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Introdução

As necessidades educativas especiais referem-se às particularidades e desafios enfrentados por


indivíduos com deficiências, transtornos de aprendizagem ou habilidades excepcionais, que demandam
suporte e adaptações no ambiente educacional para garantir uma educação inclusiva e igualitária para
todos.

Essas necessidades podem abranger diferentes áreas, como física, sensorial, cognitiva ou
socioemocional, e requerem estratégias educacionais personalizadas e adequadas às características de
cada aluno. O objetivo é promover a participação plena e o desenvolvimento máximo de cada
estudante, respeitando suas diferenças e valorizando suas potencialidades. Para isso, é fundamental que
escolas e professores estejam preparados para oferecer suporte e criar um ambiente inclusivo, onde
todos os alunos tenham acesso a uma educação de qualidade.

Além disso, é importante destacar que as necessidades educativas especiais não são limitações, mas sim
características individuais que podem demandar abordagens pedagógicas diferenciadas. O respeito à
diversidade e a promoção da igualdade de oportunidades são princípios fundamentais para garantir uma
educação inclusiva e de qualidade para todos os estudantes, independentemente de suas necessidades
específicas. Com o apoio adequado, cada aluno pode desenvolver suas habilidades, alcançar seu
potencial máximo e se tornar um membro ativo e participante da sociedade.

2.1. Necessidades Educativas Especiais


Embora em uso desde os anos 60, a expressão Necessidades Educativas Especiais (special education
needs) ganha força nos fins da década de 1970 num relatório apresentado ao parlamento do Reino
Unido, pela Secretaria do Estado para Educação e Ciência, Secretaria do Estado para a Escócia e pela
Secretaria do Estado para o País de Gales. O Documento, posteriormente denominado Relatório
Warnock/Warnock Report, resumia as constatações do primeiro comité britânico constituído para
reavaliar o atendimento aos deficientes. O nome Warnock é uma alusão à presidente deste grupo de
trabalho, Mary Warnock.

Com o uso da expressão Necessidades Educativas Especiais o comité pretendia distanciar-se da


categorização médica das crianças e jovens com deficiência, adoptando uma classificação mais funcional
ao universo escolar. Todavia, somente com a publicação da Education Act de 1981 na Inglaterra, este
conceito foi claramente definido. De acordo com este documento, diz-se que “uma criança tem
Necessidades Educativas Especiais se tem dificuldades de aprendizagem que obrigam a uma intervenção
educativa especial, concebida especificamente para ela” (Sanches & Teodoro; 2006: 64).

Coll, Palacios e Marchesi (2007:11) afirmam que um aluno tem Necessidades Educativas Especiais
quando “apresenta algum problema de aprendizagem ao longo da sua escolarização, que exige uma
atenção mais específica e maiores recursos educacionais do que os necessários para os colegas da sua
idade”.

De modo mais amplo, define-se Necessidades Educativas Especiais a um «conjunto de factores de risco,
de ordem intelectual, emocional e física, que podem afectar a capacidade de um aluno em atingir o seu
potencial máximo no que concerne a aprendizagem, académica e sócio emocional». Estes factores
podem, assim, originar “discapacidades” ou “talentos”, podem afectar uma ou mais áreas do
funcionamento do aluno e podem ser mais ou menos visíveis (Correia, 2008: 43).

Pode-se dizer ainda que um aluno tem uma Necessidade Educativa Especial quando o seu
funcionamento na aprendizagem e no desenvolvimento encontra alguma dificuldade e, por
consequência lhe vem dedicada uma educação especial, mais eficaz e específica, por via da integração e
da inclusão (Ianes, 2005:11).

Agora pare e pense: em que medida o conceito que você avançou anteriormente aproxima-se de um
destes? Se apresentam alguma relação, está de parabéns. Caso contrário, não desanime: o erro é uma
parte fundamental do processo de aprendizagem.

Para operacionalizarmos melhor estes conceitos, lembremo-nos de que ao longo do percurso afirmamos
que a categoria necessidades educativas especiais vai para além da simples presença de distúrbios
físicos que possam ser motivo de dificuldades de aprendizagem.

Se consideramos esta premissa como verdadeira, convém-nos buscar um critério mais amplo para a
definição das NEE. Um ponto de partida essencial consiste em considerar que as NEE
(independentemente da causa, que pode ser biológica, social, económica, etc.) encontram-se na pessoa,
e mais precisamente na relação que esta estabelece com o meio circundante (o escolar em particular).
Então, podemos dizer que as necessidades educativas especiais são um problema antropológico que se
manifesta na inaptidão de adaptação do sujeito ao meio escolar.

Um importante documento que trata do Ser humano em termos de funcionamento/adaptação em


relação ao meio é o ICF (International Classification of Fuctioning, Disability and Health, WHO, 2001),
criado pela Organização Mundial da Saúde - OMS.

Interpretando este documento, podemos dizer que não existe uma (in)adaptação absoluta do Homem
em relação ao seu meio, isto é, o Homem pode comportar-se com desenvoltura ou encontrar-se em
dificuldades, em função da interacção que existe entre a sua dotação biológica, a sua história pessoal e
as condições que o mundo apresenta em determinado momento.

Imagine a seguinte situação: você fala fluentemente português, está inscrito num curso universitário.
Por alguma razão tem de mudar-se para um país cuja língua de ensino desconhece por completo. Você é
colocado na aula de biologia da 7ª Classe. Como é que acha que se sairia? E como é que você acha que
se sairia se a mesma aula fosse dada na língua portuguesa? Seguramente melhor, não acha?

Pedagogicamente falando, um estudante universitário que tenha sido educado unicamente em


Português (e, portando, apto para um sistema educativo cuja língua seja a portuguesa) pode encontrar-
se desajustado quando convidado para expressar-se em torno de conceitos/ideias elementares com
recurso a uma língua que lhe é estranha, o Francês, por exemplo.

Estamos a afirmar, simplesmente, que no cenário descrito acima, o estudante não “funciona
(pedagogicamente) bem” e carece de uma atenção educativa especial.

Podemos dizer o mesmo em relação a uma criança que, sendo surda e incapaz de fazer uma leitura
labial, encontre dificuldades para acompanhar o que a professora explica na primeira aula da primeira
classe e, por isso mesmo, precisa de uma atenção educativa especial.

Por tudo quanto dissemos ao longo do percurso, podemos pensar que a ideia de necessidades
educativas especiais parece ser mais funcional para descrever as nossas turmas do que classificações
muito limitadas quanto a deficiência ou dificuldades específicas de aprendizagem, porque abrange
qualquer sujeito que em determinado momento da vida precise de ajuda para se adaptar ao mundo da
escola (um adulto que sofreu um acidente e tornou-se cego, um cego congénito que aproxima-se pela
primeira vez à escola, um toxicodependente em reabilitação e que tenha perdido inteiramente as
capacidades mnemónicas, etc.).

2.2. Deficiência

Segundo Organização Mundial de Saúde, deficiência é o substantivo atribuído a toda a perda ou


anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatómica. Refere-se, portanto, à
biologia do Ser humano. Entretanto, esta concepção tem vindo a mudar, assistindo-se à passagem de
um modelo médico para um modelo social. Assim, pessoas com deficiência são aquelas que têm
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interacção com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efectiva na sociedade em
igualdades de condições com as demais pessoas (OMS, 2011).

Excursos 1. A lição de Lev Vygotskij sobre a deficiência

Para o psicólogo russo Lev Semënovič Vygotskij (1896 – 1934), o problema da deficiência deve ser
colocado e compreendido como problema social primário e fundamental (Pesci & Pesci, 2005: 152). Isto
significa que a deficiência não é apenas um dado físico/biológico. Por exemplo, o Vygotskij distingue dois
tipos de deficiência – primária e secundária. A deficiência primária é biológica (lesões orgânicas,
cerebrais, malformações, alterações cromossómicas, etc.) e a secundária é social. O conceito de
deficiência social diz respeito ao desenvolvimento do sujeito que apresenta traços da deficiência
primária/física, em função das interacções sociais). O autor acreditava firmemente que a forma como o
sujeito que apresenta uma deficiência física desenvolve-se estava fortemente relacionada com o modo
onde vive e com as interacções sociais com as quais está envolvido.

Levando ao extremo as suas ideias, Vygotskij dizia que não era importante saber qual doença/defeito a
pessoa tinha, mas que pessoa tinha tal doença/defeito. Em termos mais simples, conhecemos pessoas
invisuais que, devido ao facto de ter frequentado uma escola, podem mover-se livremente pela sua
cidade, bastando-lhe o uso da bengala branca. Entretanto, há casos de pessoas invisuais que não podem
locomover-se livremente em sua própria casa. O que diferencia estas pessoas? Se ambas são invisuais,
então, não pode ser a deficiência.

Partindo de análises deste género Vygotskij chegou ao conceito de compensação social. Em um dos seus
livros, o psicólogo escrevia:

“A educação das crianças com diferentes defeitos deve basear-se no facto de que simultaneamente com
o defeito estão dadas também as tendências psicológicas de uma direcção oposta; estão dadas as
possibilidades de compensação para vencer o defeito e de que precisamente essas possibilidades se
apresentam em primeiro plano no desenvolvimento de crianças e devem ser incluídas no processo
educativo como sua força motriz” (Vygotski, 1995, Apud Garcia, 1999: 46).

Assim, embora os vários tipos de deficiências sejam relacionadas também com circunstâncias biológicas,
a educação deve estar voltada para suas consequências sociais. Então, a deficiência deve ser
compreendida como um condicionamento biológico-social, o que significa que os dados sociais que a
pessoa com deficiência física encontra podem contribuir para minimizá-la ou agudiza-la (um surdo
instruído parecerá mais inteligente do que aquele que não teve a oportunidade de escolarizar-se, por
exemplo).

Em síntese, a educação não deve orientar-se para a deficiência (pedagogia terapêutica) ou invalidez
como princípio. Esta é apenas um dado de partida que deve ser contornado com o apoio da sociedade
(escolarização e participação social).
2.3. Disabilidade/Desability

Quem lê artigos ou os relatórios mundiais sobre a deficiência publicados pela OMS em Inglês, com
certeza já deparou-se com a expressão disability. Se já deparou-se com ela, certamente encontrou
algumas dificuldades para encontrar um termo equivalente em português. O que seria, então a
disability? Tem alguma ideia?

O termo desabilidade/disability representa a consequência de uma deficiência que pode ser física,
cognitiva, mental, sensorial, emocional, desenvolvimental, ou de uma combinação destas. Ela pode ser
congénita ou adquirida ao longo da vida.

Assim entendida, a desabilidade é um termo “umbrella” que diz respeito a deficiências, limitações nas
actividades, na participação social e demais restrições. Uma limitação na actividade é uma dificuldade
encontrada por um sujeito no desenvolvimento de actividades do dia-a-dia. A desabilidade revela-se,
assim, como um fenómeno – falta de habilidade – complexo resultante das interacções entre elementos
da estrutura corporal do sujeito e elementos da sociedade em que o sujeito vive.

Conclusão

Em conclusão, as necessidades educativas especiais exigem uma abordagem inclusiva e personalizada,


que valorize as potencialidades de cada aluno e promova sua participação plena na educação. É
fundamental que escolas, professores e toda a comunidade educacional se engajem na criação de um
ambiente acolhedor, adaptado e acessível, onde todos os estudantes tenham igualdade de
oportunidades para aprender e se desenvolver. Ao garantir uma educação inclusiva, estamos
construindo uma sociedade mais justa, empática e preparada para valorizar a diversidade e o potencial
de cada indivíduo.
Ao reconhecer e atender às necessidades educativas especiais, estamos promovendo a inclusão e a
igualdade, proporcionando a cada aluno a oportunidade de alcançar seu pleno desenvolvimento
acadêmico, social e emocional. Isso não apenas beneficia diretamente os estudantes com necessidades
especiais, mas também enriquece o ambiente escolar como um todo, criando uma cultura de respeito,
empatia e valorização da diversidade. É um compromisso coletivo garantir que todos os alunos tenham
acesso a uma educação de qualidade, independentemente de suas características individuais. Juntos,
podemos construir um futuro mais inclusivo e igualitário para todos.

Referência bibliografica

COLL, César, MARCHESI, Álvaro, PALACIOS, Jesús (2007). Desenvolvimento psicológico e educação:
transtornos do desenvolvimento e necessidades educativas especiais. 2. ed. Porto Alegre: Artmed.

CORREIA, Luís de Miranda (2008). Inclusão e necessidades educativas especiais. Um guia para
educadores e professores. 2ª ed., Porto Editora: Porto.
IANES, Dario (2005). Bisogni educativi speciali e inclusione. Valutare le reali necessità e attivare tutte le
risorse, Erickson: Trento.

GARCIA, R. M. Cardoso (1999). A Educação de Sujeitos Considerados Portadores de Deficiência:


contribuições Vygotskianas. In Ponto e Vista. v. 1, n. 1 Julho/Dezembro de 1999, pp. 42-46.

PESCI, Guido, PESCI, Simone (2005). Le radici della pedagogia speciale. Armando Editore: Roma.

SANCHES, Isabel, TEODORO, António (2006). Da integração à Inclusão escolar: cruzando perspectivas e
conceitos, in Revista Lusófona de Educação, n° 8, p. 63-83.

WHO (2001). International Classification of Fuctioning, disability and Health: ICF, WHO Library
Cataloguing-in-Publication Data: Genebra.

WHO (2011). World report on disability 2011, WHO, S/d.

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