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"OGenomaHumanoColocadoem Chip"

foi a manchete que


o New York Times usou, em outubro passado, ao publicar qüência do DNA. As ferramentas da engenharia genética,
que três empresas de biotecnologia haviam fabricado disposi- no entanto, funcionavam melhor nos genes e nas proteínas
tivos minúsculos que registram a atividade de todos os genes convencionais, o que levou os cientistas a procurar com mais
de uma amostra de tecido humano. Com isso, um dos objeti- afinco onde a luz era mais brilhanté.
vos doHuman Genome Project era alcançado. Ao escanear a Em anos recentes, os geneticistas vêm explorando com
seqüência de DNA humano, os cientistas podem estimar quais maior abrangência as partes menos visíveis do genoma, à pro-
partes são os genes transcritos em mensagens RNAe depois cura de explicaç.ões para anormalidades que contradizem o
traduzidos em proteínas funcionais. paradigma central: doenças que afetam famílias, mas que sur-
Quando o "rascunho final" da seqüência foi anunciado em gem de forma súbita e imprevisível, diferindo até entre gê-
abril, muitos disseram que a sucessão de 3 bilhões de bases A, meos idênticos; genes ativados e desativados em cânceres e
T, G e C do DNA humano representava o livro da hereditari- que, no entanto, não apresentam mutações; dones que nor-
edade, o código fonte das células, o mapa de uma vida. Na malmente morrem no útero. Eles constataram que essas ca-
verdade, todas essas metáforas são enganosas. madas de informações adicionais, distintas das dos genes co-
Um genoma, a soma de informações hereditárias no in- dificadores de proteínas, conectam-se de forma surpreenden-
terior dos cromossomos que governam o desenvolvimento temente profunda e poderosa com hereditariedade, desenvol-
de um organismo, não é um texto estático transmitido ao vimento e saúde.
longo das gerações, mas uma máquina bioquímica de uma "O Genoma Oculto", publicado na edição de dezembro
complexidade impressionante. Como todas as máquinas, de SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL, descreve essas conexões da
opera em espaço tridimensional e apresenta partes intera- segunda camada, formada por miríades de genes "só de RNA"
tivas distintas e dinâmicas. ocultos em vastas regiões não-codificadoras do DNA. A ciên-
Os genes codificadores de proteínas constituem só uma cia descartou esse DNA como detrito evolucionário sem valor
dessas partes - em geral a menor, respondendo por menos de porque não codifica proteínas. Descobriu-se, porém, que es-
2% do DNA total em cada célula humana. Mas, durante a ses genes não convencionais de fato produzem RNAs ativos,
maior parte das últimas cinco décadas, o paradigma central da através dos quais alteram profundamente o comportamento
biologia molecular considerava-os o santuário das caracterís- dos genes normais. Disfunções em genes que só produzem
ticas hereditárias. Daí a noção do genoma como mapa. RNA podem causar danos severos.
Já na década de 60, os pesquisadores desvendaram"infor- A terceira parte da máquina genômica, tão fascinante quan-
mações importantes escondidas em outra parte dos to os genes RNA ativos e talvez ainda mais importante, é a
cromossomos. Algumas estavam enfurnadas entre o DNA camada de informação "epigenética" armazenada nas proteí-
"não codificador" e outras situadas totalmente fora da se- nas e moléculas que circundam e aderem ao DNA. Os
marcadores epigenéticos são assim denominados porque po-
B~ JID (] dem afetar a saúde e as características de um organismo - al-
A maior parte das características é transmitida por genes do DNA guns são transmitidos de pais para filhos - sem.alterar a se-
que codifica proteínas. Porém um código separado, escrito por qüência do DNA subjacente.
marcadores químicos fora da seqüência do DNA,também produz O complexo código pelo qual os marcadores epigenéticos
efeitos dramáticos na saúde e na aparência de organismos.
interagem com outros componentes do genoma ainda deve
O código epigenético pode explicar por que algumas doenças pu- ser decifrado. Mas, ao trabalhar alguns mecanismos críticos,
lam geraçÕes e afetam somente um entre dois gêmeos idênticos. os pesquisadores observaram que a parte epigenética do
Os erros epigenéticos parecem estar envolvidos no câncer.
genoma parece desempenhar papéis fundamentais no cresci-
Um genoma opera como uma máquina com várias partes comple- mento, envelhecimento e no câncer. Suspeita-se também que
xas que interagem. Seria muito mais fácil modificar a parte
as "epimutações" contribuam para diabetes, esquizofrenia, de-
epigenética com medicamentos do que tem sido modificar a se-
sordem bipolar e muitas outras enfermidades complexas.
qüência do DNA.
A epigenética pode sugerir novos caminhos para o tra-

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TRASEIROS
BEMDESENVOLVIDOS
distinguem u.maovelha callipyge (primeira à esquerda) e um cameiro callipyge (terceiro, da esquerdapara a direita) de seus innãos
nonnais. Opadrão bizarro de herança da característica callipyge pode ser explicadopelainteração de três camadas distintas de infonnação no genoma

tamento dessas doenças. Enquanto as células obstinada- como se o callipyge tivesse subitamente mudado sua cárac-
mente protegem seu DNA contra mutações, elas têm como terística para recessiva.
rotina adicionar ou apagar marcadores epigenéticos. Em Os geneticistas então cruzaram carneiros de aparência nor-
princípio, as drogas poderiam reparar o código epigenético mal, porém portadores da mutação, com ovelhas completa-
para ativar e desativar conjuntos inteiros de genes nocivos. mente normais. Metade dos filhotes saiu callipyge.A caracte-
Novos medicamentos podem ser capazes de reverter alguns rística, portanto, só aparecia quando os ovinos herdavam a
dos danos genéticos que acompanham o envelhecimento mutação do pai.
ou precedem o câncer. A coisa ficou realmente bizarra, relembra Georges, quan-
do os cruzamentos produziram ovinos apresentando dois alelos
TraseirosAtraentes callipyge (em outras palavras, a mesma mutação em ambas as
A história de Solid Gold ilustra como as três partes do cópias do cromossomo). Se o callipyge fosse um gene padrão,
genoma podem interagir para confundir as noções con- então os animais que herdassem a forma mutante de ambos os
vencionais de hereditariedade. Nascido em 1983, em uma pais deveriam exibir necessariamente traseiros polpudos. To-
fazenda de criação de ovinos em Oklahoma, um carneiro davia, todos os ovinos duplamente mutados pareciam perfei-
foi batizado de «Solid Gold" quando sua parte traseira tamente normais (ver ilustração na pág. seguinte). O que esta-
cresceu em pródigas proporções. Pressentindo uma mu- va acontecendo?
tação lucrativa, o fazendeiro prontamente colocou o car- Dez anos de experimentos finalmente responderam a
neiro para reproduzir. questão. Em maio, Georges e colaboradores publicaram uma
Os filhos de Solid Gold cruzaram com ovelhas normais. receita para o pedigreee a característica callipyge: um gene
Metade dos filhotes, tanto machos como fêmeas, saíram ao padrão produtor de proteína, um ou mais genes que só pro-
pai. Os pesquisadores os chamaram de callipyge, palavra gre- duzem RNA, mais dois efeitos epigenéticos. O ingrediente
ga para «traseiro bonito". Uma divisão 50-50 é o que se espera final é uma mutação diminuta, uma base G onde um A nor-
de uma mutação de um gene dominante. «Mas aí a coisa ficou malmente aparece, em um ponto específico «no meio de um
ainda mais interessante", lembra-se Michel Georges, da deserto de genes, a 30 mil bases de distância do gene conhe-
Université de Liege, Bélgica, contratado como consultor. cido mais próximo", diz Georges. De alguma forma, o DNA
Quando uma fêmea callipyge cruzava com machos nor- naquele ponto controla a atividade dos genes da receita que
mais, nenhum filhote exibia os glúteos enormes característi- codificam proteínas e dos que só produzem RNA, no mes-
cos da mãe, apesar de alguns terem herdado a mutação. É mo cromossomo.

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GUINADAS
DEUMAÁRVOREGENEALÓGICA
HÁVINTEANOSum ovinochamado"SolidGold"nasceucomumamutação mutaçãoporparte maternaexibemumaaparêncianormal(azul)-
nocromossomo18,quelevoua um crescimentoincomume avantajado mesmoqueobtenhamumasegundacópiadogenedeseus pais
de sua partetraseira. Elepassouessacaracterísticaa cercade metade [vermelho).Devidoa efeitos epigenéticos,osúnicos ovinosque
deseus descendentes(verde),o padrãotípico paraum genedominante. desenvolvemcoxasgrandessão aquelesquerecebemsomenteuma
Geraçõesmais recentesrevelaram,noentanto,queovinosqueherdama cópiadamutação,por parte de pai (taranja)

A mutaçãoinicialquelevoua um belotraseiro
ocorreuemum carneirochamado"SolidGold",
quecruzoucomovelhasnormais.

Ageração1 aparentementeexibiauma
característicadominantepadrão(todos
os queherdarama mutaçãotinham
traseirosgrandes)...

...massomente
carneirospassarama
característicaparaa U
geração 2 ... u:::J
Acaracterísticapulaumageração(azul)
quandotransmitidaporumaovelha.
...e nageração3 o
padrãodeherança Masa característicaapareceem
pareciabem cadadescendente(taranja)quando
desconcertante.
transmitidaporumcarneiro
portadorda mutaçãoem ambasas
~ cópiasdocromossomo18.

A alteraçãode A paraG pode tornar essesgeneshiperativos, vos dos genesque sóproduzemRNA. Os RNAs amplifica-
gerando um excesso de proteína ou RNA ativo nas células dos,dealgumamaneira,bloqueiamo sinaldecrescimentoex-
musculares. O excessode proteína explica a enorme parte tra- cessivo e o filhote se mostra esbelto. Esses efeitos de
seira - mas não o curioso modelo herdado. Os pesquisadores "superdominância"parecemserraros.O "imprint", no entan-
vêem aí um fenômeno epigenético, um "imprint" (possível to, é bastantecomum, especialmenteem plantasfloríferas.
metilação do DNA), atuando na árvore genealógica. RandyL. Jirtle,daDuke University, mantémumalistaatua-
A maioria dos genes, tanto alelos maternos como pater- lizadade"imprints" degeneshumanos;o númeroestáem75.
nos, é ativada ou desativada ao mesmo tempo. O "imprint" Muitos outros aguardampara serdescobertos.Poucosdias
rompe esseequilíbrio. Paraalguns genesque sofrem essepro- apósa concepção,quasetodo o "imprint" é removido dos
cesso, apenas a cópia procedente do pai é expressa; o alelo cromossomos.Como issoaconteceé um mistério.
herdado da mãe é silenciado. O gene produtor de proteína e Variantes epigenéticas "poderiam explicar a estranha dis-
de traseiros polpudos envolvido no callípyge funciona dessa crepância de doenças entre gêmeos idênticos", sugere Emma
forma. Por isso os ovinos que recebem a mutação A-para-G Whitelaw, da University of Sidney. Gêmeos idênticos com-
da mãe parecem normais; a mutação não pode ignorar a cen- partilham seqüências idênticas de DNA. Mas quando um
sura seletiva imposta pelo "imprint". adquire uma doença com um componente genético, como a
A forma oposta do "imprint" afeta o gene (ou genes) esquizofrenia, a desordem bipolar e o diabetes infantil, geral-
callípyge que ativam os RNAs. Esses RNAs são produzidos mente o mesmo não acontece com o irmão. Ainda não se sabe
somente do alelo no cromossomo materno. Esse segundo pe- exatamente como o 'imprint' funciona. Mas pesquisadores
dacinho de magia epigenética ajuda a explicar por que a ca- admitem que a metilação do DNA parece desempenhar um
racterísticadesaparecedosanimais com os dois aleloscallípyge. papel bastante relevante.
Nesses ovinos de dupla mutação, a mutação do Simples mas poderoso, o metil consiste em um carbono,
cromossomo paterno obriga o geneprodutor de proteína auma três hidrogênios e um co-fator para se ligar a - para metilar -
superatividade. Ao mesmotempo, a cópia da mutação A-para- alguma outra coisa. O metil possui uma afinidade especial com
G no cromossomo materno incrementa os níveis de RNAs ati- as bases C (citosina) do DNA. Enzimas com finalidades es-

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pecmcas retiram as moléculas metil derivadas dos nutrientes submetilação espalhada pelo genoma. Drogas como o anesté-
básicos, tais como ácido fólico e vitamina B12, e aderem a cer- sico procaína, o estabilizado r de humor ácido valpróico e o
tas bases C por todo o genoma. agente quimioterápico decitabina parecem tanto roubar gru-
Em geral, quanto mais metilada for uma extensão do pos metila do DNA como impedir que marcadores metil se
DNA, menor a probabilidade de ser transcrita para RNA e acoplem às células recém-formadas.
de realizar sua função. Por exemplo, o alelo silenciado de «Essas drogas são bem promissoras«, enfatiza Sabine
um gene que sofreu «imprint" é quase sempre altamente Maier, da Epigenomics, empresa de biotecnologia de
metilado. O «imprint", porém, pode ser um trabalho parale- Berlim que trabalha com a Roche, de Basiléia, na Suíça, a
lo para a metilação do DNA; ele parece principalmente de- fim de desenvolver diagnósticos para câncer baseados na
fender o genoma contra elementos genéticos parasíticos de- metilação. «Há só um problema", acrescenta. "Todas as
nominados transpósons. drogas causam a desmetilação no genoma inteiro, o que
«Gostamos de pensar no genoma como algo imaculado", provavelmente causa efeitos colaterais."

uOuando
a drogafunciona,a leucemiasecura:
99,9%dascélulascancerosas desaparecem"
observa Timothy H. Bestor, da Columbia University. "Mas Outra preocupação é que o efeito seja temporário: os
nosso DNA está cheio de parasitas genéticos." Cerca de 45% marcadores metil voltam a aparecer e os genes supressores de
da seqüência do DNA humano consiste em genes virais (ou tumor se desativam novamente. «Amodificação induzida pela
fragmentos de gene) que se copiaram dentro do genoma du- droga na expressão do gene pode não ser permanente", admi-
rante o curso da evolução. Felizmente, quase todo esse DNA te Jean-Pierre Issa, da University of Texas. «Mas caso se mo-
está metilado e mantido inativo. .
difique de forma a permitir que o sistema imune possa identi-
Mas o que acontece se a defesa do metil fracassar? Em um ficar a célula tumoral ou que a induza à apoptose (suicídio da
famoso estudo de cinco anos atrás, engenheiros genéticos célula), a célula estará morta."
desativaram uma das enzimas de adição de metil em células-
tronco embrionárias. Com a guarda metil rebaixada, muitos Decifrandoo Código
transpósons tornaram-se ativos. A freqüência das mutações A reemergência de um padrão específico de metilação do
do DNA nas células cresceu dez vezes. Tais experiências le- DNA, depois de ser limpo pelas drogas, estranhamente ecoa a
vantaram uma questão intrigante: as anormalidades reprogramação do "imprint" de um embrião logo após sua con-
epigenéticas poderiam acelerar - talvez até iniciar - o caos cepção. O que direcionaria as enzimas de adição de metila de
genético que leva ao câncer? volta àqueles genes supressores de tumor ou àqueles poucos
Afinal, as células tumorais freqüentemente contêm muito alelos que deveriam ser marcados?
pouca metilação no genoma em geral e, confusamente, muitas Essa questão deve ser respondida caso a donagem se tor-
moléculas metil acopladas a certos genes que normalmente ne rotina. Atualmente, a reprogramação epigenética não tem
impedem células anormais de s.etornarem malignas. «Em pó- êxito em dones obtidos pela substituição do DNA em um
lipos do cólon (crescimentos benignos dos quais normalmen- ovo fertilizado com o DNA da célula de um adulto. «Amaior
te surgem tumores), pode-se observar uma redução na metila- parte desses dones exibe padrões anormais de metilação e
ção do DNA em todo o genoma", ocorrendo mesmo antes de de expressão gênica", diz David Wells, especialista em
as mutações destruírem importantes genes anticrescimento no donagem do AgResearch em Hamilton, na Nova Zelândia.
caminho para o câncer, afirma Stephen B. Baylin, da Johns Mesmo que a seqüência do DNA deles esteja correta, 90%
Hopkins University. dos animais morrem antes de nascer; metade dos que nas-
Ninguém sabe a razão pela qual tantos grupos metila se cem nunca atinge a idade adulta e os poucos que sobrevi-
desprendem do DNA - nenhuma enzima removedora de vem até a maturidade tendem a sofrer de obesidade e doen-
metil foi positivamente identificada. Os pesquisadores, po- ças imunológicas.
rém, suspeitam que cromossomos com pouco metil estejam Para prevenir permanentemente ou reverter os erros da
mais propensos à disfunção durante a divisão celular, dando metilação tão comuns nos dones, tumores e desordens de
um passo rumo à doença. «imprint", os pesquisadores devem decifrar um código
A idéia de que a falta de metil no DNA pode levar ao cân- epigenético relacionado - um completamente separado do
cer humano é ainda apenas uma hipótese e, de qualquer modo, DNA. "A metilação, em si, não silencia os genes," afirma
os oncologistas não dispõem de drogas que possam corrigir a Baylin, do Johns Hopkins. «Ela só os trava no estado silen-

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o VOLUMEEPIGENÉTICO
CONTROLA
OSGENES
AseqüênciadeDNAnãoé o únicocódigoarmazenadonoscromossomos. às proteínashistonasquecontrolamsuaformadentrodoscromossomos.
Ochamadofenômenoepigenético,deváriostipos, podeatuarcomo Entresuasmuitasfunções,o volumeepigenéticocontrolao silenciamento
controledevolumeparaamplificarou emudecero efeitodosgenes.A dequantidadesimensasdeelementosgenéticosparasitas,chamados
informaçãoepigenéticaestá codificadacomoanexosquímicosdo ONAou transpósons,queconfundemo genoma.

Histonas

ONAexposto sendo
transcrito em RNA

4 °s genestambémpodemser suprimidospor
marcadoresmetil quese grudamdiretamenteao 3 Umintrincadocódigohistona- escritoemmarcadores
químicospresosnasterminaçõesdashistonas-também
DNA,normalmenteemlocaisondeumabaseCé seguida governaa expressãogenética.Osmarcadoresacetilgeralmente
porumaG.Sea metilaçãoDNAdesligaosgenes amplificamos genessituadosnavizinhança,aopassoqueas
independentementeousomentepelacombinaçãocom enzimasremovedorasdeacetilossilenciam.Resta,porém,
marcadoreshistonaé aindaum mistério. decifraros códigosremanescentes.

5 Genes saltadores, também


conhecidos como transpósons,
podem se clonar e depois insinuar as
cópias em seções distantes do
genoma, algumas vezes desativando
ou hiperativando os genes. Uma
~ ~
Cópias
ONA
~
~
função principal da nietilação do DNA
parece ser a supressão dos
transpósons, que compõem quase a
metade do genoma humano.

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::I

cioso_~As enzimas de adição de meri1parecem acatar ordens tos marcadores epigenéticos estão em fluxo constante. Quan-
de um outro local. do uma seção de cromatina se condensa, o silêncio pode se
Faça um zoam em um cromossomo e constate que ele não alastrar ao longo do cromossomo até que atinja uma barreira.
é um entrelaçamento casual de DKA Icomo normalmente é Um verdadeiro esforço de guerra é travado entre as regiões
desenhado), tampouc~ um objeto único, mas uma montagem ativas e silenciosas do cromossomo. Issa considera que essa
dinâmica de DNA, proteínas e outras moléculas. Esse agru- luta poderia explicar por que o risco de câncer invariavelmen-
pamento com aparência filamenrosa, denominado cromatina, te aumenta com a idade. Talvezas barreiras nos cromossomos,
faz mais que apoiar o DNA. Também controla o acesso a ele. que separam porções fortemente condensadas, altamente
A cromatina contém t>~ e proteína, a maior parte na metiladas e silenciadas de porções ativas, acessíveis e não
forma de histonas, que são a resposta da Natureza à questão: metiladas, fragmentam-se com o passar dos anos devido à di-
Como uma célula consegue encaixar 1,8metro de DNA den- visão ou ao envelhecimento das células.
tro de seu núcleo? Resumindo, empacotamento engenhoso. As partes mais obscuras do genoma são ainda pouco com-
O DNA se enrola em carretéis da histona para formar uma preendidas. Mas é bastante evidente, enfatiza Carmen
corrente como a de um rosário, que então é retorcida forman- Sapienza, da Temple University, que o "Human Genome
do um pacote lV€Tilustração na pág. oposta). Seções de Project foi apenas o início do trabalho. Precisamos produzir
cromatina podem se condensar e se expandir independente- agora uma descrição similar do cenário epigenético". Em ou-
mente, escondendo de vista, com eficácia, áreas inteiras de tubro, a Epigenomics e o Wellcome Trust Sanger Institute, da
DNA, enquanto expõem outras seções para transcrição. Inglaterra, se encarregaram de fazer somente isso, ao lançar

"Háumuniversototalmentenovo, ,.
paraoqueestávamoscegos.E muitoempolgante
As fêmeas, por exemplo, iniciam a vida com dois um projeto de cinco anos, o Human Epigenome Project, para
cromos somos X ativos; os homens herdam só um. O em- mapear todos os pontos de metilação doDNA. O consórcio
brião da fêmea deve amordaçar o X extra para impedir que também anunciou a finalização de um mapeamento de mais
suas células recebam uma dose dupla dos genes X. Para tan- de 100mil marcadores metil acoplados ao principal complexo
to, duas partes da máquina genômica conspiram para de histocompatibilidade, uma seção do cromossomo 6 rela-
desativar a terceira. Um gene não codificador denominado cionada a muitas doenças.
Xist produz um RNA ativo que reveste o cromossomo X A nova visão da máquina genômica é estimulante por-
desnecessário. Enquanto isso, o X necessário produz RNA que abre caminhos para a engenharia genômica. Aqueles 30
"anti-senso", que age como um antídoto para proteg&..;lodo mil ou mais genes codificadores de proteínas, tão importan-
Xist. Uma reação em cadeia se dissemina pelo cromossomo tes e, no entanto, tão imutáveis, não são o único conjunto de
indesejado: metilas marcam grande parte do DNA, as instruções ao qual as células se referem. O DNA não-
histonas repelem o acetil químico de seus radicais e a codificador é importante. Anexos químicos ligados ao DNA
cromatina se compacta em uma massa inacessível, revestida e às histonas também, assim como o formato da cromatina.
por RNA. O cromossomo X silenciado é então passado como E todos estão sujeitos a manipulação. "Há um novo e inteiro
herança, de forma inativa, a cada célula portadora de genoma universo ali, que não podíamos discernir", considera Bestor.
enquanto a mulher se desenvolve. "É muito empolgante." ~
O papel das histonas nesse drama não está claro, mas estu-
dos recentes demonstram que as terminações protéicas que se W Wayt Ç-ibbsé escritor.
projetam dos carretéis de histona podem ostentar uma quan-
tidade impressionante de adições químicas. PARACONHECER
MAIS
A cromatina silenciosa e compacta não apresenta, geral- The Epigenome: Molecular Hide and Seek. Organizado por Stephan Beck e
mente, grupos acetil nas posições especiais. Pelo contrário, Alexander Olek.Wiley, 2003.
freqüentemente tem grupos metilaacoplados em diversos pon- Controlling the Double Helix. Gary Felsenfeld e Mark Groudinein na Nature,
tos nas terminações histona. As histonas também hospedam Vol. 421, págs. 448-453; janeiro 23, 2003.

The Callipyge Locus: Evidence for the Trans Interaction of Reciprocally


grupos fosfato e o peptídeo ubiquitina - e todos esses radicais
Imprinted Genes. Michel Georges, Carele Charlier e Noelle Cockett em Trends
surgem em uma desconcertante variedade de locais e combi- in Genetics,Vol.19,N°5, págs.248-252;maio,2003. .
nações. Não será fácil deficrar o código da histona. Resumos de pesquisas recentes, listagens de genes "imprint" e outras infor-
Diferentemente do código genético estável do DNA, mui- mações sobre epigenética estão disponíveis on-line no geneimprint.com

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