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Dor

A história do povo hebreu é cheia de sofrimento. A maioria dos profetas


do Antigo Testamento foram perseguidos. O livro de Jó fala de um homem
íntegro que sofreu todos os tipos de aflições e manteve-se fiel a Deus. Foi
um homem provado e aprovado. A própria crucificação de Jesus e o
martírio dos primeiros cristãos são fatos históricos cheios de sangue e
dor.
Hoje quero falar sobre uma das experiências mais importantes do
Evangelho: como aprender a lidar com o sofrimento? Como aprender a
lidar com a dor, a aflição, a tribulação? Como aprender a lidar com as
dificuldades, as derrotas, as perdas, as lutas, os revezes da vida?
Qual é a causa da dor? Qual é a origem das aflições?
A Doutrina dos Espíritos nos esclarece didaticamente que podemos sofrer
por três motivos: expiação, provação e missão. Qual é a diferença entre
essas aflições? A expiação é você sofrer porque fez outro sofrer, é colher a
dor por ter causado a dor a outro alguém, é colher espinho por ter
plantado espinho, é o que Jesus quis dizer com: quem com ferro fere, com
ferro será ferido. Essa é a expiação. A provação é você sofrer não porque
tenha feito outro sofrer, mas sim escolher passar por uma experiência
difícil para evoluir, sem ter causado mal a ninguém. Essa é a provação. A
missão é quando você sofre não porque causou o mal a alguém
(expiação), não porque quer passar pela dor para evoluir (provação), mas
sim sofrer para dar o exemplo de resignação, resiliência, força e fé, como
foi o caso da crucificação de Jesus.

Só podemos quitar nossas dívidas espirituais passando pela dor?


No livro O Céu e o Inferno, no Código Penal da Vida Futura, aprendemos
que temos três elementos para a redenção espiritual: arrependimento,
expiação e reparação. O arrependimento é o primeiro passo, mas não
pode ser confundido com remorso. Remorso é alimentar uma culpa que
paralisa o indivíduo no sofrimento, já o arrependimento é se
conscientizar que errou, se levantar e procurar evitar esse mesmo tipo
de erro. É o que aconteceu com Saulo nas portas de Damasco. Ele não
ficou se culpando por ter perseguido os cristãos, ele reconheceu seu erro
e tomou a iniciativa de mudar sua conduta, perguntando a Jesus: Senhor,
o que queres que eu faça? Esse é o arrependimento, muito diferente de
remorso. O segundo elemento é a expiação, que já foi abordada, que é
sofrer por ter feitos os outros sofrerem, mas existe um terceiro elemento
que evita passar pelo sofrimento, que é a reparação, que é uma atitude
contrária ao erro do passado. Se fui egoísta, passo a ser caridoso, se fui
orgulhoso, passo a ser humilde, quitando minha dívida sem passar pela
dor, pois como o apóstolo Pedro nos ensinou: o amor cobre a multidão de
pecados.

Por que nascem crianças com doenças terríveis? O que elas fizeram para
merecer tamanho sofrimento?
No livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo 6, temos as causas
atuais das aflições e a causas anteriores das aflições. Das causas atuais
estão os erros da existência atual. A Doutrina Espírita, por defender a ideia
de reencarnação, nos ensina que muitos dos nossos sofrimentos vieram
de uma existência anterior, explicando porque essas crianças nascem sob
pesados padecimentos. Se não é uma expiação, é uma provação ou
missão.

Jesus disse que no mundo teremos aflições, mas que era para termos
bom ânimo, pois Ele venceu o mundo. O que é vencer o mundo? O que
significa a palavra “vitória” para Jesus?

Para Jesus, a verdadeira vitória não é ostentar medalhas, troféus em cima


de pódios iluminado por holofotes. Jesus queria nos ensinar que a
verdadeira vitória é sofrer sem se desesperar, é guardar a paz no coração
quando tudo em volta é turbulência e caos. Isso é vencer o mundo: ter no
interior um paraíso enquanto o exterior é um inferno. Jesus suportou e
superou a cruz mantendo o coração em paz. Esse é o conceito de vitória
para o Mestre, uma vitória vestida de derrota aos olhos dos homens.
Jesus disse: a minha paz vos dou; não vos dou como o mundo a dá.
É preciso fazer uma distinção: qual é a diferença entre a paz do mundo e
a paz do Cristo?
A paz do mundo são as facilidades, a ausência de problemas, a “moleza”.
Mas essa paz é muito frágil pois basta um único problema que ela se
destrói. Essa é a paz do mundo. A paz do Cristo é quando tudo em volta é
o inferno e mesmo assim o nosso coração se mantém em paz, sereno,
calmo, inabalável. Isso é vencer o mundo. Ser vitorioso é guardar a paz
interior diante de testemunhos ásperos, esforços extremos. É enfrentar as
maiores lutas com uma paz inabalável, invulnerável, inquebrantável. Essa
paz só encontramos no Cristo, quando nos esforçamos para aprender e
viver seu Evangelho.

Qual é o nome da virtude que nos ajuda a lidar com o sofrimento?


Resignação.
O que é resignação?
Resignação é a capacidade de suportar e superar a dor sem se desesperar.
Porém convém não confundir resignação com acomodação. A
acomodação recebe e dor e desiste de lutar contra ela, enquanto a
resignação busca meios de suportá-la e superá-la. Para isso, a resignação
se utiliza de sua filha, a resiliência.
O que é resiliência?
Resiliência é a capacidade de se recuperar de uma dificuldade com
rapidez. A resiliência vem da engenharia, que é uma propriedade de
alguns materiais. O material que tem resiliência tem uma determinada
forma. Ao sofrer uma deformação, ele reage, recuperando a forma
original. O coração resiliente inicialmente está em paz, mas vem a dor e a
resiliência o ajuda a se recuperar da dificuldade com rapidez, recuperando
a paz inicial.
Deus envia experiências dolorosas para corações que não a podem
suportar?
Há um pensamento que nos dá poder de lidar com as dores da vida: Se
estamos sofrendo é porque podemos suportar. Há um cálculo muito
preciso entre o peso da cruz e a força do ombro. Deus só permite a dor ao
coração que pode suportar e superar. Como diz a sabedoria popular: Deus
dá o frio conforme o cobertor. Foi por isso que Jesus disse que não se
derrama vinho novo em odres velhos, ou seja, o vinho novo é a
experiência desafiadora, o odre velho é o coração fraco, ou seja, Deus não
coloca experiências desafiadoras em corações fracos. Se estamos sofrendo
é porque podemos aguentar. Se a dor passar do nosso limite, Deus envia
pessoas para nos ajudar a vencer nossos desafios. Foi o que aconteceu
com Jesus na crucificação. Quando o Mestre não estava mais aguentando,
Deus enviou Simão Cirineu para ajudar Jesus a carregar a cruz. Muitas
vezes esse Cirineu é um pai, uma mãe, um irmão, um amigo.
Basta sofrer para evoluir?
O sofrimento por si só não eleva a criatura, o sofrimento por si só não gera
iluminação. Ele tem o potencial de fazê-lo, mas tudo depende de como
encaramos a dor. Posso aproveitar a aflição para crescer ou para cair
ainda mais, tudo depende de como encaro o sofrimento. São dois
caminhos: revolta que leva a queda ou resignação que gera elevação.
Ou seja, o sofrimento por si só não nos eleva, mas sim nossa postura
diante dele. É por isso que Emmanuel nos diz no livro Vinha de Luz,
capítulo 80:
Não basta sofrer simplesmente para ascender à glória espiritual.
Indispensável é saber sofrer, extraindo as bênçãos de luz que a dor
oferece ao coração sequioso de paz. (...) Todas as criaturas sofrem no
cadinho das experiências necessárias, mas bem poucos espíritos sabem
padecer como cristãos, glorificando a Deus.

Ou seja, podemos receber a dor com rebeldia e reclamação, podemos


recebê-la calados, mas a melhor forma de receber a dor é agradecendo a
Deus por ela, pois se Deus nos enviou esse sofrimento, é porque tem algo
a nos ensinar, esse é o ápice da resignação: agradecer a Deus pela dor.

É por isso que Pedro nos diz:

Mas, se padece como cristão, não se envergonhe, antes glorifique a


Deus nesta parte.

1 Pedro 4:16

Então significa que para ser cristão eu tenho que ser masoquista?

Não é uma proposta masoquista de buscar prazer na dor, mas sim


aguardar e receber a dor como uma professora. Se a dor nos visita, é
porque ela tem algo a nos ensinar. Pergunte a ela quais são as lições que
ela veio trazer, e assim que aprendermos essas lições, a dor naturalmente
vai embora. Não peça para Deus afastar o sofrimento, peça a Ele
sabedoria para aprender as lições necessárias que o sofrimento veio
trazer. É o que Léon Denis nos ensina em O Problema do Ser, do Destino e
da Dor:
Homem, meu irmão, aprende a sofrer, porque a dor é santa! Ela é o mais
nobre agente da perfeição. Penetrante e fecunda, é indispensável à vida
de todo aquele que não quer ficar petrificado no egoísmo e na
indiferença. Esta é uma verdade filosófica: Deus envia o sofrimento
àqueles a quem ama. (...) Aprende a sofrer. Não te direi: procura a dor.
Mas, quando ela se erguer inevitável em teu caminho, acolhe-a como
uma amiga. Aprende a conhecê-la, a apreciar-lhe a beleza austera, a
entender-lhe os secretos ensinamentos. Estuda-lhe a obra oculta. Em vez
de te revoltares contra ela ou de ficares acabrunhado, inerte e fraco
debaixo de sua ação, associa tua vontade, teu pensamento ao alvo a que
ela visa, procura tirar dela, em sua passagem por tua vida, todo o
proveito que ela pode oferecer ao espírito e ao coração.

Doutrina Espírita tira a dor?


A mais notória característica da Doutrina Espírita é a sua capacidade de
consolar os aflitos. É por isso que ela é chamada de O Consolador
Prometido. Não, a Doutrina não tira a dor, ela tira o desespero.
Por que Deus criou a dor?
O apóstolo Paulo nos ensina que a tribulação produz fortaleza. A dor nos
torna mais fortes, mais resignados, mais resilientes. Os melhores vasos
são forjados no calor do fogo, as melhores espadas receberam o golpe do
martelo, o solo fértil recebeu os duros golpes da enxada.
Na química, nos temos um fenômeno conhecido como alotropia:
materiais com a mesma composição química, mas com estruturas
diferentes. O grafite e o diamante são feitos da mesma substância, o
carbono, mas são diferentes na dureza. O grafite quebra fácil, enquanto o
diamante é a substância mais dura do planeta. Qual é a diferença se
ambos são feitos da mesma substância? A diferença é que o diamante é
forjado sob altas pressões, transformando em na substância mais dura do
planeta. Como Emmanuel nos ensina: queres fortaleza? Não esquives da
tempestade.
A dor também nos torna mais amorosos, pois é bem provável que nosso
coração se encha de compaixão ao ver uma pessoa passando por uma dor
que já passamos.
A dor também nos torna mais inteligentes, pois buscamos meios de
erradica-la.
A dor é uma professora. Se a dor nos visita, convém perguntar o que ela
veio nos ensinar.
O que Ruben Alves queira dizer com a frase: “Ostra feliz não faz pérola.”
Quando cai um grão de areia dentro da ostra, ela causa um dor, uma
irritação. A ostra reage e começa a envolver o grão de areia com uma
substância que dá origem à pérola, uma joia de muito valor forjada pelo
sofrimento. A resignação e todas as outras virtudes são as pérolas da
alma.

Seja suando ou chorando, a gente evolui desidratando! Pense Nisso!

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