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INTRODUÇÃO

Cus D’amato foi um dos personagens mais


fascinantes da história do boxe. Pioneiro em dar
atenção aos elementos psicológicos no esporte,
Cus também sempre demonstrou um interesse
genuíno com seus pupilos, se preocupando com a
educação e formação do atleta como um ser
humano em sua integralidade.
Adotando métodos de treinamento pouco
ortodoxos, Cus foi visto como um ser excêntrico,
até mesmo um pária por seus pares, mas o passar
dos anos acabou por lhe fazer justiça e hoje sem
dúvida ele tem o reconhecimento merecido.
Esse livro resgata alguns dos ensinamentos mais
importantes que Cus transmitiu a seus atletas, além
de esmiuçar a sua intricada metodologia de
trabalho. Venha conhecer a visão de mundo do
lendário treinador de 3 campeões mundiais: Floyd
Patterson, José Torres e Mike Tyson.

ÍNDICE
Ensinamentos de Cus D’amato
Cus e as técnicas mentais
Entrevista com o Dr. Scott Weiss, o escritor da
biografia de Cus D’amato
A metodologia de trabalho de Cus
10 Curiosidades sobre Cus D’amato

ENSINAMENTOS DE CUS D’AMATO

"Um garoto vem a mim com uma fagulha de


interesse, eu alimento essa fagulha e ela se torna
uma chama. Eu alimento a chama e ela se torna
fogo. Eu alimento o fogo e ela se torna uma
gigantesca labareda."

"Não existe nada como um pugilista natural. Existe


uma aptidão para socar e que é diferente. Ninguém
nasce sendo o melhor. Você deve praticar e treinar
para se tornar o melhor."

**CUS D´AMATO EM COMO AS LIÇÕES MAIS


IMPORTANTES NÃO SÃO ENSINADAS NA
ACADEMIA, MAS NA MESA DE JANTAR:

“Eu nunca ensino até que eu tenha conversado com


o lutador. Eu tenho que primeiro determinar seu
estado emocional, conhecer sua história, para
descobrir o que devo fazer, quantas camadas eu
devo retirar até que eu alcance o núcleo da pessoa,
para que ele, assim como eu, possa reconhecer o
que há lá dentro.”

**EM COMO O RECONHECIMENTO DO MEDO É


UMA LIÇÃO CRUCIAL QUE ELE ENSINAVA E ERA
IGNORADA POR OUTROS TREINADORES:

“O medo é o maior obstáculo para o aprendizado


em qualquer área, mas particularmente no boxe.
Por exemplo, boxe é algo que você aprende por
repetição. Você faz a mesma coisa de novo e de
novo, e de repente você chega lá. Entretanto,
enquanto tenta aprender, se você for atacado ou se
machucar, isso irá fazer com que você fique
receoso, e se você está receoso você não pode
repetir o movimento. Isso irá atrasar o processo de
aprendizado. Quando eles vêm até a academia e
dizem “Eu quero ser um lutador”, a primeira coisa
que faço é conversar sobre medo. Eu normalmente
uso o exemplo do cervo cruzando um campo aberto
e quando se aproxima de uma clareira, de repente
os instintos o avisam de que há perigo lá, e a
natureza inicia o processo de sobrevivência, que
envolve o corpo liberar adrenalina para a corrente
sanguínea, fazendo com que o coração bata mais
rápido e permitindo ao cervo feitos extraordinários
de agilidade e força... Ele permite ao cervo sair do
perigo, ajuda ele a escapar para a segurança da
floresta através da clareira... Um exemplo de como
o medo é seu amigo.”

“A coisa que um garoto de rua mais teme é ser


chamado de covarde ou “maricas”, e às vezes uma
criança irá fazer coisas estúpidas, selvagens e
loucas, apenas para esconder o quanto está
amedrontado. Eu muitas vezes digo a eles que
mesmo que o medo seja uma coisa detestável e
embaraçante, ele ainda é seu amigo, porque se, a
qualquer momento alguém salva sua vida, talvez
inúmeras vezes ao dia, não importando o quanto ele
é detestável, você deve olhar pra ele como um
amigo, e é isso o que o medo é. Já que a natureza
nos deu o medo para nos ajudar a sobreviver, nós
não podemos olhar para ele como inimigo. Apenas
pense em quantas vezes num dia uma pessoa
poderia morrer se ela não tivesse medo. Ele andaria
na frente dos carros, ele morreria inúmeras vezes
no dia. Medo é um mecanismo de proteção.
Conversando com o lutador sobre o medo eu corto
o tempo de aprendizado em até metade do tempo,
às vezes até mais, dependendo do indivíduo.”

**SOBRE O HERÓI E O COVARDE:

"Eu pergunto aos meus garotos, qual a diferença


entre o herói e o covarde? Qual a diferença entre
amarelar e ser corajoso? Nenhuma. Apenas o que
você faz. Ambos sentem o mesmo. Ambos sentem
medo de morrer e de se machucar. O homem que
amarela se nega a encarar o que ele deve encarar.
O herói é mais disciplinado, e ele luta contra esses
sentimentos e faz o que deve ser feito. Mas ambos
sentem o mesmo, o herói e o covarde. Pessoas que
o observam o julgam pelo que você faz, não pelo
que você sente."
**SOBRE A IMPORTÂNCIA DOS ELEMENTOS
PSICOLÓGICOS NO BOXE:

“A próxima coisa que faço é deixá-los em perfeitas


condições, sabendo como a mente é e as peças que
ela prega no indivíduo, e como a vontade de um
indivíduo sempre procura uma maneira de evitar
um confronto com algo que o intimida. Eu removo
todas as dúvidas possíveis que eles possam ter
antes de estarem lá. Deixando-os em excelentes
condições, eles não vão poder dizer que estão
cansados porque eles não estão em forma. Quando
estão em excelente forma, eu os coloco para boxear
pela primeira vez, normalmente com um lutador
experiente que não irá tirar vantagem deles.
Quando o novato dispara socos e vê que nada
acontece, e seu oponente continua vindo até ele, o
novato entra em pânico. Quando ele entra em
pânico, ele quer desistir, mas ele não consegue
desistir, porque sua mente, desde os tempos em
que esteve nas ruas, está programada para
condenar quem “amarela”. Então, o que ele faz? Ele
fica cansado. Isso é o que acontece com lutadores
no ringue. Eles se cansam porque ficam com medo.
Agora que ele está cansado, ninguém poderá dizer
que ele “amarelou”. Ele simplesmente está
“cansado demais” para seguir adiante. Mas deixe
esse mesmo lutador atacar ferozmente e com
efeitos visíveis no oponente, e de repente aquele
cansado e exausto lutador se torna um tigre. É
fadiga psicológica, somente isso. Mas as pessoas do
boxe não entendem isso.”

**D´AMATO NOS SEUS MÉTODOS


DESENVOLVIDOS E UTILIZADOS ATRAVÉS DOS
ANOS E USADOS PARA ENSINAR TYSON:

“Eu conto a eles que a primeira vez que forem lutar,


na noite anterior certamente não vão dormir. Eu não
posso oferecer muito conforto, exceto pelo fato de
que o adversário passou pela mesma coisa, e
quando eles descem pra lutar e vão até os
vestiários, especialmente se estiverem numa luta
amadora, a sala estará cheia de possíveis
oponentes, porque eles não sabem contra quem
irão lutar, e todos parecem calmos, confiantes e
sorridentes, enquanto os novos rapazes estão
estáticos com o coração saltando, e eles ficam
intimidados pela atitude e confiança deles. O que
eles não sabem, é que os mais velhos olham para
eles e veem a mesma coisa em si mesmos, pois
sabem através da disciplina passar confiança
superficialmente. Vamos agora ao ringue.
Normalmente, eles vão até o ringue como se
estivessem indo à forca. Por isso, quando um
lutador sobe as escadas do ringue, eu nunca o
chamo de "amarelão". Sabendo o que virá a seguir,
o simples ato de subir ao ringue faz dele uma
pessoa de coragem e disciplina."
“Então, assim que sobem ao ringue, o outro rapaz
provavelmente irá parecer maior, e mais forte, e
melhor condicionado, e quando ele começa a se
soltar, ele irá parecer mais experiente. Essa é a
mente e imaginação de um lutador iniciante
exagerando tudo, que é o que a mente sempre faz.
Nada é tão ruim da forma que a imaginação a torna,
nem mesmo a morte. Uma pessoa não irá perceber
o que o torna nervoso até que ele entenda a razão
de estar amedrontado, que é uma coisa natural e
normal. Quando ele entende isso ele passa a aceitar
esse fato como ele é. Então isso já não será tão
intimidador, sendo essa a razão do porque eu levo
o garoto passo a passo até que o gongo soe para o
início da luta. Eu os levo por esse caminho. Eu faço
isso para que, eles já estejam habituados com esses
sentimentos, que por si só já são intimidadores.
"“Cus disse que seria assim”, então eles não se
sentem como se fossem inferiores ou menos
preparados que seus oponentes.”

“Então, quando eles vão encarar o seu


oponente e o gongo soa, pela primeira vez. Eles
encaram a realidade, e subitamente vem uma calma
relativa sobre eles. Relativa. Eles ainda estão
amedrontados, mas já não é a coisa desconhecida e
intimidadora que parecia ser. No momento que os
golpes começam a ser trocados, que o esforço de
disparar socos começa, eles ficam calmos, porque
agora, isso é algo com o qual eles podem lidar.
Entretanto, devo dizer que em momento algum o
medo desaparece. Ele é tão ruim tanto na sua
centésima luta quanto na primeira, exceto pelo fato
de, por ter cem lutas ou mais, ter adquirido
disciplina o suficiente para que ele aprenda a
conviver com o medo, sendo esse o objetivo,
aprender a conviver com isso.”

“Todo e qualquer lutador que já existiu sentiu


medo. Se um garoto viesse a mim e me dissesse que
ele não está com medo, ou eu diria que ele está
mentindo, ou então tem algo errado com ele. Eu o
mandaria para um médico para saber o que diabos
acontece com ele, por que essa não é uma reação
natural. O lutador que sobe ao ringue e não sente
medo, ou é um mentiroso, ou é um psicopata.”

*SOBRE A IMPORTÂNCIA DA FORÇA DE


VONTADE:

“Quando dois homens estão lutando, o que se


observa é mais uma disputa de vontades do que de
habilidades, normalmente com a vontade mais forte
sobrepujando a habilidade. A habilidade somente
vai prevalecer quando a habilidade for tão superior
à habilidade do outro homem, que sua vontade não
é testada. Quando você vê um lutador ficando
cansado, note que ele fica cansado quando a
pressão aumenta, após ele estar machucado ou em
uma situação difícil, incapaz de tomar o controle da
situação. É quando ele começa a ficar cansado. Por
isso, quando dois bons lutadores sobem ao ringue,
eles estão parelhos, não vão recuar um único
centímetro, e estão usando toda sua habilidade e
técnica, até que talvez no sétimo, oitavo ou nono
assalto, um dos lutadores comece a fraquejar. Isso
significa que ele chegou a um ponto onde ele já não
pode suportar mais a pressão. Ele agora ficou
dominado, pois quando duas pessoas lutam, são
similares a dois exércitos, com um tentando impor
sua vontade ao outro.”

**SOBRE SER UM PROFISSIONAL:

"Eu acredito que um homem é um profissional


quando ele pode fazer o que é necessário ser feito
não importa como ele se sinta por dentro. Um
amador é um amador na sua atitude
emocionalmente. Um profissional é um profissional
na maneira que pensa e sente e em sua habilidade
de executar ordens sob condições adversas. A
habilidade de fazer o que deve ser feito
independente da pressão e fazer isso com
equilíbrio, sem mostras dos seus sentimentos
interiores ou conflitos, se existem, é o que faz um
profissional. Isso nada tem a ver com seu
conhecimento. Eu posso te mostrar muitos
amadores com conhecimento e habilidades muito
superiores do que os melhores profissionais."

"Quando você é acertado, é quando você deve


permanecer calmo. Um lutador profissional deve
aprender como atacar e não ser atacado, e ao
mesmo tempo ser empolgante. É disso que é feito o
boxe profissional. Você tem que ser esperto, você
tem que ser inteligente, e não pode ser acertado, e
quando você é capaz disso, você é um lutador."

"Se você pode acertar seu oponente com dois


socos, você não deve acertá-lo com apenas um. Vá
lá com algumas más intenções. Acredite em si
mesmo. Uma pessoa pode sentir quando você não
acredita em si mesmo. Prepare sua mente para que
você mesmo faça isso.”
"Boxe é uma disputa de personalidade e
criatividade. O boxeador com maior vontade,
determinação, desejo e inteligência é sempre
aquele que emerge como vitorioso."

**SOBRE COMO MIKE DEU A ELE RAZÃO PARA


VIVER:
"Eu digo com frequência a Mike, "Você sabe, eu
devo a você muito," e ele não sabe o que quero
dizer. Se ele não estivesse lá, eu provavelmente não
estaria vivo hoje. A Natureza é mais esperta do que
as pessoas acham. Pouco a pouco nós perdemos
nossos amigos com os quais nós nos importamos, e
pouco a pouco perdemos nosso interesse até que
finalmente nós dizemos que diabos estou fazendo
por aqui se não tenho motivos para seguir adiante?
Você se acostuma com tudo. Até mesmo a ideia de
morrer se torna comum, e a pessoa passa a aceitá-
la. Eu acredito que as pessoas morrem porque elas
não querem mais viver, elas não têm mais
motivação para continuar vivas. Mas eu tenho uma
razão com Mike aqui, e ele me dá a motivação. Eu
irei viver e irei vê-lo se transformar num sucesso,
porque eu não vou partir enquanto isso não
acontecer, pois quando eu partir, ele não vai saber
apenas lutar, ele será capaz de tomar conta de si
próprio. Eu não tenho êxito quando eu faço de um
rapaz o campeão do mundo. Eu tenho êxito quando
faço deste rapaz o Campeão Mundial e
independente de mim."

**SOBRE O PROGRESSO DE MIKE NUM PERÍODO


CURTO DE TEMPO:
"O garoto pode fazer tudo que ser um campeão
requer, e se ele fizer tudo que ele é capaz de fazer,
eu te digo que ele será um dos maiores lutadores de
todos os tempos. Como um profissional meu
julgamento de um lutador é imparcial, eu nunca
permito que meus sentimentos pessoais se
envolvam, não importa quanta afeição eu tenha por
ele, e eu posso honestamente dizer que eu tenho
uma afeição muito grande por ele, e uma
admiração, vendo de onde ele veio para onde ele
está agora, porque eu sei o que é necessário para
fazer o que ele faz e o que ele tem feito. Eu sinto que
sou uma parte disso. É quase como observar a si
mesmo. Você nunca sabe o quanto você contribuiu
para isso, mas o resultado está aí e é bom pensar
que você tem algo com isso."

CAMPEÃO PESO-PESADO NO TOPO:

"Muitas pessoas que estão no meio do boxe todos


esses anos nunca tiveram um campeão, certamente
um campeão peso-pesado. É muito improvável que
isso aconteça durante toda a vida de uma pessoa.
Eu tive Floyd Patterson, e então, aqui, com 76 anos,
eu tive sorte de encontrar esse jovem que tem, em
minha opinião, todos os requisitos para se tornar o
campeão que tenho certeza que se tornará, talvez, o
maior que já viveu."
CUS E A TÉCNICAS MENTAIS

D'Amato morreu em 1985, aos 77 anos, um ano antes


de seu maior aluno, Mike Tyson ser coroado como
o mais jovem e sem dúvida um dos mais
empolgantes campeões dos pesos pesados que o
mundo já viu. A gênese de qualquer grandeza
começa com uma faísca. Mas sem orientação,
motivação e uma mentalidade inquebrantável, o
caminho para a grandeza e o caminho para a
mediocridade diferem apenas ligeiramente. Sem
esse desejo ardente e fome inata, não importava
quanto talento natural e proeza física você tivesse.
Sem essa determinação mental, você nunca se
arriscaria a se tornar um grande lutador. Cus sabia
que, para que seu novo aluno se tornasse um
grande lutador, ele precisava dominar o músculo
mais importante do corpo. A mente. Cus levou Iron
Mike para sua casa ainda jovem e costumava sentar-
se ao lado da cama e ensinar a Mike as lições da
mentalidade de campeão. Lições de visualização,
Afirmações, Repetições, aceitação do fracasso,
abraçar o medo, estabelecer metas e estar aberto a
melhorias e aprendizados constantes e sem fim.

VISUALIZAÇÃO
Com a ajuda de Cus, Mike usaria uma técnica de
visualização noturna. Antes de ir dormir todas as
noites, Cus ia até a cama de Mike e o ajudava a se
visualizar como um campeão elusivo, poderoso e
temível, que se movia mais rápido que um peso leve
e batia mais forte do que qualquer peso pesado na
história do boxe. Iron Mike adormecia com
visualizações e sonhava que ele era imparável, e ele
acordava na manhã seguinte querendo ter certeza
de que esses sonhos se tornariam uma realidade.
Cus fez Tyson se imaginar como o indiscutível
campeão mundial dos pesos pesados, um lutador
que se tornaria o maior pugilista de todos os
tempos, até melhor que Muhammad Ali! Cus
transformou o cérebro de Tyson em um filme de
realidade virtual. Cus estava treinando Tyson 24
horas por dia, punindo seu corpo e testando seus
limites durante o dia, mas depois aprimorando a
resiliência mental em seus sonhos enquanto
dormia. Um cronograma de treinamento de 24
horas por dia será suficiente para dar vantagem a
qualquer pessoa sobre seus oponentes.

AFIRMAÇÕES

Tornou-se uma forma de hipnose de autoajuda antes


de dormir todas as noites. Afirmações, como as
visualizações anteriores, eram a outra parte das
técnicas de reprogramação que Cus fazia
internalizar Tyson. Tyson repetia várias afirmações
ligadas a seus objetivos visualizados. Mesmo
quando ele acordou e estava treinando na
academia, Cus repetia as mesmas afirmações para
Tyson. Os dois repetiam um ao outro frases sobre
ser o melhor, sendo imbatível, sendo o boxeador
peso-pesado mais inacreditável que esse mundo já
havia visto. Ao longo de alguns anos, essas
afirmações foram enraizadas na cabeça de Tyson
como fato. Ele havia estabelecido em sua mente
uma profecia que ele deveria cumprir. Ele disse a si
mesmo que ele era o escolhido.

REPETIÇÕES

Uma grande parte do treinamento de Iron Mike foi


repetições. Cus queria que Mike não pensasse
quando estava no ringue. Instintos foram
construídos através da repetição. Para ser o
campeão, Mike precisava se mover sem o atraso do
pensamento ou da indecisão. Ele precisava que a
conexão entre sua mente e corpo fosse fluida e mais
rápida que a velocidade da luz e a única maneira
que ele poderia aprender era através de intensas
sessões de treinamento onde Tyson repetidamente
batia no mesmo lugar na bolsa e fazia os mesmos
combos** até tornou-se habitual como andar. Mike
Tyson transformou seu corpo e mente na arma
perfeita através de repetições monótonas.
**Falaremos mais sobre isso ao explicar sobre a
“Willie Bag”.

LIDAR COM O FRACASSO


Em suas primeiras lutas amadoras, Cus queria que
seu jovem gladiador cometesse erros com
frequência e cedo. Ele queria testar a resiliência e a
capacidade de aceitar erros como parte do
processo. Depois de todas as suas lutas amadoras
repletas de erros, Tyson e D'Amato passariam por
cima de todos os seus erros, tanto fisicamente
quanto mentalmente, e depois faria o que
pudessem para corrigi-los no ginásio e na sala de
aula no dia seguinte. Cus queria que Tyson visse
cada experiência, fosse no ringue ou em sua vida
diária como uma experiência de aprendizado. Cus
disse ao campeão que para ser o melhor que ele
precisava para entender que as melhores lições
sempre vinham de ser derrotado, é aí que os
campeões eram forjados.

TYSON FALA SOBRE SUA EXPERIÊNCIA COM A


HIPNOSE

“Quando eu estava com 15 anos, Cus começou a me


levar a um hipnoterapeuta chamado John Halpin,
em Nova York. Eu me deitava no chão do seu
escritório, e ele passava por todas as fases de
relaxamento, minha cabeça, olhos, braços e pernas,
todos ficando pesados. Assim que eu ficava sob sua
influência, ele me dizia tudo que Cus queria que me
dissesse. Cus escrevia as sugestões num pedaço de
papel, e John as recitava em voz alta.
“Você é o maior lutador do mundo. Seu jab é como
uma arma. Você desfere socos que são ferozes, com
más intenções. Você é um flagelo de Deus.”

CANI (MELHORIA CONSTANTE E INTERMINÁVEL)

Cus instilou em Tyson um amor pela leitura. Essa


sede de conhecimento permaneceu inalterada até
hoje. Ele encorajou sempre essa mentalidade de
menino de escola e garantiu que ele fornecesse a
Tyson todos os livros históricos e biográficos que
pudesse encontrar. Cus sabia que o homem
instruído é aquele sem medo. Ele sabia que o maior
medo de Tyson era o do desconhecido, então,
enquanto Tyson soubesse que havia respostas para
todas as perguntas desconhecidas que ele tinha,
desde que ele soubesse onde procurar, Tyson
estava a caminho de se tornar o mais forte
psicologicamente. poderoso boxeador no ringue,
não importa o adversário que ele enfrentou. Tyson
creditou os livros que Cus deu para ajudá-lo a
entender o modo como as pessoas pensam e, assim,
ajudando-o a desviar cada um de seus oponentes
antes mesmo de entrar no ringue! Tyson disse que
uma de suas figuras históricas favoritas era
Alexandre, o Grande, e no final do dia, graças ao
intenso treinamento em torno de todos, fundado
pelo falecido Cus D'Amato, Mike Tyson foi capaz de
se tornar o 'Alexandre, o Grande 'de sua geração no
ringue de boxe.

Tyson fala da influência de Cus na sua aquisição de


conhecimento e cultura:

“Nunca curti a escola, mas tinha vontade de


aprender. Então Cus me incentivava a ler alguns
livros de sua biblioteca. Li Oscar Wilde, Charles
Darwin, Maquiavel, Tolstói, Dumas e Adam Smith. Li
sobre Alexandre, o Grande. Eu adorava história. Ao
ler textos de história, aprendia coisas sobre a
natureza humana, sobre o coração dos homens.”

ENTREVISTA COM O DR. SCOTT WEISS,


O ESCRITOR DA BIOGRAFIA DE CUS
D’AMATO
Entrevista feita com o Dr. Scott Weiss, co-autor do
livro "Confundindo o Inimigo: A História do Cus
D'Amato" (Acanthus Publishing, 2013). Weiss,
fisioterapeuta e preparador físico para a Olimpíada
dos Estados Unidos. Ele escreveu (junto com Paige
Stover) o volume mais abrangente até hoje em um
dos treinadores mais fascinantes e enigmáticos do
boxe. Usando sua experiência como artista marcial
e ex-boxeador amador, Weiss investiga as
características técnicas, psicológicas e pessoais
que ajudaram D'Amato, com seu estilo peek-a-boo,
a formar campeões como Mike Tyson, Floyd
Patterson e Jose Torres.

Com uma extensa experiência como pesquisador e


uma intensa paixão pelo assunto, Weiss reúne com
sucesso uma sólida compreensão de um homem
muitas vezes intencionalmente oblíquo. Lendo
arquivos e conduzindo dezenas de entrevistas com
pessoas da cena do boxe de Nova York, com
amigos e familiares de D'Amato (que morreu em
1985), Weiss apresenta uma imagem florida do
boxe de Nova York do pós-guerra, os homens que
o controlavam e como uma figura excluída
encontrou seu próprio caminho até o topo,
geralmente por métodos controversos.

Uma das coisas que aprendi com a sua introdução


foi como Cus D'Amato foi uma influência seminal no
seu próprio treinamento em artes marciais. Você
pode falar sobre a influência inicial dele sobre
você?
Minha primeira conexão foi quando ouvi falar do
jovem Mike Tyson subindo no ranking. Sendo um
boxeador e um artista marcial, quase indo às
Olimpíadas em 1988 [por tae kwon do], eu conhecia
Mike Tyson desde a época do meu treinamento. E
sendo um artista marcial, eu disse para mim mesmo,
quem é esse cara? Quem é o técnico dele? Então, eu
diria que no início dos anos 80 foi realmente a
influência de Mike que me fez rastrear Cus e
descobrir quem ele era. Esse foi o início.

A outra influência que você falou foi Bruce Lee.


Como você aprendeu inicialmente sobre Mike
Tyson e Cus D'Amato, o que o chamou ao estilo
dele?
Semelhante a Bruce, é um estilo de vida. Não é
apenas algo que você faz unicamente no esporte. Eu
vivi minha vida pensando em todos esses
pensamentos. Percebi que Bruce e Cus faziam isso
como um estilo de vida, não apenas como uma
vocação. Essa foi a primeira coisa que percebi
sobre eles que era semelhante a mim.
A partir daí, percebi que Cus e Bruce tinham uma
ideia semelhante sobre como conseguir se
expressar totalmente. Por exemplo, quando um
lutador realmente se machuca, o outro lutador se
aproxima do oponente e começa a atirar bombas
para a esquerda e para a direita. Cus disse que
vamos tentar adotar a postura imediatamente, o que
é semelhante a uma postura de cavalo, para que
você possa obter o mesmo poder de esquerda e
direita se souber como mudar seu peso
corretamente.
Era como conciliar o Oriente e o Ocidente, e Cus
nem sabia que ele estava fazendo isso. Bruce
resumiu isso e Cus estava meio que brincando com
isso no Ocidente.

Depois que você deixou de competir ativamente em


artes marciais, o que ficou com você de Cus? Quais
foram algumas das facetas dos ensinamentos de
Cus que o levaram a exercer um papel mais
exploratório sobre a vida dele?
O estilo de Cus transcendeu o boxe. Toda a sua
abordagem foi adotar um estilo de vida como eu
estava aludindo antes - a ideia de adaptar um estilo
de vida de nutrição, treinamento, psicologia, sono
certo. Tudo o que ele estava dizendo era tão
análogo ao que estou fazendo com os atletas
olímpicos com quem trabalho agora como
fisioterapeuta. Estarei no centro de treinamento em
Colorado Springs enquanto nossos atletas estão nos
Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi, Rússia.
Ser capaz de ver como os melhores atletas
treinavam era realmente um objetivo meu. Vendo
como Cus treinou e como esses atletas olímpicos
treinaram, houve um cruzamento. Mas Cus estava
muito à frente do seu tempo.

Vamos falar de algumas especificidades de um


ginasta olímpico: quando você estraga tudo e falha
no que está tentando fazer, voltar ao seu ritmo é a
coisa mais difícil da vida. A garota cai da trave de
equilíbrio e então se levanta e diz: “Puta merda,
acabei de cometer esse erro. Em plena Olimpíada.
O que faço a partir de agora?” E Cus sabia
desenvolver essa confiança em você. Ele sabia
hipnose. Ele sabia aplicar a técnica, sabia as
palavras certas a dizer.

O que fez você buscar Cus em particular como o


assunto de seu primeiro livro?
Sendo um lutador de menor envergadura, gostei do
estilo do “peek-a-boo”. O ritmo e o tempo eram
mais...incomuns. Foi o que eu fiz naturalmente -
então essas são as qualidades estilísticas. Além
disso, percebendo que o que você está fazendo é
mais do que apenas lutar, estava me aprimorando
nisso. Percebi que Cus fazia isso naturalmente, com
seus lutadores sempre dando tudo o que podiam, os
ensinava a ser uma pessoa completa primeiro e um
ótimo atleta - isso era muito importante - e não
apenas um grande boxeador. Era disso que eu
gostava no Cus.
Como você se juntou à sua co-autora, Paige Stover,
neste projeto?
Depois de estar nas Olimpíadas pela segunda vez,
em Pequim, conversei com Michael Phelps.
Conversei com Tim Morehouse, duas pessoas que
escreveram seus livros. Foram eles que me
direcionaram. Paige havia feito algumas coisas no
mundo do boxe e estava realmente florescendo
naquela época. Eu precisava de ajuda para editar,
expressar e ajudar a organizar as ideias. Paige era
uma parte vital disso.

Um tema do seu livro sobre o qual você falou foi a


dificuldade em encontrar boas informações sobre
Cus D'Amato. E como, em suas palavras, isso foi
quase intencional. Com isso dito, como a
construção do narrador ficcional saiu em seu
trabalho? Que vantagens e desvantagens você viu
ao ter esse narrador ficcional nos levando através
dos eventos da vida de Cus?
Cus viveu a vida do “quebra-cabeça imaculado”, e
ele queria assim. Eu não teria capacidade para
descrever de uma maneira boa o suficiente. Era o
que ele queria. Seja como for, tornou tudo muito
difícil, porque quando você fala com as pessoas que
estavam por perto, elas conhecem um pouco de Cus
... certas coisas, até os membros de sua família.
Tornou-se frustrante em um ponto. Mas então eu
comecei a entender o que estava acontecendo em
sua vida. Comecei a entender o quadro geral. Sabe,
era difícil decifrar exatamente o que Cus estava
fazendo. Sou um pesquisador. No campo da
medicina, você precisa ter de três a quatro
referências, múltiplas fontes, independentemente
da declaração que você diz. E eu não poderia fazer
isso com Cus. Então, escrever uma biografia direta
para mim teria sido uma falsidade ou uma falácia.
Eu nunca seria capaz de fazer uma biografia direta.
É por isso que, depois de entrevistar tantos
membros de sua família e as pessoas ao seu redor -
entrevistas com mais de 80 pessoas - foi quando
percebi que comecei a ver através de seu
caleidoscópio e quase consegui pensar como ele.
Foi quando comecei a ser capaz de reunir a verdade
da história. Em vez de ficar, “Cus acordou neste
momento. Ele fez isso." Eu decidi colocar isso em
uma história romanceada.
Cus abriu sua academia em Nova York em 1933 - o
Empire Sporting Club. Como ele construiu sua
reputação e ingressou no boxe profissional? Você
poderia nos falar mais dos primeiros anos de Cus
como treinador?
Foi através do irmão dele. Seu irmão se tornou
boxeador e trabalhou com um empresário. O irmão
dele trabalhou com o [pugilista] Yama Bahama.
Acho que o empresário dele era Bob Melnick na
época. Depois Cus realmente viu o funcionamento
interno do boxe, de realmente assisti-lo no Bronx,
no Sunnyside Boulevard, em algumas das igrejas
onde seu irmão iria boxear, essa foi sua porta de
entrada no boxe.
Acho que aludi a isso no livro que a primeira
essência do boxe na vida de Cus era através de um
tio. Seu tio também era lutador e deu a todos os
meninos luvas de boxe e sacos de pancada no Natal
uma vez. Essa foi a gênese do boxe na mente de
Cus. Mas ele entendeu o funcionamento do boxe
profissional acompanhando seu irmão.

Como Cus foi capaz de alcançar o sucesso como


treinador?
Provavelmente no exército. Cus tinha um jeito de
ser tão carismático e ele sempre conseguia
aglutinar as pessoas ao seu redor, que diziam: "uau,
esse cara sabe do que está falando". Quando ele
estava no exército e começou a pegar o
conhecimento de seu irmão e a evoluí-lo, ele
percebeu que as pessoas começaram a ouvi-lo. As
pessoas queriam saber como lutar e se defender. E
Cus sabia disso a vida toda. Eu acho que o exército
era um lugar essencial para Cus saber quem ele era
como pessoa.

Uma coisa que aprendi com seu livro foi o


envolvimento precoce de Cus com Rocky Graziano
[Graziano se tornaria campeão dos médios em
1947]. Ele não é um lutador que está intimamente
associado a Cus nos dias de hoje. Você pode lançar
alguma luz sobre esse relacionamento?
Ele era um garoto do Lower East Side e Cus dirigia
o Lower East Side. E foi exatamente isso que
aconteceu. Quando Graziano surgiu, eles
precisavam de um substituto para uma luta, e
Graziano treinava no Empire Sporting Club - de
Cus. Era quase como uma organização de boxe da
qual você fazia parte apenas para conseguir boas
lutas. Graziano era apenas um jovem do Lower East
Side - que todo mundo sabia que iria nocautear as
pessoas.

Outro aspecto interessante do livro é a descrição de


como era o envolvimento da multidão com o boxe
na época. Você fala sobre como esse ambiente foi
desafiador para alguém que não estava tão bem
conectado. Você poderia falar sobre os desafios
específicos que Cus enfrentou quando começou a
se envolver mais no alto circuito de boxe da cidade
de Nova York?
Veja como ainda é difícil hoje em dia. Para
realmente avançar, existem alguns caminhos.
Naquela época, não havia muitos. Havia apenas um
ou dois caminhos para chegar ao topo da montanha
e, se você estava com a estrada bloqueada,
fatalmente não sairia do lugar.
Cus teve que deixar seus próprios lutadores
lutarem no ginásio que ele tinha. Ou deixar os
lutadores em seu ginásio lutarem contra os caras
que saíram e estavam na academia de Gleason ou
em outras academias. Ele foi para a Europa para
realizar lutas já. E é isso que Cus precisava fazer.
Quando não há um caminho, você precisa encontrar
seu próprio caminho. Esse foi um dos seus
principais pilares na gênese de quem ele era. Foi
encontrar outro caminho. Quando você está
bloqueado, você está parado. Mas Cus teve um
pouco mais de dificuldade e teve que escalar uma
montanha mais alta e evitar algumas minas
terrestres.

Você pode esclarecer um pouco mais o


envolvimento da máfia? Eu acho que muitos
elementos dessa cena seriam muito
surpreendentes para os fãs de boxe de hoje.
Bom, qualquer um da máfia diria apenas coisas
negativas sobre Cus. Todo mundo falou contra ele.
Todo mundo era negativo. Se alguém perguntasse
qualquer coisa sobre Cus, iriam dizer coisas como
“Ele é bicha. Não fale com ele. Eu não quero ter
nada a ver com ele. Não vá ao ginásio dele. "
Aquele tempo após a Depressão. Foi uma época
muito difícil. E as pessoas não o deixavam entrar.
Toda vez que você enfia a cabeça e quase tem algo,
eles o empurram de volta. Cus precisava passar
pela porta dos fundos em vez da porta da frente. E
esse era simplesmente o meio. Foi o que foi. Todo
mundo estava nisso para te empurrar para fora.
Seria como você tentando obter uma entrevista
exclusiva com Manny Pacquiao após uma luta.
Sendo que ninguém te conhece, e o que você
consegue? Apenas algumas migalhas, Era assim
com Cus.

Vamos falar sobre Floyd Patterson, o primeiro


grande campeão de Cus. Conte-nos sobre o
relacionamento entre os dois. Como progrediu ao
longo dos anos e como Cus foi capaz de guiá-lo ao
topo?
Cus se orgulhava de não atrair as pessoas mais
velhas em sua carreira, depois de terem sido
campeões. Ele se orgulhava de forjá-los quando
menino, criando-os como homem e tornando-os um
grande lutador. Esse é o exemplo de Floyd. Floyd
não sabia nada quando começou com Cus. Ele mal
sabia ler e escrever. Não sabia como se comunicar
com as pessoas. Ele era realmente um garoto
lutando para sair do buraco. Cus adorou a ideia de
garantir que esse cara se tornasse alguém na vida.
Esse era realmente o seu principal objetivo com
Floyd.
Ao longo dos anos, apenas para simplificar, Floyd
ficou com ele o máximo que pôde, mas depois a
coisa deteriorou. [Patterson] teve uma grande
reunião com Roy Cohn e um dos grandes padres da
época, um dos cardeais. Eles tiveram um grande
jantar. E para encurtar a história, as pessoas
começaram a enganar Floyd para fazê-lo pensar
que Cus estava sendo desonesto com ele.
O cara que ajudou a puxar Floyd pela encosta ao
lado deles foi Julius November, advogado. Ele
garantiu que Floyd tinha sido roubado. Ele estava
trabalhando para Floyd e Cus e tornou-se uma
situação horrível. Foi o que aconteceu ao longo do
tempo. Apenas se deteriorou. As pessoas
começaram a dizer a Floyd que Cus não estava do
seu lado, e Floyd acabou acreditando.

Quando Floyd estava subindo no ranking, como foi


visto o estilo “peek-a-boo”?
Foi uma grande piada. Adam, foi uma grande piada.
O (Promotor) Teddy Brenner costumava dizer: “O
que esse cara está fazendo, se escondendo atrás
das luvas? O que ele está brincando de peek-a-boo
(esconde-esconde), como eu faço com meus filhos?

Toda a mídia riu. Toda a mídia, a serviço da máfia
estava escrevendo em seus caderninhos enquanto
abaixavam os chapéus, se é que você me entende.
Foi tudo um grande jogo naquela época. Eles
estavam tirando sarro do cara de Cus. “Ele (Floyd
Patterson) nem é um peso pesado! Olhe para esse
garoto! Ele vai ser nocauteado por alguém!” Eles
estavam rindo dele.
Como Cus lidou com a perda de Patterson para
Sonny Liston e como isso o afetou como pessoa?
Imediatamente, Cus queria que ele [Patterson] se
submetesse à hipnose novamente. A hipnose foi um
grande ponto no mundo de Cus. Mike [Tyson]
costumava ser hipnotizado duas ou três vezes por
dia - antes dos treinos, antes das lutas. Então, a
hipnose era parte essencial do trabalho. A
psicologia era enorme. Cus chamou isso de seu
próprio diálogo interno. O que você diz para si
mesmo no dia da sua luta vai te tornar um vencedor
ou quebrar você.
Assim, à medida que Floyd avançava, isso se
tornava cada vez mais importante. Quando ele
perdeu, Cus infelizmente não estava tão envolvido
na época. E ele tentou se aproximar novamente de
Floyd, mas Patterson estava naquela montanha
onde eu estava falando antes - quase no topo da
montanha acreditando em todo mundo. Ele acabou
se afastando de Cus. Na época, Cus queria falar com
Floyd e Floyd o surpreendeu. Eles deveriam se
encontrar depois da luta em uma das estradas, mas
ele nunca apareceu. Cus estava lá esperando, e ele
estava muito, muito chateado.
Ele nunca conseguiu compartilhar os sentimentos e
a psicologia de voltar e ser forte na segunda luta.
Ele nunca mais conseguiu ensiná-lo e dizer tudo o
que queria ... ser capaz de voltar de uma grande
derrota. Mais uma vez, assim como Mike, ninguém
estava lá para ensiná-lo a voltar de uma perda
difícil. Mas olhe para Manny Pacquiao; ele voltou de
uma perda enorme e tremenda. Isso está
desenvolvendo um campeão ainda melhor. E Cus
queria que seus lutadores entendessem isso e
aprendessem.

Eu sei que você é um grande especialista tanto na


técnica e filosofia ensinada por Cus. Você pode nos
dar um tutorial rápido sobre o estilo “peek-a boo”?
O que isso traz de vantagem aos lutadores? Quais
são algumas fraquezas em potencial? Por que
funcionou bem para Patterson e Tyson? Por que
esse estilo não passou para outros lutadores?
Vou te dar algumas coisas dos dois lados. Para os
profissionais, olhe para os boxeadores tailandeses.
Eles são bem conhecidos no UFC. Eles são
conhecidos por qualquer tipo de golpe de mão
como o melhor. Chama-se Arte dos Oito Membros.
Veja como eles mantêm a guarda bem no alto.
Manter as mãos no alto é uma das maiores coisas
que você pode fazer para se proteger de ser
golpeado na cabeça.
Porque também acreditamos em dobrar seu queixo.
Se você realmente visse Mike quando jovem ou
Floyd quando jovem, eles estariam dobrando tanto
o queixo no peito que, se você os olhasse pelas
costas, praticamente não veria a cabeça deles. Era
quase como um truque de mágica. Dobrar o queixo
e manter as mãos no alto eram muito importantes
para se defender de golpes na cabeça.
Outro grande ponto positivo foi o movimento da
cabeça. Cus sempre dizia para garantir que sua
cabeça não estivesse no mesmo lugar, se você der
um soco ou se mexer. Isso foi bem intenso.
Desferindo um soco e mergulhando ou jogando um
soco e “deslizando” para um lado, principalmente
para a esquerda, o movimento da cabeça era
realmente importante.
Além disso, um grande aspecto final desse estilo foi
o trabalho de pés. Não era nada ortodoxo. Havia
mais movimentos oriundos de artes marciais, onde
havia pequenos pulos e saltos para os lados.
Trocando os pés para colocar seu lado forte no
uppercut. Saltando para o outro lado para virar à
direita, o que Cus diria um “6” ao fígado ou aos rins,
um golpe muito contundente. Eles constantemente
moviam o corpo.
Um aspecto negativo do estilo foi que você
realmente tinha que manter a guarda bem fechada,
ou “fechar a lacuna”, isto é não proporcionar
nenhum espaço. Um lutador mais baixo, como Mike,
lutando contra um cara mais alto como um Buster
Douglas ou um Lennox [Lewis], os movimentos
daqui para frente terão que ser diferentes dos
movimentos de um plano vertical. Mike trabalhou
furiosamente. Cus chamou de “concentração
furiosa” avançar, esquivar, pendular, e só então
você seria capaz de chegar a um ponto em que
poderia dar um soco com suas más intenções.
Mas havia uma fraqueza em “fechar a lacuna”. Havia
essa abertura que realmente os deixavam
vulneráveis a tomar um uppercut ou receber um
golpe no corpo. E uma fraqueza adicional seria
contra alguém mais pesado e usar essa pressão
sobre você.

A biblioteca de luta de Cus é lendária. Ele


costumava fazer exibições a noite toda e fazer seus
boxeadores assistirem a toneladas de filmes de luta
antigos. Havia lutas ou lutadores específicos que ele
continuava voltando como influências?
Oh sim. Cus amava Robinson. Ele amava a postura
corporal de Ray Robinson e a maneira como jogava
os ombros no golpe. Ele amava a técnica de
Robinson, mas também gostava do movimento de
Henry Armstrong. Armstrong era um cara que
estava sempre se esquivando, pendulando e
socando enquanto avançava. Ele é quase como o
Floyd Mayweather de hoje.
Outro cara seria Tony Canzoneri - outro lutador
mais leve que tinha o poder de um peso pesado,
mas ele se movia como um peso leve. Essas são as
pessoas que Cus amou. Ele sempre revia as lutas
deles.
Mas Cus temia George Foreman. Se você olhou
para o jeito que George Foreman socava, e se você
se levanta e tenta boxear com ele de frente, a sua
mão direita se aproxima rapidamente e é mortal. E
isso infelizmente coloca o lutador do estilo “peak-
a- boo” em uma posição ruim porque cada soco é
como um movimento no sentido horário. Eles são
como uppercuts largos e arredondados. Cus dizia:
“Você nunca lutará contra George Foreman. Não
faça isso.”

Outro aspecto da técnica de Cus era a variedade de


socos que ele faria com que seus lutadores
jogassem. Quando você pensa em lutadores
modernos, muitos deles são conhecidos por dois ou
três socos, seja o jab, a mão direita reta ou o gancho
esquerdo. Mas Cus realmente trabalhou em sete,
oito ou nove socos diferentes. Ele era um
verdadeiro obcecado na variedade de socos de
diferentes ângulos. Isso era mais filosófico por
natureza?
Não, isso era real. Ele queria que os lutadores
dessem cinco ou seis socos em dois quintos de
segundo. Ele estava cronometrando. Era um
objetivo dele. José [Torres] foi a primeira pessoa
antes de Floyd que conseguiu. José conseguiu dar
seis socos em dois quintos de segundo. O
argumento dele, não importava qual lutador você
colocasse na frente de um lutador seu, se você
ficasse parado por dois quintos de segundo, veria
que ele receberia esses seis socos. Ele realmente
falou sobre a ciência da luta. José também foi
fundamental para enraizar o “peak – a -boo”.

O que você diria serem alguns dos fundamentos


defensivos do estilo de Cus?
Não importa o soco que você deu, houve um
movimento na cabeça. Não importa que soco lhe
tenha sido dado, houve um movimento na cabeça.
Os movimentos da cabeça eram muito importantes.
O que quer que fizesse, haveriam sempre esses
movimentos da cabeça. Ser defensivo e não ser
atingido era mais importante do que realmente ser
ofensivo e acertar.
Se você já estudou Wing Chun, se há uma defesa, há
um soco ao mesmo tempo. Foi isso que Cus
desenvolveu. Sempre foi um ataque e defesa
simultâneos. Você está bloqueando e batendo ao
mesmo tempo. Essa foi um diferencial muito
importante que Cus tinha no seu estilo.

Eu queria falar sobre as técnicas psicológicas de


Cus.Muitos lutadores não conseguiram lidar com
eles.
Sim. Mas o que o tornou único nessa área? Quais
foram algumas das técnicas que ele usou e como ele
conseguiu ter sucesso nessa área e sustentar seus
boxeadores para torná-los os grandes lutadores
que eles se tornariam?
Ele queria e exigia de todos, psicológica e
fisicamente. Se você pudesse se dedicar totalmente
a ele, seria capaz de usar todos esses atributos e
todo a sua energia para realizar a tarefa em questão.
Esse era o objetivo da Cus - realmente ensinar você
a ser o melhor possível e expressar o melhor
possível com o corpo que você tem. E é por isso que
eu amo Bruce também, porque todo o objetivo de
Bruce Lee era se expressar completamente com seu
corpo. Integrar o que funcionou para que funcione
para você. E foi isso que Cus e Bruce fizeram.
E por acaso, Mike tinha todos os atributos
perfeitamente. José tinha alguns deles em uma
direção. Floyd tinha alguns deles na outra direção.
Mas quando Mike apareceu, todas as estrelas
estavam alinhadas na sua pessoa.

Uma coisa sobre Cus era seu tamanho e estatura


relativamente pequena e, no entanto, ele era uma
presença muito intimidadora. Como você explica
isso?
Eu diria que, quando você realmente conhece algo
tão bem, fala sobre isso com confiança, foco,
autoridade e consideração positiva. E para Cus, o
boxe foi toda a sua vida. Era todo o seu ser. Como
eu disse antes, não era sua vocação; era a vida dele.
Quando algo é a sua vida, você apenas fala. O léxico
está aí. E acho que ele dominou ou dominou as
pessoas com seu espírito e conhecimento da ciência
do boxe.

O que Cus diria que seria um desempenho perfeito


no ringue? Houve uma luta que lhe deu o maior
prazer de ter assistido, em meio a todas as vitórias
de seus pupilos no ringue?
Ele comentou muito sobre certas lutas de Floyd's
[Patterson] e Jose. A luta exata não está vindo à
mente, mas o que ele gostaria é que um lutador seja
atingido minimamente e seja capaz de, nas três
primeiras rodadas, aniquilar totalmente e dominar
o outro lutador sem se ferir.
Se a psicologia do que ele ensinou a você surtiu
efeito e seu domínio e espírito estão sob controle e
você está realmente pronto fisicamente para a luta,
você não precisará de nada mais do que essas
coisas nas três primeiras rodadas, a menos que a
vontade e força do outro lutador sejam maiores do
que o sua. Então Cus dizia: "Você ficará aqui a noite
toda, meu amigo." Após a terceira rodada, Cus
percebeu que é quando as coisas mudam.

Houve uma grande era de treinadores nos anos 60


e 70. Você tinha figuras importantes, como Angelo
Dundee e Eddie Futch. Como eram os
relacionamentos dele com esses treinadores?
Eles o respeitavam. Eles respeitavam Cus, mas ele
sempre foi um pária por algum motivo. Ele sempre
foi o cara esquisito, aquela “carcamano” que era
apenas diferente. A academia era diferente. Se um
lutador ficou bom em sua casa, eles não poderiam
se tornar os melhores em sua casa. Eles teriam que
ir para a casa de Stillman. É por isso que ele teria
que passar Floyd para [Dan] Florio. Ele não tinha
permissão para segurar a mão de seus lutadores o
tempo todo. Então essa foi realmente uma grande
limitação.

O que Cus achava dos outros treinadores da época?


Ele gostava de alguns aspectos de seus estilos. Ele
gostou da maneira como Charlie Goldman
conversou com seus lutadores. Ele gostou da
maneira como Ray Arcel trabalhou no corner, como
os irmãos Florio fizeram ... Al Gavin e Bob Jackson,
ele pensou que eles eram alguns dos caras mais
jovens e melhores por aí, especialmente Al. Ele
amava Al - do jeito que ele trabalhava cortes e
coisas assim. Então, ele se deu bem com eles, mas
alguns de seus colegas de profissão só pensaram
nele como um pária.

Havia uma lacuna bastante longa entre a carreira de


Jose Torres e o ressurgimento de Cus com Mike
Tyson. Cus deixaria a cidade de Nova York e iria
para Catskill, Nova York. Como você caracterizaria
o tempo dele em Catskill? Ele abriu uma academia
lá, mas ele não era o treinador ativo que ele era
anteriormente em termos de ter grandes lutadores.
Como era a vida dele naquela época, no início e
meados dos anos 70?
As coisas estavam mudando muito naqueles
tempos. As pessoas sempre me perguntam se Cus
estava fugindo de Manhattan. Ele não estava
fugindo, mas era mais como se o tivessem
enxotado. Ele era um homem velho até então. Ele
não tinha mais cartas na mão. Não tinha um
campeão, e isso foi muito difícil e frustrante. Ele
começou a procurar se acalmar. Jimmy disse: “Vá
encontrar uma esposa. Estou pensando em fazer a
mesma coisa. Eles queriam relaxar, repensar as
coisas, por assim dizer.
A família de Cus morava na área de Catskill. Ele
costumava ir para lá nas férias, para pescar. Meus
pais costumavam ir ao Concorde, Raleigh e esses
lugares. Parecia que Cus e esses caras abriram
esses lugares. Eles teriam manifestações lá e
campos de treinamento de boxe lá. Foi realmente o
que aconteceu naqueles dias.

Mike Tyson é levado para Cus, que é


imediatamente apaixonado por ele. Essa parte da
história é bem conhecida. Um aspecto que acho
interessante é o relacionamento de Cus com seus
acólitos - Teddy Atlas e Kevin Rooney. Havia a
famosa história com Atlas puxando a arma para
Tyson e Atlas sendo demitido. Da perspectiva de
Cus, você pode nos guiar por alguns desses
eventos? Como Cus percebeu essa perturbação?
Por que ele tomou algumas das decisões que
tomou?
Apenas para resumir, por que eu gostaria de jogar
um balde de água fria na brasa? Cus está pensando
que Mike é seu último suspiro. E se você fosse Cus
- você tem que pensar sobre isso com a mente de
Cus - qualquer um que interfira e ponha tudo a
perder, já que Tyson poderia ser o último campeão
mundial, que eu criei desde o início ... meu Sonny
Liston, era a maneira que Cus pensava. Nada o
impediria de fazer isso. Teddy Atlas, não importa o
quão bom ele fosse - e eu respeito muitas coisas
sobre Teddy, tenho o número dele no meu celular -
, mas ele ainda não chegou a um acordo. Um dia
haverá um livro ou uma entrevista em que ele
decida se abrir, mas ele não está pronto para se
abrir e dizer a verdade sobre seu ponto de vista e o
que viu. Confie em mim, eu lhe dei muitas
oportunidades de falar.
Teddy não gostou do jeito que Cus estava
favorecendo Mike. Várias vezes, Cus minaria Teddy
na frente de Mike e Teddy sentiu uma perda de
respeito. A propósito, a história da arma é 100%
verdadeira e Teddy definitivamente disparou.
Houve competição entre Teddy e alguns dos outros
treinadores mais jovens na academia de Cus?
Não, Teddy era o cara. 100%. Ele era o aluno mais
velho, se você preferir. Se você entende o mundo
das artes marciais, ele sempre ficou à frente dos
demais. Ele era o aluno mais velho. Ninguém ficou
no caminho de Teddy, exceto Cus. Quando as
pessoas começaram a ver Mike “aloprando”,
começaram a perder o respeito por Teddy. Mas isso
também se tornou uma cena superficial e Teddy
nem sempre estava lá. Teddy começou a ficar
realmente envolvido na comunidade. A esposa dele
era dali. Ela possuía um bom restaurante italiano lá
e ele começou a se arraigar na comunidade. Ele e
Cus começaram a reclamar sobre Mike. Cus não
queria ninguém interferisse nos seus planos em
relação à Mike.

Houve discussões na época sobre manter o status


de amador de Mike por mais tempo?
Não, não mesmo. A essência principal de Bill
Cayton e Jimmy [Jacobs] era enviar uma fita VHS em
pequenos pacotes, e eu tenho um desses pacotes.
Eles enviaram esses pacotes para todos os agentes
esportivos do país. E eles gostaram de um
marketing no estilo de guerrilha.
Eles nem queriam esperar. Do jeito que eles
pressionaram Mike, você não pode mais fazer isso
assim. Talvez você pudesse através da Internet, mas
não da maneira que eles fizeram. Eles fizeram um
esforço de marketing no estilo guerrilha com Mike
e não queriam que ele permanecesse amador.

Seu estilo não era amador. Mike não era bom em


pontos. Olhe para as lutas de Tillman. Tillman I e II
foram risíveis. Mesmo vendo Mike em Colorado
Springs [em casa ou nos campos de treinamento
olímpicos dos Estados Unidos], assistindo Mike
lutar, ele era feroz como amador. Mike era um
profissional [estilo] desde o dia em que começou.
Eles queriam que ele saísse dos amadores
imediatamente.

Quando a saúde Cus começou a se deteriorar à


medida que envelhecia, Kevin Rooney assumiu um
papel mais importante com Mike. Você pode falar
mais sobre Rooney e qual foi seu papel em ajudar a
moldar o lutador que Mike Tyson se tornou?
Kevin estava lá antes de Teddy. Eu sei que parece
difícil acreditar, mas é verdade. Kevin era um
profissional. Teddy não podia ser um profissional,
por isso começou a treinar com Cus. Ele tinha
escoliose. Trato pacientes com escoliose até hoje.
Você não para de lutar por causa disso, a menos que
seu ângulo de Cobb seja maior que um certo grau.
Eu acho que são 30 graus se não me engano. Ele não
tinha isso.
Cus não queria que Teddy se machucasse. Essa é a
verdade honesta. Ele não queria que ele fosse um
profissional. Ele não queria que ele se ferisse. Cus
também queria que Teddy fosse seu discípulo. Cus
sabia que não tinha muito tempo para viver e queria
ter certeza de que passaria seu legado. Então ele fez
de Teddy um treinador. Naquela época, Rooney
ainda estava lutando profissionalmente.
E então, quando mudou, quando ele [Cus] decidiu
romper com Teddy, não havia pessoa melhor para
ajudar Mike do que o cara que realmente estava lá
desde o início também, e esse era Kevin. Mike não
apenas respeitava e reconhecia Kevin, mas Cus
também respeitava Kevin por isso.

Como foram alguns dos últimos momentos da vida


de Cus? Ele tinha um lutador à beira de se tornar o
mais jovem campeão dos pesos pesados do mundo.
Houve esse tremendo impulso. Mas Cus não era do
tipo que insistia em sua saúde em declínio. Você
poderia nos orientar nos últimos 12 a 18 meses da
vida de Cus?
Eles estavam muito tristes com isso. Ele nunca
dirigiu, por exemplo. As pessoas sempre dirigiam
para Cus e faziam outras coisas por ele. E naquela
época, ficou claro que seu condicionamento físico e
sua capacidade de fazer as coisas para continuar
vivendo eram apenas um estorvo para ele. Seu sono
não foi consistente a noite toda. Ele sempre dormia
sozinho. Ele nunca dormiu com Camille [sua
esposa]. Ele seria tão barulhento em seu quarto que
acordaria Camille e alguns dos outros lutadores
com seu ronco e respiração. Ele estava realmente
ficando bem debilitado.
Infelizmente, e odeio dizer isso, mas ele se tornou
um velho italiano ranzinza, xingando as coisas. Se
você não passasse manteiga no pão corretamente,
ele ficaria bravo com você. Mas enquanto você
dormia, ele vinha até você ao seu lado e dizia: me
desculpe. Esse é o tipo de cara que Cus era. Ele
estava passando por muita instabilidade emocional.
Jimmy estava realmente cuidando dele na época.
Ele formulou o plano para Mike. Ele garantiu que
Jimmy e Bill soubessem exatamente o caminho que
ele queria. Cus sabia como criar campeões - da
parte da imprensa, da parte física à parte mental - e
ele não queria que nada se interpusesse no seu
último “tiro”, que era Mike.

Como Cus enxergaria seu próprio legado no


esporte?
Bem, Cus gostaria de ter algo a dizer sobre seu
próprio legado. Ele gostaria de dirigir seu passado,
presente e futuro. Essa é a parte engraçada. Ele
gostaria de fazer piadas e dizer como deveria ter
sido.
Cus realmente queria ser um lutador como seu
irmão Gerry, mas não conseguiu passar no teste
ocular. Ele costumava dizer que, se Harry Greb
pudesse lutar com um olho de vidro, ele também
poderia. Ele nunca conseguiu fazer tudo o que
queria. E sentiu que poderia ter feito mais e ser
melhor. Sim, Mike era um ótimo garoto, mas
[usando a voz do Cus] “Ele não era exatamente o
que eu queria. Ele cumpriu os objetivos que
estabelecemos, mas poderia ter feito mais. Ele
poderia ter feito melhor.”
Cus acreditava que poderia haver muito mais
pessoas assim ... se ele tivesse um mestre e um
estudante, que se curvariam de joelhos e ouviriam
tudo o que Cus disse. Não apenas escute o que Cus
disse, mas ele teria que morar em um mosteiro. Ele
teria que varrer o mosteiro. Fazer todo o trabalho
serviçal. Aprender realmente todos os atributos e é
isso que ele realmente queria.
Há um tema de arrependimento que percorre Cus,
se essa é a palavra certa.
Ele nunca será feliz. Ele nunca ficará satisfeito. Ele
sempre poderia fazer melhor. Cus queria fazer isso
sozinho, mas ele nunca poderia. Ele queria chegar
lá e realmente tentar fazer isso sozinho, mas ele
nunca foi capaz de se expressar completamente em
sua vida, e isso o frustrou. Ele estava sozinho.
Quando ficou mais velho, havia outros lutadores
daquela época a quem ele respeitava? Ele ainda era
um estudante de boxe moderno?
Ele amava Ali. Ele realmente amava Ali muito. Ele
rendeu muitos elogios a Muhammad por seu
carisma, a maneira como comandava sua
personalidade na imprensa, a maneira como
comandava a si mesmo no ringue. Eu tento aludir a
isso no livro que ele teve um relacionamento
melhor com Ali do que Angelo [Dundee] e que ele
teve um relacionamento mais próximo com Ali do
que a maioria das pessoas realmente entende.
Então essa era uma pessoa grandiosa que ele
amava.
Eu também diria que há outras pessoas que ele
admirava na época em que ele estava meio que
desaparecendo ... ele amava os irmãos Hilton no
Canadá. Não sei se você ouviu falar deles, mas eles
eram realmente grandes na época. Ele realmente
apreciava o entusiasmo deles pela arte do boxe. Ele
apreciou o acampamento de Roberto Duran até toda
a luta “No Mas”. Ele também gostava de Hearns e,
embora estivesse com medo de Big George
[Foreman], ele o respeitava. Ele quase o treinou
numa época, quando estava em Catskill.
Novamente, naquela época, Cus estava realmente
fora do jogo. A vibração daquela época era que
ninguém estava ligando para Cus e dizendo: “Ei, o
que você achou dessa luta. Ei, o que você achou
desse lutador chegando? Foi silencioso. O telefone
não estava tocando. Havia um cara com quem falei
que estava presente na vida de Cus durante esse
período. Eles apenas se sentavam no quintal com
uma poltrona falando sobre o passado, mas
ninguém ligava para Cus. Foi um momento difícil
para ele. Ele era mais um crítico do boxe do que
alguém que dizia apreciar este ou aquele lutador.
Cus era considerado uma personalidade crítica por
alguns.
Ele achava que o boxe era mais seguro que o
futebol. Ele sempre dizia: "Se as pessoas fossem
atingidas tanto quanto acham que um boxeador é
atingido, ninguém faria boxe". A arte e a ciência do
boxe não o permitem se ferir. E ele tentava
convencê-lo de qualquer coisa - como a razão pela
qual as pessoas gaguejam e têm demência não tem
nada a ver com boxe, por exemplo.

Cus teve seu círculo de devotos e muitos críticos.


Havia pontes que ele destruiu e do qual se
arrependia?
Floyd [Patterson] foi o maior. Floyd era seu grande
arrependimento. Ou seja, sob a respiração dele,
enquanto ele estava se preparando para morrer, ele
ainda estava murmurando Floyd, eu amo Floyd.
Esqueça o Mike. Esqueça José. Floyd era filho dele.
Floyd era seu auge. Foi quando ele teve sua
vitalidade. Ele foi capaz de tornar Floyd um
campeão mundial. Eu acho que Floyd realmente era
seu grande arrependimento de qualquer conexão
que ele tivesse com alguém.
Seus irmãos também. Rocco era seu irmão mais
velho. Ele sempre teve alguns problemas com
Rocco e acho que era uma coisa de controle, pois
Rocco era o único irmão nascido na Itália. Ele
sempre teve conflitos com ele de certa forma, assim
como Tony, que sempre lhe devia dinheiro. E eles
sempre brigaram por isso, mesmo que fosse por 10
dólares. Acho que 10 dólares naqueles dias era
mais dinheiro, mas ... ele brigou muito com sua
família. Houve muitas brigas acaloradas.

Colocando seu chapéu de especulação por um


segundo, no boxe de hoje, quem você acha que são
algumas pessoas no esporte - treinadores ou
lutadores - que Cus realmente respeitaria?
Há um grupo que tenta imitar o estilo de Cus. Há um
lutador do UFC Dominic Cruz que faz parte de um
acampamento que tenta fazer algo que Cus fez com
a numeração, mas em vez de numerar socos, eles
somam socos, movimentos e pontapés. Então eu
acho que ele realmente apreciaria o treinamento
deles. Esse é um grupo.
Você sabe que Cus não gostava das pessoas que
estavam no topo. Ele ficaria realmente chateado
olhando, eu diria, para um cara como Floyd
Mayweather, ganhando mais dinheiro do que
qualquer atleta do mundo, apenas por causa de seu
estilo de vida. Ele diria que aquele homem
realmente era apenas um vaidoso. Ele
[Mayweather] manteria a distância, controlaria a
luta e faria o que ele queria, e tudo bem, mas Cus
não gostaria disso. Ele não gostava de pessoas que
não queriam ser desafiadas, que tinham medo de
mostrar suas verdadeiras cores. Isso não mostraria
um verdadeiro campeão. É por isso que algumas
pessoas não gostam de Floyd. Então parte disso é
que Cus não gostaria do que está por aí. Mas
qualquer lutador que colocasse sua vida em risco e
realmente mergulhasse no boxe, esse sim, Cus
apreciaria.

Que tal alguém como Pacquiao que luta de um jeito


muito agressivo?
Ele adoraria isso. Eu acho que disse isso antes.
Quando você cai em um buraco tão fundo assim ...
Essa é uma experiência complexa. A psicologia
necessária para alguém voltar ao topo é
fundamental. Mais importante do que o treinamento
é poder entrar lá com confiança; é preciso doses
cavalares de confiança. Cus gostaria de ter estado
lá. Isso é coisa dele - a psicologia disso, como
recuperar você. Ele teria aproveitado todas as suas
habilidades com Manny Pacquiao.
O que os treinadores de boxe de hoje devem
aprender com Cus?
Tudo sobre o seu lutador. Não é sobre você. Cus
costumava dizer: “O lutador luta. Apenas faça qual
é o seu trabalho e faça-o bem, se você segura o
balde de cuspe ou se é o cutman. Você deve
conhecer seu papel na equipe. Então essa é a
primeira coisa. É importante respeitar e lembrar.
Você tem um lugar no campo de treinamento. Eu
diria que seria a coisa mais importante, que você
tem um papel definido.

Estou tentando entender o que você acabou de


dizer com como Cus pegaria seus lutadores, os
derrubaria e os faria se adaptar aos seus desejos. O
que você disse é semelhante a como Cus treinaria
seus lutadores?
Deixe-me dar um exemplo - Buster Mathis. Buster
era um cara com excesso de peso que o procurou.
Eles disseram, Cus, treine esse cara. Então ele
disse: “Ok, mas nós nem vamos entrar na academia
ainda.” Ele disse: “não vou praticar boxe com você
ainda”. Ele fez Buster andar de patins e só queria
ver esse grandalhão de patins. Ele queria ver como
ele se movia. Ele queria ver como ele falava com as
pessoas e como ele se comportava em sociedade.
Era sobre isso que Cus era - quem você realmente
é como pessoa e como personalidade, porque isso
se manifesta quando você luta.
Parece difícil de explicar, mas você não daria um
soco até saber como limpar o mosteiro e arrumar
seu quarto. Era disso que se tratava Cus, aprender
sobre como você realmente é.

A METODOLOGIA DE TRABALHO DE
CUS

Cus tinha uma metodologia de trabalho um tanto


incomum. A ofensiva de Cus começava com uma
boa defesa. Não ser atingido era de suma
importância, então a postura de seus atletas era
sempre com a guarda bem alta, cotovelos grudados
nas costelas e os punhos na altura do queixo. Isso
somado aos constantes movimentos de pêndulo
utilizados para esquiva e aproximação fizeram com
que no meio do boxe apelidassem essa postura de
"peak-a-boo" referência a brincadeira de esconde-
esconde que adultos fazem com os bebês. É
importante lembrar que Cus nunca utilizou esse
termo, o nome foi dado como uma forma pejorativa,
pois durante muito tempo acreditavam que esse
estilo de boxe havia caído em desuso. Mas Tyson
tratou de provar a todos que com o atleta certo, esse
estilo era mortal.
A fim de desenvolver essa habilidade se treinava
com um saco de pancada slip bag, cheio de areia,
pendurado numa corda. O objetivo era se
movimentar em torno se esquivando, movendo a
cabeça para evitar que fosse atingido.

WILLIE BAG
Esse nome foi dado em homenagem ao lutador
Willie Pastrano. Era uma estrutura envolta por um
colchão coberto de lona. Tinha um desenho de um
torso sobre ele. O corpo estava dividido em
diferentes zonas, e cada zona tinha um número
associado a ela. Os números ímpares eram socos
com a mão esquerda, os pares, com a mão direita.
Cus então colocava uma fita cassete com ele falando
as várias sequencias de números. Ao ouvir a
sequência “cinco, quatro”, o boxeador desferia um
golpe de esquerda no corpo e um uppercut de
direita no queixo. A ideia era que, quanto mais se
repetisse essas ações em respostas aos números,
mais elas se tornariam instintivas e automáticas, e
não seria possível pensar conscientemente nelas.
Para maiores detalhes, segue a numeração
desenhada na Willie Bag:
1-Cruzado de esquerda (cabeça)
2-Direto de direita ou cruzado de direita (cabeça)
3- Uppercut de esquerda (cabeça)
4- Uppercut de direita (cabeça)
5- Gancho de esquerda (corpo)
6- Gancho de direita (corpo)
7- Jab

Talvez o mais fantástico sobre essa inusitada


invenção de Cus tenha sido a maneira como ele a
idealizou.
Cus era um homem que estava sempre em busca de
conhecimento, mas não conhecimento puramente
teórico. Ele buscava aquele saber que
imediatamente poderia ser colocado em prática.
Aquilo que fosse extremamente útil e funcional.
E o mais interessante era que não importa em qual
área de conhecimento que ele pesquisasse, ele
conseguia ter uma visão de como aquilo poderia ser
aplicado para melhorar a sua ciência do boxe.
Como assim?
A invenção da Willie bag é o exemplo mais notável
disso. A inspiração para essa metodologia de treino
veio da sua observação atenta sobre profissionais
de outras áreas, que não tinham nenhuma relação
com o boxe. Em especial, da perícia dos músicos
talentosos em trocar seus instrumentos.
Cus observou que o mérito desses músicos vinha de
uma incansável prática de repetição constante,
horas a fio, ao ponto de conquistarem a habilidade
de tocar seu instrumento automaticamente, sem
precisar pensar no que seria feito.
Esse processo de aprendizado é chamado de
competência inconsciente, e faz parte dos 4
estágios da competência.
Vamos entender um pouco melhor isso.

Estágio 01: Incompetência Inconsciente


“Não sabemos o que não sabemos”
Esse é o estágio onde ainda não se sabe a
habilidade a ser aprendida ou não dá importância a
ela. A ignorância total.
Para ir para o próximo estágio, deve-se reconhecer
a sua incompetência e o principal, dar valor a nova
habilidade a ser conquistada.
Estágio 02: Incompetência Consciente
“Sabemos o que não sabemos”.
É nesse estágio da competência que começamos a
aprender de fato, é onde reconhecemos nossa
incompetência em algo. E automaticamente
começamos a dar um alto valor a nova habilidade
que precisamos aprender.
Nesse estágio é onde já sabe o que não se consegue
executar, porém, está disposto a aprender.
É esse estágio o mais difícil, é aqui que irá começar
a praticar a nova habilidade e com certeza erros e
falhas virão, gerando assim um sentimento de
frustração. Além dos erros e falhas novas sub-
habilidades irão aparecer e isso irá dificultar ainda
mais.
É aqui que muitas pessoas desistem, justamente
pelas dificuldades que estarão enfrentando. Nesse
momento temos que entender que errar faz parte do
processo de aprendizado e vai ser necessário para
chegar ao próximo estágio da competência.
Estágio 03 – Competência Consciente
“Experimentamos e Praticamos a nova habilidade”
Esse é o momento onde já sabemos executar a nova
habilidade, mas ainda de maneira mecânica e ainda
dependendo de muita atenção para não errar.
Esse estágio é mais fácil que anterior, porém, ainda
é necessário muita atenção e esforço na execução
da nova habilidade. É comum, perceberem o
esforço que está sendo realizado.
O desconforto para executar é bem menor e ainda
pode ser divertido e motivador, uma vez, que os
primeiros resultados já começam a aparecer.
Estágio 04 – Competência Inconsciente
“Fazemos sem perceber”
Você já ouviu com certeza a seguinte frase: “A
prática leva a perfeição”, pois então essa é a fase.
Nesse a nova habilidade já foi executada tantas
vezes que agora ela é realizada com perfeição.
Em alguns casos o domínio em determinada
habilidade é tanto que se começa a moldar ou
adaptá-la melhor aos contextos que você está.

Inicialmente descrita como Os 4 Estágios do


Aprendizado de qualquer nova Habilidade, a teoria
foi desenvolvida nos anos 70 por Noel Burch, ou
seja, 5 anos depois que Cus já colocava isso em
prática
MOVIMENTAÇÃO
A maneira como um lutador se movimentava no
ringue também era minuciosamente treinada por
Cus. Ele acreditava que os lutadores eram atingidos
por golpes de direita porque ficavam parados e
com as luvas muito baixas. Sua orientação era que o
lutador se movimentasse em U, e não apenas para
cima e para baixo. Assim a movimentação era
constante, para os lados, para a frente e para os
lados e para a frente ao mesmo tempo.

CONTRA-ATAQUE COM VELOCIDADE E


POTÊNCIA NOS GOLPES
A máxima de Cus era: “O boxeador deve dar socos
com más intenções”. Além disso, o treinamento
deveria possibilitar ao pugilista a capacidade de
fazer dois socos parecerem um, isto é: extrema
velocidade. O plano de luta era: “esquive-se do
soco e contra-ataque. Mova-se e bata ao mesmo
tempo. Force a definição da luta.”

Socos curtos podem ser mais fortes que socos


longos.
10 CURIOSIDADES SOBRE CUS
D’AMATO:
1.Ele ficou praticamente cego de um olho ao se
envolver numa briga de rua na juventude.
2.Nessa mesma época, Cus era bem envolvido com
a igreja católica e pensou seriamente em se tornar
um padre.
3.Na fase final de sua vida, ele vivia em uma grande
casa vitoriana com 14 quartos, que funcionava como
alojamento para jovens e promissores pugilistas.
4.Nos anos 50, quando a máfia dominava o circuito
do boxe profissional, D’amato foi uma das poucas
vozes dissonantes que ousaram falar abertamente
sobre esse esquema.
5.Como consequência, devido às ameaças que
começou a sofrer desses mafiosos, Cus se tornou
extremamente paranoico. Dormia com o revólver
debaixo do travesseiro. Nunca andava de metrô,
temendo ser empurrado para os trilhos. Prevenia-
se contra franco-atiradores. Desconfiava de comida
e bebida de origem desconhecida. Mike Tyson
relata que Cus não deixava ninguém ter uma cópia
da chave de sua casa, seu próprio quarto também
só vivia fechado, ninguém tinha permissão para
entrar.
6.Cus nunca enriqueceu com o boxe, pelo
contrário, ele declarou que na metade da década de
60, estava praticamente falido. A maior parte do que
ele ganhou no boxe, acabou gastando em sua
guerra contra o International Boxing Club de Jim
Norris (que funcionava sob o comando da Máfia).
"Para combater pessoas como o IBC, tive que
manter uma agência de informações, um sistema de
espionagem", afirmou. "Caso contrário, como você
vai ficar à frente dessas pessoas?"
7.Além de não enriquecer, Cus também não dava
muita importância ao fato de acumular dinheiro. Na
sua opinião dinheiro só servia pra ajudar as
pessoas, e ele passou a vida tentando ajudar
aqueles mais pobres que ele.
8.Além de Tyson, D’amato treinou outros 2
campeões mundiais. Floyd Patterson e José Torres.
9.Um dos seus passatempos favoritos era pescar.
Podendo ficar até semanas incomunicável
pescando em locais no interior.
10.Cus tinha um grande acervo de lutas antigas, o
qual sempre estava assistindo. Seus lutadores
preferidos eram: Sugar Ray Robinson, Henry
Armstrong e Tony Canzoneri.

Olá, espero que tenho sido uma leitura agradável.


Se quiser saber mais sobre a história do boxe,
acesse: www.boxeandocomahistoria.com.br

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comigo: (21) 99595-0812

Antonio Carlos Novais

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