelhos formais de – Poder de autoridade.
justiça Moçambicana; e descrédito Dentre vários impactos que os lin-
do sistema de justiça pelos cidadãos chamentos trazem, os pesquisadores
Moçambicana e Bloqueio dos apare- do ISCTAC, descrevem os seguintes:
lhos informais de justiça face aos
aparelhos formais. O Furto do Papel Punitivo do
Estado Por Pessoas Alheias Ou
Recessão Crítica as Causa Ilegítimas; inversão do Carácter
Preventivo da Pena Para o
Carácter Retributivo; assassinato
Criminalidade galopante certa- de inocentes e violação do
mente pode levar ao linchamento, princípio de presunção (artigo
mas não quando as máquinas for- 59 CRM - 2004) de inocência e
mais da administração da justiça, fun- atropelo ao direito a vida
(artigo 40 CRM - 2004); constru-
cionarem correcta e devidamente. O ção da personalidade delin-
factor substancial do elevado índice quente no seio das crianças.
da criminalidade, em parte aponta-
se a efectivação da política criminal, Furto do Papel Punitivo do Estado
de prevenção participada, e de pre- Por Pessoas Alheias ou Ilegítimas
venção estatal activa. Na prevenção
participada, de acordo com o mode- O Estado, é o titular activo da atri-
lo que será representado no capítulo buição da pena, pelo poder de auto-
a seguir, (Pirâmide do Iceberg), con- ridade que este detém, sustentado
siste no uso da comunidade como pelo contrato social, onde as pes-

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soas, abdicam dos seus direitos para concretamente no artigo 59, refere
o corpo social, quebrando o estado em torno do princípio da presunção
da natureza onde existe a lei dos da inocência e por outro lado, a mes-
mais fortes em detrimento dos mais ma lei, não abre mão de um direito
fracos. Na medida, em que os popu- fundamental, conhecido como o
lares fazem a justiça pelas próprias direito a Vida, que constitui hoje, uma
mãos, arrancam o papel punitivo do cláusula pétrea – Norma de eficácia
Estado. Nestas circunstâncias, refira- constitucional absoluta que não
se que, quem tem o poder de julgar, pode ser alterada por emenda cons-
usando meios penais adequados é titucional – sendo que este dispositivo,
única e exclusivamente o Estado, por não pode ser alterado por uma revi-
via dos tribunais segundo defende são constitucional, ou por emenda
BLACK (1983). A comunidade, não constitucional. Porém, um cidadão,
tem legitimidade de agir, sem que o ou ser acusado de roubo ou de qual-
Estado atribua o poder de acção. quer outro tipo leal de crime, de for-
ma informal, perde a capacidade de
Inversão do Carácter Preventivo da se defender e com isto provar a sua
Pena Para o Carácter Retributivo inocência. Entretanto, este facto,
pode criar constrangimentos, tendo
Neste aspecto, toca-se de forma em conta de que, se não for observa-
directa politica criminal, no contesto do de forma detalhada este fenóme-
preventivo. A pena em Moçambique, no, acaba-se por via de uma fúria
tem carácter preventivo e não retri- popular, linchar-se pessoas inocentes,
butivo. Segundo as lições da Professo- tal como o caso da imagem anterior-
ra Teresa Beleza, em vários ordena- mente destacada.
mentos jurídicos, a pena tem o
carácter preventivo, e tem como Análise do Fenómeno em Concreto
objectivo, a prevenção da socieda-
de, pelas práticas futuras de ilicitudes. Nos linchamentos, ocorre que,
O carácter retributivo consiste no antes da sua execução, o infractor
pagamento do mal pelo mal. Este ou o presumível criminoso, é neutrali-
carácter da pena se verificou no zado por um aglomerado grupo de
código de Hamurabi, na lei de Talião, pessoas que pretendem agredir.
“Dente por Dente Olho por Aqui, descarta-se a ideia da impossi-
Olho” (BELEZA, 1984). bilidade de recorrer a força pública.
E o linchamento pela sua carac- O que acontece, é que os linchado-
teriza, além de ser executada por res, não se interessam ou nem preten-
quem não tem legitimidade e neste dem que haja a intervenção da for-
caso, passaria a ser o Estado, por via ça pública. Aqui, as pessoas, arran-
de uso de seus meios coercivos e per- cam o papel do Estado, em condi-
suasivos de fazer cumprir a justiça ções que este pode desempenhar a
(Beleza, 1984). A Constituição da sua função de salvaguarda e defesa
República de Moçambique de 2004, de direitos de cidadãos (Sitoe, 2012).

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No linchamento, não existe a pro- não começa necessariamente da
porcionalidade, em termos do bem a Polícia, ou seja, a polícia não é um
ser sacrificado, ser do valor jurídico único actor na prevenção do crime.
inferior, salvo ou que se pretenda sal- É preciso envolver mais actores que
var. No linchamento, sacrifica-se por- de forma activa, possam contribuir
tanto, entre outros bens, a integrida- de forma directa na prevenção do
de física e em casos mais graves a crime. A política criminal, como um
vida. Para os linchadores, só interessa conjunto sistemático de métodos
a punição do linchado e que aquilo, estatais para fazer face ao crime, por
sirva de exemplo (SITOE, 2012). Entre- via de prevenção e repressão, consi-
tanto, os pontos problemáticos de dera-se um instrumento importante,
imputação da responsabilidade cri- na erradicação do fenómeno crimi-
minal para este tipo legal de crime nal. Assim sendo, com base no estu-
igualmente consistem em dificuldade do efectuado, o grupo de pesquisa-
de identificação dos respectivos dores e investigadores, subentende
agentes do crime; cumplicidade que
generalizada por parte de quem o
pratica, o que dificulta as respostas “a erradicação dos linchamentos
essenciais da investigação criminal passa necessariamente pelo
estancamento de todos os facto-
como: Quem praticou? Acusação e res de risco que florescem a cri-
custódia precipitada e desesperada minalidade galopante, particular-
de indivíduos que caíram nas mãos mente (crimes de roubo, assalto a
do azar no momento da recolha. residência e violações), por via
No processo de prevenção do cri- da prevenção criminal, com base
na Teoria da Prevenção do Crime
me e violência no contesto moçam- no Modelo da Pirâmide do ICE-
bicano face as ondas dos linchamen- BERG - TPCMPI ”:
tos, há um conjunto de factores de
risco na prevenção do crime de lin- Prevenção do crime com base no modelo da
pirâmide do ICEBERG (Montanha de Gelo) - PCM-
chamento, com destaque para a PI
limitação do aparelho legislativo pela
ineficácia da norma jurídica; ineficá-
cia dos sistemas da administração de
justiça ou a desconfiança na máqui-
na judiciária

Mecanismos Para Prevenir o Crime de


Linchamento na Esfera da Política
Criminal

A prevenção do crime de lincha-


mentos, como qualquer outro tipo
legal de crime, contraditoriamente
ao que se entende no senso comum,

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Assim sendo, a prevenção deste fundamental, na prevenção, crie
tipo de crime como outros tipos sub- mecanismos como: solidificação de
jectivos, tem seguintes formas preven- efectivos, patrulhamentos em zonas
tivas que devem fazer parte da políti- de risco, prontidão policial em caso
ca criminal, tendo como acção a de denúncia, esclarecimento à
prevenção na Base da Pirâmide do comunidade em relação aos trâmites
ICEBERG – Nível 1, a prevenção processuais e a ressurreição do minis-
media na pirâmide do ICEBERG – tério público do cemitério onde sua
Nível 2 e a prevenção no topo da alma se encontra a desancar.
pirâmide do ICEBERG – Nível 3 Ao Ministério público é chamado
Como efectivar a prevenção do a ressuscitar dos bastidores, e em
crime na base da pirâmide do ICE- conexão com a PRM, ajudem no
BERG – nível 1? Antes de olhar a Polí- esclarecimento dos trâmites do pro-
cia, como único actor na prevenção cesso-crime em relação as comuni-
do crime, é preciso atender de que, dades. Este papel igualmente, se
antes mesmo de que a polícia tome acresce aos tribunais, mas importa
o papel preventivo, a prevenção do clarificar que, não basta somente
linchamento como qualquer outro absolver por insuficiência de prova,
tipo subjectivo de crime, deve come- mas que pressione o Ministério Publico
çar na comunidade. É imperativo a fazer o seu trabalho.
que, a população seja vigilante e de A prevenção do crime no topo
um auxílio a máquina estatal na pre- da pirâmide do iceberg – nível 3,
venção do crime e passe a confiar este, papel é lançada a máquina
na justiça estatal como a que exerce legislativa e executiva. Quanto a
por mérito a titularidade de punibili- máquina legislativa, não basta
dade. Há que levar a cabo a vigilân- somente estatuir no Código Penal e
cia comunitária, através de mecanis- sua instrumental, ou em qualquer
mos de alerta e denúncia. outra legislação extravagante que
Como materializar a prevenção LINCHAR é crime. Isto não é suficien-
do crime media na pirâmide do ICE- te. É preciso criar mecanismos claros
BERG – nível 2? Na prevenção em e específicos de ter uma norma legis-
segunda instancia, a comunidade, lativa sancionatória que não entre
deixa e ser o titular activo da preven- em desuso por ineficácia absoluta. A
ção do crime, atendendo que este turma executiva, lhe é imputada a
papel passara a ser exercido pela responsabilidade de criar políticas
máquina de administração de justiça. claras de prevenção ao crime em
Nesta forma de prevenção do crime, coordenação com todas as outras
os titulares da administração de justi- máquinas de administração da justi-
ça, passam a ser os actores de relevo ça, como a polícia, que clama desde
na prevenção de crime, na elabora- antes do Cristo pelas condições míni-
ção de estratégias sólidas e eficazes mas de trabalho. É necessário investir
para a prevenção. Aqui, é imperativo na Segurança interna do Estado e
com que, a polícia como um a actor investir de forma acesa nos aparelhos

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de administração de justiça. Portan- cabo um conjunto de ações com vis-
to, a formação intensiva por parte ta ao reforço e expansão dos serviços
dos membros da PRM de modo em autónomos de policiamento comuni-
que estejam capacitados para dar tário em bairros periféricos, como
vasão ao seu trabalho. Munhava, Matacuane, Manga, Chi-
pangara e etc. Poderá melhorar o
Conclusões Prévias trabalho conjunto entre populares e
a PRM; aumento de efectivo e o
Há, necessidade que, o Estado, melhoramento das linhas de comuni-
crie mecanismos próprios, trabalhado cação a nível das esquadras de polí-
junto com a comunidade, com cia para maximizar esforços e respon-
objectivo de evitar com que os males der a demanda popular em caso de
dos linchamentos se repitam, e que busca por estes serviços. A máquina
crie desta forma confiança na justiça executiva (Poder Executivo) deve
e principalmente na polícia. criar políticas sólidas de prevenção
O Estado, sozinho, não pode fazer do crime, e igualmente invista na
nada, se não cruzar os braços, e ao segurança interna da comunidade
invés de condenar o acto, há que se política. Ao legislativo, recomenda-se
investigar e criar soluções para o dile- que crie legislações que garantam
ma que respondam de forma ade- eficácia absoluta na prevenção
quada e estratégica a problemática coerciva do crime. Ao judiciário, que
de linchamentos. Dai, recomenda-se faça com que a o braço importante
a a implementação de programas na administração da justiça, como o
participativos e inclusivos de sensibili- Ministério Público, abandone a santa
zação, consciencialização, patrulha- casa de descanso eterno e auxilie
mento em áreas estratégicas onde o activamente na prevenção ao crime,
crime constitui moda, contribuiria sig- e crie programas de consciencializa-
nificativamente na melhoria das con- ção as comunidades, relativamente
dições de segurança da comunida- aos actos ou transmites do processo.
de, e maximizaria de forma árdua a Finalmente, a sociedade em geral,
confiança popular na justiça formal deve auxiliar o Estado na prevenção
perdida ao longo dos tempos; a aus- activa do Crime.
cultação da população sobre a defi-
nição de um plano estratégico e efi- Referências Bibliográficas
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