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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINASSAU

DEPARTAMENTO DE ARTES VISUAIS

LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS

Do caldeirão de Exu ao nascimento de Vênus: A construção


alquímica da representação de Pombagira Menina.

Guilherme Pietro Vieira da Silva

Projeto de Conclusão de Curso.

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO I

Rio de Janeiro

2023

1.Tema:
Do caldeirão de Exu1 ao nascimento de Vênus: A construção alquímica
da representação de Pombagira Menina.
2.Introdução:
A pesquisa tem como objetivo esclarecer a formação iconográfica das
representações da pomba gira menina, e tentar relacionar com referências
utilizadas das artes clássicas europeias com suas múltiplas representações
femininas (Vênus, Maria Madalena etc.), dentro desses contextos simbólicos
criados nas religiões afro-indígenas-brasileiras. Para isso foram selecionadas
três imagens da pomba gira menina ao qual será dedicado um capítulo a cada
uma para entender sua formação iconográfica e as camadas que as
representações dessa entidade espiritual podem guardar em si.
As representações selecionadas para esse trabalho sobre a iconografia
de Pombagira Menina serão analisadas, junto às obras das artes para se
conseguir entender as camadas de profundidades que as representações
escultóricas dessas entidades espirituais podem guardar em forma de
símbolos, e aquilo que fomentamos na nossa sociedade contemporânea
ocidental sobre o feminino, beleza e erotismo. Além disso, a pesquisa tentará
entender a influência das representações clássicas no meio popular e na
construção de um ideal de mundo e no meio afro religioso especificamente, e
busca encontrar referências dentro repertório imagético das culturas afro-
indígenas a fim de tentar entender fusão alquímica que ocorreu para o
nascimento das esculturas dessa entidade espiritual.
A primeira etapa da pesquisa será dedicada à imagem da Pombagira
Menina da praia e do nascimento de Vênus de Sandro Botticelli, que se inspira
com maior clareza nas belas artes clássicas. No segundo capítulo a pesquisa
se dedicara a imagem de Pombagira Menina da empresa Imagens Bahia, que
se cobre e investigar no universo clássico figuras femininas ligadas ao erótico e
amor que igualmente se cobriam, revelando uma algo pudico, cândido, e tímido

1
A definição de “Exu” com essa determinada grafia nessa tese será dedicada aos espíritos de umbanda
que utilizam desse nome para formarem um grupo. Esses espíritos são segundo o Babá Rodrigo Cassano
seriam: “O imenso grupo de Exus e Pombagiras acolhe a presença de espíritos de pessoas diversas,
podendo variar entre os povos originários, os judeus, as bruxas e ciganos degredados, os negros
africanos em diáspora forçada, os imigrantes pobres e população brasileira de um modo geral por
exemplo “(CASSANO, 2023, extraído de um texto do mesmo em:
https://www.facebook.com/1807644804/posts/precisamos-nos-apartar-de-tudo-aquilo-que-não-nos-
contemplaora-se-a-umbrankkka-q/10218412119613463/
)
em figuras consideradas pagãs ou símbolos sexuais do feminino (Vênus

capitolina [96 d.c.-192d.c], Vênus Pudica [364-361 a.C], Afrodite de Cnido [sec-
IV a.C] de Praxiteles). Finalmente, no terceiro capítulo será dedicado a imagem
da Pombagira Menina a qual ela está debruçada sobre a relva ou chão e fazer
comparação com figuras igualmente deitadas da Arte Renascentistas e da Era
moderna (Olympia [1863] do Manet, Vênus Adormecida [1508]de Giorgione,
A Vênus de Urbino [1538]de Ticiano).
Além das imagens citadas algumas outras imagens tanto da
Antiguidade, Renascença e Idade Moderna que podem dar mais informações
da construção imagética, além de entender como essa imagem chegou até
nós.
A protagonista (Pombagira Menina) deste trabalho acadêmico, está
cercada de itans2 que contam como ela se tornou essa ancestral; Em geral
essas histórias falam da perda da infância dessas mulheres, e por isso
guardam de volta a juventude de mulheres e resgatam isso, carregando em
seu nome, isso fica claro na fala de um dos entrevistadores para esse trabalho
que será o Tata Khippo, vejamos o que ele fala:

Sobre as Pombagira Menina é o seguinte: uma falange, né? Uma,


vamos dizer assim, uma organização espiritual em torno do fato de
que era muito comum nos séculos passados durante a história e
passado da humanidade, a prostituição infantil. Não só a prostituição,
os casamentos já aconteciam com meninas ainda tem lugares do
mundo que acontece até hoje a partir dos oito anos. Só que de fato
em lugares muito as meninas eram vendidas para prostíbulos. Eram
dados como pagamento de dívida e coisa do tipo. Então a falange de
Pombogira Menina acontece nesse contexto das meninas literalmente
meninas que perdem a infância e são empurradas pra esse mundo,
pra se tornar mulher, pra se tornar adulta. Aí aí é um momento em
que acontece, né? Essa estigmação. Porque menina é sinônimo da
menina que perdeu a infância, daquela que foi obrigada de alguma
forma a ser tornar mulher. Não sempre pela prostituição, mas pelo
casamento que é praticamente a violência e é igual, né, praticamente
a mesma violência ou por situação em como ela é dada pra prestar
favores em casas de outras pessoas servir como serviçal e coisas do
tipo. É nesse contexto que vai surgir a falange das pombas giras
meninas.3

2
Termo em ioruba que significa lendas e histórias.
3
KHIPPO, Tata.depoimento (maio,2023) entrevistador: Guilherme Pietro Vieira da Silva. Rio de Janeiro,1
arquivo .mp3 2:57 minutos
As afirmações riquíssimas de Tata Khippo se complementam com a fala
feita pela Pombagira Maria da Paz sobre sua própria história em vida para Luiz
Correa, seguimos parte de sua fala:

Eu saí de casa muito cedo, 13 anos. Fuji de casa, fui embora. E aí eu


conheci um macho, ele já devia ter uns 25 anos. E foi até bom
enquanto durou, mas durou pouco tempo, ele me deixou. Aí eu caí na
gandaia, foi aí que eu me tornei uma prostituta. E em menos de um
ano de prostituição eu me passei. Por isso que eu só tenho 14 anos,
foi assim que eu me passei. Eu digo que me passei porque a morte, a
morte para mim é uma coisa que não existe, que é uma coisa tão
rápida. Não morri assim de morte natural, morri apunhalada, e aquela
minha ira de matéria eu trouxe para essa corrente, por isso eu tive de
ser domesticada para hoje eu ser o que eu sou. 4

Daí vemos que essas antepassadas eram mulheres que transgrediram e


viveram à margem da nossa sociedade. Além disso, perderam sua infância e
quando se encantam ou ancestralizam trazem consigo essa marca: uma dor
que se torna uma marca; um trauma, e isso elas trazem como força em forma
de flor.
3.Problema de Análise e Hipótese:
O trabalho tentará responder: (1) Como foram construídas as imagens de
pomba gira no Brasil? (2) Quais são as influências das artes clássicas dentro
do repertório imagético de Exu? (3) Qual carga simbólica e histórica que
Pombagira Menina representa? (4) Qual a relação iconográfica entre a
representação da vênus e da Pombagira Menina?
A hipótese a ser pensada é saber se representação de Pombagira
Menina como Vênus pode esta associado a uma transferência de culto assim
como ocorreu no período medieval com as deusas Mater (Cybele,Isis,etc) e
Mãe de Deus ( a Virgem Maria). Esse fator de transferência também ocorreu no
período da colonização na região do Congo e Angola, pois símbolos católicos
sofrem mudanças estéticas para o povo bakongo, mesclados figuras católicas
a heróis,Nkisi5,e espiritos daquela civilização, além da mudança estética que
esses sofrem6.

4
PAZ, Pomba gira Maria. Corpo, emoções e identidade: reflexões sobre narrativas e fotografias de um
terreiro de culto afro-brasileiro. Luiz Gustavo Pereira de Souza Correia. Rituais contemporâneos. p. 01 a
36, agosto, 2010
5
Equivalente a Minkise, termo usado para divindades bakongo, além de também se peças de elemento
“feitiche”
6
MARTINEZ,Barbaro. *“Ma kisi Nsi: L’art de habitants de region de Mbanza Kongo” in Angola figures de
pouvoir. Paris: Dapper Museum Press, 2010
4. Justificativa:
O interesse dentro dessa pesquisa surge a partir de pesquisas sobre
ancestralidade feminina dentro das religiões afro-indígenas brasileiras. 7 Ao
buscar estudar e tentar entender como era concebido esse feminino para
povos originários e o que floresceu na diáspora, com as dezenas de ancestrais
e encantados8 que se manifestam e são cultuadas em todo território nacional.
Depois de muito me envolver e procurar, a dúvida acerca da minha própria
ancestralidade se apresentou, que é a Pombagira Menina, entidade espiritual
que ao muito pesquisa tinha dificuldade em encontrar mais sobre, e buscar
referências históricas.
A partir do artigo: A OUTRA ARTE SACRA BRASILEIRA O CASO DA
POMBAJIRA MENINA de Tadeu Mourão e, A obra: ARUÊ EXU:
SOBREVIVÊNCIAS, MEMÓRIAS E SINCRETISMO – POMBA-GIRA MENINA
DA PRAIA de Felipe Bernardes, cria-se uma conceituação sobre representação
de uma Exu mulher9, que se vê claramente uma cópia da representação do
nascimento de Vênus do Sandro Botticelli. A partir disso fiquei curiosa para
entender; por que uma deusa pagã na representação renascentista; foi a
inspiração para ser a escultura de uma entidade espiritual dos cultos afro
brasileiros? Então a partir disso fui pesquisar as imagens e outras
representações dessa Pombagira. Então identifiquei outras representações
feitas dessa bacuro10 que remetiam muito a obras de representações femininas
dentro da tradição artística.
Após esse interesse, despertei para a vontade de compreender a razão
genealógica e iconográfica para se chegar na representação de Pombagira
Menina e porque ela está ligada às divindades pagãs como símbolos do erótico
e da beleza dentro da perspectiva eurocêntrica, mas isso não significa que não
será possível traça correlações com divindades femininas dentro dos culto
7
Religiosidades que se formaram com base dentro dos conceitos culturais e espirituais de povos
africanos em diáspora forçada e indígenas, dentro do Brasil.
8
“O encantado não é o espírito de um humano que morreu, perdeu o corpo físico, não sendo, por
conseguinte um egum. Ele se transformou, tomou outra feição nova maneira de ser. Encantou-se,
tornou-se nova forma de vida, numa planta, num acidente físico-geográfico, num peixe, num animal,
virou vento, fumaça.” (SHAPANAN, 2006, p.319)
9
Sinônimo de Pombagira
10
Designação utilizada nas umbandas antigamente para se fala sobre os espíritos que desciam em seus
médiuns, “palavra que tem origem no kimbundu da flexão da palavra bakulu, que significa ancestral”
(ISHTAR,Layla, depoimento[abril,2023], entrevistador: Guilherme Pietro Vieira da Silva. Rio de Janeiro,
em troca de conversa)
africanos e indígenas, para se tentar extrair mais informações que auxiliaram
na formação da percepção visual da identidade desses espíritos.
5.Objetivos
Traçar uma relação entre as imagens de pomba gira menina e as musas
das belas artes. Além disso entender junto com o caldeirão simbólico
sociocultural que fomentou a criação das Pombagiras no Brasil, em especifico
aquelas nomeadas de “menina”.

6.Metodologia e Produto:
A pesquisa será criada com base de pesquisas literárias sobre o culto
de Exu (orixá e catiço11) dentro do meio afro-brasileiro e todo seu imaginário,
além de utilizar a literatura de Aby Warburg e Erwin Panofsky para realizar o
estudo da iconografia das fontes primárias.
Também será realizada entrevistas de campo com sacerdotes de cultos
afro-brasileiros para entender, mais a fundo a relação desses espíritos com a
comunidades terreiros afro religiosos.
Sobre as entrevistas, inicialmente pretende-se deixar de forma anônima
as identidades das pessoas que participarão. Além de tentar buscar outras
referências no acervo policial do Museu da República e em Floras 12 de
umbanda.
O produto dessa pesquisa será a confecção de uma roupa inspirada na
fotografia do artigo: “Corpo, emoções e identidade: reflexões sobre narrativas e
fotografias de um terreiro de culto afro-brasileiro” (2010) de Luiz Correia,
especificamente a vestimenta na qual a Pombagira Maria da Paz usa numa
fotografia ajoelhada no chão (fotografia está nas “Fontes e Material de trabalho
“do projeto é a figura de número 8).
A escolha dessa peça foi por uma série de fatores, fotografia traz uma
presença muito forte, além do fato do espírito fotografado em seus relatos ter
dito que apenas possui 14 anos de idade, fato que traz conexão com a
protagonista desse projeto. Outro fator é o design da peça ser um pouco
diferente dos outros que se vê a venda e sendo utilizado nos tempos atuais.
11
Termo usado em casa de candomblé para se referir aos exus e pombagiras de umbanda
12
Nome dado a loja de artigos religiosos de cultos afro-brasileiros
Também será organizado uma série de fotografias para se
desenvolvidas inspirada na tese.
7.Discussão bibliográfica:
O trabalho irá usar bibliografias que discorrem não somente sobre Exu
catiço (Povo de rua/exus e pombagiras de umbanda) mas também o orixa Èṣù
13
, o vodun14 Legba15 , e o inquice16 Mpambunjila.17
Para entender influência dessas imagens na construção do imaginário
popular, será usada a obra de Reginaldo Prandi - Exu, de mensageiro a diabo:
Sincretismo católico e demonização do orixá Exu - e o documentário - a dança
das cabaças (2006), dirigido por Kiko Dicunni.
Sobre aqueles que foram degredados e auxiliaram na formação do povo
de rua das umbandas, além da influência da bruxaria ibérica no culto do
quimbanda18 serão utilizadas as obras: Maria Padilha E Toda A Sua Quadrilha:
De Amante De Um Rei De Castela A Pomba-Gira De Umbanda (1993), de
Marlyse Meyer, e Calibã e a Bruxa: Mulheres, Corpos e Acumulação
Primitiva(2019), de Silvia Frederice; O diabo e a terra de santa Cruz (1986), da
Laura de Mello de Souza e o livro A Prostituta Sagrada: a Face Eterna do
Feminino(1997), de Nancy Qualls Corbett que além de auxiliar para entender
feitiçaria ibérica, ainda ajuda na aglutinação da visão história da prostituição,
que é um marcador importantíssimo para se entender a egrégora espiritual que
Pombagira Menina pertence.
Auxiliando na imagem do feminino de Pombagira, será utilizado o
documentário - Pomba gira (1998), por Patrícia Guimarães e Majar Vargas. No
filme consegui reencontrar o transe e a imagética das pombagiras que eram
cultuadas dentro das umbandas populares que floresceram dentro das
comunidades e que conserva, os traços dessas figuras marginalizadas.

13
orixá mensageiro que foi sincretizado com o diabo, escolhi dessa grafia para falar do orixá ioruba
nesse projeto.
14
Termo Ewe-Fon para espírito, equivalente a orixá.
15
Divindade Ewe-Fon equivalente ao Èsù dos grupos nagôs.
16
Equivalente a Nkisi.
17
Divindade Bantu ligado as encruzilhadas.
18
Nome dado ao culto de povo de rua nas religiões afro-brasileiras, esse termo tem origem no
quimbundo. Segundo Nei Lopes: “Quimbanda: (1) Linha ritual da Umbanda que trabalha especialmente
com exus. (2) Sacerdotes de cultos de origem banta. Do quimbundo kimbanda, sacerdote e médicos
ritual, correspondente ao quicongo nganga. O termo se distingue de outros, como o quimbundo
muloji[...] que designa feiticeiro, agente de práticas que objetivam malefícios.” (LOPES, 2006)
Para estudar sobre a formação das imagens de pomba gira menina será
utilizada as obras de Tadeu Mourão: Encruzilhadas da cultura Imagens de Exu
e Pombajira e A OUTRA ARTE SACRA BRASILEIRA O CASO DA
POMBAJIRA MENINA. Além disso será utilizado o autor Felipe Bernardes
ARUÊ EXU: SOBREVIVÊNCIAS, MEMÓRIAS E SINCRETISMO – POMBA-
GIRA MENINA DA PRAIA.
A pesquisa está ciente da existência de outras imagens e
representações que Exu poderiam ser utilizada para ser comparada às obras
de artes do universo clássico, porém ainda que caso seja citada, não serão o
foco. Caso mencionado não serão analisados com profundidade. O mesmo se
dará aos outros nomes simbólicos que a linha de Pombagira carrega (Maria
Padilha, Maria Mulambo, Maria Quiteria, etc)
Os textos que nos auxiliam a entender a relação de pomba gira com
outras divindades femininas, será o texto De Yiá Mi a Pomba Gira:
transformações e símbolos da libido (2000) de Monique Rose Aimée Augras, e
obra Encantaria Brasileira (2006) de Reginaldo Prandi.
Logo no início do documentário: A Dança das Cabaças (2006), fica claro
a importância muito nítida do orixá Èsù para as comunidades religiosas afro-
brasileiras. A importância desse orixá cai sobre as costas do Povo de Rua nas
umbandas, marcado assim a importância desses e ligado a força do orixá que
deu nome a esses espíritos quimbandeiros, mas também trazendo com isso a
demonização que vemos logo no início do filme 19, e que também aparece no
artigo de Reginaldo Prandi – Exu de mensageiro a diabo – que mostra a
transformação que Èsù e Legba passa durante o período de colonização em
terras iorubas, ate chegar aqui nas Américas, trazendo o ranho cristão da
colonização20.
Para essa tese é de grande relevância compreender o porquê tanto se
associar Pombagira Menina a prostituição. Para embasar o assunto, é
importante entender o movimento histórico que levaram mulheres a esse
caminho. Para sanar essas questões, a pesquisa se debruça no livro O Calibã
e a Bruxa (2019), que discorre sobre como o corpo feminino foi uma ferramenta

19
DINUCCI,Kiko. Dança das Cabaças – 2006.
20
PRANDI,Reginaldo. Exu, de mensageiro a diabo: Sincretismo católico e demonização do orixá Exu.
muito utilizada para a mecânica do capitalismo, e como esse sistema levou
muitas mulheres durante a história a venderem seus corpos para sobreviver.
Outro livro que também poderia ser de grande valia é: O diabo e terra
de Santa Cruz (1986). Nele entendemos como bruxas e prostitutas estavam
ligadas a visão da inquisição. Isso fica claro no trecho a frente: “No estereótipo,
feiticeira e prostituta eram indissociáveis.” (SOUZA, 1986, p. 328). E vemos
como isso reflete dentro na história, a rainha Maria Padilha de Castelã fica com
mesma associação a feitiçaria e prostituição por ter sido cortesã do rei Dom
Pedro de Castelã21; séculos depois Maria Padilha seria invocado por mulheres
da região da ibérica, para filtros de amor 22.
Esse tema da prostituição ligado ao sagrado não é algo da atualidade,
mas sim de tempos imemoriáveis, fato que o livro - A Prostituta Sagrada: a
Face Eterna do Feminino (1997) – traz de maneira muito rica. O paradoxo entre
prostituição e sagrado, duas palavras que muitas vezes são associadas as
pombagiras. Isso fica muito claro no quando se referem a esses espíritos 23, um
artigo que ajuda nessa ideia é De Yiá Mi a Pomba Gira: transformações e
símbolos da libido (2000) na qual fala-se que as Iyabas24 na umbanda
perderam muitas características libidinosa que possui em outros cultos
(especificamente no candomblé), e que essa parte fica sendo regida na
umbanda por Pombagira, o lado Ajé25 dessas iyabas que ligada a Iyami
Osoronga26, então a face bruxa e libidinosa dessas divindades fica sendo
regida na umbanda por essas guardiãs as Pombagiras. O artigo que fecha o
assunto sobre prostitutas e pombagira é o artigo: - A POMBA-GIRA NO
IMAGINÁRIO DAS PROSTITUTAS (2007) – o trecho dele final traz uma
reflexam sobre isso:

21
MEYER. Maria Padilha E Toda A Sua Quadrilha: De Amante De Um Rei De Castela A Pomba-Gira De
Umbanda - 1993
22
SOUZA. O diabo e terra de Santa Cruz - 1986
23
DINUCCI,Kiko. Dança das Cabaças – 2006.
24
“Rainha; nome pelo qual os Orixás femininos (e seus filhos e filhas) são designados. (MARTINS, 2001,
p. 172). Também grafado (principalmente na Bahia) Aiabá” (PARIZI, P 259)
25
“Àjé. Mulheriniciada no culto a Iyami Oxorongá; mulher dotada de poderes especiais que os utiliza
para praticar tanto o bem quanto o mal. As Àjé Funfun trabalham especialmente para o bem, enquanto
as Àjé Pupa trabalham especialmente para o mal. Epiteto de Iyami Oxorongá.” (SALMI/RIBEIRO apud
PARIZI, p. 249) ou “Definição pejorativa de bruxa.” (ALCAMO, p 73)
26
“Iyami Oxorongá representam o Feminino em toda sua complexidade e aspectos: ao mesmo tempo
generoso e protetor, mas perigoso e destrutivo. Força ancestral, antiga como a Terra.” (PARIZI, p 108)
Maria Padilha, Maria Molambo, Maria Navalha, Maria Quitéria,
Surubita, Luziara, foram as prostitutas pesquisadas que em diferentes
níveis possuem uma relação com a Pomba-Gira, de acordo com suas
experiências de vida. Para elas, como pudemos observar, as
Pombas-Giras são suas “mães”, madrinhas, protetoras, as
“acompanham”. Senhoras dos seus destinos, são responsabilizadas
pelas suas trajetórias, detém o poder sobre os seus desejos, sobre as
suas conquistas, sobre os seus homens. Para Maria Molambo e
Maria Quitéria ao relatar que já viram a entidade, citam o espelho
como lugar da sua aparição, destarte, o espelho é aquilo que reflete
imagens, dessa forma, poderíamos dizer que a Pomba-Gira é a
própria imagem das prostitutas refletidas no espelho. 27

Aí vemos a importância dessas entidades para essas mulheres que


ainda são marginalizadas na nossa sociedade contemporânea. O filme -
Pomba gira (1998) - de Patrícia Guimarães e Majar Vargas, traz a Pombagira
marginalizada, feiticeira, benigna se realiza desejo, maligna se afasta
parceiros, e assim é amostrada, esse documentário mostra o resultado do
caldeirão de exu, e como ele reverbera, e acontecia nas comunidades.
A obra – Encantaria Brasileira (2006) – traz o conhecimento muito amplo
sobre os encantados nas religiões afro-indígenas brasileiras, assim vendo a
diversidades e pluralidades que podemos encontrar em território brasileiro de
figuras espirituais que aqui podem possuir certos aspectos e outras regiões
outros28.
O artigo de Tadeu mourão - Encruzilhadas da cultura Imagens de Exu e
Pombajira e A OUTRA ARTE SACRA BRASILEIRA O CASO DA POMBAJIRA
MENINA -, e o artigo de Felipe Bernardes - ARUÊ EXU: SOBREVIVÊNCIAS,
MEMÓRIAS E SINCRETISMO – POMBA-GIRA MENINA DA PRAIA ambos
fazem uma pesquisa iconográfica baseado no método de Warburg para se
estudar a formação da imagem de Pombagira menina da praia e a sua
inspiração no “O Nascimento de Vênus’’ de Sandro Bottecelli, faz um análise
criteriosa dos símbolos e relações que ambas guarda uma com a outra.

8.Fontes e Material do trabalho:

27
(SANTOS/SOARES, 2007. p 18)
28
PRANDI, Reginaldo. Et al. encantaria brasileira. Pallas.6 de setembro 2006. p 08
(figura 1: Peça do culto de Oxum, escultura em madeira, Nina rodrigues. Rio de janeiro,1904
Fonte: Revista Artistica, Scientifica e Literaria)

(figura 2: Pombagira Menina da Praia, escultura em gesso policromado; Caxias do Sul[RS],


2023 Fonte: Ervaria central < Imagem Pomba Gira da Praia 40 Cm Concha Mod4
(ervanariacentral.com.br) >)
(figura 3: O nascimento de Vênus, têmpera sobre tela, Sandro Botticelli, 1482- 1486, Galeria
dos Uffizi, Florença)

(figura 4: Pombagira Menina Bahia, escultura em gesso resinado,2023,São Paulo,fonte: Luz da


mata < Pomba Gira Menina Imagem Umbanda Gesso Escultura 35 Cm (mercadoshops.com.br)
>)
(figura 5:Vênus capitolina, escultura em mármore, Autor desconhecido, dinastia antonina [96
d.c.-192d.c.] fonte: Santa Sé)

(figura 6: Pombagira Menina sentada, escultura em gesso pintada a mão.2023,Fonte: Elo7 <
Pomba Gira Menina Sentada Imagem Pomba Gira Sentada | Elo7 >)
(figura 7: Olympia, óleo sobre tela, Édouard Manet.1863, Fonte: Musée d’Orsay, Paris)

(figura 8: Maria da Paz, em registro do álbum particular da mãe de santo Maria Helena. Fonte:
https://journals.openedition.org/eces/452?lang=es)
(figura 9: Pombagira Menina sem roupa, escultura em gesso pintada a mão.2023,Fonte: Elo7<
Imagem Pomba Gira menina escultura pomba gira menina s/roupa (elo7.com.br) >)

(figura 10: Venere Anadiomene, óleo sobre tela. Jean-August-Dominique Ingres, [1808 – 1848],
Fonte: Museu Condé, Chantilly)

A escolha dessas imagens são o estopim dessa investigação, elas são


papel fundamental para essa tese e são parte presente para essa pesquisa.
A figura número 1 é uma “peça do culto de Oxum” da revista de Artistica,
Scientifica e Literaria. Marianno Carneiro da Cunha afirma em seu livro que
essa foi a obra de arte que influenciou na construção das imagens de pomba
gira no futuro, pois ela guarda diversas características dessas 29.
A segunda, quarta, sexta e nona figura, são representações achadas de
Pombagira Menina disponíveis em Florais presenciais e virtuais do nosso país.
A terceira, quinta, sétima e decima figura, são pinturas e esculturas do
universo do Renascimento e Era moderna com figuras de ideias de beleza
dentro dos cânones da arte ocidental.
A oitava figura é foto do álbum pessoal da mãe de santo Maria Helena,
sacerdotisa do Templo de Angola Xangô Catulho Onicá no Zambe, na foto ela
está em transe com sua Pombagira Maria da Paz 30. Essa fotografia é de suma
importância para confecção do produto dessa tese.

9.Cronograma:

Atividades Fev Mar Abril Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
o
Pesquisa x x x x x
Bibliográfica
Leitura e x x x x x x x x
Análise
Elaboração do x x x x
projeto
Entrega do x x x
Projeto
Elaboração do x x x x x x x
trabalho
Revisões x x x

29
CARNEIRO DA CUNHA, Marianno. Arte afro-brasileira. In: ZANINI, Walter (ed.). História geral da arte
no Brasil. Volume II. São Paulo: Instituto Walter Moreira Salles, 1983, p. 1000
30
CORREIA, Luiz. “Corpo, emoções e identidade: reflexões sobre narrativas e fotografias de um terreiro
de culto afro-brasileiro”. 2010, p. 2
Entrega de X x
trabalho

Defesa de tcc x

10.Referências bibliográficas:

ALCAMO. Ileana. A fonte – iya nlá – mãe yorúbà. Athelia Henrietta Press, Inc.
ANDRADE, Paula Carolina. Os gênios vão muito além da lâmpada. Editora
tabla. Rio de Janeiro
< Os gênios vão muito além da lâmpada - Editora Tabla>
AUGRAS, Monique Rose Aimée. De Yiá Mi a Pomba Gira: transformações e
símbolos da libido. In MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.).
Candomblé, religião do corpo e da alma. Rio de Janeiro: Pallas, 2000, p. 17-44
BERNANDES, Felipe. ARUÊ EXU: SOBREVIVÊNCIAS, MEMÓRIAS E
SINCRETISMO – POMBA-GIRA MENINA DA PRAIA. Revista Seminário de
História da Arte. 2019
CARNEIRO DA CUNHA, Marianno. Arte afro-brasileira. In: ZANINI, Walter
(ed.). História geral da arte no Brasil. Volume II. São Paulo: Instituto Walter
Moreira Salles, 1983.
CORREA, Alexandre. UM MUSEU MEFISTOFÉLICO: MUSEOLOGIZAÇÃO DA
MAGIA NEGRA NO PRIMEIRO TOMBAMENTO ETNOGRÁFICO NO BRASIL. Rio de
janeiro,Uerj.
CORREIA, Luiz. “Corpo, emoções e identidade: reflexões sobre narrativas e
fotografias de um terreiro de culto afro-brasileiro”. 2010
COUSTE, Alberto. A biografia do Diabo. Record, 1 janeiro de 1996
DINUCCI,Kiko. Dança das Cabaças - Exu no Brasil. Youtube, 2006 -
https://youtu.be/yZyRzyE1gEc
FEDERICI,Silvia. Calibã e a Bruxa: Mulheres, Corpos e Acumulação Primitiva.
Editora Elefante, 23 maio 2019
 GUIMARÃES,Patricia,VARGAS, Maja. Pomba gira. Youtube, 1998 –
https://youtu.be/Jor-Thi0sSY
LOPES, Nei. Novo Dicionário Banto do Brasil. Pallas, 6 setembro 2006.
MARTINEZ,Barbaro. *“Ma kisi Nsi: L’art de habitants de region de Mbanza
Kongo” in Angola figures de pouvoir. Paris: Dapper Museum Press, 2010
MEYER,Marlyse. Maria Padilha E Toda A Sua Quadrilha: De Amante De Um
Rei De Castela A Pomba-Gira De Umbanda. Livraria Duas Cidades, 1 de
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