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5 ANÁLISE DA CAMADA LIMITE TURBULENTA

Nesta etapa, em procedimento análogo à Seção 4 foram tomadas duas medidas dos perfis
de velocidade para dois números de Reynolds na posição x = 0,7 m e duas tomadas em x = 0,8 m,
cujos resultados se encontram condensados na Figura 5. A correção da coordenada vertical para
os perfis turbulentos foi realizada a partir dos valores encontrados para os casos laminares. Essa
correção foi considerada uma vez que, para a análise dos perfis em regimes distintos, as posição
na placa foram fixadas, variando-se apenas o número de Reynolds. Como a posição horizontal não
seria alterada, optou-se por estimar a correção vertical no regime laminar, onde a medição sofreria
menores pertubações.
A estimativa da espessura δ99% foi feita através de um processo iterativo empregando os
dados de posição vertical e velocidade em cada um dos perfis turbulentos analisados. Com o auxı́lio
de uma rotina em MatLab® , diversos valores de espessura de camada limite foram testados onde
avaliou-se o erro médio quadrático entre o perfil de velocidades experimental e o perfil raiz sétima.
O valor considerado para a espessura δ99% foi aquela que minimizava este erro.
Considerando-se que o escoamento apresenta um comportamento turbulento desde o bordo
de ataque da placa plana, a espessura δ99% para a camada limite neste regime pode ser calculada
a partir da expressão contida na Equação 3 [3].
0, 16 · x
δ= 1/7
(3)
Rex
A Tabela 4 apresenta os valores das espessuras δ99% teóricas e experimentais, obtidas para cada um
dos perfis de velocidade analisados. Embora estas espessuras tenham sido calculadas considerando
o valor do Rex , descrito pelo Equação 1, os escoamentos estão sendo identificados a partir do valor
do Reθ calculado.

Tabela 4: Resultados obtidos após análise dos perfis de velocidade no regime turbulento.

x(m) θ(mm) Reθ δ99% (mm) experimental δ99% (mm) teórico


0,7 1,59 1, 05 · 103 19,0 17,4
3
0,7 1,48 1, 04 · 10 18,5 17,2
3
0,8 1,99 1, 32 · 10 22,8 19,5
0,8 1,93 1, 49 · 103 22,2 19,1

As discrepâncias entre os valores teóricos e experimentais podem ser justificadas uma vez
que a teoria empregada considera que o regime do escoamento sobre a placa é turbulento desde o
bordo de ataque, contudo próximo ao bordo de ataque, a camada limite inicialmente é laminar [1].
A Figura 5 apresenta os perfis de velocidade para os escoamentos turbulentos bem como os
valores da espessura de quantidade de movimento θ encontrados.

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Figura 5: Similaridade entre os perfis de velocidade tomados no regime turbulento.

Assim como no caso laminar [1] evidencia que para o regime turbulento é possı́vel descrever o
escoamento por meio de uma variável similar, fazendo com que os perfis de velocidade normalizados
não dependam da coordenada x, haja vista que não há um comprimento caracterı́stico ao longo
da direção do escoamento que o defina. Voltando-se para os dados coletados, as tomadas de
velocidade executadas em posições distintas e para variados números de Reynolds, os perfis de
velocidade normalizados coincidiram, denotando que existe similaridade entre estes.

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6 ANÁLISE DA CAMADA LIMITE TRANSICIONAL
A correção da coordenada vertical para os perfis no regime de transição foi realizada a
partir dos valores encontrados para os casos laminares. Essa correção foi considerada uma vez em
que,para a análise dos perfis em regimes distintos, as posição na placa foram fixadas, variando-se
apenas o número de Reynolds. Como a posição horizontal não seria alterada, optou-se por estimar
a correção vertical no regime laminar, onde a medição sofreria menores pertubações.
A Tabela 5 apresenta os valores da espessura de quantidade de movimento, θ, calculada
para cada um dos perfis de velocidade no regime transicional.

Tabela 5: Resultados obtidos após análise dos perfis de velocidade no regime transicional.

x(m) Reθ θ (mm)


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0,7 4, 73 · 10 1,12
0,8 7, 83 · 102 1,57

A partir dos valores experimentais obtidos, foi possı́vel traçar os perfis de velocidade nor-
malizados (u/U0 vs y/θ) para a camada limite no regime transicional dos ensaios realizados. A
Figura 6 apresenta estes perfis identificados pelo seu respectivo Reθ .

Figura 6: Similaridade entre os perfis de velocidade tomados no regime transacional.

A Figura 7 apresenta o perfil de velocidade para a camada limite nos três regimes ensaiados.
Cada perfil está identificado com o seu respectivo Reθ .

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Figura 7: Perfis de velocidade de todos os regimes analisados.

No regime transicional, com base no gráfico da Figura 7, nota-se que curva dos dados do
perfil transicional para Reθ = 4.73 · 106 encontra-se fora das curvas do laminar e do turbulento.
Entretanto, para Reθ = 7.83 · 105 , o perfil coincide razoavelmente bem com os perfis turbulentos,
indicando que para este valor o regime turbulento estaria bem desenvolvido, por conseguinte, com
os dados obtidos não foi possı́vel determinar se a não similaridade entre os perfis se deu pelo fato
de estarem em regimes distintos ou pelo fato da não-similaridade intrı́nseca do regime transicional
resultante do fato de este apresentar um comportamento instável ao longo do tempo [1].

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7 FLUTUAÇÃO E NÍVEL DE TURBULÊNCIA
A partir dos dados brutos do comportamento da velocidade durante o intervalo estudado, de
10 segundos para cada medida, os valores médios temporais da velocidade foram extraı́dos, assim
como seu valor rms usado para determinar as flutuações das medições reais da média temporal.
Como demonstra [4] a equação 4 mostra a definição usada para urms .
s Z T2
1
urms = (u(t) − u)2 dt (4)
T 2 − T 1 T1
Esses dados foram normalizados pela velocidade de escoamento livre Uo para representar a
flutuação da velocidade, e normalizados pelo perfil de velocidade média caracterizando o nı́vel de
turbulência. Os gráficos dessas medidas encontram-se na Figura 8.
É esperado que as variações e nı́veis de turbulência dos escoamentos laminar e de transição
sejam menores que as do escoamento turbulento, porém, pelas diferentes velocidades em cada
número de Reynolds analisado, fora da camada limite os gráficos normalizados apresentam valores
de flutuação similares. Maiores diferenças de comportamento podem ser observadas no interior
da camada limite nas proximidades da superfı́cie da placa. Isto pode ser observado no gráfico de
flutuação do regime laminar que tem um gradiente comparativamente menor aos demais regimes
junto a placa indicando apenas uma variação intrı́nseca aos erros experimentais, sem divergir do
perfil de velocidades temporalmente constante da teoria. Enquanto que os gráficos do regime
de transição e turbulento demonstram valores elevados de flutuação junto a placa demonstrando
uma variação significativa do perfil de velocidades nessa região da camada limite, caracterı́stica na
formação de estruturas turbilhonares.
Também é possı́vel observar no gráfico de flutuação do escoamento de transição, uma dimi-
nuição das variações junto à superfı́cie da placa. Outrossim, pode ser visto no gráfico do regime
turbulento plenamente desenvolvido que as flutuações aumentam com a proximidade da placa.
Essa divergência comprova que o escoamento da Figura 8 pertence ao regime de transição, pois
a intermitência do comportamento laminar ocasiona a diminuição na variação média temporal da
velocidade observada.
Ademais, a presença de flutuações significativas (em torno de 5% das medições médias) na
velocidade do escoamento fora da camada limite dos 3 regimes indica que o próprio sistema de
medição possa conter algum ruı́do que influencia na medição de urms , além do túnel de vento conter
um nı́vel de turbulência intrı́nseco, fazendo diferir o observado das variações teóricas esperadas
pela transição natural do escoamento. Essas flutuações do aparato experimental se demonstram
proporcionais ao perfil de velocidade média do escoamento laminar, o que condiz com a linearidade
do sistema laminar. Esse comportamento proporcional entre flutuação e valor médio não se mostra
com os escoamentos de transição e turbulento devido às suas não-linearidades. E por este fato,
não se pode esperar uma transformação de similaridade entre os perfis de flutuações dos tipos de
escoamento.

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(a) (b)

(c) (d)

(e) (f)

Figura 8: (a), (c) e (d): Perfis de flutuação normalizados para os regimes laminar, transicional e
turbulento, respectivamente; (b), (d) e (e): Perfis de nı́vel de turbulência normalizados para os
regimes laminar, transicional e turbulento, respectivamente.

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8 ANÁLISE DO FATOR DE FORMA
O fator de forma H é definido como a razão entre a espessura de deslocamento δ ∗ e a
espessura de quantidade de movimento θ[3]. As espessuras, por sua vez, podem ser calculadas a
partir do perfil de velocidade da camada limite obtido experimentalmente.
Como as velocidades foram medidas de forma discreta, as integrais 5 e 6 foram aproximadas
pelo método do trapézio, integrando desde y = 0 até um ponto claramente acima da camada limite
em y = y1 > δ, estimado pela estabilização da velocidade em função de y. Isso é feito pois a integral
fora da camada limite tem valor irrisório - de fato, segundo a teoria seu valor seria nulo - portanto
a integral no intervalo aproxima satisfatoriamente a integral na camada limite teórica.
Obtido o perfil de velocidade, utilizou-se as seguintes equações para determinar as espessuras
δ e θ[2]. Perceba que o fluido é considerado incompressı́vel devido ao baixo número de Mach,

portanto ρ = ρe ∀y.
Z y1
ρu
δ =

(1 − )dy, δ ≤ y1 (5)
0 ρe U 0
Z y1
ρu u
θ= (1 − )dy, δ ≤ y1 (6)
0 ρe U0 U0
Com esses valores, foi possı́vel definir o fator de forma através da Equação 7.
δ∗
H= (7)
θ
Os valores teóricos tı́picos de H para escoamento sobre a placa plana são 2,59 para esco-
amentos laminares e 1,3 para escoamentos turbulentos[3]. Esses valores são constantes pois as
espessuras têm a mesma dependência em x e Re.
A Tabela 6 apresenta os valores calculados pelas equações 5, 6 e 7 para diferentes Reθ .

Tabela 6: Valores experimentais para o fator de forma e para as espessuras de deslocamento e de


quantidade de movimento

x(m) Reθ δ ∗ (mm) θ(mm) H


0,7 1, 04 · 103 2,56 1,48 1,73
3
0,7 1, 05 · 10 2,75 1,59 1,73
0,8 1, 32 · 103 2,74 1,99 1,38
3
0,8 1, 49 · 10 2,73 1,93 1,41
0,8 2, 30 · 102 3,93 1,55 2,53
2
0,7 2, 49 · 10 2,33 0,88 2,64
2
0,7 4, 73 · 10 1,85 1,12 1,65
0,8 7, 83 · 102 2,15 1,57 1,37

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Comparando esses resultados com os perfis teóricos, foi possı́vel traçar o gráfico presente
na Figura 9.

Figura 9: Fator de forma em função do número de Reynolds

Podemos observar que, de fato, o fator de forma indica que a transição ocorre entre os
regimes laminar e turbulento, ao aumentar o número de Reynolds, e que os valores se aproximam
dos valores teóricos.
As divergências observadas podem ser atribuı́das às incertezas nas medições devido as flu-
tuações no escoamento do túnel de vento não amenizadas pela média de 10 segundos, assim como
o desvio da calibração da distância do fio quente à placa devido à impossibilidade de tocar o fio
quente à superfı́cie, devido à sua fragilidade. Por fim, propagação desses desvios no cálculo do fator
de forma se potencializa devido às integrações numéricas com relativamente poucos pontos e di-
visão entre valores incertos de δ ∗ e θ, muito sensı́veis a desvios devido a suas pequenas magnitudes,
da ordem de milı́metros.
Fica evidente, também, como os regimes laminares e turbulentos são bem distintos, mas a
transição é uma região menos bem definida, pois os pontos correspondentes a números de Reynolds
intermediários são mais dispersos que os extremos, que ficam próximos dos valores teóricos.
Outra possibilidade para explicar o desvio no lado turbulento, é que ainda não tenha ter-
minado a transição, o que explicaria os valores levemente aumentados de fator de forma. Porém,
o valor de H ≈ 1,4 é condizente com os resultados empı́ricos de Schubauer, Klebanoff e Persh,
citados por Schlichting[1]. Esse desvio pode indicar que o perfil de velocidade da camada limite
turbulenta não se ajusta perfeitamente à lei da raiz sétima.

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9 CONCLUSÃO
Na prática, foram medidos os perfis de velocidade sobre uma placa plana para estimar os
valores de número de Reynolds para o inı́cio e fim da transição do regime laminar para o regime
turbulento. Foram medidos também os perfis de velocidade para as camadas limite em regime
laminar, transicional e turbulento desenvolvidas sobre a placa plana.
Com os dados obtidos no ensaio 2, foi possı́vel estimar a faixa de transição, sendo ela entre
Re = 2,96 · 105 e Re = 4,23 · 105 , valor levemente antecipado em relação a teoria, que prevê a
transição para um número de Reynolds entre 3,5 · 105 e 5,0 · 105 . A antecipação é justificada por
perturbações no escoamento, como, por exemplo, uma placa que não seja perfeitamente plana.
Ao analisar os gráficos construı́dos, pôde-se constatar a similaridade para os perfis laminares
e turbulentos e a não-similaridade para um perfil transicional, sendo que a segunda tomada de
velocidades, a priori transicional, apresentou-se no regime turbulento pelo fato de o fator de forma
calculado estar próximo de 1,3, valor previsto na teoria para o regime turbulento a similaridade
com os perfis turbulentos normalizados.
Para reproduções desse experimento, utilizar um sistema de posicionamento automático
para o fio quente, isto é, que não precisasse do ajuste manual, poderia aumentar a precisão dos
perfis coletados. Utilizar uma placa fabricada com tolerância menor contribuiria para reduzir a
antecipação da transição.
De fato, foi possı́vel observar os perfis de velocidade previstos pela teoria da camada limite,
bem como realizar as análises citadas anteriormente.

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Referências
1 SCHLICHTING, H.; GERSTEN, K. Boundary-layer theory. 9. ed. Berlin Heidelberg: Springer,
2017. 1, 4, 7, 8, 10, 14

2 ANDERSON, J. D. Fundamentals of Aerodynamics. 5. ed. New York: McGraw-Hill, 2011. 4,


5, 6, 13

3 WHITE, F. M. Mecânica dos Fluidos. 8. ed. Porto Alegre: AMGH Editora Ltda., 2018. 7, 13

4 ROOT-MEAN-SQUARE. Weisstein, Eric W. Disponı́vel em: hhttps://mathworld.wolfram.


com/Root-Mean-Square.htmli. Acesso em: 20 mai. 2022. 11

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