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Os Fanqueiros Literários

Anti-intelectualismo: Uma abordagem machadiana – Resenha

Por: Israel Melo, Jeferson Martins e Luan Teixeira 1

ASSIS, Machado de. Os Fanqueiros Literários. Jornal O Espelho, Rio de Janeiro,


set/out 1859.

As ondas anti-intelectuais tomam conta do mundo moderno. Não é raro


indignar-nos com pressões contra a academia e com “experts de plantão” que
gozam de boa retórica, porém não demonstram honestidade intelectual. O trabalho
anti-acadêmico hoje é a “obra grossa” que Machado de Assis já denunciava no
século XIX.
Machado de Assis é um dos principais expoentes da literatura brasileira,
sendo o principal nome do realismo no país. Nasceu no Rio de Janeiro em 1839 e é
o fundador da cadeira nº23 da Academia Brasileira de Letras. Escreveu não tão
somente romances, mas também poesias, crônicas, críticas teatrais, contos, entre
outros textos.2
A crônica machadiana para o jornal “O Espelho” aborda a indignidade de
quem produz literatura pensando apenas no consumo da mesma (o lucro que se
pode obter), e não na sua qualidade. Machado de Assis, como um dos maiores
nomes da literatura brasileira, vê-se extremamente indignado e denomina tais
produções de “fancarias literárias” – estabelecendo uma comparação com os
negociantes de tecido da época. O autor associa o que chama de “obra grossa” com
a difusão do anti-intelectualismo, e é aqui que entra o objeto de estudo desta análise
crítica.
Embora seja possível estabelecer uma relação entre as “fancarias
literárias” denunciadas por Assis no século XIX com as diversas produções culturais
atuais que têm a simples intenção de “lacrar” com o objetivo de lucrar; em cerca de
duas páginas, o cronista demonstra-se à frente do seu tempo, ao criticar um
fenômeno que, com a difusão das mídias digitais, se encontra muito mais presente

1
Acadêmicos da 1ª fase do curso de Direito Noturno da Universidade do Extremo-Sul Catarinense
(UNESC) – 2019.
2

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE LETRAS. Machado de Assis – Biografia. Disponível em:


<http://www.academia.org.br/academicos/machado-de-assis/biografia>. Acesso em 10 abr. 2019.
atualmente. Tal fenômeno é facilmente observado não somente nas obras
anteriormente citadas, mas também conjuntura política, na qual se põe em cheque
conhecimentos obtidos pelo meio científico e estabelece-se um inestimável valor a
crenças desonestas imputadas ao senso comum. Segundo Ladeira (2019),
atualmente basta um mouse e um computador para que se refute teorias
corroboradas há séculos por importantes pensadores. 3
Assis, no texto de 1859, pede uma “inquisição literária” a tais
desonestidades intelectuais, o que se torna hoje cada vez mais impossível. O termo
utilizado pelo autor, na sua compreensão literária, pode parecer muito forte – e é,
mas precisa-se ter a consciência de que é necessário lutar pela valorização do
conhecimento desenvolvido pelas ciências e presente na academia. Se não houver
reação, cada vez mais será permitida a ascensão de quem não dá a mínima
importância à educação e ao modo como ela transforma as pessoas, parafraseando
o pedagogo brasileiro Paulo Freire.
A leitura da crônica “Os Fanqueiros Literários”, embora complexa, é
necessária para compreendermos como a literatura tem o poder de retratar com
maestria fenômenos sociais e como a compreensão da História é necessária em
tempos de negacionismo (NAPOLITANO, 2019)4. A “fancaria literária” do século XIX,
infelizmente, se mantém com muito mais força no século XXI, sendo possível
denominá-la “política” na medida em que grupos extremistas se apropriam de “obras
grossas” para se favorecerem e ascenderem ao poder.

3
LADEIRA, Francisco. A era do anti-intelectualismo. Jornal Observatório da Imprensa, ed. 1020,
jan. 2019. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/dilemas-contemporaneos/a-era-do-
anti-intelectualismo/>. Acesso em 10 abr. 2019.
4

NAPOLITANO, Marcos. Governo Bolsonaro prega “negacionismo histórico” sobre a ditadura. Jornal
El País, abr. 2019. Disponível em:
<https://brasil.elpais.com/brasil/2019/04/05/politica/1554419295_939718.html>. Acesso em 10 abr.
2019.

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