Você está na página 1de 11

1

AS CARAS DE JUVENTINO MARAVILHA

Monólogo em cinco cenas de Everaldo Vasconcelos

(DEBAIXO DE UM ENORME GUARDA-CHUVA COMO SE FOSSE UMA ÁRVORE ONDE


ESTÃO PENDURADAS MUITAS MÁSCARAS. JUVENTINO ESTÁ DE PÉ COM UM VEU
FINO QUE COBRE-LHE A CABEÇA. TOCA UMA SIRENE DANDO INICIO AO HORÁRIO
DE VISITAS - ENTRADA DO PÚBLICO)

CENA 1 - MÁSCARA NEUTRA

ELE - Estão vendo essa placa aí; "Não ameixa" é para não ameixer mesmo. Maravilha! Sejam bem
vindos quem quiser me ouvir, mas se preferir outra coisa pode ir andando. Mas vão se achegando
que o meu tempo é curto; daqui a pouco acaba o tempo da visita e vocês irão embora, e a minha
história é comprida, muito mais comprida que a estrada que vai daqui até o outro lado do mundo.
(PARA UMA PESSOA DA PLATÉIA) Menino, essa menina, primeiro não se assuste com esse véu
que trago cobrindo o meu rosto. Não é que a minha cara seja muito feia, não existe feiura tão
horrenda que não possa ser olhada Tem pessoas que se divertem com as deformidades alheias. Mas
aqui não se trata de uma cara, mas do vazio. Imaginem o vazio imenso do qual o universo foi
criado. Eu venho daquele lugar, que ainda não existia, e do nada, porque coisa nenhuma havia, eu
dei a luz a mim mesmo. Nasci sem um semblante.(DESCOBRE O VÉU REVELANDO A SUA
MÁSCARA NEUTRA) Sou tal qual ninguém e sou todo mundo. De verdade este poderia ser o meu
nome, "Todo Mundo", mas me chamam Juventino, Juventino Maravilha. Segundo me contam
dizem que este é o meu nome, que foi colocado por acaso devido ao meu nascimento apressado.
Não importa o que acham ou não, sinto-me assim como essa cara que vocês olham agora. É a
melhor feição que eu tenho, com a aparência que eu trago sob ela sinto-me um farsante, e não
conto as vezes que fui obrigado a representar os papéis que a vida me pediu para representar.
Representava os meus papeis, mas quando chegava em casa lavava o rosto para arrancá-los de mim.
Lavei-me tanto com sabão e bucha vegetal que a minha face aplainou assim. Voltei para a minha
origem. Daqui eu sou aquele menino que viu uma escavadeira e pensou que fosse um dragão, que
2

imaginou que ele fosse um cavaleiro e tal como São Jorge abria os caminhos, ele gritou com o
dragão que medroso começou a cavar um esconderijo no chão. O que muitos não sabem é que
dragões também se escondem dentro das pessoas, dos grupos e das multidões. Também sou a
menina que se apaixonou por um passarinho, que fez um ninho nos caibros do telhado bem em cima
de sua cama, que acordava com ele, e saia de madrugada com o sol nascendo, cantava bem-te-vi e
voava. Eu flutuava junto e via do alto a cidade despertando. Com esta minha cara, eu era o pássaro e
era a nuvem que rebolava de alegria com o calor amarelado dos raios solares. Eu era também o sol
que dizia bom dia! Mas essa mesma cara era a agonia dos famintos que amanhecem sem um pedaço
de pão. Todos esses que moram pelas ruas são como essa máscara; não tem um rosto; não tem os
traços da individualidade; são os restos mortais da humanidade. São os monges mendicantes em sua
eterna caminhada sob os pés dos ricos poderosos. Arrasto-me com eles em sua pobreza. É uma
riqueza ser alguém para outro alguém. Sou o mêdo dos corações feridos por espadas egoístas. Sou
também a alegria inocente. Mais tantas coisas que cabem nessa aparência. Um cavaleiro com o seu
próprio código de honra. Tenho o meu guarda-chuva com todas as caras que preciso para viver no
mundo. Não, não se preocupem, que não vai chover. Podem ficar com as suas máscaras; essa que
está colada em sua cabeça, mas se colocarem as mão abertas sobre ela e repuxarem para um lado ou
para o outro, podem aparecer outras pessoas que habitam em você. Eu tenho aqui comigo essa
comunidade toda que me acompanha, bichos-gente e bichos-bichos. Eu me lembro que minha mãe
dizia que tem gente que tem cara mole e outras que tem cara de pau, mas que é melhor que você
tenha a sua cara porque se perdê-la vai ficar assim como eu que tenho várias e nenhuma. Paciência,
eu sou também como um espantalho.!(COBRE-SE COM O VÉU E RETIRA A MÁSCARA
NEUTRA) Maravilha!

CENA 2 - A MÁSCARA DO BICHO MAIS ANTIGO

ELE - (COBERTO COM O VÉU)Faz um tempo que andava como um bicho por este mundo, antes
que aparecessem as pessoas. E por aquela época nasci muitas vezes . Algumas vezes era tão rápido
que mal dava para ver a paisagem. Mas lembro perfeitamente quando fui o bicho mais antigo. A
terra era uma só e se chamava Pangeia. E eu estava no coração daquele continente, exatamente onde
hoje fica o ponto extremo oriental da América do Sul. Esta máscara é muito antiga. Ele viu
nascerem os primeiros dinossauros. E ainda aparece quando é chamado. (CHAMANDO) Jaraguá
vem aqui fora que tem um pessoal querendo te conhecer.
3

JARAGUÁ - (ENTRADANDO) Jaraguá vem cantando, assustando as crianças, mas ele é gente
boa, vem dançando sua chegança, ele é rei da brincadeira, fazendo sua lambança.
Mas eu preciso dizer para vocês a verdadeira estória desse Juventino. Assim, é como todas as
contações desse tipo que tem sempre um amor perdido no meio das cenas. Portanto, essa estória
tem a ver com a paixão de Juventino por uma moça muito bela, mas só que ela não dava a menor
bola para ele e para completar ainda se assanhava para o melhor amigo dele. Certa vez até brigaram,
mas juventino levou a pior e ficou na humilhação. Aquela danada da paixão ficou tão recolhida num
recanto. sem que ele pudesse fazer nada. Foi por aquela época que ele resolveu que era mais prático
usar uma máscara para se passar por outro que fosse mais agradável para aquela garota, que para
ele era a princesa Carlota do castelo. Aliás, não preciso dizer mais nada,(PAUSA) Estou vendo nos
olhinhos de vocês que querem saber o que aconteceu, pois vamos em frente, a curiosidade é mãe de
todas as estórias, não é mesmo?(EXIBE DOIS BONECOS DE PANO, UM DE JUVENTINO E
OUTRO DO VELHO) Juventino vinha triste pela estrada quando encontrou um velho, e pediu que
ele lhe arranjasse uma meizinha para ele curar a sua mágoa. Aquele velho era um vendedor da
pomada milagrosa do peixe-elétrico, e disse que o ajudaria se Juventino trabalhasse para ele durante
12 luas cheias e um eclipse total da lua, quando ela ficasse vermelha dentro da sombra da terra
então ele estaria livre para encontrar com a sua amada. Juventino, disse que essa era uma proposta
absurda, que tudo o que ele queria era um remédio que o fizesse esquecer, e então o velhote disse
que isso era muito fácil, bastava que ele tomasse uma xícara de chá de camomila e dormisse
profundamente durante toda a noite. Juventino fez isso, tintim por tintim, mas na manhã seguinte
quando ele abriu os olhos e se espreguiçou, a primeira coisa que ele lembrou foi de sua querida
Carlota. então ele voltou atrás daquele salafrário do vendedor de pomada e disse que não tinha
funcionado, então o velhote disse que ele poderia trocar de cara, pois se ela já tinha tomado abuso
dele, então não teria mais jeito, mas que para isso ele teria que dar a sua cara original, e em troca
ganharia uma cara nova. Assim ele fez.(COLOCA A MÁSCARA DO VELHO )

CENA 3 - A MÁSCARA DO VELHO

VELHO - Quando você se prepara para uma jornada, confere detalhadamente o seu alforje, verifica
todos os seus apetrechos e espera que da janela a sua amada lhe diga um "oi", e enquanto ela não
vem, você fica ali esperando que algo aconteça. Mas você não pode ficar todo o tempo esperando
que ela apareça enquanto o tempo vem e vai, será necessário partir e rápido senão não haverá para o
que voltar. Esta é a dor do guerreiro cotidiano, a sua luta para seguir em frente apesar da dor de
partir.
4

(EM UMA DE SUAS MÃOS COMO UM MAMULENGO APARECE CARLOTA) Então ela surge
um pouco, e eu já me julgo suficientemente forte para ir em frente, os primeiros passos nesta
estrada não são muito confortáveis, mas eu preciso dar cada passo a mais sem olhar para trás.
ELE- Bom dia, moça bonita!
ELA- O que você quer?
ELE - Me dê um beijo.
ELA - Vá catar coquinho!
ELE - Eu gostaria de te dizer que te amo
ELA- Muita gente diz isso também
ELE - Mas eu ouvi das estrelas que você é a minha amada
ELA - Você está doente da cabeça, porque estrela não fala.
ELE - Mas se falasse...
ELA - Se... Se... Se... E além disso quem gosta de velho é cupim.
ELE - De quem a senhora está falando?
ELA - Já se olhou no espelho?
ELE - Hoje não, mas sei que estou de cara nova e lindo...
ELA - (MOSTRANDO UM ESPELHO PARA ELE) Não tenho necessidade de mentir.
ELE - Mas não entendo o que aconteceu. Você não está me reconhecendo, eu sou Juventino.
ELA - Antes fosse aquele doido que vivia recitando versos para mim. O seu tempo já passou
velhote...
ELE - Onde estou eu ?Cadê a minha cara?
ELA - Perdoe, hoje estou sem trocado. Acontece cada coisa estranha por aqui. Dá licença que tenho
o que fazer. (SAI)

VELHO - Meu Deus, eu troquei de cara para ficar mais bonito e assim conquistar Carlota, mas
aquele mandigueiro me enganou e me deu a cara de um velho. Usando esta máscara, o que fazer se
a minha hora já passou. Devo ficar apenas com o vento e a lembrança vaga destes diálogos fugidios,
é o que me resta como consolo? Devo agradecer por estas boas lembranças e fazer o exercício
necessário da caminhada, e não ter dúvidas? Estas coisas foram ficando cada vez mais complicadas
e aquilo que era apenas uma amizade foi se transformando numa paixão primordial, daquelas que
você não consegue se desvencilhar e que é tão necessária a vida como o ar. Há algo de estranho
nessa estória. Será que ela já percebeu isso, que tenho a necessidade de ficar por perto de ter a sua
voz por perto? Mas como, se não tenho mais este direito de ficar me apaixonando? É possível meio
que namorar cifrado, sem dizer o que realmente se quer dizer e ficar neste jogo maravilhoso de bem
5

entendidos e velados recados de solitários perdidos na noite. Então ela me diz que não tem moedas
para me dar, pois sou agora somente apenas um mendigo. Eu lhe pedi um beijo e ela me mandou
catar coquinho. Preciso buscar de volta a minha cara original.

(APARECE A FIGURA QUE UM É BONECO DE LUVA COM DUAS CARAS OPOSTAS)

FIGURA - (COM A CARA DE ANJO) Por favor...


ELE - Você sabe o que isso significa?
FIGURA - Gosto de pensar que sim.
ELE - Perdôo a sua ignorância.
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) você poderia repetir?
ELE - Vôte! De onde apareceu este estrupício?
FIGURA - Escute, vou relevar a ofensa porque você é um velhinho.
ELE - oh, não! É engano. Esta não é a minha cara original
FIGURA - Está na sua cara que tem pelo menos uns 100 anos.
ELE - Tanto assim?
FIGURA - Talvez um pouco mais.
ELE - Isso é terrível.
FIGURA - Se você quiser podemos trocar de cara. Eu tenho duas uma para cada ocasião.
ELE - Como se faz isso?
FIGURA - (COM A CARA DE ANJO) Acho melhor você refletir mais sobre isso
ELE - Eu desejo ardentemente encontrar com Carlota.
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) E por uma paixão deve se fazer de tudo, ou não é
paixão verdadeira.
ELE - As suas palavras enchem o meu coração de esperança.
FIGURA - (COM A CARA DE ANJO)Isso não é amor
ELE - E o que é isso que me deixa tonto?
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) Isso é amor
ELE - Eu não aceito que ela não seja minha. Não suporto a solidão.
FIGURA - (COM A CARA DE ANJO)Procure se curar dessa doença possessiva.
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) - Cale essa sua boca de anjinho, de anjinho hipócrita?
ELE - Olhem para mim, os dois...
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO)- Os dois não dá, ou eu ou ele. Quem você prefere?
ELE - Vocês sabem como faço para recuperar a minha cara?
6

FIGURA - (COM A CARA DE ANJO) - Como você a perdeu?


ELE - Carlota estava cansada de minha cara, então eu aceitei trocar com um vendedor de pomada
milagrosa.
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) Conhecemos ele, é um farsante, um ladrão.
ELE - Pois é, roubou a minha cara. Sabem onde posso encontra-lo?
FIGURA - (COM A CARA DE ANJO) Sim
ELE - Onde fica?
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) No castelo que fica na estrada de Guarabira.
ELE - Vou lá acertar as contas com aquele trambiqueiro.
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) Se for com esta cara ele vai lhe reconhecer
FIGURA - (COM A CARA DE ANJO) Isso é verdade.
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) De modo que é um bom negócio a gente trocar de
máscara; você fica com a minha e eu fico com o velho.
ELE - O que devo fazer?
FIGURA - (COM A CARA DE DEMÔNIO) Basta desejar que a troca ocorre automáticamente.
ELE - Aceito trocar com o seu irmão que tem uma cara mais bonita.
FIGURA - (COM A CARA DE ANJO) Aceito a troca.

4 - A MÁSCARA DE ANJO E DEMÔNIO

(ELE COLOCA A MÁSCARA COM DUAS FACES, UMA DE ANJO E OUTRA DE DEMÔNIO
MAS FICA COM A CABEÇA COBERTA POR UM VEU ENQUANTO O VELHO APARECE
COMO UM BONECO MAMULENGO)

VELHO (BONECO) - Eu continuo daqui a estória que começou a ser contada pelo Jaraguá acerca
desse Juventino que vendeu a sua cara para conquistar o grande amor. O que ele não sabia é que eu
fiquei muito feliz em me desvencilhar daquele demônio que andava comigo. Eu fiz um bom
negócio em ficar com essa cara de velho. Ele achou que ficou com a cara de anjo, mas não se deu
conta de que levou consigo o seu irmão gêmeo. Mas ele saiu por aí muito feliz com a sua nova
feição de bom moço, e foi até o castelo da estradinha, que era um cenário desolador, pois estava
completamente abandonado. O portão frontal estava enferrujado, e o jardim coberto de mato. Ele
entrou, espreitou pelas janelas e não havia uma alma viva naquele lugar, então encontrou uma porta
7

apodrecida cujos restos se amontoavam na soleira. Ele entrou na casa, caminhou pelos aposentos.
Tudo estava cheio de poeira e teias de aranha, mas não havia ninguém. Pensou consigo que fora
novamente enganado por aquela figura, mas dessa vez ele fizera um bom negócio, pois ficou com a
cara angelical que inspirava confiança. Assim resolveu ir procurar por Carlota, foi até o seu antigo
endereço, mas ela não estava mais lá. Ninguém sabia do seu paradeiro, mas uma vizinha disse que
ela tinha subido a serra na direção de Campina Grande. Ele se escafedeu por aquelas bandas, mas
não a encontrou, e assim foi que na feira de lá, ele conheceu um profeta de rua anunciando o fim do
mundo, que fazia as suas pregações com um alto-falante montado em uma bicicleta. O profeta se
afeiçoou da cara de anjo de Juventino, e o convidou para participar. As pessoas se sentiam atraídas
por ele, de modo que até milagres fazia, pois a fé do povo não tem limites. Assim ele foi alçado a
uma posição importante e arrecadaram tanto dinheiro que já estavam construindo um templo grande
com ar-condicionado para mil fiéis sentados em poltronas acolchoadas, e isso para o povo era um
sinal de que ali reinava as bençãos de deus. Mas não foi por ali que ele viu Carlota, e sim na
rodoviária, assim de passagem, procurou segui-la, e descobriu que ela estava morando numa cidade
mágica no interior de Pernambuco. Ele se alegrou com essa possibilidade e encontrou um jeito de
seguir a moça, que encontrou em um fim de tarde na janela de sua casa olhando a rua. (SAI)

(ELE TIRA O PANO BRANCO QUE COBRE-LHE O ROSTO E APARECE COM A MÁSCARA
DE DUAS CARAS)

ELE - (COM A CARA DE ANJO) É aqui que mora Carlota. Dessa vez ela não poderá me resistir,
pois eu tenho uma arma secreta. Tenho comigo essa cara de anjo apaixonado, que encanta, mas
disso não passa.
(VIRANDO E APARECENDO COM A MASCARA DO DEMÔNIO) E tenho o malandro que é
muito mais safado e sem escrúpulos, que poderá quebrar as resistências dela com a sua lábia
hipnótica.

(APARECE CARLOTA COMO UM MAMULENGO)

ELA - Olha que rua mais linda, tão cheia de gente bonita. Boa tarde gente bonita!

ELE - (COM CARA DE ANJO) Boa tarde moça bonita.


ELA - Boa tarde seu moço
ELE - (COM CARA DE ANJO) Você é a flor mais bonita desta cidade
8

ELA - E pra que esse incherimento todo?


ELE - (COM CARA DE ANJO) Não é enchirimento é poesia
ELA - Pois pegue a sua poesia e vá passando.
ELE - (COM CARA DE ANJO) Voce é muito braba
ELA - Você não viu nada
ELA - Olhe, eu tenho uma péssima experiência com gente do seu tipo. Não me dou bem nem com
poeta nem com curandeiro de feira. O último que eu conheci levou um anel que eu tinha para
consertar e desapareceu. Eu sei que ele mora no castelo da estradinha que é encantado.
(ELE VIRA A MÁSCARA E FICA COM CARA DE DEMÔNIO)
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO) Eu acho que posso ajudar.
ELA - E quem é o senhor?
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO) Eu sou eu mesmo só que com outra maquiagem.
ELA - E mudou assim tão depressa.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO) É a maquiagem da marca vapt-vupt.
ELA - Eu preciso de uma coisa assim. Dá muito trabalho se arrumar para ir a uma festa.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Pois eu posso lhe arranjar um pouquinho se a senhorita me der
um beijo.
ELA - Um beijo assim tão depressa.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO) Se eu lhe trouxer o anel ...
ELA - Pois vá buscar que lhe beijo
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Trato feito não pode desfazer.
ELA - Eu sou uma mulher de palavra. Você tem até a hora em que a lua cheia aparecer no horizonte
para chegar (SAI)

(ELE VIRA A MÁSCARA E FICA COM CARA DE ANJO)

ELE - (COM CARA DE ANJO) Essa foi fácil demais. Agora preciso pegar o anel. Eu sei onde ele
está, mas como vou conseguir fazer isso numa rapidez dessa?

(SURGE VENTANIA COMO UM MAMULENGO)

VENTANIA - Moço, boa tarde, eu ia passando e não pude deixar de escutar a sua conversa.
ELE - (COM CARA DE ANJO) Boa tarde
VENTANIA - Se o senhor quiser posso leva-lo até lá.
9

ELE - (COM CARA DE ANJO) E qual é o seu preço para fazer a viagem de ida e volta.
VENTANIA - Faço a viagem e ainda lhe mostro a porta secreta que dá acxesso ao Labirinto, quero
somente uma de suas caras.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Negócio fechado, pode ficar com essa mesmo.
(Juventino muda para cara de demônio)
VENTANIA -Vamos,
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Estou pronto.
VENTANIA -Já chegamos.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Você é rápido mesmo.
VENTANIA - Ali é a entrada do labirinto. estarei aqui fora te esperando.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO) Serei rápido, entrarei, pegarei o anel e voltarei para beijar
Carlota quando a lua cheia aparecer.

CENA 5 - MÁSCARA DO TOURO

(JUVENTINO COBRE-SE COM O VEÚ E COLOCA A MÁSCARA DO MINOITAURO)

TOURO - Não se assustem com a minha aparência, não sou o monstro que habita os labirintos,
apesar de que muitas vezes faço coisas que excedem as forças do ser humano, aliás, todos tem um
pouquinho de mim. Estou nas profundezas desse labirinto do qual não fácil, nem entrar e nem sair,
mas eu posso sair daqui as vezes que quero, e faço isso muitas vezes. No momento é da estória de
Juventino que eu quero lhes falar, tal como já começou um parente meu, o Jaraguá. A sina de
Juventino foi que ele depois de ter feito negocio com o vento, que o trouxe até aqui, e que sabia do
segredo de minha passagem secreta, e também sabia que as vezes ando pelas praças como um
curandeiro que vende pomadas milagrosas e faz performances fantásticas com fogo, com facas e
serpentes. O vento, consegue passar pelas brechas e se inflitra em todos os caminhos, assim ele
levou Juventino até o labirinto. Ele achava que seria uma aventura fácil de resolver, que bastaria
chegar aqui pegar o anel e ir embora. Mas não foi assim que aconteceu, ele ficou surpreso quando
descobriu que eu sabia de todas as suas peripécias, e até de seu amor por Carlota. Eu lhe contei que
aquelas máscaras eram na verdade algumas de minhas filhas que moram no mundo exterior. Ele já
devia saber disso porque é um artista popular estudado e que conhece as estórias das mitologias
antigas, e algumas até mais antigas que a humanidade de agora. Tem coisas que vem do tempo dos
continentes perdidos, Então, Juventino me pediu o anel e eu prontamente lhe dei; ele se admirou de
ser um anel feito de osso, pois parecia-lhe que deveria de ser de algum metal precioso. Colocou o
10

objeto no bolso e perguntou-me por onde ficava a saída, ele estava com a sua cara de demônio e por
isso demonstrava muita ousadia, mas eu lhe disse que a saída dali teria um custo, e que ele deveria
concordar com o preço antes de qualquer coisa. Eu lhe expliquei que ali somente tinham duas
portas, por uma ele poderia sair, mas esqueceria de tudo, até de si mesmo; e pela outra porta ele não
perderia a sua memória, mas ficaria com um rosto neutro que lhe retiraria completamente a sua
identidade física.

(SURGE JUVENTINO COMO UM MAMULENGO NA MÃO DO TOURO)

ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO) Preciso sair, pois tenho compromisso já marcado.
TOURO - O senhor precisa decidir por qual porta quer sair.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Deixe de sacanagem, que estas opções que você me colocou
não me servem
TOURO - Tem a opção de ficar aqui.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) O senhor deve ter ficado ruim da cabeça
TOURO - O senhor é quem manda. Tenho outras coisas para fazer, aproveite para conhecer todos os
cõmodos deste lugar.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Vamos parar com esse absurdo.
TOURO - Eu não mandei você entrar aqui
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Entrei porque precisava de algo
TOURO - O anel eu já lhe dei.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Mas não tem serventia nenhuma se eu ficar aqui.
TOURO - A saida fica ai em sua frente, nestas duas portas. Como já lhe disse pela primeira o
senhor perde a memória, e pela segunda perde a sua cara. O que escolhe?
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Ficar aqui eu não quero.
TOURO - Então vá.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)E tudo porque eu quis ficar mais jovem para sempre e
conquistar o amor de Carlota.
TOURO - O que escolhe.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)A gente pode fazer algum negócio, dar um jeitinho nisso...
TOURO - O que é que está pensando.
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)O senhor sabe que tive uma experiencia com o profeta do fim
do mundo, se o senhor der um jeitinho de eu escapar daqui, quando sair comoloco o senhor como
um dos deuses de nosso templo.
11

TOURO - E o que mais?


ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Dinheiro, muito dinheiro. Como já é sabido por todos, desde a
eternidade, o dinheiro compra tudo. Podemos abrir uma conta bancária para o senhor, e faremos as
transferências automaticamente.
TOURO - Estou impressionado com a sua desenvoltura.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Pois é, hoje nós governaremos o mundo antes que ele acabe.
TOURO - Acabe com a sua ajuda, não é.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Bem, pelo menos a gente vai divertir muito.
TOURO - Não podemos fazer negócio.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) mas, é um bom negócio para o senhor que vive aqui trancado,
nós podemos dar visibilidade a sua imagem nas redes sociais.
TOURO - Vai escolher o que?
ELE - (COM CARA DE DEMÔNIO)Se eu perder a memória eu esquecerei a minha senha do
banco.
TOURO - Então, é uma escola fácil.
ELE -(COM CARA DE DEMÔNIO) Acho que com o dinheiro eu faço uma plástica e boto a cara
que eu quiser.
TOURO - A porta de saída que escolheu é aquela, mas antes de sair deixe aqui a sua cara.

(O BONECO DE JUVENTINO SAI)

(JUVENTINO LEVANTA O PANO BRANCO E AGORA ESTÁ USANDO A MÁSCARA


NEUTRA DO INÍCIO)
(TOCA A SIRENE)
ELE - A sirene está tocando avisando que acabou o horário de visita. Agradeço os que me escutaram
e em troca ofereço um conselho. Conselho bom é aquele que vem com a vida através dos atos, é que
nós não conseguimos ler nos atos das pessoas o seu sentido, mas está lá uma advertência grande
dizendo as coisas que você precisa saber. Quando a gente viaja para os reinos interiores são as
máscaras que salvam a gente. Eu estava contando dessas coisas que aconteceram depois que fui em
busca de um beijo de Carlota. Se vocês a virem por aí, digam que mando lembranças. Por hoje é só,
não quero que vocês percam a oportunidade de saírem por aquela porta com as suas caras. (SAI)

fim
João Pessoa, junho de 2022.

Você também pode gostar