Você está na página 1de 76

Luz no Caminho

Luz no Caminho
Um Tratado Clássico
Sobre o Despertar da Sabedoria

Redigido por M.C.

Escrito para o uso pessoal


daqueles que não conhecem a sabedoria
oriental e desejam estar sob sua influência

Tradução, Notas e Prólogo


de Carlos Cardoso Aveline
 

The Aquarian Theosophist


Luz no Caminho

Um Tratado Clássico
Sobre o Despertar da Sabedoria

Copyright desta edição © Carlos Cardoso Aveline, 2014.


Todos os direitos reservados. Título do original em  inglês:
Light on the Path. Theosophy Company, Índia, 1991, 90 pp.

1ª edição, 85 páginas, publicada em junho de 2014, em Aveiro,


Portugal, por Joaquim Soares para The Aquarian Theosophist,
 
O Teosofista e os websites www.FilosofiaEsoterica.com,
www.TeosofiaOriginal.com
e www.VislumbresDaOutraMargem.com.

ISBN:
 978-989-20-4708-9
Depósito legal: 377437/14

1. Teosofia. 2. Discipulado.
3. Filosofia. 4. Ética. 5. Lei do Carma.
Imagem da capa: © iStockphoto LP 2014.
Impresso na Officina Digital - Impressão e Artes Gráficas.

Luz no Caminho foi impresso graças a duas doações


teosóficas. Uma delas foi feita como homenagem a Celso de
Magalhães. A outra, como homenagem a Helena P. Blavatsky.

Conselho Editorial de “The Aquarian Theosophist”,


“O Teosofista” e dos seus websites associados, em 2014:

Arnalene Passos, Celina de Jesus Cardoso, Evaldo Berwig,


Joana Maria Pinho, Joaquim Soares, Magda Loios Susano, Marco
Bufarini, Regina Maria Pimentel de Caux e Silvia Caetano de Almeida.

Mais informações podem ser obtidas escrevendo para:


The Aquarian Theosophist, Rua 1º de Maio, Edifício 1º de
Maio, N.º 1, 2º Esq., 3830-568, Gafanha da Nazaré (Aveiro), Portugal.
Email: lutbr@terra.com.br. No Facebook, veja nossas páginas 
SerAtento, Carlos Cardoso Aveline e FilosofiaEsoterica.com.
Sumário

Não Há Nada Fora da Lei no Universo


Prólogo da Edição Luso-Brasileira

1. Primeira Série de Regras

2. Segunda Série de Regras

3. Comentários a “Luz no Caminho”- I

4. Comentários a “Luz no Caminho”- II

5. Comentários a  “Luz no Caminho”- III


O Pedido do Neófito

6. Comentários a  “Luz no Caminho”- IV


O Isolamento do Adepto

7. O Carma
Não Há Nada

Fora da Lei no Universo


Prólogo da Edição Luso-Brasileira
Redigido por M.C. (Mabel Collins), com comentários feitos em
alguns casos por um Iniciado, o livro “Luz no Caminho” é um dos
maiores clássicos teosóficos. Os axiomas e regras centrais desta
obra são estudados desde uma remota antiguidade pelos que
buscam viver a sabedoria esotérica do Oriente.
No presente volume traduzimos a edição indiana da Theosophy
Company.[1] Para facilitar a leitura contínua, os comentários da
edição clássica em inglês são incluídos em itálico já como parte do
texto principal. Estão sempre antecedidos pela palavra “ANÁLISE”.
A única nota de pé de página da edição original é assinalada
como tal na sua abertura. As nossas próprias anotações explicativas
aparecem como notas numeradas ao pé de cada página, sem
assinatura. Através delas, o leitor verá que numerosos trechos da
obra, de responsabilidade de Mabel Collins e não do Iniciado que
cooperou com ela, transmitem ideias falsas.

O Cuidado na Leitura

Os trechos assinalados e discutidos nas notas luso-brasileiras


constituem testes para o discernimento do leitor, e não surgem por
acaso. Devido às provações enfrentadas pelos teosofistas do século
19, a Srta. Mabel Collins perdeu a ética e o bom senso pouco
depois da publicação de “Luz no Caminho”. Os erros que ela viria a
cometer por falta de respeito pela verdade já estavam presentes
num plano abstrato em sua abordagem da lei do carma e da filosofia
teosófica, e se refletem nos seus comentários às regras e no
capítulo final de “Luz no Caminho”.
O fato de que todo o material reunido nesta obra foi publicado
em vida de Helena P. Blavatsky não é garantia de infalibilidade. Não
existe em teosofia o conceito de “infalível”. Tudo o que é humano é
aperfeiçoável.
Como editora, H.P.B. primava pela tolerância e errou por ser
menos exigente do que deveria. Pouco antes de morrer, ela fez uma
autocrítica severa como consequência de advertências recebidas de
seu Mestre.[2]
Ela constatou entre 1889 e 1890 que subestimara o
déficit de sentimento ético e de vocação para a autodisciplina que
havia na maior parte dos seus alunos. Ela tinha sido demasiado
otimista em relação ao despertar da sabedoria no coração humano.
A partir de então, H.P.B. passou a reforçar os ensinamentos éticos e
ensinou com mais força sobre a necessidade de autodisciplina. Em
26 de abril de 1890, na sua terceira mensagem aos teosofistas
norte-americanos, ela escreveu:
“O que eu disse no ano passado permanece verdadeiro hoje,
isto é, que a Ética da Teosofia é mais importante do que a
divulgação de quaisquer leis e fatos psíquicos. Estes últimos se
referem apenas à parte material e passageira do ser humano
setenário, mas a Ética é absorvida pelo verdadeiro homem - o Eu
Superior, que reencarna.”[3]

Os Erros de M. Collins em “Luz no Caminho”

O presente livro é de 1885 e antecede em cerca de cinco anos


a autocrítica de HPB. Um exame atento de suas páginas mostra que
faltava a Mabel Collins perceber a ética como um princípio decisivo
em teosofia.
O problema se reflete nas falhas que tratamos de identificar,
registrar e documentar. Alguns dos erros mais grosseiros de M. C.
estão no ensaio final da obra, intitulado “O Carma”.
A ilusão segundo a qual os sábios imortais estão “acima” ou
“fora” da Lei do Carma é uma armadilha, e abre as portas para a
derrota espiritual. Os sábios e Iniciados são servidores que
conhecem, vivem e exemplificam a Lei. Não há nem houve jamais
coisa alguma fora da Lei, no Universo. Cada desvio terá de ser
compensado. Cada erro será corrigido. A Lei Una rege tudo o que
acontece durante os períodos de manifestação do Cosmo, os
manvântaras; a mesma Lei rege todos os aspectos dos períodos de
repouso do Cosmo, os seus pralayas. Por isso nenhuma derrota é
definitiva. A cada fracasso novas tentativas devem seguir-se, até
que através delas a vitória ocorra pouco a pouco. Desde um ponto
de vista teosófico, o aprendizado inclui muitas encarnações. Ao
contrário das religiões supersticiosas, não há em filosofia esotérica
nada parecido a uma “condenação eterna”.
O medo da derrota é um obstáculo em si, quando paralisa o
buscador da verdade. A confiança é uma virtude, quando a cautela
e a prudência não são abandonadas. Os dois pontos mais
importantes da caminhada são a adoção de uma meta nobre e a
coragem de tentar o melhor incessantemente. Os fracassos são
falhas a serem corrigidas no futuro. A contribuição de Mabel Collins
à causa teosófica permanece, enquanto a sua derrota pessoal
passará, dando lugar à sabedoria.
A questão do fracasso de numerosos aprendizes durante a
fase pioneira do movimento teosófico, no século 19, deve ser olhada
desde pelo menos dois ângulos principais. Um ponto de vista mostra
o erro cometido pelos aspirantes ao discipulado. As ilusões que os
derrotaram devem ser evitadas pelos estudantes do século 21. O
outro ponto de vista nos convida a avaliar o método de ensino.
Como vimos acima, as limitações da prática pedagógica de H.P.B.
como instrutora a levaram a fazer uma dura autocrítica que teve
lugar cerca de um ano depois da crise com Mabel Collins. Na
ocasião, ela precisou lidar com a derrota de vários outros
colaboradores seus e buscadores da verdade.
O professor que exige em excesso leva os alunos ao fracasso.
O ensinamento deve ser transmitido em um ritmo e de uma maneira
que reduzam ao máximo o risco de falha do aprendiz. Em tempos
pioneiros, uma dose extraordinária de rigor pode ser historicamente
necessária. Com o tempo a prática pedagógica adota expectativas
mais realistas em relação aos alunos e passa a ensinar mais
devagar aquilo que eles podem absorver sobre a base de uma
prática ética estável, e de uma compreensão direta das leis
universais.
No século 21, o movimento esotérico deve aprender com a
autocrítica de HPB e adequar o seu enfoque do discipulado. O que é
simples pode ser profundo. O que é desnecessariamente
complicado com frequência torna-se superficial. Cabe adotar um
enfoque que seja operacionalmente simples, e cuja complexidade
permaneça invisível em condições normais.
O discipulado sempre ocorreu de modo amplamente implícito, e
tentar “organizá-lo” de modo demasiado detalhado do ponto de vista
material e institucional provoca problemas difíceis de resolver na
etapa atual da humanidade.

“Luz no Caminho” e “A Voz do Silêncio”

No primeiro parágrafo do prefácio de “A Voz do Silêncio”, HPB


informa:
“As páginas que se seguem têm como origem o Livro dos
Preceitos de Ouro, uma das obras que são colocadas nas mãos dos
estudantes místicos do Oriente. O conhecimento destas páginas é
obrigatório naquela Escola cujos ensinamentos são aceitos por
muitos teosofistas. Portanto, como conheço de memória muitos
destes Preceitos, o trabalho de traduzi-los foi uma tarefa
relativamente fácil para mim.”[4]
A fonte básica do livro redigido por Mabel Collins é o mesmo
Livro dos Preceitos de Ouro, obra jamais divulgada em público. A
semelhança existente entre os ensinamentos de “Luz no Caminho” e
de “A Voz do Silêncio” é forte. Logo no início de “Luz no Caminho”
vemos estes axiomas:
“Antes que os olhos possam ver, eles devem ser incapazes de
lágrimas. Antes que o ouvido possa ouvir, ele deve ter perdido sua
sensibilidade. Antes que a voz possa falar na presença dos Mestres,
ela deve haver perdido o poder de ferir. Antes que a alma possa
erguer-se na presença dos Mestres, os seus pés devem ser lavados
com o sangue do coração.”
E encontramos o seguinte trecho nos primeiros parágrafos de
“A Voz do Silêncio”:
“Antes que a Alma possa ver, a Harmonia interior deve ser
alcançada e os olhos físicos precisam ficar cegos para toda ilusão.
Antes que a Alma possa ouvir, a imagem (o homem) deve tornar-se
surda tanto para rugidos como para sussurros, e tanto para o
bramido dos elefantes quanto para o leve zumbido do vaga-lume
dourado. Antes que a Alma possa compreender e possa lembrar, ela
deve estar unida ao Orador Silencioso...”.
A semelhança não é casual. Em texto publicado em seus
“Collected Writings”[5], H.P. Blavatsky afirma que parte dos
aforismos de “Luz no Caminho” vem da mesma fonte de “A Voz do
Silêncio”. Ela escreve que aforismos como “antes que a voz possa
falar na presença dos Mestres, ela deve haver perdido o poder de
ferir” e outros axiomas de “Luz no Caminho”, são “tão velhos quanto
o Livro dos Preceitos de Ouro”, de onde foram retirados.
Embora as duas obras tenham muito em comum, há várias 
diferenças práticas entre elas.
“Luz no Caminho” resulta da colaboração entre um alto Iniciado
grego e uma estudante de um país ocidental. Sua linguagem é mais 
compreensível para o leitor do Ocidente. “A Voz do Silêncio” foi
escrita por uma discípula Iniciada e mais avançada que M.C. “A
Voz” é um livro diretamente Oriental e mais exigente. Nele Helena
Blavatsky dá menos atenção às dificuldades psicológicas
específicas da alma ocidental.

A Lição Presente nas Armadilhas

HPB referiu-se às falhas do volume organizado por M. Collins


em uma carta aberta publicada em 1889. Ela escreveu que “o brilho
desta pequena joia de valor inestimável, Luz no Caminho, fica agora
encoberto por uma grande mancha negra que nada poderá
eliminar.”[6]
No mesmo ano, em carta pessoal dirigida ao teosofista John
Ransom Bridge, HPB considerou “insidiosa” e “perigosa” a regra
número 20 da obra.[7] Acrescentou que “só a parte principal” do livro
“foi ditada por um verdadeiro Adepto, e o resto foi acrescentado pela
consciência interior da Srta. Mabel Collins”.
HPB informou em outras ocasiões que tal Adepto não é um
Mestre[8], nem Mahatma.[9] Há evidências de que seu nome é
Illarion - nome também grafado como Hilarion[10]
-, e de que ele é
grego.[11]
A Regra I-20 de “Luz no Caminho”

Existem duas “regras número 20” na obra: uma está na


primeira série de regras, a outra na segunda. HPB não esclarece a
qual parte do livro se refere. A regra 20 da segunda série tem uma
só frase. A sua ideia não parece ser eticamente questionável e
tampouco é comentada por Mabel Collins. Podemos deduzir que
HPB questiona a regra 20 da primeira série, que é longa, complexa,
e recebe um comentário de Mabel Collins.
HPB acrescentou que a regra 20 possui um “veneno oculto” e
tem afinidade com magia tântrica egoísta e antiética. No entanto,
não é fácil encontrar “veneno” na regra I-20. Ao mencionar este
inofensivo trecho da obra, HPB talvez quisesse dizer a seu
interlocutor que o livro tem sérios problemas, sem indicar
especificamente quais são eles.
Isso é provável porque, quando não podia falar francamente,
HPB às vezes escrevia frases enigmáticas como as usadas neste
caso. Deste modo ela causava uma certa perplexidade, mas ao
mesmo tempo despertava atenção na direção correta.
Um exame crítico da regra I-20 revela que a regra não acentua
o suficiente a necessidade de renúncia total, no que diz respeito ao
eu inferior. No entanto, este é um erro menor, levando-se em conta
o conjunto da obra.
Podemos ver como perigosa nesta regra a seguinte frase, que
se refere ao Caminho: “Busca-o testando todas as experiências.”
Porém, o real significado do conselho é: “Busca-o vendo como um
teste
cada experiência que tiveres na vida.”
Cabe também examinar uma pergunta:
“Que tipo de experiência o peregrino irá aceitar em sua vida?”
Isso depende da sua intenção, e da intenção do seu ser
emocional. Para o peregrino que se colocou a serviço de uma causa
nobre, a purificação interior é natural e inevitável.[12]
A regra I-20 contém advertências sobre a necessidade de levar
uma vida pura. Várias ideias nela e no comentário a ela são úteis e
profundas. Ao olhar para esta regra, porém, HPB pode ter visto o
estado mental não-ético de Mabel Collins, que a redigiu. Este
fragmento do livro não tem necessariamente um efeito venenoso
para todos. Cada um deve observá-lo com independência, levando
em conta os diversos fatores em jogo. 
Os principais erros de “Luz no Caminho” são assinalados na
presente edição com a clareza possível. Cabe destacar, por outro
lado, que H.P.B. reconheceu em mais de uma ocasião o grande
valor da obra.  “Luz no Caminho” é um clássico imprescindível na
biblioteca de todo estudante de filosofia esotérica, seja ele leigo ou
experiente. As falhas do livro exemplificam a necessidade de evitar
a crença cega: o buscador da verdade deve pensar por si mesmo. 
Embora tenha cooperado com um Adepto, Mabel Collins não
possuía um alicerce sólido em sua vida. O exemplo da sua derrota
traz um alerta sobre a necessidade de reexaminarmos sempre a
firmeza ou não do solo em que pisamos. Só o altruísmo é estável. O
avanço eficaz ao longo do caminho da sabedoria é aquele que o
peregrino obtém por mérito próprio, enquanto trabalha movido por
um sentimento de amor incondicional à verdade, em cooperação
com outros seres que buscam o bem.
A vida obedece à lei da simetria e da justiça. Ajudando os que
podem saber menos que ele, o peregrino passa a receber ajuda -
talvez invisível - daqueles que sabem mais.

A Inteligência é Imparcial

Na Análise do item 10 da segunda série de regras, “Luz no


Caminho” apresenta uma ideia que merece ser destacada:
“A inteligência é imparcial: ninguém é teu inimigo; ninguém é
teu amigo. Todos são teus instrutores.”
Este axioma deve ser compreendido para que não haja uma
visão ingênua do processo de ajuda mútua entre companheiros de
busca espiritual, ou das relações familiares do estudante de
teosofia.[13]
A comunidade de estudantes deve estabelecer uma harmonia
tão grande quanto possível e uma completa cooperação, dentro do
que o carma permite. O mesmo desafio existe no universo das
relações familiares. A vida flui de acordo com a lei da simetria. A
cada passo na direção do mundo divino, o estudante é obrigado a
dar um passo do mesmo tamanho para longe do mundo dos
interesses pessoais. Sua determinação de buscar o melhor será
testada de diversos modos inesperados e dolorosos, devido à ação
de forças impessoalmente contrárias ao mundo divino.
Embora a busca do discipulado leigo seja apenas uma modesta
preparação para o verdadeiro aprendizado, ela já contém em si, em
pequena escala, os principais elementos do futuro. Daí a
importância do tema do discipulado para os estudantes de teosofia.
A Lei da Simetria é a lei do carma, e rege o discipulado.[14] As
Cartas dos Mahatmas mostram que forças antiespirituais são
usadas conscientemente pelos sábios orientais para evitar que o
progresso do estudante seja prematuro. Na Carta 74, um Mestre
informa que alguns dugpas [magos antiéticos e antievolutivos]
recebem carta branca dos magos da bondade e do altruísmo para
testar de modo cruel os chelas, ou discípulos da sabedoria divina.
Isso ocorre, diz o Sábio, “por algum tempo, com o único
objetivo de extrair toda a natureza interna do chela, a maior parte de
cujos cantos e recantos permaneceria escura e escondida para
sempre, se não fosse dada uma oportunidade para que cada um
destes cantos fosse testado.” E o mestre acrescenta: “Se o chela
conquista ou perde o prêmio é algo que depende apenas dele.”[15]
Os testes e armadilhas da caminhada ocorrem sem aviso
prévio. Surgem de modo inesperado, frequentemente nas relações
de afinidade mais profunda do aprendiz. Eles vêm através da família
e das relações com os colegas de caminho espiritual. A história do
movimento teosófico moderno está cheia de exemplos disso.
Cada estudante deve ter sempre presente, portanto, o fato de
que a inteligência suprema é imparcial: ninguém é seu amigo, no
sentido convencional da palavra, e ninguém é seu inimigo. Todos
são seus instrutores.

(Carlos Cardoso Aveline)


Luz
no
Caminho
1. Primeira Série de Regras
Estas regras foram escritas para todos os discípulos: presta
atenção a elas.
Antes que os olhos possam ver, eles devem ser incapazes de
lágrimas. Antes que o ouvido possa ouvir, ele deve ter perdido sua
sensibilidade. Antes que a voz possa falar na presença dos Mestres,
ela deve haver perdido o poder de ferir. Antes que a alma possa
erguer-se na presença dos Mestres, os seus pés devem ser lavados
com o sangue do coração.[16]
1. Mata a ambição.
ANÁLISE:
A ambição é a primeira das maldições: a grande tentação do
homem que está se erguendo acima dos seus semelhantes. É a
forma mais simples de buscar por uma recompensa. Homens de
poder e inteligência são continuamente afastados das suas
possibilidades mais elevadas por causa da ambição. No entanto, ela
é uma professora necessária. Os seus resultados se tornam pó e
cinzas na boca; assim como a morte e a separação, ela termina por
mostrar ao homem que trabalhar para si mesmo é trabalhar para a
decepção. Porém, embora esta primeira regra pareça ser simples e
fácil, não passes rapidamente por ela. Porque os maus hábitos do
homem comum sofrem uma transformação sutil e reaparecem sob
novas formas no coração do discípulo. É fácil dizer, “não serei
ambicioso”. Não é tão fácil dizer, “quando o Mestre examinar o meu
coração, ele o encontrará completamente limpo”. O puro artista que
trabalha por amor à sua obra está às vezes mais firmemente no
caminho correto que o ocultista que imagina haver afastado o seu
interesse por si mesmo, mas na realidade apenas ampliou os limites
da experiência e do desejo, e transferiu seu interesse para coisas
que dizem respeito a uma dimensão maior da sua vida. O mesmo
princípio vale para as duas outras regras, que são aparentemente
simples. Considera-as demoradamente e não te deixes enganar
pelo teu coração. Porque agora, no portal inicial, um erro pode ser
corrigido. Mas se tu o carregares contigo ele crescerá e produzirá
efeitos, e terás que sofrer amargamente antes de conseguires a sua
destruição.
2. Mata o desejo de viver.
3. Mata o desejo de conforto.
4. Trabalha como aqueles que são ambiciosos. Respeita a vida
como aqueles que a desejam. Deves ser feliz como aqueles que
vivem em função da felicidade.
Procura no coração a origem do mal e elimina-a. Ela vive no
coração do discípulo devotado assim como no coração do homem
de desejos. Só os fortes podem matá-la. Os fracos devem esperar
que ela cresça, dê frutos, e morra. E ela é uma planta que vive e
cresce ao longo de todas as idades. Ela floresce quando o homem
acumulou em si inúmeras existências. Aquele que quiser ingressar
no caminho do poder deve eliminar essa coisa do seu coração. E
então o coração sangrará, e toda a vida do homem parecerá
dissolver-se completamente. Esta provação deve ser suportada. Ela
pode vir no primeiro degrau da perigosa escada que leva ao
caminho da vida: ou pode surgir só no último. Mas, ó discípulo,
lembra que ela deve ser suportada, e trata de reunir as energias da
tua alma para enfrentar a tarefa. Não vivas no presente nem no
futuro, mas no eterno. Esta erva daninha gigantesca não pode
florescer lá; a sua mancha na existência é eliminada pela atmosfera
do pensamento eterno.
5. Mata todo sentido de separação.
ANÁLISE:
Não penses que podes permanecer afastado do homem
maldoso ou do tolo. Eles são tu mesmo, embora em uma proporção
menor que o teu amigo ou teu mestre. Mas se deixares que cresça
em ti a ideia de separação em relação a qualquer coisa ou pessoa
má, ao fazer isso criarás um Carma que te amarrará a aquela coisa
ou pessoa até que a tua alma reconheça que não pode ficar isolada.
Lembra que o pecado e a vergonha do mundo são o teu pecado e a
tua vergonha; porque tu és parte do mundo; o teu Carma está
inevitavelmente ligado ao grande Carma. E antes que tu possas
alcançar o conhecimento deves ter passado por todos os lugares,
puros ou impuros. Lembra, portanto, que a roupa suja que evitas
tocar pode ter sido tua no dia de ontem, ou poderá ser tua amanhã.
E se te afastares dela com horror quando for lançada sobre teus
ombros, ela te seguirá com mais força. O homem que se considera
um justo prepara para si mesmo um leito de lama. Abstém-te porque
é correto abster-te, e não para te manteres limpo.
6. Mata o desejo de sensação.
7. Mata a fome de crescimento.
8. No entanto, conserva-te sozinho e isolado, porque nada que
está corporificado, nada que tem uma consciência de separação,
nada que está fora do eterno, pode ajudar-te. Aprende com a
sensação e observa-a, porque só assim começarás a obter a ciência
do auto-conhecimento e colocarás o pé no primeiro degrau da
escada. Cresce como a flor. Ela cresce inconscientemente, porém
com uma forte ansiedade por abrir a sua alma para o ar. Assim
também tu deves fazer um esforço para ir adiante e abrir a tua alma
em direção ao eterno. Mas é o eterno que deve fazer despertar a
tua força e a tua beleza, e não o desejo de crescimento. Porque no
primeiro caso tu te desenvolves com grande pureza, mas no
segundo caso tu ficas insensível devido à busca de destaque
pessoal.
9. Deseja apenas aquilo que está dentro de ti.
10. Deseja apenas aquilo que está além de ti.
11. Deseja apenas aquilo que é inalcançável.
12. Porque dentro de ti está a luz do mundo - a única luz que
pode iluminar o Caminho. Se fores incapaz de percebê-la dentro de
ti, será inútil procurar fora. Ela está além de ti; porque quando a
tocares terás perdido a ti mesmo. Ela é inalcançável, porque sempre
recua. Tu entrarás na luz, mas nunca tocarás a chama.
13. Deseja o poder ardentemente.
14. Deseja fervorosamente a paz.
15. Deseja posses, acima de tudo.
16. Mas estas posses devem pertencer apenas à alma pura.
Devem ser propriedade, portanto, de todas as almas puras, e devem
constituir uma posse específica do todo apenas quando houver
unidade. Deves ansiar pelas posses que podem ser obtidas por uma
alma pura, de modo que possas acumular riquezas para aquele
espírito unificado da vida que é o teu único verdadeiro eu. A paz que
deves desejar é aquela paz sagrada que nada pode perturbar, e na
qual a alma cresce como cresce a flor sagrada nas lagoas de águas
imóveis. E o poder que o discípulo deve desejar é o poder que o
fará parecer nada aos olhos dos homens.
17. Procura o caminho.
ANÁLISE:
Estas três palavras talvez pareçam demasiado óbvias para
constituírem uma regra. O discípulo pode dizer: “Por que eu iria
estudar estes pensamentos, a menos que tivesse interesse em
buscar o caminho?” No entanto, não sigas adiante apressadamente.
Faz uma pausa e pensa um pouco. Será o caminho o que tu
desejas, ou há na tua visão uma pálida perspectiva das grandes
alturas que alcançarás por mérito próprio, e de um futuro grandioso
que deverás conquistar? Permanece alerta. O caminho deve ser
buscado por si mesmo, e não pelo fato de que os teus pés irão
percorrê-lo.
Há uma correspondência entre esta regra e a regra dezessete
da segunda série.
Depois de eras de luta e muitas vitórias, quando a
batalha final for vencida e for exigido o segredo final, tu estarás
pronto para um caminho mais adiantado. Quando for revelado o
segredo final desta grande lição, nele se abrirá o mistério do novo
caminho - uma trilha que leva até além de toda experiência humana
e que transcende a percepção ou imaginação humana. A cada um
destes pontos, é necessário fazer uma longa pausa e pensar bem. A
cada um destes pontos, é preciso ter certeza de que o caminho é
escolhido por si mesmo. O caminho e a verdade vêm primeiro;
depois vem a vida.
18. Procura o caminho retirando-te para o teu interior.
19. Procura o caminho avançando corajosamente para o
exterior.
20. Não o busques de qualquer modo em especial.[17] Para
cada temperamento há um modo que parece mais desejável. Mas o
caminho não é encontrado só pela devoção, nem apenas pela
contemplação religiosa, por um avanço intenso, por um trabalho
com autossacrifício, ou pela observação atenta da vida. Nenhuma
destas trilhas pode levar o discípulo mais do que um passo adiante.
Todos os degraus são necessários para que haja uma escada. Um
após o outro, os defeitos dos homens tornam-se degraus, à medida
que são vencidos. As virtudes dos homens são degraus de fato
necessários, e não podem ser dispensadas de modo algum. No
entanto, embora elas criem uma atmosfera agradável e um futuro de
felicidade, elas serão inúteis se permanecerem sozinhas. Toda a
natureza do ser humano deve ser usada com sabedoria por aquele
que deseja ingressar no caminho. Cada um é para si mesmo
absolutamente o caminho, a verdade e a vida. Mas isso só se torna
um fato quando ele domina firmemente toda a sua individualidade,
e, com a força da sua vontade espiritual despertada, reconhece que
esta individualidade não é ele próprio, mas um instrumento que com
a sua dor ele criou para seu próprio uso, e graças ao qual ele
pretende, à medida que seu crescimento lentamente desenvolve
sua inteligência, chegar até a vida que está além da individualidade.
Quando percebe que é para isso que a sua maravilhosa vida
complexa e separada existe, então, de fato, e só então, ele está no
caminho. Procura o caminho mergulhando nas profundezas
misteriosas e gloriosas do teu próprio ser mais profundo. Busca-o
testando todas as experiências. Deves utilizar os teus sentidos para
compreender o crescimento e o significado da individualidade, e a
beleza e a obscuridade dos outros fragmentos divinos que lutam a
teu lado, e que formam a humanidade a que tu pertences. Procura-o
estudando as leis do ser, as leis da natureza, as leis do
sobrenatural[18]; e procura-o estabelecendo uma profunda
obediência da alma à estrela que brilha fracamente no interior. À
medida que vigias com reverência, a luz da estrela se tornará
gradualmente mais forte. Então poderás saber que encontraste o
começo do caminho. E quando tiveres chegado ao fim, a sua luz se
transformará subitamente na luz infinita.
ANÁLISE:
Busca o caminho testando toda experiência, e lembra de que
com isso não quero dizer “Cede às seduções dos sentidos para
conhecê-lo”. Antes de te tornares um ocultista tu podes fazer isso;
mas não depois. Quando tiveres escolhido e entrado no caminho
não poderás ceder a tais seduções sem sentires vergonha. No
entanto, podes experimentá-las sem horror; podes medi-las,
observá-las e testá-las, e esperar com paciência e confiança pelo
momento em que elas já não te afetarão mais. Mas não condenes o
homem que cede a elas; estende tua mão a ele como a um irmão
peregrino cujos pés se tornaram pesados devido ao lodo. Lembra, ó
discípulo, que embora possa ser grande a diferença entre o homem
bom e o pecador, é ainda maior a distância entre o homem bom e o
homem que alcançou o conhecimento; e que é imensurável a
distância entre o homem bom e aquele que está no limite da
divindade. Portanto, evita pensar demasiado cedo que já te
apartaste da massa.[19] Quando tiveres encontrado o começo do
caminho, a estrela da tua alma mostrará sua luz; e por esta luz
perceberás como é grande a escuridão em que ela brilha. A mente,
o coração e o cérebro permanecem escuros até que a primeira
grande batalha tenha sido vencida. Não fiques assustado nem
aterrorizado por esta visão; mantém os teus olhos fixos na pequena
luz e ela crescerá. Mas permite que a escuridão em teu interior te
ajude a compreender o desamparo daqueles que não viram a luz, e
cujas almas estão em escuridão profunda. Não os acuses - não te
afastes deles, mas tenta erguer um pouco do pesado Carma do
mundo; dá a tua ajuda às poucas mãos fortes que impedem a vitória
completa das forças da escuridão. Então tu começarás a
compartilhar de um contentamento que traz, de fato, um trabalho
terrível e uma profunda tristeza, mas também provoca uma
satisfação grande, e cada vez maior.
21. Procura pela flor que se abre durante o silêncio que vem
após a tempestade: não antes.
A planta crescerá, se desenvolverá, criará galhos e folhas e
formará botões, enquanto a tempestade continua e a batalha
prossegue. Mas só quando toda a personalidade do homem se tiver
dissolvido e derretido - só quando ela for mantida pelo fragmento
divino que a criou como mero instrumento de experiências e
experimentos sérios - só quando toda a natureza tiver cedido e se
tiver tornado uma auxiliar do seu eu superior, o botão da flor poderá
abrir-se. Então virá uma calma tal como ocorre em um país tropical
após uma chuva pesada, quando a natureza trabalha tão
rapidamente que se pode ver a ação dela. Esta é a calma que
surgirá para o espírito fatigado. E no silêncio profundo ocorrerá algo
misterioso para provar que o caminho foi encontrado. O fato pode
ser mencionado de muitas maneiras; é uma voz que fala onde não
há voz alguma para falar; é um mensageiro que vem, um
mensageiro sem forma ou substância; ou é a flor da alma que se
abre. Nenhuma metáfora pode descrever o fato. Mas ele pode ser
buscado, procurado e desejado, mesmo no auge da tempestade. O
silêncio pode durar um só instante, ou pode durar um milênio. Mas
ele terminará. No entanto, tu levarás contigo a força do silêncio.
Uma e outra vez a batalha terá de ser travada e vencida. É só
durante um intervalo que a natureza pode estar imóvel. 
ANÁLISE:
O abrir da flor é o momento glorioso em que a percepção
desperta. Com ele surgem a confiança, o conhecimento, a certeza.
A pausa da alma é o momento de assombro, e o momento seguinte,
de satisfação, é o silêncio.
Deves saber, ó discípulo, que aqueles que passaram
pelsilêncio, e sentiram a sua paz, e conservaram a sua força,
esperam que tu passes pelo silêncio também. Portanto, quando
consegue entrar no Salão do Aprendizado, o discípulo sempre
encontra lá o seu mestre.
Aqueles que pedirem, obterão. Mas, embora o homem comum
possa pedir perpetuamente, sua voz não será ouvida. Porque ele
pede apenas com a sua mente; e a voz da mente só é escutada no
plano em que a mente age. Portanto, eu digo que aqueles que
pedirem só obterão depois de colocarem em prática as primeiras 21
regras.
Ler, no sentido oculto, é ler com os olhos do espírito. Pedir é
sentir a fome interna - a força da aspiração espiritual. Ser capaz de
ler significa ter obtido, em uma pequena medida, o poder de matar
aquela fome. Quando o discípulo está pronto para aprender, então
ele é aceito e reconhecido como tal. Isso é necessário, porque ele
tem sua luz, e ela não pode ser escondida. Mas é impossível
aprender até que a primeira grande batalha seja vencida. A mente
pode reconhecer a verdade, mas o espírito não é capaz de recebê-
la. Uma vez tendo passado pela tempestade e alcançado a paz,
sempre é possível aprender, mesmo quando o discípulo oscila,
hesita e se afasta. A voz do silêncio permanece nele, e ainda que
ele deixe o caminho completamente, algum dia a voz soará de novo
e fará com que ele fique distante, separando os seus sentimentos
pessoais das suas possibilidades divinas. Então, com dor e com
gritos desesperados por parte do eu inferior abandonado, ele
voltará.
​Portanto eu digo, Que a paz esteja contigo. “Dou para ti a
minha paz” são palavras que só podem ser ditas pelo Mestre aos
discípulos amados que são como ele próprio. Há alguns, mesmo
entre aqueles que não conhecem a sabedoria oriental, a quem isso
pode ser dito, e a quem isso pode ser dito diariamente de modo
mais completo do que aqui.
[20] Observa as três verdades.[21] Elas são iguais. 
As regras mencionadas acima são as primeiras regras escritas
nos muros do Salão do Aprendizado.[22] Aqueles que pedirem,
obterão. Aqueles que desejarem ler, lerão. Aqueles que desejarem
aprender, aprenderão.
Que a paz esteja contigo.
2. Segunda Série de Regras
Do silêncio que é paz, surgirá uma voz forte.[23]
E essa voz
dirá: “Isso não é correto: tu colheste, agora deves plantar.” E
sabendo que esta voz é o próprio silêncio, tu obedecerás.
​Tu que agora és um discípulo, capaz de ficar de pé, capaz de
escutar, capaz de ver, capaz de falar, tu que venceste o desejo e
alcançaste o autoconhecimento, que viste a tua alma florescer e a
reconheceste, e que escutaste a voz do silêncio, deves ir para o
Salão do Aprendizado e ler o que lá está escrito para ti.
ANÁLISE:
Ser capaz de ficar de pé é ter confiança; ser capaz de escutar é
ter aberto as portas da alma; ser capaz de ver é ter alcançado a
percepção; ser capaz de falar é ter alcançado o poder de ajudar os
outros; haver vencido o desejo é ter aprendido como usar e
controlar o eu inferior; haver alcançado o autoconhecimento é ter se
retirado para a fortaleza interna a partir da qual o homem pessoal
pode ser visto com imparcialidade; ter visto a tua alma florescer é ter
obtido um vislumbre momentâneo em ti mesmo da transfiguração
que irá finalmente fazer de ti mais que um ser humano; reconhecer
é alcançar a grande tarefa de olhar para a luz resplandecente sem
baixar os olhos nem cair de volta com medo, como se estivesses
diante de algum fantasma. Isso ocorre com alguns, e assim, quando
a vitória está quase garantida, acontece a derrota; escutar a voz do
silêncio é entender que a única verdadeira orientação surge do
interior; ir para o Salão do Aprendizado é entrar no estado em que a
aprendizagem é possível. Então muitas palavras serão lá escritas
para ti, e escritas em letras de fogo, para que as entendas
facilmente. Porque quando o discípulo está pronto, o Mestre
também está pronto.
1. Permanece fora da batalha que vai começar, e, embora
lutes, não sejas tu o guerreiro.
2. Procura pelo guerreiro e deixa que ele lute em ti.
3. Ouve as ordens dele para a batalha e obedece a elas.
4. Não obedeças a ele como se ele fosse um general, mas
como se ele fosse tu mesmo, e como se as palavras ditas por ele
fossem a expressão dos teus desejos secretos; porque ele é tu
mesmo, embora seja infinitamente mais sábio e mais forte do que
tu. Procura por ele, para evitar que no calor e na pressa da luta tu
passes por ele sem vê-lo; e ele não te conhecerá, a menos que tu o
conheças. Se o teu grito chegar ao ouvido dele, então ele lutará em
ti e preencherá o desagradável vazio interno. Assim poderás passar
pela luta com calma e sem desgaste, permanecendo à parte e
deixando que ele lute por ti. Deste modo será impossível que erres
um golpe. Mas se não procurares por ele, se passares por ele sem
vê-lo, não haverá segurança para ti. Teu cérebro irá oscilar. Teu
coração ficará indeciso. No pó do campo de batalha, a tua vista e os
teus sentidos falharão, e não saberás distinguir teus amigos dos
teus inimigos.
Ele é tu mesmo, no entanto tu és apenas finito e tendes a errar.
Ele é eterno e firme. Ele é a verdade eterna. Uma vez que ele haja
entrado em ti e passe a ser o teu guerreiro, ele nunca mais te
abando-nará completamente, e no dia da grande paz ele se tornará
um contigo.
5. Escuta a canção da vida.
ANÁLISE:
Procura por ela e escuta-a primeiro em teu próprio coração. No
início talvez digas: “Ela não existe; quando a procuro, só encontro
discórdia.” Olha mais profundamente. Se ficares desanimado de
novo, faz uma pausa e olha mais fundo ainda. Há uma melodia
natural, uma fonte obscura em cada coração humano. Ela pode
estar escondida, completamente oculta e silenciada, mas está lá. Na
própria base do teu ser tu encontrarás fé, esperança e amor. Aquele
que escolhe o mal se recusa a olhar dentro de si mesmo, fecha os
seus ouvidos à melodia do seu coração, e fecha os seus olhos para
a luz da sua alma. Ele faz isso porque pensa que é mais fácil viver
nos desejos. Mas sob toda vida há a forte corrente que não pode ser
interrompida; ali estão, na realidade, as grandes águas. Encontra-as
e perceberás que todos, até a mais desgraçada das criaturas, fazem
parte delas, mesmo que alguém possa estar cego para este fato e
construa para si mesmo uma forma externa de horror
fantasmagórico. É neste sentido que eu te digo: todos aqueles seres
entre os quais tu lutas para avançar são fragmentos do Divino. E a
ilusão em que vives é tão enganosa que é difícil saber por
antecipação onde exatamente tu irás detectar pela primeira vez a
voz espiritual no coração dos outros. Mas deves saber com certeza
que esta voz ocorre no teu interior. Procura lá por ela, e quando a
tiveres escutado poderás reconhecê-la com mais facilidade ao teu
redor.
6. Guarda na memória a melodia que ouvires.
7. Aprende dela a lição da harmonia.
8. Podes manter-te erguido agora, firme como uma rocha em
meio ao tumulto, obedecendo ao guerreiro que é tu mesmo e é teu
rei. Deves estar despreocupado em relação à batalha,
concentrando-te no cumprimento das ordens dele, sem pensar no
resultado da luta, porque só uma coisa é importante; que o guerreiro
vença, e tu sabes que ele é incapaz de derrota. Permanecendo
assim, calmo e atento, usa a capacidade de escutar que tu obtiveste
pelo sofrimento e pela destruição do sofrimento. Apenas fragmentos
da grande canção virão até os teus ouvidos enquanto tu não fores
mais que um ser humano. Mas se os escutares, lembra deles
fielmente, de modo que nada do que te chegou seja perdido, e tenta
aprender a partir deles o significado do mistério que te rodeia. Com
o tempo não necessitarás de instrutor.[24] Porque assim como um
indivíduo tem voz, aquilo em que ele existe também tem voz. A
própria vida tem seu modo de falar e nunca está silenciosa. E o que
ela diz não é um grito, ao contrário do que tu, estando surdo, podes
supor. É uma canção. Aprende da canção que tu és parte da
harmonia; aprende a obedecer às leis da harmonia.
9. Observa atentamente toda a vida que te rodeia.
10. Aprende a olhar inteligentemente os corações dos homens.
ANÁLISE:
Desde um ponto de vista absolutamente impessoal, pois caso
contrário a tua visão estará distorcida. Portanto a impessoalidade
deverá primeiro ser compreendida.
A inteligência é imparcial: ninguém é teu inimigo; ninguém é teu
amigo. Todos são teus instrutores. O teu inimigo se torna um
mistério que deve ser resolvido, mesmo que para isso sejam
necessárias longas eras; porque o ser humano deve ser
compreendido. Teu amigo se torna uma parte de ti, uma extensão
do teu ser, um enigma difícil de decifrar. Só uma coisa é ainda mais
difícil de conhecer: o teu próprio coração. O mistério profundo do eu
só pode começar a ser visto quando os laços da personalidade são
afrouxados. Ele só se revelará diante da tua compreensão quando
estiveres situado à parte dele. Neste momento, e não antes,
poderás controlá-lo e guiá-lo. Neste momento, e não antes, poderás
usar todos os poderes dele, e dedicá-los a uma tarefa útil.
11. Observa com atenção total o teu próprio coração.
12. Porque através do teu próprio coração vem a única luz que
pode iluminar a vida e torná-la clara aos teus olhos.
Estuda os corações dos homens, de modo que possas saber
como é o mundo em que vives e do qual serás uma parte. Olha a
vida constantemente mudando e movendo-se ao teu redor, pois ela
é formada pelos corações dos homens, e, à medida que tu
aprenderes a compreender a natureza e o significado dos corações,
serás capaz, gradualmente, de ler a palavra maior da vida.
13. A fala só vem com o conhecimento. Obtém o conhecimento
e serás capaz de falar.
ANÁLISE:
É impossível ajudar os outros antes que tenhas obtido alguma
certeza tu mesmo. Quando tiveres aprendido as primeiras vinte e
uma regras e tiveres entrado no Salão do Aprendizado com teus
poderes desenvolvidos e teus sentidos libertados da ignorância,
então verás que há uma fonte dentro de ti, da qual brotará a fala.
Depois da décima terceira regra, não posso acrescentar mais
palavras ao que já foi dito. Eu te dou a minha paz. [25]
Estas regras foram escritas apenas para aqueles a quem eu
dou minha paz; aqueles que podem ler tanto com o sentido interior
quanto com o sentido externo.
14. Tendo obtido o uso dos sentidos internos, havendo
dominado os desejos dos sentidos externos, tendo vencido os
desejos da alma individual, e havendo obtido conhecimento,
prepara-te agora, ó discípulo, para entrar de fato no caminho. A
trilha foi encontrada; prepara-te para percorrê-la.
15. Pergunta à terra, ao ar e à água sobre os segredos que
eles guardam para ti. O desenvolvimento dos teus sentidos internos
te capacitará para fazer isso.
16. Pergunta aos seres sagrados da terra sobre os segredos
que eles guardam para ti. O controle dos desejos dos sentidos
externos te dará o direito de fazer isso.
17. Pergunta ao mais interior, ao uno, sobre o segredo final que
ele guardou para ti ao longo das eras.
A vitória grande e difícil, o domínio dos desejos da alma
individual, é um trabalho de eras. Portanto não tenhas expectativa
de obter essa recompensa até que eras de experiência tenham sido
acumuladas. Quando chega ao momento de aprender esta décima
sétima regra, o homem está a um passo de tornar-se mais do que
um ser humano.
18. O conhecimento que agora te pertence só é teu porque a
tua alma está em unidade com todas as almas puras, e com aquilo
que é o mais interno. Esta é uma confiança depositada em ti pelo
mais elevado. Trai esta confiança, usa erradamente o teu
conhecimento ou negligencia o que aprendeste, e mesmo agora é
possível que caias do alto nível que conquistaste. Grandes seres
caem de volta, até mesmo do limiar, incapazes de sustentar o peso
da sua própria responsabilidade e inca-pazes de seguir adiante.
Portanto, olha para este momento sempre com reverência e temor;
e fica preparado para a batalha.
19. Está escrito que, para aquele que está no limiar da
divindade, nenhuma lei pode ser estabelecida, e nenhum guia pode
existir. No entanto, como um esclarecimento para o discípulo, a luta
final pode ser descrita da seguinte maneira:
Agarra com força aquilo que não tem substância nem
existência.
20. Escuta apenas a voz que não tem som.
21. Olha apenas na direção daquilo que é tão invisível para os
sentidos internos quanto para os sentidos externos.

Que a paz esteja contigo.


3. Comentários a

“Luz no Caminho”
- I
“Antes que os olhos possam ver,
eles devem ser incapazes de lágrimas.”[26]
Os leitores devem lembrar que, para alguns, esta obra talvez
pareça possuir pouca coisa de filosofia. Para aqueles que a leem do
ponto de vista da linguagem comum, ela não faz sentido. Muitos
pensarão que ela não é um alimento espiritual. Estejam atentos e
não a leiam de modo rotineiro.
Há outro modo de ler, que é, na verdade, o único jeito útil no
caso de muitos autores. Trata-se de ler não só o que está nas entre-
linhas, mas o que está dentro das palavras. Na verdade, a tarefa é
decifrar um código profundo. Todas as obras alquímicas estão
escritas no código a que me refiro. Ele tem sido usado pelos
grandes filósofos e poetas de todos os tempos. Ele é usado
sistematicamente pelos que são Adeptos na percepção da vida e do
conhecimento. Ao mesmo tempo que estes seres parecem revelar a
mais profunda sabedoria, eles também escondem, nas próprias
palavras que expressam a sabedoria, o mistério real a que as
palavras se referem. Não podem fazer mais do que isso. Uma lei da
natureza estabelece que cada ser humano deve compreender estes
mistérios por si mesmo. Não é possível obtê-los por outro método. O
homem que deseja viver deve comer ele próprio seus alimentos;
este é o método simples usado pela natureza, e que se aplica
também à vida mais elevada. O homem que quiser viver e agir na
vida superior não pode ser alimentado com uma colher, como um
bebê. Deve alimentar-se por si mesmo.
Eu me proponho a colocar partes de “Luz no Caminho” em uma
linguagem nova e em alguns casos mais clara; mas não sei se este
esforço levará a uma compreensão. Para um homem surdo e mudo,
a verdade não se torna mais inteligível pelo fato de algum linguista
desorientado traduzir as palavras que transmitem a verdade e dizê-
las em todas as línguas vivas e mortas, gritando-as uma a uma em
seu ouvido. Mas para aqueles que não são surdos e mudos uma
linguagem pode ser mais fácil que as outras, e é a estes que eu me
dirijo.
Sei bem do fato de que já os primeiros aforismos de “Luz no
Caminho”, incluídos sob o Número I, permaneceram com o seu
signi-ficado interno selado para muitos que, em outros aspectos,
compreen-deram o propósito do livro.
Há quatro verdades seguras e comprovadas com relação ao
ingresso no ocultismo. Os Portões Dourados barram aquele limiar;
no entanto, alguns passam pelos portões e descobrem o que é
sublime, ilimitado e está mais além. Nos espaços mais distantes do
Tempo, todos passarão por aqueles portões. Mas eu gostaria que o
Tempo, o grande enganador, não fosse tão dominante. Para aqueles
que o conhecem e o amam, nada tenho a dizer. Aos outros - que
não são tão poucos quanto se poderia pensar, e para quem a
passagem do Tempo é como o golpe de um martelo e o sentido de
Espaço é como as barras de uma jaula de ferro -, eu irei explicar
uma e outra vez[27] até que possam compreender completamente.
As quatro verdades escritas na primeira página de “Luz no
Caminho”[28] se referem ao teste da iniciação do candidato a
ocultista. Enquanto não passar pelo teste, ele não pode chegar
sequer à fechadura do portão que dá acesso ao conhecimento. O
conhecimento é a maior herança do ser humano; por que, então, ele
não deveria tentar obtê-lo através de todos os caminhos?[29] O
laboratório não é o único local em que se pode fazer experimentos;
devemos lembrar que a palavra ciência deriva de sciens,
“consciente” ou “ciente”, e de scire, “conhecer”. A sua origem é
semelhante à origem da palavra “discernir”, “reconhecer”. A ciência,
portanto, não lida apenas com o que é matéria, nem sequer nas
suas formas mais sutis e obscuras. Uma ideia como essa nasce da
mentalidade superficial dos tempos atuais. “Ciência” é uma palavra
que abrange todas as formas de conhecimento. É extremamente
interessante saber das descobertas da Química e ver como elas
abrem caminho através do aspecto denso da matéria em direção às
suas formas mais finas; mas há outros tipos bem diferentes de
conhecimento, e nem todos os pesquisadores restringem o seu
desejo estritamente científico de obter conhecimento a experimentos
que podem ser testados diante dos sentidos físicos.
Todo aquele que possui um pouco de inteligência e não foi
reduzido à condição de idiota por algum vício dominante já tem a
impressão de que há sentidos mais sutis presentes nos sentidos
físicos, ou talvez tenha percebido isso com algum grau de certeza.
Não há nada de extraordinário nisso. Se nos déssemos ao trabalho
de ouvir o testemunho da Natureza, saberíamos que tudo o que é
perceptível para a vista comum tem algo ainda mais importante
escondido dentro de si. O microscópio abriu todo um mundo para
nós, mas dentro das estruturas que o microscópio revela, há um
mistério que máquina alguma pode sondar.
O mundo inteiro é animado e iluminado, até nas suas formas
mais materiais, por um mundo que há em seu interior. Este mundo
interno é chamado de “astral” por algumas pessoas, e esta é uma
palavra tão boa quanto qualquer outra, embora signifique
simplesmente “estelar”; mas as estrelas, como Locke assinalou, são
corpos que irradiam luz. Esta qualidade é característica da vida que
existe dentro da matéria; aqueles que a veem não necessitam de
lâmpadas para enxergar. A palavra inglesa “star” (estrela), além
disso, é derivada do verbo do inglês antigo “stir-an”, conduzir,
mover; e sem dúvida é esta vida interna que domina a vida externa,
assim como o cérebro de um ser humano guia os movimentos dos
seus lábios. De modo que embora a palavra “Astral” não seja em si
mesma excelente, posso usá-la sem problemas para alcançar meu
objetivo atual.
Toda a obra “Luz no Caminho” está escrita em uma linguagem
cifrada de símbolos astrais, e, portanto, só pode ser decifrada por
alguém que lê astralmente. E o seu ensinamento tem como meta
principal o desenvolvimento da vida astral.[30] Enquanto não for
dado o primeiro passo neste sentido, o conhecimento rápido que é
chamado de intuição segura continua sendo impossível para o ser
humano. E esta intuição segura e positiva é a única forma de
conhecimento que capacita o ser humano para trabalhar
rapidamente e alcançar o seu estado verdadeiro e elevado, dentro
dos limites do seu esforço consciente. Obter conhecimento através
de experimentos é um método muito tedioso para aqueles que
aspiram por realizar um real trabalho. Quem obtém conhecimento
através de uma intuição segura conquista o conhecimento em suas
várias formas com suprema rapidez, através de um intenso esforço
de vontade, assim como um operário pega suas ferramentas sem
pensar no peso delas ou em qualquer outra dificuldade. Ele não
perde tempo testando cada ferramenta, mas usa aquelas que lhe
parecem mais adequadas.
Cada uma das regras contidas em “Luz no Caminho” está
escrita para os discípulos todos, mas só para os discípulos, isto é,
“aqueles que obtêm conhecimento”. As leis desta escola não têm
qualquer utilidade ou interesse para ninguém, exceto os seus
alunos.
A aqueles que estão seriamente interessados em Ocultismo, eu
digo, em primeiro lugar: “obtenham conhecimento”. A aquele que
tem, lhe será dado. É inútil esperar pelo conhecimento. O círculo do
Tempo se fechará diante de ti e em tempos futuros tu ficarás sem
poder nascer e sem força. Portanto, eu digo o seguinte aos que têm
fome ou sede de conhecimento: “prestem atenção a estas regras”.
Nenhuma delas foi criada ou inventada por mim. Elas são
apenas a expressão de leis da natureza superior. Elas colocam em
palavras verdades que são tão absolutas em suas próprias esferas
quanto as leis que governam a conduta da Terra e da sua
atmosfera.
Os sentidos de que se fala nestas quatro afirmativas são os
sentidos astrais, ou internos.
O ser humano só deseja a luz que ilumina a alma não-espacial
quando a dor, o sofrimento e o desespero o arrancam da vida da
humanidade comum. Primeiro é o prazer que se esgota; depois, a
dor é vivida até que ela chega ao fim; finalmente os seus olhos se
tornam incapazes de lágrimas.
O que se segue é óbvio, embora eu saiba muito bem que será
desmentido enfaticamente por muitos que estão em simpatia com
ideias surgidas da vida interna. O ato de ver com o sentido da vista
astral é uma forma de atividade inicialmente de difícil compreensão
para nós. O cientista sabe que um milagre acontece cada vez que
uma criança nasce no mundo, desenvolve a visão dos olhos e
consegue comandá-la através do cérebro. Um milagre equivalente
acontece com cada um dos sentidos, sem dúvida; mas o controle da
visão talvez seja o esforço mais estupendo. A criança o faz quase
inconscientemente, pela força hereditária do hábito. Ninguém é
consciente, na vida adulta, de que alguma vez o tenha feito. Do
mesmo modo, não podemos lembrar os movimentos que nos
permitiram, por exemplo, subir uma montanha, um ano atrás. Isso
decorre do fato de que nós nos movimentamos, vivemos e temos o
nosso ser na matéria. Nosso conhecimento a respeito do mundo
material se tornou intuitivo.
O que acontece com a nossa vida astral é muito diferente.
Desde há longas eras o ser humano tem dado pouca atenção a ela;
tão pouca atenção que praticamente perdeu o uso dos sentidos
astrais. É verdade que em cada civilização a estrela brilha de novo e
o ser humano confessa, de modo mais ou menos tolo e confuso,
que tem consciência de existir. Mas com muita frequência ele nega
o fato. E, ao ser materialista, o ser humano se torna algo estranho,
um ser que não pode ver a sua própria luz. Ele passa a ser uma
coisa viva que não quer viver, um animal astral que tem olhos, e
ouvidos, e a fala, e energia, e no entanto não quer usar nenhum
destes dons. Este é um fato. O hábito da ignorância está tão
estabelecido que atualmente ninguém vê com a visão interna, se o
sofrimento ainda não fez com que os olhos físicos sejam incapazes
de ver, e ainda não fez com que o olhos estejam destituídos de
lágrimas - a umidade da vida.
Ser incapaz de derramar lágrimas é ter enfrentado e vencido a
simples natureza humana, e ter alcançado um equilíbrio que não
pode ser abalado por emoções pessoais.
Isso não implica dureza ou indiferença de coração. O fato não
significa que não haja dor, como acontece quando a alma que sofre
parece não ter mais forças para sofrer intensamente; não significa
que haja a insensibilidade típica da velhice, quando a emoção se
torna entorpecida porque as cordas que vibram com ela estão
gastas.[31] Nenhuma destas condições é adequada para um
discípulo, e se qualquer uma delas existir nele, terá que ser
superada antes que ele possa ingressar no caminho. A dureza de
coração é uma característica do homem egoísta, do egocêntrico,
para quem o portal está sempre fechado. A indiferença é patrimônio
do tolo e do falso filósofo. A indecisão os torna simples marionetes,
por que não têm a força necessária para encarar as realidades da
existência. Quando se desgasta a intensidade maior da dor e do
sofrimento, o resultado é uma letargia semelhante àquela que
acompanha a idade avançada, tal como na experiência usual de
homens e mulheres. Uma situação como esta torna impossível o
ingresso no caminho, porque nele o primeiro passo é difícil e só
pode ser dado por um indivíduo forte, cheio de vigor psíquico e
físico.
É verdade que, como disse Edgar Allan Poe, os olhos são as
janelas da alma; as janelas do palácio mal assombrado no qual ela
vive. Esta é a expressão mais próxima possível, em linguagem
comum, do significado do texto. Se a aflição, o desânimo, a
decepção ou o prazer podem abalar a alma fazendo-a perder o
contato com o calmo espírito que a inspira, e a umidade da vida se
derrama, mergulhando o conhecimento na sensação, então tudo fica
confuso, as janelas são escurecidas e a luz se torna inútil. Isso é tão
literalmente verdadeiro quanto o fato de que se um homem estiver
na beira de um precipício e perder sua calma devido a alguma forte
emoção, certamente cairá. O equilíbrio do corpo deve ser
preservado não só em lugares perigosos, mas também em solo
firme, e com a ajuda que a Natureza nos dá através da lei da
gravidade. O mesmo ocorre com a alma; ela é o elo entre o corpo
externo e o espírito, e brilha como uma estrela que está mais além.
A centelha divina existe no espaço estável em que nenhuma
convulsão da Natureza pode sacudir o ar; e isso ocorre sempre.
Mas a alma pode perder o seu contato com este espaço, e pode
perder o seu conhecimento disso, apesar de estes dois fatores
serem parte de um único todo; e é pela emoção, pela sensação, que
este contato é perdido.
Experimentar prazer ou dor causa uma vibração intensa que é,
para a consciência do ser humano, vida. Esta sensibilidade não
diminui quando o discípulo começa o autotreinamento; ela aumenta.
Este é o primeiro teste para a sua força. Ele deve sofrer, desfrutar
ou suportar dor mais agudamente que os outros seres humanos, ao
mesmo tempo que escolheu para si um dever que não existe para
os outros: o dever de não deixar que o sofrimento o afaste do seu
propósito firme. Na verdade, já no primeiro passo ele deve tomar as
rédeas de si mesmo e colocar-se um limite: e só ele pode fazer isso.
Os quatro primeiros aforismos de “Luz no Caminho” se referem
inteiramente ao desenvolvimento astral. Este desenvolvimento deve
ser realizado até certo ponto - isto é, deve ser completamente
iniciado - antes que o resto do livro seja realmente compreensível
além do plano intelectual, e, na verdade, antes que ele possa ser
lido como um tratado prático, e não metafísico.
Em uma das grandes Fraternidades místicas, há quatro
cerimônias, realizadas no início do ano, que ilustram e explicam de
modo prático estes aforismos. Só neófitos tomam parte destas
cerimônias, porque são funções relativas simplesmente ao limiar.
Mas elas servem para mostrar a seriedade do processo pelo qual
alguém se torna um discípulo, quando se compreende que estas
são todas cerimônias de sacrifício. A primeira cerimônia é esta que
estou comentando. A mais aguda satisfação, o sofrimento mais
amargo, a angústia da perda e o desespero são despertados na
alma trêmula, que ainda não encontrou a luz na escuridão e está tão
indefesa como um cego. E até que estes choques possam ser
suportados sem perda de equilíbrio, os sentidos astrais devem
permanecer fechados. Assim estabelece a lei da compaixão. O
“médium” ou o “espírita” que se apressa a ingressar no mundo do
psiquismo sem a devida preparação é alguém que vai contra a lei,
alguém que desobedece às leis da super-natureza. Quem contraria
as leis da Natureza perde a saúde física; quem contraria as leis da
vida interior, perde a saúde psíquica. Os “médiuns” se tornam
loucos, se suicidam, se transformam em criaturas miseráveis e
destituídas de sentido moral. Frequentemente terminam como
descrentes, duvidando até mesmo daquilo que os seus próprios
olhos viram. O discípulo é levado a se tornar o seu próprio mestre
antes de aventurar-se por este terreno perigoso, e antes de tentar
ficar frente a frente com os seres que vivem e trabalham no mundo
astral, aos quais nós chamamos de mestres. Nós os chamamos de
mestres por causa do seu grande conhecimento e da sua
capacidade de controlar não só a si mesmos, mas as forças ao seu
redor.
A condição da alma que vive para a vida de sensações e não
para a vida de conhecimento é uma condição vibratória ou oscilante,
e não fixa. Esta é a representação literal mais aproximada do fato;
mas só é literal para o intelecto, e não para a intuição. É necessário
um outro vocabulário para esta parte da consciência humana. A
ideia de “condição fixa” pode ser, talvez, substituída pela ideia de
“estar em casa”. No mundo das sensações, nenhuma “casa”
permanente pode ser encontrada, porque a mudança é a lei desta
existência vibratória. Este é o primeiro fato a ser aprendido pelo
discípulo. É inútil parar e chorar por causa de uma cena em um
caleidoscópio que já mudou.
Bulwer Lytton abordou com grande força o fato bem conhe-cido
de que a primeira experiência do neófito em Ocultismo é uma
tristeza insuportável. Uma sensação de vazio cai sobre aquele que
faz do mundo algo sem valor e da vida um esforço inútil. Isso ocorre
após a sua primeira contemplação séria do abstrato.[32] Ao ver, ou
mesmo ao tentar ver o mistério inefável da sua própria natureza
superior, ele faz com que a provação inicial caia sobre si. A
oscilação entre prazer e dor deixa de ocorrer, talvez durante um só
instante; mas isso é o suficiente para que ele se liberte das amarras
que o ligavam ao mundo da sensação. Ele experimentou, mesmo
que brevemente, a vida maior; e a partir de então a existência
convencional é acompanhada por uma sensação de irrealidade, de
vazio, de uma negação horrível. Este é o pesadelo que acompanha
o neófito no romance “Zanoni”, de Bulwer Lytton. E mesmo o próprio
Zanoni, que havia aprendido grandes verdades, e a quem grandes
poderes haviam sido confiados, ainda não havia passado de fato
pelo limiar no qual medo e esperança, desespero e contentamento,
parecem num momento realidades absolutas e no momento
seguinte meras fantasias.
Esta provação inicial é frequentemente trazida até nós pela
própria vida. Porque afinal de contas a vida é o grande instrutor.
Voltamos a estudar a vida depois que adquirimos poder sobre ela,
assim como o professor de Química aprende no laboratório mais do
que o seu aluno. Há pessoas tão próximas ao portal do
conhecimento que a própria vida as prepara para o conhecimento, e
ninguém precisa invocar o terrível guardião da entrada. Tais
indivíduos devem ser naturalmente perspicazes e fortes, capazes do
prazer mais intenso. Em seguida surge o sofrimento e define o seu
grande dever. As formas mais intensas de dor caem sobre tais
indivíduos, até que finalmente eles emergem do estupor em que
estavam as suas consciências, e, pela força da sua vitalidade
interna, avançam através do limiar até um lugar de paz. Então a
vibração da vida perde o seu poder de dominação. A natureza
sensível ainda deve sofrer, mas a alma se libertou e permanece
afastada, guiando a vida na direção da sua grandeza. Aqueles que
estão sujeitos ao Tempo e atravessam lentamente todos os seus
espaços vivem através de uma longa série de sensações, e sofrem
uma constante mistura de prazer e dor. Eles não se atrevem a
dominar e vencer a serpente do eu inferior, o que os tornaria divinos.
Preferem continuar afligindo-se ao longo das mais diversas
experiências, e sofrendo os golpes das forças contraditórias.
Quando um destes indivíduos sujeitos ao Tempo decide entrar
no caminho do Ocultismo, esta é sua primeira tarefa. Se a vida
ainda não a tiver ensinado a ele, se ele não for suficientemente forte
para ensinar esta tarefa a si mesmo, mas tiver força suficiente para
pedir e merecer a ajuda de um mestre, então esta temível provação,
descrita em “Zanoni”, será colocada diante dele. A oscilação em que
ele vive é por um instante eliminada e ele tem que sobreviver ao
choque de enfrentar o que lhe parece à primeira vista ser o abismo
do nada. Só quando ele tiver aprendido a viver neste abismo, e
quando tiver encontrado a paz deste abismo, será possível que seus
olhos se tornem incapazes de lágrimas.
A dificuldade de escrever de maneira compreensível sobre
estes assuntos é grande. Eu peço a quem tiver lido este artigo com
algum interesse e ainda permanecer com dúvidas e perplexidades
que me escreva através da seção dedicada aos leitores desta
revista.[33] Faço este pedido porque as perguntas bem formuladas
são tão úteis para o leitor quanto as respostas a elas.
4. Comentários a

“Luz no Caminho”
- II
“Antes que o ouvido possa ouvir,
ele deve ter perdido sua sensibilidade.”
​Talvez esta afirmativa pareça curiosa, mas as quatro primeiras
regras de “Luz no Caminho” são indubitavelmente as mais
importantes de todo o livro, com uma única exceção. O motivo pelo
qual são tão importantes está no fato de que elas contêm a lei vital,
a própria essência criativa do homem astral. E é apenas na
consciência astral (ou autoiluminada) que as regras que se seguem
a estas quatro reco-mendações iniciais possuem um significado
dinâmico. Quando alguém obtém o uso dos sentidos astrais, é
natural que passe a usá-los, e as regras posteriores são apenas
orientações para o seu uso. Quando afirmo isso, quero dizer,
naturalmente, que as quatro primeiras regras são as que têm
importância e interesse para quem as lê em uma página. Quando
elas são gravadas no coração e na vida de um ser humano, as
regras posteriores se transformam inevitavelmente em afirmativas
metafísicas que não são apenas interessantes, ou extraordinárias,
mas fatos concretos da vida a serem captados e vivenciados.
As quatro regras estão escritas na grande câmara de toda
verdadeira loja de uma Fraternidade viva. Quer o homem venda sua
alma ao diabo, como Fausto[34], ou seja enganado na luta, como
Hamlet, ou consiga passar adiante e avançar no Caminho, em
qualquer caso estas palavras são para ele. O homem só pode
escolher entre a virtude e o vício quando já é homem. Um bebê e
um animal não podem fazer tal escolha. O mesmo ocorre com o
discípulo. Ele deve primeiro tornar-se um discípulo, antes mesmo de
ver os dois caminhos e escolher entre eles. O esforço de criar a si
mesmo como um discípulo é um renascimento que deve ser feito
por si e sem professor algum. Antes que as quatro regras sejam
aprendidas, nenhum instrutor pode ser útil para ele; e este é o
motivo pelo qual “os Mestres” são mencionados desta forma.
Nenhum mestre verdadeiro, seja ele um adepto que domina o poder,
o amor, ou o caminho da escuridão[35], pode afetar o ser humano
enquanto estas quatro regras não forem compreendidas e
vivenciadas.
As lágrimas, como já foi dito, podem ser definidas como a
umidade da vida. Antes que seus olhos se abram para o mundo
super-humano, a alma deve ter deixado de lado as emoções
humanas e alcançado um equilíbrio que os infortúnios não podem
abalar.
A voz dos Mestres está sempre no mundo, mas ela só pode ser
escutada por aqueles cujos ouvidos já não recebem os sons que
afetam a vida pessoal.[36] O riso já não torna o coração leve, a raiva
já não o domina mais, e palavras ternas já não funcionam como um
bálsamo.[37]
 Porque aquele nível interno de consciência para o qual
os ouvidos funcionam como um portal externo constitui um lugar
estável de paz em si mesmo, e ninguém pode perturbá-lo.
Assim como os olhos são as janelas da alma, os ouvidos são o
seu portal, ou suas portas. Através dos ouvidos vem o
conhecimento da confusão do mundo. Os grandes seres que
conquistaram a vida e se tornaram mais do que discípulos
permanecem em paz e imperturbados em meio à vibração e ao
movimento agitado e caleidoscópico da humanidade. Eles têm
dentro de si um conhecimento seguro e uma perfeita paz. Graças a
isso, não ficam agitados devido aos fragmentos parciais e errados,
trazidos até os seus ouvidos pelas vozes mutáveis dos que estão ao
seu redor. Quando falo de conhecimento, me refiro a um
conhecimento intuitivo. Esta informação segura não pode ser obtida
através de um trabalho intenso, ou por experimentação, porque
estes métodos só podem ser aplicados ao mundo material, e porque
a matéria é em si mesma uma substância completamente incerta e
insegura, sendo continuamente atingida por mudanças. As leis mais
absolutas e universais da vida natural e física, tal como são vistas
pelo cientista, serão deixadas de lado quando este universo tiver ele
próprio passado[38], e só a sua alma existir no silêncio. Qual será
então o valor do conhecimento das leis descobertas por esforço e
por observação?[39] Espero que nenhum leitor ou crítico imagine
que com isso eu pretendo desprezar o conhecimento adquirido, ou o
trabalho dos cientistas. Ao contrário, eu penso que os cientistas são
os pioneiros do pensamento moderno. Os dias da literatura e da
arte, quando os poetas e os escultores viam a luz divina e a
colocavam em sua linguagem grandiosa, estes dias estão
enterrados no longo passado junto com os escultores anteriores a
Fídias e os poetas anteriores a Homero. Os mistérios já não
governam o mundo do pensamento e da beleza; a força que o
governa é a vida humana, e não algo que o transcenda. Mas os
trabalhadores cientistas estão progredindo, menos por sua vontade
própria do que pela força das circunstâncias, na direção daquela
linha distante que separa as coisas interpretáveis das coisas que
não podem ser interpretadas. Cada nova descoberta os leva a mais
um passo adiante. Portanto eu tenho grande estima pelo
conhecimento que é obtido por trabalho e experimentação.
Mas o conhecimento intuitivo é algo inteiramente diferente. Ele
não é adquirido de alguma forma, mas, poderíamos dizer, é uma
função da alma; não da alma animal, que se transforma em um
fantasma após a morte, quando a luxúria, o afeto ou a memória de
más ações a mantém na vizinhança dos seres humanos; mas da
alma divina que anima todas as formas externas do ser
individualizado.
Esta função, naturalmente, pertence à alma divina e lhe é
inerente. O candidato a discípulo deve erguer-se até a consciência
desta alma através de uma força de vontade intensa, decidida e
indômita. Uso a palavra “indômita” por um motivo específico. Só
aquele que é indomável, que não pode ser dominado, que sabe que
tem que exercer o papel de senhor em relação aos seres humanos,
aos fatos, em relação a todas as coisas exceto a sua própria
divindade[40], pode despertar esta função. “Através da fé todas as
coisas são possíveis”. Os céticos riem da fé e se orgulham da
ausência dela em suas mentes. A verdade é que a fé[41]
é uma
grande engrenagem, uma energia enorme, que, na verda-de, pode
realizar tudo. Porque ela é o compromisso ou aliança entre a parte
divina do homem e o seu eu inferior.
O uso desta engrenagem é indispensável para obter conhe-
cimento intuitivo, porque, se um homem não acreditar que tal
conhecimento existe dentro de si mesmo, como poderá resgatá-lo e
usá-lo?
Sem fé ou confiança ele fica mais indefeso que um pedaço de
madeira abandonado às marés do oceano. Assim como a madeira é
atirada para cá e para lá, um homem pode ser jogado pelos acasos
do destino. Mas tais aventuras são apenas externas e possuem
pouca importância. Um escravo pode ser arrastado pelas ruas,
acorrentado, e ao mesmo tempo manter a alma serena de um
filósofo, como ocorreu no caso de Epicteto. Um homem pode ter
todas as regalias do mundo, sendo aparentemente o senhor
absoluto do seu próprio destino, e no entanto não saber o que é
paz, e desconhecer o que é certeza ou segurança, porque é
abalado dentro de si mesmo pelas marés de pensamento que
chegam até ele. Estas marés mutáveis não só arrastam o homem
corporalmente para cá e para lá como um pedaço de madeira à
deriva. Isso não seria nada. Elas entram em sua alma e tiram dela
toda inteligência permanente; e a deixam vazia, em branco, de
modo que nela só ocorrem impressões passageiras.
Para deixar mais claro o que digo, devo usar uma imagem
simbólica. Quero que penses num autor com seus escritos, um
pintor com suas telas, um compositor escutando as melodias que
surgem em sua imaginação feliz. Supõe que qualquer um destes
trabalhadores passa seus dias junto a uma grande janela e olhando
uma rua movimentada. A força da animação da vida interromperia
tanto a visão como a audição, e para ele o grande tráfego da cidade
seria apenas uma cena passageira. Mas um homem cuja mente
está vazia e cujo dia não tem objetivo, sentado àquela mesma
janela, observa os que passam e percebe os rostos que o agradam
ou interessam. O mesmo ocorre na relação da mente com a
verdade eterna. Se a mente já não transmite à alma as suas
flutuações, o seu conhecimento parcial e sua informação pouco
confiável, então, no lugar interno de paz encontrado quando foi
aprendida a primeira regra[42] - naquele lugar interno a luz do real
conhe-cimento se torna uma chama. Neste momento, os ouvidos
começam a escutar. No início, muito vagamente e de modo quase
indefinido. E, de fato, estas primeiras indicações do começo da vida
real e verdadeira são tão fracas e tênues que, às vezes, são
colocadas de lado como meras fantasias e resultados da
imaginação.
Mas, antes que estas indicações possam tornar-se mais que
meras fantasias[43], o abismo do nada deve ser enfrentado de outra
forma. O completo silêncio, que só pode ocorrer quando se fecham
os ouvidos a todos os sons transitórios, vem como um horror mais
assustador do que até mesmo o vazio sem forma do espaço.[44]
Nossa única concepção mental do espaço vazio ocorre, penso eu,
quando ela é reduzida ao elemento mais simples do pensamento, a
total escuridão.[45]
Este é um grande terror físico para a maior parte
das pessoas, e quando visto como um fato eterno e imutável, pode
significar, para a mente, mais a ideia da aniquilação do que qualquer
outra coisa. Mas esta é a obliteração de apenas um sentido; e o
som de uma voz pode surgir e trazer conforto mesmo na mais
profunda escuridão. Tendo encontrado o caminho que o conduz até
esta escuridão que é o abismo temível, o discípulo deve então
fechar as portas da sua alma para que nenhum elemento
reconfortante, e tampouco nenhum inimigo, possa entrar nela. E é
ao fazer este segundo esforço que o fato de que a dor e o prazer
constituem uma mesma sensação se torna perceptível por aqueles
que antes eram incapazes de reconhecê-lo. Porque quando a
solidão do silêncio é alcançada, a alma tem uma grande fome, um
desejo muito intenso e apaixonado de alguma forma de sensação
sobre a qual possa  descansar. Essa ânsia é suficientemente forte
para que uma sensação dolorosa passe a ser tão bem-vinda quanto
uma sensação agradável.[46] Quando a consciência disso é obtida,
ao captá-la e mantê-la firmemente consigo, o homem que possui
coragem pode destruir de imediato a “sensibilidade”. Quando o
ouvido já não discrimina entre o que é agradável e o que é doloroso,
ele já não é afetado pelas vozes dos outros.
Então é possível, e é
seguro, abrir as portas da alma.
A “visão” é o primeiro esforço, e o mais fácil, porque é obtida
em parte através de um esforço intelectual. Como se sabe, o
intelecto pode vencer o coração na vida comum. Portanto, este
passo preliminar ainda está no domínio da matéria. Mas o segundo
passo não permite que haja esta ajuda, nem qualquer outro auxílio
do mundo material. Naturalmente quando falo de ajuda material me
refiro à ação do cérebro, ou das emoções, ou da alma humana. Ao
fazer com que os ouvidos ouçam apenas o silêncio eterno, o ser que
nós chamamos de humano se torna algo que já não é humano.[47]
Até mesmo uma observação muito superficial das mil e uma
influências que os outros exercem sobre nós mostra que isso é
verdade. Um discípulo cumprirá todos os deveres inerentes à sua
condição humana; mas ele os cumprirá de acordo com o seu próprio
sentido do que é correto, e não segundo a opinião de qualquer
pessoa ou grupo de pessoas. Este é um resultado evidente do fato
de que ele acredita no conhecimento, ao invés de adotar alguma
forma de crença cega.
Para obter o puro silêncio necessário ao discípulo, é preciso
deixar de lado o coração, as emoções, o cérebro e as suas
racionalizações. Estes são meros mecanismos que perecem ao final
de cada vida humana. A essência que está mais além, que
determina a força motivadora e dá vida ao homem, deve erguer-se e
agir. Esta é a hora de maior perigo. No primeiro teste o homem pode
ficar enlouquecido pelo medo. Bulwer Lytton escreveu sobre esta
primeira provação. Nenhum romancista chegou até o segundo teste,
embora alguns dos poetas tenham chegado. A sua sutileza e o seu
grande perigo estão no fato de que a medida da força de um homem
determina a sua chance de passar adiante, ou de seguir pelo menos
caminhando de algum modo. Se ele tiver força suficiente para
acordar aquela parte de si mesmo com a qual está pouco
familiarizado, a suprema essência, então poderá erguer os portões
de ouro, e neste caso ele passa a ser um verdadeiro alquimista, que
possui o elixir da vida.
É neste ponto da experiência que o ocultista fica separado de
todos os outros homens e ingressa em uma vida que é sua própria.
Ele entra no caminho da realização individual[48], ao invés da mera
obediência aos espíritos que governam nosso planeta Terra. Este
erguer-se como uma força individual na verdade o identifica com as
forças mais nobres da vida, e faz com que ele esteja em unidade
com elas. Porque elas estão além dos poderes desta terra e das leis
do universo.[49]
Aqui está a única esperança de êxito no grande
esforço; saltar de imediato desde o seu atual ponto de vista para o
seu próximo ponto de vista, e tornar-se desde já uma parte
intrínseca do poder divino - assim como ele já vinha sendo uma
parte intrínseca do poder intelectual - na grande Natureza à qual ele
pertence. Ele permanece sempre à frente de si mesmo, se uma tal
contradição pode ser compreendida. Os irmãos mais velhos, os
pioneiros, são os homens que aderem a esta posição, que
acreditam no seu poder intrínseco de progredir e no poder de
progredir que pertence à raça humana inteira. Cada indivíduo deve
dar o grande salto por si mesmo e sem ajuda.[50] No entanto, já é
um ponto de apoio saber que outros percorreram antes este
caminho. É possível que eles tenham se perdido no abismo; isso
não importa[51], porque, pelo menos, tiveram a coragem de entrar no
caminho.
Eu digo que é possível que eles tenham se perdido no
abismo[52] porque ninguém que tenha passado adiante é
reconhecível, até que a situação nova e inteiramente diferente tenha
sido alcançada por ambos.[53] É desnecessário discutir neste
momento qual é a nova situação. Digo apenas que, no estado inicial
de silêncio em que entra o homem, ele perde o conhecimento dos
seus amigos, dos que o amam, e de todos os que são mais
próximos a ele; e também perde a visão dos seus professores, e
daqueles que trilharam o caminho antes dele.[54] Explico isso porque
dificilmente alguém passa adiante sem amargas reclamações. Se a
mente pudesse compreender antecipadamente que o silêncio deve
ser completo, esta reclamação não surgiria criando um obstáculo no
caminho.[55]
O teu professor ou antecessor pode apoiar-te, e pode
dar-te toda a simpatia de que o coração humano é capaz. Mas
quando vêm o silêncio e a escuridão, tu perdes toda percepção do
teu instrutor. Ficas então sozinho. Ele não pode ajudar-te, não
porque ele tenha perdido o poder que possui, mas porque tu
invocaste teu grande inimigo.
O teu grande inimigo és tu mesmo. Se fores capaz de enfrentar
a tua própria alma na escuridão e no silêncio, vencerás o eu físico
ou animal, o eu que vive apenas nas sensações.
Sinto que esta afirmação pode parecer complexa. Na realidade
ela é bastante simples. Quando o ser humano chega à maturidade e
a civilização está no auge, o homem fica entre dois fogos. Bastaria
que ele alcançasse a sua grande herança, para que o estorvo da
vida meramente animal fosse deixado de lado sem dificuldade. Mas
ele não faz isso, e assim as raças humanas florescem, envelhecem
e morrem, e são eliminadas da face da terra, por mais esplêndido
que tenha sido o seu florescimento. E cabe ao indivíduo fazer este
grande esforço; recusar-se a ter medo desta natureza maior, e dizer
não à possibilidade de ser levado de volta ao seu eu menor ou mais
material. Cada indivíduo que realiza isso é um redentor da raça
humana. Ele pode não proclamar as suas ações; pode atuar em
segredo e em silêncio. Mas ele estabelece uma ligação entre o ser
humano e a sua parte divina, entre o conhecido e o desconhecido,
entre a agitação dos mercados e o silêncio dos Himalaias cobertos
de neve. Para criar esta ligação, não é necessário que ele caminhe
entre os homens; no plano astral ele é esta ligação, e este fato faz
dele um ser diferente do resto da humanidade. Ainda neste ponto
inicial do caminho do conhecimento, quando não deu mais que o
segundo passo, ele vê que seus pés estão mais firmes e percebe
que é reconhecido como parte de um todo.
Esta é uma das contradições da vida. Elas são tão frequentes
que constituem matéria-prima para escritores. O ocultista descobre
que as contradições se tornam muito mais acentuadas à medida
que se esforça por viver a vida que escolheu. Quando se recolhe em
seu próprio interior e se torna independente, ele vê que passa a ser
mais nitidamente parte de uma grande maré de pensamentos e
sentimentos definidos. Quando aprende a primeira lição, vence a
fome do coração e recusa-se a viver com base no amor dos outros,
ele percebe que é mais capaz de inspirar amor. À medida que ele
afasta a vida, ela vem a ele sob uma nova forma e com um novo
significado. Para o homem, o mundo sempre tem sido um lugar com
muitas contradições; quando ele se torna discípulo, ele percebe que
a vida pode ser descrita como uma série de paradoxos. Este é um
fato na natureza, e a razão disso é bastante compreensível. A alma
do homem “permanece como uma estrela à parte”, e isso ocorre
mesmo com a alma do mais vil entre nós, enquanto que a sua
consciência está sob a lei da vida sensorial e vibratória.
Este fato em si mesmo é suficiente para causar as
complicações de caráter que fornecem a matéria-prima para o
romancista. Todo ser humano é um mistério, tanto para amigos
como para inimigos, e é um mistério também para si mesmo. É
frequentemente impossível descobrir as suas motivações, e ele
próprio não consegue compreendê-las ou saber por que ele faz isso
ou aquilo. O esforço do discípulo visa despertar a consciência na
parte celestial de si mesmo, ali onde seu poder e sua divindade
estão a dormir. À medida que sua consciência desperta, as
contradições do ser humano se tornam mais acentuadas que nunca,
e o mesmo ocorre com os paradoxos através dos quais ele vive.
Porque, naturalmente, o homem cria sua própria vida, e “as
aventuras são para os aventureiros”. Este é um provérbio cheio de
sabedoria, que tem como base a realidade e cobre toda a área da
experiência humana.
A pressão sobre a parte divina do homem reage sobre a parte
animal. Quando a alma silenciosa acorda, ela faz com que a vida
comum do ser humano fique mais cheia de propósito, mais vital,
mais real e mais responsável. Para manter o foco nos dois
exemplos já mencionados, o ocultista que se retirou para sua
própria cidadela encontrou sua força; ele imediatamente se torna
consciente das exigências que o dever faz em relação a si. Ele não
obtém sua força por direito próprio, mas porque é uma parte do
todo. Assim que ele permanece seguro em relação à vibração da
vida e pode ficar imperturbável, o mundo externo clama, pedindo a
ele que venha trabalhar nas circunstâncias externas. O mesmo
ocorre com o coração. Quando o coração não deseja mais coisa
alguma para si, é convidado a doar generosamente.
“Luz no Caminho” foi descrito como um livro de paradoxos, e
com razão; como poderia ser outra coisa, se ele lida com a
verdadeira experiência pessoal do discípulo?
Adquirir os sentidos astrais da visão e da audição, ou, em
outras palavras, obter a percepção e abrir as portas da alma, é uma
tarefa gigantesca que pode exigir o sacrifício de muitas encarnações
sucessivas. E, no entanto, quando a vontade desenvolveu sua força,
o milagre inteiro pode ser realizado em apenas um segundo de
tempo cronológico. Assim o discípulo deixa de ser escravo do
Tempo.
Estes dois passos iniciais são negativos[56]: isto é, eles
implicam um abandono da condição atual das coisas, mais do que
um avanço em direção a outra situação. Os dois passos a seguir
são ativos, e implicam um progresso na direção de outro estado de
ser.
5. Comentários a

“Luz no Caminho”
- III
O Pedido do Neófito
“Antes que a voz possa
falar na presença dos Mestres...”
A fala é o poder da comunicação; o momento do ingresso na
vida ativa é marcado pela sua conquista.
E agora, antes de dar mais um passo à frente, quero explicar
um pouco o modo como estão organizadas as regras escritas em
“Luz no Caminho”. As primeiras sete regras numeradas são
subdivisões das duas primeiras regras não-numeradas, que eu
comentei nos dois ensaios anteriores. As regras numeradas são
simplesmente um esforço meu para tornar as regras não-numeradas
mais inteligíveis. As regras “oito” a “quinze”, das numeradas, se
referem a esta regra que agora abordo.
Como já disse, estas regras foram escritas para todos os
discípulos, e para mais ninguém. Elas não têm interesse para outras
pessoas. Portanto, espero que só os discípulos se deem ao trabalho
de ler a continuação destas anotações. Expandirei - se isso for
solicitado - os comentários das duas primeiras regras, que incluem
toda a parte do esforço para a qual é necessário o bisturi do
cirurgião. Mas espera-se que o discípulo enfrente sem ajuda a
serpente, o seu eu inferior. Ele deve suprimir suas paixões e
emoções humanas pela força da sua própria vontade. O discípulo só
pode pedir a ajuda de um Mestre quando isso é realizado pelo
menos em parte. De outro modo as portas e janelas da sua alma
ficarão manchadas, cegas, e escurecidas, impedindo que qualquer
conhecimento chegue até ele.
Nestes comentários, não pretendo ensinar a ninguém como
lidar com sua própria alma: simplesmente dou conhecimento ao
discípulo. Não estou escrevendo para todos, agora. A realidade
superior impede isso através de suas próprias leis imutáveis.[57]
As quatro regras que escrevi para os ocidentais que quiserem
estudá-las estão, como eu disse, na antecâmara de toda
Fraternidade viva, e posso acrescentar: na antecâmara de toda
Fraternidade ou Ordem, viva, morta, ou ainda por ser formada.
Quando falo de uma Fraternidade ou Ordem, não me refiro a uma
entidade arbitrária criada por eruditos e intelectuais; me refiro a um
fato verdadeiro na realidade superior, um estágio de
desenvolvimento na direção do Absoluto Bem.[58] Durante este
desenvolvimento, o discípulo encontra vários graus de harmonia, de
conhecimento puro, de verdade pura, e, à medida que avança por
tais graus, ele vê a si mesmo tornando-se parte de algo que pode
ser de algum modo descrito como uma camada de consciência
humana. Ele descobre os seus colegas, os seres que possuem
como ele um caráter altruísta. A sua associação com eles se torna
permanente e indissolúvel porque tem como sua base uma
semelhança vital, de substância. Ele assume um compromisso
interno com eles cujo voto solene não requer que se digam palavras
e não necessita uma estrutura de linguagem convencional. Este é
um aspecto do que quero dizer quando me refiro a uma
Fraternidade.
Se as primeiras regras são corretamente postas em prática, o
discípulo percebe que está situado em um limiar. Se a sua vontade
for suficientemente firme, surge então o poder de falar: e este é um
poder duplo. Porque agora, à medida que avança, ele vê a si
mesmo entrando em um estado de florescimento no qual cada botão
lança, ao abrir-se, vários raios ou pétalas. Para exercitar o seu novo
dom, ele deve usá-lo em seu caráter duplo. Ele descobre em si
mesmo o poder de falar na presença dos mestres; em outras
palavras, ele tem o direito de pedir contato com o elemento mais
divino daquele estado de consciência no qual ingressou. Mas ele se
vê compelido, pela natureza da sua situação, a agir de duas
maneiras ao mesmo tempo. Ele não pode mandar a sua voz até as
alturas em que estão os deuses, antes de chegar aos lugares
profundos onde a luz não brilha de modo algum. O discípulo chegou
a uma situação que é regulada por uma lei de ferro. Se ele pedir
para tornar-se um neófito, ele se torna de imediato um servidor. No
entanto o serviço que prestará é sublime, e para ver isso basta
observar o caráter daqueles que o acompanharão. Porque os
mestres são também servidores; eles servem e só depois pedem a
sua recompensa. Uma parte do serviço deles é deixar que o
conhecimento chegue até o discípulo; o primeiro ato de serviço, da
parte do discípulo, é dar algo daquele conhecimento aos que ainda
não estão preparados para estar onde ele está. Esta não é uma
decisão arbitrária tomada por algum mestre, instrutor ou ser
semelhante, por mais divino que seja. É uma lei daquela vida na
qual o discípulo agora entrou.
Portanto, estava escrito no portal interno das lojas da antiga
Fraternidade Egípcia: “O trabalhador é digno de ser contratado”.
A expressão “Pede e terás” soa como demasiado fácil e
simples para ser verdadeira. Mas o discípulo só pode “pedir”, no
sentido místico em que a palavra é empregada nesta escritura,
depois de haver alcançado o poder de ajudar os outros.
​Por que isso deve ser assim? Esta afirmação não soa como
excessivamente dogmática?
​Será demasiado dogmático dizer que, antes de saltar, um
homem deve ter um chão firme? A situação é a mesma. Se for dada
ajuda, e for realizado um trabalho, então existe um real pedido. Não
se trata de uma reivindicação pessoal de pagamento, mas de um
pedido consubstancial. Os seres divinos doam, e eles exigem que tu
também does, antes de seres admitido como um deles.
Esta lei é descoberta assim que o discípulo tenta falar. Porque
a fala é um dom que nasce apenas para o discípulo que tem poder e
conhecimento. O espiritualista entra no mundo psíquico-astral, mas
não encontra lá qualquer fala determinada, a menos que peça por
ela e continue pedindo. Se ele estiver interessado em “fenômenos”,
ou nas meras circunstâncias e acasos da vida astral, ele não entrará
em qualquer raio direto de pensamento ou de propósito
determinado. Ele apenas existirá e se divertirá na vida astral assim
como existia e se divertia na vida física. Há certamente uma ou duas
lições simples que o mundo psíquico-astral pode ensinar a ele,
assim como há lições simples que a vida material e intelectual lhe
ensina. E estas lições têm que ser aprendidas; o homem que se
propõe a viver a vida do discípulo sem ter aprendido as lições
prévias e simples deve sempre sofrer devido à sua ignorância. Estas
lições são vivenciais, e precisam ser estudadas de uma maneira
vivencial. Devem ser experimentadas do início ao fim, uma e outra
vez, de modo que cada aspecto da natureza do aprendiz seja
permeado por elas.
Voltemos ao ponto inicial. Ao pedir pelo poder da fala, o neófito
clama por orientação ao Grande Ser que permanece na posição de
mais destaque no raio de conhecimento em que ingressou. Quando
ele faz isso, a sua voz é lançada de volta pelo poder de que ele se
aproximou, e ecoa até os níveis mais profundos da ignorância
humana. De algum modo vago e confuso, é levada uma notícia a
todos os seres humanos que a escutarem; a notícia de que existem
um conhecimento e um poder benéficos, e de que eles são
ensinados. Nenhum discípulo pode passar pelo limiar sem divulgar
esta notícia, e sem registrá-la de uma maneira ou de outra.
Ele é tomado de horror ao ver o modo imperfeito como o faz; e
então vem o desejo de fazer a transmissão de uma maneira mais
correta. Junto com o desejo de ajudar os outros, vem o poder de
fazê-lo. É puro o desejo que vem até ele. Ele não pode obter crédito,
nem glória, nem recompensa pessoal por realizar este desejo. É por
isso que ele obtém o poder de alcançá-lo.
A história de todo o passado, até onde podemos conhecê-lo,
mostra muito claramente que não há crédito, glória ou recompensa
a serem ganhos em troca desta primeira tarefa pedida ao Neófito.
Os místicos sempre a desprezaram, e os videntes não acreditaram
nela. Aqueles que tinham o poder adicional do intelecto deixaram os
seus registros escritos para a posteridade. Para a maior parte dos
homens, eles parecem escritos visionários e sem significado,
mesmo quando os autores têm a vantagem de falar desde um
passado distante. O discípulo que tenta realizar a tarefa aspirando
secretamente por fama ou sucesso, ou querendo parecer um
instrutor e apóstolo diante do mundo, fracassa antes mesmo de
começar a tarefa. A sua hipocrisia oculta envenena a sua própria
alma e as almas daqueles de quem ele se aproxima. Ele
secretamente adora a si mesmo, e essa idolatria produzirá
necessaria-mente seus resultados.
Quando a mensagem divina vier até seu espírito, o discípulo
que tem o poder de avançar e que é suficientemente forte para
vencer cada uma das barreiras irá esquecer completamente de si
mesmo, na nova consciência que desce sobre ele. Se este contato
elevado pode realmente despertá-lo, ele se torna semelhante aos
que são divinos,  graças a seu desejo de doar, mais do que receber;
à sua vontade de ajudar, mais do que ser ajudado; e à sua decisão
de alimentar os famintos, mais do que receber ele próprio o maná
do céu. A sua natureza se transforma. Ele é abandonado
subitamente pelo egoísmo que leva os seres humanos à ação na
vida comum.
6. Comentários a

“Luz no Caminho”
- IV
O Isolamento do Adepto
“Antes que a voz possa falar na presença dos
Mestres, ela deve haver perdido o poder de ferir.”
Aqueles que dão uma atenção apenas passageira e superficial
ao assunto do Ocultismo - e eles são numerosos - perguntam a todo
momento por que, se os adeptos[59] vivem, eles não aparecem no
mundo, e não mostram o seu poder. A afirmativa de que o principal
grupo destes sábios vive além das montanhas dos Himalaias parece
ser uma prova de que eles são figuras apenas imaginárias. De outra
forma, por que situá-los tão longe?
Infelizmente, foi a Natureza que fez isso, sem que houvesse
escolha ou decisão pessoal. Há certos pontos no planeta em que o
avanço da “civilização” não é sentido, e onde a febre do século
dezenove[60]
é mantida à distância.
Nestes lugares privilegiados sempre há tempo e espaço para
as realidades de vida. Eles não estão dominados pelas ações de
uma sociedade desorganizada, amante do dinheiro e que busca
prazeres. Enquanto houver adeptos na Terra, a Terra deve preservar
locais de retiro para eles. Este é um fato da natureza, e constitui
apenas uma expressão externa de um aspecto profundo da
Natureza Superior.
O pedido do neófito permanece sem ser atendido, até que a
voz com que ele o pronuncia perca o poder de ferir. Isso se deve ao
fato de que a vida do astral divino[61] é um espaço em que reina a
ordem, assim como a ordem reina na vida natural. Sempre há, é
claro, o centro e a circunferência, tal como na natureza. Perto do
coração central da vida, em qualquer plano, há conhecimento, e a
ordem reina por completo. O caos torna obscura e confusa a
margem externa do círculo. Na realidade, qualquer forma de vida
tem uma semelhança maior ou menor com uma escola filosófica. Há
sempre os que se dedicam ao conhecimento e esquecem das suas
próprias vidas enquanto buscam por ele; e há sempre a multidão
frívola que vai e vem. Epicteto disse que era mais fácil comer sopa
com garfo do que ensinar filosofia a tais indivíduos. O mesmo
estado existe na vida astral superior; e lá o adepto dispõe de um
isolamento ainda maior, e pode permanecer nele. Este local de retiro
é tão seguro, tão protegido, que nenhum som que inclua discórdia
alcança os ouvidos dele. Por que razão há locais protegidos se o
adepto é um ser de poderes tão grandes, segundo dizem aqueles
que creem em sua existência? A resposta é muito clara. Ele serve a
humanidade e se identifica com o mundo inteiro. Ele está disposto a
sacrificar-se pela humanidade a qualquer momento, vivendo por ela,
e não morrendo por ela. Por que ele não deveria morrer? Porque ele
é parte do grande todo, e uma das partes mais valiosas desse todo.
Porque ele vive sob leis e sob uma ordem que ele não deseja
quebrar. Sua vida não pertence a ele, mas às forças que trabalham
através dele. Ele é um florescimento da humanidade. É a flor que
contém a semente divina. Ele é, em sua própria pessoa, um tesouro
da natureza universal, guardado e preservado para que os frutos
possam ser aperfeiçoados. É apenas durante certos períodos
definidos da história do mundo que ele tem permissão para aparecer
entre as multidões, como seu redentor. Mas para aqueles que têm a
força suficiente para separar-se da multidão ele está sempre
disponível. E para aqueles que são suficientemente fortes para
vencer os erros da natureza humana pessoal, tal como estabelecido
nestas quatro regras[62], ele está conscientemente dispo-nível,
facilmente reconhecível, pronto para responder.
Mas esta vitória sobre o eu inferior implica uma destruição de
qualidades que a maior parte das pessoas considera não só
indestrutíveis, mas desejáveis. O “poder de ferir” inclui muito daquilo
que os seres humanos valorizam, não só em si próprios, mas nos
outros. O instinto de autodefesa e de autopreservação é parte desse
poder de ferir, assim como a ideia de que se tem qualquer direito, ou
direitos, seja como cidadão, como ser humano, ou como indivíduo.
O mesmo vale para a consciência agradável de respeito por si
mesmo e de ser alguém virtuoso.[63] Para muitos, estas são
afirmações difíceis de aceitar; no entanto são verdadeiras. Estas
palavras que escrevo agora, e aquelas que já escrevi a respeito,
não são de modo algum minhas próprias. Elas são tiradas das
tradições da loja da Grande Fraternidade que foi um dia o esplendor
secreto do Egito. As regras escritas na sua antecâmara eram iguais
às que estão escritas nas antecâmaras das escolas de hoje.
Durante todo o tempo, os sábios viveram distantes da massa. E
mesmo quando algum propósito ou objetivo temporário induz um
deles a vir até o meio da vida humana, o seu isolamento e sua
segurança são preservados tão completamente como sempre. Essa
é parte da sua herança, é parte da sua posição, ele está
credenciado para isso e não pode deixá-lo de lado, assim como o
Duque de Westminster não pode dizer que deixará de ser o Duque
de Westminster.
De tempos em tempos, um adepto passa um período vivendo
nas várias grandes cidades do mundo, ou talvez apenas passe por
elas; mas todos são ocasionalmente ajudados pelo poder real e pela
presença de um destes homens. Aqui em Londres, assim como em
Paris e São Petersburgo, há seres humanos de grande
desenvolvimento. Mas eles só são reconhecidos como místicos por
aqueles que têm o poder de reconhecê-los; e esse poder é dado
pela vitória sobre o eu. De outro modo, como eles poderiam
permanecer, mesmo por uma hora, em uma atmosfera mental e
psíquica como a que é criada pela confusão e pela desordem de
uma cidade? Se eles não fossem protegidos e mantidos em
segurança, o próprio desenvolvimento deles sofreria interferência, e
o seu trabalho ficaria prejudicado. Além disso, o neófito pode
encontrar pessoalmente um adepto, pode viver na mesma casa que
ele, e ser mesmo assim incapaz de reconhecê-lo e de fazer com
que sua voz seja escutada por ele. Porque nenhuma proximidade
espacial, nenhuma proximidade em relacionamento, nenhuma
intimidade diária pode anular as leis inexoráveis que garantem ao
adepto a sua vida em retiro. Nenhuma voz chega ao seu ouvido
interno antes de tornar-se uma voz divina, uma voz que ignora as
aspirações do eu inferior. Qualquer apelo menor seria igualmente
inútil e uma perda de energia e de força, como se um professor de
filologia fosse ensinar as primeiras letras a crianças que ainda não
sabem ler. Enquanto um ser humano não se torna um discípulo em
seu coração e seu espírito, ele não pode existir para aqueles que
são professores de discípulos. E ele se torna discípulo por um único
método: a renúncia às aspirações humanas pessoais que haja em si
mesmo.
Para que a voz perca o poder de ferir, o homem deve ter
chegado àquele ponto em que vê a si mesmo apenas como mais
um em meio às vastas multidões que vivem; apenas mais um, entre
os grãos de areia levados para lá e para cá pelo mar da existência
vibratória.[64]
Afirma-se que cada grão de areia no leito do oceano é levado a
seu tempo até a praia e vive à luz do sol por um momento. O
mesmo ocorre com os seres humanos. Eles são levados para lá e
para cá por uma grande força; e cada um, no momento certo, sente
sobre si os raios solares.
Quando um ser humano é capaz de ver a sua própria vida
como uma parte do todo, ele deixa de lutar para obter qualquer
coisa para si mesmo. Esta é a renúncia aos direitos pessoais. O
homem comum não espera ter a mesma sorte que o resto do
mundo, mas em alguns pontos ele pretende obter uma posição
melhor do que os outros.
O discípulo não tem esta expectativa. Assim, mesmo que ele
seja, como Epicteto, um escravo acorrentado, não tem nada a dizer
sobre isso. Ele sabe que a roda da vida gira incessantemente.
Burne Jones mostrou isso em seu quadro maravilhoso. A roda gira,
e nela estão ligados o pobre e o rico, o grande e o pequeno. Cada
um tem o seu momento de boa sorte quando a roda o coloca no
nível mais elevado. O Rei sobe e cai, o poeta é festejado e
esquecido, o escravo é feliz e depois é descartado. Cada um, por
sua vez, é esmagado quando a roda prossegue seu giro. O
discípulo sabe que isso ocorre, e, embora seja seu dever fazer o
melhor que pode com a vida que lhe cabe viver, ele nem reclama
nem fica eufórico diante das suas oscilações, e tampouco inveja a
boa sorte de outros. Ele sabe bem que todos estão apenas
aprendendo lições. Ele sorri para o socialista e o reformador que se
esforçam por mudar circunstâncias cuja causa está nas forças da
própria natureza humana. Esse esforço é como debater-se contra os
espinhos. É um desperdício de vida e de energia.
Ao compreender isso, o ser humano renuncia aos seus
imaginados direitos individuais, sejam eles quais forem. Ele deixa de
lado o uso e a posse de um aguilhão venenoso que é compartilhado
por todos os indivíduos de visão limitada.
Quando o discípulo reconhece completamente que a própria
ideia de direitos individuais é apenas um resultado da presença do
veneno em si, e que constitui o som da serpente do seu eu inferior,
que envenena com sua mordida a sua própria vida e a vida dos que
o rodeiam, então ele está pronto para participar de uma cerimônia
anual que é aberta a todos os neófitos capacitados para ela. Todas
as armas defensivas e ofensivas são abandonadas; e todas as
armas da mente e do coração, do cérebro e do espírito. Nunca mais
um ser humano será visto por ele como alguém que pode ser
criticado ou condenado; nunca mais o neófito pode levantar sua voz
em autodefesa ou para desculpar a si mesmo.[65] Ele sai daquela
cerimônia e volta para o mundo na condição de um ser
desprotegido, como uma criança recém-nascida. E isso é,
exatamente, o que ele é. Ele começou a nascer de novo no plano
superior da vida, naquele planalto bem iluminado em que os ventos
correm livres, e de onde os olhos veem inteligentemente o mundo a
partir de uma nova percepção.
Eu disse acima que, depois de renunciar ao sentido de direitos
individuais, o discípulo deve abrir mão também do sentido de
autorrespeito e de virtude.[66] Isso pode soar como uma doutrina
terrível; mas todos os ocultistas sabem bem que não se trata de
uma doutrina, e sim de um fato. Aquele que se considera mais
sagrado que o outro, aquele que tem qualquer orgulho de estar livre
de um vício ou erro, aquele que se considera sábio ou de algum
modo superior aos seus semelhantes - é incapaz de ser discípulo. O
ser humano deve tornar-se como uma criança pequena, antes que
possa ingressar no reino dos céus.
A virtude e a sabedoria são coisas sublimes, mas se elas criam
na mente de alguém um orgulho e uma consciência de
separatividade em relação ao resto da humanidade, então elas são
apenas a serpente do eu inferior, reaparecendo sob uma forma mais
sutil. A qualquer momento esse eu pode adotar sua velha forma
grosseira e atacar tão ferozmente como aquele eu que inspira as
ações de um assassino, capaz de matar para obter riquezas ou por
raiva; ou de um político capaz de sacrificar a população pelos seus
próprios interesses ou pelos interesses do seu partido.
Na verdade, a ideia de perder o poder de ferir implica que a
serpente do eu inferior não é só paralisada, mas morta.
Quando ela é apenas desorientada ou induzida ao sono, ela
ressurge e o discípulo passa a usar o seu conhecimento e o seu
poder para os seus próprios fins pessoais, e então se torna um
discípulo dos muitos mestres das artes antievolutivas, porque o
caminho da destruição é muito largo e fácil, e pode ser encontrado
com os olhos fechados. Este é, evidentemente, o caminho da
destruição. Porque quando um indivíduo começa a viver para si
mesmo ele reduz o seu horizonte cada vez mais até que, no final, o
espaço de que dispõe é do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Todos já vimos este fenômeno ocorrer na vida comum. Um homem
egoísta se isola; ele se torna menos interessante e menos agradável
para os outros. Trata-se de um espetáculo desagradável. As
pessoas se afastam de alguém que é muito egoísta como se o
indivíduo fosse um animal perigoso. O fato é ainda mais
desagradável quando ocorre em um plano superior da vida, e
quando o indivíduo tem os poderes de um conhecimento adquirido
ao longo de várias encarnações.
Por isso eu digo: faz uma pausa e pensa bem no limiar. Porque
se o pedido do neófito for feito sem uma completa purificação, ele
não chegará até o local de retiro do adepto divino, mas evocará as
forças terríveis que servem o lado obscuro da natureza humana.

0000000

“Antes que a alma possa erguer-se


na presença dos Mestres, os seus pés
devem ser lavados com o sangue do coração.”
 
A palavra “alma”, usada aqui, significa a alma divina, “o espírito
estelar”.
“Ser capaz de erguer-se é ter confiança”; e ter confiança
significa que o discípulo tem certeza sobre si mesmo; que renunciou
às suas emoções, ao seu eu inferior, e até à sua dimensão humana;
que é incapaz de sentir medo e não tem consciência de sofrimento;
que toda a sua consciência está centrada na vida divina, que é
representada simbolicamente pela expressão “os Mestres”; que ele
não tem nem olhos, nem ouvidos, nem fala, nem energia, exceto no
raio divino e para o raio divino que foi tocado pelo seu sentido mais
elevado. Então ele é destemido; ele fica livre de sofrimento,
ansiedade e desânimo; sua alma permanece na livre chama da luz
divina que permeia todo o seu ser, sem encolher-se e sem desejar a
postergação de coisa alguma. Ele chega então à sua herança e tem
direito de reivindicar seu parentesco com os instrutores dos seres
humanos. Ele está ereto; ele ergueu sua cabeça; ele respira a
mesma atmosfera que eles. 
Mas antes que ele consiga fazer isso, os pés da alma devem
ser lavados com o sangue do coração.
O sacrifício, ou a renúncia do coração humano e suas
emoções, é a primeira das regras. Ela exige “obter um equilíbrio que
não pode ser ameaçado por emoção pessoal alguma”. Isso é feito
pelo filósofo estóico; ele, também, se mantém à parte e olha de igual
modo para os seus próprios sofrimentos e para os sofrimentos dos
outros.
Do mesmo modo que a palavra “lágrimas” na linguagem dos
ocultistas significa a alma emocional, e não a sua aparência física,
assim também a palavra “sangue” não se refere àquele sangue que
é essencial para vida física, mas ao princípio criativo na natureza do
ser humano, que o leva à vida para experimentar dor e prazer,
alegria e tristeza. Quando ele deixa que o sangue flua desde o
coração, ele chega à presença dos Mestres como um puro espírito
que já não deseja encarnar em busca de emoção e experiência. Seu
destino ainda pode incluir sucessivas encarnações em matéria
densa, através de longos ciclos de tempo; mas ele já não as deseja.
O desejo primário de viver já não existe nele. Quando assume uma
forma humana de carne e osso, ele o faz em busca de um objetivo
divino, para realizar o trabalho dos Mestres, e sem nenhuma outra
meta. Ele não busca por prazer ou dor, não pede por algum céu, e
não teme inferno nenhum; no entanto, ele já participa de uma
grande herança que, mais do que uma compensação pela renúncia
a estas coisas, é um estado de alma em que simplesmente se
apaga a memória delas. Ele já não vive no mundo, mas com o
mundo. O seu horizonte se ampliou e agora é tão largo quanto o
universo.
7. O Carma
Considera comigo que a existência individual é uma corda
esticada desde o infinito até o infinito, e que não tem início ou fim,
nem pode ser quebrada.
Esta corda é formada por inúmeros fios, finos, profundamente
unidos, cuja associação produz a sua grossura. Os fios são
destituídos de cor, e são perfeitos em suas qualidades de retidão, de
força e de constância. Como a corda passa por todos os lugares, ela
sofre estranhos acidentes. Frequentemente um fio é pego e fica
grudado, ou talvez seja puxado violentamente para fora do seu
caminho reto. Então por um longo tempo o fio fica desorganizado, e
desorganiza o todo. Às vezes um fio é manchado por alguma sujeira
ou por alguma cor; e a mancha não só prossegue além do ponto de
contato, mas muda a cor de outros fios. E lembra-te de que os fios
estão vivos.  São como fios elétricos, e mais, são como nervos
trêmulos. Até quando, então, irão a mancha e a distorção avançar!
Mas finalmente os longos fios vivos, que em sua continuidade
ininterrupta formam o indivíduo, passam da sombra para a luz.
Então eles já não são destituídos de cor, mas dourados; e outra vez
eles estão juntos, parelhos. Mais uma vez, a harmonia está
estabelecida entre eles; e desde esta harmonia interior a harmonia
maior é percebida.
Esta imagem simbólica apresenta apenas uma pequena parte -
um lado, apenas, da verdade; é menos que um fragmento. No
entanto, concentra-te nela; com sua ajuda, tu podes ampliar a
percepção. É necessário compreender em primeiro lugar que o
futuro não é formado arbitrariamente por algum ato separado do
presente, mas todo o futuro existe em uma continuidade ininterrupta
com o presente, assim como o presente em relação ao passado. Em
um plano da realidade, e desde um ponto de vista, a imagem da
corda é correta.
Já foi dito que um pouco de atenção ao ocultismo[67] produz
grandes resultados cármicos. Isso ocorre porque é impossível dar
alguma atenção ao tema do ocultismo sem fazer uma escolha
definida entre o que é comumente chamado de bem e mal. O
primeiro passo em ocultismo leva o estudante até a árvore do
conhecimento. Ele deve arrancar o fruto e comer; deve escolher. Ele
não é mais capaz de ficar na indecisão da ignorância. Ele segue
pelo caminho do bem ou pelo caminho do mal. E dar um só passo
de modo decidido e consciente em qualquer um dos caminhos
produz grandes resultados cármicos.[68] Em sua grande maioria, os
homens caminham hesitando, sem terem certeza sobre a meta que
buscam. O seu padrão de vida é indefinido; conse-quentemente, o
seu Carma opera de maneira confusa. Mas quando se chega ao
limiar do conhecimento, a confusão começa a diminuir, e em
consequência disso os resultados cármicos aumentam
enormemente, porque todos eles avançam na mesma direção nos
diferentes planos da vida. Assim, o ocultista não pode ser indeciso,
nem pode voltar depois de passar pelo limiar do conhecimento.
Estas duas coisas são tão impossíveis quanto um homem adulto
voltar a ser criança de novo. Quando a individualidade chega ao
estado de responsabilidade como resultado do crescimento, não é
mais possível retroceder.
Aquele que quiser escapar da escravidão do Carma[69] deve
erguer a sua individualidade acima da sombra, até alcançar o brilho;
deve elevar a sua existência de modo que os seus fios não tenham
contato com substâncias que os arrastem para o solo, e que não
fiquem presos, nem sejam distorcidos. Ele simplesmente eleva a si
próprio para fora da região em que o Carma[70] opera. Ele não
abandona, por causa disso, a existência que está vivenciando. O
chão pode ser sujo e irregular, ou cheio de ricas flores cujo pólen
mancha, e pode ter substâncias doces que aderem e ficam
grudadas - mas acima da cabeça há sempre o céu livre. Aquele que
deseja não ter Carma deve ver o ar como quem vê o seu lar; e
depois do ar, o éter. Quem deseja criar bom Carma encontrará
muitas situações confusas, e no esforço por plantar boas sementes
para sua própria colheita pode plantar centenas de ervas daninhas,
e entre elas a erva daninha gigante.[71]
Não desejes plantar sementes para a tua própria colheita;
deseja apenas plantar para que surjam frutos que alimentem o
mundo. Tu és parte do mundo; ao alimentares o mundo, tu te
alimentas. No entanto, mesmo neste pensamento ainda existe um
grande perigo a ser enfrentado pelo discípulo que pensa há muito
tempo estar trabalhando pela causa do bem, enquanto no nível mais
interno da sua alma ele só percebeu o mal; isto é, ele tem pensado
em si mesmo como se tivesse como objetivo fazer um grande
benefício para o mundo, mas o tempo todo ele tem abraçado o
Carma, e o grande benefício que ele busca é para si mesmo.
Um homem pode recusar-se a pensar em benefício para si
mesmo. Mas na própria recusa fica visível o fato de que o benefício
é desejado. E é inútil que o discípulo tente aprender através do
controle de si mesmo. A alma deve estar sem grilhões, e os desejos,
livres.[72] Mas até que os desejos estejam fixos ali onde não há
recompensa nem punição, nem bem nem mal, é inútil que ele se
esforce.[73] Pode parecer que ele faz um grande progresso, mas
algum dia ele terá que estar frente a frente com sua própria alma, e
reconhecerá que quando veio até a árvore do conhecimento
escolheu o fruto amargo e não o fruto doce; e então o véu cairá por
completo, e ele abandonará sua liberdade, e se tornará um escravo
do desejo. Portanto, permanece alerta, ó tu que ainda estás apenas
tomando o rumo da vida do ocultismo. Aprende agora que não há
cura para o desejo, não existe cura para a busca de recompensas,
não há cura para a dor de ansiar por algo, exceto quando a visão e
a audição estão fixas naquilo que é invisível e que não tem som.
Começa desde já a prática deste princípio, e mil serpentes serão
mantidas longe do teu caminho. Vive no que é eterno.
As operações práticas da lei do Carma só podem ser
estudadas quando o discípulo chega ao ponto em que elas não o
afetam mais.[74] O iniciado tem o direito de pedir a revelação dos
segredos da natureza, e de conhecer as regras que governam a
vida humana. Ele obtém este direito ao escapar dos limites da
natureza[75] e ao libertar-se das regras que governam a vida
humana.[76]
Ele se tornou uma porção reconhecida do elemento
divino, e não é mais afetado por fatores temporários. Ele então
obtém um conhecimento das leis que governam as condições
temporárias. Portanto, tu que desejas compreender as leis do
Carma deves tentar primeiro libertar-te destas leis; e isto só pode
ser feito fixando tua atenção naquilo que não é alcançado por elas.
[77]
 
[1]
“Light on the Path”, Theosophy Company, Mumbai, India, fifth
Indian reprint, 1991, 90 páginas.
[2] Veja “Collected Writings”, H.P. Blavatsky, TPH, EUA, volume
XII, pp. 581-590, especialmente pp. 583-584.
[3] “Five Messages”, H. P. Blavatsky, Theosophy Co., Los
Angeles, 1922, 32 pp., ver p. 26. O livreto está publicado em
www.FilosofiaEsoterica.com.
[4] “A Voz do Silêncio”, Helena P. Blavatsky, edição online
disponível em www.FilosofiaEsoterica.com e seus websites
associados.
[5] “Collected Writings”, H.P. Blavatsky, TPH, EUA, volume XI, ver
páginas 316 a 320.
[6]
Veja a carta de HPB ao jornal “Light”, datada de junho de
1889 e reproduzida nas pp. 284-286 do volume XI de “Collected
Writings”, H.P. Blavatsky. O trecho citado está na p. 286.
[7]
A carta está publicada na revista “The Theosophical Forum”,
da Sociedade Teosófica de Point Loma / Pasadena, edição de
outubro de 1944, pp. 469-474. Ali, sobre “Luz no Caminho”, veja
especialmente a metade superior da p. 472. Para saber mais sobre
a perda de rumo em que caiu Mabel Collins, o leitor pode examinar
o capítulo 11 da parte 6 do livro “HPB”, de Sylvia Cranston (Ed.
Teosófica), especialmente pp. 409 a 411. Veja-se também o artigo
“Mabel Collins (1851-1927)”, de Alexander Markin, na revista
“Insight”, (“the journal of the Theosophical Society in England”),
edição de September/October 2001, pp. 24-25. A novela “The
Blossom and the Fruit”, de Mabel Collins, é a história de um
fracasso espiritual. Seu livro “O Idílio do Lótus Branco” narra outra
derrota e descreve traições. A verdade é que a linguagem do
fracasso não é adequada para o século 21. O rigor deve ser
compensado com a presença da confiança. A certeza da vitória
protege o peregrino.
[8]
Ver o documento intitulado “To All Theosophists, The Esoteric
Section of the Theosophical Society and its Enemies”, em “Collected
Writings”, H.P. Blavatsky, TPH, vol. XI, especialmente pp. 314-315.
[9]
“Collected Writings”, volume XI. Veja a metade superior da p.
285.
[10] Veja “Collected Writings”, vol. XI, p. 320. Este Adepto
também escreveu histórias místicas em parceria com HPB,
conforme é sugerido em “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Editora
Teosófica, Primeira Série, Carta 20, p. 65. A palavra “adepto”, usada
em teosofia para designar Iniciados e altos Iniciados, significa
literalmente “aquele que conhece”.
[11]
“Collected Writings”, H.P. Blavatsky, TPH, EUA, volume XI, p.
285.
[12] Veja-se o artigo de John Garrigues intitulado “Reunindo
Experiências de Vida”. Seu subtítulo é “A Experiência Humana Mais
Importante é a da Compreensão”, e ele está disponível em 
www.FilosofiaEsoterica.com e seus websites associados.
[13] Veja por exemplo o texto “Um Por Todos e Todos Por Um”, de
Carlos Cardoso Aveline, que está publicado em
www.FilosofiaEsoterica.com e seus websites associados. Nos
mesmos websites, leia também o texto de Helena Blavatsky
intitulado “Aprendendo Com Cada Detalhe da Vida”.
[14] Veja o artigo “A Lei da Simetria”, de Carlos Cardoso Aveline,
que está disponível em nossos websites.
[15] “Cartas dos Mahatmas”, Ed. Teosófica, Brasília, 2001, edição
em dois volumes,  ver volume I, Carta 74, pp. 344-345.
[16] Os capítulos 3, 4, 5 e 6 do presente volume comentam
respectivamente as quatro frases deste parágrafo. Sobre a
complexa estrutura interna desta obra, veja também os primeiros
parágrafos do capítulo 5, “O Pedido do Neófito”.
 
[17] H.P. Blavatsky questionou a validade desta regra. Veja o
Prólogo da Edição Luso-Brasileira.
[18]
“Sobrenatural”. Trata-se de um equívoco de Mabel Collins.
Para a filosofia esotérica, não há coisa alguma “acima” ou “fora” da
Natureza.  Portanto, nada existe de “sobrenatural”. Tudo o que é
metafísico faz parte da Natureza.
[19] Ou seja, não tente afastar-se dos que parecem ainda mais
ignorantes do que você é, e isso por um motivo muito simples. A lei
que opera no discipulado é a lei da compaixão e da simetria. O
sofrimento e a miséria humanos virão até você com toda força, de
um modo ou de outro, na exata medida em que você se aproximar
da bênção eterna.
[20]
O desenho de um triângulo constitui a marca ou símbolo de
um alto Iniciado.
[21] Na edição em inglês do livro “O Idílio do Lótus Branco”, de
Mabel Collins, podemos ler o seguinte: “Há três verdades que são
absolutas e não podem ser perdidas, mas podem permanecer em
silêncio por falta de quem as expresse. A alma do homem é imortal,
e o seu futuro é o futuro de algo cujo crescimento e esplendor não
têm limites. O princípio que dá vida habita em nós e fora de nós. Ele
é imortal e eternamente benéfico; não é ouvido, nem visto, nem
sentido pelo olfato, mas é percebido pelo homem que deseja a
percepção. Cada homem é o seu próprio absoluto legislador,
produzindo para si glória ou trevas; é o decretador da sua vida, da
sua recompensa, da sua punição. Estas verdades, que são grandes
como a própria vida, são tão simples como a mais simples das
mentes humanas. Alimenta com elas os famintos.” (The Idyll of the
White Lotus, Mabel Collins, Quest Books, Wheaton, Illinois, EUA,
1952 / 1974, 142 pp., ver p. 114.)
[22] “Salão do Aprendizado”. A expressão aparece em “A Voz do
Silêncio”.
[23] “Do silêncio que é paz, surgirá uma voz forte.” A ideia de que
o silêncio fala aparece desde este parágrafo até à página seguinte.
Conforme indicado no prólogo, “A Voz do Silêncio”, obra publicada
por Helena Blavatsky, tem a mesma origem que “Luz no Caminho”.
[24] Erro de MC. O instrutor é necessário, mas ele fala através da
vida.
[25] Isso significa que o Iniciado que vinha até agora fazendo
comentários às Regras deixa de fazê-lo neste ponto, usando como
assinatura uma marca dos Iniciados, o triângulo. A frase seguinte
opera como um pós-escrito do Iniciado, e a partir deste ponto as
regras desta Segunda Série não recebem comentários ou Análises.
As palavras “Estas regras foram escritas.... ” abrem a Primeira
Série, na p. 19.
[26] Os Comentários a seguir, numerados de I a IV, foram escritos
por Mabel Collins e publicados inicialmente na revista “Lucifer”,
quando sua editora era Helena P. Blavatsky. Apareceram nas
edições de setembro de 1887 (pp. 8-14), outubro de 1887 (pp. 90-
96), novembro de 1887 (pp. 170-172) e janeiro de 1888 (pp. 379-
383). A palavra “Lucifer” (em inglês, sem acento), é um termo antigo
e anterior ao Cristianismo imperial de Roma. A palavra significa
“portador da luz” e designa o planeta Vênus, a estrela d’alva e a
estrela vespertina.
[27]
Erro de MC. O tempo - inseparável do carma e do ritmo da
vida - é um instrutor sagrado. Enganadora é a ignorância humana,
que olha para o tempo de maneira errada. O tempo e o espaço são
divinos.
[28]
Ver a p. 19 da presente edição, antes da regra número 1.
[29]
O caminho é internamente um só, embora ele se adapte,
externamente, às circunstâncias cármicas de cada estudante. O
mesmo caminho interno pode ser encontrado nas mais diferentes
tradições culturais.
[30] A palavra “astral” não se refere ao eu inferior
necessariamente, mas ao plano dos astros celestiais. O aprendiz
deve expandir a sua relação com o Universo. A expressão “ler
astralmente” se refere ao plano da luz astral, ou akasha, que possui
níveis elevados.
[31]
É falsa a ideia de Mabel Collins segundo a qual a velhice é
acompanhada de insensibilidade. A sensibilidade se torna mais
educada, mas não diminui necessariamente, e em muitos aspectos
ela cresce, na velhice. O auge das ocupações materiais durante a
meia-idade, de 35 a 50 anos, pode produzir mais insensibilidade e
indiferença do que a velhice. Na terceira idade a alma resgata o
melhor da infância, segundo a tradição japonesa. Algumas linhas
mais abaixo, MC insiste na ilusão de que velhice significa
necessariamente letargia.
[32]
É ilusória a ideia de que a tristeza seja sempre a primeira
experiência em Ocultismo. Isso depende do carma de cada um. Em
muitos casos predomina na primeira experiência o contentamento.
Em outros, a primeira experiência é dominada por sentimentos de
compaixão e solidariedade. O momento do despertar combina
sentimentos com frequência bastante diferentes entre si e
aparentemente paradoxais.
[33]
O presente capítulo foi publicado inicialmente na forma de
artigo em setembro de 1887: veja a nota de pé de página na sua
abertura.
[34]
O diabo é um dos frutos da imaginação sacerdotal. A autora
esqueceu que vender a alma ao espírito da falta de ética não é uma
opção em teosofia. Não há filosofia - esotérica ou não - se não
houver ética.
[35]
Caminho da escuridão. Qual a utilidade desta alusão, feita de
passagem, aos “mestres” sem alma que “ensinam” o egoísmo e a
derrota espiritual? Ela serve como alerta para os estudantes de
teosofia. Nem tudo o que é “oculto” é espiritual. A ética e o altruísmo
do estudante são severamente testados a cada momento. Um
passo sem ética é um passo para o abismo, e nenhum estudante,
por mais “avançado” que possa pensar que é, está acima do perigo.
[36]
Os sons que afetam a vida pessoal são feitos de palavras. A
voz dos mestres está sempre no mundo mas flui acima do plano
verbal ou visual, e é escutada no mundo da alma e do silêncio.
Assim, os “canalizadores” que proliferam em círculos
pseudoesotéricos ouvem palavras ditadas apenas por sua própria
imaginação desinformada.
[37]
Esta mesma condição, que qualifica o peregrino para
encontrar o mestre, é descrita em detalhes nos aforismos 951 a 961
do clássico “Jnaneshvari”, de Shri Jnaneshvar, UNESCO edition,
1969, State University of New York Press, EUA, 652 pp., ver p. 596.
O livro “Jnaneshvari” ou “Dnyaneshwari” é qualificado como obra de
extrema importância no terceiro parágrafo do prefácio de “A Voz do
Silêncio”, de H.P. Blavatsky.  
[38]
Isso não ocorre com a lei do carma, que existe antes, durante
e depois de um universo manifestado. A grande lei universal é
eterna. Ela atravessa tanto manvântaras (períodos de manifestação)
como pralayas (períodos de repouso). Nos pralayas, a presença
dela é implícita.
[39]
A verdade é que esforço, observação e experimentação são
fundamentais em Raja Ioga. E Raja Ioga é a Ioga pela qual se
alcança o discipulado, conforme podemos ver em “Cartas dos
Mahatmas”, Ed. Teosófica, volume II, p. 316. É do esforço, da
observação e da experimentação na direção do altruísmo e da ação
correta que surge a intuição superior do sexto princípio. Todos estes
fatores se somam, apoiam uns aos outros, e são indispensáveis
para o discipulado. Não há dicotomia, mas complementaridade,
entre eles.
[40]
E isso só se consegue através do completo autossacrifício,
da absoluta renúncia, da humildade pessoal e de um altruísmo
inteiramente dedicado ao bem da humanidade em seu conjunto.
Caso contrário, ocorre a queda pelo egoísmo “espiritualizado”.
[41]
Fé; não se trata aqui de fé cega, mas de uma confiança que
resulta do conhecimento real e do bom senso.
[42] A primeira regra (não numerada) de “Luz no Caminho” é:
“Antes que os olhos possam ver, eles devem ser incapazes de
lágrimas”, e foi comentada no capítulo anterior.
[43]
Na realidade, se são verdadeiras, estas impressões nunca
foram fantasias. Elas apenas podem ter sido vistas como fantasia.
Este é um pequeno mas sério lapso da autora destes comentários.
Percepções corretas jamais começam como mera imaginação, e só
podem ser confundidas com ela por mentes mal informadas.
[44] O silêncio e o vazio são “assustadores” para o nível
egocêntrico de consciência, no estudante. Para um aprendiz
maduro, o vazio sem forma do Espaço é uma bênção que surge
com grande alívio, trazendo libertação. No entanto, a vasta solidão
nos planos inferiores de consciência pode assustar a natureza
emocional do estudante.
[45] A afirmação é vaga e pode levar a equívoco. Na verdade,
onde quer que haja uma concepção mental - “escura” ou não -
inexiste silêncio. O silêncio e o vazio não têm atributos: onde existe
alguma concepção a respeito deles, não há silêncio, ou vazio.
[46]
Uma sensação de tédio leva muitos a provocarem mais
sofrimentos para si mesmos e para outros através de metas
ilusórias e impulsivas. Superada essa oscilação sem fundamento, o
aprendiz passa a escutar a voz do dever mais elevado.
[47] Não é mais humano no sentido de que já não está sujeito à
morte; mas ainda é humano no sentido transcendente, assim como
são humanos - embora imortais - os Mahatmas e Mestres de
Sabedoria.
[48] A autorrealização ocorre através do autoesquecimento e da
dedicação completa ao ideal altruísta da libertação de todos os
seres.
[49]
Como vimos no prólogo, as forças espirituais não estão nem
gostariam de estar acima das leis do universo. Elas atuam a serviço
das leis.
[50]
Sem ajuda visível; a ajuda dos Irmãos Mais Velhos ocorre na
maior parte dos casos sem que possa ser percebida.
[51]
Dizer que “não importa” perder o foco ou dar um passo em
falso é um erro crasso. O aprendiz deve avançar com prudência,
evitando isso que M. Collins chama de “abismo”. Todo passo em
falso deve ser evitado, na medida do possível. O aprendiz deve
avançar com segurança, sem pressa, de modo vitorioso. Deve saber
esperar, mantendo a intenção correta até que o caminho à sua
frente esteja claro.
[52] Imagens simbólicas assustadoras como “abismo” podem ter
sido úteis durante o século 19 mas não ajudam a ninguém no
contexto cultural do século 21. A confiança é possível e é
indispensável, ao lado da cautela. Não existe abismo, exceto como
metáfora, embora possa haver uma sensação de estar à beira de
um abismo, ou de cair nele, durante testes prévios a uma grande
iniciação.
[53] Isto equivale a dizer que só um sábio pode reconhecer um
sábio. A ideia é apenas parcialmente verdadeira. Na verdade, um
discípulo reconhece o mestre, assim como o mestre reconhece o
discípulo.
[54] HPB escreveu que o Livro de Jó, no Velho Testamento,
retrata o ciclo da iniciação, no qual é necessário perder tudo o que
se possui. Isso coincide, astrologicamente, com o ciclo de Saturno.
[55]
Toda rejeição de fatos objetivos é uma perda de energia.
Os
protestos e as lamentações de Jó, no Velho Testamento, são
cansativos até mesmo para o leitor da Bíblia.
[56]
Os dois passos iniciais correspondem aos axiomas que
abrem o primeiro parágrafo da obra “Luz no Caminho”: 1) Antes que
os olhos possam ver, eles devem ser incapazes de lágrimas; 2)
Antes que o ouvido possa ouvir, ele deve ter perdido sua
sensibilidade.
[57] Os fatos de natureza superior, que dizem respeito ao
discipulado, só são compreensíveis por um processo de sintonia
interior. Discípulo é aquele que aprende de fato. Os discípulos têm
“olhos para ver” porque possuem o ponto de vista a partir do qual
tais fatos passam a ser compreensíveis. O não-discípulo com
motivação egoísta se agarra às palavras. O não-discípulo sincero se
preparará para a compreensão e chegará pouco a pouco ao
conhecimento. O discípulo compreenderá melhor as palavras ao
vivê-las. Uma obra como “A Doutrina Secreta”, por exemplo, é
esotérica por si mesma. Está selada invisivelmente, ainda que suas
palavras sejam públicas. A chave de leitura está no ponto de vista, e
o ponto de vista correto inclui entre outros fatores uma intenção
pessoal elevada e nobre.
[58]
No original em inglês, “absolute God or Good” (“absoluto
Deus ou Bem absoluto”). Segundo a teosofia, a ideia de um deus
monoteísta é uma ilusão responsável pela maior parte do atual
sofrimento humano (veja a Carta 88 de “Cartas dos Mahatmas”).
Preferimos evitar na presente tradução este termo enganoso.
[59] Ocultismo, como conceito da filosofia esotérica, nada tem a
ver com “artes ocultas”, mas é a ciência que investiga os aspectos
universais e essenciais da vida. Tais realidades escapam ao mundo
das aparências e portanto são “ocultas” para os cinco sentidos e a
mente superficial. Quanto ao termo “Adepto”, em teosofia ele se
aplica frequentemente a um sábio que se libertou da necessidade
de reencarnar. Quando ele opta por continuar vivendo fisicamente,
faz isso movido por compaixão e apenas para ajudar a evolução da
humanidade.
[60] A primeira edição de “Luz no Caminho” é de 1885, mas a
ideia permanece válida no século 21.
[61]
Nota da edição original em inglês: “Naturalmente, todo
ocultista sabe, por haver lido Eliphas Levi e outros autores, que o
plano ‘astral’ é um plano de forças desiguais e instáveis, e que nele
um estado de confusão necessariamente prevalece. Mas isso não
se aplica ao plano ‘astral divino’, no qual há sabedoria e, portanto, a
ordem predomina.”
[62] Referência às quatro regras não numeradas que estão nas
linhas de abertura da parte I de “Luz no Caminho”: “Antes que os
olhos possam ver, eles devem ser incapazes de lágrimas. Antes que
o ouvido possa ouvir, ele deve ter perdido sua sensibilidade. Antes
que a voz possa falar na presença dos Mestres, ela deve haver
perdido o poder de ferir. Antes que a alma possa erguer-se na
presença dos Mestres, os seus pés devem ser lavados com o
sangue do coração.”
[63]
No decorrer da evolução, a alma individual deixa de lutar por
seu próprio bem-estar e passa a lutar pelo bem-estar dos outros e
da humanidade. Neste processo, o indivíduo transcende a
consciência pessoal, passa a preocupar-se mais com os seus
deveres do que com os seus direitos, e encontra a felicidade interior.
[64]
Essa afirmação não significa dizer que um sábio não luta, ou
não é um guerreiro. Ele é guerreiro, mas não luta por si mesmo.
Luta pelo bem dos outros e da humanidade, e sua luta é não-
violenta. Por outro lado, o rigor maior deste trecho se aplica
sobretudo ao discipulado regular. Na aspiração ao aprendizado
leigo, que predomina desde o ano de 1900, as exigências são
menos urgentes do que no discipulado regular. Os perigos e as
exigências são os mesmos, mas parecem menos intensos porque
todo o aprendizado é hoje mais lento e avança homeopaticamente.
Assim se reduz o número de fracassos.
[65]
Isto não é verdade. Entrou aqui a imaginação literária de MC.
O fato é que mesmo um discípulo iniciado, como H.P. Blavatsky, tem
o direito e o dever de defender-se de acusações injustas que
prejudiquem o seu trabalho pela humanidade, e HPB fez isso com
autorização dos Mestres. Os colegas de discipulado têm o dever
sagrado de defender uns aos outros de acusações injustas, como
vemos no artigo “Comentários à Escada de Ouro” (disponível em
nossos websites). E os discípulos dos mestres orientais têm
também o dever de criticar a falsidade e a hipocrisia sempre que
elas provocam sofrimento e dificultam o progresso espiritual da
humanidade.
[66] Esta é uma referência ao autorrespeito orgulhoso, e à
aparência de virtude perante os outros, que são duas características
de um eu inferior desinformado. Na verdade, o estudante amplia o
autorrespeito no sentido de que o seu respeito pelo seu próprio eu
superior, o verdadeiro eu, se aprofunda. E ele fortalece a sua
virtude, o que é muito diferente de fortalecer a aparência de virtude.
[67]
Ocultismo é a ciência filosófica que estuda os aspectos
ocultos e invisíveis da vida, trazendo-os para o plano da razão e da
compreensão consciente. A primeira regra para o estudante do
verdadeiro ocultismo é renunciar a toda busca de vantagem
pessoal.
[68]
Um erro de MC. Não há dois caminhos em ocultismo, mas
apenas o caminho do bem e da lei. O “caminho do erro” é falso e
constitui  um não-caminho,  uma armadilha, um beco sem saída.
[69]
É falsa a ideia de que um sábio se liberta da lei do carma. Os
sábios libertam-se apenas dos níveis inferiores do Carma. A lei é
onipresente. A libertação espiritual ocorre não só dentro da Lei, mas
é uma expressão dela.
[70]
Como vimos no prólogo, ele não se eleva acima do Carma,
mas acima do carma negativo da ignorância humana.
[71]
A erva daninha gigante é o egoísmo, que frequentemente se
oculta sob a aparência de espiritualidade.
[72]
Os desejos purificados e livres estão na origem da
criatividade superior, que é necessária na evolução espiritual. O
ponto é ressaltado pelo filósofo russo Nicolas Berdyaev. Veja por
exemplo o capítulo “The Ethics of Creativeness”, em seu livro “The
Destiny of Man”. A obra pode ser encontrada em nossos websites.
[73]
Erro de MC.
Nenhum esforço é inútil. Todo esforço gera
lições. Mas os esforços que visam alcançar recompensas têm
resultados extremamente limitados. Ao mencionar o bem e o mal,
esta frase se refere apenas ao aspecto superficial do que é visto
convencionalmente como bem e mal. O Bem é aquilo que está em
sintonia harmônica com a Lei do Universo. O “mal” é a ignorância
que se resiste por algum tempo à força invencível da Sabedoria.
[74]
Erro de MC. A ação impessoal transcende apenas o carma
inferior. Nas próximas linhas, este parágrafo final da obra contém
outras ideias infelizes.
[75]
A palavra “natureza”, aqui, deve ser entendida no sentido
restrito de “natureza física”. A Natureza em si é abrangente e inclui
tudo o que há, espiritual e material, conforme explica a Carta 88 de
“Cartas dos Mahatmas” (Editora Teosófica, dois volumes). Assim, na
verdade, a teosofia ensina que ninguém escapa dos limites da
natureza, mas pode-se transcender os limites da natureza física.
[76]
A frase deve ser lida como referindo-se ao aspecto superficial
e convencional da vida humana.
[77] O estudante tenta libertar-se dos níveis inferiores de ação
humana, em que a lei do carma opera de modo grosseiro. Isto pode
ser feito fixando a atenção naquilo que há de mais universal e
elevado.

Você também pode gostar