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O mito do boto e a sua representação na cultura

Antes de iniciarmos a descrição do que é o mito do boto e aquilo que representa


devemos analisar o que é um mito para uma melhor conceção do termo.
Segundo a “GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA”, a palavra
"mito" tem várias definições, onde podemos incluir o discurso, narrativa, boato,
legenda, fábula e apólogo.
No entanto, é muitas vezes utilizada de forma a referir-se a uma história fictícia. Esta
interpretação é baseada em uma visão racionalista que acredita que apenas a razão pode
expressar a verdade. No entanto, esta visão mais simplista é hoje em dia algo já
ultrapassado, já que muitos desses mesmos conhecimentos misteriosos são de natureza
simbólica. Num sentido mais profundo, os mitos são descrições religiosas antigas que
expressam exemplos da ação humana através dos atos dos "deuses". Estas narrações
sagradas possuem uma imposição para a vida humana.
Outra definição de mito que encontramos no dicionário do Priberam, é que mito diz
respeito ao discurso, ás coisas ditas, história, conto , narrativa, ficção, e que pode
englobar uma personagem, que mesmo não tendo sido real, simboliza algo que se deve
admitir; ou ainda uma pessoa ou uma coisa, que não existe, mas se supõe que é real.
Agora que conseguimos dar uma definição geral do que é um mito e o que isto
representa, vamos centrar no mito em questão, no mito do boto. O que é o Mito do
Boto? Qual é a sua origem? Se foi algo que surgiu já no nosso século ou é algo já que
passou algumas gerações e dessa forma que tenha contribuído para que seja considerado
um dos mitos mais difundidos? E como acontece em muitos mitos, existe apenas uma
versão ou existem mais? É isto que vou tentar responder com a pesquisa que realizei
sobre este mito.
Podemos dizer que se trata de um mito de origem indígena e que faz parte do folclore
brasileiro.
A partir da dissertação de mestrado de Gilzete Passos Magalhães, intitulada com o
nome – Os espelhos dos rios: dimensões simbólicas da relação de género na lenda
amazónica o boto, os historiadores e folcloristas apontam a origem desta personagem
depois da invasão dos europeus à América, entre os séculos XV e XVI. Após esses
acontecimentos, alguns estudiosos procuraram pesquisar sobre o assunto em busca de
satisfazer as curiosidades contidas neste mesmo mito.
Numa outra pesquisa, apareceu um ponto de vista de um antropólogo chamado Luís da
Câmara Cascudo, em que aponto a ligação do mito do boto aos atos carnais e que tal
remete à Grécia Antiga.
Menciona-se ainda que o boto, que tem como habitat, a bacia do rio Amazonas e do
Orinoco, tanto no Brasil, como na Colombia, no Peru e na Bolívia, apresenta
semelhanças com um mamífero bastante conhecido que é o golfinho, apenas com
algumas diferenças mínimas entre eles; o golfinho é de cor cinza, enquanto o boto pode
ser cinzento ou de cor rosa, e outra diferença é que o golfinho vive em água salgada e o
boto tem como habitat a água doce.

Esta comparação e apresentação de semelhanças entre os dois faz com que este
antropólogo aponte para o fato que o golfinho era considerado um símbolo de luxúria
para os romanos e para os gregos, pois as partes do seu corpo eram consideradas
afrodisíacas, algo que associavam à deusa do amor.

Esta associação deste mamífero como símbolo de poder e de proibido e até de


afrodisíaco permaneceu durante séculos e foi aplicada à posteriori no Brasil, à
personagem do boto. Assim passa-se a ideia de que o boto era um símbolo afrodisíaco e
não só, pois partes do corpo do boto eram vistas como tendo poderes mágicos. Sabe-se
ainda que o mito do boto só se fundou nesta cultura popular no século XIX.

Mas o que é o mito do boto?

Encontrei algumas versões diferentes do mito do boto, quanto ao momento que ele
surge, ou seja em algumas versões, fala-se que só aparece nas festas de junho, outras
versões fala-se apenas que aparece nas festas dos povos do Rio Amazonas, e outros só
em noites de lua cheia; na maioria das versões diz que ele atrai as mulheres mais bonitas
e as engravida , não falando de nenhuma especificidade das mesmas, no entanto
encontrei versões em que diz que o boto não procura apenas as mais bonitas mas sim
uma mulher virgem.

Sendo assim, mantive-me na versão que é mais apresentada de forma mais generalizada.
Nas festas dos povos do Rio Amazonas aparece um jovem elegante, que se veste bem, e
normalmente com roupa branca. Além da roupa, traz na cabeça um chapéu, como se
quisesse esconder o rosto, o que é normal, tendo em conta que o chapéu serve para
esconder um orifício que o mesmo traz na cabeça e que serve para respirar, pois a
transformação não é feita de forma completa. Apresenta ainda um sorriso no rosto, uma
sede por bebidas alcoólicas e um talento para dançar.
Este jovem escolhe a rapariga mais bonita para dançar, e o que acontece é que a
escolhida cai de amores pelo boto, como quase por magia e se entrega a ele de uma
forma dominante. Engravida a rapariga e na manhã do dia seguinte, assim que surgia os
primeiros raios de sol, a transformação voltava acontecer e o jovem atirava-se ao rio.
No entanto não é apenas nas festas que o boto aparece, pois dizem também que as
raparigas que estiverem nas canoas com roupas vermelhas ou menstruadas, podem ser
atiradas para fora das embarcações pelo boto, pois este sente-se atraído pela cor das
roupas e pelo cheiro.
Uma das mensagens utilizadas pelas gerações às jovens por causa deste mito, era que
tivessem cuidado pelas mulheres mais velhas para terem cuidado com os homens mais
elegantes das festas onde iam, e que caso vissem um homem que estivesse de chapéu
que pedissem para retirar de forma a certificarem-se que não se tratava do boto, isto
tudo acontecia para evitar a possibilidade de as raparigas jovens se tornarem mães
solteiras e por em causa a honra da família.
Como já falei anteriormente, o mito do boto é um dos mitos mais difundidos no Brasil e
dessa forma a sua representação não é feita só na literatura mas também na música, no
teatro e no cinema.
Desta forma destaco na área da música , algumas que se inspiraram ou tomaram como
base o mito para as suas composições como: Foi Boto, Sinhá, de Waldemar Henrique;
Lenda do Boto, de Wilson Fonseca; Esse Rio é minha rua, de Rui Barata e Paulo André;
Boto Namorador, de Dona Onete; Olho de Boto, Nilson Chaves e Encanto do Boto, de
Zake Sá.
No cinema podemos destacar desde logo o filme de Walter Benjamim Júnior, Ele, o
boto; depois existem outras adaptações, como por exemplo A Força do Querer, que é
uma telenovela; temos ainda Principe da encantaria, que é uma curta metragem de
animação; Lendas Amazónicas, de Moisés Magalhães que é um documentário com 4
episódios, onde se tratam de lendas, onde um desses episódios é sobre o mito
apresentado, temos ainda Cidade Invisivel, que penso que é das últimas adaptações
feitas para a cinema e neste caso pela Netflix em 2020.
Na área da escultura também encontramos algumas representações como por exemplo
uma escultura em bronze intitulada como O Boto, de Maria Martins. E por fim na
pintura encontramos uma pintura de Helton Faustino, com o nome de A Lenda do Boto.
Desta forma conseguimos perceber o impacto que o mito do boto trouxe ao povo
brasileiro, e da forma que se repercutiu na sociedade e na representação do mesmo nas
várias áreas. Além disto, no Brasil é habitual dizer ainda nos dias de hoje que quando
não se sabe quem é o pai de alguma criança, dizer que é filho do boto.
Bibliografia

GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA. Lisboa/Rio de Janeiro:


Editorial Enciclopédia, [s.d. p.]

"mito", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-


2021, https://dicionario.priberam.org/mito [consultado a 03-04-2023].

MAGALHÃES, Gilzete Passos. Os espelhos dos rios: dimensões simbólicas da relação de gênero
na lenda Amazônica o Boto. 2013. 150 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 20

Origem do boto, in Boto Cor de Rosa, https://brasilescola.uol.com.br/folclore/boto-cor-de-


rosa.htm#Origem+da+lenda (consultado a 08-04-2023)

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