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Eletromagnetismo Cap3 jpc2016
Eletromagnetismo Cap3 jpc2016
(cap. 3. eletrodinâmica)
universidade de coimbra
2016
2
Conteúdo
3 Electrodinâmica 5
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
3.2 A experiência de Faraday . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
3.3 A lei de Faraday . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
3.3.1 Lei de Faraday num circuito em movimento⋆ . . . . . . 10
3.4 As equações de Maxwell . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
3.4.1 A corrente de deslocamento de Maxwell . . . . . . . . . 11
3.4.2 A aproximação quasi-estacionária . . . . . . . . . . . . 16
3.4.3 As equações dos potenciais V e A na electrodinâmica . 17
3.4.4 Acerca do gauge de Lorenz⋆ . . . . . . . . . . . . . . . 19
3.5 As ondas electromagnéticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
3.5.1 A equação geral de uma onda . . . . . . . . . . . . . . 21
3.5.2 A luz e as ondas electromagnéticas . . . . . . . . . . . 23
3.5.3 A experiência de Hertz . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
3.5.4 O teorema de Poynting . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
3.5.5 Ondas sinusoidais planas . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
3.5.6 Ondas electromagnéticas planas no vazio . . . . . . . . 35
3.6 Ondas electromagnéticas em meios condutores . . . . . . . . . 39
3.7 A linha de transmissão coaxial . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
3.7.1 Análise do cabo a partir da teoria de circuitos . . . . . 47
3.7.2 Reflexão do sinal no cabo . . . . . . . . . . . . . . . . 49
3.8 Os potenciais retardados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
3.8.1 Potenciais de Liénard-Wiechert⋆ . . . . . . . . . . . . . 54
3.9 Radiação de um dipolo eléctrico . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
3.9.1 Ganho da antena . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
3.10 Radiação de um dipolo magnético . . . . . . . . . . . . . . . . 64
3.11 Guias de ondas⋆ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
3
4 CONTEÚDO
4 Comentário Final 81
Capı́tulo 3
Electrodinâmica
3.1 Introdução
Até agora estudámos os campos eletrostático e magnetostático. Trata-se
num caso e noutro de efeitos associados a cargas e correntes em regime esta-
cionário, respectivamente. Vamos analisar neste capı́tulo os fenómenos de-
vidos a cargas e correntes que não estão em condições estacionárias, cujos
campos variam com o tempo.
5
6 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
i
m’ m m’ m
N S N S
i B B
v v
F F F F
onde E = ddq F é o campo elétrico dentro do condutor. A f.e.m. é portanto de facto uma
diferença de potencial. A designação de força electromotriz é portanto inadequada já que
não é uma força como o nome sugere, mas o integral de uma força por unidade de carga.
Mas é, todavia, a designação que continua a ser comummente utilizada. Como é evidente,
num circuito em que haja uma f.e.m. há certamente um campo não conservativo, (cuja
circulação é não nula).
No caso de uma bateria, a f.e.m. é a energia que essa bateria transfere para as cargas por
unidade de carga, através de um qualquer mecanismo interno (que pode ser eletroquı́mico,
fotovoltaico, piezoeléctrico, etc...), por via do qual elas vão de um eletrodo para o outro
contra o campo eletrostático entre esses eletrodos. Ou seja, internamente, entre os eletro-
dos de uma bateria, há um campo não conservativo que atua sobre as cargas; cuja f.e.m. co-
incide com a diferença de potencial entre eletrodos, se resistência interna for nula. Porém,
caso a força eletromotriz seja induzida, como acima, esse campo não conservativo não está
circunscrito a uma parte do circuito, mas estende-se ao longo de todo ele.
3.3. A LEI DE FARADAY 7
ror” à variação de fluxo”). Esta regra prática ficou conhecida como lei de
Lenz.
Da observação resulta claro que a corrente está claramente associada ao
movimento relativo entre o magnete e a espira e que a energia dessa cor-
rente provem certamente da energia do movimento relativo entre eles. A
força de interação entre o momento magnético do magnete, m, e o momento
magnético induzido na espira, m′ , deve pois opor-se ao movimento relativo
entre eles, transferindo energia cinética para a corrente induzida na espira,
quer quando eles se aproximam quer quando eles se afastam um do outro.
Isto é, durante a aproximação, m e m′ têm sentidos contrários e por isso
repelem-se; durante o movimento de afastamento têm o mesmo sentido, e
portanto atraem-se, (ver fig. 3.1). A corrente induzida na espira é portanto
sempre de molde a opôr-se à variação do fluxo magnético através da respec-
tiva superfı́cie, quer quando aumenta, quer quando se reduz, como concluiu
Lenz.
Vimos em § 2.6, eq. 2.39 que variar o fluxo magnético custa energia. De
facto, é essa transferência de energia que está efetivamente subjacente à lei
de Faraday-Lenz, como veremos a seguir.
E = −∂t A + ∇f
H
onde f é uma função arbitrária, já que C ∇f · dℓ = 0 (ver eq. 1.19).
Esta parcela conservativa pode-se fazer coincidir com o campo eletrostático,
fazendo f = −V . Desta forma conveniente, E inclui também o campo elet-
rostático e reduz-se a este último no regime estacionário. Por isso, E repre-
senta efetivamente a acepção mais geral do campo elétrico e convém portanto
chamar-lhe simplesmente E. Passámos portanto do campo conservativo elet-
rostático para o campo eléctrico, em que o campo eletrostático é o caso limite,
em condições estáticas.
Podemos então escrever que
E = −∇V − ∂t A (3.4)
2
H
O integral, C
E · dℓ = 0, pois o campo eletrostático tem sempre ∇ × E = 0.
3.3. A LEI DE FARADAY 9
onde ψ é uma função arbitrária, que não contribui para o regime estacionário, pois nesse
caso todas as derivadas temporais explicitas, ∂t , são nulas. Fica-se então com,
ρ
∇·E = − ∂t (ψ + ∇ · A)
ǫ0
Mas, como vimos, a divergência, ∇ · A, não está definida pelos campos, é fixada pela
escolha de gauge (ver § 2.4.3) e podemos portanto escolhê-la de forma a que seja sempre
∇ · E = ǫρ0 em qualquer regime, variável ou não (ver discussão em § 3.4.4).
4
Mas se parte do campo for eletrostático, tal que E = E var + E est , então como ∇ ×
E var = 0, então E 6⊥ B, (mas E var ⊥ B var ).
10 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
no vazio na matéria
∇ · E = ǫρ0 (1) ∇ · D = ρℓ (1a) (lei de Gauss)
∇·B =0 (2) ∇·B =0 (2a) (lei de Gauss) (3.8)
∇ × E = −∂t B (3) ∇ × E = −∂t B (3a) (lei de Faraday)
∇ × B = µ0 j (4) ∇ × H = jℓ (4a) (lei de Ampère)
5
Como se constata na eq. 3.3.1, o campo elétrico depende do movimento do observador
relativamente às cargas. Já tı́nhamos visto que assim devia ser em § 2.4.
3.4. AS EQUAÇÕES DE MAXWELL 11
ii) aplicando o operador rotacional vai-se descobrir que existem ondas elec-
tromagnéticas (§ 3.5).
0 = ∇ · (∇ × B) = µ0 ∇ · (j + ∂t D) = µ0 (∇ · j + ∂t ρ) = 0
| {z } | {z }
∇ × B = µ 0 j + µ 0 ǫ0 ∂ t E (3.10)
12 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
0 = ∇ · (∇ × H) = ∇ · j ℓ
0 = ∇ · (∇ × H) = ∇ · j ℓ + ∂t ρℓ = ∇ · (j ℓ + ∂t D)
∇ × H = j ℓ + ∂t D (3.11)
6
A inclusão da corrente de deslocamento é porventura a maior contribuição de Maxwell
para a teoria electromagnética. Nas suas próprias palavras: “the variations of the electrical
displacement must be added to the currents to get the total amount of electricity”, Maxwell,
1865 [“A Dynamical Theory of Electromagnetic Field”]. Sem a corrente de deslocamento
o electromagnetismo seria outra coisa totalmente diferente.
3.4. AS EQUAÇÕES DE MAXWELL 13
I Z Z
B · dℓ = (∇ × B) · ds = (∇ × B) · ds (3.12)
C S S′
Z Z
(∇ × B) · ds = µ0 j · ds = µ0 i
S S
H q R
Ora, de acordo com a lei de Gauss, S+S ′ E · ds = ǫ0 . Como S E · ds = 0, então
R i
S ′ ∂t E · ds = ǫ0 . Por conseguinte,
Z Z
(∇ × B) · ds = µ0 i = (∇ × B) · ds
S′ S
✸
14 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
i B
R
E
C 000
111
000S
111
000
111
S’
111111
000000
q
V 000000
111111
B
000000
111111
E
000000
111111
000000
111111
no vazio na matéria
∇ · E = ǫρ0 (1) ∇ · D = ρℓ
(Gauss) (1a)
∇·B =0 (2) ∇·B =0 (Gauss) (2a)
∇ × E = −∂t B (3) ∇ × E = −∂t B
(Faraday) (3a)
∇ × B = µ 0 j + µ 0 ǫ0 ∂ t E (4) ∇ × H = j ℓ + ∂t D
(Ampère) (4a)
(3.13)
com D = ǫ0 E + P e B = µ0 (H + M ). As formas integrais destas equações
7
As equações que Maxwell publicou em 1865 eram originalmente em número de 20 e
tinham formas muito distintas das atuais (i.e., eram intragáveis). As quatro equações vec-
toriais que hoje designamos como equações de Maxwell são de facto a versão de Heaviside,
de 1884.
As três frases seguintes que retirei do artigo original de Maxwell, de 1865, dão uma ideia
do seu entendimento acerca do campo electromagnético que acabara de descobrir:
• ”the variations of the electrical displacement must be added to the currents to get
the total amount of electricity”
• ”[the energy] resides in the electromagnetic field, in the space surrounding the elec-
trified and magnetic bodies, as well as in those bodies themselves”
• [about the speed of light]: ”the agreement of the results seems to show that light and
magnetism are affections of the same substance, and that light is an electromagnetic
disturbance”
3.4. AS EQUAÇÕES DE MAXWELL 15
E+
E− B+ k k σ Ψ
1111111111
0000000000
n^
0000000000
1111111111
0000000000
1111111111 h
B−1111111111
0000000000S
C
l
são, respectivamente:
no
H
vazio na
H
matéria
E · ds = ǫq0 (1) D · ds = qℓ (1a)
HS HS
B · ds = 0 (2) B · ds = 0 (2a)
HS R HS R
E · dℓ = − dtd S B · ds (3) E · dℓ = − dtd S B · ds (3a)
HC d R HC d R
C B · dℓ = µ0 i + µ0 ǫ0 dt S E · ds (4) C H · dℓ = iℓ + dt S D · ds (4a)
(3.14)
As condições de fronteira dos campos E e B da electrodinâmica são
idênticas às da eletrostática (e magnetostática), (eqs. 1.58 e 2.31). Com
efeito, aplicando as equações integrais 3.14 à vizinhança de uma superfı́cie,
Ψ, (ver fig. 3.3), em que, por hipótese, os campos são descontı́nuos, no limite
em que h → 0, obtém-se:
no vazio na matéria
n̂ · (E + − E − ) = ǫσ0 (1) n̂ · (D + − D − ) = σℓ (1a)
n̂ · (B + − B − ) = 0 (2) n̂ · (B + − B − ) = 0 (2a) (3.15)
n̂ × (E + − E − ) = 0 (3) n̂ × (E + − E − ) = 0 (3a)
n̂ × (B + − B − ) = µ0 k (4) n̂ × (H + − H − ) = kℓ (4a)
(note que na fig. 3.3, limh→0 S = 0). Isto é, as condições de fronteira do campo
electromagnético são iguais no regime variável e no regime estacionário.
As eqs. 3.13-(3) e eq. 3.13-(4)), dizem-nos que um campo eléctrico variável
num ponto origina nesse ponto um campo magnético variável, e vice-versa,
respectivamente. Há portanto aqui uma simetria entre os campos eléctrico
e magnético: a variação temporal de qualquer deles implica o outro. Os
16 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
∇ × (∇ × A) = µ0 j + µ0 ǫ0 ∂t E = µ0 j + µ0 ǫ0 (−∇∂t V − ∂t2 A)
∇ · A + µ 0 ǫ0 ∂ t V = 0 (3.19)
Estas equações foram publicadas por Lorenz em 1867, escassos anos (ape-
nas dois) após a publicação dos artigos de Maxwell, e são conhecidas como
equações de Lorenz.10
A condição 3.19, que especifica esta escolha dos potenciais, é chamada
condição de Lorenz ou gauge de Lorenz e, no regime estacionário, reduz-
se ao gauge de Coulomb, ∇ · A = 0, (ver § 2.4.3).
9
Os campos não definem absolutamente os potenciais, mas o contrário não é verdadeiro
- os potenciais definem univocamente os campos E e B.
10
Note que Lorenz e Lorentz são pessoas diferentes! (vide D. Jackson, Classical Electro-
dynamics).
3.4. AS EQUAÇÕES DE MAXWELL 19
E = −∇V − ∂t A = −∇V ′ − ∂t (A + ∇f ) = ∇V ′ − ∂t A′ = E ′
20 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
∇ · A′ + µ0 ǫ0 ∂t V ′ = 0 = (∇2 f − µ0 ǫ0 ∂t2 f ) + (∇ · A + µ0 ǫ0 ∂t V ) = 0
Esta é uma equação de onda que em princı́pio terá sempre solução não trivial,
pelo que é sempre possı́vel satisfazer a condição de Lorenz, eq. 3.19. Isto é, se
por hipótese os potenciais, (V, A), não satisfizerem a priori a condição 3.19,
as variantes, (V ′ , A′ ), satisfazem-na seguramente. Como, (V, A) e (V ′ , A′ )
são equivalentes - descrevem os mesmos campos fı́sicos -, portanto podemos
sempre satisfazer a condição 3.19 e considerar equações desacopladas em V
e A, (eqs. 3.20).
A liberdade de escolha do “sistema de potenciais” tem paralelo na liber-
dade de escolha do sistema de coordenadas:- podemos escolher os mais con-
venientes. A fı́sica não depende nem de um nem do outro.
∇ × (∇ × E) = ∇(∇ · E) − ∇2 E
= −∂t (∇ × B) = −(µ0 ∂t j + µ0 ǫ0 ∂t2 E)
3.5. AS ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 21
f v
x
O O’ x
vt x’ x’
(x’=x − v t)
A perturbação que origina uma onda pode ser uma flutuação mecânica, a
perturbação de um campo, etc... A velocidade de propagação de uma onda
é função das propriedades do meio no qual se propaga. As perturbações
de campos como o campo electromagnético, constituem ondas imateriais e
propagam-se todas no vazio à velocidade da luz.
Seja, por hipótese, uma onda que se propaga num meio a uma dimensão,
com velocidade constante, v, que mantém a sua forma à medida que se
propaga (ver fig. 3.4 ). No referencial da onda, a perturbação que se propaga
é descrita por uma função f (x′ ). Porém, vista do laboratório, f é uma função
do espaço e do tempo. Isto é, f (x′ ) = f (x − vt), pois a relação entre os dois
sistemas de coordenadas é x′ = x − vt, (transformação de Galileu).
As derivadas de f em ordem a x e a t são, (derivação composta ou em
cadeia),
∂ x f = ∂ x′ f ∂ x x′ = ∂ x′ f
∂t f = ∂x′ f ∂t x′ = −v∂x′ f
∂x2 f = ∂x2′ f
∂t2 f = v 2 ∂x2′ f
Deste exercı́cio resulta assim a equação geral de uma onda unidimensional,
∂t2 f = v 2 ∂x2 f (3.25)
Esta é a famosa equação de onda a uma dimensão, onde v é a velocidade
da onda. A generalização para o espaço tridimensional é imediata, pois
∂x2 → ∇2 = ∂x2 + ∂y2 + ∂z2 . Obtém-se assim a equação de onda a 3 dimensões
da função f (r),
∂t2 f = v 2 ∇2 f (3.26)
A equação de onda baseia-se em argumentos muito gerais e portanto
aplica-se a qualquer perturbação que se propague através de qualquer meio.
Aplica-se portanto em geral a quaisquer ondas acústicas, electromagnéticas,
marı́timas, gravitacionais, etc... A velocidade de propagação depende natu-
ralmente do processo fı́sico subjacente e das propriedades do meio em causa.
A eq. 3.26 foi descoberta por D’Alembert em 1746 e é conhecida como
equação de onda de D’Alembert.11 Esta equação já era portanto conhecida
cerca de 100 anos antes de Maxwell descobrir as ondas electromagnéticas (em
1865).
11
D’Alembert também demonstrou que as soluções gerais da eq. 3.25 são do tipo f (x, t) =
f (x − vt) + g(x + vt).
3.5. AS ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 23
Como se disse, as equações 3.22 e 3.23 dizem-nos que existem ondas electro-
magnéticas, que se propagam no espaço vazio com velocidade c = √µ10 ǫ0 ≈
3×108 m/s. Esta previsão foi confirmada alguns anos depois de ter sido feita,
através das experiências realizadas por Hertz (cerca de 1888, ver § 3.5.3).
As equações 3.13-(3), 3.13-(4), 3.22 e 3.23 mostram que uma mera flu-
tuação do campo eléctrico num ponto induz uma perturbação do campo
magnético em pontos dessa vizinhança; a qual por sua vez perturba o campo
eléctrico na vizinhança seguinte, etc... A perturbação dos campos vai-se
portanto propagando pelo espaço na forma de uma onda imaterial 12 , com
velocidade c = √µ10 ǫ0 ≈ 3 × 108 m/s. A velocidade c depende apenas das
propriedades do vazio e é por isso uma constante fundamental da fı́sica.
Maxwell constatou que o valor numérico da velocidade, c, era muito
próximo do valor da velocidade da luz, o qual era já bem conhecido nessa
época, sobretudo depois das experiências realizadas por Fizeau (em 1849) e
por Foucault (em 1850), que mediram a velocidade da luz em vários mate-
riais. Maxwell teve a intuição de que esta coincidência não era fortuita e
especulou que a luz devia ser também ela uma onda electromagnética.13 É
hoje evidente que Maxwell estava certo e que a luz visı́vel é, de facto, apenas
uma janela estreita num espectro muito mais largo de ondas eletromagnéticas
(ver tabela 3.1).
12
Durante muito tempo não se considerou que fosse possı́vel haver ondas imateriais que
se propagassem no vazio. Por isso inventou-se o éter, uma espécie de essência que existiria
em todo o espaço para dar suporte à propagação da luz. Esse conceito só foi abandonado
com o advento da teoria da relatividade.
13
Citando Maxwell: ”If it should be found that the velocity of propagation of electro-
magnetic disturbances is the same as the velocity of light, and this not only in air, but in
other transparent media, we shall have strong reasons for believing that light is an elec-
tromagnetic phenomenon”. J. C. Maxwell in ”A Treatise on Electricity and Magnetism”,
2nd vol., 3rd ed., p. 431, 1891.
Na verdade, já nessa época se suspeitava de que a luz devia ter alguma relação com
os campos eléctrico e magnético. Por exemplo, anos antes, em 1845, Faraday, um ex-
perimentador arguto, tinha observado que um campo magnético podia rodar o plano de
polarização de um feixe de luz polarizada.
24 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
15
Uma descarga eléctrica ocorre se o campo eléctrico for superior à rigidez dielétrica
do ar (campo de disrupção, Emax ≃ 3 × 106 V/m). Se o campo for suficientemente
intenso para fornecer a um eventual electrão livre do ar a energia cinética suficiente para
que ele ionize uma molécula (ou átomo) com que colida, libertar-se-ão nessa colisão outros
electrões que, uma vez livres, serão acelerados pelo campo e originarão mais eletrões livres,
e assim sucessivamente. Estabelece-se assim uma corrente muito intensa que dura cerca
de 1 ns − é isto que vulgarmente se designa como descarga (ou faı́sca).
O campo necessário para produzir uma descarga no ar pode ser estimado com uns poucos
cálculos. Se houver no ar n = N/V moléculas/m3 e a secção transversal de cada molécula
for ∼ πa2 , então a distância média de aceleração que um electrão percorre antes de colidir
1 2
com outra molécula é ℓ ∼ nπa 2 , pois V ≈ N πa ℓ. Na aproximação de gás ideal, 1 mole
3
ocupa 22.4 dm ; o diâmetro de cada molécula é ∼ 2 Å; e a energia de ionização é da ordem
de I ∼ 1 eV. Entre colisões a energia adquirida por um electrão é ∆U = e∆V ∼ eEℓ.
∼ ∼
Conclui-se assim que se E > E max ≃ 3 × 106 V/m, então ∆U > I e portanto há uma
descarga. O campo E max é o campo de disrupção (ou rigidez dielétrica) do ar.
Para que se dê uma descarga no ar entre dois electrodos à distância de 1 cm um do
outro é portanto necessária uma diferença de potencial, ∆V ∼ 30 kV. Cada faı́sca tem
uma duração de cerca de 1 ns, pelo que a frequência máxima de descargas é da ordem de
∼ 1 GHz.
16
A capacidade de uma esfera condutora é C = 4πǫ0 R; duas esferas com cargas q e −q,
em que a distância centro a centro seja d, têm uma diferença de potencial ∆V ≈ R2 1 − R d
e têm portanto uma capacidade C ≈ 2πǫ0 R 1 + R d .
26 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
Hertz concluiu que, como cada descarga que ocorre no circuito está as-
sociada a variações muito fortes dos campos eléctrico e magnético, que se
vão propagar como ondas electromagnéticas ao espaço em redor, então os
campos dessa onda electromagnética devem induzir uma força electromotriz
numa espira detectora colocada a certa distância da descarga. Se esta espira
tiver uma pequena interrupção, e se os campos da onda tiverem amplitude
suficiente, a diferença de potencial na descontinuidade da espira pode ser
bastante para que se produza uma pequena faı́sca nessa abertura. Esta ideia
foi crucial, pois até então ninguém sabia como detectar as ondas electro-
magnéticas.
Assim, para detectar as ondas electromagnéticas Hertz concebeu um
ressoador constituı́do por uma espira circular, de raio a, quase fechada, com
duas pequenas esferas separadas por uma distância submilimétrica, ajustável.
Com um parafuso podia afinar a distância entre as esferas e assim variar o
fator LC da espira, de modo a aproximá-lo do do circuito oscilante até obter
ressonância (ver fig. 3.5).
As direções dos campos E e B estão indicadas na figura 3.5, para ondas
que se propagam horizontalmente. Colocando a espira perpendicularmente
ao campo magnético da onda, que é variável, a força electromotriz induzida
na espira de raio a é, de acordo com a lei de Faraday,
dΦ dB
ǫ=− ≈ −πa2
dt dt
Se a amplitude de ǫ for suficientemente elevada dá-se uma pequena descarga
entre os terminais da espira, proporcional a dBdt
, que é visı́vel no escuro. A
dimensão da espira deve ser muito menor que o comprimento de onda de
modo a apanhar o máximo de B na maior parte da área da espira.
Hertz observou que de facto se viam faı́scas na espira quando ocorriam
faı́scas no circuito oscilante, demonstrando assim que eram produzidas, e se
propagavam no ar, ondas electromagnéticas. Confirmava-se assim a previsão
feita por Maxwell cerca de 20 anos antes. A experiência de Hertz é por isso
uma das experiências fundamentais da fı́sica.
Mas Hertz não se ficou por esta observação qualitativa, fez várias ex-
periências, cada vez mais aperfeiçoadas.
Numa das suas experiências Hertz colocou uma chapa condutora em frente
ao dipolo radiante, a cerca de 10 metros deste. Os electrões de um condu-
tor absorvem o campo electromagnético, e, oscilando, reemitem a onda com
a mesma frequência da onda incidente, i.e., uma chapa condutora constitui
3.5. AS ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 27
V
L’ L
C
a) b)
λ /2
c) d)
então,
B2 E2
∇ · (E × B) = −∂t − µ 0 ǫ0 ∂ t − µ0 E · j
2 2 !
1 2 ǫ0 2
= −µ0 ∂t B + E − µ0 E · j
2µ0 2
d dW
= ρE · v = E · j (3.31)
dt dτ
pois j = ρv.
A equação 3.28 expressa portanto o balanço de energia em cada ponto:
- a variação (negativa) de energia do campo electromagnético por unidade
de volume da vizinhança de um ponto é igual ao fluxo de energia que sai
desse volume mais a energia que é transferida para as cargas dessa vizin-
hança, nesse intervalo de tempo por unidade de volume. Esta é uma forma
de enunciar o teorema de Poynting.
Integrando a eq. 3.28 tem-se a equação do balanço de energia num volume
finito, τ , cuja superfı́cie é Ψ, tem-se
I
d d Z dW dW
− Uem − S · ds = dτ = (3.32)
dt Ψ dt τ dτ dt
onde Uem é a energia armazenada no campo nesse volume. Este é o teorema
de Poynting (1884).
S
g = ǫ0 (E × B) =
c2
Consequentemente, uma onda electromagnética que incida sobre uma su-
perfı́cie exerce sobre ela uma pequena pressão − a chamada pressão da ra-
diação. Mas trata-se em geral de um efeito tão pequeno que o vamos igno-
rar.21
21
A pressão da luz emitida pelo Sol é uma das causas (juntamente com o vento de
partı́culas) que faz com que a cauda dos cometas se estenda na direção oposta ao Sol.
3.5. AS ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 31
22
Mais geralmente, f (x, t) = f0 cos(kx − ωt + α) onde α é uma fase constante. Contudo,
a fase anula-se mudando o instante inicial em que se começa a contar o tempo e podemos
ignorá-la na discussão.
32 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
f f
f0 f0
x t
λ T
a) b)
Figura 3.6: Uma onda sinusoidal é periódica quer no espaço quer no tempo,
sendo λ e T os respectivos perı́odos de repetição, no espaço e no tempo.
^
k
f(x,y,t)
^
k θ
z ^r
r r
^
θ k y
ξ ^
r ξ
y
x x
a) b)
Figura 3.7: Onda plana a duas dimensões, f (x, y, t), que se propaga na
direção/sentido do vector de onda, k. Esta onda pode ser descrita a uma
dimensão na direção de propagação, f (x, y, t) = f (ξ, t).
3.5. AS ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 33
Isto é, a expressão geral de uma onda sinusoidal a três dimensões é pois
onde k = 2π λ
k̂ é o vector de onda ou vector de propagação, o qual aponta na
direção e sentido de propagação da onda. A velocidade desta onda é portanto
v = ωk k̂.
É sabido que a fórmula de Euler relaciona uma função sinusoidal com
uma função exponencial complexa, sendo23
√
eiϑ = cos ϑ + i sin ϑ , com i = −1
n o
Podemos por isso escrever cos ϑ = ℜe eiϑ , substituindo por regra as funções
trigonométricas por funções exponenciais, com as quais é geralmente mais
fácil lidar. A eq. 3.35 toma assim a forma,
i(k·r −ωt)
f (r, t) = ℜe f0 e (3.36)
Ondas estacionárias
Uma classe importante de soluções da equação de onda é a das ondas esta-
cionárias, que são ondas confinadas a uma determinada zona limitada do
espaço, mas que não se propagam efetivamente.
Nas fronteiras da região em causa a função de onda deve satisfazer
condições de fronteira, especı́ficas do fenómeno em causa (no caso das ondas
electromagnéticas são as condições de fronteira dos campos E e B). Mas
essas condições de fronteira não dependem do tempo e, consequentemente,
estas soluções da equação de onda devem estar fatorizadas nas variáveis do
espaço e do tempo, de modo a satisfazerem as referidas condições em todos os
instantes. Isto é, o que acontece à função nas fronteiras não pode depender
do tempo.
No caso de uma onda unidimensional, as soluções da equação de onda são
pois do tipo
f (x, t) = g(x)h(t)
Como os zeros das funções g(x) não dependem do tempo, as ondas esta-
cionárias caracterizam-se portanto por terem pontos onde a amplitude de
oscilação é sempre nula (nodos) e outros onde a oscilação é máxima (ven-
tres). Estas ondas são estacionárias, não se propagam (e.g., os nodos e os
ventres não mudam de posição).25 Estes conceitos podem ser generalizados
para mais dimensões, como é evidente.
25
As ondas estacionárias podem-se neste caso interpretar como sobreposições de ondas
com sentidos contrários, pois 2cos(kx − ωt) + cos(kx + ωt) = cos(kx) cos(ωt).
36 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
ou seja,
k·E =0 → E⊥k (3.42)
Isto é, o campo eléctrico de uma onda electromagnética que se propague no
espaço livre (de barreiras ou fronteiras) é sempre perpendicular à direção
de propagação − é uma onda transversal. Visto que ∇ · B = 0, conclui-se
igualmente que B ⊥ k. Por conseguinte, as ondas electromagnéticas que
se propagam no vazio, em espaço aberto, são ondas transversais eléctricas e
magnéticas.26
O rotacional de E e de B impõe condições adicionais aos campos que
se propagam e que sejam descritos pelas eqs. 3.41. Assim, a equação de
Maxwell, eq. 3.13-(3), ∇ × E = −∂t B, requer que:
∂t B = iωB; (3.43)
x̂ ŷ ẑ +x̂ (∂y Ez − ∂z Ey )
∇×E = ∂x ∂y ∂z = −ŷ (∂x Ez − ∂z Ex ) = i (k × E)
(3.44)
Ex Ey Ez +ẑ (∂x Ey − ∂y Ex )
i (k × E) = iωB
26
Uma onda é transversal ou longitudinal consoante a oscilação é perpendicular ou
longitudinal à direção de propagação, respetivamente. Assim, p.ex., o som é uma onda
longitudinal de pressão na direção em que se propaga, mas uma onda na superfı́cie da
água é transversal.
3.5. AS ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS 37
E
E
k
B B k
a) b)
ω
ou seja, como k
= c,
1
B= k̂ × E (3.45)
c
Por outro lado, a equação de Maxwell, eq. 3.13-(4), ∇×B = µ0 ǫ0 ∂t E, obriga
a que ∇ × B = i(k × B) = −i cω2 E; isto é, que E = −c(k̂ × B). Mas esta
condição é equivalente à eq. 3.45, não acrescenta nada.
Em suma, conclui-se que os campos de uma onda electromagnética que
se propaga no espaço livre e vazio, na direção/sentido k̂, são tais que:
E ⊥ k̂ e B ⊥ k̂
E⊥B (3.46)
|B| = |E |
c
E E
B
B
k
E
Polarização
Os campos E e B de uma onda electromagnética plana que se propaga
no vazio têm a forma genérica representada na fig. 3.8: - oscilam transver-
salmente à direção de propagação, com periodicidade espacial bem definida.
Se o plano de oscilação do campo eléctrico (e do campo magnético) se
mantiver constante diz-se que a onda tem polarização linear. Normalmente
o estado de polarização é referido à oscilação do vector E (como E e B estão
acoplados basta definir um deles).
Todavia, a polarização não tem que ser linear; satisfazem igualmente
as equações de Maxwell ondas transversais em que o plano formado pelos
vectores E e B roda durante a propagação (ver fig. 3.9). Trata-se nesse caso
de ondas com polarização circular (eventualmente elı́ptica), a qual pode ser
circular esquerda ou direita consoante o sentido de rotação de E em relação
a k (ver fig. 3.9).
1 1 E2
S= (E × B) = EB k̂ = 0 cos2 (k · r − ωt) k̂
µ0 µ0 µ0 c
3.6. ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS EM MEIOS CONDUTORES 39
Isto é, o vector de Poynting de uma onda sinusoidal é ele próprio uma onda
sinusoidal, mas com frequência dupla da frequência dos campos.27 Contudo,
o interesse reside no valor médio de S. Define-se a intensidade de uma onda
eletromagnética em cada ponto como a média temporal de S, i.e., I = hSi,
E02 D 2 E E2 ǫ0
I = hSi = cos (k · r − ωt) = 0 = E02 c = huic (3.47)
µ0 c 2µ0 c 2
(pois hcos2 ϑi = 21 ). Isto é, a intensidade da onda é igual à densidade média
de energia do campo electromagnético28 a multiplicar pela velocidade dessa
onda (note-se que qualquer densidade de fluxo é a densidade do que se move
vezes a respetiva velocidade, e.g., para a carga, j = ρv), (eq. 1.68), etc.
Sempre que uma onda electromagnética encontra uma fronteira e o meio
muda de caracterı́sticas, há lugar a reflexão e refracção das ondas. As
condições de fronteira dos campos eléctrico e magnético (eqs. 3.15) determi-
nam as relações entre os campos nessas fronteiras e, portanto, as intensidades
das ondas refractada e reflectida em qualquer interface. Porém, não faremos
essa análise aqui.
As ondas electromagnéticas, pelo seu interesse, pela diversidade dos con-
ceitos que envolve e pelo universo das suas aplicações, têm que ser estudadas
especificamente, nas suas diversas vertentes. Importa ainda assim discutir
alguns fenómenos mais significativos e algumas aplicações relevantes.
∇·E =0 (3.48)
∇·B =0 (3.49)
∇ × E = −∂t B (3.50)
∇ × B = µσE + µǫ∂t E (3.51)
∇ × (∇ × E) = −∂t (∇ × B)
= −µσ∂t E − µǫ∂t2 E
isto é,
∇2 E − µǫ∂t2 E = µσ∂t E (3.52)
e, analogamente,
∇2 B − µǫ∂t2 B = µσ∂t B (3.53)
As equações 3.52 e 3.53 são equações de onda não homogéneas (o lado
direito não é nulo). Conquanto não saibamos a priori qual é a solução destas
equações, admitamos todavia que uma onda plana que se propaga ao longo
de z é solução, i.e., que
B
z
vazio condutor
Isto é, se
′′ ′
E = E0 Ê e−k z ei(k z−ωt) ; (3.62)
|k| ′′ ′
B= E0 (k̂ × Ê) e−k z ei(k z−ωt+α) ) (3.63)
ω
Na fig. 3.10 esquematizam-se os campos de uma onda electromagnética que
se propaga num bom condutor, onde se ilustra a diferença de fase entre os
campos. Num bom condutor, tem-se σ ≫ ǫω e, portanto, k ′ ≈ k ′′ , sendo a
diferença de fase aproximadamente 45o .
Em suma, conclui-se das equações anteriores que uma onda electro-
magnética se extingue exponencialmente à medida que penetra através de
um meio condutor; o que significa que, na prática, não penetra para além
da camada superficial. Este efeito é conhecido como efeito pelicular (em
inglês, skin effect) e tem consequências importantes, nomeadamente nas lin-
has de transmissão, quer de sinal quer de potência.
Como se disse atrás, considera-se que um meio é um bom condutor se tem
condutividade muito elevada, tal que σ ≫ ǫω, (o cobre tem σ ∼ 108 Ω−1 m−1
e o limite σ ∼ ǫω atinge-se para ω ≃ 7 × 1018 Hz). Para frequências aquém
desse limite, a expressão 3.58 fica
r r r
µǫ σ µσω q
k ′′ ≈ ω = = πµσf (3.64)
2 ǫω 2
3.6. ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS EM MEIOS CONDUTORES 43
onde f é a frequência da onda. Isto significa que (ver eq. 3.62) a distância
média de penetração31 da onda no condutor é da ordem de δ = k1′′ , ou seja,
1
δ=√ (3.66)
πµσf
Com efeito, a essa distância, δ, da superfı́cie, a amplitude da onda está re-
duzida a cerca de 1/3 do valor à entrada. Esta distância caracterı́stica, δ,
designa-se como profundidade pelicular, sendo, como se vê, uma quanti-
dade que decresce com a frequência. A tabela 3.2 tem os valores da profun-
didade pelicular do cobre para várias frequências.32
Devido a este efeito pelicular (mas não só) as ondas de frequência muito
elevada propagam-se nos cabos das linhas de transmissão apenas numa fina
camada superficial do condutor. Por consequência, a resistência efetiva de
um fio condutor é geralmente muito maior a frequências elevadas do que seria
se a corrente fosse contı́nua.
Podemos estimar a importância do efeito pelicular num condutor
cilı́ndrico sólido, de comprimento ℓ e raio a, supondo que a corrente é uni-
forme nessa fina pelı́cula de espessura δ. Se a corrente for contı́nua a re-
sistência do fio é
1 ℓ
R0 =
σ πa2
Porém, se a corrente for variável, só corre na camada superficial e, conse-
quentemente, √
1 ℓ a a πµσf
R≈ = R0 = R0 (3.67)
σ 2πaδ 2δ 2
e, portanto, a resistência do fio cresce com a raiz quadrada da frequência
da corrente que o percorre. Por exemplo, num fio de cobre com 5 mm de
diâmetro a resistência por metro é R0 /ℓ ≃ 8 × 10−4 Ω/m, para corrente
contı́nua. Porém, a 25 kHz, só uma pelı́cula é efetivamente condutora e por
31
O valor médio da distância percorrida pela onda é
R∞ ′′
0
dz ze−k z 1
δ = R∞ ′′ z
= ′′ (3.65)
0
dz e −k k
Quando z = δ, fica E(z = δ) = E0 /e ≃ E0 /3, ou seja, a amplitude cai para cerca de 1/3
ao fim da distância δ.
32
Não deve pois surpreender que todos os bons condutores sejam opacos à luz visı́vel
(cuja frequência é f ∼ 1014 Hz) - as ondas não passam! É também por isso que os bons
espelhos são feitos com pelı́culas boas condutoras, ver nota da pág. 27.
44 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
Tabela 3.2: Profundidade pelicular do cobre para várias frequências das on-
das electromagnéticas.
b y ϕ
^
a
ρ
^
ϕ
ϕ z x
x z^
ρ
^ ϕ
^
y
n̂ × (E + − E − ) = 0 (3.69)
n̂ · (B + − B − ) = 0 (3.70)
E = E̺ ̺ˆ + Eϕ ϕ̂ + Ez ẑ
B = B̺ ̺ˆ + Bϕ ϕ̂ + Bz ẑ
e, portanto,
E0 i(kz−ωt)
B= e ϕ̂
̺v
Concluı́mos assim que no espaço entre os dois condutores se propaga uma
onda electromagnética, cujos campos são da forma34 (ver fig. 3.12)
E0 i(kz−ωt)
E(̺, z, t) = ̺ˆ e (3.72)
̺
E0 i(kz−ωt)
B(̺, z, t) = ϕ̂ e (3.73)
̺c
As ondas transversais representadas pelas equações anteriores constituem
o chamado modo principal de propagação em cabos coaxiais. Há todavia
também outros modos de propagação mais complicados que correspondem a
ondas electromagnéticas que não são simultaneamente transversais em E e
em B (ver § 3.11).
34
Verifique que, de facto, ambos os campos satisfazem as condições de fronteira 3.70,
nas superfı́cies dos condutores.
3.7. A LINHA DE TRANSMISSÃO COAXIAL 47
b
E
1111111111111
0000000000000
B k
0000000000000 a
1111111111111 111
000
000
111
0000000000000
1111111111111 000
111
000
111
0000000000000
1111111111111
B
000
111
B
k E
E
Figura 3.12: Campos E e B de uma onda electromagnética que se propaga
através do cabo coaxial no modo fundamental de propagação (dominante):
o campo eléctrico é radial e o campo magnético é axial. a) Vista transversal
e b) vista longitudinal.
ǫE0 i(kz−ωt)
(σ)̺=a = n̂ · (ǫ+ E + − ǫ− E − ) = a
e
(3.74)
(k)̺=a = n̂ × ( µ1+ B + − 1
µ−
B−) = ẑ µE0 ca
0
ei(kz−ωt)
Esta é uma equação de onda não homogénea, que descreve uma onda amorte-
cida, que se vai extinguindo à medida que se propaga (c.f. eq. 3.52). A am-
plitude da onda vai-se reduzindo à medida que ela percorre o cabo, devido às
perdas óhmicas por efeito Joule. Este efeito dissipativo não se manifestou na
análise precedente porque apenas analisámos a propagação da onda através
do dielétrico.
A função V (z, t) é também ela descrita por uma onda cuja equação é
V(z) V(z+dz) a
I(z) I(z+dz)
dz
R dz L dz
C dz V(z+dz,t)
V(z,t)
G dz
dz
z
j
ρ
r"
r’ τ ( V(r), A(r))
O r
x y
Estas duas equações são claramente equações de onda não homogéneas (são
homogéneas em pontos onde ρ = j = 0), o que significa que no regime não
estacionário, as variações dos potenciais formam ondas que se propagam pelo
√
espaço à velocidade da luz, c = 1/ µ0 ǫ0 .
As equações de Lorenz são, como se vê, uma generalização das equações de
Poisson da eletrostática, às quais se reduzem no regime estacionário, ficando
∇2 A = −µ0 j (3.85)
ρ
∇2 V = − (3.86)
ǫ0
Vimos nos capı́tulos precedentes que as soluções destas últimas equações têm
a forma (ver eqs. 1.50, 2.24 e fig. 3.15),
µ0 Z j(r ′ ) ′
A(r) = dτ (3.87)
4π τ r′′
1 Z ρ(r ′ ) ′
V (r) = dτ (3.88)
4πǫ0 τ r′′
Por conseguinte, as soluções das eqs. 3.83 e 3.84 devem também ser, em
princı́pio, uma generalização das soluções do regime estacionário.
Discutimos nas linhas seguintes as soluções do potencial V , mas pode-se
aplicar o mesmo argumento às componentes do potencial vector, A.
As eqs. 3.83 e 3.84 são equações de onda que variam linearmente com
as fontes, pelo que é válido o princı́pio de sobreposição. Considerando a
3.8. OS POTENCIAIS RETARDADOS 53
y q v
θ r"
r’
θ
V(r ,t)
r
z’ z
x
isotropia do espaço, cada carga infinitesimal variável será origem de uma onda
esférica de potencial, de amplitude infinitesimal - i.e., origina uma ondula ou
ondı́cula esférica - com a forma genérica, (ver eq. 3.40 e fig. 3.15),
′′
f (r′′ − ct)
′′ f (t − rc )
dV (r , t) = = (3.89)
r′′ r′′
Contudo, na vizinhança da fonte o efeito de propagação do potencial não
se põe, pelo que nesse ponto a solução deve-se aproximar da solução esta-
cionária, i.e.,
r ′′
f (t − c
) f (t) ρ(r ′ , t)dτ ′
lim = lim = lim
r →0
′′
r′′ r
′′ →0 r ′′ r ′′ →0 r′′
′′
′′
pelo que f t − rc = ρ r ′ , t − rc dτ ′ .
O potencial V de uma distribuição variável de cargas deve ser dado pela
sobreposição de todas as ondı́culas com origem em cada uma das flutuações
elementares de cargas, eq. 3.89. O mesmo se pode dizer acerca das com-
ponentes do potencial vector, A. Podemos pois prever que as soluções das
equações de Lorenz têm a forma,
′′
1 Z ρ(r ′ , t − rc ) ′
V (r, t) = dτ (3.90)
4πǫ0 τ r′′
′′
µ0 Z j(r ′ , t − rc ) ′
A(r, t) = dτ (3.91)
4π τ r′′
onde j(r ′ , t − r′′ /c) e ρ(r ′ , t − r′′ /c) são as distribuições que existiam em
tempos recuados, t − r′′ /c, quando essas ondulas foram emitidas, (sendo
54 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
esses tempos diferentes para cada ondula). Estas soluções são, de facto, uma
generalização das respectivas soluções estacionárias, eqs. 3.87 e 3.90, que são
conhecidas como potenciais retardados.36
As equações anteriores dizem-nos claramente que, em condições não-
estacionárias, é necessário ter em conta o tempo de trânsito da variação
dos potenciais, desde as fontes (em r ′ ) até ao ponto em que é observado o
seu efeito, em r (ver fig. 3.15). Isto é, os potenciais V e A que existem num
ponto r em cada instante são os de cargas e correntes que existiam instantes
antes, em t − δt, onde δt = r′′ /c é o tempo de transito de cada ondı́cula
entre r ′ e r, feito à velocidade da luz. Os potenciais V e A em cada ponto
são portanto os das cargas e correntes que em cada instante se veem a partir
desse ponto (literalmente!). São por isso potenciais retardados, do mesmo
modo que a imagem que se vê do céu é a imagem das estrelas, não a que elas
têm agora, mas a imagem que elas tinham no instante em que emitiram a
luz que nós vemos, porventura há muitos milhões de anos atrás; e esse tempo
não é o mesmo para todas elas. O que vemos no céu é portanto uma imagem
retardada do universo!
As soluções 3.90 e 3.91 permitem calcular os campos criados por cargas e
correntes em qualquer regime variável e têm por isso grande importância.
Calculadas estas soluções, os campos obtêm-se derivando essas soluções,
recorrendo às eqs. 3.17, entre os potenciais e os campos.
Quando se considera o limite da carga pontual, r′′ pode passar para fora do inte-
gral; porém, o integral resultante não é igual à carga, pois a função ρ não se refere a
um instante particular (i.e., não é uma foto da nuvem de carga), já que r′′ depende
de r ′ mas também de r. Mas fazendo a mudança de variável, ζ = z ′ − v(t − r′′ /c),
fica ρ = ρ(x′ , y ′ , ζ), e visto que r′′2 = (x − x′ )2 + (y − y ′ )2 + (z − z ′ )2 , então
v z′ − z ′ v
dζ = dz ′ + ′′
dz = dz ′ 1 − cos θ
c r c
pois (z − z ′ )/r′′ = cos θ, (ver fig. 3.16). R O fator (1 − vc cos θ) sai para fora do
integral, que assim se reduz à carga, q = τ ρ(x′ , y ′ , ζ)dx′ dy ′ dζ.
Por conseguinte, o potencial de uma carga pontual, q, em movimento com
velocidade, v tem a forma
1 q
V (r, t) = (3.92)
4πǫ0 r (1 − vc cos θ)
′′
r̂′′ r̂′′
Z Z
ρ(r ) ∇ · ′′2 dτ ′ =
′
ρ(r ′ ) ∇ · dτ ′
r r ′′ <a r′′2
r̂′′ r̂′′
Z I
≈ ρ ∇· dτ ′ = ρ · ds′ = 4πρ
r ′′ <a r′′2 S r′′2
onde ds′ = r′′2 sin θ dθ dϕ r̂′′ , com ρ = ρ(r′′ = 0) = ρ(r ′ ). Voltando atrás, conclui-
se finalmente que
1 ρ
∇2 V − 2 ∂t2 V = −
c ǫ0
Esta demonstração aplica-se igualmente a cada umas das componentes do potencial
A.
⋄
a forma mais simples de calcular os campos que são radiados por uma antena
é calcular primeiramente os potenciais retardados em cada ponto e, a partir
deles, obter os campos eléctrico e magnético que constituem a onda emitida.
Têm particular interesse as ondas sinusoidais (ver § 3.5.5). As fontes dos
campos das ondas electromagnéticas radiadas hão de ser nesse caso densi-
dades de correntes que oscilam harmonicamente, a que correspondem cor-
rentes da forma, n o
I(t) = I0 cos ωt = I0 ℜe e−iωt (3.94)
Ou seja, visto de longe, no ponto r, (ver fig. 3.15),37
!
′ r′′ r ′′
j r ,t − = j(r ′ )e−iω(t− c
)
(3.95)
c
O potencial em r é dado pela eq. 3.91,
ωr ′′
µ0 −iωt Z ei c
A(r, t) = e j(r ′ ) ′′ dτ ′ = A(r)e−iωt (3.96)
4π τ r
Se as correntes estiverem confinadas a um fio fino de comprimento ℓ, então
jdτ ′ = Idℓ ′ , pelo que
ωr ′′
µ0 −iωt Z ei c
A(r, t) = e I(r ′ ) ′′ dℓ ′ (3.97)
4π r
Um dipolo de Hertz é constituı́do por um fio fino, muito curto, de com-
primento ℓ ≪ 1, percorrido por uma corrente que oscila harmonicamente,
I = I0 cos(ωt). Este elemento básico é o limite assimptótico de uma antena
dipolar eléctrica. Em pontos afastados do dipolo, o campo calculado para
esse dipolo não é significativamente diferente daquele que é devido p.ex. a
uma antena de meia onda, que tem ℓ = λ2 . Os cálculos são, porém, muito
mais simples.38
Seja o dipolo eléctrico elementar de Hertz da fig. 3.17, percorrido pela
corrente sinusoidal da eq. 3.94.39 O potencial (retardado), A(r, t), criado
37
Como é habitual, omite-se a menção explı́cita à parte real, de modo a simplificar a
notação. Não há, porém, ambiguidade porque as quantidades fı́sicas são evidentemente
reais.
38
Este argumento deve ser usado com cautela, pois em geral são relevantes as diferenças
de fase introduzidas por elementos radiantes diferentes.
39
Nesta situação a carga do fio desloca-se periodicamente num e no outro sentido, sendo
em cada ponto q(t) = q0 sin(ωt) e, portanto, I = q0 ω cos(ωt), com I0 = q0 ω.
58 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
r^
z
ϕ^
r θ^
θ
l
ϕ
x y
por esta corrente num ponto à distância r′′ = r do dipolo (que está colocado
na origem de coordenadas), é
ωr ′′ ωr
µ0 −iωt Z ℓ ei c µ0 ei c −iωt
A(r, t) = e I(r ′ ) ′′ dℓ ′ ≈ I0 ℓ e ẑ (3.98)
4π 0 r 4π r
Isto é, A = Az ẑ.
O problema trata-se melhor em coordenadas esféricas, sendo então
A = Az ẑ = Ar r̂ + Aθ θ̂ + Aϕ ϕ̂
com
Ar = Az ẑ · r̂ = Az cos θ
Aθ = Az ẑ · θ̂ = −Az sin θ
Aϕ = Az ẑ · ϕ̂ = 0
Há claramente simetria azimutal na fig. 3.17, pelo que os potenciais e os
campos não podem depender de ϕ. O campo B, radiado pelo dipolo, vem
da relação B = ∇ × A, sendo
1
B = [∂r (rAθ ) − ∂θ Ar ] ϕ̂
r
( ! !)
ωr ωr
ξ ei c ξ ei c
= ∂r r (− sin θ) − ∂θ cos θ ϕ̂
r r r r
( )
ξ iω i ωr ξ i ωr
= − sin θe c + 2 e c sin θ ϕ̂
r c r
3.9. RADIAÇÃO DE UM DIPOLO ELÉCTRICO 59
µ0
onde se fez ξ = I ℓe−iωt .
4π 0
Ora, visto que c = ωk , fica
µ0 I 0 ℓ −iω 1
B(r, θ, t) = sin θ + 2 ei(kr−ωt) ϕ̂ (3.99)
4π rc r
Vemos portanto que o campo B tem duas componentes, uma que decresce
com a distância, r, e a outra com o quadrado da distância. Em pontos
afastados do dipolo, quando r ≫ 1, o campo fica reduzido a40
µ0 I0 ℓ sin θ ω i(kr−ωt)
B(r, θ, t) = −i e ϕ̂ (3.100)
4π r c
Em pontos fora do dipolo, j = 0, e ∇ × B = µ0 ǫ0 ∂t E, donde se tem
1 1
[∂θ (sin θBϕ )] r̂ − ∂r (rBϕ )θ̂ = µ0 ǫ0 ∂t E
r sin θ r
µ0 I 0 ℓ 1
Então, fazendo η = 4π e µ0 ǫ0 = c2 na eq. 3.99, obtém-se
h i
1 η −iω 1
∂E
c2 t r
= r sin θ rc
+ r2
2 sin θ cos θ ei(kr−ωt)
h i
1
= − ηr ∂r r sin θ −iω 1
∂E
c2 t θ rc
+ r2
ei(kr−ωt)
Isto é, h i
2iηc2 −iω 1
Er =
ω r2 c
+ r3
cos θ ei(kr−ωt)
h i
E = i c2 η sin θ − k2 −
ik
+ 1
ei(kr−ωt)
θ ω r r2 r3
Em pontos afastados do dipolo, o campo eléctrico radiado é pois
µ0 I0 ℓ sin θ i(kr−ωt)
E(r, θ, t) = −iω e θ̂ (3.101)
4π r
π
(o fator i = ei 2 que aparece nas eqs. 3.100 e 3.101 é uma diferença de fase
(de π2 ) entre a oscilação da corrente e os campos que ela radia).
Faz-se notar que, como é de supor em campos constitutivos de ondas
electromagnéticas, os campos das equações 3.100 e 3.101 são mutuamente
ortogonais, E ⊥ B, e que, além disso, |B| = |E c
|
.
O campo eléctrico radiado por um dipolo de Hertz, dado pela eq. 3.101,
está representado na fig. 3.18, para dois instantes sucessivos. Este campo é
pois, basicamente, o de uma onda esférica, modulado pela função sin θ, (cf.
eq. 3.40). A amplitude decresce com o inverso da distância ao dipolo, como é
caracterı́stico de uma onda esférica, diferentemente do campo de um dipolo
eléctrico estático, que varia com 1/r3 .
40 k 1
Mais exatamente, quando r ≫ r2 , i.e. no limite em que kr ≫ 1, ou seja, para r ≫ λ.
60 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
k k
k k
E
θ I(θ)
x y
µ0 ω 2 ℓ 2 2
hP i = I (3.103)
12πc 0
62 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
θ I(θ)
µ0 p20 4
hP i = ω
48π 3 c
Esta equação é importante porque nos diz que: - uma carga a oscilar radia ondas
electromagnéticas com uma potência que é proporcional à quarta potência da frequência
de oscilação.
Um exemplo dramático em que a equação anterior está implicada é na existência do
céu azul (e do pôr do sol vermelho). O céu é azul devido à interação da radiação solar
com as moléculas da atmosfera, em resultado da qual as moléculas se tornam em pequenos
dipolos eléctricos oscilantes. A potência (re)emitida por essas moléculas, é proporcional
à 4a potência da frequência, sendo por isso muito mais intensa no azul do que na banda
do vermelho. Em resultado disso, a luz azul é dispersa em todas as direções mais do
que outras componentes e o céu torna-se azul. Este tipo de dispersão é conhecido como
dispersão de Rayleigh.
É também devido a esta dispersão que o pôr do sol é vermelho; nessa altura a luz
atravessa muito mais ar e a dispersão da componente azul é maior - a luz do pôr do sol é
a que sobra, (expurgada de azul é vermelha).
3.9. RADIAÇÃO DE UM DIPOLO ELÉCTRICO 63
I hS(r, θ)i hP i
G(θ) = = , onde hIi = hhSii = (3.106)
hIi hhSii 4πr2
µ0 ω 2 ℓ2 48π 2 cr2 2
G(θ) = 2 2 2 2
sin2 θ = sin2 θ (3.107)
32π cr µ0 ω ℓ 3
k
E
z r B
r"
θ
r’ y
ϕ
i x
Figura 3.21: Dipolo magnético oscilante, constituı́do por uma espira circular.
Representam-se os campos E e B da onda que ele radia, num ponto r.
Como vimos em § 3.8, o potencial vector (retardado) criado por esta corrente,
num ponto r é
µ0 I I0 dℓ ′ −iω(t− r′′ )
A(r, t) = e c (3.108)
4π C r′′
o qual se refere às correntes existentes no instante (passado) em que a per-
turbação electromagnética deixou a espira e que, após um tempo de trânsito
′′
τ = rc , chega ao ponto r.
O cálculo do campo criado pelo dipolo magnético é mais complicado do
que o de um dipolo eléctrico elementar, pois neste caso é necessário integrar
sobre toda a espira.43
43
Se considerássemos apenas um dos elementos dessa espira então tratar-se-ia de um
·⊙
dipolo de Hertz e não de uma espira, ⌣.
3.10. RADIAÇÃO DE UM DIPOLO MAGNÉTICO 65
µ0 I0 a i(kr−ωt)
A(r, t) = e ikaπ sin θ ϕ̂ (3.110)
4πr
π
O fator i = ei 2 indica que há uma diferença de fase de π2 entre a oscilação
da corrente e a do potencial A.
Os campos E(r, t) e B(r, t) são dados pelas eqs. 3.17,45
dos campos radiados por um dipolo magnético oscilante é o que está repre-
sentado na fig. 3.18, trocando E com B nessa figura.
A intensidade da radiação emitida obtém-se a partir do vector de Poynt-
ing, S = µ10 E × B; em pontos afastados S = S r̂ e, portanto,
µ0 m20 ω 4 sin2 θ
S= r̂ e2i(kr−ωt) (3.115)
16π 2 c3 r2
A intensidade da onda é assim,
!
µ0 m20 ω 4 sin2 θ
I = hSi = (3.116)
32π 2 c3 r2
cabo coaxial
prato reflector
torna-se muito elevado, assim como as correntes induzidas de Foucault. Por consequência,
a resistência dos cabos eléctricos torna-se muito elevada e, consequentemente, são grandes
as perdas óhmicas de Foucault.
47
A razão de ser para o guia ser opaco em frequências inferiores à frequência de cut-off,
ωc , é que se ω < ωc não é possı́vel satisfazer simultaneamente as equações de onda, as
equações de Maxwell e as condições de fronteira.
70 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
y
b E
B
a x
Z Z x̂ ŷ ẑ
B=− dt ∇ × E = − dt ∂x ∂y ∂z
0 Ey 0
Z Z
= − −x̂ dt ∂z Ey + ẑ dt ∂x Ey
h i i
= x̂ ∂z E0 y + ikz E0 y − ẑ ∂x E0 y ei(kz z−ωt)
ω
ou seja, como E0 y = E0 y (x, y), então Bz 6= 0 (!). Isto significa que o campo
magnético desta onda não é transversal à direção de propagação, ẑ. Uma
onda com estas caracterı́sticas é uma onda transversal eléctrica (TE). Porém,
as linhas do campo B ainda formam linhas fechadas, pois ∇ · B = 0; o
que significa que em parte essas linhas seguem ao longo do guia de ondas,
que é a direção de propagação (ver fig. 3.23). Esta configuração satisfaz
também a condição de continuidade da componente B ⊥ em todas as paredes
do condutor, i.e., contando que |B| → 0 nas paredes laterais.
ondas TE e TM
No caso mais geral de uma onda TE, cuja velocidade é segundo z, temos
então n o
E(x, y, z, t) = E0 x (x, y)x̂ + E0 y (x, y)ŷ ei(kz z−ωt)
1 2
Da equação de onda, ∇2 E = ∂ E,
c2 t
vem que
( 2
∂x2 E0x + ∂y2 E0x − kz2 E0x = − ωc2 E0x
2
∂x2 E0 y + ∂y2 E0 y − kz2 E0 y = − ωc2 E0 y
e, portanto, !
1 d2 χ 1 d2 η 2 ω2
+ = kz −
χ dx2 η dy 2 c2
As variáveis x e y são independentes e por isso as duas parcelas da equação an-
terior são também independentes. Como a igualdade é válida para quaisquer
valores de x e y, conclui-se que essas parcelas são necessariamente constantes
(é o método de separação de variáveis),
1 d2 χ
2
= −kx2 (3.121)
χ dx
1 d2 η
2
= −ky2 (3.122)
η dy
com !
ω2
−kx2 − ky2 = kz2 − 2 (3.123)
c
As eqs. 3.121 e 3.122 são equações diferenciais ordinárias, cujas soluções são
sinusoidais,
E0x (x, y) = [A1 cos(kx x) + A2 sin(kx x)] [B1 cos(ky y) + B2 sin(ky y)]
E0y (x, y) = [A′1 cos(kx x) + A′2 sin(kx x)] [B1′ cos(ky y) + B2′ sin(ky y)]
Frequência de cut-off
Se a constante kz for um número real, i.e., se kz2 > 0, então a onda elec-
tromagnética propaga-se ao longo do eixo z no guia de ondas sem amorteci-
mento. Tendo em consideração a eq. 3.123, conclui-se então que a condição
2
para que não haja atenuação da amplitude da onda é kz2 = ωc2 − kx2 − ky2 > 0;
ou seja, se
s
n2 m 2
ω > ωnm = cπ + 2 , com m, n = 0, 1, 2, . . . (3.130)
a2 b
74 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
A
λ/2
B
a) b)
E
B
E
E B
Fluxo de energia
No caso das ondas TE, o campo B tem uma componente na direção de
propagação. Coloca-se por isso a questão de saber que implicações tem isso
no vector de Poynting e na sua relação com a propagação da onda. Ora, no
caso destas ondas,
(
1 1 2 2
S = E×B = E0x + E0y ẑ
µ0 µ0 c
)
1 iπ
+ cos kx x cos ky y (E0x ŷ − E0y x̂) e2i(kz z−ωt+ 2 )
µ0
1 J0
.8
J1
.6 J2
.4
.2
0
2 4 6 8 ξ
−.2
−.4
TE TE TM
01 11 11
2
onde kz2 − ωc2 = κ2 e onde m = 0, 1, 2, . . .; e Jm ′
é a derivada de Jm , e κ
é a componente transversal do vector de onda k, (isto é, o vector de onda
é k = kz ẑ + κ). Os factores C, C ′ , D, D′ e D′′ são constantes. Compare
estas soluções com as correspondentes soluções do guia retangular, eqs. 3.128,
3.129.
As soluções anteriores, eq. 3.131, são semelhantes às que se aplicam às
fibras ópticas. Porém, as fibras ópticas são particularmente complicadas de
estudar, visto que a parede do guia é uma interface entre dois dielétricos
diferentes e não uma parede condutora, o que implica considerar também a
propagação de ondas nesse meio envolvente à fibra (que é a bainha).
Os modos de propagação correspondem às soluções de onda possı́veis,
compatı́veis com as condições de fronteira dos campos. As condições de
fronteira de E e B impõem que a componente tangencial de E deve ser
contı́nua em ̺ = a, o que significa que Eϕ (a) = 0. Por outro lado, o campo
B deve ter componente normal contı́nua em ̺ = a; i.e., B̺ (a) = 0. Impondo
estas restrições às eqs. 3.131 conclui-se por consequência que as ondas TE
devem satisfazer a condição
′
Jm (κa) = 0 (3.132)
′ ′
onde ζmn é o n-ésimo zero da função Jm e ζmn o n-ésimo zero da função Jm .
Assim, a condição 3.132 das ondas TE traduz-se portanto na equação,
78 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
′
κa = ζmn , ou seja,
ω2 ′
ζmn
k 2 = κ2 + kz2 = , com κ = (3.134)
c2 a
A onda propaga-se ao longo de z sem se extinguir se kz2 > 0 (cf. eq. 3.131).
2
Ou seja, há ondas se kz2 = ωc2 − κ2 > 0. Isto significa que só se transmitem
através do guia de ondas ondas com frequência ω, tal que
c ′
ω > ωmn ; com ωmn = ζmn (3.135)
a
onde ωmn é a frequência de corte (ou de cut-off ) caracterı́stica do guia de
ondas.
O modo fundamental - o de frequência mais baixa - é pois o modo (TE)11 ,
′
correspondente a ζ11 ≈ 1.841, ver eqs. 3.133; este é o modo de propagação
dominante num guia de ondas cilı́ndrico. Na fig. 3.27 representam-se a tı́tulo
ilustrativo alguns dos modos de propagação de um guia de ondas cilı́ndrico.
Por exemplo, se o raio for a = 6 cm, então a frequência de corte no modo
(TE)11 é ω11 ≈ 10 GHz.Consequentemente, ondas com frequência inferior a
ω11 não passam neste guia de ondas.
Em geral, as ondas que se propagam dentro do guia de ondas são uma
sobreposição dos vários modos possı́veis, dependendo da frequência do campo
electromagnético injetado no guia de ondas. É todavia possı́vel favorecer um
modo em detrimento doutros, mas não vamos discutir essa questão.
Ondas TM
O campo magnético das ondas TM tem a forma
( )
Cm ′ ′
B= Jm (κ̺) sin(mϕ)ˆ
̺ + Cm Jm (κ̺) cos(mϕ)ϕ̂ ei(kz z−ωt) (3.136)
̺
′
onde m = 0, 1, 2, . . . e Cm e Cm são constantes. O campo eléctrico pode-se
obter diretamente a partir do campo B. As condições de fronteiras das ondas
TM originam, à semelhança das ondas TE, a condição
Jm (κa) = 0 (3.137)
ζmn
pelo que os valores possı́veis de κ são, κ = a
.
3.11. GUIAS DE ONDAS⋆ 79
Como vimos acima, o modo fundamental (TE)11 só pode ser excitado se
TE
ω > ω11 = 1.841c/a. Como se conclui das eqs. 3.133, o modo seguinte com
frequência mais baixa desse guia de ondas é o modo (TM)01 , cuja frequência
de corte é
TM
ω01 = 2.4048c/a
TE TM
Por consequência, se uma onda tiver frequência no intervalo ω11 < ω < ω01
então apenas é excitado o modo (TE)11 . Um guia de ondas que opere nestas
condições é um guia de ondas monomodo.
Fibras ópticas
A questão anterior tem particular relevância nas fibras ópticas de alto débito,
∼ ∼
estendidas sobre longas distâncias (> 100 Gb/s; > 100 km), porque modos
de propagação diferentes têm velocidades diferentes.48 Esta diferença limita
a taxa de transferência de dados porque desconstroi a forma do sinal trans-
ferido (sobretudo após longas distâncias). Por isso as fibras ópticas usadas
atualmente em telecomunicações de média/longa distância são fibras ópticas
monomodo. Estas fibras são necessariamente muito finas49 ; pois o seu raio,
A velocidade de fase das ondas ao longo do guia é v = kωz , mas a velocidade a que
48
dω
um sinal efetivamente se propaga é a velocidade de grupo, u = dk z
. Vimos acima que
(′)
ω2 ζmn
kz2 = c2 − κ2 , onde κ = a qé um número bem definido em cada modo. Por conseguinte, a
2 2
velocidade do sinal é u = c 1 − κωc2 , o que significa que modos diferentes têm geralmente
velocidade diferente - os modos de ordem mais elevada são geralmente mais lentos.Na
transmissão de um sinal é pois desejável que não haja múltiplos modos a propagar-se
porque, como cada um destes se propaga com velocidade diferente, do outro lado do guia
há uma sobreposição de sinais desencontrados que distorce e desconstroi o sinal original.
Os modos de propagação de um guia correspondem de algum modo às diferentes ondas
estacionárias que se podem formar nas direções perpendiculares à direção de propagação,
já que no plano transversal a onda não se pode propagar. Isso permite descrever semi-
quantitativamente um guia de ondas.
49
De facto, a internet rápida como hoje a conhecemos só se tornou realidade graças à
capacidade em produzir fibras monomodo. Esse reconhecimento valeu aos cientistas que
as desenvolveram o prémio nobel da fı́sica em 2009.
80 CAPÍTULO 3. ELECTRODINÂMICA
100
absorção por
impurezas de OH¯
Atenuação (dB/km)
10
1
dispersão de Rayleigh 1.55 µm
1.31 µm
0.1
absorção de
infravermelho
0.01
0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 1.6 1.8
comprimennto de onda (µm)
É melhor parar.
Fim.
p
50
O fator n21 − n22 vem das condições de fronteira na interface dielétrica entre a fibra e
a bainha que a envolve
p e relaciona-se com o ângulo crı́tico de reflexão total nessa superfı́cie,
pois sin θc = n11 n21 − n22 ; se θ < θc a luz sai pela parede e perde-se através dela; portanto
não se propaga.
51
Newport Photonics, Technical Note #21.
Capı́tulo 4
Comentário Final
Este texto foi escrito para suporte às aulas de Electromagnetismo dadas
na Universidade de Coimbra nos últimos anos para o curso de Engenharia
Eletrotécnica e Computadores.
Terminadas estas lições podemos agora olhar para trás e ver o longo
percurso andado. Ver como, partindo de equações empı́ricas decorrentes
da observação, se foi argumentando sucessivamente até se concluir que os
campos eléctrico e magnético estão acoplados, que a perturbação de um deles
perturba o outro e que essas perturbações se propagam na forma de ondas
electromagnéticas imateriais, mesmo no espaço vazio.
O objectivo foi explanar os conceitos, interligando-os e dando-lhes con-
texto, tendo sempre presente as aplicações e o cálculo de problemas. A
organização e a sequência dos assuntos tem de resto em conta a necessidade
de paralelamente se irem calculando problemas.
Mas pretendeu-se também mostrar para que é que servem e onde é que se
aplicam esses conceitos, para além do âmbito de aplicação estrito. Foi nessa
tentativa de rasgar horizontes que fomos discutindo na parte final algumas
aplicações relevantes, que nos levaram às portas de outras disciplinas mais es-
pecı́ficas. Deixámos por isso assuntos inacabados, que serão presumivelmente
objecto de estudo mais aprofundado nessas disciplinas, em particular as que
estudam ondas electromagnéticas e óptica, linhas de transmissão, teoria de
circuitos, teoria de antenas e telecomunicações, fibras ópticas, etc...
Por vezes parecerá a alguns que esta análise dos conceitos por detrás dos
fenómenos é desnecessária e que devemos privilegiar as aplicações e focarmo-
nos apenas nas práticas que se utilizam para resolver problemas concretos.
Essa ideia assenta muito nas capacidades de cálculo numérico atuais que
81
82 CAPÍTULO 4. COMENTÁRIO FINAL