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DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2176-9451.19.3.127-138.bbo
A má oclusão de Classe I de Angle com biprotrusão é caracterizada pela inclinação acentuada dos incisivos para vesti-
bular, o que provoca a protrusão dos lábios superior e inferior. As extrações dos primeiros pré-molares têm sido indi-
cadas para reduzir a convexidade facial com a retração dos dentes anteriores, mantendo a relação de chave de oclusão
dos caninos e dos primeiros molares. Para a obtenção de resultados compatíveis com as metas estéticas e cefalométricas
idealizadas para o tratamento ortodôntico, é necessário que a fase de fechamento de espaços seja realizada com con-
trole da sobremordida e do torque dos incisivos. Na maioria dos casos, também há necessidade de se proporcionar
ancoragem máxima aos dentes posteriores. O presente caso clínico foi apresentado à Diretoria do Board Brasileiro de
Ortodontia e Ortopedia Facial (BBO) como parte dos requisitos para a obtenção do título de Diplomado pelo BBO.
» O autor declara não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou Como citar este artigo: Moresca R. Class I malocclusion with severe double pro-
financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias trusion treated with first premolars extraction. Dental Press J Orthod. 2014 May-
descritos nesse artigo. -June;19(3):127-38. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2176-9451.19.3.127-138.bbo
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caso clínico BBO Má oclusão de Classe I de Angle com biprotrusão severa tratada com extrações dos primeiros pré-molares
Durante a análise funcional da oclusão, observou-se Durante o sorriso, era evidente a protrusão dos incisivos
que as guias laterais eram realizadas pelos caninos, no superiores e o aumento do corredor bucal (Fig. 1).
lado direito, e pelos primeiros pré-molares, no lado Na análise dentária (Fig. 1, 2), foi identificada má
esquerdo. A guia anterior era curta, sem desocluir oclusão de Classe I de Angle, com sobremordida e so-
completamente os dentes posteriores. Não foram en- bressaliência de 2mm. Havia apinhamento na arcada
contrados sinais e sintomas de hábitos parafuncionais dentária inferior, com discrepância de -6mm, e com
ou disfunção temporomandibular. vestibuloversão do dente 41, linguoversão do dente 32
e mesiovestibuloversão do dente 33, gerando um desvio
DIAGNÓSTICO de 0,5mm da linha média inferior para o lado esquerdo.
A paciente apresentava padrão facial equilibrado as- Na superior, havia apenas suave giroversão do dente 12.
sociado a um perfil convexo e protrusão dos lábios supe- As arcadas dentárias apresentavam forma bastante alon-
rior e inferior (Ls-Linha S = 2mm; Li-Linha S = 1mm), gada no sentido anteroposterior. Uma característica im-
o que proporcionava a diminuição do ângulo nasolabial portante a ser destacada era a inclinação lingual exces-
e do sulco mentolabial, e uma acentuação dos sulcos na- siva dos pré-molares e molares inferiores, gerando uma
solabiais, mas sem afetar o selamento passivo dos lábios. constrição transversa nessa região.
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A análise da radiografia panorâmica mostrou que Cefalometricamente (Fig. 5, Tab. 1), apresentava bi-
os primeiros molares superiores estavam inclinados protrusão dentoalveolar, associada a um padrão esque-
para mesial (Fig. 3). Por meio das radiografias peria- lético de Classe II por excesso maxilar (SNA = 90,5o;
picais dos incisivos e das radiografias interproximais, SNB = 85o; ANB = 5,5o) e convexidade facial aumentada
foi possível identificar a redução generalizada na al- (ângulo da convexidade = 14o). No entanto, esses valores
tura da crista óssea alveolar, sendo mais acentuada cefalométricos podem ter sido influenciados pela severa
nos incisivos inferiores. Também foi possível visu- protrusão (1-NA = 10mm; 1-NB = 15mm) e inclina-
alizar excesso de material restaurador na face distal ção vestibular (1-NA = 32o; 1-NB = 51o; IMPA = 114o;
do dente 14 (Fig. 4). 1/1 = 92o) dos incisivos superiores e inferiores.
Figura 3 - Radiografia panorâmica inicial. Figura 4 - Radiografias iniciais: periapicais dos incisi-
vos e interproximais.
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A B
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A fase de alinhamento e nivelamento foi iniciada A retração dos dentes anteriores foi realizada uti-
com fios de NiTi SE 0,014”, seguidos pelo 0,016”, lizando-se a mecânica de deslizamento associada aos
em ambas as arcadas. Durante esse período, os cani- mini-implantes. Os tie-backs ativos foram instalados
nos, especialmente os inferiores, foram distalizados dos mini-implantes até os ganchos soldados aos arcos,
para obtenção de espaço para o alinhamento dos in- sendo ativados 3mm a cada 28 dias13 (Fig. 6). A posi-
cisivos, evitando sua inclinação para vestibular. Essa ção vertical dos mini-implantes (distantes aproxima-
distalização foi realizada utilizando-se lacebacks ativos damente 8mm dos arcos ortodônticos) foi planejada
instalados desde os mini-implantes até os braquetes para se obter um vetor de força inclinado que, em
dos caninos. Os incisivos laterais inferiores só foram associação à mecânica de deslizamento, contribuiria
incluídos no arco após a obtenção de espaço para seu para o controle de torque e da sobremordida durante
correto posicionamento. Depois desse alinhamento a retração dos dentes anteriores. Como efeito colateral
inicial, os dentes anteriores foram mantidos conju- dessa mecânica, ocorreu uma tendência de inclinação
gados para se evitar a abertura de espaços. Após a distal dos primeiros molares — mais acentuada nos
completa expressão do potencial de movimentação superiores —, devido à fricção entre o tubo e o arco
do arco 0,016”, foram instalados, simultaneamente, ortodôntico. Essa movimentação indesejada foi rever-
os arcos de NiTi SE 0,014” e 0,016”. Essa associação tida nas fases seguintes do tratamento.
de arcos tem por objetivo eliminar a “folga” dos fios No estágio final da retração anterior, após a confirma-
de nivelamento nos braquetes autoligáveis passivos 10, ção clínica da obtenção dos resultados estéticos desejados,
melhorando o controle rotacional e a expressão das foram realizados os registros intermediários. Com base na
informações de segunda ordem. Estima-se que a avaliação clínica e cefalométrica, decidiu-se remover os
associação dos fios 0,014” e 0,016” corresponda a mini-implantes e finalizar o fechamento dos espaços
um diâmetro total de 0,021”, o que preencheria por residuais com a movimentação mesial dos dentes pos-
completo o canal de encaixe dos tubos e braquetes 11. teriores, utilizando correntes elásticas e mantendo os
A fase de alinhamento e nivelamento foi conclu- dentes anteriores conjugados, com ligadura metálica,
ída com os arcos de NiTi SE e de aço inoxidável como unidade de ancoragem.
0,019” x 0,025”. Os arcos de NiTi SE receberam Após o completo fechamento dos espaços, foi re-
dobras distais, para auxiliar no controle da vestibu- alizado o reposicionamento de braquetes, para refi-
larização dos incisivos; e os de aço inoxidável re- namento das relações oclusais, com base nos achados
ceberam ganchos soldados entre os incisivos laterais clínicos e radiográficos. A partir desse momento, os
e caninos, e foram diagramados e coordenados de dentes foram mantidos amarrados conjuntamente,
acordo com o método de Trevisi 12. Na consulta de para se evitar a reabertura de espaços. A fase de inter-
instalação dos arcos de aço inoxidável, também fo- cuspidação estava planejada com a utilização de arcos
ram realizados os tie-backs passivos, com amarrilhos 0,019” x 0,025” braided, mas, devido à anatomia atípi-
metálicos 0,008” estendidos dos ganchos dos segun- ca de alguns dentes, foi necessário finalizar o caso com
dos molares até os ganchos dos arcos, para evitar a dobras de primeira e de segunda ordens em arcos con-
projeção dos dentes anteriores com a expressão do feccionados com fio de aço inoxidável 0,016”, com
torque embutido nos braquetes desses dentes. o auxílio de elásticos intermaxilares 3/16” médios,
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De fato, as alterações faciais observadas ocor- em função da perda óssea — observada nessa região
reram em resposta à grande movimentação dos in- ao início do tratamento — e da forma triangular das
cisivos. Os incisivos superiores foram retraídos em coroas desses dentes. Durante a fase de finalização, foi
3mm e apresentaram alteração de 2o na inclinação proposta à paciente a redução interproximal do esmal-
em relação à linha NA; enquanto os incisivos infe- te, para eliminar os espaços. Considerando-se que esse
riores apresentaram retração de 9,5mm e alteração procedimento poderia levar a uma desproporção de
de 25o na inclinação em relação à linha NB, além volume dentário entre as arcadas — comprometendo o
de redução de 24o no ângulo IMPA. Essas mudan- estabelecimento dos trespasses entre os incisivos — e,
ças acarretaram em aumento de 33 o no ângulo inte- também, que esses espaços não afetavam a estética do
rincisal (Fig. 11, 12; Tab. 1). É importante destacar sorriso, optou-se por sua manutenção (Fig. 7).
que, apesar da grande retração dos incisivos, houve Em relação às características oclusais, o caso foi finali-
excelente controle da sobremordida (Fig. 7, 8), o zado com os caninos e os primeiros molares em chave de
que contribuiu decisivamente para o ajuste estético oclusão, com boa intercuspidação dos dentes posteriores
e funcional do caso. As sobreposições dos traçados (Fig. 7, 8). Do ponto de vista funcional, a adequação dos
cefalométricos indicam que, além do movimento trespasses horizontal e vertical nos dentes anteriores, em
lingual, ocorreu, simultaneamente, a intrusão dos conjunto com o controle de torque em todos os dentes,
incisivos (Fig. 12). Esse padrão de movimentação possibilitou a obtenção de guia incisal, em protrusiva, e
(retração e intrusão) também contribuiu para a me- guias laterais pelos caninos, sem interferências oclusais.
lhoria da saúde periodontal nos incisivos, com a di- De maneira geral, alcançou-se bom paralelismo ra-
minuição do nível da recessão gengival. dicular, com angulações distais das raízes dos caninos
Após o alinhamento inicial, foram observados espa- e dos primeiros molares superiores, como já havia sido
ços negros entre os incisivos inferiores, que surgiram observado na radiografia panorâmica intermediária.
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No entanto, durante a fase de finalização, optou-se mantinham em posições desfavoráveis, sendo solicitada
por priorizar o refinamento das relações oclusais, em sua remoção. Assim, as fotografias e os modelos finais
detrimento da correção da angulação das raízes desses são apresentados já sem esses dentes.
dentes (Fig. 9). Foi detectado que houve encurtamento Como era esperado, não aconteceram alterações es-
da raiz distal do dente 46 e arredondamento das raí- queléticas significativas. Houve redução de 4o no ângulo
zes dos incisivos, principalmente dos superiores (Figs. ANB e de 13,5o no ângulo da convexidade facial (Fig.
9, 10). Esse achado pode estar relacionado à associação 11, Tab. 1), que pode ser atribuída à grande remodela-
dos movimentos de retração e intrusão realizados nesses ção observada nas regiões dos pontos A e B. Também
dentes14. Também foi possível observar, na radiografia pode-se observar que o tratamento com extrações levou
panorâmica (Fig. 9), que os terceiros molares ainda se a uma melhora significativa do perfil facial (Fig. 12).
Figura 9 - Radiografia panorâmica final. Figura 10 - Radiografias finais: periapicais dos incisi-
vos e interproximais.
A B
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B B
Figura 12 - Sobreposições total (A) e parciais (B) dos traçados cefalométricos inicial (preto) e final (vermelho).
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CR
F
Vi
Vr
Figura 13 - Representação esquemática das forças geradas pela mecânica Figura 14 - Efeito da força aplicada sobre o arco ortodôntico, durante a
de deslizamento associada a mini-implantes: F = força gerada pelos tie- mecânica de deslizamento com utilização de mini-implantes.
-backs ativos; Vr = vetor horizontal de retração; Vi = vetor vertical de intru-
são; M = momento de inclinação lingual sobre os incisivos, uma vez que F
está passando abaixo do centro de resistência (CR) dos dentes anteriores.
importante com a utilização dos braquetes autoligáveis com o uso dos recursos tradicionais. A razão desse au-
passivos, que apesentam menor eficiência na expressão mento pode ser o maior movimento realizado pelos den-
do torque27. Cabe ressaltar que essa deflexão se estende, tes anteriores, uma vez que os dentes posteriores não con-
também, aos dentes posteriores, aumentando o atrito tribuem para a redução dos espaços das extrações. Essa
do fio com os tubos dos molares, o que pode levar ao movimentação mais extensa dos incisivos também pode
movimento distal desses dentes. predispor a um maior risco de reabsorções radiculares14.
O posicionamento vertical dos mini-implantes pode Analisando os resultados obtidos no presente caso
variar de acordo com a intensidade desejada para o vetor clínico e correlacionando-os com as informações ob-
de intrusão. Um posicionamento mais apical ou cervi- tidas na literatura ortodôntica, é possível concluir que
cal vai proporcionar, respectivamente, maior ou menor a utilização da mecânica de deslizamento associada
vetor intrusivo sobre os dentes anteriores. Para evitar in- aos mini-implantes produziu efeitos favoráveis no
clinação indesejada do plano oclusal na região anterior, tratamento da biprotrusão com extrações dos primei-
é mandatório que os mini-implantes estejam na mesma ros pré-molares. No entanto, o sucesso no tratamen-
altura, considerando-se os lados direito e esquerdo. to esteve relacionado, prioritariamente, ao correto
É preciso também considerar que, utilizando os mini- diagnóstico e planejamento do caso e à aplicação de
-implantes, o tempo necessário para o completo fecha- princípios biomecânicos adequados à movimentação
mento dos espaços pode ser um pouco maior, comparado ortodôntica desejada.
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