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ISSN 1980-3540

Volume 18 • No 1 • 2023

Conceitos em Genética
Genética e Sociedade
Na Sala de Aula
Materiais Didáticos
Resenhas
Um Gene
Índice
Conceitos em Genética
Viroide – um RNA parasita......................................................................................................1
Tiago Campos Pereira, Danyel Fernandes Contiliani

Genética e Sociedade
Biológico e social andam juntos: como a genética pode nos ajudar a entender
a complexidade da constituição de sexo/gênero.....................................................................7
Carolina Moraes Martins de Barros, Maíra Batistoni e Silva

Na Sala de Aula
A história evolutiva dos cetáceos: um modelo para o ensino de ancestralidade
comum e classificação biológica em uma sequência de ensino investigativa.........................15
Larissa Rocha de Carvalho, Ana Clara Chromeck da Silva, Giovanna Civitate Bastos, Rebeca Jacinto Bonfim,
Igor Augusto Bonifácio Santana, Daniela Lopes Scarpa, Maíra Batistoni e Silva

Materiais Didáticos
Uno das bases nitrogenadas: recurso didático para o ensino
do emparelhamento de bases e mutações pontuais..............................................................31
Ana Thaila Rodrigues Felix, Priscila Barreto de Jesus
Será que tem um pintinho?
Uma aula prática para desvendar os segredos do ovo de galinha..........................................46
Larissa Ferragute Gouveia, Igor Buzzatto Leite, Thaís Metzker Pinto, Jórdan Fares Sampar,
Carolina Stefano Mantovani, Lúcia Elvira Alvares
Uso de ferramentas online no estudo de mutações...............................................................59
Monica Laner Blauth, Maria Helena Romano Santin, Rafael Martins dos Santos
Um monge no jardim.............................................................................................................71
Adauto Lima Cardoso, Ana Carolina Guedes Pedreira, Ana Carolina Milos Alves da Silva, Ariana Musa de Aquino,
Arthur Gasparindo Moreira, Ciro Hugo Elnatan de Souza Santos, Gabriela Larissa Lima da Silva, Larissa Baldo Vieira,
Layla Nechy Rodrigues dos Santos, Maiara Ribeiro Cornacini, Renato de Oliveira Neves, Solange Rivas, Vitor Luiz da Silva

Resenhas
Paper Models: um recurso pedagógico acessível para o ensino
da estrutura de ácidos nucleicos e proteínas.........................................................................80
Renato Massaharu Hassunuma, Luan Ednelson Soares Garcia, Giovanni Augusto Lima de Oliveira,
Patrícia Carvalho Garcia, Michele Janegitz Acorci-Valério, Marjorie de Assis Golim, Sandra Heloisa Nunes Messias
Heather Dewey-Hagborg: arte contemporânea, biopolítica e genética.................................82
Paula Fernandes Tavares Cezar-de-Mello

Um Gene
Dsup: um gene de tardígrado associado à tolerância à radiação............................................84
Vitor Nolasco de Moraes, Danyel Fernandes Contiliani, Tiago Campos Pereira
CONCEITOS EM GENÉTICA Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Viroide –
um RNA parasita

Tiago Campos Pereira1,2, Danyel Fernandes Contiliani2,3


1
Departamento de Biologia, FFCLRP, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP
2
Programa de Pós-Graduação em Genética, FMRP, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP
3
Instituto Agronômico de Campinas, IAC, Ribeirão Preto, SP
Autor para correspondência - tiagocampospereira@ffclrp.usp.br

Palavras-chave: viroide, ribozima, RNA, patógeno, fitopatologia, agente subviral

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 1


CONCEITOS EM GENÉTICA Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

O viroide é uma molécula RNA ímpar na biologia devido a um conjunto de propriedades


incomuns: ele é de simples fita, porém se estrutura como uma dupla fita; alguns deles pos-
suem atividade catalítica; é capaz de ser replicado pela célula hospedeira e causar doenças em
plantas e fungos. Assim, o viroide é um patógeno de RNA, e os genomas de alguns deles não
possuem genes. Esses organismos incomuns são muito menores e mais simples que os vírus
sendo, portanto, denominados agentes subvirais. Neste trabalho, veremos como eles conse-
guem causar doenças mesmo sendo desprovidos de genes.

O que são anos, publicou um conjunto de artigos a res-


peito do patógeno causador do afilamento
patógenos? do tubérculo da batata, uma doença que afe-
tava a produção dessa espécie vegetal. Seus
Patógenos são organismos causadores de estudos apresentavam algo até então desco-
doenças. Diversas classes de patógenos são nhecido pela ciência – o agente etiológico Agente etiológico -
descritas, sendo as mais familiares: (a) or- da doença era muito menor e mais simples organismo causador de doença;
ganismos eucariontes multicelulares (por que os vírus. O organismo causador dessa o mesmo que patógeno.
exemplo, o platelminto Taenia solium, cau- enfermidade era desprovido de camada lipí-
sador da cisticercose); (b) organismos euca- dica e até mesmo de um capsídeo proteico;
riontes unicelulares (por exemplo, a levedura ele era composto somente por uma molécula
Cryptococcus neoformans, causadora da crip- de RNA. Apenas isso. Theodor criou o ter-
tococose); (c) organismos procariontes (por mo viroide (oide - semelhante) para designar
exemplo, a bactéria Yersinia pestis, causadora essa nova classe de patógenos, similares aos
da peste bubônica) e (d) vírus (por exemplo, vírus por serem acelulares e extremamente
o vírus da Febre Amarela, causador da Febre diminutos, porém distintos deles por serem
Amarela). As três primeiras classes compar- destituídos de proteínas.
tilham o fato de serem organismos consti- Os viroides são moléculas de RNA de fita
tuídos por células. Por sua vez, os vírus são simples, de 246 a 434 nucleotídeos de exten-
entidades acelulares e podem ser interpreta- são. Curiosamente, devido ao elevado grau
dos como parasitas intracelulares obrigató- de complementaridade interna da cadeia de
rios, submicroscópicos, compostos por ácido RNA (i.e., sequências de nucleotídeos que
nucleico, proteína e, dependendo da família são complementares entre si dentro da mes-
viral, com presença de envelope lipoproteico. ma cadeia), os viroides apresentam estrutura
Há outras classes menos conhecidas de pa- semelhante a uma dupla fita de RNA qua-
tógenos, entre elas os príons, que são estru- se-perfeita (Figura 1). Seu tamanho pode
turalmente ainda mais simples que os vírus, variar de 50 nanômetros (nm), quando con- Nanômetro - a milionésima
compostos exclusivamente por proteína (vide siderado como dupla fita, ou 100 nm quando parte do milímetro.
artigo O gene PRNP codificador da proteína observado como simples fita, linearizado.
Linearizado - em biologia
príon e o mal da vaca louca, Genética na Esco- Todos os viroides descritos infectam apenas molecular, o termo aplica-se a
la, v.13, n. 1, 2018) e os viroides, compostos plantas (por exemplo, o tomateiro, o coquei- uma molécula que previamente
exclusivamente por RNA. ro, a pereira, a macieira, a videira, o pesseguei- era circular, porém devido a um
ro e o abacateiro) e fungos (como a levedura corte em sua cadeia tornou-se
linear, apresentado assim duas
Saccharomyces cerevisiae). Eles são transmiti-
Viroide – um dos por pulgões, pequenos insetos que se ali-
mentam da seiva, ou durante o manuseio das
extremidades.

RNA patogênico plantas (por exemplo, instrumentos de poda


usados em uma planta contaminada). Até o
Em 1971, o pesquisador suíço-americano momento, nenhum viroide foi identificado
Theodor Otto Diener, atualmente com 101

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em animais. Contudo, ressalta-se que o vírus trutura em dupla-fita, e com mecanismos de


da hepatite Delta, que afeta humanos, possui replicação similares.
algumas curiosas semelhanças com viroides:
pequeno genoma de RNA, circular, com es- Afinal, como uma molécula de RNA pode se
replicar?

Figura 1.

Um RNA replicável A estrutura do genoma de


um viroide. O genoma do
viroide do tubérculo afilado
No contexto celular, o DNA nuclear é replicado antes da mi- da batata (PSTV) possui 359
tose por enzimas conhecidas como DNA polimerases. Por sua nucleotídeos (sequência dentro
da caixa preta), constituindo
vez, as moléculas de RNA mensageiro, transportador e ribos-
um dos menores genomas
somal não são duplicadas, pois a célula não possui um sistema conhecidos. Devido ao alto
de replicação para essas classes de RNAs. Como, então, a mo- grau de complementaridade
lécula de RNA do viroide consegue se multiplicar na célula? entre as bases de sua cadeia
nucleotídica, este RNA
Algo muito especial ocorre para a replicação dos viroides. Eles de simples fita emparelha
são copiados por meio de uma atividade não convencional da consigo mesmo, formando
uma estrutura semelhante a
enzima RNA polimerase II (RNAPII). Relembrando, a RNA um RNA de dupla fita quase
polimerase II é uma enzima que se liga ao DNA (aos genes, perfeitamente emparelhado
mais especificamente) e sintetiza moléculas de RNA mensa- (imagem do meio). Esse
geiro (mRNAs), processo esse denominado de transcrição gê- emparelhamento interno pode
ser visto em detalhe na imagem
nica. Entretanto, acredita-se que o RNA do viroide seja capaz
inferior. As regiões que parecem
de recrutar a RNAPII e alterar sua função, para que ela realize bolhas representam as regiões
a replicação dele (sintetizando uma molécula de RNA com- sem complementaridade
plementar ao viroide, denominada de fita negativa) (Figura 2). interna. As imagens do meio e
Por sua vez, a fita negativa serve como molde para a mesma inferior foram geradas a partir
do software online RNAfold
enzima RNAPII fazer cópias do viroide (convencionalmente (http://rna.tbi.univie.ac.at/cgi-
designado de cópias de fita positiva). bin/RNAWebSuite/RNAfold.
cgi) com a sequência original
Essa replicação ocorre de uma maneira bem curiosa, denomi- do PSTV.
nada de círculo rolante. Isto é, o genoma do viroide serve como
um molde ‘circular’, sobre o qual a RNAPII fica dando voltas
Concatâmero - estrutura ininterruptamente, gerando uma longa cadeira multimérica
Multimérica - estrutura
composta por várias cópias de de viroides (Figura 2). composta por várias cópias de
uma mesma unidade básica,
uma mesma unidade básica.
todas elas dispostas em E, então, como esse concatâmero é cortado em unidades do
sequência linear e de maneira
viroide?
consecutiva.

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Figura 2.
O mecanismo de replicação
do viroide por círculo
rolante. Convencionalmente,
o viroide é designado de fita
(ou polaridade) positiva (+).
Apesar de ter alto grau de
complementaridade interna, por
questões didáticas, ele é aqui
representado simplesmente
como um círculo. No núcleo, ele
é replicado pela RNAPII, enzima
essa que se liga ao viroide
(representado como um círculo
vermelho), e percorre toda sua
extensão ininterruptamente
(tal como se estivesse rolando
pelo círculo), gerando uma
longa cadeia de RNA (em azul)
com diversas cópias (isto é,
multimérica) de polaridade
negativa (-). É importante
ressaltar que parte da cadeia
azul está perfeitamente
emparelhada com a vermelha,
formando um RNA de dupla fita
(dsRNA) perfeito (duas regiões
circulares lado a lado). A cadeia
multimérica (concatâmero) é
então clivada nas unidades
fundamentais (isto é, no
tamanho do próprio genoma
do viroide, o monômero) por

Um RNA catalítico meio da atividade catalítica


de corte do próprio RNA
(ribozima). Estes monômeros
Neste momento, outra característica de alguns viroides mere- de polaridade negativa são
ce comentário: alguns deles possuem atividade catalítica, isto então circularizados por
uma ligase celular e então
Monômero - a unidade básica é, são enzimas de RNA. Em sua ampla maioria, as enzimas
submetidos ao processo de
de uma estrutura repetitiva, tal celulares são proteínas; entretanto, há alguns poucos exemplos replicação de círculo rolante
como a de um polímero. de enzimas de RNA, designadas de ribozimas. Os viroides são novamente, para gerar as cópias
exemplos de ribozimas. monoméricas originais (de
polaridade positiva) do viroide.
Assim, alguns viroides são capazes de realizar o corte da ca- Nota-se, portanto, que todo
deia multimérica em monômeros, por meio de sua atividade esse processo de replicação
apresenta simetria entre as fitas
Clivagem - corte. Em biologia catalítica de clivagem. Em seguida, esses monômeros são cir- positiva e negativa. Imagem
molecular, o termo geralmente cularizados por meio da atividade de enzimas convencionais baseada em Clark, D.P. e
se refere ao corte realizado, da célula, tais como a DNA ligase (por meio de uma atividade colaboradores, 2019.
por enzimas, em sequências não convencional de ligar RNAs) ou da tRNA ligase.
nucleotídicas, de aminoácidos
ou outras biomoléculas. É necessário esclarecer que nem todos os viroides possuem
essa atividade de ribozima. Há a hipótese de que outras en-
zimas celulares, tais como a RNase III, realizem a clivagem
Circularizado - em biologia
molecular, o termo aplica-se a
daqueles viroides que não forem catalíticos.
uma molécula que previamente
era linear, porém, devido à
Depois das análises anteriores, ainda pode se fazer a seguinte
ligação das duas extremidades pergunta: Considerando-se um genoma tão pequeno, afinal,
de sua cadeia, tornou-se quantos genes o viroide possui?
circular.

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Um genoma vidos de genes. Um genoma com zero gene.


Isso leva a outra pergunta: Como, então, o
desértico viroide é capaz de causar uma doença?

É importante ressaltar que o viroide e o seu


genoma são, na verdade, a mesma entidade, Um acidente
uma mesma coisa. Em resposta à pergunta
anterior, de maneira extraordinária, os vi-
de percurso
roides não possuem genes codificadores de Alguns vírus possuem RNAs de dupla fita
proteínas! Esses dois aspectos reforçam a na- (dsRNAs) como materiais genéticos, ao pas-
tureza singular do viroide na biologia. so que os RNAs celulares são tipicamente de
simples fita. Essa diferença é a base de um
Conforme exposto anteriormente, alguns
sistema de defesa celular contra vírus. Isto
viroides possuem atividade de ribozima.
é, quando uma célula hospedeira identifica
Nesse sentido, pode-se argumentar que tais
dsRNAs em seu interior, ela os fragmen-
viroides possuem um único gene codificador
ta (por meio de uma enzima denominada
para um RNA funcional – a ribozima. Por
Dicer) e usa os segmentos gerados para re-
sua vez, os demais viroides que não possuem Patogênese - modo como
conhecer, por complementaridade, demais um agente patogênico
atividade de ribozima são genomas despro-
RNAs do vírus (Figura 3). causa uma doença.

Figura 3.
O mecanismo de patogênese
do viroide. Durante sua
replicação, os viroides geram
RNAs de dupla fita (dsRNAs)
perfeitos, os quais são
reconhecidos pela célula, e
processados em pequenos
fragmentos pela enzima Dicer,
denominados pequenos RNAs
de interferência (siRNAs).
Os siRNAs constituem os
complexos celulares RISC,
os quais identificam (por
complementaridade) e tentam
clivar os demais RNAs derivados
do viroide (setas tracejadas
1). Entretanto, alguns siRNAs
viroidais (regiões em verde)
apresentam complementaridade
parcial com RNAs mensageiros
da célula vegetal, levando ao
corte e destruição acidental
dessas moléculas (seta tracejada
2). A redução destes mRNAs
do hospedeiro resulta nos
Entretanto, no caso dos viroides, algo ines- as regiões complementares dos mRNAs da sintomas e está envolvida com o
perado ocorre. Os fragmentos derivados do célula vegetal, resultando na destruição aci- desenvolvimento da doença em
si. Imagem baseada em Wang,
viroide apresentam complementaridade par- dental destas moléculas (Figura 3). Assim, M.B. e colaboradores, 2004.
cial com RNAs mensageiros da célula, per- os mRNAs atingidos se tornam incapazes de
mitindo o emparelhamento de bases entre gerar os seus produtos de maneira suficiente,
tais moléculas. Portanto, uma vez que esses inviabilizando suas funções biológicas. Esse
fragmentos se associam ao complexo ribo- evento, por sua vez, leva ao surgimento de
Complexo
nucleoproteico RISC (do inglês, complexo sintomas típicos de doenças viroidais, tais ribonucleoproteico -
induzido por RNA) ele é encaminhado até como a redução de tamanho de estruturas da agregados moleculares
formados por RNA e proteínas.

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planta, ondulação das folhas, alterações na FLORES, R.; NAVARRO, B.; DELGADO, S.;
casca, clorose e deformação de tubérculos, SERRA, P.; DI SERIO, F. Viroid pathogenesis:
a critical appraisal of the role of RNA silencing
frutos e flores. Portanto, em síntese, ao tentar in triggering the initial molecular lesion. FEMS
combater o viroide, a planta acaba destruin- Microbiol Rev. v. 44, n. 3, p. 386-398, 2020.
do alguns de seus RNAs, levando à doença. Clorose - redução anormal da
CLARK, D.P.; PAZDERNIK, N.J.; MCGEHEE, produção de clorofila em folhas
Por fim, é relevante destacar que os viroides M.R. Molecular Biology (Third Edition). Chapter vegetais, deixando-as amarelas
24 - Viruses, Viroids, and Prions. Academic Cell, ou brancas.
da família Pospiviroidae se replicam no nú-
p. 749-792, 2019.
cleo (por meio da RNAPII, tal como descri-
to anteriormente) ao passo que os viroides
da família Avsunviroidae se multiplicam no
cloroplasto (por meio de outra RNA po-
limerase, que atua nessa organela). Diante
disso, levanta-se a hipótese de que outros
mecanismos moleculares de patogênese exis-
tam, tal como a interação do RNA do viroide
com genes no núcleo ou no genoma do clo-
roplasto, alterando a expressão dos mesmos,
resultando assim nos sintomas observados.

Conclusões
Os viroides estão entre os parasitas estru-
turalmente mais simples conhecidos pela
ciência. Viroides são seres vivos? Essa é uma
pergunta difícil de ser respondida, princi-
palmente pelo fato de não possuirmos, no
presente, uma definição universalmente
aceita sobre o que é vida. Entretanto, consi-
derando-se o fato de que viroides possuem
material genético, são replicados dentro da
célula, sofrem mutação e passam por seleção
natural, os pontos a favor de seu status como
vivos são relevantes. A eventual identificação
dessa classe de RNAs parasitas infectando
outros grupos (arqueias e animais), assim
como a compreensão a respeito da origem
dos viroides e sua correlação filogenética com
os vírus e as células, constituiriam descober-
tas marcantes.

Para saber mais


NAVARRO, B.; FLORES, R.; DI SERIO, F. Advanc-
es in Viroid-Host Interactions. Annual Review of
Virology, v. 8, p 305-325, 2021.

WANG, M.B.; Bian, X.Y.; WU, L.M. et all. On the


role of RNA silencing in the pathogenicity and
evolution of viroids and viral satellites. Proc Natl
Acad Sci USA, v.101, n.9, p. 3275-80, 2004.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6631365/

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GENÉTICA E SOCIEDADE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Biológico e social andam


juntos: como a genética
pode nos ajudar a entender
a complexidade da
constituição de sexo/gênero

Carolina Moraes Martins de Barros1, Maíra Batistoni e Silva2


1
Programa de Pós-Graduação Interunidades de Ensino de Ciências da Universidade de São Paulo
2
Laboratório de Pesquisa em Práticas Científicas e Epistêmicas no Ensino de Ciências,
Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, SP

Autor para correspondência – carolina.moraes.barros@usp.br


Palavras-chave: sexo/gênero, cariótipo, determinação sexual, tema gancho

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A participação de mulheres no esporte veio junto com a regulação dos corpos, ou seja, a defi-
nição de características que servem para identificar o que é masculino ou feminino e a tenta-
tiva de adequar as pessoas, especialmente mulheres, nessa classificação. Nesse contexto, um
caso emblemático é o da atleta María-José Martinez Patiño, uma mulher que foi banida das
competições esportivas por apresentar cariótipo XY, ainda que não possuísse características
físicas ou genitais associadas aos corpos masculinos. Usamos esse caso como motivador para
discutir quais são as bases genéticas para a determinação e a diferenciação sexual, além dos
cromossomos X ou Y, e como esses conceitos podem ser usados como temas gancho para
reflexões na educação básica.

Como olhar para um olhar que já é defendido por filósofas


da ciência e pesquisadoras das questões de
sexo/gênero pela gênero. Ao invés de pensarmos sexo e gêne-
ro separadamente, olharmos para eles como
ótica da Biologia uma dualidade, sexo/gênero. As expressões
de gênero são moduladas pelo que é enten-
Costumamos ouvir ou dizer que a identi- dido socialmente como sexo - olhando pela
dade de gênero se constrói para além dos visão da biologia, isso é simples de se en-
limites da biologia. Usualmente, faz-se uma tender. A novidade dessa interpretação dos
separação entre o que é sexo e entre o que é conceitos é compreender que as concepções
gênero: o primeiro, uma construção bioló- sobre gênero também influenciam, bioló-
gica; o segundo, uma construção social. No gica e fisicamente, os corpos de cada um
entanto, essa separação dicotômica pode dos sexos. Assim, é impossível desvincular
fazer com que gênero não seja um objeto um do outro e, o tempo todo, o que esta-
recorrente das aulas de biologia, somente mos olhando é sexo/gênero: a identidade
sexo. de gênero se constrói também nos limites
da biologia, como sexo se constrói também
Queremos trazer a proposta de um outro para além desses limites. Essa interação está
olhar, como biólogas, para esses conceitos; representada na Figura 1.

Figura 1.
Representação de como sexo
e gênero interagem ao longo
do desenvolvimento para
determinar a sua expressão no
indivíduo. Adaptado de Regitz-
-Zagrosek (2012).

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As expressões de sexo/gênero variam em cada tir na categoria feminina, com o argumento


indivíduo, mas socialmente há uma pressão de que deveriam garantir que todas as atletas
para se atender às expectativas do que é fe- competissem em igualdade, considerando
minino e do que é masculino. As pessoas só suas condições físicas. Em 1936, nas Olim-
são compreendidas como pessoas a partir de píadas de Berlim, houve o primeiro caso
leituras externas de seus corpos como corpos em que o sexo de uma das competidoras foi
sexuados. Nas discussões sobre sexo/gênero, questionado por uma concorrente, acarre-
a complexidade para formação da identidade tando a necessidade do COI se posicionar
de gênero é bastante abordada, mas a forma- oficialmente quanto à regularidade da par-
ção de sexo é retratada como uma etapa mais ticipação da atleta, após conduzir exames
trivial da questão. Queremos mostrar, a par- médicos. Nos anos seguintes, em diferentes
tir da análise de um caso emblemático, como eventos, outras atletas foram contestadas,
a complexidade das expressões corporais de especialmente as que apresentavam caracte-
sexo/gênero já começam desde a própria rísticas físicas consideradas masculinizadas.
determinação biológica (e genética) de sexo,
pois essa pode ocorrer em um espectro de A constante ocorrência desses casos, ao
variação e nem sempre em uma divisão exata longo do tempo, levou o COI, em conjunto
entre o que é masculino e feminino - e isso com a Federação Internacional de Atletismo
influencia na percepção social dos corpos que (IAAF), a propor uma política obrigatória de
destoam do que é esperado. averiguação de sexo para as atletas que plei-
teavam vagas nas categorias femininas. Para

Diversidade de participar das competições, era necessário


que a atleta possuísse uma carteirinha que
corpos no esporte: atestasse que havia sido reconhecida como
mulher pelos órgãos oficiais esportivos. Na
o que a genética década de 1960, foram usados como crité-
rios os aspectos físicos externos das atletas
tem a ver com isso? participantes. A comissão médica do COI
analisava as atletas nuas, enfileiradas, avalia-
A inserção de mulheres no esporte, em even- va suas genitálias e as submetia a um exame
tos oficiais, aconteceu de maneira tardia. A ginecológico. Isso, claro, foi considerado uma
primeira edição dos Jogos Olímpicos da Era enorme violência e humilhação. O número
Moderna ocorreu em 1896, quando a parti- de reclamações e posicionamentos oficiais
cipação feminina não foi autorizada. Atletas das atletas e suas delegações contra esse tipo
e ativistas se posicionaram contra a decisão de averiguação fez com que o COI precisasse
do Comitê Olímpico Internacional (COI) buscar uma maneira alternativa de testagem
da época, levando à inclusão de mulheres dessas mulheres. Assim, em 1968, os crité-
na segunda edição dos Jogos Olímpicos, em rios precisaram ser alterados e foi então que,
1900. A participação feminina com certe- explicitamente, entraram os conhecimentos
za foi uma vitória, mas iniciou de maneira advindos da genética.
tímida: dos cerca de 900 atletas mundiais,
somente 22 eram mulheres, que só podiam A decisão do COI foi que todas as atletas
participar em duas modalidades, golfe e da categoria feminina precisavam passar por
tênis. Foi só no pós-segunda-guerra que a um teste para identificar a presença de dois
participação feminina se tornou mais repre- cromossomos X. Nessa análise, buscava-
sentativa e todas as modalidades puderam -se averiguar ao microscópio a presença da
ser acessadas por atletas mulheres, mas, até cromatina sexual (um dos cromossomos X
hoje, ainda não houve nenhuma edição com fica inativado e condensado), o que só ocorre
a mesma proporção de atletas das categorias quando há cromossomos X em dose dupla,
masculina e feminina. ou seja, em pessoas com cariótipo XX. Em
pessoas com cariótipo XY não há esse cro-
Com o aumento das mulheres participantes, mossomo mais condensado, pois o único cro-
criou-se um problema para as entidades es- mossomo X permanece ativo e descondensa-
portivas: definir quem estaria apta a compe- do. As diferenças entre os cromossomos X e

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Y podem ser observadas na Figura 2. O teste conclusivos ou não considerados adequados


para avaliar a presença da cromatina sexual à categoria feminina, a atleta era submetida Esfregaço bucal - método de
era realizado por coleta de amostra por meio a uma bateria de exames mais aprofunda- coleta de células epiteliais da
bochecha, a partir de cotonete.
de esfregaço bucal, seguida da aplicação em dos, determinados caso a caso pela comissão Após coleta, o material é
lâmina e posterior avaliação em análise mi- médica do evento, mas sem um parâmetro colocado sobre lâmina de vidro
croscópica. Caso os resultados fossem in- preestabelecido em regulamento. para exame microscópico.

Figura 2.
Cariótipo humano, incluindo
os cromossomos X e Y, obtido
a partir de metáfases mitóticas
após cultura de linfócitos
de sangue periférico. Já no
núcleo interfásico, quando há
cromossomos X em dose dupla,
um deles fica mais condensado,
pois está inativado, formando
a cromatina sexual, que pode
ser visualizada após esfregaço
de células da mucosa oral.
O processo de inativação de
um dos cromossomos X em
indivíduos com dois X permite
que haja compensação da dose
da expressão dos genes do
cromossomo X em relação ao
cromossomo Y, que é menor
que o cromossomo X, e não
possui muitos dos genes que
estão presentes no cromossomo
X. Fonte: WikiMedia Commons,
cortesia do National Human
Genome Research Institute.

O caso da atleta po, o que a desqualificava para competir na


categoria feminina.
que desafiou o A atleta realizou exames mais completos

cariótipo (e o COI) para confirmação, como a análise de carió-


tipo por método de banda-G (Figura 2).
Banda-G - método de
Após dois meses de espera, os resultados
Em 1983, a atleta espanhola María-José Pa- coloração dos cromossomos,
confirmaram os testes preliminares: o carió- muito importante para a análise
tiño se sentia realizada pela classificação para
tipo de Patiño era 46, XY. A atleta conta que, de cariótipo. Já o cariótipo
uma competição de elite do esporte que trei- é uma técnica que inclui a
crescendo, nunca suspeitou que houvesse
nava desde criança: a prova de 100 m com preparação dos cromossomos
nada de diferente em seu corpo. Passou por
barreira. Aos 22 anos, ela viajou para Hel- em uma lâmina para
exames médicos e ginecológicos ao longo dos visualização ao microscópio,
sinki, na Finlândia, para competir pela pri-
anos, possuía vagina e mamas, se considerava seguida da análise do número
meira vez em um campeonato mundial. Lá,
e sempre fora percebida como uma mulher. e da forma dos cromossomos
passou pelos testes de averiguação de sexo presentes em cada célula.
exigidos pela IAAF, recebeu sua carteirinha Apesar dessa reviravolta na sua vida pessoal,
de mulher e correu, fazendo seu melhor Patiño continuava se dedicando ao esporte
tempo pessoal. Dois anos depois, Patiño e estava classificada para competir no Cam-
viajou para Kobe, no Japão, para compe- peonato Nacional de Atletismo espanhol, em
tir nos Jogos Universitários Mundiais. Em 1986. Como era uma competição nacional,
1985, no entanto, sua participação foi bar- as regras de testagem de sexo eram diferentes
rada pela organização do evento: seu teste das previstas pelo COI ou pela IAAF, sem
de análise de cromatina sexual não indicou a a obrigatoriedade de uma comprovação das
presença de dois cromossomos X no carióti- atletas mulheres. No entanto, a delegação de

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Diferenciação Sexual
atletismo espanhola orientou Patiño a se re- Diferenciação Sexual Diferente (DSD), Diferente (DSD) - termo
tirar da prova, declarar que tinha uma lesão e mas que fisiologicamente não teriam vanta- usado para descrever o grupo
se aposentar permanentemente do atletismo. gens no desempenho esportivo, como Patiño. de pessoas que possuem
alterações no desenvolvimento
Ela se recusou, competiu e venceu a prova de Apesar da ampla oposição, o COI e a IAAF típico dos caracteres sexuais,
60 m com barreira. Ao cruzar a linha de che- mantiveram a política de testagem durante algumas das quais podem
gada, com a repercussão de sua vitória, suas as décadas de 1980 e 1990, argumentando dificultar enquadrar o
informações médicas foram vazadas para a que o objetivo não era classificar as pessoas indivíduo no sexo masculino
ou feminino. O termo tem
imprensa. Com a divulgação do resultado em um dos dois sexos, mas impedir que ho-
sido utilizado em substituição
do exame de cariótipo, Patiño foi expulsa mens se passassem por mulheres para conse- a termos mais antigos como
do time de atletismo espanhol, perdeu seu guir vantagens competitivas. Com as críticas, intersexo ou anomalia da
auxílio, a residência para atletas e sua bolsa houve mudanças nos métodos de testagem. diferenciação sexual (ADS),
universitária. Seus recordes a nível nacional Ao invés de cariótipo, passou-se a se realizar por ser considerado menos
estigmatizante.
foram apagados do histórico da modalidade, um teste genético que utiliza uma técnica
como se ela tivesse trapaceado para conquis- mais moderna, a reação em cadeia da po-
Reação em cadeia da
tá-los. limerase (PCR), para avaliar a presença do polimerase - técnica
gene SRY, gene crucial na determinação do biomolecular por meio da
Ainda assim, ela não se conformou e lutou sexo masculino localizado no cromossomo qual moléculas de DNA são
por uma revogação da desqualificação. Pa- Y. Apesar da modernização da técnica, o ob- replicadas sucessivamente, em
tiño não acreditava possuir qualquer vanta- jetivo da testagem continuava a ser a distin-
tubo de ensaio, o que resulta na
gem física e, apesar do resultado de cariótipo, sua amplificação. Essa técnica é
ção genética entre homens e mulheres. baseada no processo pelo qual
defendia que era uma mulher como qualquer ocorre a replicação de DNA
outra, inclusive fisicamente. Nos dois anos naturalmente.
seguintes, a atleta recebeu apoio de ativistas
do esporte e pesquisadores da área médica e,

https://www.sport.es/labolsadelcorredor/wp-content/uploads/2017/08/Maria-Jose-Martinez-Patino001.jpg
após uma intensa investigação, concluiu-se
que seu corpo não possuía sensibilidade à
testosterona. Ou seja, mesmo durante o de-
senvolvimento embrionário, não houve qual-
quer resposta à ação hormonal de andróge-
nos. Efetivamente, apesar de seu cariótipo
XY, seu corpo não respondia à testosterona.
Em 1988, a comissão médica da IAAF au-
torizou-a a retornar às competições - foi a
primeira pessoa a ser requalificada como mu-
lher em eventos esportivos. Porém, devido
ao tempo sem competir profissionalmente,
Patiño não se classificou para os Jogos Olím-
picos de 1992 e sua carreira esportiva termi-
nou. Atualmente, ela é pesquisadora política
e da ciência do esporte, atuando pelos direi-
tos humanos e inclusão esportiva.
O caso de Patiño fortaleceu as críticas à tes-
tagem de sexo, servindo como evidência de
que a comunidade esportiva deveria se opor Andrógenos - hormônios
esteroides associados às
à compulsoriedade desses testes. Os testes de A obrigatoriedade dos testes de sexo perma- características sexuais
sexo, como realizados até então, foram criti- neceu até os anos 2000, quando finalmente secundárias masculinas, dentre
cados inclusive por geneticistas, endocrino- o COI e outras entidades esportivas revoga- os quais o mais conhecido é a
logistas e outros especialistas da saúde. Es- ram a necessidade desse tipo de procedimen- testosterona.
sas pessoas indicavam que os critérios para to. Atualmente, testes de averiguação de sexo
o teste eram excludentes para mulheres que ainda são conduzidos quando há alguma de-
Gônadas - órgãos responsáveis
tinham alterações do desenvolvimento se- núncia de fraude contra uma competidora,
pela produção de células
xual envolvendo suas gônadas e genitália ex- mas não são realizados de forma compulsó- germinativas e hormônios
terna, ou para outras pessoas que possuíam ria em todas as atletas. sexuais.

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A determinação tanto, a medicina utiliza outros termos para


descrever essa determinação, que ocorre por
genética do sexo processos sequenciais em etapas dependen-
tes: a determinação genética do sexo, a de-
e a diferenciação terminação gonadal e, por fim, a diferencia-
ção sexual. Primeiro, acontece a fertilização,
sexual: para além quando o zigoto recebe os cromossomos se-
xuais de seus genitores, o que leva à determi-
do cariótipo nação genética do sexo do embrião. Depois,
ocorre a determinação gonadal, quando ha-
O caso da atleta María-José Patiño, além verá a transformação da gônada bipotencial
de nos estimular a pensar sobre aspectos Gônada bipotencial:
em ovário ou testículo. Após esse processo estágio do desenvolvimento
de cunho social e político para inclusão de de transformação gonadal, estímulos gerados embrionário das gônadas,
diversidade de corpos no esporte, também pela gônada diferenciada, principalmente no qual ela ainda está
desperta a curiosidade sobre um problema hormonais, acarretam o início do processo indiferenciada, ou seja, tem
de cunho genético: quais são os mecanis- o mesmo aspecto tanto nos
de diferenciação sexual, que corresponde à indivíduos do sexo masculino
mos que levam uma pessoa de cariótipo XY diferenciação da genitália externa e de duc- quanto feminino.
a possuir características físicas reconheci- tos internos, levando ao fenótipo final que é
das como características típicas do sexo fe- socialmente compreendido como masculino
minino? ou feminino. Assim, vemos diferentes cama-
Cotidianamente, usamos o termo determi- das para, a partir da determinação genética
nação sexual para descrever um processo am- de sexo, chegar-se à diferenciação sexual:
plo, responsável pelo desenvolvimento de um cromossômica, genética, transcricional e
ser vivo como macho ou como fêmea. No en- hormonal, representadas na Figura 3.

Figura 3.
Esquema de etapas para
diferenciação sexual. Adaptado
de Fausto-Sterling (2012).

A determinação gonadal sempre se colocou SRY, do inglês Sex-determining region on the


como uma questão para estudiosos da gené- Y chromosome (região de determinação se-
tica e biologia reprodutiva, principalmente xual no cromossomo Y) que, na maioria dos
ao se pensar sobre qual seria o evento que casos, define que se desenvolvam testículos.
leva, durante o desenvolvimento embrio- Porém, situações empíricas encontradas na
nário, da gônada bipotencial aos ovários ou medicina mostraram que a presença do cro-
testículos. Na década de 1950, a presença ou mossomo Y não era suficiente para resolver
ausência do cromossomo Y era entendida a questão da determinação gonadal: algu-
como único responsável pela determinação mas pessoas, apesar de possuírem cariótipo
gonadal, conhecimento adquirido a partir 46, XY, não desenvolviam testículo (como
de experimentos com roedores e análises em vimos, por exemplo, no caso da Patiño); ao
humanos. A busca pelo gene no cromosso- mesmo tempo, a ausência do cromossomo Y
mo Y que iniciaria a determinação gonadal também não impedia que algumas pessoas
da gônada bipotencial em testículo se esten- de cariótipo 46, XX apresentassem desen-
deu por 30 anos, até a descoberta do gene volvimento testicular.

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No início do desenvolvimento embrionário, A mudança da gônada bipotencial em ová-


todos os embriões apresentam semelhanças rio ou testículo ocorre por duas vias possí-
em suas estruturas sexuais, por possuírem veis de sinalização: a via FGF9/SOX9 e a
gônada bipotencial e genitália externa indi- via WTN4/β-catenina. Quando há pre-
ferenciada, independente dos cromossomos sença do gene SRY, há inibição da via da
sexuais presentes no cariótipo do embrião. β-catenina, o que estimula a expressão do
O gene SRY, presente no cromossomo Y, é gene FGF9. A expressão deste gene resulta
responsável por iniciar a etapa de determi- na diferenciação testicular e manutenção da
nação gonadal em indivíduos que desenvol- expressão do gene SOX9. Quando há dose
verão testículos, mas esse processo depende dupla de cromossomos X, há também pre-
também de outros genes. A presença ou não sença em dose dupla do gene WNT4, já que
do gene SRY, ainda que fundamental para é um gene presente nesse cromossomo. A
a determinação gonadal, é somente o ponto presença em dose dupla de WNT4 e esti-
de início de uma cascata que, inclusive, de- mula a ação de β-catenina, responsável por
pende de genes ligados ao cromossomo X e inibir a expressão do gene SOX9 e desenca-
genes autossômicos. dear o desenvolvimento dos ovários. Assim,
alterações na expressão dos genes SOX9 e
Exatamente quais são todos esses genes DAX1 podem levar a alterações na deter-
ainda é algo indefinido e desvendar isso é minação gonadal.
um importante campo de investigação, mas
alguns deles já foram descritos e sabe-se que A próxima etapa é quando ocorre efetiva-
são genes que desencadeiam processos an- mente a diferenciação sexual, que está liga-
tes e depois da determinação testicular. Um da a características do fenótipo final desen-
exemplo são os genes DAX1 e WNT4, que volvidas por ação hormonal. Em indivíduos
estão presentes em indivíduos de ambos os com testículos, há a produção de hormônio
sexos, estarem localizados no cromossomos antimulleriano e andrógenos, que vão atuar
X, se apresentando em dose simples em in- na diferenciação das estruturas e tecidos
divíduos que possuem apenas um cromos- ligados ao sistema reprodutor masculino.
somo X e em dose dupla em indivíduos que Nesse caso, a testosterona tem um papel
possuem dois cromossomos X. Em indiví- fundamental: ela atua nos tecidos em re-
duos XY com excesso de expressão gênica ceptores androgênicos que vão desencadear
de algum desses dois genes, pode ocorrer a a formação das estruturas reprodutivas in-
produção de fatores antagônicos para o de- ternas (epidídimo, dutos deferentes, vesícu-
senvolvimento dos testículos, podendo cau- las seminais e próstata) e das estruturas da
sar inclusive “reversão” gonadal e desenvol- genitália externa, levando ao processo que
vimento de ovários, pois a expressão mais é conhecido como virilização. Já em indiví-
alta é similar à de um indivíduo que tem duos com ovário, a via WNT4/β-catenina
dois cromossomos X. estimula a formação dos dutos mullerianos
e produção de hormônios esteroides. Os
Outro ponto que diverge das hipóteses ini- dutos originarão as estruturas reprodutivas
ciais é a descoberta de que genes localizados internas (trompas, útero e canal vaginal) e
nos autossomos também desempenham há, ao mesmo tempo, a formação da genitá-
funções no processo de determinação go- lia externa masculina ou feminina.
nadal. Um exemplo é o gene SOX9, locali-
zado no cromossomo 17. Após a realização No caso da atleta María-José Patiño, me-
de experimentos com camundongos, foi dicamente sua condição é conhecida como
observado que esse gene atua nas gônadas síndrome da Insensibilidade à Testostero-
femininas e masculinas no início do desen- na ou da Insensibilidade Androgênica, na
volvimento embrionário, mas que não se forma completa, conhecida como uma das
expressa nos tecidos femininos ao longo da principais causas da diferenciação sexual
maturação. diferente em pessoas com cariótipo 46, XY.

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Essas pessoas não passam pelo processo las de Ciência e Biologia, como questões de
completo de virilização fetal, o que pode gênero e sexualidade, se torna possível pelo
acontecer quando há falta de receptores uso de temas gancho. Os temas gancho são
periféricos nos tecidos capazes de desenca- conteúdos conceituais tradicionalmente as-
dear uma resposta à ação de testosterona. sociados às aulas de Ciências e Biologia, mas
Isso ocorre em decorrência de mutações no que podem ser motivadores para trabalhar
gene que codifica o receptor androgênico. com outros conceitos, que geralmente estão
Esse gene, conhecido como gene AR (do marginalizados nos documentos oficiais cur-
inglês androgen receptor), está localizado no riculares.
cromossomo X humano. Em pessoas com
mutações que acarretam a perda da função No exposto neste texto, indicamos uma pos-
dos receptores de andrógenos, ainda que a sibilidade de usar o caso da atleta María-José
gônada masculina produza androgênios, os Patiño para trabalhar conteúdos conceituais
tecidos alvo não respondem aos hormônios. mais tradicionais, como cariótipo, determi-
Pessoas com essa condição geralmente se nação de sexo genético, determinação go-
identificam e são identificadas como mulhe- nadal e diferenciação sexual. Usando esses
res, por apresentarem características físicas conteúdos conceituais como motivadores, é
socialmente associadas a esse sexo/gênero. possível estimular discussões e reflexões em
aula sobre a diversidade de corpos existentes
Conhecer todos esses processos é importan- e os estereótipos de gênero que vigoram na
te para entender que, mesmo quando olha- nossa sociedade. É possível, a partir desses
mos para determinação de sexo apenas por temas ganchos, falar sobre identidades de
uma visão estritamente biológica e voltada gênero possíveis e como são constituídas a
para o campo da genética, há uma multipli- partir de um espectro. É também possível
cidade de fatores envolvidos que vão levar a problematizar como argumentos biológicos
diferentes expressões de sexo e a uma varie- podem servir para sustentar preconceitos de
dade de corpos - somente pensar em XX ou gênero ou transfobia e indicar que conhecer a
XY não basta. A complexidade do assunto complexidade da diferenciação sexual e a di-
aumenta quando expandimos essa visão para versidade de corpos como algo natural serve
abarcar outros aspectos biológicos, como as para combater esse tipo de preconceito utili-
interações hormonais e, mais ainda, quando zando também argumentos biológicos, além
levamos em conta aspectos psicossociais. dos sociais; ainda, podem servir para discutir
sexualidade e diferenciar orientação sexual
A determinação de identidade de gênero, um tema bastante
relevante ao se pensar o contexto pessoal de
de sexo e a estudantes da educação básica.

diferenciação Para saber mais


sexual como tema BASTOS, F. “Eu fico meio sem saber como eu vou

gancho para
falar isso, assim do nada”. Currículo, diversidade
sexual e ensino de biologia. In: TEIXEIRA, P.;
DALMO, R.; PESSOA, G. (Orgs). Conteúdos
questões sociais cordiais. Editora Livraria da Física, 2019.

CARAKUSHANSKY, G.; BICA, D.; CARA-


Nos documentos oficiais para se pensar o KUSHANSKY, M. Desordens da diferenciação
currículo de Ciências e Biologia pouco se sexual. In: CAPLAUCH, R. (Org.). Endocrinolo-
fala sobre aspectos sociais ligados a sexo e gia Feminina e Andrologia. Grupo Editorial Na-
gênero. O enfoque é primordialmente tec- cional, 2012.
nicista, voltado a um olhar biológico sobre PATIÑO, M. J. Personal Account: A woman tried and
a reprodução e o desenvolvimento do corpo tested. Lancet, v. 366, p. S38, 2005.
humano. Pensando pela perspectiva des-
WOLFF, D. Políticas de gênero em competições esporti-
ses documentos oficiais, a possibilidade de vas. Monografia para obtenção do título de Ba-
explorar aspectos sociais pertinentes às au- charel em Direito. Uniceub, 2020.

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A história evolutiva dos


cetáceos: um modelo
para o ensino de
ancestralidade comum
e classificação biológica
em uma sequência de
ensino investigativa

Larissa Rocha de Carvalho1, Ana Clara Chromeck da Silva1, Giovanna Civitate Bastos2,
Rebeca Jacinto Bonfim2, Igor Augusto Bonifácio Santana1, Daniela Lopes Scarpa3,
Maíra Batistoni e Silva3
1
Graduando em Ciências Biológicas, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, SP
2
Graduado em Ciências Biológicas, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, SP
3
Departamento de Ecologia, Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, Programa de Pós-Graduação Interunidades
em Ensino de Ciências da USP, SP
Autor para correspondência - ana.chromeck@usp.br

Palavras-chave: ensino por investigação, ensino de ciências, evolução, classificação biológica, cetáceos

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O Ensino por Investigação é uma importante ferramenta para criação de situações pedagógi-
cas em que os estudantes aprendem e exercitam habilidades próprias da atividade científica.
Os cetáceos são um grupo de mamíferos aquáticos cujo registro fóssil documenta a passa-
gem de um ancestral terrestre para o ambiente marinho de forma gradual. O presente artigo
apresenta uma proposta de sequência didática investigativa, na qual os alunos devem utilizar
filogenias, análises morfológicas e seus conhecimentos sobre classificação biológica para re-
solver uma questão-problema sobre a ancestralidade dos cetáceos. Além disso, relatamos a
experiência de aplicação desta sequência didática em uma escola pública, em turmas do 7⁰ ano
em São Paulo.

Objetivos métodos próprios à investigação científi-


ca. Uma sequência de ensino investigativa,
portanto, deve envolver os alunos em um
Este relato objetiva descrever a aplicação de
problema contextualizado, que permita que
uma sequência didática baseada na metodo-
eles levantem e testem hipóteses a partir da
logia de Ensino por Investigação, que tomou
interação com materiais disponibilizados e
a análise de grupos de mamíferos marinhos
da discussão com colegas.
como base para o estudo da ancestralidade
comum. Na literatura da área do ensino de ciências,
há muitas possibilidades de estruturação
Referencial teórico das sequências didáticas investigativas. Nes-
te trabalho apresentaremos uma sequência
No Ensino de Ciências por Investigação, didática que possui dois ciclos de investi-
questões-problema são utilizadas para criar, gação orientados por perguntas distintas.
em sala de aula, situações pedagógicas nas Em síntese, a organização dos momentos
Tabela 1.
quais a resolução implica na aplicação, por da atividade ocorreu conforme o descrito na Organização dos momentos
parte dos estudantes, das ferramentas e Tabela 1. da sequência didática. Fonte:
elaborada pelos autores.
Aulas 1 e 2 Aulas 3 e 4
1° Ciclo - Momento 1 1° Ciclo - Momento 2 2° Ciclo
Proposição Apresentação da questão Apresentação da questão “Por Introdução sobre cladogramas, ancestralidade comum
do problema “O que são mamíferos?” a que as baleias são mamíferos?” a e a justificação de hipóteses a partir de evidências.
partir da apresentação da partir dos critérios elaborados pelos Apresentação das filogenias conflitantes, do Dossiê
diversidade de mamíferos. alunos no momento anterior. de Evidências e a questão “Qual das duas filogenias
apresentadas você acredita que é a mais apropriada?
Justifique com base nas evidências do Dossiê”.
Resolução Grupos de trabalho devem Grupos de trabalho devem Grupos de trabalho devem analisar as informações
do problema buscar as semelhanças entre identificar os critérios elencados disponibilizadas para a elaboração de uma resposta.
os mamíferos apresentados anteriormente nas baleias e Nesta etapa, sugerimos que os professores circulem
para determinar critérios que também as adaptações que estes entre os grupos de trabalho para auxiliar os
definem os mamíferos. animais possuem ao ambiente estudantes na realização da tarefa e para acompanhar
aquático. o andamento da atividade.
Discussão e Discussão e anotação em Discussão e anotação em lousa dos Discussão e anotação em lousa dos consensos da sala,
sistematização lousa dos consensos da sala. consensos da sala, recomenda-se apresentação do que é o consenso científico atual,
coletiva oral que o professor faça apontamentos valorizando os apontamentos feitos pelos estudantes.
quanto à relação entre diversidade
morfológica e adaptação aos
diferentes meios.
Sistematização Elaboração de uma resposta Elaboração de uma resposta final Elaboração de uma resposta final pelos grupos a partir
escrita final pelos grupos a partir de pelos grupos a partir de suas de suas discussões e da síntese coletiva. Entrega das
suas discussões e da síntese discussões e da síntese coletiva. respostas.
coletiva. Entrega das respostas.

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Ao longo da descrição desta sequência didá- • Interpretar árvores filogenéticas e reco-


tica, os momentos mencionados acima serão nhecer, a partir delas, a ancestralidade co-
detalhados. mum, utilizando como exemplo o grupo
dos mamíferos.
A utilização do Ensino por Investigação
como metodologia, bem como a organização Para além dos conteúdos conceituais, o ca-
proposta para as atividades, visa a Alfabeti- ráter investigativo das atividades propostas
zação Científica como objetivo do ensino de exercita habilidades comuns à prática cien-
ciências. tífica, como a análise de evidências e a ar-
gumentação escrita dos estudantes, além do
Os cetáceos, uma ordem de mamíferos ex- trabalho em equipe, que visa estimular a coo-
clusivamente aquáticos, incluem baleias, gol- peração entre alunos.
finhos e botos. Diversas linhas de evidência
sustentam a hipótese de que esse grupo evo- A sequência didática aqui referida foi apli-
luiu a partir de mamíferos terrestres; entre cada em três turmas do sétimo ano de uma
elas o registro fóssil, que documenta a redu- Escola Municipal de Ensino Fundamental
ção de membros posteriores e inferiores de (EMEF) localizada na zona oeste da cidade
ancestrais extintos dos cetáceos atuais. Mui- de São Paulo. Nessas turmas, foram minis-
tas descobertas de fósseis relevantes para a tradas quatro aulas de 45 minutos, dispostas
reconstituição da história evolutiva desse em pares de aulas seguidas (90 minutos), no
grupo ocorreram nas últimas décadas, além contexto de um estágio realizado por estu-
do grupo ser familiar aos estudantes, o que o dantes de licenciatura em ciências biológicas.
torna um tema relevante e atual para investi- As aulas foram realizadas em meio a um mó-
gação em sala de aula. dulo de estudos sobre classificação biológica,
em que os estudantes se encontravam já fa-
A questão-problema que orienta esta se- miliarizados com os critérios utilizados por
quência é “A ocupação do ambiente aquático Robert Whittaker para classificar os seres
pelos cetáceos é uma característica ances- vivos em cinco Reinos.
tral ou derivada?”. Essa questão, no entanto,
Característica ancestral
não é enunciada explicitamente para os es-
tudantes tal como consta aqui. Em cada um 1° ciclo - estado anterior de uma
característica, a partir do qual
dos ciclos de investigação há um problema
contextualizado para ser solucionado com investigativo surgiu uma novidade evolutiva.

Característica derivada
base em dados que serão fornecidos aos es- Proposição e resolução - novidade evolutiva
tudantes; a proposição de uma controvérsia compartilhada por um grupo
do primeiro problema
científica hipotética é utilizada para introdu- de espécies em relação a seu
zir o problema de investigação. Este ciclo investigativo, com duração prevista ancestral.
de duas aulas de 45 minutos, pretende res-
A partir das metodologias utilizadas, ao final
ponder à pergunta: “Por que baleias são ma-
desta sequência didática esperamos que os
míferos?”. Para tal, primeiro os alunos devem
estudantes sejam capazes de:
compreender o que define um mamífero,
• Inferir a existência de parentesco entre para posteriormente justificar a classificação
diferentes grupos de mamíferos, a partir das baleias nesse grupo. A definição de ma-
da análise de características morfológicas mífero é abordada neste primeiro problema
compartilhadas; e a classificação das baleias é contemplada
no segundo problema deste ciclo. Nele, são
• Comparar características morfológicas de contempladas as três primeiras expectativas
mamíferos pertencentes a diferentes am- de aprendizagem, além de mobilizados os
bientes; conhecimentos prévios dos estudantes sobre
o tema.
• Relacionar as características morfológicas
de cetáceos à conquista do ambiente aquá- Em grupos de até cinco estudantes, os alunos
tico; recebem imagens representativas (Figura 1)

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de diversos mamíferos, que permitem visua- “Todos os animais apresentados abaixo


lizar algumas das sinapomorfias ou outras são classificados pelos biólogos como
Sinapomorfias - novidade
características do grupo (pelos, glândulas mamíferos. Observe as imagens e liste evolutiva surgida em um
mamárias, respiração pulmonar etc.). Neste as características que você acha que determinado ancestral e
momento, a tarefa proposta é responder a se- justificam essa classificação.” compartilhada pelos táxons que
guinte questão: dele descendem.

Figura 1.
Animais representantes de
diferentes grupos de mamíferos.
Fonte: compilação dos autores.
Montagem a partir de imagens
coletadas no repositório digital
da Wikimedia Commons.

Discussão e sistematização que a biologia se apoia majoritariamente em


das respostas critérios morfofisiológicos para classificar
seres vivos, para que eles se atenham a esse
Após a resolução em grupos, os alunos são aspecto dos animais apresentados. Mesmo
convidados a compartilhar suas conclusões algumas características que não podem ser
com o grupo-sala. Os consensos da turma diretamente visualizadas, como a respiração
são anotados em lousa para registro e como pulmonar, podem ser inferidas a partir de
referência para os estudantes. Neste momen- caracteres externos com a ajuda de pergun-
to, é importante relembrar com os alunos tas orientadoras, ou talvez já façam parte do

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conjunto de conhecimentos prévios dos es- Proposição e resolução


tudantes. do segundo problema
Além disso, é necessário pontuar aos alunos Após a discussão e seleção de alguns critérios,
que nem todas as características comuns a o professor deve apresentar a baleia como
todos os mamíferos serão exclusivas desse modelo de mamífero. Neste momento, em
grupo, o que remonta ao aspecto hierárquico pequenos grupos, os alunos acessam o segun-
da classificação biológica e à noção de que há do grupo de imagens (Figura 2), contendo
diferentes níveis de parentesco evolutivo entre figuras de cetáceos. A partir dessas figuras, os
os seres vivos. Isso significa que nem todas as alunos devem responder duas perguntas:
características mencionadas serão de interesse
para a investigação, e possibilita a introdu- 1. “Quais das características mencionadas
ção de um critério (comparação com outros na pergunta anterior você consegue iden-
grupos animais) para a seleção de caracteres tificar nos cetáceos?”
de interesse em conjunto com os educandos.
2. “Identifique as características que per-
Com esta atividade, visamos contemplar a pri-
mitem a sobrevivência destes animais no
meira expectativa de aprendizagem.
ambiente aquático.”

Figura 2.
a) Baleia-jubarte (Megaptera
novaeangliae) e seu filhote no
Santuário Marinho Nacional das
Ilhas Havaianas. Fonte: LYMAN,
2012 - disponível no repositório
digital da Wikimedia Commons.
b) Filhote de baleia-jubarte
(Megaptera novaeangliae)
no qual encontram-se
evidentes os folículos capilares
(tubérculos) na região maxilar.
Fonte: MICHAEL, CC BY 2.0 -
disponível no repositório digital
da Wikimedia Commons.

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Espera-se que os estudantes tragam elemen- • O que são essas saliências em torno da boca
tos discutidos no primeiro problema para a da baleia da Figura 2b? Embora baleias
discussão e resolução dessas questões. não tenham pelos abundantes, como
muitos mamíferos, elas possuem pelos
Discussão e sistematização em sua região facial. Esse “bigode” é vi-
do segundo problema sível apenas em algumas espécies, mas é
possível notar folículos capilares que in-
Como no caso anterior, algumas sinapo-
dicam sua presença.
morfias de mamíferos não são visíveis nas
figuras, ainda mais devido à extrema modi- Por meio desta atividade, contempla-se a
ficação de alguns caracteres no grupo dos segunda expectativa de aprendizagem, per-
cetáceos. Aqui, o conhecimento prévio dos mitindo comparar as diferenças que os cetá-
educandos pode ser decisivo para permi- ceos apresentam em relação aos mamíferos
tir uma análise produtiva: a noção de que terrestres (e.g. nadadeiras, cauda). Também
baleias precisam emergir para respirar, que é um importante momento de retomada de
pode ser já difundida entre alunos, é um algumas indagações da atividade anterior:
indicativo de sua respiração pulmonar. Ao a diminuição da quantidade de pelos, por
longo da discussão no grupo-sala, para le- exemplo, parece oferecer alguma vantagem
vantar essas concepções e evitar possíveis no ambiente aquático e, portanto, pode ter
enganos dos educandos ao analisar as ima- sido um fator de seleção; o mesmo vale para
gens, perguntas norteadoras tornam-se es- a narina posicionada dorsalmente. Para fo-
senciais: mentar a discussão no grupo-sala, podem
ser realizadas perguntas norteadoras como:
• Qual hábito está sendo representado na
primeira imagem? Apesar da discussão • Como é o corpo de um nadador olímpico?
centrar-se em torno de caracteres mor- Eles possuem muitos pelos? Nas primeiras
fofisiológicos, o cuidado parental, repre- décadas de 1900, a depilação tornou-se
sentado na Figura 2a, é uma característi- uma prática entre nadadores olímpicos.
ca marcante de mamíferos. Embora seja Nadadores relatam maior sensibilidade à
difícil encontrar imagens de amamenta- água após depilação, e alguns estudos da
ção entre cetáceos, ela pode ser mencio- década de 1980 correlacionam essa práti-
nada como parte do cuidado parental ca à uma diminuição do custo da ativida-
neste grupo; por sua vez, a amamentação de física, que possibilitaria um aumento
é um indicativo indireto da presença de de resistência ao exercício;
glândulas mamárias, uma das caracterís-
ticas definidoras de mamíferos; • O que baleias e outros animais aquáticos (tu-
barões e peixes) têm em comum em relação
• As baleias têm narina? Ao longo da evo- à locomoção? Como é o formato do corpo
lução dos cetáceos, nota-se uma mi- desses animais? O formato alongado e fusi-
gração da narina para o topo da cabeça forme de cetáceos, com a cabeça pouco di-
desses animais, dando origem aos es- ferenciada, torna os corpos desses animais
piráculos, orifícios através dos quais os hidrodinâmicos. Outras características
cetáceos inspiram e expiram, dado que muito importantes para a natação são o
sua respiração é pulmonar. Durante a achatamento dos membros anteriores em
expiração desses animais é formada uma forma de nadadeira, bem como nadadei-
fumaça, resultante da condensação do ar ras não ósseas na região dorsal e a redução
quente do pulmão em contato com o ar dos membros posteriores. Essas caracte-
frio do ambiente. Essa condensação é co- rísticas aproximam visualmente cetáceos
mumente confundida com um esguicho e peixes, o que constitui um exemplo de
de água; convergência evolutiva.
Convergência evolutiva -
processo evolutivo através
do qual espécies pouco
aparentadas desenvolvem
estruturas e formas corporais
semelhantes.

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NA SALA DE AULA Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Ao final deste ciclo investigativo, é espe-


rado que os alunos compreendam que as 2° Ciclo
sinapomorfias de mamíferos são encontra-
das em cetáceos, ainda que de forma ves- investigativo
tigial ou modificada, o que permite clas- Proposição e resolução do problema
sificá-los como pertencentes a essa classe.
Assim, as características morfológicas de O segundo ciclo investigativo tem duração de
cetáceos que os aproximam de peixes ou duas aulas, durante as quais os alunos rece-
tubarões, resultantes de milhões de anos bem uma breve explanação expositiva sobre:
de seleção natural em ambiente aquático, o que é um cladograma e como fazer sua lei-
não significam maior proximidade evolu- tura; o conceito de ancestralidade comum e a
tiva entre esses grupos, mas sim uma con- diferença entre hipóteses e evidências. Para
vergência evolutiva. tal, sugere-se a exposição de um cladograma
esquemático (Figura 3) para auxiliar na repre-
Espera-se, portanto, como resposta para a sentação e entendimento desses pontos-chave.
pergunta central deste ciclo (“Por que ba-
leias são mamíferos?”) a retomada de carac- Em pequenos grupos, os estudantes recebem
terísticas levantadas no primeiro proble- um roteiro de atividades e um dossiê de evi-
ma como justificativas. Entre elas: pelos, dências. No roteiro há duas hipóteses filoge-
glândulas mamárias, respiração pulmonar néticas (Figura 4) para a evolução dos cetá-
etc. ceos dentro de mamíferos, com a pergunta:
Assim, neste momento da sequência didá- “Qual das duas filogenias apresentadas
tica são contempladas a segunda e a ter- você acredita que é a mais apropriada?
ceira expectativas de aprendizagem pro- Justifique com base nas evidências do
postas. Dossiê”.

Figura 3.
Modelos genéricos de
cladogramas sugeridos para
a introdução desta nova
ferramenta gráfica aos alunos.
Cladogramas são diagramas
que representam padrões
de descendência entre seres
vivos. Apesar de diferentes,
os exemplos fornecidos acima
podem ser lidos de acordo com
os mesmos princípios. As pontas
dos ramos (A, B ou C) indicam
espécies atuais; pontos em que
há bifurcação de ramos são
chamados de nós e representam
uma espécie ancestral que
se separou em duas novas
linhagens. O eixo vertical
dos diagramas representa a
passagem do tempo evolutivo,
que varia da base (mais antigo)
às pontas dos ramos (mais
recente). Fonte: KOUPRIANOV,
2006 - CC BY-SA 3.0 -
disponível no repositório digital
da Wikimedia Commons.

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Figura 4.
Hipóteses filogenéticas
concorrentes apresentadas
aos estudantes. Proposta 1
adaptada de Spaulding, O’Leary
e Gatesy (2009), doi: 10.1371/
journal.pone.0007062.

O referido dossiê é um documento contendo:

Figura Conteúdo Tabela 1.


Lista de conteúdos das figuras
As duas filogenias representativas de hipóteses conflitantes, já referidas acima, com um presentes no Dossiê de
Figura 4 balão explicativo sobre a interpretação de suas relações, uma vez que este era o primeiro Evidências. Fonte: Elaboração
contato dos estudantes. dos autores.
Figura 5 Fotografias dos animais que ocupam os terminais da filogenia.
Representação em vista lateral do corpo de uma baleia e esquema do esqueleto de uma
Figura 6
baleia e de uma foca como exemplo de outro mamífero aquático.
Figura 7 Esquema do esqueleto de um cachorro, como exemplo de mamífero terrestre.
Esqueleto e reconstrução do fóssil de Pakicetus sp., um cetáceo extinto com características
Figura 8 nitidamente marcantes do hábito terrestre (a exemplo do tamanho das falanges e membros
posteriores).
Esqueleto e reconstrução do fóssil de Dorudon sp., um cetáceo extinto com características
Figura 9 nitidamente marcantes do início da conquista do ambiente aquático (a exemplo das
modificações dos membros, em especial a redução dos membros posteriores).

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Figura 5.
Animais que ocupam os
terminais das propostas de
cladograma fornecidas aos
alunos. Fonte: compilação dos
autores. Montagem a partir
de imagens coletadas no
repositório digital da Wikimedia
Commons.

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Figura 6.
a) Representação do esqueleto do cachalote
Physeter macrocephalus. Fonte: LYDEKKER,
1894 - disponível no repositório digital da
Wikimedia Commons. b) Representação do
esqueleto de uma foca. Fonte: MEATBIKE,
2019 - CC BY-SA 4.0 - disponível no
repositório digital da Wikimedia Commons.

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Figura 7.
Representação esquemática do
esqueleto de um cachorro em
vista lateral. Fonte: DITTRICH,
1889 - disponível no repositório
digital da Wikimedia Commons.

Figura 8.
a) Esqueleto de Pakicetus
presente no museu de história
natural de Ottawa, Canadá.
b) Reconstrução de Pakicetus
inachus desenhada a lápis e
colorida digitalmente pelo
paleoartista Nobu Tamura.
Disponível no repositório digital
da Wikimedia Commons.

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Figura 9.
a) Esqueleto de Dorudon
atrox no museu Senckenberg
em Frankfurt, Alemanha. b)
Reconstrução de Dorudon sp.
desenhada a lápis e colorida
digitalmente pelo paleoartista
Nobu Tamura. Disponível no
repositório digital da Wikimedia
Commons.

Inicialmente, os alunos realizam a leitura os fósseis relativamente recentes que foram


e compreensão das imagens nos pequenos apresentados.
grupos. Sugere-se que o docente reforce que
os animais presentes na filogenia represen- Ao final da discussão, é feita uma sistemati-
tam grupos maiores e que não contemplam zação oral das hipóteses apresentadas. Neste
a diversidade total de mamíferos. O docente momento, o professor deve explicitar a res-
faz a mediação em atendimentos individuais posta do problema proposto para este ciclo
a cada grupo, a partir de novas questões: de investigação, ou seja, que a proposta 1 é
considerada mais apropriada para refletir a
• O que são estes ossos tão pequenos que ficam história evolutiva de mamíferos. Para isso,
próximos de onde esperaríamos encontrar as o docente deve retomar as evidências for-
pernas das baleias, se elas os tivessem? Eles necidas aos alunos, em especial os fósseis de
parecem ter alguma função? O que eles po- ancestrais de cetáceos (Pakicetus e Dorudon),
dem indicar? que possibilitam reconstituir parcialmente a
transição dos ancestrais deste grupo do am-
• Olhando o esqueleto, você diria que a baleia biente terrestre para o aquático. Além disso,
tem dedos? E a foca? O que isso pode indicar? o professor também pode relatar aos alunos
• O esqueleto da foca é mais semelhante ao da que a hipótese 1 é suportada por outras evi-
baleia ou ao do cachorro? Quais são as seme- dências, além das trabalhadas em sala, e que
lhanças e diferenças? atualmente a sua aceitação constitui um con-
senso no meio científico.
• Quais as principais diferenças entre o Paki-
cetus e o Dorudon? Onde vocês acreditam Por fim, os alunos realizam a sistematização
que esses animais viviam? Qual deles vocês escrita da discussão em sala, revendo suas
acham mais semelhante às baleias atuais? O respostas anteriores e realizando alterações,
que isso indica sobre a origem dos cetáceos? sem, no entanto, apagar os “erros” que supu-
nham ter cometido.

Discussão e Esta etapa permite uma retomada das expec-


tativas de aprendizagem abordadas anterior-
sistematização mente nesta sequência didática, a partir da
análise morfológica dos grupos apresentados
Após a realização da tarefa em grupo, os es-
sob uma perspectiva evolutiva. Além disso,
tudantes compartilham com o grupo-sala as
a interpretação correta da árvore filogenéti-
conclusões às quais chegaram, e realiza-se
ca de mamíferos é necessária para a análise
uma discussão coletiva sobre os conflitos en-
das hipóteses contrastantes apresentadas aos
tre as explicações apresentadas por cada gru-
alunos para explicar a evolução do grupo de
po. Na discussão, pode ser valorizada a ideia
cetáceos, contemplando, assim, a última ex-
de que na ciência as hipóteses são revisitadas
pectativa de aprendizagem esperada.
com o surgimento de novas evidências, como

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Relatos da seja reflexo da familiaridade dos estudantes


com o grupo e com o tipo de atividade aplica-
experiência da. Dado que as turmas estavam em um mó-
dulo sobre classificação dos seres vivos, acre-
e reflexões ditamos que isso também contribuiu para o
bom prosseguimento desta etapa.
posteriores Como proposta de melhoria para esta etapa
Durante a aplicação, pudemos notar alguns da sequência didática, sugerimos uma tarefa
aspectos da sequência didática que funciona- extra, que possibilita a aplicação dos conhe-
ram bem, assim como aspectos que poderiam cimentos construídos na investigação ante-
ser melhorados. Vale ressaltar que o fato de rior em outro contexto. Nesta atividade, os
a aplicação ter ocorrido em turmas de uma estudantes seriam apresentados ao Tubarão-
mesma escola limita o escopo de generaliza- -baleia (Rhincodon typus) por meio de uma
ções quanto ao que será discutido a seguir. imagem (Figura 10) e texto descritivo sobre
Cada contexto possui suas particularidades a espécie. A orientação para o desenvolvi-
e não seria possível elaborar uma atividade mento da atividade seria a seguinte:
universalmente bem-sucedida. “O animal do texto acima pode ser considera-
Notamos que o primeiro ciclo investigativo do um cetáceo? Justifique sua resposta utilizan-
funcionou muito bem, e muitas das respostas do-se dos seus conhecimentos sobre mamíferos
esperadas foram contempladas em falas dos e cetáceos, e compare estes conhecimentos com
estudantes. Durante a primeira atividade, a as informações citadas no texto. A justificativa
maioria dos grupos citou glândulas mamá- será corrigida pelo professor usando os critérios
rias e pelos, e muitos citaram características sumarizados na tabela abaixo. Você pode uti-
reprodutivas típicas de mamíferos e respira- lizá-los durante a elaboração da resposta como
ção pulmonar também. Acreditamos que isso guia do que será exigido.”

Tabela 2.
Critérios para as respostas
esperadas.

Texto (1,0) A resposta é legível e coerente (0,5) A resposta é parcialmente (0,0) A resposta é ilegível OU a
(1,0) legível OU apresenta problemas redação apresenta problemas
de redação que dificultam seu de redação que impedem seu
entendimento entendimento

Conceitos (1,0) Utilizou corretamente os (0,5) Utilizou parcialmente os (0,0) Não utilizou corretamente
(1,0) conceitos discutidos nas conceitos discutidos nas os conceitos discutidos nas
questões 1 e 2 questões 1 e 2, tornando a questões 1 e 2
resposta incompleta OU utilizou
algum conceito incorretamente

Justificativa (2,5) A justificativa comparou (1,25) A justificativa comparou (0,0) A justificativa não utilizou
(2,5) corretamente e de maneira de maneira incompleta OU nenhum conceito discutido nas
completa os conceitos parcialmente incorreta os questões 1 e 2 OU comparou
discutidos nas questões 1 e 2 conceitos discutidos nas de maneira incorreta
com as informações presentes questões 1 e 2 com as
no texto informações presentes no
texto

Classificação (0,5) Seus argumentos embasam a (0,25) Seus argumentos embasam (0,0) Seus argumentos não embasam
(0,5) sua escolha de classificação parcialmente sua escolha de sua escolha de classificação
classificação

Observação: as respostas esperadas estão descritas no item Respostas.

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Figura 10.
Tubarão-baleia (Rhincodon
Os tubarões-baleia alcançam, em média, 10 a 14 metros de comprimento e pesam de 6 a 10 toneladas. Apesar de serem tão grandes, typus) no Santuário Marinho
esses animais são dóceis e se alimentam de plâncton, krill, pequenos crustáceos, lulas e peixes, por meio da filtração.
Nacional Flower Garden Banks,
O tubarão-baleia é ovovivíparo, o que significa que o embrião é formado dentro de um ovo, que então eclode no útero da mãe. No final, localizado no estado do Texas,
os jovens são liberados para o mar completamente formados. O único tamanho de ninhada já documentado foi de mais de 300 filhotes.
nos Estados Unidos. Fonte:
A pele de um tubarão-baleia adulto pode ter até 10 cm de espessura e tem a consistência de borracha forte, o que limita possíveis ECKERT, 2011 - disponível no
ataques de baleias assassinas, grandes tubarões brancos, tubarões-tigre e humanos.
repositório digital da Wikimedia
Disponível em: https://olharoceanografico.com/mas-afinal-e-tubarao-ou-e-baleia/. Acesso em: 12 de janeiro de 2023.
Common.

O segundo ciclo investigativo se mostrou ção, e com conhecimento das singularidades


mais desafiador para os estudantes, o que dos alunos.
corresponde com a pouca familiaridade deles
com a nomenclatura (e.g. evidências, hipó- Ainda assim, quando diante de dificuldades,
teses) e os procedimentos necessários para o educador pode se sentir tentado a direcio-
a realização da tarefa. Observamos que os nar demais ou mesmo fornecer as respostas
educandos se mostraram menos motivados a aos alunos. Contudo, conforme discutido
completar esta etapa da tarefa, ainda que ao por Carvalho (2013) a autenticidade do
longo da discussão no grupo-sala tenhamos aprendizado de habilidades está vinculada
obtido um engajamento maior das turmas à tentativa de realização da tarefa e com a
como um todo. Acreditamos que as dificul- possibilidade de errar e aprender com os er-
dades encontradas não estavam relacionadas ros. A desmotivação observada pode ter sido
com a falta de conhecimento sobre os con- fruto da relação negativa que os estudantes
ceitos trabalhados, mas sim com as práticas têm com o erro e o medo de errar. Cabe ao
demandadas pelas tarefas. professor incentivar as tentativas autênticas
e abrir espaço para o erro e o aprendizado a
É preciso ter em mente que um desafio só partir dele.
será motivador caso sua dificuldade este-
ja adequada para os educandos envolvidos Outro fator que desempenha um papel im-
na tarefa; desafios não devem ser difíceis a portante na desmotivação é o pouco tempo
ponto de desmotivar os alunos, nem fáceis a despendido para o desenvolvimento das ha-
ponto de não estimular um desencadear de bilidades de análise e interpretação de cla-
ideias. A adequação dessa dificuldade deve dogramas. Indicamos a inserção de uma ou
ser realizada com base no contexto de aplica- mais aulas dedicadas a essas habilidades, a

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depender dos conhecimentos prévios dos es- -de-rosa (Inia geoffrensis), que figura como
tudantes e da disponibilidade de aulas para personagem do folclore brasileiro, pode ser
execução da sequência didática. ponto de partida devido à atual ameaça de
extinção da espécie.
Além disso, percebemos que um grande obs- Pensamento tipológico -
táculo à compreensão adequada dos clado-
gramas e do panorama apresentado – o que Respostas crença de que a variação da
natureza pode ser reduzida a
um número limitado de classes
inclui a descoberta dos fósseis – foi o pen-
samento tipológico, ou essencialista, dos esperadas básicas representando tipos
constantes e nitidamente
estudantes. Acreditamos que essa sequência 1° ciclo investigativo delimitados.
ficaria, portanto, melhor alocada após outras
atividades que estimulassem o pensamento 1. “Todos os animais apresentados abaixo
populacional, necessário para a compreensão são classificados pelos biólogos como ma-
da diversidade orgânica e da evolução bioló- míferos. Observe as imagens e liste as ca-
gica com base em seleção natural, premissas racterísticas que você acha que justificam
importantes no contexto conceitual traba- essa classificação.”
lhado. Além disso, acreditamos que seria in-
teressante incluir evidências de outras fontes Nas imagens de mamíferos apresentadas, é
– como a geologia e a geografia – para dar esperado que os alunos identifiquem diver-
aos alunos um panorama mais completo da sas características, como: corpo recoberto
história evolutiva apresentada, que abarcasse por pelos, quatro membros locomotores,
não só os animais, mas também o meio no boca, olhos, narinas etc. Também é possível
qual estes estão inseridos. Isto porque houve, que sejam levantadas informações a partir
entre os educandos, dificuldades para a com- de conhecimentos prévios, como: respiração
preensão do tempo geológico; informações pulmonar, cuidado parental, amamentação
descontextualizadas de outras disciplinas, ou etc.
mesmo de ciências – mares da terra primi- Algumas dessas características, embora se-
tiva, a existência da Pangeia –, foram levan- jam comuns aos animais apresentados, estão
tadas pelos alunos, mesmo sendo relativas a amplamente difundidas também em diversos
períodos temporais muito distantes daqueles animais não mamíferos. Isoladamente, esses
nos quais os animais dos fósseis apresenta- caracteres não podem ser utilizados para jus-
dos viveram. tificar a classificação de um animal como ma-
Por último, consideramos que a sequência mífero. É o caso da presença de boca e olhos,
aqui apresentada também poderia ser articu- quatro membros locomotores e respiração
lada ao trabalho de relações entre ciência, tec- pulmonar. Isso pode ser problematizado
nologia, sociedade e meio ambiente (CTSA). com os alunos, ao levantar com eles exemplos
Isto porque ao longo da costa brasileira estão de peixes, répteis ou aves que também apre-
distribuídas diversas espécies de cetáceos, sentem esses caracteres e, portanto, impossi-
como cachalotes, golfinhos e baleias; espé- bilitem sua utilização como critérios isolados
cies costeiras que tendem a ser residentes de classificação para o grupo analisado.
de uma região restrita, que utilizam como Entre as características, apenas pelos e a
abrigo e fonte de recursos alimentares. Dada amamentação se sustentam como exclusivas
a importância econômica da costa brasileira de mamíferos e, portanto, devem ser o foco
em termos de recursos pesqueiros e, mais re- da investigação nos próximos momentos.
centemente, para a indústria petroleira, essas
espécies estão sujeitas a diversas ameaças an- 2. Atividade sugerida
trópicas, como a captura acidental em redes
de emalhe, já reconhecida como uma ameaça O tubarão-baleia não pode ser considerado
global à conservação desse grupo. Cetáceos um cetáceo pois não apresenta caracterís-
de água doce também se encontram ameaça- ticas que definem este grupo, como a ama-
dos pela pesca. Para este estudo, o boto-cor- mentação e a presença de (poucos) pelos.

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Apesar de apresentar características seme- a necessidade de emergir para respirar indi-


lhantes a baleias, como as nadadeiras e o cam que esses animais realizam respiração
formato hidrodinâmico, permitindo a vida pulmonar, uma característica que, embora
no ambiente aquático, há características que não seja exclusiva de mamíferos, é difundida
distinguem estes grupos como o fato de o entre os representantes do grupo. O cuida-
tubarão respirar por brânquias, como os do parental, indicado na Figura 2a, embora
peixes, enquanto a baleia apresenta respira- também não seja exclusivo do grupo, pode
ção pulmonar, como os demais mamíferos e levar à menção da amamentação, caracterís-
outros grupos. tica exclusiva dos mamíferos, assim como os
pelos, que podem ser identificados na ima-
2° ciclo investigativo gem da baleia-jubarte (2b), em que é possível
1. “Quais das características mencionadas notar folículos capilares. Esses dois últimos
na pergunta anterior você consegue iden- caracteres são suficientes para a classificação
tificar nos cetáceos?” de cetáceos como mamíferos.

Entre as características identificadas na 2. “Identifique as características que per-


pergunta anterior, que incluem caracteres mitem a sobrevivência destes animais no
exclusivos e não exclusivos de mamíferos, é ambiente aquático.”
esperado que sejam identificadas também Entre as características que permitem a so-
nos cetáceos: respiração pulmonar, cuidado brevivência destes animais no ambiente
parental, amamentação (glândulas mamá- aquático é possível citar a migração da narina
rias) e pelos. para a região dorsal, o formato hidrodinâmi-
Embora não esteja representada explicita- co do corpo e a diferenciação de membros
mente nas imagens, a presença de narinas e anteriores em nadadeiras.

Referências
Plos One, v. 4, n. 9, 23 set. 2009. Public Library
of Science (PLoS). http://dx.doi.org/10.1371/
journal.pone.0007062.
bibliográficas CARVALHO, A. M. P. O Ensino de Ciências e a
SPAULDING, M.; O'LEARY, M. A.; GATESY, J. proposição de sequências de ensino investigativas.
Relationships of Cetacea (Artiodactyla) Among In: CARVALHO, Anna Maria Pessoa de. Ensino
Mammals: increased taxon sampling alters inter- de Ciências por Investigação. São Paulo: Cengage
pretations of key fossils and character evolution. Learning,. Cap. 1. p. 1-20, 2013.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 30


MATERIAIS DIDÁTICOS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Uno das bases nitrogenadas:


recurso didático para o
ensino do emparelhamento
de bases e mutações pontuais

Ana Thaila Rodrigues Felix1, Priscila Barreto de Jesus2


Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Tecnologia e Ciências Sociais, Juazeiro, BA
1

Universidade Federal do ABC, Centro de Ciências Naturais e Humanas, São Bernardo do Campo, SP
2

Autor para correspondência - priscila.jesus@ufabc.edu.br


Palavras-chave: DNA, jogos didáticos, nucleotídeo, purinas, pirimidinas, replicação

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 31


MATERIAIS DIDÁTICOS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

O Uno das Bases Nitrogenadas é um jogo que pretende facilitar o ensino da estrutura dos
nucleotídeos no DNA, com foco nas bases nitrogenadas e seu emparelhamento, além de tra-
balhar fundamentos das mutações pontuais de substituição de nucleotídeo único. A aplicação
deste material didático é recomendada desde o ensino médio até disciplinas da graduação nas
áreas da Biologia, de acordo com o nível de complexidade trabalhado previamente em sala de
aula.

Mutações são alterações permanentes no neo, os alunos compreenderão que o proces-


DNA, ou seja, hereditárias, que modificam so não é linear, havendo possibilidade de re-
a sequência de bases nitrogenadas. Tais al- paro, e que transições e transversões ocorrem
terações podem envolver desde mudanças em taxas distintas. Utilizando-se do layout e
em um único par de bases até modificações regras de um jogo mundialmente conhecido
em grandes regiões do DNA, incluindo cro- (Mattel Inc.), espera-se que o contato com as
mossomos como um todo (mutações estru- cartas reforce a compreensão do tema e leve
turais e numéricas). No jogo Uno das Bases os alunos à aprendizagem significativa de
Nitrogenadas são trabalhadas mutações que maneira divertida.
envolvem a substituição de um único par de
bases (transição e transversão). Esse tipo
de mutação pontual pode resultar do mau
Instruções para
funcionamento do sistema de replicação, in-
serindo uma base incorreta na fita de DNA
o(a) professor(a)
que está sendo sintetizada. Durante a repli- Recomenda-se que o jogo seja aplicado após
cação, a maioria das DNA polimerases fa- aulas teóricas sobre a estrutura dos nucleo-
zem a revisão do seu trabalho a cada base que tídeos, o processo de replicação e mutações.
acrescentam. Se a polimerase detecta que um O(A) professor(a) poderá imprimir o ma-
nucleotídeo errado foi adicionado, ela há de terial previamente e solicitar que os alunos
removê-lo e substituí-lo imediatamente (re- fiquem responsáveis por recortar as cartas
paro), antes de continuar a síntese de DNA. do jogo a fim de que se familiarizem com as
No entanto, se a base incorretamente empa- mesmas e relembrem os conteúdos vistos em
relhada não for detectada e substituída, as aula teórica. A turma pode ser dividida em
alterações podem persistir após a replicação, grupos de dois até cinco jogadores, além de
causando as mutações. um moderador, e cada partida poderá variar
de 20 a 40 minutos, de acordo com o número
Apesar de ser um tema presente no cotidia- de participantes e as questões levantadas pe-
no dos alunos, discutido em sala de aula em lo(a) professor(a), podendo ser adaptada aos
todos os níveis e até bastante visto em jornais horários de aula. Antes de iniciar a atividade,
e revistas, a compreensão do processo de mu- o(a) professor(a) deverá entregar o material
tação ainda é difícil para a maioria dos estu- a cada grupo e solicitar que o(a)s aluno(a)s
dantes. Além de exigir conhecimento prévio leiam a ficha de instruções do jogo e tirem
a respeito da estrutura dos nucleotídeos, re- possíveis dúvidas a respeito da dinâmica.
plicação e reparo do DNA, o entendimento
das mutações gênicas esbarra numa abor- No entanto, após iniciada a partida, suge-
dagem geralmente expositiva, que dificulta re-se que o(a) professor(a) não solucione as
a aprendizagem do tema. No jogo Uno das problemáticas que surgirem, mas que oriente
Bases Nitrogenadas, os alunos atuarão simu- cada grupo na construção do conhecimento
lando a ação da enzima DNA polimerase, por conta própria. Caso a dúvida não seja
incorporando os nucleotídeos durante o pro- sanada dessa forma, o grupo poderá anotar
cesso de replicação. Além disso, ao trabalhar as questões para discutir com o restante da
as consequências do emparelhamento errô- turma após o fim da aplicação da atividade.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 32


MATERIAIS DIDÁTICOS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Por fim, para avaliação da aprendizagem, re- • 20 cartas Guanina: 05 de cada cor (impri-
comenda-se a aplicação de questões a cada mir 5x)
grupo, que posteriormente devem ser discu-
tidas com toda a turma. • 20 cartas Citosina: 05 de cada cor (impri-
mir 5x)
Seguem alguns exemplos de questões que
podem ser aplicadas, a depender do nível de Cartas especiais:
complexidade do tema abordado: • 08 cartas +2 (Comprar duas cartas): 02
Questão 1. Quais são os componentes de de cada cor (imprimir 1x)
um nucleotídeo? • 08 cartas Inverte: 02 de cada cor (impri-
Questão 2. Quais são as bases nitrogenadas mir 1x)
púricas e pirimídicas? Quais as principais • 04 cartas Bloqueio (imprimir 1x)
diferenças entre os dois tipos?
• 04 cartas Curinga (imprimir 1x)
Questão 3. Sabendo que um trecho de uma
cadeia de DNA apresenta a sequência de • 04 cartas Curinga +4 (Comprar quatro
bases 5’- GTAGCCAAGG -3’, qual a se- cartas) (imprimir 1x)
quência do mesmo trecho da fita comple-
• 04 cartas Transição (imprimir 1x)
mentar?
• 04 cartas Transversão (imprimir 1x)
Questão 4. O que é e como se origina uma
mutação pontual? • 22 cartas Reparo do DNA (imprimir 1x)
Questão 5. Diferencie as mutações pontuais 2. Dinâmica do jogo
do tipo transição das mutações do tipo
transversão. Os alunos atuarão como a enzima DNA
polimerase, incorporando os nucleotídeos
Questão 6. Quantas possibilidades existem (cartas) na fita de DNA de acordo com a
nas mutações do tipo transição e transver- complementaridade das bases nitrogenadas.
são? Liste-as. Vencerá o jogador que ficar sem nenhuma
Questão 7. Qual a relação entre os raios ul- carta na mão primeiro, e este deverá utilizar
travioleta (UV) e a indução de mutações? todos os meios possíveis para impedir que os
outros jogadores façam o mesmo.
Questão 8. Durante o jogo, ao cometer erros
de emparelhamento, na maioria das vezes Preparação
ocorre reparo do DNA em vez de transi- • Cada grupo deverá definir quem será o
ções e transversões. Explique por que isso mediador, que ficará responsável por ve-
ocorre. rificar os emparelhamentos errôneos. Em
caso de turmas pequenas, o(a) próprio(a)
Instruções para professor(a) poderá se encarregar de me-
diar todos os grupos.
os estudantes • Criar duas pilhas de CARTAS CON-
1. Descrição do material SEQUÊNCIA (vide ficha de instruções)
viradas para baixo: uma com 11 cartas Re-
O jogo é composto por 138 cartas, sendo: paro e 04 cartas Transição (recomenda-se
Cartas de ação: imprimir em papel colorido ou identificar
o verso destas cartas como TRANSI-
• 20 cartas Adenina: 05 de cada cor (impri- ÇÃO), e outra com mais 11 cartas Repa-
mir 5x) ro e 04 cartas Transversão (recomenda-se
imprimir em papel colorido ou identificar
• 20 cartas Timina: 05 de cada cor (impri- o verso destas cartas como TRANSVER-
mir 5x) SÃO).

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• O mediador deverá embaralhar as outras uma carta na mão. Caso não grite e os ou-
cartas (CARTAS DE AÇÃO + CAR- tros percebam antes do próximo começar
TAS ESPECIAIS) e distribuir 07 para a jogar, o jogador pode ser penalizado com
cada jogador. As cartas restantes devem a compra de duas cartas da pilha de com-
ser viradas para baixo, formando a pilha pras. A rodada termina quando um dos
de COMPRAS. jogadores zerar as cartas da mão.
• A carta superior da pilha de COMPRAS Regra extra
deve ser virada para cima servindo de base (para turmas de cursos de graduação)
para que o jogo comece, ou seja, inician-
do a fita de DNA. Os jogadores atuarão 5. Quando a mutação criada for um dímero
como a DNA polimerase, incorporando de pirimidinas (timina com timina, timi-
os nucleotídeos (cartas) na fita de DNA na com citosina e vice-versa), indepen-
de acordo com a complementaridade das dentemente da cor, todos os jogadores de-
bases nitrogenadas. verão colocar a mão em cima da pilha de
descarte e o último a colocar a mão deverá
Observação: Se qualquer uma das CAR- comprar duas cartas da pilha de compras.
TAS ESPECIAIS for virada para dar
início à pilha de DESCARTE, consulte O jogo tem algumas cartas especiais que o
as funções das mesmas para ler instruções. tornam mais dinâmico e auxiliam na fixação
de conceitos relacionados ao tema. Abaixo
Jogando estão listadas as funções das CARTAS ES-
PECIAIS:
1. O jogador que estiver à esquerda do me-
diador começa o jogo, que seguirá em sen- • Carta +2 (Comprar duas cartas): o jo-
tido horário. gador poderá jogá-la respeitando a cor da
carta anterior. O próximo jogador deverá
2. Na sua vez, você deve combinar uma car- pegar duas cartas do monte e perder a vez.
ta da sua mão com a carta do nucleotídeo
que está no alto da pilha da fita de DNA, • Carta Inverte: O uso da carta inverso de-
de acordo com a complementaridade das verá obedecer a cor da carta anterior, e o
bases. Exemplo: Se for jogada uma TI- seu uso irá ocasionar a mudança no senti-
MINA verde, o próximo poderá jogar do do jogo (se estiver indo para a esquer-
uma ADENINA verde, vermelha, azul da, muda para a direita e vice-versa).
ou amarela, ou seja, os pares podem ser
formados utilizando cores diferentes. • Carta Bloqueio: A luz UV irá bloquear
a replicação. Assim, o jogador seguinte
3. Caso o jogador não tenha a base comple- perderá a vez. Esta carta deve ser jogada
mentar, ele poderá jogar uma base não obedecendo a cor da carta anterior.
complementar, criando um emparelha-
mento errôneo. Neste caso, ele deverá pe- • Carta Curinga: Esta carta possui as qua-
gar uma CARTA CONSEQUÊNCIA tro bases nitrogenadas e poderá ser jogada
na pilha correspondente ao tipo de muta- em qualquer momento do jogo, indepen-
ção que foi criada (transição ou transver- dentemente da cor da carta anterior. O jo-
são) e que irá indicar se o erro no empare- gador, então, poderá escolher uma cor ou
lhamento foi reparado ou não. Se o erro a próxima base a ser jogada.
for reparado (carta reparo), ele continua a • Carta +4 (Comprar quatro cartas): O
jogada; no entanto, as cartas de transição jogador também poderá jogá-la indepen-
e transversão punem o jogador que causar dentemente da carta anterior, dando-lhe
uma mutação no DNA que não for repa- o poder de escolher a cor das próximas
rada (ver CARTAS ESPECIAIS). cartas, além de fazer com que o próximo
4. Ao jogar a penúltima carta, o jogador de- jogador pegue 4 cartas do monte de com-
verá gritar “DNA” para indicar que só tem pras.

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• Carta Reparo do DNA (monte CON- os nucleotídeos incorporados de forma


SEQUÊNCIAS): Indica que o erro no errônea podem persistir após a replicação
emparelhamento foi reparado pela DNA e causar mutações. Os erros de replicação
polimerase e que o jogador que incorpo- oriundos de maus emparelhamentos ori-
rou o nucleotídeo errado pode continuar ginam mutações pontuais.
a jogada.
Questão 5. A substituição de uma purina
• Carta Transição (monte CONSE- por outra purina ou de uma pirimidina
QUÊNCIAS): A transição ocorre quan- por outra pirimidina é chamada de tran-
do há substituição de base uma pirimídica sição, e a substituição de uma purina por
por outra pirimídica (ex: Timina → Cito- uma pirimidina, ou vice-versa, é chamada
sina e vice-versa), ou de uma base púrica de transversão.
por outra púrica (ex: Adenina → Guani-
na e vice-versa). O jogador que causou a Questão 6. Existem quatro possibilidades
mutação do tipo transição deve pegar +2 de transição (Timina → Citosina, Citosi-
cartas da pilha de compras. na → Timina, Adenina → Guanina, Gua-
nina → Adenina) e oito possibilidades de
• Carta de Transversão (monte CON- transversão (Timina → Adenina, Timina
SEQUÊNCIAS): A transversão ocorre → Guanina, Citosina → Adenina, Ci-
quando bases pirimídicas são substituídas tosina → Guanina, Adenina → Timina,
por bases púricas ou quando bases púricas Guanina → Timina, Adenina → Citosi-
são substituídas por bases pirimídicas (ex: na, Guanina → Citosina)
Timina → Adenina, Timina → Guanina,
Citosina → Adenina, Citosina → Guani- Questão 7. Os raios UV são absorvidos
na e vice-versa). O jogador que causar a principalmente por pirimidinas, que fi-
mutação do tipo transversão deverá pegar cam mais reativas, e podem formar díme-
+4 cartas da pilha de compras. ros entre pirimidinas adjacentes (dímeros
de pirimidinas). Estes dímeros podem al-

Respostas terar a dupla hélice do DNA, interferindo


na replicação precisa da molécula, além de
provocar erros durante o reparo do DNA
Questão 1. O nucleotídeo é um conjunto
danificado.
formado pela associação de 3 moléculas,
uma base nitrogenada, um grupamento Questão 8. O processo de replicação do
fosfato e um glicídio do grupo das pento- DNA apresenta fidelidade extremamente
ses. alta. Além disso, vários mecanismos de re-
paro do DNA atuam de forma sequencial
Questão 2. As bases púricas são adenina e
para corrigir qualquer pareamento incor-
guanina, e as pirimídicas são timina e cito-
reto que possa ter ocorrido. Assim, erros
sina. No RNA temos a uracila, que é uma
aleatórios nas sequências nucleotídicas
base pirimídica. As bases púricas são es-
ocorrem muito raramente.
truturas de duplo anel, enquanto as bases
pirimídicas apresentam anel simples.
Questão 3. 3’- CATCGGTTCC -5’
Agradecimento
À Pró-Reitoria de Extensão da Universidade
Questão 4. Por vezes, a enzima DNA poli- do Estado da Bahia (UNEB), pela bolsa de
merase insere nucleotídeos incorretos du- monitoria concedida ao projeto Utilização
rante a síntese de uma nova fita de DNA. de modelos e jogos didáticos para facilitação
Caso não sejam detectados e corrigidos da aprendizagem de Biotecnologia no Ensi-
pelos mecanismos de reparo do DNA pe- no Médio.  
las DNA-polimerases no sentido 3'→5',

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Anexo. Cartas de Ação e Cartas Especiais


Cartas Adenina e Timina

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Cartas Citosina e Guanina

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Cartas 2+

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Cartas Inverte

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Cartas Bloqueio e Curinga

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Cartas Curinga 4+

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Cartas Transição e Transversão

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Cartas Reparo do DNA

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Cartas Reparo do DNA

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Cartas Reparo do DNA

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Será que tem um pintinho?


Uma aula prática para
desvendar os segredos
do ovo de galinha

Larissa Ferragute Gouveia1, Igor Buzzatto Leite2, Thaís Metzker Pinto2,


Jórdan Fares Sampar2, Carolina Stefano Mantovani2, Lúcia Elvira Alvares2
1
UNICAMP, Instituto de Biologia, Campinas, SP
2
UNICAMP, Departamento de Bioquímica e Biologia Tecidual, Campinas, SP
Autor para correspondência - lealvare@unicamp.br
Palavras-chave: galinha, ovo, reprodução, ovogênese, meiose, aula prática

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À primeira vista, o ovo de galinha é apenas um alimento saboroso e nutritivo, comum na nos-
sa rotina. Contudo, nele ocorre um instigante fenômeno da natureza, que é a transformação
do ovo em um pintinho, em apenas três semanas. Essa admirável transformação só é possível
porque o ovo contém tanto as informações genéticas para gerar o pintinho, quanto o habitat
ideal para o seu desenvolvimento, fornecendo nutrição, proteção e hidratação, por meio de
um “oceano” particular. Neste artigo, apresentamos uma aula prática destinada ao estudo de-
talhado do ovo de galinha e das suas estruturas. Além de ser acessível e de baixo custo, o ovo
de galinha é um material que permite aos estudantes analisar a importância de suas diferentes
estruturas para a reprodução da galinha e traçar paralelos com a reprodução humana.

Onde mora a genética


no ovo de galinha?
Gameta feminino - Célula
reprodutiva haploide feminina. O primeiro passo para gerar um pintinho é a fecundação,
Fecundação - Junção de
ou seja, o encontro do gameta feminino (óvulo) e do game- gametas que origina o zigoto
ta masculino (espermatozoide), que são células reprodutivas ou célula-ovo.
Haploide - Contém uma única
haploides (n). É a partir do material genético contido nos ga- Gameta masculino - Célula
cópia de cada cromossomo. metas que é formado o núcleo do zigoto, que é diploide (2n) reprodutiva haploide masculina.
e contém todas as informações para coordenar o desenvolvi-
mento embrionário do pintinho. Sabendo disso, fica evidente
Célula-ovo ou zigoto - Célula que há uma relação importante entre o ovo de galinha e o óvu- Diploide - Contém duas
diploide gerada na fecundação, lo desta ave, dado que os pintinhos nascem dos ovos. Assim, cópias homólogas de cada
pela junção de um gameta vamos analisar essa questão mais de perto. cromossomo.
masculino com um feminino.
A parte do ovo da galinha que corresponde ao óvulo é a gema.
Sim, a gema é uma célula imensa, repleta de reservas nutritivas
Vitelo - Substâncias de reserva
(vitelo) e delimitada pela membrana vitelínica. Como toda Membrana vitelínica -
nutritiva do ovo. célula, a gema contém um núcleo, que fica em uma região cha- Membrana que envolve o
Disco germinativo - Região
mada disco germinativo. Nele, o núcleo é cercado por um ci- ovócito da galinha.
em que se forma o embrião. toplasma com pouco vitelo e, por isto, o disco germinativo tem
coloração diferente da gema como um todo. Assim, é possível
visualizar o disco germinativo como um ponto esbranquiçado,
de mais ou menos 3 mm, em cima da gema. É neste local que
ocorre a fecundação e, se ela for bem-sucedida, a formação do
embrião.
No momento em que a gema é liberada do ovário, ela ainda não
terminou a meiose, um pré-requisito básico para a formação
Meiose - Tipo de divisão
celular que gera os gametas do gameta feminino da galinha. Por esse motivo, o nome técni-
haploides. co desta célula é ovócito. A gema só será um óvulo verdadeiro,
Ovócito - Célula reprodutiva da
no sentido de ter finalizado a meiose, se ocorrer a fecundação. galinha, que forma o óvulo.
Isto porque o ovócito das aves, assim como o dos mamíferos,
incluindo o humano, só completa a segunda divisão da meiose
se houver a fecundação. Veja mais detalhes no Box 1.

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Se a galinha tiver acasalado, espermatozoi- Independentemente de o ovócito ter sido


des serão depositados pelo galo na sua cloaca fertilizado ou não, ele continuará descendo
e migrarão pelo oviduto da galinha. A fecun- pelo oviduto da galinha. Ao longo desse ca-
Oviduto - Canal do aparelho
dação ocorre logo após a ovulação e é o estí- minho, serão depositadas substâncias que reprodutor da galinha, que
mulo necessário para que o ovócito termine a irão envolver e proteger a gema, como a clara conduz o ovo.
meiose. Logo em seguida, ocorre o encontro (albúmen) e a casca calcária, terminando de
do núcleo do óvulo com o núcleo do esper- formar a estrutura completa do ovo de ga-
matozoide, gerando a célula-ovo ou zigoto. linha, antes de ser posto. Portanto, apenas
Essa célula é muito especial, uma vez que é a ovos fertilizados terão um embrião e pode-
partir dela que são gerados todos os tecidos e rão formar um pintinho.
Ovulação - Liberação do
órgãos do pintinho. ovócito maduro.

Box 1.
A gametogênese feminina é um processo que envolve a redução pela metade do número de A gametogênese da galinha e a
cromossomos das células progenitoras (ovogônias), por meio de um tipo especial de divisão meiose.
celular chamado meiose. No caso da galinha, cada célula somática apresenta 38 cromosso- Cromossomos autossômicos
- Qualquer cromossomo que
mos autossômicos e dois cromossomos sexuais (Z e W). Por sua vez, o gameta feminino
não é um cromossomo sexual.
(óvulo) apresenta 19 cromossomos autossômicos e um cromossomo sexual. Como na galinha
Cromossomos sexuais -
a fêmea é o sexo heterogamético, estes cromossomos podem ser W ou Z. Diferentemente, Cromossomos responsáveis
na mulher, as células somáticas apresentam 44 cromossomos autossômicos e dois cromosso- pelas diferenças sexuais entre
mos sexuais, enquanto os gametas apresentam 22 cromossomos autossômicos e um cromos- machos e fêmeas.
somo sexual X, pois na espécie humana o sexo homogamético é o feminino. Heterogamético - Sexo
determinado por cromossomos
Na galinha, a meiose ocorre no disco germinativo, localizado em cima da gema (ovócito I), sexuais diferentes.
onde fica o núcleo desta célula. É importante lembrar que, ao término da meiose II, apenas Homogamético - Sexo
uma das células produzidas durante a gametogênese da galinha contribuirá para formar o determinado por cromossomos
ovócito II, enquanto as demais células, chamadas de corpúsculos polares, são pequenas e sexuais iguais.
degeneram. Na mulher, a meiose ocorre da mesma forma que na galinha, com a diferença de
que o ovócito II quase não contém reservas nutritivas e não é visível a olho nu.

Corpúsculos polares -
Representação das principais fases da gametogênese feminina na galinha Células de tamanho reduzido
geradas na meiose durante a
gametogênese da galinha.

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É preciso mais do que a meiose


para formar um pintinho: a linha de
montagem do ovo de galinha
Quando a galinha ovula, a gema ou ovócito istmo, em que é produzida uma membrana
maduro percorre um longo trajeto no ovi- dupla de fibras de queratina, que irá envol-
duto, que contém vários compartimentos ver a clara do ovo. A formação desta dupla
especializados na adição dos diferentes en- membrana demora cerca de 1 hora. Você cer-
voltórios da gema (Figura 1). O primeiro tamente já viu esta membrana quando des-
compartimento do oviduto é o infundíbulo, cascou um ovo cozido. Ela é aquela película
formado por uma fina membrana, que rece- fina e branca que envolve a clara. O quarto
be a gema quando ela é liberada do ovário. É compartimento do oviduto da galinha é o
nesta região do oviduto da galinha que ocorre útero, onde o ovo permanece de 18 a 21 ho-
a fecundação, caso espermatozoides estejam ras. Neste local há secreção de uma solução
presentes. No infundíbulo também ocorre a aquosa contendo sais minerais, que faz com
formação das chalazas, duas espirais de ma- que o ovo dobre de tamanho em poucas ho-
Chalazas - Estruturas proteicas
terial proteico fibroso, que ficam conectadas ras. Esse processo diminui ao longo do tem- fibrosas semelhantes a molas,
à região equatorial da membrana vitelínica. po, dando lugar à deposição de carbonato de que ficam localizadas na
As chalazas estabilizam e mantêm a gema cálcio, que irá endurecer a casca do ovo. Com região equatorial da gema,
na posição central do ovo, atuando como um a casca formada, ocorre a deposição da cutí- amortecendo o impacto de
choques mecânicos no ovo.
amortecedor de choques mecânicos para o cula, uma camada fina e transparente, que
embrião em um ovo fecundado. O segundo protege o ovo de contaminações após a eclo-
compartimento é o magno, onde é adicionada são. Por fim, o ovo é direcionado para a região
a clara do ovo, que é formada principalmente final do oviduto, a vagina, uma região na qual
por água e pela proteína albumina. A depo- não há modificações, apenas o transporte do
sição da clara do ovo demora mais ou menos ovo. A partir da vagina, o ovo é direcionado
três horas. O terceiro compartimento é o para a cloaca, por onde ocorre a postura.

Figura 1.
O ovário e o oviduto da galinha
formam a “linha de montagem”
do ovo.

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Na galinha apenas o ovário e oviduto es- chamadas de trompas de Falópio), além do


querdos são funcionais, tal como ocorre útero, vagina e genitália externa. Uma com-
em outras aves. Diferentemente, na mulher paração de outros aspectos da reprodução
o sistema reprodutor é formado por dois da galinha e da espécie humana é apresen-
ovários, duas tubas uterinas (anteriormente tada na Tabela 1.

Tabela 1.
Semelhanças e diferenças entre
a reprodução da galinha e a
humana.

Objetivo deste Fundamental, para complementar o ensino


sobre os tipos de reprodução dos animais.
material didático No Ensino Médio, a aula poderá ser aplicada
para complementar o estudo de meiose e ga-
Esta aula tem por objetivo permitir que os metogênese, bem como sobre padrões de re-
estudantes sejam capazes de identificar as produção e desenvolvimento de vertebrados.
diferentes estruturas que formam o ovo de
galinha e justificar a sua importância para a
reprodução das aves.
Instruções para
os professores
Público-alvo Sugere-se que o professor realize esta aula
prática após ter ministrado para seus alunos
Esta aula prática poderá ser adaptada a dife-
conteúdos específicos como os exemplifica-
rentes públicos, dependendo do interesse do
dos acima. Como material de apoio didático,
professor. Ela poderá, por exemplo, ser apli-
o professor poderá ler com seus alunos a in-
cada a estudantes dos 7o e 8o anos do Ensino
trodução deste artigo. Isso facilitará o enten-

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dimento por parte dos alunos da importância discussão entre os estudantes, sugere-se que
desta aula prática, estimulando a curiosidade, o professor divida a turma em grupos de 3
além de reforçar o conteúdo recém-aprendido. a 5 alunos. Por fim, sugerimos ao professor
que, após a aula prática, ele aplique as ativi-
Para se preparar para a aplicação desta prá- dades de fixação de conteúdo fornecidas nes-
tica, o professor deverá utilizar o roteiro e te material didático.
a prancha de fotos, que ilustra os principais
passos para observação das estruturas do ovo Informações detalhadas sobre os materiais e
de galinha (Figura 2). Para facilitar a organi- a organização da aula prática são apresenta-
zação prévia da aula e estimular a interação e das nos anexos.

Figura 2.
Principais passos da aula prática
para observação das estruturas
do ovo de galinha. Importante:
sugerimos que este material seja
de uso exclusivo do professor,
para não desestimular os alunos
a realizarem os procedimentos
propostos.

Preparação poderão fazer isso por ele. Alternativa-


mente, devem ser disponibilizadas luvas
dos materiais para alunos alérgicos.
• O professor deve alertar aos alunos para
1. Imprimir o roteiro de aula prática para os manterem equipamentos eletrônicos, tais
grupos de alunos. como celulares e tablets, distantes dos
2. Organizar os materiais para a realização ovos e demais materiais de aula prática,
da aula. A lista de materiais e uma suges- para não os sujar e os danificar.
tão de organização deles é proposta no
Anexo 1. Após a aula prática
Importante: • Como fechamento da aula prática e para
avaliar se os alunos atingiram os objetivos
• Antes da aula prática, pergunte à turma
de aprendizagem propostos, é sugerida a
se há alguém com alergia ao ovo de gali-
aplicação das atividades 1 e 2 (anexo), que
nha. Caso afirmativo, oriente o estudante
abordam os principais conceitos discuti-
para evitar o contato com os ovos durante
dos ao longo da atividade.
a prática. Os demais integrantes do grupo

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Instruções para os estudantes


Roteiro de aula prática
1. Identifiquem o kit de trabalho disponibilizado pelo professor para o grupo. Localizem o ovo de galinha e o observem.
2. Cada aluno deverá segurar o ovo em suas mãos com firmeza, mas sem força exagerada, pois o ovo pode quebrar. Lembrem-se
que a galinha também aplica pressão sobre seus ovos no ninho, portanto o ovo é resistente, mas há um limite.
3. Observem atentamente a casca do ovo. Percebam que ela tem poros em sua superfície.
Pontos de parada e reflexão:
a. Qual a função da casca do ovo?
b. Para que servem os poros da casca do ovo?
c. Em que parte do oviduto da galinha se forma a casca do ovo? Do que ela é formada?
4. Um aluno do grupo deverá se encarregar de abrir o ovo. Para abri-lo, aproxime o ovo do recipiente fornecido e quebre-o com
cuidado. Em seguida, reserve a casca sobre papel toalha ou guardanapo.
Atenção: realize os procedimentos acima com muito cuidado para não quebrar a gema do ovo. Ela ainda será utilizada na
atividade!
5. O grupo agora deverá focar sua atenção nas cascas de ovo reservadas. Identifiquem aquela que contém a câmara de ar
e pressione-a com cuidado para não a danificar! Peguem essa casca e a quebrem ao meio com cuidado. Identifiquem as
membranas interna e externa da casca, que formam a câmara de ar. Ao contrário da casca calcária, estas membranas são muito
finas e tem flexibilidade como a pele humana.
Ponto de parada e reflexão:
d. Por que as membranas interna e externa do ovo são finas e flexíveis, diferentemente da casca calcária? Qual sua função?
6. O grupo agora deverá voltar a sua atenção para o conteúdo do ovo, que foi colocado no recipiente. Localizem a gema e a clara.
7. Na gema, tentem identificar o disco germinativo, que é um ponto esbranquiçado com cerca de 2-3 mm.
Importante: O disco germinativo apresenta um diâmetro maior quando o ovo é fecundado. Normalmente, ovos de granja não
são fecundados, apenas ovos provenientes de granjas que criam galinhas soltas em contato com galos fornecem
ovos fecundados.
8. Agora observem a clara ou albúmen. Coloquem o papel preto abaixo do recipiente com o ovo para dar maior contraste.
Identifiquem a clara densa, localizada próxima à gema, e a clara fluida, que fica na periferia. Há também uma pequena camada
de clara fluida no entorno da gema, de visualização mais difícil. Localizem as chalazas, que são duas estruturas de albúmen com
formato espiral, encontradas lateralmente à gema. Com o palito de dente, retire a chalaza do ovo. Cuidado para não furar a
gema!
Pontos de parada e reflexão:
e. Qual a contribuição da gema do ovo para a formação do pintinho?
f. Qual é a função da clara? E das chalazas?
9. Peguem o segundo recipiente fornecido pelo professor. Com cuidado, separem a gema da clara e a transfiram para o novo
recipiente.
10. Examinem a gema mais de perto. Notem que ela é envolvida por uma membrana, que ajuda a manter sua forma.
11. Perfurem a membrana que envolve a gema com o palito. O que acontece? Pode-se afirmar que há um “saquinho” envolvendo
a gema?
Ponto de parada e reflexão:
g. Qual o nome da membrana que envolve a gema? Qual a sua função?
12. Agora é hora de limpar! Joguem no lixo todo o material utilizado na aula prática, exceto os recipientes. Lave os recipientes
com detergente e sequem com os papéis fornecidos pelo professor.
Importante: Ovos de galinha podem ter bactérias nocivas à saúde humana. Algumas delas, como as Salmonella spp., podem
ser muito perigosas! Portanto, após a finalização da aula prática não esqueçam de lavar bem as mãos com água e
sabão.

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Anexo 1A
Lista de materiais
a) Kit de trabalho para os grupos:
• 1-2 ovos de galinha;
• 1 suporte para ovos;
• 2 recipientes de vidro transparente;
• 1 pedaço de cartolina preta;
• Palitos de dente.
b) Materiais de limpeza
• Detergente;
• Papel toalha ou guardanapos de papel;
• Proteção para a superfície de trabalho (toalha, papel kraft ou outro item que sirva de forro protetor);
• Lixeiras com sacolas plásticas.
c) Material de proteção individual
• Luvas.

Anexo 1B
Sugestão de organização dos materiais para realização da aula prática.

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Atividade 1
Agora que vocês conheceram de perto o ovo de galinha, identifiquem suas estruturas no esquema abaixo.

1. 7.

2. 8.

3. 9.

4. 10.

5. 11.

6. 12.

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Atividade 2
Complete o quadro e represente os cromossomos sexuais no esquema abaixo. A seguir, compare o resultado da gametogênese
humana com a da galinha e circule a imagem do sexo heterogamético em cada uma das espécies.

Humano Galinha

Número de autossomos: Número de autossomos:

Número de cromossomos sexuais: Número de cromossomos sexuais:

Ploidia do indivíduo: Ploidia do indivíduo:

Ploidia do gameta: Ploidia do gameta:

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Respostas dos “Pontos de parada e


reflexão” para o professor
a. Qual a função da casca do ovo? conteúdo do ovo de bactérias, além de
reduzir a perda de água pelo ovo, o que
A casca do ovo tem as funções de 1) pro- é essencial caso haja um pintinho em for-
mover trocas gasosas entre o interior do mação.
ovo e o ambiente externo a ele; 2) evitar
a desidratação do ovo pela perda da umi- e. Qual a contribuição da gema do ovo para a
dade em excesso; 3) proteger o interior do formação do pintinho?
ovo de danos mecânicos; 4) atuar como
barreira física contra patógenos como bac- A gema, por corresponder ao ovócito,
térias, fungos e outros agentes externos contribui com o material genético para a
contaminantes e 5) ser uma importante formação do embrião. Esse material gené-
fonte de cálcio durante o desenvolvimento tico fica depositado no disco germinativo,
do pintinho. local onde se desenvolve o embrião que
irá gerar o pintinho, caso seja fecundado
b. Para que servem os poros da casca do ovo? por um espermatozoide. A gema fornece
ainda o aporte nutricional para o pintinho
Os poros da casca do ovo servem para que em desenvolvimento, por meio do vitelo
haja a difusão e troca de gases, como oxi- contido no seu interior.
gênio e gás carbônico, permitindo que o
pintinho em desenvolvimento “respire”. f. Qual é a função da clara? E das chalazas?
c. Em que parte do oviduto da galinha se forma A clara fornece o meio líquido no qual
a casca do ovo? Do que ela é formada? o embrião se desenvolve. Além disso, ela
contém uma grande quantidade de proteí-
A casca do ovo é formada no útero do ovi- nas, necessárias para o desenvolvimento
duto da galinha. O principal componente adequado do pintinho em formação.
da casca do ovo é o carbonato de cálcio,
que será empregado pelo pintinho em de- As chalazas são estruturas de proteção,
senvolvimento para a ossificação do seu que atuam como “amortecedores” para o
esqueleto. pintinho em desenvolvimento. Por terem
uma estrutura espiralada, elas são como
d. Por que as membranas interna e externa do molas que mantém a gema no centro do
ovo são finas e flexíveis, diferentemente da ovo, reduzindo o impacto de movimentos
casca calcária? Qual sua função? bruscos, além de impedir o contato do
As membranas interna e externa são fle- embrião com as membranas da casca.
xíveis por não terem composição calcária g. Qual o nome da membrana que envolve a
como a casca externa do ovo, mas sim uma gema? Qual a sua função?
composição predominantemente proteica.
Elas são compostas, em parte, de quera- Membrana vitelínica. Ela delimita a gema,
tina, uma proteína que também está no que contém internamente o vitelo, fa-
cabelo, unhas e pele humanos. cilmente observável quando se rompe a
membrana, como proposto na aula prá-
As membranas interna e externa do ovo tica. O vitelo é fonte de nutrição para o
envolvem e contêm a clara e protegem o pintinho em desenvolvimento.

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Atividade 1

1. Gema 7. Disco germinativo


2. Membrana vitelínica 8. Câmara de ar
3. Chalaza 9. Membrana interna
4. Clara fluida externa 10. Membrana externa

5. Clara densa 11. Casca calcária

6. Clara fluida interna 12. Cutícula

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Atividade 2
Humano Galinha

Número de autossomos: 44 Número de autossomos: 38

Número de cromossomos sexuais: 2 Número de cromossomos sexuais: 2

Ploidia do indivíduo: 2n Ploidia do indivíduo: 2n

Ploidia do gameta: n Ploidia do gameta: n

Para saber mais


GARCIA, S. M. LAUER; FERNÁNDEZ, C. G. Em- https://poultry.extension.org/articles/poultry-ana-
briologia-3. Artmed Editora, 2009. tomy/avian-reproductive-female/

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Uso de ferramentas
online no estudo
de mutações

Monica Laner Blauth1, Maria Helena Romano Santin2, Rafael Martins dos Santos3
1
UFPel, Instituto de Biologia, Dep. de Ecologia, Zoologia e Genética, Campus Capão do Leão, UFPel, Pelotas, RS
2
Graduando, Medicina, UFPel, Pelotas, RS
3
Graduando, Odontologia, UFPel, Pelotas, RS
Autor para correspondência - blauth.monica@gmail.com
Palavras-chave: classificação das mutações, tradução, alinhamento de sequências, querubismo, doença genética

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Uma grande quantidade de informações sobre os genes e genomas estão disponíveis em ban-
cos de dados com possibilidade de utilização em atividades didáticas, permitindo a aproxima-
ção dos conceitos abordados em sala de aula das práticas de análise de DNA. Essa abundân-
cia de informações, entretanto, pode ser um obstáculo para quem não trabalha com biologia
molecular. Aqui propomos um roteiro para a análise de sete sequências mutantes do gene
SH3BP2, que causam a doença conhecida como Querubismo. A proposta aborda a identifi-
cação de mutações por alinhamento de sequências de DNA e de aminoácidos, o processo de
tradução e a análise de mutações.

Mutação é qualquer alteração no DNA de da e o olhar voltado para cima, que lembra
um descendente, comparada ao DNA de seu a imagem infantil de anjos querubins, dá o
ancestral. É a fonte primordial de variabili- nome popular à doença. Além da alteração
dade, podendo trazer vantagem, ser neutra facial, o fenótipo da doença pode envolver
ou desvantajosa no contexto do genoma e problemas respiratórios, de visão, fala, de-
ambiente do indivíduo. Particularmente nos glutição e de formação e posicionamento
cursos de graduação da área da saúde, e mes- dos dentes. As lesões faciais tendem a regre-
mo no ensino médio, as mutações são apre- dir entre 20 e 30 anos. O fenótipo é autos-
sentadas associadas a fenótipos relacionados sômico dominante, com expressividade va-
com doenças em humanos, tanto pelo en- riável e 11 genes foram descritos associados
foque do curso, quanto por permitir que os à doença: SH3BP2, FAM193A, HAUS3,
alunos façam a relação de alterações visíveis MXD4, NAT8L, POLN, RNF4, TNIP2,
com a função dos produtos gênicos de forma ZFYVE28, PTN11 e RIT1. A grande
mais fácil. maioria das mutações descritas é no gene
SH3BP2, localizado no braço curto do cro-
As mutações têm um sistema de classificação mossomo 4, e que codifica uma proteína que
complexo que pode referir-se ao ganho ou se liga a várias outras proteínas, regulando
perda da função de genes, ou se sua origem a sua atividade (GeneCards - The Human
é esporádica ou induzida. A classificação das Genes Database; OMIM - Online Mende-
mutações que ocorrem em regiões codifican- lian Inheritance in Man).
tes dos genes é particularmente interessante,
porque pode auxiliar na reflexão sobre o seu A proposição da atividade é baseada na des-
efeito na proteína correspondente. Além dis- crição de mutações feita por Ueki e cola-
so, trabalhar com mutações em regiões codi- boradores em 2001, disponível no OMIM
ficantes nos permite abordar alguns aspectos (SH3BP2- 602104), de sete mutações em
do processo de tradução. uma mesma região do éxon 9. Por se tratar
de mutações próximas, é possível fazer aná-
Querubismo é uma doença genética rara, lise a partir de uma mesma comparação de
que ocorre pelo desenvolvimento excessivo sequências.
de tecido fibroso e pela degradação de ossos
da mandíbula e maxilar. A face arredonda- As respostas estão no anexo 3.

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Material necessário cleotídeos e de aminoácidos. Além das


alterações, a característica química dos
aminoácidos trocados poderá ser observa-
• Roteiro de atividade (entregue impresso
da para a conclusão sobre o tipo de mu-
ou arquivo digital) - Anexo 1;
tação, seguindo a classificação: mutação
• Sequências nucleotídicas (arquivo digital, sinônima (troca de nucleotídeos, mas não
enviado por e-mail ou compartilhado re- dos aminoácidos), mutação conservativa
motamente, por exemplo) - Anexo 2; (troca de nucleotídeos e de aminoácidos,
mas os aminoácidos possuem a mesma ca-
• Computador com acesso à internet para racterística química), mutação de sentido
uso dos programas. errado (troca de nucleotídeos e troca de
aminoácidos com características químicas
Atividade diferentes), mutação sem sentido (troca
de nucleotídeos e troca de um aminoácido
Cada aluno/grupo deverá ter um computa- por códon de parada).
dor com acesso à internet, o roteiro de análi-
se (Anexo 1) e o arquivo com as sequências Para tornar a atividade mais rápida, cada alu-
(Anexo 2). no/grupo pode fazer a análise de uma muta-
ção. Nesse caso, como cada aluno/grupo terá
O Anexo 2 consiste em sete sequências com uma sequência diferente, ao final da ativida-
mutação e uma sequência selvagem (padrão de o resultado poderá ser apresentado aos
ou normal, com uma sequência de nucleo- demais colegas, promovendo uma discussão.
tídeos que não causa a doença), no formato
necessário para análise, ou seja, no formato
txt. e identificadas com o símbolo >. Atividades
• Identificação da mutação alternativas
Cada sequência nucleotídica obtida de Com a finalidade de tornar a análise mais
uma pessoa doente deverá ser alinhada atrativa, disponibilizamos mutações já des-
com a sequência selvagem, usando o pro- critas como associadas ao Querubismo e, as-
grama sugerido no roteiro. A troca de nu- sim, a discussão ficará limitada às mutações
cleotídeo e a posição em que a alteração de perda de sentido e conservativa. Porém,
ocorreu deverão ser anotadas. outras atividades podem ser realizadas com
a sequência selvagem disponibilizada:
• Identificação da alteração de aminoácido
Proposta alternativa 1
Após a identificação da mutação, cada
uma das sequências nucleotídicas deve- Solicite aos alunos que criem, na sequência
rá ser traduzida de acordo com o código selvagem, uma mutação sinônima, uma de
genético, usando o programa sugerido no erro de matriz de leitura e outra sem senti-
roteiro. As sequências traduzidas no pro- do. Além da mutação na sequência do DNA,
grama deverão ser copiadas e coladas em todos os passos de alinhamento de sequência
um arquivo de texto, mantendo a identi- nucleotídica, tradução e alinhamento de se-
ficação da sequência (ex.: >selvagem). To- quência de aminoácido poderão ser solicita-
das as sequências de aminoácidos, devida- dos, usando o mesmo roteiro e programas. É
mente identificadas, deverão ser copiadas importante saber que:
e coladas no programa de alinhamento de
• Para gerar uma mutação sinônima, é
múltiplas sequências sugerido no roteiro.
necessário verificar a degeneração dos
A troca e a posição em relação à sequência
códons. Com exceção do códon da Me-
selvagem deverão ser anotadas.
tionina (ATG - AUG) e do Triptofano
• Identificação do tipo de mutação (TGG- UGG), todos os outros aminoá-
cidos são traduzidos por mais de um có-
Por fim, é feita a análise do tipo de mu- don. Para essa atividade é necessária uma
tação, observando se as alterações de nu-

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tabela com o código genético disponível a identificação e formatação corretas


como guia. As tabelas de códons geral- (olhar o modelo no Anexo 1, que é o
mente usam os códons de RNA e, para mesmo a ser seguido para a sequência
a atividade, usamos sequências de DNA. de aminoácidos).
Como as sequências de DNA disponibi-
lizadas são codificantes, os códons são os
mesmos, trocando apenas as bases Uracila
Considerações
(U) da tabela de códons por Timina (T). finais
• Erros de matriz de leitura são possíveis a A grande quantidade de sequências de
partir da inserção ou deleção de um único DNA disponíveis em bancos de dados é
nucleotídeo, por exemplo. Quanto mais promissora para o desenvolvimento de ati-
próximo do início da sequência, mais fácil vidades, ao mesmo tempo que pode con-
será a observação da alteração dos ami- fundir aqueles que não conhecem a ferra-
noácidos após a mutação. menta. A proposição da atividade usando
É importante observar que a inserção/de- o Querubismo veio, justamente, da neces-
leção de múltiplos de 3 nucleotídeos em sidade de encontrar sequências nucleotí-
sequência causará uma inserção/deleção dicas com mutações já descritas para uma
de aminoácido, não um erro de matriz de mesma doença e que estivessem posiciona-
leitura. das em locais próximos, permitindo o uso
de uma única sequência selvagem na análi-
• Mutações sem sentido são aquelas que se. Somado a isso, é um fenótipo de inte-
criam um códon de parada. Para essa ati- resse da área saúde, tendo sido usado em
vidade, é necessário disponibilizar a tabe- aulas práticas do curso de graduação em
la de códons e propor que a alteração seja Odontologia. Operacionalmente, as maio-
de um único nucleotídeo, porque exigirá res dificuldades são: ter computadores com
uma análise melhor por parte do aluno. acesso à internet disponíveis e o fato de os
Há diferentes possibilidades para criar programas serem em língua inglesa. Para
os códons UAA, UAG e UGA (ou TAA, tentar contornar o problema da compreen-
TAG e TGA, na sequência do DNA). Por são dos programas, o roteiro mostra o que
exemplo, os códons para o aminoácido li- fazer e quais campos devem ser alterados.
sina (AAA ou AAG) podem ser alterados O roteiro e as sequências também podem
para TAA ou TAG, respectivamente, por ser enviados aos alunos para realizarem a
meio da mudança na primeira base. atividade fora da instituição e, nesta pro-
posta, é imprescindível a discussão após a
Proposta alternativa 2 realização da atividade para verificar o en-
Considerando que as mutações são aleató- tendimento dos alunos.
rias, é possível sortear uma região e a muta- Por fim, prevendo algumas perguntas como:
ção (troca nucleotídica, inserção ou deleção) “não foram descritas mutações sem sentido
para ser feita na sequência selvagem. Para a ou de erro de matriz de leitura?” ou “só há
análise, devem ser feitos todos os passos des- mutações em locais específicos?”, acrescen-
critos no roteiro. tamos possibilidades de trabalho alternati-
Importante: vas usando o mesmo roteiro e programas,
• Usar sempre o frame (quadro de leitura) considerando que os alunos já estarão fami-
1 (olhar roteiro) da tradução da sequên- liarizados com o processo. Outros tipos ou
cia selvagem e o frame 1 da sequência locais de mutações podem causar alterações
onde a nova mutação foi criada. fenotípicas mais graves, impedindo o desen-
volvimento, ou alterações que não promo-
• Se os programas derem erro, verifi- vam a alteração do fenótipo e, por isso, não
car se as sequências estão todas com possuem sequência descrita.

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Anexo 1
Roteiro para atividade de análise de sequência e
identificação do tipo de mutação
Identificação da mutação pelo alinhamento da sequência selvagem com
sequências obtidas em pessoas com Querubismo
Para facilitar o encontro da mutação, a sequência obtida de uma pessoa doente é alinhada
(nucleotídeos posicionados de acordo com a homologia com outra sequência) com a sequência
selvagem (sequência mais frequente na população, de uma pessoa sem a doença), usando o
programa disponível em https://www.ebi.ac.uk/Tools/psa/emboss_needle/ (Figura 1).

Figura 1.
Página do programa EMBOSS,
usado para o alinhamento de
sequências nucleotídicas. Está
destacado em amarelo o que
deve ser feito em cada campo.

Após alguns segundos, a resposta aparecerá no final da página, como mostrado na Figura 2.

Tradução de sequências codificantes


Como a sequência em que ocorreram as mutações é uma região codificante, podemos realizar
a tradução, usando o programa disponível em: https://www.ebi.ac.uk/Tools/st/emboss_
transeq/ (Figura 3). Após traduzir, copie e cole a sequência com a identificação correta em
um arquivo de texto.

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Figura 2.
Resposta do alinhamento de
duas sequências. O traço entre
os nucleotídeos simboliza que
são iguais, o ponto entre os
nucleotídeos mostra que são
diferentes.

Figura 3.
Página do programa EMBOSS,
usado para a tradução de
sequência nucleotídica. Está
destacado em amarelo o que
deve ser feito em cada campo.

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Para a tradução das sequências há duas configurações importantes: a configuração do Frame e a


do Codon Table.

Os frames são as diferentes leituras possíveis para a mesma sequência de nucleotídeos. Como
geralmente as sequências que estudamos não se iniciam com o códon de início, ou não sabemos
se a sequência é a codificante (5’-3’) ou a molde (3’-5’), realizamos a tradução de seis maneiras
de leitura (seis frames).

5' 3'
1 2 3
{
{
{
AAGTCAGCCCA

{
{
{
3 2 1
3' 5'

Para a sequência do exemplo acima, a tradução poderia iniciar em:


• AAG (iniciando no primeiro nucleotídeo);
• AGT (iniciando do segundo nucleotídeo);
• GTC (iniciando no terceiro nucleotídeo);
• ACC (iniciando do primeiro nucleotídeo, fazendo a leitura inversa);
• CCC (iniciando do segundo nucleotídeo, fazendo a leitura inversa) e
• CCG (iniciando do terceiro nucleotídeo, fazendo a leitura inversa).

Após o primeiro códon, a leitura segue de três em três nucleotídeos em sequência e o programa
pode gerar seis leituras (seis frames) (Figura 4). Nestas situações, a identificação da sequência
codificante correta é feita por consulta em banco de dados. Como esse não é o objetivo da
presente proposta, deve-se usar o frame 1 para traduzir as sequências do Anexo 2, para obter a
sequência de aminoácido funcional.

Figura 4.
Resultado da tradução de uma
sequência nucleotídica nos seis
frames.

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Em Codon Table (tabela de códons) deve-se escolher que tipo de leitura de códons o programa
fará. Dependendo do organismo ou se é um gene nuclear ou mitocondrial, alguns códons levam
à incorporação de aminoácidos diferentes daquele conhecido como padrão. No caso de genes
nucleares humanos, a leitura dos códons é standard ou padrão.

Identificação da alteração de aminoácido por alinhamento da sequência


selvagem com as sequências obtidas em pessoas com Querubismo
O programa disponível em https://www.ebi.ac.uk/Tools/msa/clustalo/ (Figura 5) será usado
para alinhar todas as sequências traduzidas.

Figura 5.
Página do programa EMBOSS,
usado para o alinhamento das
sequências de aminoácidos.
Está destacado em amarelo
o que deve ser feito em cada
campo.

O resultado aparecerá como mostrado na Figura 6.

Cada uma das sequências é comparada com a selvagem nos pontos em que há indicação de
diferença. No exemplo da Figura 6, observamos as seguintes diferenças:
Sequência 1 = 5F>I (troca de F por I na posição 5)
Sequência 2 = 3A>P (troca de A por P na posição 3)

Figura 6.
Resultado do alinhamento de
três sequências de aminoácidos.
Os asteriscos indicam que há o
mesmo aminoácido em todas
as sequências e, quando há
pelo menos um aminoácido
diferente em pelo menos uma
das sequências, é deixado um
espaço em branco (indicado
pelas setas).

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Análise das mutações


Após o registro das mudanças de nucleotídeos e de aminoácidos, podemos classificar as
mutações:
• Mutação sinônima, se observa a alteração na sequência de DNA e não na sequência de
aminoácidos.
• Mutação conservativa, se observa a alteração de aminoácido e ambos possuem as mesmas
características químicas, o que pode manter a função da proteína, mas não é uma regra.
• Mutação de sentido errado, se observa a alteração de aminoácidos, que apresentam
características químicas diferentes.
• Mutação sem sentido, quando um códon de aminoácido é trocado por um de término.

A Tabela 1 lista os aminoácidos, as diferentes abreviaturas usadas para eles (uma letra e três
letras) e sua característica química. A tabela 2 é uma sugestão para a organização e apresentação
dos resultados.

Aminoácido Abreviaturas Característica química Tabela 1.


Ácido glutâmico E Glu ácido Aminoácidos que compõem
sequência de proteínas, suas
Alanina A Ala alifático
abreviaturas e característica
Arginina R Arg básico química (indicada pelas cores).
Asparagina N Asn amídico
Aspartato ou ácido aspártico D Asp ácido
Cisteína C Cis com enxofre
Fenilalanina F Phe aromático
Glicina G Gli alifático
Glutamina Q Gln amídico
Histidina H His básico
Isoleucina I Ile alifático
Leucina L Leu alifático
Lisina K Lis básico
Metionina M Met com enxofre
Prolina P Pro alifático
Serina S Ser hidroxilado
Tirosina Y Tir aromático
Treonina T Thr hidroxilado
Triptofano W Trp aromático
Valina V Val alifático

Alteração Alteração Tabela 2.


Sequência Tipo de mutação Modelo para apresentação das
nucleotídica aminoácido
respostas sobre mutações que
Ex. 120T>A 40F>I Sentido errado (aromático por alifático) causam Querubismo.

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Anexo 2
Sequências de 282 nucleotídeos de DNA do gene SH3BP2 para análise
>selvagem
C AG G C AG C T TG CC G TCC TC AC AC AG AG G G TG G AG TG G G G AG G G G AG C AG AG G G TG G CC G CCCC G TG TC TG AC AG TG A A A
T G G T C C T G C C T T C C T C T C C C T G C C C C T C C A G G C G AT C A C C C C C C G AT G G G C A G A G T T T C A G G A G C T T C T C C T T T G A A A A
G C C C C G G C A A C C C T C A C A G G C T G A C A C T G G C G G G G A C G A C T C G G A C G A G G A C TAT G A G A A G G C A A G G C T G A G C G G C A A
G C C T G G G T C C C A G T G G C C A G TA G G T G G A C A G G T G G T G G G A A A G C C A
>1
C AG G C AG C T TG CC G TCC TC AC AC AG AG G G TG G AG TG G G G AG G G G AG C AG AG G G TG G CC G CCCC G TG TC TG AC AG TG A A A
T G G T C C T G C C T T C C T C T C C C T G C C C C T C C A G G C G AT C A C C C C G C G AT G G G C A G A G T T T C A G G A G C T T C T C C T T T G A A A A
G C C C C G G C A A C C C T C A C A G G C T G A C A C T G G C G G G G A C G A C T C G G A C G A G G A C TAT G A G A A G G C A A G G C T G A G C G G C A A
G C C T G G G T C C C A G T G G C C A G TA G G T G G A C A G G T G G T G G G A A A G C C A
>2
C AG G C AG C T TG CC G TCC TC AC AC AG AG G G TG G AG TG G G G AG G G G AG C AG AG G G TG G CC G CCCC G TG TC TG AC AG TG A A A
T G G T C C T G C C T T C C T C T C C C T G C C C C T C C A G G C C AT C A C C C C C C G AT G G G C A G A G T T T C A G G A G C T T C T C C T T T G A A A A
G C C C C G G C A A C C C T C A C A G G C T G A C A C T G G C G G G G A C G A C T C G G A C G A G G A C TAT G A G A A G G C A A G G C T G A G C G G C A A
G C C T G G G T C C C A G T G G C C A G TA G G T G G A C A G G T G G T G G G A A A G C C A
>3
C AG G C AG C T TG CC G TCC TC AC AC AG AG G G TG G AG TG G G G AG G G G AG C AG AG G G TG G CC G CCCC G TG TC TG AC AG TG A A A
T G G T C C T G C C T T C C T C T C C C T G C C C C T C C A G G C A AT C A C C C C C C G AT G G G C A G A G T T T C A G G A G C T T C T C C T T T G A A A A
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Anexo 3
Resposta da atividade
1) Tradução das sequências de DNA.
>selvagem
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>1
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2) Resultado do alinhamento das sequên- destaque estão as alterações de aminoácidos


cias de aminoácido. causadas pelas mutações e, sublinhada, a se-
quência selvagem, que deve ser usada para fa-
A imagem abaixo corresponde ao alinha- zer todas as comparações de cada sequência
mento das sequências de aminoácidos. Em obtida de um paciente.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 69


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3) Identificação das alterações do DNA e A tabela abaixo mostra as alterações em nu-


proteína de cada sequência e análise do cleotídeos e aminoácidos de sete sequências
tipo de mutação. que causam Querubismo e a classificação da
mutação.

Alteração Alteração Tabela.


Sequência Tipo de mutação Resposta da atividade.
nucleotídica na proteína

1 122C>G 41P>R Sentido errado (alifático por básico)

2 113G>C 38R>P Sentido errado (básico por alifático)

3 113G>A 38R>Q Sentido errado (básico por amídico)

4 122C>T 41P>L Conservativa (ambos alifáticos)

5 122C>A 41P>H Sentido errado (alifático por básico)

6 128G>A 43G>E Sentido errado (alifático por ácido)

7 127G>C 43G>R Sentido errado (alifático por básico)

Observações: a resposta apresentada significa: a posição da mutação (ex.: 122 na sequência 1), o
nucleotídeo da sequência selvagem (ex.: C na sequência 1) e o nucleotídeo da sequência do
paciente (ex.: G na sequência 1). Para os aminoácidos, a lógica é similar, na qual o número
é a posição na sequência, a primeira letra é o aminoácido da sequência selvagem e a última
letra é o aminoácido da sequência do paciente. Para o paciente 4, apesar de ter ocorrido
uma alteração conservativa, a pessoa apresenta o fenótipo doente.

Para saber mais


mutation in the gene encoding c-Abl-binding
protein SH3BP2 causes cherubism. Am J Med
Genet A,15: 37-40.
KANNU P, BASKIN B, BOWDIN S. Cherubism.
2007 [Atualização 2018]. In: ADAM MP, AR- OMIM - Online Mendelian Inheritance in Man.
DINGER HH, PAGON RA, et al., editors. https://www.omim.org/. Acessado em
GeneReviews. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/ 17/03/2022
books/NBK1137/. Acessado em 15/01/2022
UEKI Y, et al. 2001. Mutations in the gene encoding
LO B, FAIYAZ-UL-HAQUE M, KENNEDY S, c-Abl-binding protein SH3BP2 cause cherubism.
AVIV R, TSUI LC, TEEBI AS. 2003. Novel Nat Genet, 26:125-126.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 70


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Um monge
no jardim

Adauto Lima Cardoso, Ana Carolina Guedes Pedreira, Ana Carolina Milos Alves da Silva,
Ariana Musa de Aquino, Arthur Gasparindo Moreira, Ciro Hugo Elnatan de Souza Santos,
Gabriela Larissa Lima da Silva, Larissa Baldo Vieira, Layla Nechy Rodrigues dos Santos,
Maiara Ribeiro Cornacini, Renato de Oliveira Neves, Solange Rivas, Vitor Luiz da Silva
Bando de Teatro Científico Siriema, Agência de Divulgação Científica e Comunicação, Instituto de Biociências de Botucatu,
Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP
Os autores estão listados em ordem alfabética e todos contribuíram igualmente para o trabalho
Autor para correspondência - siriemabtc@gmail.com
Palavras-chave: teatro científico, Genética, DNA, cromossomo, célula, síndrome de Down

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Genética - é o estudo da
hereditariedade e de todos os
aspectos do gene.

A peça teatral “Um monge no jardim” (Anexo) aborda diversos temas na área de genética, in-
cluindo desde a referência histórica sobre o surgimento da genética mendeliana até conceitos
básicos atuais, como a definição de célula, cromossomos, genes e herança genética. O texto
também se debruça sobre a existência das síndromes cromossômicas e conduz a uma reflexão
sobre a inclusão social de pessoas com síndrome de Down.
Síndrome de Down - conjunto
de fenótipos humanos
Além dos conceitos essenciais relacionados Além disso, envolver no processo estudantes decorrentes da trissomia
à área, a obra contempla ainda a figura do que ainda não tiveram contato com esse co- do cromossomo 21. Inclui,
dentre suas manifestações,
cientista, caracterizado como um ser curioso. nhecimento deve instigá-los a buscar conhe- a deficiência intelectual,
Este personagem em específico é muito im- cimento extra. aumento do risco de doenças
portante para enfatizar a temática e também cardíacas, dificuldades motoras
para trabalhar a ideia de humanização dos Para a encenação são necessários onze ato- e características físicas
pesquisadores, além de contribuir para a des- res, cujo figurino e características podem ser como olhos oblíquos, rosto
adaptados de acordo com os recursos dispo- arredondado, orelhas pequenas,
mistificação do estereótipo de cientista. O mãos pequenas com dedos
personagem, juntamente com o coro de cro- níveis e as ideias do proponente da atividade. curtos, língua protusa e estatura
mossomos, são, precisamente, os elementos Essa peça foi originalmente roteirizada e en- baixa.
que geram a coesão da peça ao conduzir uma cenada por estudantes de graduação e pós- Trissomia - condição na
conversa cheia de indagações e interações -graduação da Universidade Estadual Pau- qual estão presentes três
com o cenário e com todos os demais per- lista “Júlio de Mesquita Filho”, na intenção cromossomos de um mesmo
de ser levada ao ambiente escolar. É possível tipo em vez de dois, em
sonagens. Ademais, em alguns momentos, o uma célula.
cientista interage diretamente com o público. consultar como foi realizada pela primeira
vez através do link: https://www.youtube. Célula - é a unidade básica
estrutural e funcional dos seres
A linguagem utilizada para trabalhar os con- com/watch?v=f1_Rl3Xhjuo&feature=you-
vivos. Toda célula é composta
ceitos foi escolhida na intenção de abranger tu.be por citoplasma envolto por uma
públicos diversos, incluindo, por exemplo, membrana, material genético e
estudantes dos ensinos fundamental e mé-
dio. O curto tempo de duração da cena (cer-
Personagens outras biomoléculas.
Cromossomos - estruturas
ca de 10 minutos) foi pensado para facilitar a Coro (Cromossomos): É composto por um constituídas por proteínas
execução dessa atividade sem comprometer a e ácidos nucleicos e estão
conjunto de cinco atores que interpretam presentes aos pares no núcleo
rotina escolar, além de minimizar a dispersão diferentes cromossomos. Eles se caracteri- de células eucariotas. Por
dos espectadores. Por sua vez, os figurinos e zam de forma neutra e semelhante, muitas serem constituídos por DNA,
cenários foram construídos de forma mini- vezes agindo como um único personagem. são as estruturas das células
malista, visando atender a diversas realidades O coro guia a apresentação fazendo per- que carregam os genes.
Humanos apresentam 23 pares
escolares. É possível realizar a montagem da guntas, apresentações de personagens e de cromossomos: 22 pares
peça com materiais de baixo custo ou mesmo encenações com o protótipo celular a fim autossômicos e 1 par sexual.
reaproveitados. de elucidar os conceitos abordados du- Gene - unidade fundamental
rante a peça. A atuação do coro de cro- da informação biológica. Um
A apresentação do conteúdo no formato de
mossomos é cheia de expressões faciais e gene é um trecho de DNA
teatro pode permitir que os alunos se sintam que carrega a informação para
gestos para enriquecer o enredo através
sensibilizados pelo assunto e se identifiquem produção de alguma molécula
da linguagem corporal. O figurino pode funcional na célula.
com as ideias abordadas. Além disso, eles
ser composto de roupas pretas, luvas, ma-
também poderão desenvolver habilidades Herança genética (ou
quiagem toda branca e batom vermelho hereditariedade) - é o
relacionadas com a produção de figurinos e
para destacar os lábios. processo de transmissão de
cenário, direção, atuação, sonografia, entre
traços e características ao longo
outras funções. Realizar a montagem da peça Cientista: A cientista é uma personagem das gerações.
com estudantes que já tiveram contato com muito atenta, comunicativa, interessada e DNA - molécula biológica
os temas abordados deve auxiliar no apren- atenciosa. Ela se expressa com clareza e se localizada no interior das
dizado e no aprofundamento dos conteúdos. dispõe, com muita vontade, a responder as células e que carrega a
informação genética.

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perguntas feitas pelo coro, inclusive cha- palavras. Seu figurino remete à roupa tra-
mando outros personagens para auxiliá-la dicional usada por frades católicos agosti-
na ilustração dos conceitos. Essa persona- nianos, e é composto de uma túnica mar-
gem frequentemente se dirige diretamente rom, uma corda sendo utilizadas como
ao público, mediando a interação entre a cinto, sandálias ou chinelos e também um
plateia com os demais componentes das par de óculos.
cenas. Ela possui a função de quebrar o
paradigma do cientista inatingível, inco- Senhorita Genética: Esse personagem é
municável e ininteligível. Do ponto de uma cientista, porém, especializada em
vista textual, a personagem é um impor- genética. Ela é uma figura elegante e mui-
tante elemento de coesão entre as cenas. O to prestigiada. Se expressa de forma asser-
figurino usado pode ser o de um cientista tiva e possui a função de colaborar com a
clássico do imaginário popular, composto cientista na elucidação de conceitos. Seu
por jaleco, óculos e outros elementos cien- figurino pode ser composto por um vesti-
tíficos (lupa, vidrarias, entre outros). do com elementos que remetem à área de
genética. Nessa personagem há a desvin-
Monge: esse personagem representa a figu- culação da figura do cientista do conceito
ra de Gregor Johann Mendel, um frade de pessoa estudiosa destituída de beleza
agostiniano alemão do século XIX que ou vaidade estética.
foi reconhecido mundialmente por seus
trabalhos nas áreas de botânica e genética Mãe: A personagem representa as diversas
e por escrever sobre as leis da hereditarie- mães que se encontram preocupadas com
dade, mais tarde conhecidas por “leis de a saúde de seu filho e procuram aconse-
Mendel”. Embora, em sua época, Mendel lhamento médico a fim de encontrar res-
não tivesse qualquer conhecimento sobre postas para dúvidas gerais sobre a gesta-
termos e conceitos como os de "gene" e ção, desenvolvimento, etc. Ela se mostra
"DNA", o personagem incorpora essas in- preocupada com a saúde de seu bebê,
formações. Na peça, o monge é mostrado que tem a síndrome de Down, mas vai se
como um personagem tranquilo e pacien- resignando à medida que recebe esclare-
te, que calmamente explica os conceitos de cimentos sobre essa condição genética.
genética. Ele possui um sotaque alemão Seu figurino pode ser composto por um
estereotípico, que pode ser facilmente si- vestido longo e confortável para a barriga
mulado com a pronúncia carregada do R da gestante, um lenço nos cabelos, além de
e com a inversão do gênero de algumas um sapato casual.

Figura 1.
Registro do elenco da primeira
montagem da peça “Um
monge no Jardim” apresentada
no Auditório do Instituto
de Biociências de Botucatu,
Universidade Estadual Paulista.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 73


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Pai: Este personagem se revela sempre mui- com síndrome de Down e a importância
to preocupado com a saúde de sua esposa dos pais e da sociedade na inclusão dessas
(Mãe) e de seu bebê, que está prestes a vir crianças na sociedade. Ela usa cabelo pre-
ao mundo. Assim como a Mãe, à medida so, roupa social, jaleco com nome ou um
em que ele compreende a síndrome de crachá, pouca maquiagem e um estetoscó-
Down e se liberta de preconceitos, passa a pio apoiado ao pescoço.
ter uma visão humanista e inclusiva.
Enfermeira: A enfermeira é atenta e acolhe-
Médico (a): Esta personagem tem a função dora. Ela usa o cabelo preso e um jaleco
de trazer informação e quebrar os para- simples e carrega consigo um recém-nas-
digmas e preconceitos. A médica orien- cido, o qual apresenta ao coro de forma
ta sobre os cuidados para com a criança animada.

Figura 2.
Registro da peça “Um Monge
no Jardim” sendo apresentada
no Auditório do Instituto de
Biociências de Botucatu, em
que aparecem o “Coro de
cromossomos” e o “Monge”
explicando o conceito de gene.

Protótipo estrutura e organização da célula eucariótica


e do DNA. Os materiais utilizados para sua
produção são de baixo custo, como bacias de
A peça aborda estruturas biológicas que es-
plástico, esferas de plástico, tinta de artesa-
tão em nível microscópico, o que pode tornar
nato, fita autoadesiva (velcro), cola quente,
difícil a compreensão do conteúdo. Para auxi-
papel celofane, arame e barbante colorido. O
liar no entendimento desses temas, foi criado
protótipo pode ser montado pelos próprios
um protótipo de célula eucariótica (Figura 3)
estudantes e pode ser utilizado em outras
que é utilizado pelo personagem Monge para
atividades que envolvam os conhecimentos
explicar conceitos de biologia celular e gené-
de biologia celular e genética.
tica. Esse recurso aborda de maneira básica a

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Figura 3.
Protótipo de célula
eucariótica. (A) Representação
de célula eucariótica produzida
com esferas de plástico pintadas
com tinta de artesanato; uma
esfera isolada representa uma
única célula, a união das esferas
representa a associação de
células formando organismos
multicelulares; pequenos
pedaços de fita autoadesiva são
colados nas esferas, permitindo
que elas fiquem na forma livre
ou que sejam agrupadas. (B)
Protótipo de célula eucariótica
fechado, construído com
duas bacias pintadas com
tinta de artesanato e fixadas
pelas bordas por arames. (C)
Protótipo de célula eucariótica
aberto, no qual podem ser
observados citoplasma, núcleo e
material genético. (D) Esquema
representando as estruturas
celulares que podem ser
observadas no protótipo.

Considerações São Paulo (2015/16661-1; 2017/07484-4)


e à Professora Doutora Adriane Pinto Was-
finais ko (IBB-UNESP) pelo incentivo para reali-
zação dessa atividade.
A divulgação científica e a popularização da
ciência estão cada vez mais presentes no nos-
so cotidiano, constituindo um importante
papel das universidades e das escolas de for-
ma a levar para a sociedade os assuntos cien-
tíficos mais variados. Tão importante quanto
popularizar a ciência é a maneira como esse
processo é realizado. O teatro científico, nes-
se sentido, une dois elementos fundamen-
tais: a arte como forma de expressão humana
e a ciência como forma de obtenção de co-
nhecimento. Essa união de áreas tem enorme
potencial para levar o conhecimento para a
sociedade, contribuindo para tornar a popu-
lação mais interessada por ciência.

Agradecimentos
Agradecemos o apoio estrutural da Agên-
cia de Divulgação Científica e Comunica-
ção (AgDC) do Instituto de Biociências de
Botucatu da Universidade Estadual Paulista
(IBB-UNESP), ao apoio financeiro da Fun-
dação de Amparo à Pesquisa do Estado de

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Anexo
Um monge no jardim
Personagens
Cientista
Monge
Srta. Genética
Mãe/Enfermeira
Pai
Médico(a)
Coro (Cromossomos): CI, CII, CIII e CIV
Época
Presente
Lugar da cena
Jardim

ATO I
Inicialmente, juntam-se à cena um coro formado por quatro cromossomos (CI, CII, CIII e CIV). Os personagens estão com vestes
pretas e situam-se em uma das laterais do cenário, composto por uma mesa central com algumas canetas, um caderno, pastas e, se
possível, elementos que remetam às ciências naturais (lupa, vidrarias e afins).
CENA I
O coro a uma só voz começa:
— Cromossomos um coro
Tão somente somos
Iguais
Cromossomos:
Nada mais
CENA II
O personagem “Cientista” entra na cena trajando um jaleco branco comprido, óculos e uma pasta. Até que o CI começa o diálogo,
apresentando nosso personagem:
CI: — Como todos podem ver, essa cidadã é uma cientista.
Cientista: — Muito prazer, sou uma cientista, como todos podem ver.
CII: — O que exatamente é um cientista?
CIII: — Um ser curioso, que sempre quer saber mais.
CIV: — Sobre os seres vivos, o universo…
Cientista: — E como somos.
Todos: — Cromossomos.
Cientista: — Sempre tem alguém que comenta na família ou entre os amigos:
CI: — Meu Marcelinho puxou a tia Hercília.
CII: — Tenho diabetes como o vovô.
CIII: — É a cara cuspida e escarrada do pai.
CIV: — Minha irmã tem olhos azuis e eu não.
CENA III
Nesse momento, a enfermeira entra em cena com uma criança recém nascida (uma boneca) enrolada numa manta:
Enfermeira: — Acabou de nascer, venham ver!
(rodeiam o “bebê”)
CI: — Bilú, bilú!
CII: — Para quem será que puxou?
CIII: — Tem o queixinho da mãe! “Cuti, cuti!”
CIV: — Igualzinho o joelho do tio Osvaldo!
Enfermeira: — Que cor de olhos será que vai ter?
(Congelam o quadro)

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ATO II
Nesse momento, uma nova cena se forma na história. A cientista passa a explicar para o público os fenômenos genéticos que fazem
parte do enredo. Assim, ela relembra a História da Genética, trazendo à tona as considerações de Mendel, algumas definições
importantes na área médica e científica.
CENA I
Cientista: — Quem primeiro se preocupou com essas questões, como: porque somos altos, ou baixos, de que cor são nossos
olhos… enfim, nossas características, foi um monge, no século dezenove, que estava um dia em seu jardim,
plantando ervilhas de cheiro.
(bate palmas)
— Tragam um jardim, por favor!
CENA II
O coro sai apressado, junto com a enfermeira, e voltam trazendo vasinhos de plantas que colocam na frente do palco. Entra o monge
com um regador.
O monge possui um sotaque alemão carregado. Esse sotaque pode ser interpretado pelo ator carregando na pronúncia dos R’s das
palavras, deixando de conjugar alguns verbos (ex.: são = ser) e trocando o gênero das palavras.
Música - (https://www.youtube.com/watch?v=nNH1uZetbro). O monge assobia.
Monge: — Estas ervilhas são muito interessantes. Meus interesses científicos me levaram a investigar os padrões de herança
(Exemplo de uso do sotaque: Essas ervilhas ser muito interressantes. Minhas interresses cientificas me levarram a
estudar os padrrões de herrança).
CI: — Herança? Tipo assim um tesouro, senhor Monge?
CII: — Um terreno, uma casa, um dinheiro bom guardado no banco?
CIII: — Ou debaixo do colchão?
CIV: — Ou será em um cofre?
Monge: — Não, não, não, quando eu digo herança, quero dizer herança genética. O que herdamos de nossos antepassados.
CI: — Tipo assim as manias, senhor Monge?
CII: — A profissão e as coisas que gostamos de fazer?
CIII: — Os objetivos de vida que vamos ter?
CIV: — Ou as comidas que preferimos comer?
Monge: — Essas coisas que vocês mencionaram não são coisas que vem do nascimento, são preferências que dependerão da
criação e do ambiente em que a pessoa vive. Portanto, elas não são herdadas. Quando eu digo herança genética me
refiro às características passadas dos pais para os filhos, que estão no DNA de nossas células (Essas coisas que vocês
mencionarram non ser coisas…).
CI: — Células?
CII: — São insetos como libélulas?
CIII: — DNA?
CIV: — Nessas letras o que há?
Monge: — Células são coisas muito pequenas que compõem os seres vivos. Uma célula sozinha não pode ser vista sem a ajuda
de um microscópio. Milhares de células juntas são o que formam pessoas, plantas e outros animais. E o DNA são
estruturas que ficam dentro do núcleo das células e são responsáveis pelas nossas características. Cada pedaço do DNA
tem uma função específica, que contribui para as nossas características, como a cor da nossa pele, cor dos nossos olhos
e nossa altura. Cada pedacinho desse DNA é chamado de gene (Pronúncia: Células ser coisas muito pequenas…).
(Nessa explicação, Mendel mostra um protótipo de célula gigante, de onde tira um núcleo, e do núcleo retira o material genético
conforme a explicação).

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CENA III
Cientista: — Mendel, o monge do século dezenove, não sem razão é chamado o pai da genética. Genética é o nome da ciência
que estuda o DNA e os genes. Que entre agora a senhorita Genética, uma brilhante cientista geneticista, ou seja,
uma especialista em genes.
Surge, portanto, uma nova personagem no enredo, a Senhorita Genética, quem vai explicar os processos biológicos envolvidos mais
precisamente. A personagem é muito elegante e bem vestida.
Música de entrada da geneticista ( https://www.youtube.com/watch?v=CUwMw0R_6TU)
Srta. Genética: (ajudando o monge a sair de cena)
— Muitas características são comuns entre os membros de uma família, como vocês já devem ter notado. A cor de
cabelo, cor dos olhos, ou até mesmo a chance de ter algumas doenças têm geralmente a ver com a genética.
São os padrões de herança humana, ou seja, características que passam dos pais para os filhos, como bem
descobriu Mendel estudando suas ervilhas.
Cientista: — Mendel realizou seus experimentos utilizando a ervilha de jardim, mostrando que a curiosidade pode nos fazer
descobrir coisas incríveis a partir de quaisquer interesses.
CI: — E eu que pensava que ervilhas só eram boas para sopa.
CII: — Então quer dizer que nossas características são determinadas pelos genes, que são herdados dos nossos pais.
CIII: — Andaram estudando, é?
CIV: — E nós? Cromossomos?
Srta. Genética: — Os cromossomos são conjuntos de genes, que são feitos de DNA. O ser humano possui 46 cromossomos, em
23 pares que carregam nosso material genético.
CII: — Como uma quadrilha de festa junina.
Música de quadrilha (https://www.youtube.com/watch?v=Q45AKyWxuY8. Os cromossomos saem em uma dança típica).
CIII: — Olha a cobra!
CIV: — Olha a ponte!
Srta. Genética: — Digamos que é assim mesmo. Vinte e dois parzinhos idênticos, e tem também o par de cromossomos que
define se vai ser menina ou menino, os chamados “cromossomos sexuais”, e eles têm tamanhos diferentes. São
os cromossomos X e Y.
(um par de cromossomos coloca um chapéu de palha e outro grinalda de noivinha, dançam a música junina).
Cientista: — O cromossomo 21 é o menor de todos. Um vem da mãe e outro do pai, como em todos os outros pares. Às vezes,
e ninguém sabe por que, a pessoa tem três cromossomos 21, ao invés de 2. A essa situação com 3 cromossomos
21 chamamos de trissomia do 21 ou síndrome de Down. Nessa situação, um dos dois, o pai ou a mãe, mandou dois
cromossomos em vez de um.
CI: — Um erro?
Cientista: — Mas o resultado não é um erro. Vamos imaginar uma cena assim:
CENA IV
Entra um casal, no qual a esposa está grávida. O casal passa numa consulta médica para entender como está o andamento da
gravidez:
Médico: — Como estão?
Mãe: — Olá, doutor. Perfeitamente bem, doutor!
Médico: — Doutor não. Doutor é quem tem doutorado. Eu sou médico.
Pai: — Os exames ficaram prontos, médico?

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 78


MATERIAIS DIDÁTICOS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Médico: — Sim, e pelos resultados já podemos afirmar que o bebê de vocês terá síndrome de Down.
Pai: — Nosso filho vai nascer doente?
Mãe: — Por que justamente conosco? Deve ter acontecido algum engano, não é possível.
Médico: — O bebê não é doente. É uma criança que, como todas as outras, precisa principalmente de carinho, alimentação
adequada, cuidados com a saúde e um ambiente acolhedor.
Pai: — Vai ter olhinhos puxados, então?
Médico: — É uma característica das pessoas com síndrome de Down. Leva um tempo para os pais se acostumarem com a ideia de
ter um filho com trissomia do 21, que pode levar a criança a ter alguns comprometimentos.
Mãe: — Quais comprometimentos?
Médico: — A criança provavelmente vai demorar um pouquinho mais para sentar, andar, pode ter algumas dificuldades de
movimentação e vai demorar mais para falar. Mas cada criança é uma criança, única em seu modo de ser e interagir
com o mundo.
Mãe: — Meu medo é que tenha problemas no coração. É comum que essas crianças tenham, não é?
Médico: — Em uma parte dos casos. Mas há maneiras médicas de resolver o problema, se o problema de fato for um problema.
Pai: — Nosso filho vai poder frequentar uma escola regular?
Médico: — Ele deve frequentar uma escola regular.
Mãe: — Então, assimilando a ideia aos poucos, seremos pais de uma criança especial?
Médico: — Todo filho é especial. Único. O preconceito e a discriminação são os piores inimigos. As crianças com síndrome de
Down são pessoas inteligentes e sensíveis, amorosas e gentis, como qualquer outra criada com amor e respeito.
Mãe: — Tem razão, seu médico.
(Neste momento foram acalmados os ânimos. O pai olha para os olhos da esposa gentilmente e pega em suas mãos para proferir
o texto):
Pai: — Nosso filho será feliz, porque será amado.
CENA V
Última cena da peça. Entram todos os personagens ao som de uma música de fundo disponível no link https://www.youtube.com/
watch?v=Vbv-xyiWTRI. A intenção é que seja uma cena mais sensível e reflexiva.
CI: — Pode ser que venha a ser um jardineiro.
CII: — Que cuide das ervilhas de cheiro .
CIII: — Porque certo dia, em um jardim, um monge descobriu os genes e sua importância.
CIV: — E isso fez do ser humano, um pouco mais conhecedor de si mesmo.
Cientista: — Não se sabe muitas vezes para o que viemos, mas o importante é que estamos aqui. E podemos a cada dia descobrir
mais sobre nós através da ciência.
Srta. Genética: — E fazemos parte dos nossos, de quem herdamos o que somos.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 79


RESENHAS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Paper Models: um recurso


pedagógico acessível para
o ensino da estrutura de
ácidos nucleicos e proteínas
Renato Massaharu Hassunuma1, Luan Ednelson Soares Garcia2, Giovanni Augusto Lima de Oliveira3,
Patrícia Carvalho Garcia1, Michele Janegitz Acorci-Valério1, Marjorie de Assis Golim4,
Sandra Heloisa Nunes Messias5
1
Curso de Biomedicina, Universidade Paulista, UNIP, Bauru, SP
2
Graduando Biomedicina, Universidade Paulista, UNIP, Bauru, SP
3
Graduando Ciências Biológicas, Universidade Paulista, UNIP, Bauru, SP
4
Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", UNESP, Botucatu, SP
5
Curso de Biomedicina, Universidade Paulista, UNIP, São Paulo, SP
Autor para correspondência - rhassunuma@gmail.com
Palavras-chave: ácidos nucleicos, jogos e brinquedos, proteínas

A visualização da estrutura tridimensional de biomoléculas pode ser de difícil compreensão


para alunos quando o professor se utiliza de recursos bidimensionais tradicionais para apre-
sentação delas, como projeções em tela ou imagens impressas. Neste contexto, a utilização de
modelos didáticos de papel pode ser um recurso bastante acessível para ser utilizado em sala
de aula que, além de motivar, também permite que o aluno estabeleça uma conexão entre a
aula teórica e o desenvolvimento da atividade prática.
A página Paper Models (Modelos de papel, papel sulfite A4, com instruções de monta-
na tradução livre) pertence ao site Protein gem em inglês e vídeos disponíveis no You-
Data Bank e seu acesso pode ser obtido Tube com legenda com tradução automática
por meio do link: https://pdb101.rcsb.org/ para o português.
learn/paper-models. Esta página disponibi-
liza moldes para impressão em papel de áci- É importante ressaltar que, para montagem
dos nucleicos e proteínas de interesse bioló- dos modelos de papel, o aluno irá necessitar
gico, que o professor pode utilizar em sala de apenas do material impresso, tesoura, cola e
aula em disciplinas de Ciências, Genética ou fita adesiva. Assim, além da atividade possuir
Bioquímica do Ensino Médio ao Superior, baixo custo, ela também permite a produção
possuindo interdisciplinaridade com outras ilimitada de peças.
áreas como Artes e Matemática. A construção das moléculas pode ser realiza-
Alguns já são bastante conhecidos no meio da de forma individual ou em grupo. Como as
acadêmico, como o origami de DNA, mas instruções estão em inglês, o próprio professor
existem outros para o RNA transportador, pode explicar as etapas de montagem. Ao final
imunoglobulina G, insulina, proteínas fluo- da construção das biomoléculas de papel, o do-
rescentes verde e vermelha, receptor acopla- cente pode comparar o modelo criado com ima-
do a proteínas G e estruturas dos vírus da gens bidimensionais de livros ou de projeções.
dengue, HIV, HPV, Zika, entre outros. Caso o professor preveja que os alunos terão
dificuldade na execução do modelo, ele mesmo
Os modelos estão disponíveis em arquivo no pode construí-lo previamente à aula, utilizando
formado PDF, podendo ser impressos em o material apenas de forma expositiva.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 80


RESENHAS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

A partir da análise da estrutura tridimensio- molécula? Quantos nucleotídeos ou aminoá-


nal das moléculas construídas, o professor cidos compõem a molécula? O que é a estru-
pode realizar questionamentos como: qual tura secundária e terciária de uma proteína?
a diferença entre uma proteína e um ácido É importante mencionar, contudo, que as per-
nucleico? Onde estão localizadas e quais são guntas devem ser realizadas de acordo com o
os tipos de ligações químicas presentes nesta conteúdo e nível de escolaridade dos alunos.

Figura 1.
Instruções e Modelo de
papel do RNA transportador
apresentado na página Paper
Models. Fonte: tRNA paper
model. Disponível em: https://
pdb101.rcsb.org/learn/paper-
models/trna. Acesso em: 29
set. 2022.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 81


RESENHAS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Heather Dewey-Hagborg:
arte contemporânea,
biopolítica e genética
Paula Fernandes Tavares Cezar-de-Mello
Colégio Pedro II, Campus Duque de Caxias
Autor para correspondência - paulamello@cp2.g12.br
Palavras-chave: ensino de genética, bioarte, determinismo genético, privacidade genômica, biohackers e biopolítica

Heather Dewey-Hagborg é uma artista contemporânea estadunidense que desenvolve obras


transdisciplinares por meio da tecnologia e da ciência. A artista ganhou a atenção dos críticos
e da mídia a partir da polêmica exposição intitulada Stranger Visions (2012 – 2013), obra
construída a partir do DNA presente em artefatos recolhidos pela artista nas ruas de Nova
Iorque. Unhas, cabelos, chicletes mascados e bitucas de cigarro serviram de fonte para obten-
ção do material genético deixado por desconhecidos (stranger) com a finalidade de reconstruir
seus respectivos rostos (visions) impressos em 3D (figura). Essa obra deu início a uma série
de outros projetos de bioarte, tendo o DNA como fonte problematizadora e fio condutor de
questionamentos e intersecções que reúnem aspectos das artes, genética e biopolítica.

O DNA e a biotecnologia já foram temas de aparentaria, agiria e pensaria? O quanto eu


outras manifestações artísticas, a exemplo de poderia saber sobre uma pessoa a partir de um
Genesis (1999) e GFP Bunny (2000), do ar- único fio de cabelo?” É provável que algumas
tista carioca Eduardo Kac. Dewey-Hagborg dessas perguntas já tenham cruzado nossos
coloca em pauta a privacidade dos dados pensamentos e os dos nossos alunos, afinal,
genéticos – ao utilizar, sem consentimento, a ciência de identificação genética de indiví-
DNAs encontrados em vias públicas – e o duos não é nova e permeia o nosso cotidiano
determinismo genético – ao trabalhar com na vida real e na ficção.
o imaginário de que o genoma determinaria
fidedignamente as feições e os traços (fenóti- A articulação entre arte contemporânea,
pos) dos indivíduos. A concepção do projeto ciência e ensino de genética, nesse ponto,
foi deflagrada pela presença de uma impres- já deve ser conspícua e, dentre as inúmeras
são ou pegada genética – um fio de cabe- possibilidades pedagógicas que esse trabalho
lo – preso em uma rachadura da vidraça da apresenta, destaco três: (1) determinismo
sala de terapia: “de quem seria? Como o dono genético – a artista expõe um pressuposto

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 82


RESENHAS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

de que os genes e seus efeitos são determi- privacidade genética. (3) Biohackers e bioé-
nantes exclusivos dos fenótipos observáveis, tica – uma crescente cultura de amadores,
discussão que pode ser articulada com Pro- ou não, adeptos do do-it-yourself (DIY), di-
bably Chelsea (2017), obra da mesma artista fundida especialmente no campo da Biologia
que propicia uma crítica mais incisiva ao de- Molecular. Heather se tornou uma biohacker,
terminismo genético. Nela, são estimadas 30 apropriando-se de técnicas de Biologia Mo-
possibilidades de rostos para Chelsea Man- lecular e Bioinformática, colocando a “mão na
ning, ativista política que vazou documentos massa” na coleta, extração do DNA e análise
confidenciais para o WikiLeaks. (2) Privaci- dos dados. Tal prática levanta dúvidas sobre,
dade genômica – a exemplo dos dados no ci- por exemplo, a regulamentação e permissão
berespaço, os dados genéticos também estão de tais atividades, no âmbito da privacidade,
expostos. A obra denuncia a vigilância genéti- da bioética e da biossegurança.
ca à espreita, seja pelos rastros genéticos ou
pela popularização de testes genéticos direto Um olhar mais refinado e detalhado nessas e
ao consumidor. A abordagem possibilita dis- em outras obras de bioarte de Heather De-
cussões interdisciplinares a respeito dos li- wey-Hagborg apontarão mais intersecções
mites legais e éticos desejáveis para garantir a no ensino e possibilidades de debates com
outras áreas do conhecimento.

Figura.
Stranger Visions. Chiclete
mastigado e rosto estimado
a partir dos rastros genéticos
deixados por um desconhecido.
Imagens: https://commons.
wikimedia.org/.

ANEXO
Sobre os artistas
Eduardo Kac Heather Dewey-Hagborg
Site: http://www.ekac.org/transgenicin- Site: http://www.deweyhagborg.com/,
dex.html, acessado em 19/11/2022. acessado em 19/11/2022.
TEDx Vienna: https://youtu.be/IS_5WJ- TEDx Vienna: https://youtu.be/666K-
teCC8, acessado em 19/11/2022. q95xm1o, acessado em 19/11/2022.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 83


UM GENE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Dsup: um gene de
tardígrado associado à
tolerância à radiação

Vitor Nolasco de Moraes1,2, Danyel Fernandes Contiliani1,2,3,


Tiago Campos Pereira1,2
1
Depto de Biologia, FFCLRP, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP
2
Programa de Pós-Graduação em Genética, FMRP, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP
3
Instituto Agronômico, Centro de Cana, Ribeirão Preto, SP
Autor para correspondência - vitor.moraes@usp.br
Palavras-chave: anidrobiose, radiação, radioproteção, proteína Dsup, quebra de DNA

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 84


UM GENE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Tardígrados são diminutos animais capazes de façanhas hercúleas, tais como tolerar
temperaturas próximas ao zero absoluto, dessecação extrema, vácuo e radiação. Pesquisadores
japoneses identificaram um gene exclusivo de tardígrados denominado Dsup. A proteína
Dsup pode interagir com o DNA em algumas situações, além de protegê-lo contra os efeitos
nocivos da luz ultravioleta e raios-X. Este artigo descreve o que já se sabe sobre o gene Dsup
e os mecanismos por meio dos quais a proteína Dsup é capaz de promover radioproteção
quando expressa em diferentes espécies.
Radioproteção - proteção
contra radiações.
Tardígrados e
poliextremotolerância Poliextremotolerância -
Tardígrados (do Latim, tardi: lento; gradus: doce. Seus corpos são segmentados, cons- tolerância a diversos tipos de
passo - aquele que anda lentamente) são pe- tituídos por cabeça, tronco e quatro pares condições extremas, tal como
extremos de temperatura, de
quenos animais invertebrados, cujos tama- de membros (pernas). Eles são comumente
pressão, radiação e vácuo.
nhos variam de 0,1 a 1,2 mm, e que habitam conhecidos como “ursos d’água” (Figura 1), e
diversas partes do globo, incluindo ambien- atualmente são descritas aproximadamente Limnoterrestre - ambientes
tes limnoterrestres, marinhos e de água 1200 espécies. terrestres úmidos, que estão
sujeitos a períodos de seca e de
imersão em água.

Figura 1.
Microscopia eletrônica de
varredura do tardígrado
Ramazzottius varieornatus
Tipicamente, os tardígrados são conhecidos nessa revista, (v. 16, n1, 2021). A anidrobio- em seu estado hidratado (a)
e em seu estado dessecado
como os “organismos mais resistentes do se é um estado especial em que o organismo
(em anidrobiose) (b). Barras
mundo” pelo fato de serem capazes de tole- não apresenta sinais observáveis de metabo- de escala: 100 μm. A imagem
rar frio e calor extremos, fortes secas, radia- lismo, e se torna tolerante a diversos tipos corresponde à figura 1a e
ção, pressão hidrostática, vácuo e condições de estresses físico-químicos. Entretanto, os b do artigo Hashimoto, T.,
do espaço. Entretanto, essa poliextremoto- tardígrados não são os únicos seres capazes Horikawa, D., Saito, Y. et al.
Extremotolerant tardigrade
lerância ocorre apenas quando eles entram de entrar em anidrobiose. Espécies anidro- genome and improved
em um estado de animação suspensa, de- biontes são encontradas entre as bactérias, radiotolerance of human
nominado anidrobiose (vide artigo O gene leveduras, nematódeos, crustáceos, mosqui- cultured cells by tardigrade-
Tps1 e seu papel na anidrobiose, publicado tos e plantas. unique protein. Nat Commun
7, 12808, 2016. https://doi.
org/10.1038/ncomms12808.
Artigo do tipo Open Access;
reprodução da imagem
permitida devido a licença do
tipo CC BY-NC-SA 4.0.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 85


UM GENE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

O efeito da cadeias de DNA (Figura 2). Essas quebras


podem ser em apenas uma cadeia da dupla-
radiação nas células -hélice ou em ambas as cadeias. O primeiro
tipo de quebra é mais facilmente reparado
Na natureza existem diferentes tipos de ra- pela célula, ao passo que o segundo tende a
diação. As radiações corpusculares são aque- ser mais letal.
las constituídas por partículas, tais como a Adicionalmente, a energia da radiação X
radiação alfa (composta por núcleos de Hé- pode converter moléculas de água em espé-
lio) e a radiação beta (composta por elétrons cies reativas de oxigênio (por exemplo, pe-
emitidos a partir do núcleo de átomos ins- róxido de hidrogênio e superóxido), que são
táveis). Por sua vez, as radiações eletromag- moléculas que danificam os demais consti-
néticas são aquelas formadas por ondas, tais tuintes da célula (proteínas, lipídeos e ácidos
como a radiação gama, a ultravioleta (UV) e nucleicos) (Figura 2). Portanto, a exposição
os raios-X. Em especial, as radiações gama e de organismos a elevados níveis de radiação
os raios-X são considerados ionizantes, sen- ionizante tende a ser fatal.
do assim capazes de promover quebras nas Ionizante - capaz de ionizar
moléculas. Diz-se de radiações
altamente energéticas, capazes
de excitar e ejetar elétrons
de uma molécula, tornando-a
carregada positivamente.

Figura 2.
Lesões no DNA por radiação
ionizante. Os danos causados
no DNA decorrentes da
exposição celular a radiações
ionizantes podem ocorrer de
forma direta (i.e., a radiação
promovendo quebras no DNA)
e/ou indireta, envolvendo
a produção de espécies
reativas de oxigênio que,
por sua vez, geram quebras
no DNA. Imagem: Moraes,
V. N. utilizando elementos
disponibilizados em BioRender
(célula e moléculas de DNA).

O gene Dsup foi detalhadamente caracterizado, porém


sabe-se que a proteína codificada (Dsup)
possui 445 resíduos de aminoácidos. Por-
Durante o processo de sequenciamento do
tanto, o gene deve possuir no mínimo 1335
genoma do tardígrado anidrobionte Ramaz-
pares de bases; naturalmente, o tamanho de
zottius varieornatus, pesquisadores japoneses
fato deve ser maior ao se considerar a pro-
identificaram um gene codificador de uma
vável existência de íntrons (Figura 3). Dsup
proteína exclusiva de tardígrados, denomi-
é muito expresso durante as fases iniciais do
nada de Dsup (do inglês, Damage suppres-
desenvolvimento embrionário de R. varieor-
sor). Até o momento, esse gene ainda não

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 86


UM GENE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

natus, período marcado por intensa síntese que são encontradas apenas em vertebrados).
de DNA e múltiplas divisões celulares. Em termos físico-químicos, trata-se de um Carboxi-terminal - a
extremidade da proteína em
polipeptídeo muito básico (alcalino), espe- que se situa o grupo carboxila
Curiosamente, até o momento não há outras cialmente em sua porção carboxi-terminal. (-COOH), oposta à extremidade
proteínas semelhantes à Dsup nos bancos Considerando a carga positiva dessa região, na qual se encontra o grupo
de dados, de tal forma que ela se apresenta os pesquisadores levantaram a hipótese de amino (-NH2).
com uma identidade única. Apesar disso, Dsup se associar ao DNA por meio de in-
foi observada similaridade de uma pequena terações eletrostáticas. De fato, ao testarem
região de 8 a 12 aminoácidos entre Dsup e Interação eletrostática -
experimentalmente essa ideia, eles verifica- atração ou repulsão entre
HMGN (proteínas que se ligam a nucleos- ram que Dsup se liga a ácidos nucleicos in moléculas eletricamente
somos, protegem contra radicais hidroxila e vitro, isto é, em um ambiente fora da célula. carregadas.

Figura 3.
Aspectos moleculares de
Dsup. O gene Dusp e seu RNA
mensageiro são representados
com um número mínimo de
1335 nucleotídeos. A proteína
Dsup apresenta uma região
de α-hélice e um sinal de
localização nuclear (NLS,
que permite que a proteína
sintetizada no citoplasma
migre para o núcleo) na região
C-terminal. Em contraste,
a versão truncada de Dsup
é desprovida da porção
carboxi-terminal, assim não
apresentando o NLS. Imagem
baseada em: Hashimoto T,
Kunieda T. DNA Protection
Protein, a Novel Mechanism of
Radiation Tolerance: Lessons
from Tardigrades. Life. v.7, n.2,
p. 26, 2017.

Para verificar se essa interação ocorre dentro diadas pela extremidade básica carboxi-ter-
da célula, os pesquisadores realizaram a fu- minal de Dsup, os cientistas criaram uma
são da proteína Dsup a uma proteína fluo- versão artificial da proteína, desprovida da
rescente, permitindo a visualização de ambas porção carboxi-terminal (Figura 3). Os en-
dentro da célula com o auxílio de microscó- saios demonstraram que esta versão menor
pio de fluorescência. Assim, eles confirma- é incapaz de se ligar ao DNA e de se loca- Microscópio de fluorescência
ram que Dsup se localiza no núcleo celular. lizar no núcleo, evidenciando assim o papel - instrumento que permite
da extremidade carboxi-terminal na atua- a visualização de estruturas
Para verificar se essa interação com o DNA ção da proteína. que, quando excitadas por
e localização no núcleo de fato eram me- algum tipo de radiação
eletromagnética, emitem um
tipo de luz específico.

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 87


UM GENE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Adicionalmente, por meio de estudos com- Os pesquisadores observaram que células-


putacionais, um grupo de pesquisa espanhol -Dsup apresentavam menores focos de his-
encontrou evidências de que a proteína Dsup tonas fosforiladas do que células do grupo
não possui uma estrutura terciária definida, controle (i.e., não expressando Dsup).
potencialmente podendo se “moldar” para se
ligar ao DNA. Em especial, após exposição aos raios X,
os cientistas perceberam que as células do

Dsup confere grupo controle apresentavam aspecto anor-


mal e não adesão à placa de cultivo (que são
radiotolerância características de células mortas), ao passo
que algumas das células-Dsup apresentavam
em diversos morfologia normal e aderência. Por fim, as
células-Dsup que se apresentavam normais
organismos também tiveram proliferação muito superior
(por volta de 100 vezes mais abundantes)
Considerando a interação de Dsup com o do que as células controle após 12 dias de
DNA, e que os tardígrados possuem elevada cultivo. Tomados em conjunto, todos esses
tolerância à radiação, os pesquisadores levan- experimentos evidenciam que Dsup é uma
Expressão heteróloga -
taram a hipótese de que essa proteína seria proteína que se liga ao DNA (e aos nucleos- transcrição e tradução de
capaz de proteger o DNA contra os danos somos, possivelmente tal qual as proteínas um gene em uma célula (ou
promovidos pela radiação ionizante também HGMN), protegendo-o de quebras promo- organismo) que naturalmente
em outros organismos. vidas por radiação X, resultando em uma não possui aquele gene.
maior viabilidade celular quando expostas
Nesse sentido, eles realizaram a expressão
aos raios X.
heteróloga do gene Dsup em células huma- Ensaio Cometa - teste
nas (a partir daqui denominadas “Células-D- Mais recentemente, um grupo de pesquisa realizado com células, as
sup”), e as expuseram à radiação X. Por meio italiano verificou que Dsup é capaz de mo- quais são submetidas a uma
diferença de potencial elétrico.
do ensaio Cometa, eles perceberam que cé- dular genes de reparo em células humanas Se o DNA estiver fragmentado
lulas-Dsup apresentaram menores danos no submetidas à radiação ultravioleta e estresse devido à radiação, os pedaços
DNA, isto é, menor fragmentação do mate- oxidativo. Ou seja, quando as células-Dsup de DNA vão se deslocar mais
rial genético. são expostas a peróxido de hidrogênio, Dsup rapidamente para o polo
positivo, gerando uma imagem
se liga diretamente ao DNA, protegendo-o,
Notoriamente, sabe-se que, por volta de uma que se assemelha a um cometa.
e ativa diversas vias de detoxificação para re- Para mais detalhes, vide o
hora após a exposição à radiação, histonas
mover radicais livres (Figura 4). Entretanto, artigo: O uso do ensaio Cometa
posicionadas próximas a sítios de quebra de
quando exposta à radiação UV, Dsup parece para o ensino de genética
dupla cadeia de DNA apresentam fosfori- toxicológica, Genética na
ativar de maneira mais eficaz os mecanismos
lação. Portanto, histonas fosforiladas repre- Escola, Volume 2 - n°2, 2007).
de reparo do DNA, favorecendo uma recu-
sentam sinais de dano causado por raios X.
peração celular mais rápida e a sobrevivência.
Fosforilação - adição de um
grupo fosfato [(PO4)-3] em uma
determinada molécula.

Figura 4.
Dsup confere proteção contra
estresse oxidativo e radiação
UV. À esquerda, vemos que a
proteína Dsup pode interagir
com DNA para proteção contra
radicais livres. À direita, nota-se
que Dsup não se liga ao DNA,
porém ativa vias de reparo ao
dano no DNA. Imagem: Moraes,
V. N. utilizando elementos
disponibilizados em BioRender
(célula), Protein Data Bank
(estrutura de DNA – 103D) e
Alphafold Protein Structure
Database (protein - P0DOW4).

Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 88


UM GENE Genética na Escola – ISSN: 1980-3540

Em 2021, outro grupo de pesquisadores mófilos) ou que toleram situações extremas


espanhóis expressaram Dsup na bactéria (i.e., organismos extremotolerantes) têm
Escherichia coli, e demonstraram o seu im- o potencial de identificar genes singulares,
portante papel na tolerância a radiações ioni- associados a essas propriedades fascinantes.
zante e ultravioleta. Resultados semelhantes A caracterização pormenorizada das proteí-
foram observados em plantas transgênicas nas codificadas por esses genes, como Dsup,
de Nicotiana tabacum (tabaco) expressando o e de seus mecanismos moleculares de ação,
gene Dsup, geradas por um grupo de cientis- nos permitem compreender como é possível
tas nos Estados Unidos. Neste estudo nor- haver vida em ambientes considerados “inós-
te-americano, plantas do grupo controle e pitos”, assim como apresentam um imenso
plantas transgênicas foram semeadas em pla- potencial biotecnológico para a agricultura,
cas contendo 1 mM de etilmetano sulfonato medicina e indústria.
mM - milimolar, equivalente a
(EMS, um agente mutagênico) e cultivadas 10-3 molar.
por duas semanas. As plantas-controle apre-
sentaram redução no crescimento das raízes
Para saber mais
e de massa total (massa fresca), ao passo que HASHIMOTO, T. et al. Extremotolerant tardigrade
plantas transgênicas Dsup apresentaram fe- genome and improved radiotolerance of human
cultured cells by tardigrade-unique protein. Na-
nótipos semelhantes a plantas que não foram ture communications, v. 7, n. 1, p. 1-14, 2016.
expostas a EMS, evidenciando assim o papel Mutagênico - capaz de causar
protetor de Dsup quanto a esse agente es- MÍNGUEZ-TORAL, M. et al. A computational mutação nos ácidos nucleicos.
tressor. Semelhantemente ao observado em structural study on the DNA-protecting role of
the tardigrade-unique Dsup protein. Scientific re-
células humanas expressando Dsup, o ensaio ports, v. 10, n. 1, p. 1-18, 2020.
Cometa realizado em células de tabaco ex- Agente estressor - qualquer
postas a radiação X ou UV mostraram que PUIG, J. et al. DNA Damage Protection for Enhanced elemento físico, químico ou
Bacterial Survival Under Simulated Low Earth biológico que cause estresse no
Dsup também protege o DNA em vegetais. Orbit Environmental Conditions in Escherichia organismo em estudo.
coli. Frontiers in microbiology, p. 3898, 2021.
Conclusão KIRKE, J.; JIN, XIAO-LU; ZHANG, XING-HAI.
Expression of a tardigrade Dsup gene enhances
Estudos sobre os genomas de seres que habi- genome protection in plants. Molecular Biotech-
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Genética na Escola | Vol. 18 | Nº 1 | 2023 Sociedade Brasileira de Genética 89

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