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Nutrição Clínica:

TGI e DCNT

Prof.a Mariane Caroline Meurer

Indaial – 2021
1a Edição
Elaboração:
Prof. Mariane Caroline Meurer
a

Copyright © UNIASSELVI 2021

Revisão, Diagramação e Produção:


Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI

M598n

Meurer, Mariane Caroline

Nutrição clínica: TGI e DCNT. / Mariane Caroline Meurer. – Indaial:


UNIASSELVI, 2021.

186 p.; il.

ISBN 978-65-5663-360-2
ISBN Digital 978-65-5663-355-8

1. Nutrição. – Brasil. 2. Saúde - Aspectos nutricionais. – Brasil. II.


Centro Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 612.3
Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Olá, acadêmico, seja bem-vindo à disciplina de Nutrição Clínica! Este livro
didático tem como propósito auxiliá-lo no processo de aprendizagem da ciência da
Nutrição, que envolve diferentes conceitos e dinamismo acerca das doenças que
acometem o trato gastrointestinal.

Este livro didático servirá como guia, futuro nutricionista, saber como proceder
em um atendimento em consultório, clínica ou hospital, adquirindo os conhecimentos
necessários para diferenciar as doenças do trato gastrointestinal (TGI), obesidade,
doenças cardiovasculares, diabetes mellitus e síndrome metabólica, e compreender a
dietoterapia envolvida em cada uma delas.

O livro está dividido em três unidades, cada qual com objetivos, conteúdos, au-
toatividades, dicas, sugestões e recomendações. Como sabemos, o Trato gastrointesti-
nal (TGI) tem como função a absorção de água, eletrólitos e nutrientes e sofre desafios
intensos para evitar que agente patogênicos causem danos e desequilíbrios importan-
tes nos tecidos internos. Na Unidade 1, aprenderemos sobre a função do TGI, aprofun-
daremos nas principais doenças que acometem esse sistema e a dietoterapia adequada
para cada caso.

O excesso de peso e a obesidade são fatores de risco para diversas doenças


consideradas crônicas (DCNT). As DCNT são multifatoriais apresentando um desenvol-
vimento silencioso e com muitas recidivas que se não prevenidas ou tratadas podem
impactar de forma devastadora na vida do indivíduo e na saúde pública.

Por isso, o estilo de vida e um processo de intervenções se fazem necessários


nesses pacientes. Tendo em vista a importância da nutrição nesses casos, na segunda
e na terceira unidade, você aprofundará os conhecimentos referentes às doenças
cardiovasculares, como hipertensão e doença arterial coronariana, diabetes mellitus
tipo 1 e 2, a síndrome metabólica, bem como a dietoterapia envolvida em cada uma
dessas patologias.

Desejamos uma ótima leitura!

Prof.a Mariane Caroline Meurer


GIO
Olá, eu sou a Gio!

No livro didático, você encontrará blocos com informações


adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender
melhor o que são essas informações adicionais e por que você
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais
e outras fontes de conhecimento que complementam o
assunto estudado em questão.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos


os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina.
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada
também digital, em que você pode acompanhar os recursos
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que
também contribui para diminuir a extração de árvores para
produção de folhas de papel, por exemplo.

Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente,


apresentamos também este livro no formato digital. Portanto,
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com
versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Preparamos também um novo layout. Diante disso, você


verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos,
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.

QR CODE
Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e
dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR Codes
completamente gratuitos e que nunca expiram. O QR Code é um código que permite que você
acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar
essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só
aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos.
ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!

LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conheci-


mento, construímos, além do livro que está em
suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem,
por meio dela você terá contato com o vídeo
da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa-
res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de
auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que


preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


SUMÁRIO
UNIDADE 1 — NUTRIÇÃO CLÍNICA: TRATO GASTROINTESTINAL E DOENÇAS
CRÔNICAS NÃO TRANSMISSÍVEIS........................................................................................ 1

TÓPICO 1 — FUNÇÕES DO TRATO GASTROINTESTINAL E DOENÇAS DO


TRATO GASTROINTESTINAL SUPERIOR...............................................................................3
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................3
2 DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL SUPERIOR....................................................5
2.1 REFLUXO GASTROESOFÁGICO............................................................................................................ 5
2.1.1 Fisiopatologia do Refluxo Gastroesofágico............................................................................ 5
2.1.2 Dietoterapia no Refluxo Gastroesofágico.............................................................................. 9
2.2 GASTRITE................................................................................................................................................12
2.2.1 Fisiopatologia da Gastrite..........................................................................................................12
2.2.2 Dietoterapia na Gastrite........................................................................................................... 14
2.3 ÚLCERA GÁSTRICA..............................................................................................................................17
2.3.1 Fisiopatologia da Úlcera Gástrica............................................................................................17
2.3.2 Dietoterapia na Úlcera Gástrica............................................................................................. 19
2.4 PANCREATITE.......................................................................................................................................22
2.4.1 Fisiopatologia na Pancreatite..................................................................................................23
2.4.2 Dietoterapia na Pancreatite....................................................................................................25
2.5 CÁLCULO BILIAR................................................................................................................................. 27
2.5.1 Fisiopatologia do Cálculo Biliar...............................................................................................28
2.5.2 Dietoterapia no Cálculo Biliar..................................................................................................31
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................... 33
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 35

TÓPICO 2 — DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL INFERIOR...................................37


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................37
2 SÍNDROME DO INTESTINO IRRITÁVEL (SII).....................................................................37
2.1 FISIOPATOLOGIA DA SII....................................................................................................................... 37
2.2 DIETOTERAPIA NA SII.........................................................................................................................42
2.2.1 Fibras.............................................................................................................................................42
2.2.2 Glúten...........................................................................................................................................43
3 COLITE ULCERATIVA E DOENÇA DE CROHN................................................................... 44
3.1 FISIOPATOLOGIA DA COLITE ULCERATIVA.....................................................................................45
3.2 FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA DE CROHN.....................................................................................46
3.3 DIETOTERAPIA NAS DII......................................................................................................................46
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................. 50
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................... 52
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 53

REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 55

UNIDADE 2 — NUTRIÇÃO CLÍNICA: OBESIDADE E DOENÇAS CARDIOVASCULARES........ 67

TÓPICO 1 — OBESIDADE...................................................................................................... 69
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 69
2 FISIOPATOLOGIA DA OBESIDADE....................................................................................70
2.1 GENÉTICA................................................................................................................................................71
2.2 AMBIENTAL........................................................................................................................................... 74
2.3 HORMÔNIOS E NEUROTRANSMISSORES...................................................................................... 76
2.4 COMPORTAMENTO ALIMENTAR....................................................................................................... 77
3 DIETOTERAPIA NA OBESIDADE........................................................................................79
3.1 RESTRIÇÃO CALÓRICA........................................................................................................................ 79
3.2 CETOGÊNICA......................................................................................................................................... 81
3.3 LOW CARB.............................................................................................................................................82
3.4 VITAMINA D E OBESIDADE................................................................................................................82
3.5 MICROBIOTA INTESTINAL..................................................................................................................83
RESUMO DO TÓPICO 1..........................................................................................................87
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 89

TÓPICO 2 — DOENÇAS CARDIOVASCULARES 1.................................................................. 91


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 91
2 HIPERTENSÃO................................................................................................................... 91
2.1 FISIOPATOLOGIA NA HIPERTENSÃO................................................................................................93
2.2 DIETOTERAPIA NA HIPERTENSÃO..................................................................................................96
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................105
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................107

TÓPICO 3 — DOENÇAS CARDIOVASCULARES 2...............................................................109


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................109
2 FISIOPATOLOGIA NA DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA........................................... 110
3 DIETOTERAPIA NA DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA.............................................. 113
LEITURA COMPLEMENTAR.................................................................................................117
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................ 119
AUTOATIVIDADE................................................................................................................. 121

REFERÊNCIAS.....................................................................................................................123

UNIDADE 3 — TRATO GASTROINTESTINAL E DOENÇAS CRÔNICAS NÃO


TRANSMISSÍVEIS NA NUTRIÇÃO CLÍNICA....................................................................................127

TÓPICO 1 — DIABETES MELLITUS TIPO 1..........................................................................129


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................129
2 FISIOPATOLOGIA DA DIABETES MELLITUS TIPO 1....................................................... 131
3 DIETOTERAPIA NA DIABETES MELLITUS TIPO 1...........................................................139
3.1 CONTAGEM DE CARBOIDRATOS.....................................................................................................140
3.2 MICROBIOTA.........................................................................................................................................141
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................143
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................145

TÓPICO 2 — DIABETES MELLITUS TIPO 2.........................................................................149


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................149
2 FISIOPATOLOGIA NA DIABETES MELLITUS TIPO 2.......................................................149
2.1 TRATAMENTO FARMACOLÓGICO.................................................................................................... 152
3 DIETOTERAPIA NA DIABETES MELLITUS TIPO 2..........................................................156
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................162
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................164
TÓPICO 3 — SÍNDROME METABÓLICA............................................................................... 167
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 167
2 FISIOPATOLOGIA DA SÍNDROME METABÓLICA............................................................. 167
3 DIETOTERAPIA NA SÍNDROME METABÓLICA................................................................170
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................ 177
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................180
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................182

REFERÊNCIAS.....................................................................................................................184
UNIDADE 1 -

NUTRIÇÃO CLÍNICA: TRATO


GASTROINTESTINAL E
DOENÇAS CRÔNICAS NÃO
TRANSMISSÍVEIS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender as funções do trato gastrointestinal;

• reconhecer a fisiopatologia envolvendo as doenças do sistema digestório;

• conhecer a dietoterapia voltada para cada patologia do sistema digestório;

• desenvolver o olhar clínico para as patologias do sistema digestório.

PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – FUNÇÕES DO TRATO GASTROINTESTINAL E DOENÇAS DO TRATO


GASTROINTESTINAL SUPERIOR

TÓPICO 2 – DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL INFERIOR

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

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CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!

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2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
FUNÇÕES DO TRATO GASTROINTESTINAL
E DOENÇAS DO TRATO
GASTROINTESTINAL SUPERIOR

1 INTRODUÇÃO
O trato gastrointestinal (TGI) tem como principal função a absorção de água,
eletrólitos e nutrientes. Durante todo o tempo, o TGI sofre desafios intensos para evitar
que agentes patogênicos atinjam o lúmen gastrointestinal e acessem tecidos internos.
Por isso, as células epiteliais do TGI formam uma barreira seletivamente permeável,
rigidamente regulada e especializada (SHEN, 2009).

A parede do TGI começa no esôfago e termina no ânus, sofrendo alterações ao


longo das várias regiões. Essa parede é composta por quatro camadas (túnicas) com uma
rede de nervos interconectadas. As túnicas são chamadas de: túnica mucosa, túnica
submucosa, túnica muscular e túnica serosa ou adventícia, formando, assim, o tecido
epitelial (Figura 1) (SPENCE, 1991).

FIGURA 1 – ANATOMIA DO ESTÔMAGO

FONTE: <https://image.slidesharecdn.com/captulo02-alimentosesistemadigestrio-
120425085859-phpapp02/95/captulo-02-alimentos-e-sistema-digestrio-80-1024.
jpg?cb=1335344574>. Acesso em: 24 fev. 2021.
3
Esses tecidos epiteliais são essenciais para o funcionamento adequado de todo
o organismo, fazendo sua cobertura e proteção, formando glândulas que desempenham
funções específicas, realizam secreção e absorção de substâncias necessárias e
protegem contra agentes físicos, químicos e patogênicos (VASILEVA et al., 2017).

Como sabemos, o corpo humano é extensamente colonizado por bactérias,


fungos e vírus coletivamente, essa colonização é conhecida como microbiota comensal.
Esses micro-organismos são distribuídos ao longo da superfície do corpo, porém, o local
de maior variedade é o TGI, mais especificamente o intestino (QIN et al., 2010).

Via de regra o TGI é adaptado à colonização por bactérias comensais, pois


estas ajudam na digestão e influenciam no desenvolvimento do sistema imunológico
de mucosa. O problema é que a colonização bacteriana pode se tornar patogênica
dependendo da bactéria presente e do comprometimento das células epiteliais de
barreira ou imune (PETERSON; ARTIS, 2014) e isso pode acarretar doenças e distúrbios
do TGI (Quadro 1).

QUADRO 1 – ALGUMAS DOENÇAS QUE ACOMETEM O TGI

Trato Gastrointestinal superior Trato gastrointestinal inferior


• Refluxo gastroesofágico.
• Gastrite. • Síndrome do Intestino irritável.
• Úlcera. • Colite Ulcerativa.
• Pancreatite. • Doença de Crohn.
• Cálculo biliar.

FONTE: O autor

DICAS
Assista aos vídeos disponíveis nos links a seguir:

Digestive System, Part 1: https://www.youtube.com/watch?v=yIoTRGfcMqM


Digestive System, Part 2: https://www.youtube.com/watch?v=pqgcEIaXGME
Digestive System, Part 3: https://www.youtube.com/watch?v=jGme7BRkpuQ

4
2 DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL SUPERIOR
As doenças do trato gastrointestinal superior são aquelas que acometem o
estômago, pâncreas e anexos. Neste tópico, nós iremos focar apenas na doença do
refluxo gastresofágico, gastrite, úlcera, pancreatite e cálculo biliar.

Essas doenças apresentam fisiopatologias distintas, porém, com um deno-


minador em comum, a nutrição. Neste tópico, iremos aprender a fisiopatologia de
cada doença e a dietoterapia indicada para as doenças do TGI superior.

2.1 REFLUXO GASTROESOFÁGICO


O esôfago é um tubo oco de aproximadamente 25 centímetros em
comprimento que se estende da faringe até o estômago. A faringe é um tubo muscular
de aproximadamente 12 centímetros que serve como entrada para o esôfago e trato
respiratório. Basicamente, o esôfago é dividido em três partes: cervical, torácico e
abdominal. Sua função primária consiste em transportar o alimento ingerido da faringe
para o estômago (GAVAGHAN, 1999).

2.1.1 Fisiopatologia do Refluxo Gastroesofágico


A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) é um distúrbio comum em todo o
mundo, com uma prevalência estimada de 18,1 a 27,8% na América do Norte (CLARRETT;
HACHEM, 2018). Em 2006, estimou-se que no Brasil a prevalência estava em torno de 12%
(NASI; MORAES-FILHO; CECCONELLO, 2006).

Apesar de sua alta prevalência na população, muitos desses indivíduos não


procuram atendimento médico em decorrência de suas características intermitentes
e o fácil acesso à medicação não prescrita (ABRAHÃO JUNIOR, 2014). Entre os fatores
de risco para o desenvolvimento da DRGE, incluem a idade avançada, índice de massa
corpora (IMC) alto, tabagismo, ansiedade e/ou depressão e sedentarismo. Os hábitos
alimentares inadequados também podem contribuir para a DRGE, incluindo a acidez
dos alimentos, tamanho e horário das refeições (ZHENG et al., 2007; JAROSZ; TARAS-
ZEWSKA, 2014).

Sua fisiopatologia é multifatorial. Entre os mecanismos envolvidos estão o


relaxamento prejudicado e transitório do tônus de repouso do esfíncter esofágico,
retardo do esvaziamento gástrico, peristalse disfuncional, depuração inadequada do
ácido esofágico, salivação reduzida, resistência da mucosa prejudicada e aumento da
pressão intra-abdominal. O relaxamento do esfíncter esofágico expõe o esôfago ao
ácido gástrico e outros conteúdos estomacais, como a pepsina, bile, fluido do intestino
delgado e secreções pancreáticas, todos esses são prejudiciais à mucosa esofágica
(KELLERMAN; KINTANAR, 2017).

5
Essa exposição repetida do esôfago ao suco gástrico provoca alterações
na integridade da mucosa e na composição celular, levando ao desenvolvimento de
inflamação, tecido cicatricial e alterações na sensibilidade visceral. As complicações
decorrentes incluem os sintomas esofágicos e extraesofágicos, desenvolvimento de
estenose, dismotilidade e/ou carcinogênese (SPECHLER, 2003; GIORGIO et al., 2006)

As manifestações clínicas típicas são pirose e regurgitação, as manifestações


atípicas são dor torácica, tosse e manifestações otorrinolaringológicas (pigarro,
rouquidão, laringite e asma) (Figura 2). Endoscopicamente, a classificação da DRGE
pode ser: não erosiva, erosiva e complicada, quando ocorre ulcerações, estenose ou
metaplasia intestinal (ABRAHÃO JUNIOR, 2014).

FIGURA 2 – MANIFESTAÇÕES DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO

Legenda: DTOI – Dor Torácica de Origem Indeterminada. ORL – Otorrinolaringológicas.

FONTE: Abrahão Junior (2014, p. 32)

O rastreamento dos pacientes quanto aos “sintomas de alarme” associados à


DRGE é importante, pois podem ser indicativos de necessidade de avaliação endoscópi-
ca. Esses sintomas podem sugerir malignidade subjacente, quando a endoscopia pode
ser recomendada, além disso, o exame torna-se importante para triagem de pacientes
com alto risco de complicações (esôfago de Barrett, sintomas crônicos e frequentes,
idade > 50 anos, caucasianos e com obesidade central). Dentre os “sintomas de alarme”

6
estão a disfagia (dificuldade para engolir), odinofagia (dor para engolir), anemia, sangra-
mentos e perda de peso, que podem indicar a presença de complicações como este-
noses, ulcerações, malignidade (KATZ; GERSON; VELA, 2013). Você deve se perguntar:
como o diagnóstico é feito?

O diagnóstico da DRGE é realizado através de anamnese detalhada, que pode


ser complementada com exames de imagens específicos como endoscopia, radiológico
contrastado do esôfago, cintilografia, manometria, pHmetria de 24 horas e teste
terapêutico (FBG, 2003).

O método de escolha para o diagnóstico das lesões causadas pelo refluxo


gastroesofágico é o exame endoscópico, o qual apresenta uma sensibilidade de cerca
de 60% e possui uma facilidade de execução e disponibilidade na maioria dos centros
médicos. Através dele é possível avaliar a gravidade da esofagite e realizar biópsias
quando necessário, como nos casos de complicações (estenose péptica, úlceras e
esôfago de Barrett) (FBG, 2003).

Através dessa avaliação ocorre uma classificação dos graus ou intensidade


da esofagite. Porém, existem várias classificações e divergências nas interpretações
quanto ao real significado dos achados como eritema, friabilidade e edema da mucosa
esofágica, haja vista a baixa correlação entre esses achados endoscópicos e o exame
histológico. As classificações usualmente empregas são a de Savary-Miller e a Los
Angeles (FBG, 2003). Veja, nos Quadros 2 e 3, o descritivo de cada uma delas.

QUADRO 2 – CLASSIFICAÇÃO ENDOSCÓPICA DE SAVARY-MILLER

FONTE: FBG (2003, p. 5)

7
QUADRO 3 – CLASSIFICAÇÃO ENDOSCÓPICA DE LOS ANGELES

FONTE: FBG (2003, p. 5)

O tratamento da DRGE tem como objetivo o alívio dos sintomas, a cura das
lesões da mucosa (quando presentes), e a prevenção de recorrências e complicações.
Esse tratamento pode ser considerado clínico, cirúrgico ou endoscópico, para ser
mais prático, a literatura sugere a divisão da abordagem terapêutica em medidas
comportamentais e farmacológicas, e que fique claro ao paciente de que ele possui
uma doença crônica (MORAES-FILHO et al., 2010).

Várias classes de medicamentos podem ser utilizadas no tratamento da DRGE.


As drogas de primeira escolha são os inibidores da bomba de prótons (IBP), que inibem
a produção de ácido pelas células parietais do estômago, reduzindo assim a agressão ao
esôfago. Os IBPs em dose plena são o tratamento de escolha inicial por um período de
quatro a oito semanas, porém, se o paciente não apresentar melhora dos sintomas a dose
é dobrada, sendo administrada antes do café da manhã e antes do jantar (HENRY, 2010).

O tratamento cirúrgico é indicado para aqueles indivíduos que necessitam


usar medicação ininterruptamente, intolerantes ao tratamento clínico prologado e nas
formas de complicações da doença. Além disso, estudos sugerem que o tratamento
cirúrgico deve ser indicado para as mulheres menopausadas e com osteoporose, visto
que há uma possível interferência do uso do IBP na absorção de cálcio (HENRY, 2010).

ATENÇÃO
Os sintomas da DRGE não devem ser confundidos com os da dispepsia. A
dispepsia é um desconforto epigástrico, sem azia ou regurgitação ácida e que
possui duração superior a um mês, podendo estar associada a uma distensão
abdominal ou plenitude gástrica, arrotos, náuseas e vômitos. A dispepsia é
um distúrbio que pode ser tratado de forma diferente da DRGE e que pode
também contar com a avaliação endoscópica, bem como teste para a H. pylori
(DENT, 2004).

8
2.1.2 Dietoterapia no Refluxo Gastroesofágico
Diante do exposto, como deve ser conduzida a dietoterapia para o paciente
com DRGE?

Como já citado anteriormente, há vários fatores de risco para o desenvolvimento


da DRGE, os quais incluem idade, massa corporal excessiva, estilo de vida como
tabagismo e inatividade física e a dieta, porém, o papel da dieta como fator de risco
para a DRGE ainda não foi bem esclarecido e os resultados são contraditórios (JAROSZ;
TARASZEWSKA, 2014).

Estudos levantam a hipótese de que certos hábitos alimentares, como comer


rápido grandes volumes ou comer antes de dormir podem contribuir para o aparecimento
dos sintomas da doença, porém, nenhum deles conseguiu confirmar a influência desses
hábitos na ocorrência ou agravamento dos sintomas.

Jarosz e Taraszewska (2014) afirmam que não houve influência da regularidade


e da velocidade das refeições ou entre as refeições na ocorrência dos sintomas de
DRGE. Porém, os autores citam uma associação entre o baixo número de refeições (uma
a duas refeições por dia) e os sintomas. Sabe-se que restringir o número de refeições ao
longo do dia torna maior o volume das refeições mínimas realizadas, e isso pode piorar
os sintomas da DRGE. Os autores levantam a hipótese de que a teoria da biomecânica
esteja envolvida, a qual diz que o alongamento excessivo (por muitos anos) das paredes
do estômago, devido ao volume da refeição e o acúmulo de ar no fundo do estômago
durante a refeição, leva ao enfraquecimento dos mecanismos que regulam o esfíncter
esofágico inferior.

A literatura costuma listar alguns produtos como refluxogênicos, são eles:


alimentos gordurosos, picantes ou azedos, frutas cítricas e sucos, alho, tomate e suco
de tomate, chocolate, café, bebidas e produtos contendo hortelã-pimenta, bebidas
carbonatadas e álcool.

Vários mecanismos são pressupostos envolvendo o consumo desses alimentos


e o agravamento dos sintomas da DRGE, como a diminuição da tensão do esfíncter
esofágico inferior, retardo do esvaziamento gástrico, estímulo dos receptores sensoriais
no esôfago e o aumento da secreção de ácido clorídrico (PEHL et al., 1999; RODRIGUEZ-
STANLEY et al., 2000; MYKLEBUST et al., 2003; HAMPEL; ABRAHAM; EL-SERAG, 2005).

Como vimos, estudos anteriores se concentraram em analisar os tipos de ali-


mentos e bebidas em termos de sua fisiopatologia nos sintomas da DRGE. Recente-
mente, tem sido colocado que padrões dietéticos, incluindo a composição de macro-
nutrientes e comportamento alimentar estão envolvidos, e que podem fazer parte de
uma abordagem mais prática para os pacientes (NEWBERRY; LYNCH, 2019). Confira no
Quadro 4 a pressuposição de relação entre DRGE e a dieta.

9
QUADRO 4 – RELAÇÃO DRGE E DIETA

Alvo dietético Mecanismo proposto dos sintomas da DRGE


Alimentos específicos e bebidas
Alimentos e bebidas ácidas Irritação direta da mucosa esofágica
Aumento da distensão gástrica/ relaxamentos
Carbonatação
transitórios do esfíncter esofágico inferior.
Café Redução do tônus do esfíncter esofágico inferior.
Redução do tônus do esfíncter esofágico inferior/
Álcool
Motilidade gástrica.
Chocolate Redução do tônus do esfíncter esofágico inferior.
Menta Redução do tônus do esfíncter esofágico inferior.
Alimentos picantes Irritação direta da mucosa esofágica
Macronutrientes
Redução do tônus do esfíncter esofágico inferior/
Gorduras
Motilidade gástrica.
Carboidratos Redução do tônus do esfíncter esofágico inferior.
Comportamento alimentar
Comer tarde da noite Aumento da produção de ácido clorídrico
Aumento da distensão gástrica/ relaxamentos
Refeição volumosa
transitórios do esfíncter esofágico inferior.
Aumento da distensão gástrica/ relaxamentos
Refeição com densidade calórica
transitórios do esfíncter esofágico inferior.

FONTE: Adaptado de Newberry e Lynch (2019)

Na clínica é comumente recomendado que se evitem tipos específicos de


bebidas para o tratamento da DRGE, porém, a maioria dessas recomendações é baseada
em evidências limitadas. Bebidas ácidas, por exemplo, são cotadas por piorar a DRGE
e demonstrou-se que os fluidos fisiologicamente ácidos reduzem o pH do conteúdo
estomacal refluído e aumentam o tempo de depuração esofágica, contudo, na prática,
a correlação dos sintomas com a ingestão de bebidas ácidas não é clara (GOMES;
DANTAS, 2014).

Além disso, costuma-se orientar os pacientes a evitar alimentos e temperos pi-


cantes, porém, assim como nas bebidas, essas recomendações são baseadas em dados
limitados e precisam ser personalizadas para cada indivíduo. Outro exemplo é a utili-
zação da hortelã, uma pequena parcela dos pacientes relata gatilho do DRGE ao con-
sumi-la. Em contrapartida, alimentos condimentados podem agir como irritante direto
da mucosa esofágica, indicando que paciente sensíveis a esses temperos podem obter
benefícios ao evitá-los (NEWBERRY; LYNCH, 2019).

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Existem, também, hipóteses de que dietas ricas em gorduras, que incluem
alimentos fritos ou gordurosos, podem piorar os sintomas da DRGE. A gordura é
caloricamente densa e a digestão frequentemente requer a secreção de irritantes
esofágicos potenciais (sais biliares, por exemplo) e mediadores neuro-hormonais do
tônus do esfíncter esofágico inferior (ou seja, colecistoquinina). Porém, as pesquisas
que relacionam o tipo de gordura e os sintomas da DRGE precisam avançar (NEWBERRY;
LYNCH, 2019).

Além das gorduras, outro macronutriente que tem sido explorado e que tem
demonstrado resultados mais conclusivos é o carboidrato. Estudos tem relacionado a
ingestão de amido e açúcar simples a DRGE.

A ingestão de dissacarídeos e amido levam a uma fermentação pelas bactérias


do cólon, e esse processo de fermentação mostrou induzir a liberação neuro-hormonal
e relaxamento do esfíncter esofágico inferior, levando ao sintoma de azia, comum
em pacientes com DRGE, porém, o inverso foi encontrado com o consumo de fibras
(NEWBERRY; LYNCH, 2019).

Morozov, Isakov e Konovalova (2018) analisou 36 pacientes que apresentavam


DRGE não erosiva que consumiam < 20 g/dia de fibra alimentar. Esses pacientes
foram suplementados com Psyllium, 5 g três vezes ao dia (que apresenta 12,5 g de
fibras solúveis), diluído em 150 ml de água. Os autores concluíram que a modificação
da dieta com adição de 12,5 g de fibra solúvel ao dia levou à diminuição da frequência
dos sintomas de DRGE, aumento da pressão de repouso do esfíncter esofágico inferior
e diminuição do número de refluxos gastroesofágicos. Esses achados são promissores
e sugerem que as intervenções nutricionais podem ser eficazes no manejo da DRGE.

Planos alimentares que reduzem os gatilhos comuns da DRGE, como a redução


da ingestão de açúcares e gorduras saturadas e aumento da ingestão de fibras podem
ser efetivas para pacientes que procuram um planejamento alimentar abrangente
(NEWBERRY; LYNCH, 2019). Estudos já sugerem a adesão a uma dieta do tipo
mediterrânea composta por alta ingestão de frutas, vegetais, grãos inteiros e gorduras
insaturadas, a qual tem demonstrado menor incidência dos sintomas relacionados a
DRGE (MONE et al., 2016).

Quando analisamos a literatura, percebemos uma heterogeneidade no que se diz


respeito à intervenção dietética na DRGE, porém, temas comuns são abordados. Deve-
se ter em mente que o principal é a individualização da dieta com base nos sintomas, e
a reintrodução de alimentos e hábitos deve ser realizada se houver controle ineficaz dos
sintomas. Outro ponto importante, o tamanho da refeição, horários e composição dos
macronutrientes parecem ser mais eficazes do que a eliminação do alimento, com foco
na redução do volume da refeição, conteúdo de carboidratos (principalmente açúcar
simples) e o horário de alimentação, tendo atenção aos padrões alimentares noturnos.
Além disso, o estilo de vida deve ser modificado com a cessação do fumo, perda de peso
e elevação da cabeceira da cama (NEWBERRY; LYNCH, 2019).

11
Um ponto importante a ser considerado em pacientes com DRGE é a utilização
por tempo prolongado da classe de medicamentos inibidores da bomba de prótons.
Apesar dos dados da literatura serem heterogêneos, já se sabe que o uso prologado
dessa classe medicamentosa pode gerar deficiência de vitamina B12, hipomagnesemia,
deficiência de ferro, demência, entre outros (HAASTRUP et al., 2018).

INTERESSANTE
Paciente, 27 anos, sexo masculino, sobrepeso (IMC de 29,9Kg/m2), engenheiro,
diagnosticado com DRGE Los Angeles grau A, H. pylori negativo, relata sentir dores e
regurgitação ao consumir iogurtes e pão. O médico gastroenterologista prescreveu
Dexilant uma vez ao dia, após o almoço por três meses. Qual conduta nutricional poderia
ser sugerida para esse paciente?

• Como vimos, a dietoterapia deve ser individualizada, se o paciente relata desconforto no


consumo de iogurtes e pão, estes devem ser excluídos da alimentação e reintroduzidos
aos poucos quando os sintomas estiverem mais controlados.
• A perda de peso deve ser incentivada, portanto, o déficit calórico deve ser realizado.
• Paciente fará uso de IBP por tempo prolongado, por isso deve-se ter atenção ao
consumo de fontes de vitamina B12, cálcio, magnésio e ferro. Se apresentar
sinais e sintomas característicos de deficiência nutricional, exames de sangue
podem ser solicitados para confirmação e início de suplementação deve ser
realizado com doses adequadas.
• Orientações gerais com relação a hábitos de vida saudáveis e elevação da
cabeceira da cama devem ser realizadas.

2.2 GASTRITE
Como vimos, o TGI é responsável pela digestão e absorção. Sempre que
comemos algo, o alimento passa pelo esôfago e chega até o estômago, onde sofre ação
do suco gástrico (ácido clorídrico e pepsina), que deve ser ácido para facilitar a absorção
de vitaminas e minerais e proteger de bactérias patogênicas. Fatores que modifiquem
esse ácido diminuem a qualidade da digestão e predispõem o indivíduo a sintomas
como queimações, azia, gases e refluxo.

2.2.1 Fisiopatologia da Gastrite


A mucosa do estômago, além de revesti-lo, protege as células contra o ácido,
porém, quando a mucosa se encontra inflamada, o estômago reduz a produção de
ácido, enzimas e muco protetor. A gastrite nada mais é do que a inflamação da mucosa
do estômago, que se desenvolve como uma resposta do organismo a uma agressão à
sua integridade, desencadeando sintomas característicos e processos diferentes nos
quais é possível classificá-la em aguda ou crônica (CCD, 2018).

12
A classificação de gastrite aguda ou crônica concentra-se no curso do
tempo, características histológicas, distribuição anatômica e mecanismos patológicos
subjacentes. A Helicobacter pylori é a causa mais comum de gastrite em todo o mundo,
porém, indivíduos H. pylori negativos com dispepsia funcional ou DRGE não erosivo
também podem apresentar gastrite (AZER; AKHONDI, 2020).

Outra causa é a gastrite autoimune associada a anticorpo antiparietal e antifator


intrínseco sérico. É caracterizada por gastrite atrófica crônica limitada ao corpo e fundo
do estômago que causa atrofia difusa acentuada das células parietais e principais
(AZER; AKHONDI, 2020).

A gastrite autoimune é crônica, em que as células T CD4+ têm como alvo as


células parietais, levando à perda das células parietais e das células principais com
eventual atrofia da mucosa. Essa perda das células parietais promove uma acloridria
constante, fazendo com que as células G antrais produzam continuamente gastrina.

Sem essas células parietais o ciclo de feedback fica comprometido e o resultado


é um estado de hipergastrinemia. Além disso, a perda completa de células parietais
leva à falta de produção de fator intrínseco que, se grave, pode resultar em anemia
perniciosa. Essa hipergastrinemia leva à hiperplasia das células tipo enterocromafina.

O ácido clorídrico é necessário para a absorção de ferro inorgânico, e pacientes


que apresentam gastrite autoimune podem apresentar deficiência de ferro (HALL;
APPELMAN, 2019).

Além disso, a gastrite também pode ser dividia em erosiva e não erosiva. A
gastrite do tipo erosiva é mais grave e consiste na inflamação e corrosão do revestimento
gástrico, desenvolve-se subitamente (gastrite erosiva aguda) ou lentamente (gastrite
erosiva crônica) normalmente em pessoas saudáveis. Já a gastrite não erosiva é
caracterizada por alterações no revestimento gástrico que variam de desgaste (atrofia)
até transformação do tecido gástrico em outro tipo de tecido intestinal (metaplasia)
(VAKIL, 2020).

DICAS
Para entender melhor o sistema digestório sugere-se a leitura:

• RODRIGUES, S. S.; FONSECA, C. C.; NEVES, M. T. D. Células endócrinas do


sistema gastroenteropancreático: conceitos, distribuição, secreções, ação e
controle. Arq. Ciên. Vet. Zool. UNIPAR, Umuarama, v. 8, n. 2, p. 171-180,
2005. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/235581967.pdf.
• HUNT, R. H. et al. The stomach in health and disease. Gut, [S. l.], v. 64, n.
10, p. 1650-1668, 4 set. 2015. Disponível em: https://www.researchgate.net/
publication/281510130_The_stomach_in_health_and_disease.

13
As manifestações clínicas não são típicas na gastrite. Ocorre um início súbito
de dor epigástrica, náuseas e vômitos, porém, muitas pessoas são assintomáticas ou
desenvolvem sintomas dispépticos mínimos.

Histórico de tabagismo, consumo de álcool, ingestão de anti-inflamatórios não


esteroidais (AINES) ou esteroides, alergias, radioterapia ou distúrbios da vesícula biliar
devem ser considerados na anamnese de um paciente com suspeita de gastrite, além
disso, história de tratamento para doença inflamatória intestinal, distúrbios vasculíticos
ou distúrbios gastrointestinais eosinofílicos pode exigir exploração se nenhuma causa
de gastrite for aparente (AZER; AKHONDI, 2020).

Como é feito o diagnóstico da gastrite?

Com relação ao diagnóstico, as investigações laboratoriais, gastroscopia, exame


histológico e microbiológico das biópsias são essenciais para o diagnóstico da gastrite
e suas causas. Quando a gastrite está associada ao H. pylori, o tratamento promove
um rápido desaparecimento da infiltração polimorfonuclear e na redução do infiltrado
inflamatório crônico com a normalização da mucosa (AZER; AKHONDI, 2020).

2.2.2 Dietoterapia na Gastrite


Basicamente, o tratamento será guiado conforme a tolerância do paciente e
conforme os sintomas apresentados. Os achados mais comuns para a gastrite crônica
e autoimune são os distúrbios hematológicos como a anemia (deficiência de ferro), sin-
tomas neurológicos associados à deficiência de vitamina B12 (HERSHKO; IANCULOVICH;
SOUROUJON, 2007; NEUMANN et al., 2013). Deve-se verificar se o paciente faz uso de
medicamentos inibidores da bomba de prótons (IBPs) (omeprazol e similares), se sim, é
necessária uma avaliação do estado nutricional através de exames bioquímicos.

Os IBPs suprimem a secreção de ácido gástrico por meio da inibição da enzima


H+/K+-ATPase na superfície secretora das células parietais. Por serem inibidores
irreversíveis desta enzima, seu uso crônico é preocupante, pois essa redução da acidez
gástrica pode promover complicações na absorção de nutrientes como é o caso do ferro,
vitamina B12 e cálcio (LIMA; NETO FILHO, 2014), o que pode levar a inúmeras disfunções.

Para a absorção de vitamina B12 é necessário o Fator Intrínseco (FI), um produto


secretado pelas células parietais do estômago no íleo terminal após ser extraído pelo
ácido gástrico (Figura 3). A B12 atua na função neurológica, produção de glóbulos
vermelhos e síntese de DNA, é cofator para reações de conversão de ácido metilmalônico
em succinil coenzima A; a conversão de homocisteína em metionina; e a conversão de
5-metiltetrahidrofolato em tetrahidrofolato (LANGAN; GOODBRED, 2017), portanto, sua
deficiência gera prejuízos importantes à saúde.

14
FIGURA 3 – ABSORÇÃO E TRANSPORTE DE VITAMINA B12

FONTE: Adaptada de Langan e Goodbred (2017)

Com relação ao uso de IBP e o cálcio, as evidências epidemiológicas sugerem


uma associação entre o uso crônico de IBP e o risco de fraturas osteoporóticas, porém,
os mecanismos ainda não estão elucidados, sendo necessárias mais pesquisas. Não se
deve desencorajar o uso dessa classe de medicamentos em pacientes com indicações
apropriadas, sendo que o princípio geral dessa terapia é a menor dose possível
necessária para se atingir os objetivos terapêuticos, além disso o uso de suplementação
de cálcio pode ser uma boa estratégia associada ao uso de IBPs (YANG, 2008).

Com relação às plantas medicinais, alguns estudos apresentam a Maytenus


ilicifolia como um potente agente antiúlcera e gastrite. O mecanismo ainda é desconhecido,
mas pode estar relacionado a sua interferência na liberação e efetividade das substâncias
secretagogas ácido-base. Promove uma potente redução da hipersecreção gástrica
acompanhada por redução na liberação de óxido nítrico, sugerindo um importante papel
do mecanismo óxido nítrico dependente, pois há a hipótese de que a inativação da bomba

15
H+/K+-ATPase e a modulação óxido nítrico dependente são os principais mecanismos
de ação gastroprotetora. Estudos mostram que o triterpenos ativos da M. ilicifolia são
capazes de estimular a produção de fatores de proteção como muco, ou de manter os
níveis ótimos de prostaglandinas gástricas na mucosa (ANVISA, 2016).

IMPORTANTE
Segundo a Resolução CFN n° 556, de 11 de abril de 2015:

Art. 2° O art. 3° da Resolução CFN n° 525, de 25 de junho de


2013, publicada no Diário Oficial da União, Seção 1, Edição
de 28 de junho de 2013, página 141, passa a vigorar com as
seguintes alterações:
Art. 3° O exercício das competências do nutricionista para
a prática da Fitoterapia como complemento da prescrição
dietética deverá observar que:
I- a prescrição de plantas medicinais e chás medicinais é
permitida a todos os nutricionistas, ainda que sem título
de especialista;
II- a prescrição de medicamentos fitoterápicos, de produtos
tradicionais fitoterápicos e de preparações magistrais de
fitoterápicos, como complemento de prescrição dietética,
é permitida ao nutricionista desde que seja portador do
título de especialista em Fitoterapia, observado o disposto
no § 4° deste artigo.
§ 4° Para a outorga do título de especialista em Fitoterapia, a
Associação Brasileira de Nutrição (ASBRAN), atendido o dispos-
to no § 1° deste artigo, adotará regulamentação própria, a ser
amplamente divulgada aos interessados, prevendo os critérios
que serão utilizados para essa titulação (CFN, 2015, p. 1).

O QUE É GASTRITE NERVOSA?

Que as doenças que acometem o estômago provocam desconfortos e


incômodos já sabemos. Dores estomacais, queimação, acidez e refluxo são alguns
dos sintomas relacionados a gastrite. Porém, a dúvida é: o que fazer em casos em
que os fatores estresse e ansiedade desencadeiam os sintomas sem que de fato
haja uma inflamação presente?

O termo “gastrite nervosa” é bem comum e usado pela população, porém,


não é correto. Como vimos, a gastrite trata-se de um processo inflamatório, por
isso, quando o indivíduo apresenta uma inflamação no estômago emprega-se o
termo gastrite. Essa patologia pode ocorrer por diversos motivos, como infecções
bacterianas, medicamentos ou álcool.

16
O problema está na confusão que as pessoas fazem com as manifestações
decorrentes de outras situações que também afetam o funcionamento do trato
gastrointestinal como o estresse, e acabam chamando de gastrite nervosa, porém,
se não há inflamação presente, não é gastrite.

Várias são as causas possíveis para doenças que acometem o estômago


e muitas delas podem ser provocadas por problemas emocionais. Muitas vezes,
indivíduos submetidos a situações estressantes, seja na vida pessoal ou profissional,
acabam manifestando esses sintomas.

Um ponto importante a ser considerado é que mesmo que haja a manifestação


dos sintomas e não se apresente uma gastrite real (por falta de inflamação), o cuidado
com a alimentação é fundamental, afinal ela é o combustível que faz a magnífica
máquina humana funcionar perfeitamente.

Indivíduos que apresentam essas alterações gástricas (sem inflamação


presente) e que promovem uma mudança na alimentação, relatam benefícios.
Essas mudanças são: diminuição do consumo de refrigerantes, frituras, comidas
gordurosas com molhos, café e chocolate. Apesar da gastrite nervosa não se tratar
de uma inflamação no estômago, alguns tratamentos podem melhorar o quadro.
Precisa ser identificado a causa do problema, seja ela alimentar ou psicológica e a
intervenção adequada deve ser realizada.

FONTE: <http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/53566-o-que-e-a-
gastrite-nervosa>. Acesso em: 23 fev. 2021.

2.3 ÚLCERA GÁSTRICA


As úlceras pépticas (UP) têm como características lesões ulcerosas na
mucosa gastroduodenal gerando dor epigástrica e causando até sangramentos
gastrointestinais. Essa doença pode acometer o esôfago inferior, duodeno superior e
porção inferior do estômago (DUNLAP; PATTERSON, 2019).

2.3.1 Fisiopatologia da Úlcera Gástrica


A UP ocorre em áreas expostas ao ácido e pepsina, sendo designada como uma
ruptura na mucosa que reveste o estômago e se estende através da mucosa muscular.
A UP clássica é definida como uma recorrência crônica, indicando uma cicatrização
defeituosa da ferida. Os sintomas são periódicos, de forma aguda diminuem a intensidade
e se repetem de tempos em tempos (SHIOTANI; GRAHAM, 2002; GRAHAM, 2014). Sua
incidência é aumentada com a idade, ocorrendo, na maioria das vezes, em indivíduos
com idade entre 25 e 64 anos. O tratamento, a avaliação correta e a detecção precoce
previnem complicações relacionadas (DUNLAP; PATTERSON, 2019).

17
A mucosa de pacientes com UP é desequilibrada por infecções, ruptura
de barreira ou hipersecreção de ácido gástrico. Os fatores de riscos associados ao
desenvolvimento da UP incluem infecção por H. pylori, consumo de álcool, tabagismo,
uso prolongado de anti-inflamatórios não esteroidais (AINES), jejum persistente,
síndrome de Zollinger-Ellison, tratamento de câncer com inibidores da angiogênese e
cirurgia bariátrica (KEMPENICH; SIRINEK, 2018).

Além da dor, outros sinais e sintomas podem ser característicos da UP


dependendo da localização da ferida e da idade do paciente. Os sinais e sintomas
incluem: dor abdominal epigástrica, inchaço, plenitude abdominal, náusea e vômito,
perda/ganho de peso, hematêmese, melena.

Alguns sinais e sintomas que podem sugerir agravamento da UP são: perda


de peso, disfagia progressiva, anemia significativa e êmese recorrente (MALIK;
GNANAPANDITHAN; SINGH, 2020).

Algumas complicações que também podem surgir incluem sangramento,


perfuração, penetração e obstrução da saída gástrica, sendo que as úlceras grandes
(>1 cm) localizadas no canal pilórico estão associadas a complicações (LAU et al., 2011;
KAVITT et al., 2019).

A mucosa gástrica exibe especificidades na estrutura e função, e possui


mecanismos específicos de controle para garantir a homeostase e integridade (NIV;
BANIC, 2014). As linhas de defesa envolvidas na proteção da mucosa gástrica são:
a camada de muco, o epitélio da superfície de mucosa e toda a sua rede vascular
(YANDRAPU; SAROSIEK, 2015).

Agressões são constantemente neutralizadas por mecanismos de controle


interligados para manter a integridade da barreira, são eles: o controle do fluxo sanguíneo
da mucosa, a secreção de muco e bicarbonato, a renovação constante das células e o
controle neuronal e hormonal dos mecanismos de defesa (NIV; BANIC, 2014).

Dentre os fatores agressores podemos citar a secreção de ácido gástrico, a qual


tem como função matar micro-organismos (como a H. pylori, por exemplo), auxiliar na
digestão de proteínas, facilitar a absorção de nutrientes como ferro não heme, cálcio e
vitamina B12. Quando ocorre um desequilíbrio nessa regulação, ocorrendo um aumento
considerável de ácido e pepsina, ocorrem as úlceras (SCHUBERT, 2017).

Outro fator agressor é o consumo de anti-inflamatórios não esteroidais (AINES),


os quais tem como função a inibição das COX (COX-1 e COX-2).

A inibição da COX tem impactos na microcirculação do TGI, pois quando ocorre


uma lesão, essas moléculas aumentam o fluxo sanguíneo e a inibição da COX reduz
esse fluxo sanguíneo compensatório, além disso induzem a expressão de moléculas

18
de adesão de neutrófilos no endotélio prejudicando mecanicamente o fluxo sanguíneo
vascular. Por isso, a inibição da COX é um fator muito importante envolvido nos danos do
TGI induzidos por AINEs (FIORUCCI; DISTRUTTI, 2011; BJARNASON et al., 2018; GARCÍA-
RAYADO; NAVARRO; LANAS, 2018).

Além disso, a infecção por H. pylori pode causar uma inflamação aguda, crônica
e mista, estimulando as células de defesa.

A infecção por H. pylori é conhecida como um fator de risco para carcinoma


gástrico, porém, a maioria dos indivíduos não apresentam sintomas, e com a evolução
da infecção isso pode acarretar em UP e gastrite (IENI et al., 2016; DIACONU et al., 2017).

Para o tratamento da UP se faz necessário o uso de medicações. Os antagonistas


seletivos dos receptores de histamina do tipo 2 (H2-RAs) são utilizados no tratamento
de úlceras duodenais e gástricas, refluxo gastroesofágico e azia comum e são bem
tolerados, porém, têm sido associados a lesões hepáticas aparentes (LIVERTOX, 2018).

Os inibidores da bomba de prótons (IBP) são mais potentes na supressão


da secreção de ácido gástrico e amplamente utilizados no tratamento de patologias
gástricas, como o refluxo gastroesofágico e a úlcera péptica (LIVERTOX, 2019).

2.3.2 Dietoterapia na Úlcera Gástrica


A dietoterapia na úlcera péptica é para prevenir a hipersecreção de ácido
gástrico com o objetivo de reduzir a ferida e a dor na mucosa gástrica ou duodenal.
Além disso, o foco se dá na cicatrização, sendo a investigação de possíveis carências
nutricionais essenciais para um manejo dietético adequado, visto que esse paciente
possui deficiências nutricionais individuais e pode vir a ter patologias associadas
(VOMERO; COLPO, 2014). Muitos nutrientes são envolvidos no processo de cicatrização
e sistema imunológico, dentre eles podemos citar o zinco, selênio, vitamina A, proteínas,
entre outros. Veja no Quadro 5 as recomendações nutricionais para pacientes com
úlcera péptica.

19
QUADRO 5 – RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS PARA PACIENTES COM ÚLCERA PÉPTICA

Características Recomendações
Suficientes para manutenção ou recuperação do estado nutricional.
Recomendações 20-25 kcal/Kg: perda de peso
energéticas diárias 25-30 Kcal/Kg: manutenção
30-35 Kcal/Kg: ganho de peso
Fase aguda Fase de recuperação
Carboidratos (%) 50 – 60 50 – 60
Proteínas (g/kg de peso) 1.2 1.5
Lipídios (%) 25-30 25-30
Zinco (mg) 11 40
Selênio (µg) 55 400
Vitamina A (µg) 900 3000
Vitamina C (mg) 75 500
Vitamina B12 (µg) 2.4 2.4
Ácido fólico (µg) 400 400
Ferro (mg) 45 45
Fibras (g) 20 a 30 20 a 30
109 a 1011 bactérias ácido 109 a 1011 bactérias ácido
Probióticos (UFC/dia)
láticas láticas

FONTE: Vomero e Colpo (2014, p. 300)

As fibras produzem efeitos fisiológicos diferentes no organismo. As fibras


solúveis são responsáveis pelo aumento da viscosidade do bolo fecal, enquanto as fibras
insolúveis aumentam o volume das fezes, reduzem o tempo de trânsito no intestino
grosso e tornam a eliminação fecal mais fácil e rápida.

Uma dieta rica em fibras para pacientes com UP é recomendada, pois as fibras
atuam como tampões, reduzindo as concentrações dos ácidos biliares no estômago e
o tempo de trânsito intestinal, resultando em menor distensão abdominal reduzindo o
desconforto e a dor epigástrica (MAROTTA; FLOCH, 1993).

Já que a literatura fala em fibras, será que podemos associar probióticos?

Outra recomendação nutricional bem discutida na literatura é o uso de


probióticos. O uso de probióticos na UP é devido ao tratamento da infecção por H. pylori,
a qual desempenha um papel na patogênese da gastrite e da UP. Há a hipótese de
que os probióticos apresentam agentes terapêuticos contra o H. pylori, porém, não
erradicam a bactéria, apenas possuem a capacidade de reduzir a carga bacteriana e,
consequentemente, a infecção (SUERBAUM; MICHETTI, 2002; SGOURAS et al., 2005;
VASILJEVIC; SHAH, 2008).

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Outro ponto importante para a erradicação da H. pylori é o uso de antioxidantes
como a vitamina C, a qual mostrou ser mais eficientes em doses menores por um período
mais prolongado. Assim, sugere-se que pacientes que apresentem H. pylori podem se
beneficiar de uma suplementação de até 500 mg/dia de vitamina C por um período
de três meses (ZOJAJI et al., 2009). Grandes estudos (1100 pacientes) demonstraram
que a concentração plasmática de vitamina C foi 20% menor em indivíduos infectado
por H. pylori do que em controles negativos. A infecção por H. pylori pode causar uma
inativação irreversível da vitamina C ingerida no lúmen intestinal antes de sua absorção.
Quando os níveis de pH intragástrico aumentam (hipocloridria) o ácido ascórbico é
convertido na sua forma menos ativa (ácido desidroascrórbico), assim, o pH gástrico
é um fator chave na depleção de vitamina C em pacientes com problemas gástricos
(WARING et al., 1996; WOODWARD; TUNSTALL-PEDOE; MCCOLL, 2001; CAPURSO et al.,
2003; FRANCESCHI, 2014).

Pacientes infectados por H. pylori podem apresentar deficiência de vitaminas


(vitamina C, vitamina A, α- tocoferol, vitamina B12 e ácido fólico) e alguns minerais
essenciais. A vitamina B12, por exemplo, está ligada a outras proteínas e sua liberação
está relacionada com o pH gástrico. Uso de antiácidos e um pH intragástrico modificado,
causado pelo H. pylori, são os principais fatores de má absorção de vitamina B12
(FRANCESCHI, 2014).

O β-caroteno é uma provitamina A, sua biodisponibilidade depende do estado


de saúde do TGI, sendo que a hipo ou acloridria diminui significativamente a biodispo-
nibilidade do β-caroteno. Há a hipótese de que o H. pylori reduz a biodisponibilidade do
β-caroteno como consequência do lento movimento da micela contendo a vitamina
através da membrana dos enterócitos devido à sua carga negativa extrema derivada de
um meio não-ácido (FRANCESCHI, 2014).

A deficiência de folato se dá por consequência da diminuição da concentração


de vitamina C no suco gástrico e um aumento do pH intragástrico, clássico de uma
infecção por H. pylori (FRANCESCHI, 2014).

Segundo Vomero e Colpo (2014), ter uma alimentação balanceada é importante


no tratamento da UP, dado que os alimentos podem prevenir, tratar ou até mesmo aliviar
os sintomas que envolvem o desenvolvimento dessa patologia. Porém, poucos artigos
trazem recomendações atualizadas acerca da dietoterapia na UP, sendo necessários
estudos adicionais mais específicos no tratamento nutricional da UP. Veja, no Quadro 6,
a classificação dos alimentos na dietoterapia da UP.

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QUADRO 6 – ALIMENTOS PERMITIDOS, CONSUMO COM MODERAÇÃO E PROIBIDOS NA UP

Grupo alimentar Permitidos Com moderação Proibidos


Queijos gordurosos
Leite, queijos magros,
Leite (mascarpone, cream -
iogurtes e leite fermentado
cheese, gorgonzola)
Linhaça, castanha do
Oleaginosas - -
Brasil e nozes
Óleos vegetais e azeite de
Óleos - Alimentos fritos
oliva
Maçã, mamão, melão, Laranja, abacaxi,
Frutas Limão
banana acerola, maracujá
Vegetais com folhas
Brócolis, couve-flor,
verdes escuras, cenoura, Pimentas picantes
repolho, pepino,
Vegetais beterraba, feijão verde, (pimenta preta,
cebola, pimenta
espinafre, couve, rabanete, pimentões)
vermelha
abobrinha, alho-poró
Sopa de feijão, lentilha,
Legumes Feijão -
grão-de-bico e soja
Carnes gordurosas,
Carne magra (boi, porco,
Carnes carnes de órgãos e -
frango, peixe)
salsichas
Doces - Doces concentrados Chocolate
Café, chá preto,
Sucos de frutas refrigerantes /
Bebidas Sucos naturais
ácidas/cítricas refrigerantes à base
de cola
Temperos, especiarias
e condimentos
Outros alimentos - industrializados Grãos de mostarda
(Ketchup, maionese,
mostarda)

FONTE: Vomero e Colpo (2014, p. 300)

2.4 PANCREATITE
O pâncreas humano é um órgão que exerce função de duas glândulas: glândula
exócrina e glândula endócrina.

A glândula exócrina é formada por células ácidas pancreáticas e células ductais


que produzem enzimas digestivas e bicarbonato de sódio, respectivamente. O pâncreas
exócrino tem como função principal secretar enzimas digestivas responsáveis pela
digestão e absorção dos alimentos, e assimilação dos nutrientes em nosso organismo. A
glândula endócrina é constituída de cinco tipos de células de ilhotas secretoras e secreta
hormônios peptídicos responsáveis pela homeostase da glicose. As funções pancreáticas
são reguladas por mecanismos neurócrino, endócrinos e parácrinos, sendo que um
desequilíbrio tem impactos na saúde e na doença (LEUNG, 2010).

22
2.4.1 Fisiopatologia na Pancreatite
Quais distúrbios acometem o pâncreas?

Entre os distúrbios do pâncreas está a pancreatite. Ela pode ser dividida em


aguda e crônica. A pancreatite aguda (PA) é uma inflamação do parênquima glandular
do órgão retroperitoneal que leva à lesão com ou sem destruição do ácinos pancreáti-
cos. Essa inflamação pode resultar em uma doença autolimitada ou desenvolver com-
plicações com risco de vida.

Já a pancreatite crônica (PC) é caracterizada por uma síndrome que consiste


em disfunção das glândulas endócrinas e exócrinas que se desenvolvem secundaria-
mente à inflamação progressiva e fibrose crônica dos ácinos pancreáticos com dano
estrutural permanente. A recorrência da PA pode resultar em PC (HAMMAD; DITILLO;
CASTANON, 2018). Há ainda uma subdivisão da PA em: pancreatite edematosa intersti-
cial e pancreatite necrosante (BANKS et al., 2012).

A pancreatite intersticial é definida pelo aumento do pâncreas no exame de


imagem. Ocorre um borramento peripancreático que pode ser visto e constitui um
sinal de inflamação. A maioria dos pacientes apresentam este tipo de pancreatite,
sendo, na maioria dos casos, autolimitada. Já a pancreatite necrosante é caracterizada
pela necrose pancreática e/ou peripancreática. É mais bem visualizada em cortes
transversais de exame de imagem com contraste. Esta pancreatite está associada a um
curso prolongado e mais grave da doença (BARTEL, 2019).

A PC é caracterizada por fibrose e inflamação do pâncreas em indivíduos com


fatores de risco genéticos, ambientais e outros como hipertrigliceridemia. A PC tem como
característica a atrofia pancreática, fibrose, restrições ductais e distorções, calcificação,
displasia, insuficiência exócrina, diabetes, e dor crônica (SINGH; YADAV; GARG, 2019).

Com relação ao diagnóstico, a tomografia computadorizada (TC) com contraste


é um teste inicial e deve ser realizada em todos os indivíduos com suspeita de PC. A
amilase e a lipase são marcadores séricos para diagnosticar PA, mas não PC (SINGH;
YADAV; GARG, 2019). Veja, na Figura 4, um esquema que auxilia no diagnóstico da PC.

23
FIGURA 4 – FLUXOGRAMA PARA DIAGNÓSTICO DA PC

Paciente apresentando sintomas sugestivos de pancreatite crônica (PC)

Os sintomas incluem dor abdominal superior crônica ou recorrente, pancreatite aguda,


pancreatite aguda recorrente, diabetes ou insuficiência exócrina.

Imagem de tomografia computadorizada com contraste


São encontradas calcificações pancreáticas ou alterações ductais
pancreáticas características?
Com baixa probabilidade
Sim Não Com alta probabilidade da doença Não
da doença

Diagnóstico de PC improvável
Imagem de ressonância magnética com colangiopancreatografia por
ressonância magnética
São encontradas alterações ductais parenquimatosas ou
pancreáticas características?
Com alta probabilidade Com baixa probabilidade
Sim Não Não
da doença da doença

Imagem de ultrassom endoscópico


São encontradas alterações ductais parenquimatosas ou
pancreáticas características?
Com baixa probabilidade
Sim Não
da doença

Diagnóstico Consistente com


de PC diagnóstico de PC

Determinação da etiologia da PC
Fatores de risco são encontrados através da história clínica (uso crônico de álcool, tabaco, ou ambos.
Histórico pessoal ou familiar de pancreatite), resultados de testes laboratoriais (hipertrigliceridemia,
variantes genéticas), e imagem (câncer pancreático).

FONTE: Adaptada de Singh, Yadav e Garg (2019)

Já o diagnóstico da pancreatite aguda precisa preencher três das seguintes


características (BANKS et al., 2012):

• dor abdominal consistente com pancreatite aguda (início agudo de dor epigástrica
persistente e severa, geralmente com irradiação para as costas);
• atividade da lipase sérica (ou atividade da amilase) pelo menos três vezes maior que
o limite superior do normal;
• achados característicos de pancreatite aguda na tomografia computadorizada
com contraste (CECT) e, menos comumente, na ressonância magnética (MRI) ou
ultrassonografia transabdominal.
24
Se a dor abdominal sugerir fortemente que a pancreatite aguda está presente,
mas a atividade da amilase e/ou lipase sérica for menor que três vezes o limite superior
do normal, como pode ser o caso com apresentação tardia, exames de imagem serão
necessários para confirmar o diagnóstico. Se o diagnóstico de pancreatite aguda é
estabelecido por dor abdominal e pelo aumento da atividade das enzimas pancreáticas
séricas, geralmente não é necessário um CECT para o diagnóstico na sala de emergência
ou na admissão ao hospital (BANKS et al., 2012).

2.4.2 Dietoterapia na Pancreatite


Estudos mostram que 70-75% dos pacientes com pancreatite aguda apresen-
tam a forma leve da doença, na qual a mortalidade é em torno de 1%. Esses indivíduos
apresentam um bom estado nutricional, que usualmente não se modificam com a evo-
lução da doença, porém, nos 25% que desenvolvem a forma grave da doença geralmen-
te apresentam problemas nutricionais, pois sofrem uma intensa inflamação com reper-
cussão metabólica, internação prolongada às vezes necessitando de terapia intensiva e
com frequência apresentam sepse e necessidade de cirurgias (SBNPE, 2011a).

A inflamação gera estresse oxidativo e catabolismo, causando grande mobili-


zação de reservas energéticas, principalmente de massa magra, refletindo uma perda
nitrogenada de grande proporção (SBNPE, 2011a).

Os pacientes que apresentam a forma grave da doença ainda agravam com


desnutrição pela dificuldade de manter a Terapia Nutricional (TN) por apresentarem
condições diferentes: dor abdominal, íleo prolongado, necessidade de jejum para
diversos exames ou operações (SBNPE, 2011a).

Na PA leve o tratamento consiste em jejum, hidratação e o médico entrará


com analgesia (antiespasmódicos). O jejum deve ser mantido até a melhora do quadro
clínico, principalmente da dor, a realimentação geralmente ocorre em três a cinco
dias. A hidratação deve ser vigorosa, visto que os pacientes apresentam hipovolemia
em decorrência do sequestro de líquidos, portanto, a hidratação tem como objetivo
melhorar a perfusão tecidual pancreática e tentar evitar a evolução para necrose
(ROCHA et al., 2018).

A TN artificial não é indicada em casos de PA leve se o paciente conseguir ingerir


alimentos por via oral até cinco a sete dias após o início do quadro. A TN artificial só deve
ser iniciada se não houver a possibilidade de o paciente receber alimentos por via oral
após cinco a sete dias, e, em pacientes com PA grave, a TN deve ser iniciada assim que
houver a estabilidade hemodinâmica (SBNPE, 2011a).

25
Já na PA grave, a via de preferência deve ser a enteral (TNE), e quando houver
impossibilidade de uso da via enteral a parenteral está indicada, ambas serão decididas
em conjunto com a equipe multidisciplinar. Na via enteral o posicionamento jejunal é o
mais recomendável (SBNPE, 2011a).

O tipo de dieta indicado na PA é a oligomérica (baseada em peptídeos). A


polimérica (padrão com proteínas intactas) deve ser tentada se tolerada.

Não há evidências para recomendação do uso de TNE contendo imunonutrientes


para pacientes com PA grave, porém, quando TNE jejunal, pode-se utilizar ômega-3 na
fórmula TNE.

Recomenda-se ainda alto teor de triglicerídeos de cadeia média para TNE jeju-
nal na PA grave. O uso de probióticos ainda é controverso e não está recomendado para
PA aguda (SBNPE, 2011a).

Já na PC, 50% dos pacientes são desnutridos, os quais apresentam grandes


riscos ao estado nutricional, pois a PC aumenta o requerimento nutricional devido ao
processo inflamatório crônico que leva ao hipermetabolismo e o hipercatabolismo. Esse
estresse é muito semelhante ao observado na sepse, o qual caracteriza-se, como já
citado, por mudanças hiperdinâmincas com hipermetabolismo e catabolismo.

As alterações hemodinâmicas incluem aumento do débito cardíaco, diminuição


da resistência vascular sistêmica e aumento do consumo de oxigênio (SILVA; FRAN-
GELLA, 2009).

Além disso, a ingestão persistente alcoólica, característica desses pacientes, já


leva à desnutrição.

Outro ponto é a presença da dor, a qual impede a ingestão oral de nutrientes, e,


durante o curso da doença, a secreção de enzimas digestivas é gradualmente reduzida
(SBNPE, 2011b).

Na PC a subnutrição grave é uma consequência, sendo que os fatores que a


predispõem são: diminuição da ingestão alimentar, aumento da atividade metabólica,
disfunção na absorção dos nutrientes, dor pós-prandial, diabetes e abuso contínuo de
álcool (SILVA; FRANGELLA, 2009).

As primeiras recomendações terapêuticas são a abstinência alcoólica e um


fracionamento maior da dieta com menor volume. Além disso, a administração de
enzimas pancreáticas associada a uma alimentação adequada se mostra eficiente na
maioria dos casos.

26
Em pacientes que apresentam esteatorreia, a administração de triglicerídeo de
cadeia média (TCM) é indicada. Quando não houver esteatorreia uma dieta normolipídica,
rica em ácidos graxos de origem vegetal, é indicada.

Na ausência de diabetes a dieta deve ser rica em carboidratos, caso a diabetes


seja presente emprega-se o tratamento para DM1 (SILVA; FRANGELLA, 2009).

Resumindo, a TN na PC tem como objetivo controlar a má absorção e melhorar a


condição nutricional do paciente, evitando a evolução da desnutrição energético-proteica.

O aconselhamento nutricional tem como base a ingestão fracionada de


pequenas porções hipercalóricas (35 kcal/kg/dia), hiperproteica (1 a 1,5 g/Kg/dia), rica
em carboidratos e pobre em gorduras (0,7 a 1,0 g/Kg/dia) com preferência para gordura
vegetal (são mais bem toleradas) (SBNPE, 2011b).

A princípio, a dieta normal com adição de enzimas pancreáticas é eficaz na me-


lhora das condições clínicas e nutricionais do paciente com PC, sendo a “suplementa-
ção via oral com proteína hidrolisada, rica em vitaminas lipossolúveis, micronutrientes
com ou sem TCM, quando necessária” (SBNPE, 2011b, p. 5).

A TNE é indicada na PC para os pacientes que se encontram em uma fase grave


e tardia da lesão pancreática na qual a TN oral não está sendo satisfatória.

As TN oral ou enteral estão contraindicadas em pacientes que apesentam


estenose duodenal grave. Já a terapia nutricional parenteral (TNP) está indicada em
pacientes com obstrução gástrica secundária à estenose duodenal e em caso de
fístulas pancreáticas (SBNPE, 2011b).

A nutrição na PC é pouco explicada na comunidade científica, sendo necessá-


rios mais estudos para definição de condutas mais concretas visando melhorar a assis-
tência a essa população, além de contribuir para a prevenção e controle da doença, bem
como para o surgimento de novas terapias mais específicas e eficazes (SILVA; FRAN-
GELLA, 2009).

2.5 CÁLCULO BILIAR


Os cálculos biliares são conhecidos como colelitíase, e consistem em massas na
vesícula biliar ou no trato biliar causadas por níveis anormalmente elevados de colesterol
ou bilirrubina na bile (LAMMERT et al., 2016). Veja na Figura 5.

27
FIGURA 5 – CALCIFICAÇÃO DOS CÁLCULOS BILIARES

Fígado Ducto hepático


Cálculos do ducto esquerdo
biliar intra-hepáti- Cálculos extra-hepá-
co (hepatolitíase) ticos do ducto biliar
Contendo princi- (coledocolitíase)
palmente pigmento Ducto hepático Pedras primárias são
marrom e pedras de direito principalmente pedras de
colesterol Ducto pigmento marrom, en-
hepático quanto as pedras secun-
comum dárias são principalmente
Ducto pedras de colesterol
o
cístic
Cálculos da vesícula Vesícula
biliar (colecistolitíase) Ducto pancreático
Contendo pedras de coles- Ducto biliar
terol (ou pigmento preto) comum
Esfincter de Pâncreas
Oddi
Duodeno

Legenda: a) as cores das pedras representam a composição, incluindo pedras de colesterol


(amarelo) e pedras de pigmento (marrom e preto); b) visão endoscópica de cálculos secundários
de colesterol (com uma cor amarela típica) no ducto biliar durante a recuperação do cálculo com
uma cesta de Dormia.
FONTE: Adaptada de Lammert et al. (2016)

2.5.1 Fisiopatologia do Cálculo Biliar


As causas da colelitíase são multifatoriais. Fatores que afetam a produção
hepática de colesterol, função da vesícula biliar (estase ou inflamação), produção de
ácido biliar ou absorção intestinal de colesterol e ácidos biliares podem contribuir para a
formação dos cálculos. Esses fatores podem ser modificáveis ou não, conforme descrito
no Quadro 7 (LITTLEFIELD; LENAHAN, 2019).

QUADRO 7 – FATORES DE RISCO MODIFICÁVEIS OU NÃO MODIFICÁVEIS NA COLELITÍASE

Fatores de risco Fatores de risco não


Outros fatores de risco
modificáveis modificáveis
Dislipidemia Idade ≥ 40 anos Cirrose
Dieta hipercalórica Etnia Doença de Crohn
Dieta pobre em fibras Histórico familiar Hiperbilirruibinemia
Medicações: ceftriaxone
(Rocefin), estrogênios
(contraceptivos orais, Sexo feminino
terapia hormonal), fibratos,
diuréticos tiazídicos.
Síndrome metabólica Predisposição genética
Anemias hemolíticas
Obesidade
(anemia falciforme)

28
Perda de peso rápida ou
Gestação
flutuação de peso
Sedentarismo Lesão da medula espinhal
Fumo
Diabetes tipo 2

FONTE: Adaptado de Littlefield e Lenahan (2019)

A classificação dos cálculos biliares é feita com base na composição e localização,


90% dos cálculos biliares são compostos de colesterol, porém, outros tipos de cálculos
(< 10%) são representados por pedras de pigmento preto e marrom (SCHAFMAYER et
al., 2006). Além disso, podem ser classificados em extra-hepáticos (coledocolitíase) e
cálculos intra-hepáticos (hepatolitíase) (SHODA et al., 2001).

A bile é um líquido verde-escuro e marrom-amarelado, o qual contém 90%


de água. Colesterol, fosfolipídios e sais biliares são os três principais componentes
lipídicos da bile, além disso, também contém quantidades pequenas de proteínas e sais
inorgânicos. Com base na composição química e aparência, os cálculos são divididos
em dois tipos: colesterol e cálculos biliares pigmentares com etiologias diferentes
(LAMMERT et al., 2016).

Os cálculos biliares de colesterol são formados como consequência de uma fa-


lha na homeostase do colesterol biliar, quando o equilíbrio físico-químico da solubili-
dade do colesterol na bile é perturbado. A Figura 6 mostra os defeitos primários para a
formação de cálculos biliares de colesterol, os quais promovem a cristalização do co-
lesterol e a formação dos cálculos (LYONS; WITTENBURG, 2006; WANG; AFDHAL, 2014).

FIGURA 6 – FATORES ENVOLVIDOS NA FORMAÇÃO DE CÁLCULOS BILIARES DE COLESTEROL

Fatores
genéticos
e genes
litogênicos

hipersecre- Hipomotilida-
ção hepátca de da vesicula
de colesterol biliar

Cálculos de
colesterol

Transição de Fatores intes-


fase rápida tinais

FONTE: Adaptada de Lammert et al. (2016)

29
Já os cálculos pigmentares são resultados do metabolismo anormal da bilirru-
bina. A bile de pacientes com cálculos pigmentares pretos ou marrons possui grandes
quantidades de bilirrubina não conjugada.

Os cálculos pretos são formados em precipitados complexos não infectados e


facilitam seu crescimento em pedras. Alguns estudos têm demonstrado genes de sus-
ceptibilidade para a formação de cálculos biliares pigmentares (LAMMERT et al., 2016).
Veja, na Figura 7, os fatores envolvidos na formação de cálculos biliares pigmentares.

FIGURA 7 – FATORES ENVOLVIDOS NA FORMAÇÃO DE CÁLCULOS BILIARES PIGMENTARES

Hiper-
Fatores gené- secreção
ticos hepática de
bilirrubina

Cálculo bi-
liar marrom

Infecção bac-
Estase biliar
teriana

FONTE: Adaptada de Lammert et al. (2016)

Quais são os sinais e sintomas que esses pacientes apresentam?

Os pacientes que desenvolvem colelitíase apresentam um início súbito de dor


na região epigástrica ou no quadrante superior direito do abdome. A dor geralmente
é descrita como moderada a grave, estável e possui pico uma hora após o início.
Geralmente, a cólica se resolve gradualmente e pode durar de cinco a seis horas
(STINTON; SHAFFER, 2012).

Outros sintomas importantes são dor na região subescapular direita e/ou om-
bro, conhecida como sinal de Collins, dor nas costas, náuseas e vômitos. Pode ocorrer
também anorexia, sensação de saciedade, incapacidade de comer alimentos gorduro-
sos e diarreia crônica. Outro ponto importante é se os cálculos estiverem obstruindo o
ducto biliar comum, neste caso, o indivíduo pode apresentar esteatorreia ou fezes gor-
durosas e com odor fétido, isso ocorre como resultado da gordura não digerida no duo-
deno por causa da falta de bile (ABRAHAM et al., 2014; SUSUMU; MICHIAKI; YOSHINORI
et al., 2017).

30
O diagnóstico é feito através de ultrassonografia, a qual é considerada padrão
ouro para o diagnóstico de colelitíase. O diagnóstico de colelitíase pode ser eliminado se
a ultrassonografia mostrar uma parede da vesícula biliar e ducto biliar comum normais.
O diagnóstico positivo pode consistir em espessamento da parede da vesícula biliar (4
mm), aumento da vesícula biliar ou fluido ao redor (LITTLEFIELD; LENAHAN, 2019).

O tratamento da colelitíase vai depender da sintomatologia e da ausência de


complicações. O tratamento é multifatorial e inclui modificações do estilo de vida,
dieta e medicamentos. Como manejo farmacológico pode-se realizar o controle da dor,
antieméticos ou agentes de dissolução. Em indivíduos com dor recorrente o manejo
cirúrgico é o mais indicado (LITTLEFIELD; LENAHAN, 2019).

2.5.2 Dietoterapia no Cálculo Biliar


Todo mundo conhece alguém que sofre ou já sofreu com cálculos biliares, mas
como que o nutricionista deve realizar o manejo dietético desse paciente?

O excesso de peso aumenta os riscos de cálculo biliar, assim, a perda de peso


pode ser interessante nesses indivíduos, porém, se essa perda for excessiva e rápida,
isso pode promover o desenvolvimento dos cálculos e aumentar o risco de cálculos
biliares assintomáticos se tornarem sintomáticos, isso por que a perda rápida de peso
aumenta a proporção de colesterol e sais biliares na vesícula e promove a estase biliar
resultando em uma redução nas contrações da vesícula biliar (CIAULA et al., 2019).

Além disso, sabe-se que uma dieta rica em colesterol aumenta a saturação
de colesterol biliar, aumentando o risco de formação de cálculos biliares. Estudos
observacionais têm demonstrado que a ingestão de gordura saturada ou trans está
associada a um aumento na incidência de cálculos biliares e que a maior ingestão de
ácidos graxos poli ou monoinsaturados reduz esse risco, porém, mais pesquisas são
necessárias para se determinar as quantidades e proporções ideais desses ácidos
graxos mono e poli-insaturados (CIAULA et al., 2019).

Já é bem consolidado na literatura que a ingestão de açúcares refinados, como a


sacarose e frutose, está associada ao sobrepeso e obesidade e isso favorece os cálculos
biliares. Todavia, estudos têm levantado a hipótese que, além de serem obesogênicos,
os açúcares refinados são também litogênicos, porém, ainda não houve comprovação
que o consumo de açúcar refinado promove a formação de cálculos biliares, mas é
recomendado que os indivíduos com riscos de desenvolver colelitíase evitem a ingestão
excessiva de açúcar refinado (CIAULA et al., 2019).

31
Outro ponto importante a se levar em consideração é o estilo da dieta. Tsai
et al. (2004a), avaliaram em um estudo prospectivo de 20 anos, 80.898 mulheres e
descobriram que o aumento de proteína vegetal estava associado a um menor risco
de colecistectomia. Em 2006, os mesmos autores, encontraram que mulheres que
aumentaram o consumo de frutas e vegetais tiveram a incidência dos cálculos biliares
reduzida (TSAI, 2006). Esses achados sugerem que o consumo de uma dieta vegetariana
equilibrada em proteína vegetal pode diminuir o risco de desenvolver cálculos biliares
(CIAULA et al., 2019).

Pensando na dieta vegetariana, chegamos à conclusão de que, consequen-


temente, há um aumento no consumo de fibras, será que as fibras teriam influência
benéfica na prevenção e controle dos cálculos biliares?

Corroborando com a dieta vegetariana, há o aumento do consumo de fibras o


qual é importante para os cálculos biliares. Acredita-se que a fibra atue no cólon intesti-
nal, diminuindo a formação de ácido desoxicólico pelas bactérias do intestino e aumen-
tando a síntese de ácido quenodesoxicólico, o qual, por sua vez, diminui a litogenicidade
e tem sido utilizado terapeuticamente para promover a dissolução de cálculos biliares.
Sendo assim, a recomendação de uma dieta rica em fibras se faz importante dentro de
um plano alimentar para prevenção dos cálculos biliares (CIAULA et al., 2019).

Outro ponto importante a ser demonstrado, é que o aumento do consumo


de amendoim e outras nozes está associado a um risco menor de colecistectomia.
As mulheres que consumiram cinco ou mais porções de nozes por semana tiveram
um risco de 25% menor de ter uma colecistectomia em comparação a mulheres que
raramente ou nunca comiam nozes (TSAI et al., 2004b).

Como conclusão, Ciaula et al. (2019) sugerem que se deve manter o peso
corporal adequado, a dieta deve ser semelhante às recomendadas para outras
patologias (diabetes e hipertensão, por exemplo). A suplementação de vitamina C pode
ser interessante, visto que esta participa como cofator para a enzima 7α-hidroxilase,
uma etapa limitante da taxa de conversão do colesterol em ácidos biliares, prevenindo
a formação dos cálculos biliares, promovendo a conversão de colesterol em sais biliares
reduzindo a litogenicidade da bile. Além disso, é importante verificar o status do ferro e as
deficiências que devem ser corrigidas. Em pacientes com cálculos biliares sintomáticos,
os autores sugerem que uma dieta isenta de alimentos alergênicos seria viável (CIAULA
et al., 2019).

32
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• O TGI tem como principal função a absorção de água, eletrólitos e nutrientes.

• Os tecidos epiteliais são essenciais para o funcionamento adequado de todo o


organismo, fazendo sua cobertura, proteção, formação de glândulas – as quais
promovem a secreção e absorção de substâncias necessárias – e proteção contra
agentes físicos, químicos e patogênicos.

• Os micro-organismos são distribuídos ao longo da superfície do corpo, porém, o local


de maior variedade é o TGI, mais especificamente o intestino.

• A colonização bacteriana pode se tornar patogênica e isso pode acarretar doenças e


distúrbios do TGI.

• Na DRGE, o relaxamento do esfíncter esofágico expõe o esôfago ao ácido gástrico


e outros conteúdos estomacais, como a pepsina, bile, fluido do intestino delgado e
secreções pancreáticas, todos prejudiciais à mucosa esofágica.

• Na DRGE, a literatura costuma listar alguns produtos como refluxogênicos, são eles:
alimentos gordurosos, picantes ou azedos, frutas cítricas e sucos, alho, tomate e suco
de tomate, chocolate, café, bebidas e produtos contendo hortelã-pimenta, bebidas
carbonatadas e álcool.

• Na DRGE, planos alimentares que reduzem os gatilhos comuns, como a redução da


ingestão de açúcares e gorduras saturadas e aumento da ingestão de fibras, podem
ser efetivos para pacientes que procuram um planejamento alimentar abrangente.

• A gastrite nada mais é do que a inflamação da mucosa do estômago, que se


desenvolve como uma resposta do organismo a uma agressão à sua integridade,
desencadeando sintomas característicos e processos diferentes, nos quais é
possível classificá-la em aguda ou crônica.

• As úlceras pépticas (UP) têm como características lesões ulcerosas na mucosa gastro-
duodenal gerando dor epigástrica e causando até sangramentos gastrointestinais.

• A dietoterapia na úlcera péptica serve para prevenir a hipersecreção de ácido gástri-


co com o objetivo de reduzir a ferida e a dor na mucosa gástrica ou duodenal. Além
disso, o foco se dá na cicatrização, sendo a investigação de possíveis carências nutri-
cionais essenciais para um manejo dietético adequado, visto que esse paciente possui
deficiências nutricionais individuais e pode vir a ter patologias associadas.

33
• A pancreatite aguda (PA) é uma inflamação do parênquima glandular do órgão
retroperitoneal que leva à lesão com ou sem destruição do ácinos pancreáticos. Essa
inflamação pode resultar em uma doença autolimitada ou desenvolver complicações
com risco de vida.

• A pancreatite crônica (PC) é caracterizada por uma síndrome que consiste em dis-
função das glândulas endócrinas e exócrinas que se desenvolvem secundariamente
à inflamação progressiva e fibrose crônica dos ácinos pancreáticos com dano estru-
tural permanente.

• Na PA leve, o tratamento consiste em jejum, hidratação e o médico entrará com


analgesia (antiespasmódicos). O jejum deve ser mantido até a melhora do quadro
clínico, principalmente da dor, a realimentação geralmente ocorre em três a cinco dias.

• Na PA grave, a via de preferência deve ser a enteral (TNE), e quando houver


impossibilidade de uso da via enteral, a parenteral está indicada, ambas serão
decididas em conjunto com a equipe multidisciplinar. Na via enteral o posicionamento
jejunal é o mais recomendável.

• A PC aumenta o requerimento nutricional devido ao processo inflamatório crônico


que leva ao hipermetabolismo e o hipercatabolismo.

• A TN na PC tem como objetivo controlar a má absorção e melhorar a condição


nutricional do paciente, evitando a evolução da desnutrição energético-proteica.

• As causas da colelitíase são multifatoriais. Fatores que afetam a produção hepática


de colesterol, função da vesícula biliar (estase ou inflamação), produção de ácido
biliar ou absorção intestinal de colesterol e ácidos biliares podem contribuir para a
formação dos cálculos.

• O excesso de peso aumenta os riscos de cálculo biliar, sendo assim, a perda de peso
pode ser interessante nesses indivíduos, porém, se essa perda for excessiva e rápida,
pode promover o desenvolvimento dos cálculos e aumentar o risco de cálculos bilia-
res assintomáticos se tornarem sintomáticos.

• É bem consolidado na literatura que a ingestão de açúcares refinados, como a


sacarose e frutose, está associada ao sobrepeso e obesidade e isso favorece os
cálculos biliares.

34
AUTOATIVIDADE
1 A parede é composta por quatro camadas (túnicas) com uma rede de nervos
interconectadas. As túnicas são chamadas de:

I- Túnica média.
II- Túnica submucosa.
III- Túnica muscular.
IV- Túnica serosa ou adventícia.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a afirmativa II está correta.
b) ( ) As afirmativas II, III e IV estão corretas.
c) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.
d) ( ) Nenhuma das afirmativas está correta.

2 O problema é que a colonização bacteriana pode se tornar _________________________


dependendo da bactéria presente e do comprometimento das células epiteliais
de barreira ou imune e isso pode acarretar doenças e distúrbios do TGI. Escolha a
alternativa que preenche a lacuna.

a) ( ) Patogênica.
b) ( ) Comensal.
c) ( ) Benéfica.
d) ( ) Nenhuma das alternativas.

3 Os IBPs são considerados seguros e indicados para o tratamento de várias doenças


relacionadas à secreção ácida gástrica, como: refluxo gastroesofágico, úlceras
gástricas e duodenais, infecção por Helicobacter pylori e na prevenção e tratamento
de danos causados pelo uso de anti-inflamatórios não esteroidais. Essa classe de
fármacos reduz a secreção gástrica. Como agem os inibidores da bomba de prótons
(IBPs), como o omeprazol e similares?

a) ( ) Inibindo a enzima H+/K+-ATPase na superfície secretora das células parietais.


b) ( ) Inibindo a enzima amilase no estômago.
c) ( ) Inibindo a inflamação da mucosa gástrica.
d) ( ) Nenhuma das alternativas.

35
4 Os IBPs também apresentam efeito no status da vitamina B12, pela falta redução da
secreção ácida. A falta de ácido gástrico causa a redução da capacidade digestiva
de liberar vitamina B12 dos alimentos e, como consequência, reduz a quantidade de
vitamina B12 absorvida na mucosa intestinal. Para a absorção de vitamina B12, se
faz necessário:

5 A pancreatite aguda (PA) é uma inflamação do parênquima glandular do órgão


retroperitoneal que leva à lesão com ou sem destruição do ácinos pancreáticos. O
diagnóstico é clínico com suporte em exames laboratoriais e eventualmente exames
de imagem. No tratamento da pancreatite aguda qual é o tratamento mais indicado?

6 Até a melhora do quadro clínico, principalmente da dor, a realimentação geralmente


ocorre em três a cinco dias. Na pancreatite aguda o tipo de dieta indicado na terapia
nutricional enteral é:

36
UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
DOENÇAS DO TRATO
GASTROINTESTINAL INFERIOR

1 INTRODUÇÃO
As doenças do trato gastrointestinal inferior são aquelas que acometem o
intestino, dentre elas, neste tópico, iremos destacar a Síndrome do Intestino Irritável
(SII), colite ulcerativa e doença de Crohn (DC).

A SII é fator de risco para muitas doenças graves, como o câncer do TGI. Por
ser uma doença crônica é de difícil diagnóstico e o mesmo, na maioria das vezes,
acontece tardiamente. Trata-se de uma patologia funcional do intestino, apresenta
recidivas e é definida por critérios diagnósticos dos sinais e sintomas e ausência de
causas orgânicas (SILVA et al., 2020). Veremos, a seguir, toda a fisiopatologia e a die-
toterapia envolvendo a SII.

Já as Doenças Inflamatórias Intestinais (DII), como a colite ulcerativa e a


doença de Crohn, são um problema de saúde pública em muitos países, variando sua
incidência conforme a região. São caracterizadas por apresentarem uma recorrência
e envolverem o sistema imunológico, o qual tem como alvo o intestino, gerando um
processo inflamatório crônico (ZALTMAN, 2007).

Siga sua leitura para aprender as fisiopatologias e dietoterapias envolvendo as


doenças do trato gastrointestinal inferior.

2 SÍNDROME DO INTESTINO IRRITÁVEL (SII)


A prevalência da SII é de aproximadamente 11%, sendo caracterizada por um
distúrbio funcional do intestino, não estando associada a anormalidades estruturais ou
bioquímicas que possam ser detectáveis pelas ferramentas diagnósticas de rotina
atuais (ENCK et al., 2016).

2.1 FISIOPATOLOGIA DA SII


Atualmente tem sido descrita como um distúrbio de interações entre intestino-
cérebro, com fisiopatologia heterogênea e incompletamente compreendida. A interação
alterada entre intestino-cérebro, hipersensibilidade visceral, sofrimento psicossocial
e distúrbios motores gastrointestinais são considerados importantes na SII, ou pelo
menos para uma parte dos pacientes com SII.

37
Os fatores que contribuem para sua etiologia vêm aumentando nos últimos
anos, sendo que a ativação imune intestinal, aumento da permeabilidade intestinal,
alteração de microbiota e hipersensibilidade alimentar pode contribuir para os sintomas
de alguns pacientes com SII. Veja, na Figura 8, os fatores que contribuem para a SII
(BARBARA et al., 2012; POSSERUD et al., 2013; TAP et al., 2017).

FIGURA 8 – FATORES PATOFISIOLÓGICOS NA SII

FONTE: Adaptada de Algera, Colomier e Simrén (2019)

Possui como sintomas dor abdominal ou desconforto abdominal, irregularidade


nas fezes e distensão abdominal. Muitos indivíduos têm sua qualidade de vida preju-
dicada, pois os sintomas podem ser debilitantes, de leves a moderados. Geralmente,
a SII está associada a outras comorbidades somáticas como síndrome de dor, bexiga
hiperativa e enxaqueca, depressão, ansiedade e sensibilidade visceral. Além disso, exis-
te uma distinção entre os subtipos de SII: SII com dor ou desconforto e constipação
predominante (SII-C); SII com diarreia (SII-D); SII mista (SII-M); e SII não subtipo (SII-U)
(ENCK et al., 2016).

38
QUADRO 8 – CLASSIFICAÇÃO DOS SUBTIPOS DE SII

SII subtipo Frequência de fezes


SII-C > 25% constipação, < 25% de diarreia
SII-D > 25% diarreia, < 25% constipação
SII-M > 25% constipação e > 25% diarreia
SII-U < 25% constipação e < 25% diarreia

FONTE: Adaptado de Defrees e Bailey (2017)

Como visto no Quadro 8, a SII-C é definida como tendo mais de 25% dos
movimentos intestinais classificados na escala de Bristol como 1 ou 2 e com menos
de 25% das fezes categorizadas como 6 ou 7, também, na escala de Bristol. Já a SII-D
é classificada como mais de 25% das fezes categorizadas como 6 ou 7 na escala de
Bristol e menos de 25% classificada como 1 ou 2 (DEFREES; BAILEY, 2017).

Trata-se de uma doença multifatorial, por isso a patogênese é complexa e a


fisiopatologia molecular ainda não está bem elucidada.

Alterações funcionais foram descritas, como: alteração na sensibilidade


visceral, alterações funcionais do cérebro, motilidade intestinal e disfunções secretoras,
comorbidades somáticas e psiquiátricas. Além do mais, anormalidades gastrointestinais
como ativação imune, disbiose intestinal, funções mucosas prejudicadas, sensibilização
de nervos, plasticidade pós-infecciosa, expressão alterada e liberação de mediadores
mucosos e imunológicos e perfis de expressão gênicas, também estão associados com a
SII (ENCK et al., 2016).

Porém, mesmo que sua patogênese e fisiopatologia permaneçam indetermi-


nadas, existem potenciais mecanismos envolvidos na disfunção intestinal, sensação
visceral e geração dos sintomas.

As evidências são crescentes e sugerem que a barreira epitelial, a microbiota


intestinal, os antígenos alimentares e os ácidos biliares provocam respostas anormais
nos reguladores das funções sensório-motoras, incluindo eixo hipotálamo-pituitária-
adrenal (HPA), o sistema imunológico, o eixo intestino-cérebro e o sistema nervoso
entérico (ENCK et al., 2016).

Existem também outros fatores, como a depressão e ansiedade, que são


conhecidos por responder a sintomas abdominais e fatores psicossociais (estresse) que
influenciam as funções fisiológicas intestinais, como motilidade e sensibilidade visceral
(ENCK et al., 2016).

39
O diagnóstico da SII é feito através dos critérios de Roma IV, os quais requerem
que o paciente tenha sintomas de dor abdominal recorrente, em média pelo menos
um dia por semana nos três meses anteriores, com início dos sintomas pelo menos
seis meses antes da apresentação. Os critérios também exigem que o paciente tenha
dor abdominal em associação com pelo menos dois dos seguintes critérios (DEFREES;
BAILEY, 2017):

• defecação (melhora ou piora da dor);


• mudança na frequência das fezes;
• mudança na forma das fezes (aparência).

QUADRO 9 – CRITÉRIOS ROMA IV

Duração Frequência Sintomas


Dor abdominal recorrente com pelo
≥ 3 meses de sintomas menos 2 dos seguintes critérios:
persistentes, com início de 1- relacionado à defecação;
6 meses dos sintomas pelo ≥ 1 dia por semana. 2- associado à mudança na frequência
menos antes do diagnóstico. das fezes;
3- associado à mudança na forma das
fezes.

FONTE: Adaptado de Defrees e Bailey (2017)

FIGURA 9 – ESCALA DE BRISTOL

FONTE: <https://bit.ly/3qP0PwY>. Acesso em: 24 fev. 2021.

40
INTERESSANTE
O paciente pode utilizar o aplicativo Bristol Stool Chart® (disponível para Android e IOS)
para criação de gráficos baseados na classificação da escala de Bristol.

PRINT DO APLICATIVO

FONTE: O autor

A terapia farmacológica tem como objetivo alterar os distúrbios dos hábitos


intestinais e/ou dor visceral. Dentre eles, podemos citar os antiespasmódicos, baixas
doses de antidepressivos, laxativos ou aceleradores de motilidade e antidiarreicos
(ENCK et al., 2016).

Outro tratamento interessante na SII é a terapia. Estudos sugerem que os


sintomas abdominais influenciam a ansiedade e depressão (bottom-up) e os fatores
psicossociais influenciam, por sua vez, os fatores fisiológicos como função motora,
limiar sensorial e reatividade ao estresse do intestino (top-down) (FOND et al., 2014;
HUNGIN et al., 2015).

Diante do exposto, pode-se concluir que apesar de sua fisiopatologia não estar
bem elucidada, a SII envolve diversas áreas, como mostra a Figura 10.

41
FIGURA 10 – SÍNDROME DO INTESTINO IRRITÁVEL E CAUSAS MULTIFATORIAIS
Genética e epigenética
Avaliação, emoção, enfrentamento e apoio social

Estressores ex-
ternos (fatores
psicossociais)

Ativação cerebral e
modulação neuroen-
dócrina

Qualidade
Eixo intesti- Resposta de vida com-
no-cérebro ao estresse prometida

Estressores in-
ternos (alimen- Manifestações
tos e microorga- gastrointestinais e extra-
nismos) gastrointestinais

FONTE: Adaptada de Enck et al. (2016)

2.2 DIETOTERAPIA NA SII


A SII é descrita como um distúrbio de interações intestinais, sendo que a falta da
compreensão completa dos mecanismos fisiopatológicos impediu o desenvolvimento
de tratamentos eficazes, e também levou a uma abordagem de tratamento direcionada
por sintomas, em vez da patologia subjacente (ALGERA; COLOMIER; SIMRÉN, 2019).

2.2.1 Fibras
As fibras dietéticas são carboidratos não digeríveis (celulose, amido resistente e
glucanos), que formam os materiais estruturais de cereais, frutas, vegetais e legumes.
As fibras são divididas em dois grupos, com base na sua solubilidade: fibras solúveis e
insolúveis. As solúveis formam um gel que interage com as bactérias intestinais e en-
curta o trânsito do TGI. Essas bactérias da microbiota intestinal, produzem metabólitos

42
chamados de ácidos graxos de cadeia curta, que ligam o microbioma intestinal ao me-
tabolismo do hospedeiro. Já as fibras insolúveis não alteram o TGI. Além da solubilidade,
as fibras influenciam na fisiologia intestinal através da sua fermentabilidade, viscosidade
e capacidade de volume/ligação. Alguns estudos demonstram que a alta ingestão de fi-
bras insolúveis aumenta o conteúdo de água e volume fecal, resultando em um trânsito
gastrointestinal acelerado, o que explica a vantagem de pacientes com SII do tipo cons-
tipação consumir esse tipo de fibra. Porém, o consumo de fibras pode levar a inchaço,
distensão abdominal e flatulência, sendo esse problema menor proeminente com fibras
solúveis do que com insolúveis (ALGERA; COLOMIER; SIMRÉN, 2019).

O psyllium ganha destaque em pacientes que apresentam constipação. Seu


mecanismo de ação ainda não está bem elucidado, mas há a hipótese que não se
relacione apenas ao aumento do volume das fezes, mas sim ao aumento da produção
de ácidos graxos de cadeia curta, como o butirato, os quais apresentam efeitos anti-
inflamatórios na mucosa colônica ou até mesmo promovem alterações na microbiota
intestinal contribuindo na SII (CAMILLERI, 2018).

2.2.2 Glúten
Apesar de pacientes com SII apresentarem ausência de marcadores para doença
celíaca, há evidências de que esses pacientes se beneficiam de uma dieta isenta de
glúten. O mecanismo que envolve o glúten e SII ainda não está claro, mas há a hipótese de
que o glúten afeta a expressão do mRNA epitelial do intestino delgado da proteína de
barreira aumentado a permeabilidade da mucosa do intestino delgado em pacientes
com SII-D (CAMILLERI, 2018).

Muito se tem falado dos FODMAPs, será que uma dieta isenta em FODMAPs
pode ser interessante para pacientes com SII?

A intolerância alimentar é um dos fatores que mais causam sintomas em


pacientes com SII. Esses pacientes tendem a desencadear seus sintomas após consumo
de determinados alimentos, que incluem normalmente legumes, vegetais, alimentos
com lactose, gordurosos, frutas com caroço e adoçantes artificiais (HADJIVASILIS,
2019). Uma dieta baixa em FODMAPs é recomendada para pacientes com SII.

NOTA
FODMAPs é o acrônimo derivado do inglês de Fermentable Oligossacarides,
Disaccharides, Monosaccharides And Polyols. São carboidratos de cadeia
curta que são absorvidos de forma incompleta no intestino delgado. Esses
carboidratos, então, entram no cólon, onde são fermentados causando a
produção de gás no TGI inferior (ALGERA; COLOMIER; SIMRÉN, 2019).

43
Além disso, são osmoticamente ativos, aumentando a água no lúmen intestinal,
o que, somado ao mecanismo de fermentação, pode resultar em distensão luminal,
levando a sintomas como dor abdominal, diarreia, flatulência e distensão abdominal
(ALGERA; COLOMIER; SIMRÉN, 2019).

A lactose é um dissacarídeo composto de glicose e galactose, sendo um


FODMAPs quando não digerido no intestino delgado. A digestão da lactose ocorre no
intestino delgado, onde indivíduos tem ou não a persistência da enzima lactase – a
qual realiza a digestão da lactose – no lúmen intestinal, e é regulada geneticamente
(ALGERA; COLOMIER; SIMRÉN, 2019).

Estudos investigam o uso de dieta baixa ou isenta em lactose para pacientes


com SII, enfatizam que é importante considerar a intolerância à lactose na investigação
diagnóstica de pacientes com suspeita de SII. Porém, não há evidências suficientes para
recomendar uma dieta baixa ou isenta em lactose para todos os pacientes com SII, ela
deve ser individualizada e verificada a sintomatologia do paciente (ALGERA; COLOMIER;
SIMRÉN, 2019).

Pacientes com SII se beneficiam de uma dieta baixa em FODMAPs, porém, ela
é muito restritiva, sendo necessário acompanhamento com nutricionista experiente
para prevenção de deficiências nutricionais e perda de peso desnecessária (HADJI-
VASILIS, 2019).

Como conclusão, as experiências clínicas evidenciam que o manejo nutricional


para pacientes com SII é complexo. A literatura traz resultados conflitantes nos estudos
que envolveram a dietoterapia para SII, e não se sabe os efeitos a longo prazo das
terapias propostas.

No momento, a ciência está voltada para a dieta com baixo teor de FODMAPs
e a dieta isenta em glúten para apenas alguns pacientes, sendo necessárias mais
pesquisas para elucidar os mecanismos e desenvolver opções de tratamentos melhores
e mais individualizadas para os pacientes com SII (ALGERA; COLOMIER; SIMRÉN, 2019).

3 COLITE ULCERATIVA E DOENÇA DE CROHN


A colite ulcerativa é uma doença inflamatória difusa não específica, de causa
desconhecida e que afeta continuamente a mucosa colônica proximal do reto e
muitas vezes forma erosões e/ou úlceras (MATSUOKA et al., 2018). Quando o intestino
grosso é amplamente afetado durante um longo período de tempo, aumenta o risco de
desenvolver câncer. Frequentemente, ocorrem ciclos de recidiva e remissão que podem
ser acompanhados por complicações extraintestinais (KORNBLUTH; SACHAR, 2010).

44
A Doença de Crohn (DC) é uma doença inflamatória crônica desconhecida, na
qual áreas descontínuas são afetadas por uma inflamação granulomatosa transmural
(afeta todas as camadas da parede, da mucosa até a serosa) e/ou fístula, afetando
qualquer região do TGI (da boca ao ânus), porém, a região mais acometida é o intestino
grosso, delgado e a região perianal (MATSUOKA et al., 2018).

3.1 FISIOPATOLOGIA DA COLITE ULCERATIVA


Na fase inicial, a mucosa é hiperêmica, apresenta grânulos, com coloração
avermelhada e friável, sangra com facilidade, pouco muco, pode apresentar pontos
hemorrágicos que se tornam purulentos e posteriormente formam ulcerações. As úlceras
estão alinhadas ao eixo do cólon, ilhas isoladas de mucosa formam protuberâncias
criando pseudopólipos, os quais podem se unir e formar pontes mucosas (BARBOSA;
RODRIGUES, 2012; TURNER, 2010).

Na fase aguda, é possível observar a presença de células inflamatórias como


mastócitos, macrófagos, neutrófilos e linfócitos dos tipos CD4+ e CD8+, os quais, pela
sua citotoxicidade, estão relacionados ao dano de mucosa (NEUMAN, 2007).

O agravamento da doença e sua cronicidade pode provocar uma atrófica da


mucosa, tornando-a achatada e lisa, o espessamento mural e as estenoses não ocorrem,
a superfície serosa é normal, porém, os mediadores inflamatórios presentes podem
danificar a musculatura e perturbar a função neuromuscular levando a uma dilatação
do cólon e ao megacólon tóxico (TURNER, 2010).

A literatura científica levanta a hipótese de que os pacientes com colite ulcerativa


apresentam um aumento da permeabilidade do epitélio intestinal, consequência das
ulcerações, que levam a uma diminuição da função de barreira. Essa diminuição de
função de barreira, somada à inflamação contribuem para a patogênese das doenças
inflamatórias intestinais (DII), pois permitem uma maior exposição a antígenos e ativação
do sistema imunológico, promovendo a liberação de citocinas pró-inflamatórias como
TNF, o qual induz uma disfunção de barreira epitelial por desregular as junções oclusivas
(EDELBLUM, 2009; HYUN; MAYER, 2007).

O tratamento farmacológico é do tipo piramidal, no qual é utilizado como base o


ácido 5-aminossalicílico (5-ASA) e, posteriormente, se necessário, esteroides e imuno-
moduladores, que vão intensificar a eficácia do tratamento, dentre eles podemos citar:
infliximab (IFX), inibidores da calcineurina (ciclosporina A, tacrolimus) ou procedimentos
cirúrgicos, dependendo do grau da doença (KORNBLUTH; SACHAR, 2010).

45
O tratamento farmacológico tem como objetivo atuar no bloqueio ou ativação de
diferentes células e mediadores participantes da inflamação, para interrompê-la ou man-
ter a remissão da doença. Seis classes distintas de medicamentos estão disponíveis para
o tratamento das DII: aminossalicilatos, antibióticos, corticoides, tiopurinas, antagonistas
do ácido fólico como o metotrexato e imunobiológicos (SALES-CAMPOS et al., 2015).

O principal método de diagnóstico é a endoscopia digestiva, além disso testes so-


rológicos (marcadores inflamatórios) e exames radiológicos complementam o diagnóstico
e o acompanhamento (CURY, 2015, p. 41). Entre os exames de imagem sugeridos para o
diagnóstico da colite ulcerativa estão a endoscopia com biópsia, a qual é suficiente para
confirmar o diagnóstico e dar início à terapia medicamentosa em pacientes que apresen-
tam a primeira crise de colite ulcerativa (OSTERMAN; LICHTENSTEIN, 2010, p. 1985).

A colonoscopia não é indicada em pacientes com a colite na forma ativa, pois


há o risco de perfuração. Porém, quando passada a fase ativa se torna uma ferramenta
interessante para estabelecer a extensão da doença e excluir a possibilidade de Doença
de Crohn ou outras que possam complicar a colite ulcerativa (OSTERMAN; LICHTENSTEIN,
2010, p. 1985).

3.2 FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA DE CROHN


Fatores ambientais podem estar relacionados com a DC, como: tabaco,
exposição a antibióticos na infância, contraceptivos orais, anti-inflamatórios não
esteroidais (AINES) e fatores dietéticos (TORRES et al., 2017).

O diagnóstico é feito através de exames de imagem, os quais possibilitam


classificar a gravidade da doença. Esses indivíduos devem ser avaliados com endoscopia
digestiva mais baixa e imagens transversais para avaliar a extensão da doença, é
importante que todo o intestino passe por uma avaliação coerente e correta, pois a DC
pode afetar diversas áreas do TGI superior, as quais possuem implicações prognósticas
e terapêuticas (PITA; MAGRO, 2018).

3.3 DIETOTERAPIA NAS DII


O padrão dietético ocidental mudou consideravelmente. Esse padrão é
dominado pelo alto consumo de açúcar refinado, frutose industrial, desequilíbrio entre
o balanço ômega-6:ômega-3, aumento do consumo de fast foods, alta ingestão de
carne vermelha, margarina, gorduras trans, redução do consumo de frutas e legumes
(fibras), os quais favoreceram consideravelmente a incidência de DII (HOU; ABRAHAM;
EL-SERAG, 2011; ANDERSEN et al., 2012; RICHMAN; RHODES, 2013; CHAPMAN-KIDDELL
et al., 2010).

46
Alguns estudos já tentaram relacionar o consumo de proteínas de origem animal
versus proteína de origem vegetal verificaram que as proteínas de origem vegetal au-
mentaram as bactérias benéficas ao hospedeiro e promoveu a redução das patogênica,
aumentando a produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), melhorando a barreira
intestinal e reduzindo a inflamação. Porém, o consumo de proteínas de origem animal
fez o inverso, aumentou o conteúdo de bactérias patogênicas, reduziu as benéficas,
consequentemente, reduziu a produção de AGCC e aumentou a produção de N-óxido
de trimetilamina (TMAO, do inglês, trimethylamine N-oxide) favorecendo o aparecimento de
doenças cardiovasculares e doença inflamatória intestinal (SINGH et al., 2017).

Sabe-se que pacientes com DII têm uma alta tendência a apresentarem uma
diversidade microbiana intestinal menor, e como consequência uma menor quantidade
de bactérias benéficas, gerando concentrações reduzidas de butirato (um AGCC), o qual
junto com outros AGCC pode promover um efeito anti-inflamatório (LÓPEZ et al., 2016).

NOTA
A microbiota intestinal, através da fermentação de prebióticos, tem a capacidade de pro-
duzir AGCC como acetato, propionato e butirato. Pacientes com DII apresentam conteúdos
fecais de AGCC reduzidos. Dentre os benefícios dos AGCC pode-se citar: 1) inibição da ade-
são de micro-organismos patogênicos nas células intestinais; 2) favoreci-
mento de secreção de bacteriocinas (substância antimicrobiana) por célu-
las epiteliais do cólon; 3) favorecer o crescimento de bactérias benéficas;
4) proporciona efeitos anti-inflamatório para as células epiteliais através da
inibição da ativação de NF-kB e PPARγ e limitando a produção de IL-1β, IL-6
e TNF- α; 5) aumento da síntese de mucina através do estímulo do fator de
crescimento epidérmico (EGFR, do inglês Epidermal growth factor receptor)
favorecendo a homeostase intestinal (EOM et al., 2018).

O que já se sabe é que há benefícios claros em uma dieta rica em frutas,


legumes, óleo de peixe (ômega-3), grãos integrais, azeite de oliva, a qual vai oferecer
micronutrientes como vitamina D, ácidos graxos essenciais, vitaminas, minerais e fibras.
Esses alimentos irão manter uma microbiota saudável e, consequentemente, um epitélio
intestinal saudável (TOMASELLO et al., 2016).

Corroborando, Hou, Abraham e El-Serag (2011), em uma revisão sistemática,


concluíram que a alta ingestão de gorduras totais, ácidos graxos poli-insaturados
(PUFA, do inglês, polyunsaturated fatty acids), ácidos graxos ômega-6 e carne foram
associados ao risco aumentado de desenvolver DII. Em contrapartida, a ingestão de
vegetais, fibras e frutas foi associada a redução desse risco.

47
Como vimos, a dieta ocidental favorece mais a inflamação piorando o quadro
das DII. Partindo desse pressuposto, como deve ser a dietoterapia na DII?

Muito tem se estudado com relação a dietoterapia nas DII, com o objetivo
de controlar e manter a sua remissão. Porém os mecanismos e componentes ainda
levantam contradições. Por isso, não há uma intervenção dietética padrão ouro, os
profissionais da saúde promovem as que julgarem melhores, baseadas nas evidências
científicas disponíveis (HASKEY; GIBSON, 2017).

Certo, então o profissional nutricionista deve guiar sua conduta baseado no que
existe de evidência científica disponível.

Mas e se o paciente se encontra ou na fase ativa ou na fase de remissão da


doença, o que deve ser ajustado na dietoterapia?

• Fase ativa da doença


◦ redução de alimentos crus e ricos em fibras;
◦ se o paciente estiver com diarreia, assegurar a ingestão de líquidos (água sem gás,
chás naturais sem cafeína, bebidas isotônicas e água de coco, são bem toleradas);
◦ alimentos provenientes de carboidratos com menor teor de fibras (arroz branco,
batata, legumes como cenoura, chuchu e abobrinha sem sementes), carnes
magras cozidas, sopas e caldos são indicados na fase aguda;
◦ dar preferência aos temperos naturais (cebola, alho e ervas), evitar condimentos
picantes e molhos prontos (AMBROGINI JUNIOR; LIMA, 2015).

• Fase de remissão da doença


◦ dieta normal com caráter anti-inflamatório;
◦ rica em antioxidantes;
◦ rica em fibras;
◦ gorduras monoinsaturadas;
◦ reintrodução de alimentos menos tolerados pode acontecer nessa fase, porém, a
dieta deve se manter balanceada e saudável sem comprometer o estado nutricio-
nal (AMBROGINI JUNIOR; LIMA, 2015).

• Glutamina

Em estados hipercatabólicos demonstra necessidades metabólicas aumenta-


das. Para o enterócito é um nutriente importante, pois auxilia na melhora das células
mucosa, reduz a translocação bacteriana e preserva os níveis de imunoglobulina A (IgA)
intestinal e extraintestinal.

Em modelos animais demonstrou exercer um papel anti-inflamatório e protetor


contra as lesões intestinais, reduzindo os danos e melhorando o curso da doença
(AMBROGINI JUNIOR; LIMA, 2015).

48
• Vitamina D

Pacientes com DII comumente apresentam deficiência de vitamina D, esses


pacientes correm o risco de baixa densidade óssea e aumento de fraturas, pois somado
à hipovitaminose D, ainda há a doença de longa data e exposição frequente a esteroides.

Assim, os níveis de vitamina D devem ser verificados e, se necessário,


suplementados. Além disso, a vitamina D tem um papel no sistema imunológico inato,
agindo como imunomodulador e reduzindo a inflamação na DII (REICH et al., 2014).

Segundo Gubatan e Moss (2018), a vitamina D tem um papel importante de


proteção da saúde intestinal, sua deficiência é prevalentemente associada a DII e agrava
seus fatores. A suplementação e seus benefícios na DII ainda não são claras, sendo que
mais pesquisas são necessárias para orientar e medir os metabólitos de vitamina D e
sua absorção em pacientes com DII.

• Ômega-3

Os ácidos graxos da classe ômega-6, como o ácido araquidônico e linoleico,


por exemplo, têm propriedades inflamatórias, enquanto os ácidos graxos ômega-3,
ácido alfa-linolênico, eicosapentaenoico e docosahexaenoico possuem efeitos anti-
-inflamatórios.

Os possíveis mecanismos do ômega-3 são: melhora da função de barreira, ex-


pressão diminuída de citocinas, inibição de eicosanoides inflamatórios como prosta-
glandinas E2 e leucotrienos B4, expressão diminuída de moléculas de adesão e altera-
ções de microbiota intestinal (LEWIS; ABREU, 2017).

• Micronutrientes

Em pacientes com DII é comum encontrar deficiência de micronutrientes,


principalmente naqueles já submetidos à ressecção intestinal. O consumo de
micronutrientes é recomendado para se alcançar as demandas, sendo que a atenção
deve estar voltada para o consumo de alimentos que são fontes das respectivas
necessidades. Os erros ou carências nutricionais de micronutrientes devem ser
revertidos com fontes alimentares ou suplementos nutricionais adequados (AMBROGINI
JUNIOR; LIMA, 2015).

49
LEITURA
COMPLEMENTAR
INTESTINO

Gabriela Dors

Trata-se de um órgão endócrino, que possui 10 vezes mais bactérias e 100 ve-
zes mais material genético do que o número de células do organismo. Evidências cien-
tíficas já apontam que o intestino, através dos hormônios sintetizados no TGI, tem res-
ponsabilidade pelo comportamento alimentar.

Buscou-se conhecer afundo o tema, para desenvolver novas estratégias para


combater a epidemia da obesidade, porém, o conhecimento da microbiota e sua impor-
tância para a saúde humana é recente.

As bactérias intestinais não colonizam o intestino de forma uniforme, pois


apresentam diferentes atividades dependendo do local colonizado.

Essas bactérias desempenham função de proteção ao hospedeiro. Sendo as-


sim, o intestino dispõe de três linhas eficientes na defesa e que se comunicam entre si:
microbiota intestinal, barreira mucosa e o sistema imune entérico.

O TGI é colonizado inicialmente pelo parto, principalmente o parto normal, o qual


favorece o contato direto com a microbiota fecal da mãe. Depois, há o contato com o
ambiente e com a amamentação, podendo então essas bactérias sofrerem influência
pelo uso de leite industrializado quando a mãe não consegue amamentar. Além disso, a
administração de antibióticos em excesso ou de forma incorreta promovem uma seleção
natural e enfermidades diarreicas são causadas pelo desequilíbrio bacteriano intestinal.

Outro ponto importante é o fato de as bactérias intestinais agirem em nutrientes,


permitindo um melhor desempenho intestinal, sendo o principal deles o carboidrato,
o qual é fermentado no cólon e formam os ácidos graxos de cadeia curta (AGCC)
absorvidos na mucosa, como o butirato e o popionato. O butirato age nos mediadores da
inflamação e no geral os AGCC podem inibir a expressão de citocinas pró-inflamatórias.

Porém, o problema está quando acontece um desequilíbrio da microbiota. Isso


pode acarretar perda de efeitos imunes importantes, associando então a um núme-
ro de doenças inflamatórias e imunomediadas, além de permeabilidade intestinal e
constipação.

50
O desequilíbrio na microbiota gera a quebra de peptídeos e reabsorção de toxi-
nas de maneira inadequada, induzindo o surgimento de patologias, já que as funções da
microbiota intestinal estão disfuncionais.

As causas da disbiose são inúmeras, mas podemos citar a idade, estresse,


disponibilidade de material fermentável, má digestão, tempo de trânsito intestinal, pH
intestinal, sistema imunológico do hospedeiro.

Para reestabelecer esse equilíbrio microbiano, pode-se utilizar a dieta, por meio
da ingestão de probióticos, prebióticos e simbióticos ou usando medicamentos.

FONTE: Adaptado de <https://institutoanapaulapujol.com.br/iappmais/intestino/>.


Acesso em: 23 fev. 2021.

51
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:

• A interação alterada entre intestino-cérebro, hipersensibilidade visceral, sofrimento


psicossocial e distúrbios motores gastrointestinais é considerada importante na SII
ou, pelo menos, para uma parte dos pacientes com SII.

• Alguns estudos demonstram que a alta ingestão de fibras insolúveis aumenta o con-
teúdo de água e volume fecal, resultando em um trânsito gastrointestinal acelerado,
o que explica a vantagem de pacientes com SII do tipo constipação consumir esse
tipo de fibra.

• Apesar de pacientes com SII apresentarem ausência de marcadores para doença


celíaca, há evidências de que eles se beneficiam de uma dieta isenta de glúten.

• Uma dieta baixa em FODMAPs é recomendada para pacientes com SII, pois esses
carboidratos entram no cólon, onde são fermentados, causando a produção de gás
no TGI inferior.

• A Colite Ulcerativa é uma doença inflamatória difusa não específica, de causa des-
conhecida e que afeta continuamente a mucosa colônica proximal do reto e muitas
vezes forma erosões e/ou úlceras.

• A Doença de Crohn é uma doença inflamatória crônica desconhecida, na qual áreas


descontínuas são afetadas por uma inflamação granulomatosa transmural (afeta to-
das as camadas da parede, da mucosa até a serosa) e/ou fístula, afetando qualquer
região do TGI (da boca ao ânus), porém, a região mais acometida é o intestino grosso,
delgado e a região perianal.

• O padrão dietético de alto consumo de açúcar refinado, frutose industrial, desequilí-


brio entre o balanço ômega-6:ômega-3, aumento do consumo de fast-foods, alta in-
gestão de carne vermelha, margarina, gorduras trans, redução do consumo de frutas
e legumes (fibras), os quais favoreceram consideravelmente a incidência de DII.

• Há benefícios claros em uma dieta rica em frutas, legumes, óleo de peixe (ômega-3),
grãos integrais, azeite de oliva, pois oferece micronutrientes como vitamina D, ácidos
graxos essenciais, vitaminas, minerais e fibras. Esses alimentos irão manter uma mi-
crobiota saudável e, consequentemente, um epitélio intestinal saudável.

52
AUTOATIVIDADE
1 Muitas vezes o paciente possui sintomas dor abdominal ou desconforto abdominal,
irregularidade nas fezes e distensão abdominal, os quais prejudicam a sua qualidade
de vida, pois os sintomas podem ser debilitantes, de leves a moderados. Geralmente,
a SII está associada a outras comorbidades somáticas como síndrome de dor, bexiga
hiperativa e enxaqueca, depressão, ansiedade e sensibilidade visceral. Além disso,
existe uma distinção entre os subtipos de SII. Sobre a classificação dos subtipos de
SII, analise as asserções a seguir:

I- SII-C possui como frequência de fezes >25% constipação, <25% de diarreia


II- SII-D possui como frequência de fezes >25% diarreia, <25% constipação
III- SII-M possui como frequência de fezes >25% constipação e <25% diarreia
IV- SII-U possui como frequência de fezes <25% constipação e <25% diarreia

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a alternativa II está correta.
b) ( ) Apenas a alternativa III está incorreta.
c) ( ) As alternativas II, III e IV está incorreta.
d) ( ) Todas as alternativas estão corretas.

2 Alguns estudos demonstram que a alta ingestão de fibras insolúveis aumenta


o conteúdo de água e volume fecal, resultando em um trânsito gastrointestinal
acelerado, o que explica a vantagem de pacientes com SII do tipo constipação
consumir esse tipo de fibra. Porém, o consumo de fibras pode levar a inchaço,
distensão abdominal e flatulência, sendo esse problema menor proeminente com
fibras solúveis do que com insolúveis. Qual a fibra que ganha destaque em pacientes
que apresentam constipação?

a) ( ) Goma guar.
b) ( ) Betaglucana.
c) ( ) Psyllium.
d) ( ) Todas as alternativas estão corretas.

3 A intolerância alimentar é um dos fatores que mais causam sintomas em pacientes


com SII. Esses pacientes tendem a desencadear seus sintomas após consumo de
determinados alimentos, que incluem normalmente legumes, vegetais, alimentos
com lactose, gordurosos, frutas com caroço e adoçantes artificiais. Qual dieta é
recomendada para pacientes com SII?

53
4 Na fase inicial, a mucosa é hiperêmica, apresenta grânulos, com coloração avermelha-
da e friável, sangra com facilidade, pouco muco, pode apresentar pontos hemorrágicos
que se tornam purulentos e posteriormente formam ulcerações. Qual doença é?

a) ( ) SII.
b) ( ) Colite ulcerativa.
c) ( ) Doença de Crohn.
d) ( ) Todas as alternativas estão corretas.

5 Muito tem se estudado com relação a dietoterapia nas DII, com o objetivo de controlar
e manter a sua remissão. Porém os mecanismos e componentes ainda levantam
contradições. Por isso, não há uma intervenção dietética padrão ouro. Descreva o
que é importante levar em consideração na na fase ativa e na fase de remissão da DII:

54
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65
66
UNIDADE 2 —

NUTRIÇÃO CLÍNICA:
OBESIDADE E DOENÇAS
CARDIOVASCULARES

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender que a obesidade é uma doença multifatorial;

• reconhecer a fisiopatologia envolvida na obesidade e doenças cardiovasculares;

• conhecer a dietoterapia específica para cada patologia que envolve a obesidade e o


sistema cardiovascular;

• desenvolver o olhar clínico necessário para o manejo da obesidade e das doenças


cardiovasculares.

PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – OBESIDADE
TÓPICO 2 – DOENÇAS CARDIOVASCULARES 1
TÓPICO 3 – DOENÇAS CARDIOVASCULARES 2

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

67
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!

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68
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
OBESIDADE

1 INTRODUÇÃO
A obesidade vem sendo, de longe, um dos maiores problemas de saúde pública
do país. Souza, França e Cavalcante (2017) apontaram através do Global Burden of
Disease Brasil – GBD que a obesidade, glicemia de jejum e uso de álcool aumentaram
significativamente, sendo consistente com dados da maioria dos países do mundo.

O excesso de peso e a obesidade são fatores de risco para inúmeras doenças


como as cardiovasculares (as quais iremos discutir mais para frente, nesta unidade),
diabetes, câncer de cólon, de reto e de mama, cirrose e outras (ANS, 2017).

Trata-se de uma doença multifatorial que apresenta recidivas e é muitas vezes


silenciosa, que, se não prevenida ou tratada, impacta de forma devastadora a vida do
indivíduo e a saúde pública (ANS, 2017).

Dados do IBGE mostram que a proporção de obesos na população de 20 anos


ou mais de idade do país mais que dobrou, entre 2003 e 2019, passando de 12,2% para
26,8%, sendo que entre as mulheres subiu de 14,5% a 30,2% (CAMPOS, 2020).

A obesidade sofre influência da globalização e do marketing exacerbado em


cima de alimentos processados, além disso, tem o consumismo, a necessidade de pra-
zeres rápidos e respostas imediatas, tornando a obesidade uma questão social. Assim,
podemos concluir que existe uma complexa relação entre o corpo, saúde, alimento e
sociedade, que varia conforme as inserções sociais e concepções acerca do tema em
que cada indivíduo está inserido (BRASIL, 2014).

69
IMPORTANTE
O Ministério da Saúde decidiu aderir à rede de estudos da Carga Global
de Doenças (Global Burden of Disease – GBD) com o objetivo de inserir
o Brasil nas estimativas e análises da carga de doença. O estudo GBD é
publicado há cerca de 20 anos, representando um esforço científico com
o objetivo de quantificar a redução da saúde em decorrência de doenças,
lesões e fatores de risco por idade, sexo e tempo (SOUZA; FRANÇA;
CAVALCANTE, 2017).

2 FISIOPATOLOGIA DA OBESIDADE
De uma forma geral, a obesidade é um desequilíbrio energético de longo prazo
devido a um desequilíbrio entre a quantidade de calorias consumida com a quantidade
de calorias gastas. Se pensarmos na evolução, o ser humano e seus predecessores
sobreviveram a períodos de subnutrição, portanto, a seleção natural contribuiu para um
genótipo que favorece a alimentação em excesso, baixo gasto energético e inatividade física
(BLÜHER, 2019) (Figura 1). Ou seja, seres humanos que suportavam longos períodos de fome,
armazenavam e mobilizavam energia de forma mais eficientes podem ter se reproduzido
mais do que aqueles que não eram adaptados dessa forma, isso levou a uma super-
representação de variantes genéticas que promoveram a capacidade de comer rápido,
absorver calorias em um grau mais elevado e expandir os estoques de energia no tecido
adiposo de forma eficiente.

O problema é que os tempos mudaram e a supernutrição surgiu ameaçando a saúde,


invertendo o quadro no qual mais pessoas morrem de sobrepeso e obesidade do que de
baixo peso e desnutrição (BLÜHER, 2019).

70
FIGURA 1 – FATORES QUE INFLUENCIAM NA OBESIDADE

FONTE: Adaptada de Blüher (2019)

2.1 GENÉTICA
Como você já sabe a obesidade está aumentando de forma exponencial em todo
o mundo, afetando tanto países desenvolvidos como os em desenvolvimento, gerando
um impacto significativo na saúde pública e na economia. Você já sabe também que
a obesidade favorece inúmeras doenças como Diabetes Mellitus tipo 2, dislipidemia,
doença arterial coronariana (que iremos ver mais à frente), acidente vascular cerebral,
hipertensão, refluxo gastroesofágico (que vimos na Unidade 1), vários tipos de câncer,
doenças hepáticas (doença hepática gordurosa não alcoólica – DHGNA; cirrose; carcinoma
hepatocelular), além de afetar o sono, causar depressão e doenças musculoesqueléticas
(ROHDE et al., 2019) (Figura 2).

71
FIGURA 2 – OBESIDADE E OS ÓRGÃOS E SISTEMAS

• Transtorno de humor • Inflamação crônica


• Estigma social • Imunidade alterada
• Aumento do risco de infecção

• Doença cardiovascular crônica • Aumento do VO2, produção de CO2


• Aumento do débito cardíaco e esforo pra respirar
• Monitoramento padrão menos • Complacência e capacidade residual
confiável funcional reduzida
• Risco de ressuscitação com fluidos • Apneia obstrutiva do sono e sídrome
insuficiente de hipoventilação/via aérea difícil

• Doença hepática gordurosa não- • Doença renal crônica


alcoólica • Risco aumentado de lesão
• Metabolismo alterado de drogas renal aguda
• Dislipidemia induzida pela
nutrição

• Aumento da massa gorda (fonte


de energia)
• Farmacocinética alterada • Sarcopenia oculta
• Dosagem de drogas adaptada • Hiperglicemia/Dislipidemia
• Alvos calóricos e proteicos
baseados no peso ajustado

FONTE: Adaptada de Schetz et al. (2019)

O aumento da prevalência da obesidade durante os últimos 50 anos se dá pela


interação complexa de mudanças ambientais (ambiente obesogênico) e a predisposição
genética do indivíduo. Estudos têm correlacionado muito os fatores ambientais, como
o sedentarismo e o alto consumo de alimentos com alta densidade energética somado
a um gasto energético reduzido, porém, há sim uma forte influência da genética na
obesidade (ROHDE et al., 2019).

Os fatores ambientais contribuem para a variabilidade da etiologia da obesidade,


isto é, devido à variabilidade individual substancial induzida por interações gene-
ambiente, e isso somado a nutrição inadequada, sedentarismo e intervenções para
perda de peso induzem alterações dinâmicas nas assinaturas epigenéticas, modulando
a atividade do gene (ROHDE et al., 2019).

Os genes atuam na manutenção de peso e gordura corporal estáveis durante


o tempo, controlando vias eferentes (leptina, nutrientes, sinais nervosos, e outros), de
mecanismos centrais (neurotransmissores hipotalâmicos) e de vias aferentes (insulina,
catecolaminas, sistema nervoso autônomo (SNA). Ou seja, o balanço energético (energia
ingerida e energia gasta) parece depender cerca de 40% da herança genética, afetando
o apetite e o gasto energético (MARQUES-LOPES et al., 2004).

72
A maioria dos indivíduos com obesidade apresenta a obesidade multifatorial
atribuída pela interação entre múltiplos genes (poligênica). Mais de 870 SNPs (do inglês,
Single Nucleotide Polymorphisms) – uma variação na sequência de DNA que afeta
somente uma base (Adenina, Timina, Citosina ou Guanina) – foram identificados em
larga escala. Os avanços recentes têm mostrado que os loci associados à obesidade
carregam genes envolvidos nas vias que afetam neurocircuitos da regulação do
apetite e da saciedade (BDNF, MC4R e NEGR), secreção e ação da insulina (TCF7L2,
IRS1), adipogênese e metabolismo lipídico (FTO, RPTOR, MAP2K5) (ROHDE et al., 2019).
Falar de todos os genes individualmente levaria tempo e precisaria de uma unidade só
para isso, além disso, muitas pesquisas ainda estão sendo feitas para elucidar todos os
mecanismos envolvidos com cada um deles. Mas que tal conhecermos o gene FTO?

O FTO (do inglês, Fat mass- and obesity-associated gene) é fortemente ligado
a indicadores antropométricos como o IMC, por exemplo. Além disso, desempenha um
papel fundamental na regulação do desenvolvimento do tecido adiposo e funções no
tamanho e composição corporais. Evidências de estudos experimentais apontam que
o FTO é altamente expresso em áreas cerebrais importantes para a regulação do con-
sumo de energia e do sistema de recompensa, ou seja, está associado ao controle do
apetite e saciedade.

O FTO faz parte de uma via que medeia a neuroregulação da ingestão de


alimentos, com o bloqueio do sinal da leptina, então levanta-se a hipótese de que
polimorfismos nesse gene pode estar associado ao controle alimentar no hipotálamo
associado a transtornos alimentares como o da Transtorno de Compulsão Alimentar
Periódica (TCAP) (HORVATH, 2017).

Por ser altamente expresso em regiões-chave no cérebro, como o hipotálamo,


os polimorfismos no FTO podem influenciar a maneira como as células percebem os
níveis de aminoácidos, e estudos mostram evidências de que os indivíduos com SNPs
suscetíveis no FTO não apenas consomem mais alimentos, mas também mostram
alteração na preferência de nutrientes, sugerindo que o FTO pode influenciar a
composição dos macronutrientes da dieta. Sendo assim, o FTO pode revelar novos alvos
terapêuticos na batalha contra a epidemia da obesidade (LOOS; YEO, 2013).

INTERESSANTE
Estimativas apontam que a obesidade observada na população se deve a
diferenças genéticas interindividuais, variando de 40 a 70%. Por muitos anos, a
identificação dos genes associados a características da obesidade foi dificultada
por uma compreensão limitada da arquitetura genética do genoma humano
e das vias biológicas implicadas na obesidade. Em 2005, com a abordagem de
associação do genoma, a qual foi uma abordagem livre de hipóteses possibilitada

73
por avanços na tecnologia de genotipagem de alto rendimento, aumentou o ritmo de
descoberta do gene. Os estudos de associação do genoma (GWAS, do inglês, genome-wide
association studies) identificaram aproximadamente 2.000 loci genéticos com associações
robustas para mais de 300 características e doenças comuns, incluindo pelo menos 75 loci
de suscetibilidade à obesidade. O FTO foi o primeiro gene identificado por meio de GWAS,
e continua sendo o loci com o maior efeito no índice de massa corporal (IMC) e risco de
obesidade, mais amplamente replicado com vários traços de obesidade ao longo da vida
através de diversos ancestrais (LOOS; YEO, 2013).

2.2 AMBIENTAL
Você já parou para pensar que o ambiente em que vivemos pode ter influência
na obesidade?

Estudos epidemiológicos identificaram vários fatores de risco modificáveis para


obesidade e doença cardiovascular (DCV), como: consumo de bebidas açucaradas,
alimentos fritos, dieta de má qualidade e estilo de vida sedentário. Esses fatores
ambientais modificam o risco genético de obesidade e doenças relacionadas (HEIANZA;
QI, 2018).

O primeiro ponto que vamos conversar é sobre o estresse. Se olharmos a


evolução humana, faz sentido que o estresse afete os processos metabólicos. Esse
sistema de estresse evoluiu para nos ajudar a lidar com situações de risco de vida,
que nos tempos ancestrais envolviam considerável esforço metabólico. O sistema de
resposta ao estresse libera glicose na corrente sanguínea para que nossos músculos
tenham energia para fugir (ou lutar) de predadores e outras ameaças. Porém o que
vemos atualmente são estressores psicológicos (brigas, trabalho, preocupações
financeiras) em vez de físicos, porém, nosso corpo responde como se o estresse fosse
físico, nos deixando em uma situação de excesso de energia que tende a ser depositado
na forma de gordura corporal (TOMIYAMA, 2019).

O estresse e a obesidade estão ligados por mudanças que tem como objetivo
acomodar os efeitos do estresse, em vez de alterar o evento estressante real. Ou seja,
os caminhos que levam do estresse à obesidade são esforços do indivíduo para lidar
com os aspectos emocionais negativos do estresse (Figura 3), que pode ser agudo ou
crônico (TOMIYAMA, 2019).

74
FIGURA 3 – VIAS DE CONEXÃO DO ESTRESSE E OBESIDADE

Cognição Fisiologia
• Função executiva • Eixo Hipotalâmico-
• Auto regulação pituitária-adrenal
• Circuito de recompensa
• Microbioma
Estigma
Estresse Obesidade do peso
Comportamento Bioquímica
• Comer • Leptina e grelina
• Atividade física • Neuropeptídeo Y
• Dormir

FONTE: Tomiyama (2019, p. 3)

Outro ponto importante é o sedentarismo. A atividade física e o estilo de vida


sedentário podem modificar o risco genético de obesidade, um exemplo é a relação
entre o genótipo FTO e a obesidade, a qual é atenuada entre pessoas com altos níveis
de atividade física (HEIANZA; QI, 2018).

Evidências (estudo com mais de 200.000 adultos) sugerem interações entre


variantes genéticas e atividade física na adiposidade, o efeito de aumento do IMC foi
atenuado em até 30% nos indivíduos fisicamente ativos em comparação com os não
ativos (GRAFF et al., 2017). Isso demonstra, que a atividade física e o comportamento
sedentário podem modificar o risco genético de obesidade, ganho de peso e doenças
cardiovasculares (HEIANZA; QI, 2018).

Além disso, a atividade física contribui para o gasto energético diário, e quanto
maior o balanço energético negativo, maior é a perda de peso. Esse aumento do gasto
energético pode ser obtido pelo aumento da atividade física através de exercícios
supervisionados ou não, atividade ocupacional, trabalho doméstico, cuidados pessoais,
deslocamento e atividades de lazer. Os mecanismos envolvidos são a aceleração
da quebra das principais reservas energéticas do organismo, ou seja, glicogênio e
triacilgliceróis, levando à perda de peso (PETRIDOU; SIOPI; MOUGIOS, 2019).

O exercício acelera a glicogenólise no músculo e no fígado; glicólise, o ciclo do


ácido cítrico e fosforilação oxidativa no músculo; lipólise no tecido adiposo e músculo;
oxidação de ácidos graxos no músculo. Todo esse processo ocorre por meio da secreção
estimulada de hormônios e mudanças nas concentrações de substratos que levam à
ativação de enzimas que catalisam etapas importantes nas vias catabólicas citadas
anteriormente (PETRIDOU; SIOPI; MOUGIOS, 2019).

Petridou, Siopi e Mougios (2019) apontam em sua revisão que o exercício é


indispensável para o controle da obesidade, porém, é uma ferramenta subestimada visto
que os indivíduos dão preferências a outros meios como medicamentos e cirurgias. Os

75
autores colocam que os profissionais de saúde devem entender melhor que o exercício
é um “medicamento” importante e explorar suas características únicas, indo além da
contribuição para a perda de peso e gordura corporal, manutenção do peso corporal e
redução de gordura e aptidão física na obesidade, contribuindo para o bem-estar mental,
social e melhora da qualidade de vida. Além disso, o exercício é capaz de combater a
inflamação crônica de baixo grau que está associada à obesidade.

2.3 HORMÔNIOS E NEUROTRANSMISSORES


A ingestão de energia (alimentação) é metabolizada e usada para alimentar
o metabolismo basal, a termogênese e o gasto de energia (atividade física), quando
ocorrem excessos acontece o armazenamento como forma de gordura nas células
adiposas para uso posterior (GREENWAY, 2015).

Como vimos, o peso corporal é influenciado por fatores como: genética,


ambiental e comportamental, mas sabemos que fatores hormonais também exercem
um papel importante, e qual será esse papel?

O sistema neuro-hormonal é complexo e desempenha uma importância bio-


lógica fundamental no balanço energético e fornecimento de nutrientes. Os sinais en-
volvidos na regulação homeostática da ingestão de alimentos, balanço energético e
corporal são centralizados no núcleo arqueado do hipotálamo, tronco cerebral caudal e
partes do córtex e sistema límbico. Neuropeptídeos e hormônios envolvidos na regula-
ção do apetite funcionam centralmente no hipotálamo, como o neuropeptídeo Y (NPY) e
o AgRP (do inglês, agouti-related peptide), os quais são orexígenos (estimulam a fome),
pró-opiomelanocortina (POMC) é orexígena (suprime a fome) (GREENWAY, 2015).

O hipotálamo processa sinais periféricos que transmitem informações sobre a in-


gestão de alimentos de curto prazo (disponibilidade de nutrientes) ou balanço de energia
de longo prazo (estoque de energia) para atingir a homeostase energética. É criado um
ciclo de feedback entre o cérebro e a periferia (trato gastrointestinal, pâncreas, fígado,
músculo e tecido adiposo). Os sinalizadores de curto prazo são os hormônios orexígenos
como a grelina e o polipeptídeo inibidor gástrico; os anorexígenos incluem o peptídeo 1
semelhante ao glucagon (GLP1), peptídeo YY (PYY) e colecistoquinina (CCK) do trato gas-
trointestinal; os anorexígenos do pâncreas como polipeptídio pancreático (PP), amilina e
insulina; e os anorexígenos dos adipócitos como a leptina (GREENWAY, 2015).

A insulina reduz a ingestão alimentar de forma central, mas causa ganho de


peso quando age perifericamente. O hipotálamo interage com as vias de recompensa,
no sistema cortiço-límbico, associadas à palatabilidade (visão, olfato e sabor) dos
alimentos. Essas vias de recompensa hedônica podem substituir o sistema homeostático
e aumentar o desejo por alimentos considerados ricos em energias mesmo se houver

76
uma saciedade fisiológica e que os estoques estejam repletos de energia. Outros
neurotransmissores cerebrais também desempenham papel importante nas vias de
recompensa e na mediação do impulso do prazer para comer, como os mecanismos
dopaminérgicos, opioidérgicos e canabinoides (GREENWAY, 2015).

NOTA
Vamos relembrar alguns hormônios envolvidos nos mecanismos de fome e saciedade?

• Via orexígena (NAVES, 2014):


◦ Grelina: produzida nos rins, intestino, placenta, hipófise, no hipotálamo e no estôma-
go. Regula a ingestão alimentar, mecanismos de recompensa, além de ser modula-
dora do estresse e combater o envelhecimento.
◦ Neuropepetídeo Y: é um hormônio orexígeno mais potente. Promove um balanço
energético positivo, estimulando o aumento da ingestão alimentar, a diminuição do
gasto energético e o aumento da lipogênese.

• Via anorexígena (NAVES, 2014):


◦ Leptina: produzida nos adipócitos, parece informar o hipotálamo o ta-
manho das suas reservas de gordura corporal, sendo responsável pela
redução do consumo alimentar e pelo aumento do gasto energético.
◦ Insulina: esse hormônio parece ser responsável por informar a ade-
quação das reservas energéticas ao hipotálamo, sendo importante
para a regulação do peso corporal a longo prazo.
◦ PYY: responsável pela inibição do apetite e importante para o término
da refeição.

2.4 COMPORTAMENTO ALIMENTAR


Um outro ponto importante é o comportamento alimentar na obesidade. Como
vimos anteriormente, o estresse e a obesidade estão interligados e a literatura coloca
que o estresse agudo ativo às respostas adaptativas, mas o estresse prolongado leva a
desgastes dos sistemas regulatórios provocando alterações biológicas que enfraquecem
os processos adaptativos ao estresse aumentando a suscetibilidade a doenças. Ou seja,
quanto mais prolongada e intensa a situação estressante, menor o senso de domínio e
adaptabilidade do organismo, por isso a resposta ao estresse e o risco de desregulação
homeostática persistem (YAU; POTENZA, 2013).

77
Uma das homeostases perdidas é a do comportamento alimentar, e isso tem
sido estudado há muitos anos. Yau e Potenza (2013) sugerem diferenças individuais
na resposta à ingestão de alimentos, sugerindo que há relação com o tipo específico
de estressor, duração da provocação do estresse e variações nos níveis de saciedade e
fome no início dos estudos.

Outro ponto importante e complexo é entender quais alimentos são selecionados


ou evitados sobre estresse. Tanto em humanos quanto em animais, observa-se uma
mudança na escolha por alimentos mais prazerosos e saborosos, favorecendo os com
alto teor de gordura e açúcares. Achados sugerem que o estresse pode promover
padrões alimentares irregulares e fortalecer as redes de alimentação hedônica, e esses
efeitos são exacerbados em indivíduos com sobrepeso e obesos (YAU; POTENZA, 2013).

Além do estresse, existem também os fatores psicológicos que provocam


sofrimento no paciente obeso devido ao preconceito social e a discriminação contra
a obesidade, como as características do seu comportamento alimentar. Outros
problemas existentes são a depreciação da imagem física, a preocupação opressiva
com a obesidade, tornando o paciente obeso inseguro devido a sua instabilidade de
manter a perda de peso, além disso, há a falta de confiança, sensação de isolamento em
decorrência da inabilidade da família e dos amigos em entender o problema, humilhação
devido ao intenso preconceito e discriminação ao qual esses indivíduos são submetidos,
remete a uma grande carga psicológica (BERNARDI; CICHELERO; VITOLO, 2005).

Evidências apontam que esses indivíduos buscam a comida para resolver ou


compensar problemas dos quais, às vezes, não tem nem consciência. Esses pacientes
podem apresentar dificuldades em obter prazer em relações sociais (pela rejeição ou
discriminação que os levam ao isolamento), porém, esse sentimento contribui para
que o obeso enxergue a comida como uma importante fonte de prazer e que, devido
ao preconceito, restringe suas relações afetivas e sociais, tornando um ciclo vicioso,
no qual há o ganho progressivo de peso e uma solidão cada vez maior (BERNARDI;
CICHELERO; VITOLO, 2005).

A abordagem terapêutica multiprofissional tem como objetivo interromper o


ciclo vicioso e avaliar as intensas demandas psicológicas causadas pela história clínica
pregressa do paciente, se houve restrições alimentares e pressão social para ser magro.
A pressão social e as restrições podem levar a dietas extremamente restritivas, as quais
desencadeiam reações psicológicas e fisiológicas que favorecem o aumento do peso e
a obesidade (BERNARDI; CICHELERO; VITOLO, 2005).

78
3 DIETOTERAPIA NA OBESIDADE
Agora que já entendemos que a obesidade é uma doença multifatorial e complexa,
vamos compreender como a nutrição, através da dietoterapia, pode auxiliar esses
indivíduos na busca pela perda de peso e melhor qualidade de vida.

3.1 RESTRIÇÃO CALÓRICA


O gasto energético é variável e sofre influência das mudanças no peso corporal,
e o equilíbrio entre a energia ingerida (calorias) e a demanda de energia corporal é
fundamental para o controle do peso corporal (GREENWAY, 2015).

O equilíbrio energético é integrante de modelos quantitativos de mudança de


peso corporal fornecendo informações úteis sobre a perda e recuperação de peso.
Mas para entendermos melhor, precisamos esclarecer alguns conceitos básicos
(GREENWAY, 2015).

O gasto energético total (GET) engloba o gasto energético em repouso (GER,


a energia necessária para as funções celulares), o não GER (energia gasta durante a
atividade física) e o efeito térmico do alimento (energia gasta para processar o alimento
ingerido). A manutenção do peso corporal reduzido está associada a mudanças no
gasto de energia, podendo favorecer o ganho ou a perda de peso. A perda de peso
induzida pela dieta promove uma redução do GET, GER e não GER, e isso se dá, pois
há uma redução na massa corporal e aumento da eficiência metabólica, ou seja, se
menos massa total deve ser movida durante a atividade física, a mesma atividade terá
um menor gasto energético reduzindo assim o não GER se os níveis de atividade física
são mantidos os mesmos (GREENWAY, 2015) (Figura 4).

79
FIGURA 4 – GASTO ENERGÉTICO E ATIVIDADE FÍSICA

FONTE: Adaptada de Hill, Wyatt e Peters (2012)

Na prática clínica, é importante que a comunicação entre os profissionais da


nutrição e da educação física esteja alinhada, pois, além da modificação dietética, vimos
que é necessária modificação de carga de treino para que o indivíduo se mantenha em
uma perda de peso constante.

A restrição alimentar ou calórica é utilizada comumente para o tratamento da


obesidade. Essa restrição gera a perda de peso, mas, como vimos, produz diminuições
compensatórias em outros componentes que fazem parte do balanço energético, ou
seja, reduz o gasto energético e das reservas de energia corporal e aumento da fome.
Como a necessidade energética reduz com a perda de peso, uma estratégia é combinar
um nível mais baixo de gasto de energia com uma menor ingestão energética, porém
na prática não é o ideal. O aumento da atividade física serve para aumentar então o
gasto energético total, permitindo uma ingestão energética razoável para o nível de
peso corporal e exigindo uma menor restrição alimentar. Assim, os indivíduos que se
envolvem em volumes maiores de atividades físicas, possuem uma restrição calórica
adequada para o seu peso e têm sucesso na manutenção da perda de peso no longo
prazo (HILL; WYATT; PETERS, 2012).

80
3.2 CETOGÊNICA
Nesta etapa, precisaremos resgatar um pouco dos conceitos da bioquímica da
nutrição, tudo bem?

A insulina ativa vias que armazenam energia derivada dos carboidratos, porém,
quando há ausência ou escassez de carboidratos da dieta o nível de insulina é reduzido
e lava à redução da lipogênese e do acúmulo de gordura. O baixo consumo drástico de
carboidratos (abaixo de 50 g/dia) promovem uma baixa nas reservas de glicose, tanto
para a oxidação normal da gordura por meio do fornecimento de oxaloacetato no ciclo
de Krebs como para o fornecimento de glicose para o sistema nervoso central (SNC). O
SNC não utiliza gordura como energia, somente glicose, e após três a quatro dias sem
carboidratos o SNC é forçado a encontrar fontes de energia alternativas derivadas da
superprodução de acetil coenzima A (CoA), isso leva à produção dos corpos cetônicos
(acetoacetato, ácido β-hidroxibutírico e acetona) na matriz mitocondrial e no fígado
(PAOLI et al., 2013).

Os corpos cetônicos são usados pelos tecidos como fonte de energia por meio
de uma via que leva à formação a partir do β-hidroxibutirato de duas moléculas de acetil
CoA, utilizadas finalmente no ciclo de Krebs (PAOLI et al., 2013).

Há fortes evidências de que a dieta cetogênica é eficaz para a perda de peso,


porém não há um consenso na literatura sobre os mecanismos pelos quais isso
acontece. Paoli et al. (2013) sugerem que o efeito da dieta cetogênica na perda de peso
pode ser causado por:

• Redução do apetite devido ao maior efeito de saciedade das proteínas, efeitos sobre
os hormônios de controle do apetite e a uma possível ação supressora de apetite
direta dos corpos cetônicos.
• Redução da lipogênese e aumento da lipólise.
• Redução do quociente respiratório de repouso e, portanto, maior eficiência metabólica
no consumo de gorduras.
• Aumento dos custos metabólicos da gliconeogênese e do efeito térmico das proteínas.

81
3.3 LOW CARB
As dietas com baixo teor de carboidratos (LCD, do inglês, Low Carb Diet) (Quadro
1) tem como hipótese a redução da insulina (que já vimos que produz um estado anabólico
de armazenamento de gordura), melhora a função cardiometabólica e induz a perda de
peso. Ainda se debate no meio científico sobre os mecanismos das LCD que induzem
a perda de peso. A questão que devemos nos atentar é que, ao reduzir carboidratos
da dieta, a ingestão de proteína e gorduras aumenta para compensar. A hipótese que
se levanta então é que as proteínas e gorduras aumentam a saciedade e produzem
menos hipoglicemia concomitante, e isso reduz a fome e a ingestão geral de alimentos
e produz um déficit calórico. Apesar das controvérsias, as revisões sistemáticas trazem
que as dietas com baixo teor de carboidratos são tão eficazes, para a perda de peso em
comparação a outras dietas (OH; GILANI; UPPALURI, 2020).

QUADRO 1 – TEOR DE CARBOIDRATOS

Muito baixa em carboidratos ou Very low- (< 10% carboidratos) ou 20-50 g/dia.
carbohydrate.
(< 26% carboidratos) ou menos que < 130
Baixa em carboidratos.
g/dia.
Moderada em carboidratos. 26%-44%.
Alta em carboidratos. 45% ou mais.
FONTE: Adaptado de Oh, Gilani e Uppaluri (2020)

Nordmann et al. (2006), em uma revisão sistemática, compararam ensaios


clínicos randomizados com intervenções dietéticas por pelo menos seis meses.
Entre as intervenções dietéticas continham: dietas de baixo teor de carboidratos e
isocalóricas com dietas de baixo teor de gordura e restrição energética na perda de
peso, pressão arterial e perfil lipídico. Os autores concluíram que as dietas com baixo
teor de carboidratos e sem restrição calórica parecem ser tão eficazes quanto dietas
com baixo teor de gordura e restrição calórica na indução da perda de peso por pelo
menos até um ano.

3.4 VITAMINA D E OBESIDADE


Indivíduos com obesidade apresentam níveis séricos de 25(OH)D (vitamina
D) mais baixo do que pessoas com peso normal, e esses níveis de vitamina D estão
inversamente relacionados com o peso corporal, índice de massa corporal (IMC) e massa
gorda (WALSH; BOWLES; EVANS, 2017).

82
As causas da hipovitaminose D podem ser diversas na obesidade. Pode haver
um menor consumo de alimentos fontes devido à alimentação inadequada, menor
exposição à luz solar já que esses pacientes são mais sedentários e às vezes possuem
dificuldades de se locomover, ou síntese cutânea prejudicada de vitamina D. Outro fato
importante a se pensar é a distribuição de 25(OH)D em um volume maior de tecido
corporal total, já que ela pode ser sequestrada pelo tecido adiposo, reduzindo assim sua
biodisponibilidade (WALSH; BOWLES; EVANS, 2017).

Estudos mostram que as pessoas obesas precisarão de doses (Quadro 2) mais


altas do que os indivíduos com peso normal para atingir os mesmos níveis séricos de
vitamina, sendo que a dose de manutenção deva ser semelhante, já que a depuração
metabólica não é afetada pela obesidade (WALSH; BOWLES; EVANS, 2017).

QUADRO 2 – DOSES DE VITAMINA D

Dose usual 800 UI


Dose mínima 200 UI
Dose máxima (UL) 4.000 UI

FONTE: Adaptado de Pujol (2020)

ATENÇÃO
Segundo a resolução CFN n° 656/2020, na prescrição dietética de suplementos
alimentares, o nutricionista deve respeitar os limites do Nível de Ingestão
Superior Tolerável (UL, do inglês, Tolerable Upper Intake Level) e, em casos não
contemplados, considerar critérios de eficácia e segurança com alto grau de
evidências científicas.

3.5 MICROBIOTA INTESTINAL


O meio científico tem levantado a hipótese de que a microbiota intestinal
pode constituir um fator ambiental relevante na patogênese da obesidade e isso tem
levado a investigações das comunidades microbianas dos indivíduos obesos. Ley et al.
(2005) analisaram a microbiota intestinal de camundongos deficientes em leptina nos
principais níveis de filos. Os resultados indicam que os dois filos mais abundantes foram
os Firmicutes (60-80%) e Bacteroidetes (20-40%) (ABENAVOLI et al., 2019).

83
Gomes, Hoffmann e Mota (2018) concluem em sua revisão que:

• A obesidade é caracterizada pela presença de disbiose intestinal, devido ao distinto


perfil do microbioma que existe entre obesos e não obesos.
• A disbiose altera o funcionamento da barreira intestinal e do GALT (do inglês, gut-
associated lymphoid tissues) permitindo a passagem de componentes estruturais de
bactérias, como os LPS (do inglês, lipopolysaccharide) o qual ativa vias inflamatórias
que podem contribuir para o aparecimento de resistência à insulina e presença de
citocinas inflamatórias.
• A disbiose pode alterar a produção de peptídeos gastrointestinais relacionados
à saciedade, contribuindo para o aumento da ingestão alimentar e um ciclo
autossustentável.
• O metabolismo lipídico pode ser alterado pelas mudanças observadas no microbioma
intestinal, resultando em estímulo para aumentar a adiposidade corporal.

Pegando o gancho na questão metabólica, a literatura levanta que a microbiota


intestinal pode influenciar na maior extração calórica alimentar e na adiposidade. Alguns
grupos bacterianos possuem aparatos próprios capazes de otimizar o aproveitamento
do que é consumido. Essa atividade metabólica da microbiota intestinal pode facilitar a
extração calórica de substâncias ingeridas na dieta e ajudar no acúmulo de calorias no
tecido adiposo (NAVES, 2014).

Como vimos, há um desequilíbrio microbiano em pacientes obesos. Para


restaurá-lo precisa haver uma remodelação dietética importante, com a inclusão de
probióticos e prebióticos. O prebióticos permitem mudanças na composição e na
atividade da microbiota gastrointestinal, aumentando, por exemplo, bifidobactérias
benéficas. Os probióticos, por sua vez, demonstram umas mudanças metabólicas em
tecidos, afetando o metabolismo energético, lipídico e de aminoácidos (NAVES, 2014).

Assim, o uso de probióticos e prebióticos é uma estratégia interessante para


os indivíduos obesos, porém, ainda se tem muito a avançar e mais pesquisas são
necessárias para maiores comprovações dos efeitos de cepas bacterianas específicas
na obesidade.

DADOS DA PESQUISA DO IBGE MOSTRAM AUMENTO DE OBESIDADE NO BRASIL

Sophie Deram

Em 2019, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) coletou dados que demonstram


o aumento da prevalência de obesidade em adultos brasileiros. Esses dados alertam
para a necessidade de formulação de novas políticas públicas para o combate a
obesidade e o excesso de peso no Brasil.

84
Trata-se de uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) em conjunto com o ministério da saúde, que coletam informações de
interesse para a área da saúde. Ela tem como objetivo avaliar as questões de saúde
de forma mais ampla, e tem como base três eixos principais: o desempenho do
sistema nacional de saúde, condições de saúde da população e doenças crônicas
não transmissíveis e seus fatores de risco. Ela inclui dados antropométricos, como o
índice de massa corporal (IMC), usado para definir o excesso de peso da população.

Os resultados apresentados pela PNS são alarmantes, visto que 60,3% da


população adulta do Brasil tem o IMC maior de 25 kg/m2, sendo classificada com
excesso de peso. A maior prevalência está no sexo feminino, no qual 62,6% das
mulheres estão com sobrepeso e 57,5% dos homens, sendo que essa prevalência
aumenta com a idade.

Os dados da PNS trazem reflexões importantes que apesar dos esforços e


investimento para prevenir e tratar a obesidade os números só crescem, e isso tem
acontecido no mundo todo. E quais seriam os motivos desse fracasso?

Como vimos ao longo dessa unidade, a obesidade é uma doença complexa


e não existe uma solução simples. O problema é que existem crenças de que para
o tratamento e controle é “só fechar a boca e fazer exercícios físicos”, que claro são
fatores importantes, mas não os únicos. Esse pensamento desconsidera os fatores
genéticos, ambientais, psicológicos e fisiológicos envolvidos com a obesidade.

Já sabemos que dietas restritivas podem atrapalhar mais do que ajudar, pois
o corpo entende como uma privação e passa a trabalhar para garantir a sobrevivência
e poupar mais, aumentando o apetite e reduzindo o metabolismo, favorecendo o
reganho de peso levando o paciente ao famoso e temido efeito sanfona.

Além do mais há o estigma de que o paciente obeso é preguiçoso, guloso e


sem força de vontade. E esse preconceito vem da família, de profissionais da saúde e
do próprio paciente, levando a dietas restritivas e a tomar remédios para emagrecer
por conta própria, gerando consequências negativas e o risco do desenvolvimento
de transtornos alimentares.

Neste texto, a nutricionista Sophie Deram, propõem um novo olhar para a


obesidade e sugere 7 dicas:

1- Foco na saúde: que a saúde é mais importante que o número na balança, sugere
que o indivíduo esqueça as preocupações com o peso e o corpo e invista em um
estilo de vida mais saudável.
2- Não fazer dietas restritivas: pode até funcionar para a perda de peso, mas não é
sustentável a longo prazo e traz consequências negativas para a saúde.

85
3- Coma melhor e não menos: restringir não é a solução, Sophie sugere adotar uma
alimentação mais caseira, variada e com alimentos de todos os grupos alimentares.
4- Ouça seus sinais de fome e saciedade: conecte-se com o seu corpo, em vez de
sugerir recomendações de porções e quantidades de alimentos. Preste atenção
aos sinais internos, coma respeitando a sua fome e saciedade.
5- Faça as pazes com a comida e o corpo: não classifique os alimentos como “bons”
e “ruins”. Nenhum deles será responsável pelo seu ganho de peso por si só e não
existe alimento milagroso. Deixe as crenças de lado e permita-se comer com
prazer e sem culpa.
6- Cozinhe mais: o que se vê é que os indivíduos passaram a cozinhar menos e a
consumir mais industrializados. Cozinhar nos aproxima do alimento e contribui
para aumentar o consumo de alimentos in natura.
7- Todos precisam participar: todos devem estar envolvidos no tratamento da
obesidade, pois é multifatorial e pode atingir a todos.

FONTE: Adaptado de <https://www.uol.com.br/vivabem/colunas/sophie-deram/2020/10/28/dados-


da-pesquisa-do-ibge-mostram-aumento-de-obesidade-no-brasil.htm>. Acesso em: 26 fev. 2021.

86
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• A obesidade é um dos maiores problemas de saúde pública do país.

• O excesso de peso e a obesidade são fatores de risco para inúmeras doenças crônicas.

• A obesidade sofre influência da globalização e do marketing exacerbado em cima de


alimentos processados, além disso, tem o consumismo, a necessidade de prazeres
rápidos e respostas imediatas, tornando a obesidade uma questão social.

• De uma forma geral a obesidade é um desequilíbrio entre a quantidade de calorias


consumida com a quantidade de calorias gastas.

• O aumento da prevalência da obesidade durante os últimos 50 anos se dá pela inte-


ração complexa de mudanças ambientais (ambiente obesogênico) e a predisposição
genética do indivíduo.

• A maioria dos indivíduos com obesidade, apresentam a obesidade multifatorial atri-


buída pela interação entre múltiplos genes (poligênica).

• O estresse e a obesidade estão ligados por mudanças que têm como objetivo
acomodar os efeitos do estresse, em vez de alterar o evento estressante real.

• A atividade física e o estilo de vida sedentário podem modificar o risco genético


de obesidade, um exemplo é a relação entre o genótipo FTO e obesidade, a qual é
atenuada entre pessoas com altos níveis de atividade física.

• Os sinais envolvidos na regulação homeostática da ingestão de alimentos, balanço


energético e corporal são centralizados no núcleo arqueado do hipotálamo, tronco
cerebral caudal e partes do córtex e sistema límbico.

• O hipotálamo processa sinais periféricos que transmitem informações sobre a


ingestão de alimentos de curto prazo (disponibilidade de nutrientes) ou balanço de
energia de longo prazo (estoque de energia) para atingir a homeostase energética.

• Evidências apontam que esses indivíduos buscam a comida para resolver ou com-
pensar problemas dos quais, às vezes, não tem nem consciência.

87
• O gasto energético é variável e sofre influência das mudanças no peso corporal, e
o equilíbrio entre a energia ingerida (calorias) e a demanda de energia corporal é
fundamental para o controle do peso corporal.

• Há fortes evidências de que a dieta cetogênica é eficaz para a perda de peso, porém
não há um consenso na literatura sobre os mecanismos pelos quais isso acontece.

• Ainda se debate no meio científico sobre os mecanismos das LCD que induzem a
perda de peso. A questão que devemos nos atentar é que ao reduzir carboidratos da
dieta, a ingestão de proteína e gorduras aumenta para compensar.

• Indivíduos com obesidade apresentam níveis séricos de 25(OH)D (vitamina D) mais bai-
xo do que pessoas com peso normal, e esses níveis de vitamina D estão inversamente
relacionados com o peso corporal, índice de massa corporal (IMC) e massa gorda.

• A microbiota intestinal pode constituir um fator ambiental relevante na patogênese


da obesidade e isso tem levado a investigações das comunidades microbianas dos
indivíduos obesos.

• O uso de probióticos e prebióticos é uma estratégia interessante para os indivíduos


obesos.

88
AUTOATIVIDADE
1 A obesidade é caracterizada por um excesso de tecido adiposo. A medida clinica mais
utilizada para caracterizá-la é o índice de massa corporal (IMC, peso em kg dividido
pelo quadrado da altura em metros), com escalas por idade e pode sofrer influência
genética. Qual gene é fortemente ligado a indicadores antropométricos como o IMC?

a) ( ) FTO.
b) ( ) MC4R.
c) ( ) RPTOR.
d) ( ) SNPs.

2 O ambiente em que vivemos pode ter influência na obesidade. Estudos epidemio-


lógicos identificaram vários fatores de risco modificáveis para obesidade e doença
cardiovascular (DCV), quais são eles?

I- Consumo de bebidas açucaradas.


II- Consumo de frituras.
III- Sedentarismo.
IV- Frutas.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas o item I está correta.
b) ( ) Os itens III e IV estão corretas.
c) ( ) Os itens I, II e III estão corretos.
d) ( ) Todos os itens estão incorretos.

3 A ingestão de energia (alimentação) é metabolizada e usada para alimentar o


metabolismo basal, a termogênese e o gasto de energia (atividade física), quando
ocorrem excessos acontece o armazenamento como forma de ______________ nas
______________ para uso posterior. Assinale a alternativa que completa as lacunas.

a) ( ) Gordura; células musculares.


b) ( ) Gordura; células adiposas.
c) ( ) Glicose; células musculares.
d) ( ) Glicose; células adiposas.

4 Há fortes evidências de que a dieta cetogênica é eficaz para a perda de peso, porém
não há um consenso na literatura sobre os mecanismos pelos quais isso acontece.
Alguns autores sugerem que o efeito da dieta cetogência na perda de peso pode ser
causado por:

89
5 As causas da hipovitaminose podem ser diversas na obesidade, como um menor
consumo de alimentos fontes devido à alimentação inadequada e também à
distribuição dessa vitamina em um volume maior de tecido corporal total, já que pode
ficar sequestrada no tecido adiposo. Que vitamina é essa?

a) ( ) Vitamina A.
b) ( ) Vitamina D.
c) ( ) Vitamina B12.
d) ( ) Vitamina C.

6 A microbiota intestinal pode constituir um fator ambiental relevante na patogênese


da obesidade e isso tem levado a investigações das comunidades microbianas dos
indivíduos obesos. Quais os filos bacterianos mais abundantes na microbiota do
indivíduo obeso?

90
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
DOENÇAS CARDIOVASCULARES 1

1 INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é umas das causas mais comuns de doen-
ças cardiovasculares, afetando 20% da população adulta nas sociedades industrializadas.

É um fator de risco para o desenvolvimento de doença coronária, acelera o pro-


cesso de aterosclerose e pode ser determinante para o surgimento de morbidade e mor-
talidade cardiovascular associada à doença coronária, insuficiência cardíaca congestiva,
acidente vascular encefálico (AVE) e doença renal terminal (SANJULIANI, 2002).

Caracterizada por elevação sustentada dos níveis pressóricos ≥ 140 e/ou 90


mmHg. No Brasil, a HAS atinge 32,5% dos indivíduos adultos, mais de 60% são idosos
e contribui para 50% das mortes por doença cardiovascular (DCV), tendo impacto na
produtividade do trabalho e na renda familiar, com gastos estimados em US$ 4,18
bilhões entre 2006 e 2015 (MALACHIAS et al., 2016).

2 HIPERTENSÃO
Como vimos, a HAS é caracterizada por elevação sustentada dos níveis
pressóricos ≥ 140 e/ou 90 mmHg (Quadro 3).

Frequentemente assintomática, costuma evoluir com alterações estruturais e/


ou funcionais em órgãos-alvo, como coração, rins e vasos.

É um dos principais fatores de risco modificável com associação independente


para DCV, doença renal crônica (DRC) e morte prematura. Está associada a fatores de
risco metabólicos para doenças do sistema cardiocirculatório e renal, como dislipidemia,
obesidade, intolerância à glicose e diabetes mellitus.

Os fatores de risco envolvidos com o desenvolvimento da HAS são (BARROSO


et al., 2020):

• Genética: podem influenciar os níveis de pressão arterial (PA) entre 30-50%, porém,
ainda não foram identificados dados uniformes das variantes genéticas envolvidas.

91
• Idade: o envelhecimento leva a um enrijecimento progressivo e da perda de
complacência das grandes artérias, e aí a PA torna-se um problema mais significante.
• Sexo: nas faixas etárias mais jovem a PA é mais elevada entre os homens, mas na
sexta década de vida, a PA entre as mulheres costuma ser mais elevada e a prevalência
de HAS maior.
• Etnia: é um fator de risco importante para HAS, mas as condições socioeconômicas
e hábitos de vida são mais relevantes na prevalência de HAS, do que a etnia.
• Sobrepeso/obesidade: existe uma relação direta, contínua e linear entre o excesso
de peso (sobrepeso/obesidade) e os níveis de PA.
• Ingestão de sódio e potássio: a literatura científica mostra que a ingestão de sódio
está associada a DCV e AVE, quando a ingestão média é superior a 2 g de sódio, o
equivalente a 5 g de sal de cozinha. De maneira inversa, o aumento na ingestão de
potássio reduz os níveis pressóricos. Deve ser salientado que o efeito da suplemen-
tação de potássio parece ser maior naqueles com ingestão elevada de sódio.
• Sedentarismo: há uma associação direta do sedentarismo, a elevação da PA e da HAS.
• Álcool: há uma prevalência maior nos indivíduos que ingeriram seis ou mais doses
ao dia, o que equivale a 30 g de álcool/dia – uma garrafa de cerveja (600 ml) ou duas
taças de vinho (250 ml) ou uma dose de destilado (60 ml).
• Outros fatores: drogas ilícitas e automedicação têm potencial em elevar a PA ou
dificultar o seu controle.

QUADRO 3 – CLASSIFICAÇÃO DA PA CONFORME MEDIÇÃO NO CONSULTÓRIO

Classificação* PAS (mHg) PAD (mmHg)


PA ótima < 120 e < 80
PA normal 120 – 129 e/ou 80 – 84
Pré-hipertensão 130 – 139 e/ou 85 – 89
HA estágio 1 140 – 159 e/ou 90 – 99
HA estágio 2 160 – 179 e/ou 100 – 109
HA estágio 3 ≥180 e/ou ≥ 110
Legenda: HA: hipertensão arterial; PA: pressão arterial; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão
arterial diastólica. *A classificação é definida de acordo com a PA no consultório e pelo nível mais
elevado de PA, sistólica ou diastólica. **A HA sistólica isolada, caracterizada pela PAS ≥ 140 mmHg
e PAD < 90 mmHg, é classificada em 1, 2 ou 3, de acordo com os valores da PAS nos intervalos
indicados. ***A HA diastólica isolada, caracterizada pela PAS < 140 mmHg e PAD ≥ 90 mmHg, é
classificada em 1, 2 ou 3, de acordo com os valores da PAD nos intervalos indicados.

FONTE: Barroso et al. (2020, p. 30)

92
2.1 FISIOPATOLOGIA NA HIPERTENSÃO
A PA é determinada pelo produto do débito cardíaco (DC) e da resistência
vascular periférica (RVP), em pacientes normais e naqueles que apresentam HAS
existe um aspecto de variação do DC com respostas concomitantes da RVP para um
determinado nível de PA (SANJULIANI, 2002).

O DC sofre influência da contratilidade e relaxamento do miocárdio, do volume


sanguíneo circulante, do retorno venoso e da frequência cardíaca. Já a RVP sofre influ-
ência de alguns mecanismos vasoconstritores e vasodilatadores como o sistema nervoso
simpático, sistema renina-angiotensina e modulação endotelial. Além disso, a RVP de-
pende da espessura da parede das artérias, existindo um aumento ao estímulo vasocons-
tritor nos vasos nos quais há um espessamento das paredes (SANJULIANI, 2002).

O sistema renina-angiotensina é muito importante para o controle fisiológico da


PA e do equilíbrio hidroeletrolítico. Quando sua atividade está aumentada e é persistente
se relaciona com a HAS.

Muitos estudos mostram que o uso de medicamentos inibidores da enzima con-


versora de angiotensina (IECA) e/ou com bloqueadores dos receptores angiotensinérgi-
cos do tipo 1 (BRA) são eficazes no tratamento da HAS e de disfunções cardiovasculares
e renais (LACERDA et al., 2020). Assim, a angiotensina II exerce efeitos pró-hipertensivos
ligando-se ao seu receptor do tipo 1 (AT1): vasoconstrição sistêmica e renal, aumento do
débito cardíaco, retenção renal de sódio e água, estímulo à secreção de aldosterona pelas
adrenais, hipertensão glomerular, proteinúria, hipertrofia cardíaca, hipertrofia e hiperplasia
da musculatura lisa vascular, disfunção endotelial e resistência à insulina. Outro ponto
importante é que a angiotensina II estimula respostas inflamatórias e a fibrose tecidual,
contribuindo para as lesões de órgãos na HAS (LACERDA et al., 2020).

Como vimos, existe uma influência genética na HAS. Existem polimorfismos


funcionais em genes do sistema renina-angiotensina relacionados a HAS. Pacientes
com alelo D do gene da ECA apresentam maior formação de angiotensina II no coração,
nos vasos sanguíneos e no tecido renal (LACERDA et al., 2020).

Outro ponto importante que devemos considerar são os fatores dietéticos e


ambientais. O sódio e potássio interferem com os níveis pressóricos, indivíduos que
ingerem menos sódio e mais potássio apresentam PA mais baixa, porém, a influência
dietética sobre a PA depende da sensibilidade individual ao sódio. Indivíduos obesos que
possuem hipertensão, por exemplo, demonstram maior sensibilidade ao sódio enquanto
os hipertensos que apresentam perda de massa renal desenvolvem sensibilidade ao
sódio como resposta para manter a excreção de sódio induzida pela pressão. Assim,
redução do sal na dieta pode provocar redução da PA sistólica reduzindo assim o risco
de lesão em órgãos alvo (LACERDA et al., 2020).

93
Falando de obesidade, já se sabe que essa doença é um fator de risco para a
HAS, pois promove um aumento da insulina e leptina circulantes. A hiperinsulinemia
pode causar HAS por alterações nas estruturas e na função da musculatura lisa vascular
e disfunção endotelial (LACERDA et al., 2020).

Embora a hiperinsulinemia possa aumentar agudamente a reabsorção tubular


renal de sódio e a atividade do sistema nervoso simpático (SNS), esses efeitos não se
traduzem realmente em aumento da PA em humanos, portanto, não aumentam o risco
de hipertensão na ausência de obesidade coexistente e/ou síndrome metabólica. Os
efeitos metabólicos da RI (hiperglicemia e dislipidemias) podem interagir sinergicamente
com a hipertensão pré-existente agravando a lesão vascular e renal, exacerbando a
hipertensão (VALENZUELA et al., 2020).

DICAS
Leia mais sobre a HAS acessando o link: https://www.medicina.ufmg.br/
wp-content/uploads/sites/7/2020/09/Ebook-Hipertensão-Arterial-Sistêmica-
Medpencil-Medicina-em-Desenho.pdf

Entenda circulação e pressão arterial assistindo aos vídeos:

• Parte 1: https://www.youtube.com/watch?v=X9ZZ6tcxArI
• Parte 2: https://www.youtube.com/watch?v=ZVklPwGALpI

Para o diagnóstico de um paciente com HAS é necessária uma avaliação que


inclui a confirmação do diagnóstico, a suspeita e a identificação de causa secundária,
além da avaliação do risco cardiovascular (CV). As lesões de órgão-alvo (LOA) e as
doenças associadas também devem ser investigadas.

Fazem parte dessa avaliação: a medida da pressão arterial (PA) no consultório


e/ou fora dele, utilizando-se técnica adequada e equipamentos validados e calibrados,
a obtenção de história médica (pessoal e familiar), a realização de exame físico e a
investigação clínica e laboratorial. Propõem-se avaliações gerais a todos os hipertensos
e avaliações complementares apenas para grupos específicos (BARROSO et al., 2020).

O tratamento medicamentoso tem como objetivo primordial a proteção CV que


consiste em administração de medicamentos anti-hipertensivos. A redução da PA é a
primeira meta, a fim de reduzir os desfechos CV e mortalidades associadas à HAS. O uso
dos medicamentos pode ser iniciado como monoterapia ou com combinação de fárma-
cos (BARROSO et al., 2020), e é realizada pelo médico. Diversas opções medicamento-
sas envolvem o tratamento da HAS, e, por esse motivo, encontram-se dificuldades na
uniformização das condutas resultando em um insucesso ao tratamento.

94
Estudos e diretrizes de HAS sugerem classes medicamentosas preferenciais
para o tratamento, que incluem o chamado “trio de ouro”: um inibidor do sistema
renina-angiotensina (iSRA) (inibidor da enzima conversora de angiotensina ou um
bloqueador do receptor de angiotensina II), um bloqueador do canal de cálcio (BCC)
ou um diurético tiazídico/tipo tiazídico (TIAZ). Veja o Quadro 4 de medicamentos anti-
hipertensivos disponíveis.

QUADRO 4 – MEDICAMENTOS ANTI-HIPERTENSIVOS DISPONÍVEIS

Bloqueadores adrenérgicos
Alfabloqueadores
Betabloqueadores
Alfa-beta bloqueadores
Inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA)
Bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRAs)
Bloqueadores dos canais de cálcio
Di-idropiridinas
Não di-idropiridinas
Alfa-agonistas de ação central
Vasodilatadores diretos
Diuréticos
Diuréticos de alça
Diuréticos poupadores de potássio
Diuréticos tiazídicos ou do tipo tiazida.

FONTE: Adaptado de Bakris (2019)

Caso a meta pressórica não seja atingida com o mínimo de medicamentos possível,
o uso de três fármacos (“trio de ouro”) deve compreender preferencialmente os seus
componentes. Se, ainda assim, a PA não for controlada com o uso dessas três classes,
utilizando hidroclorotiazida, o controle pode ser melhorado substituindo por outro TIAZ
de longa duração e mais potente (clortalidona ou indapamida). Assim, Feitosa et al.
(2020) propuseram o octeto medicamentoso para tratamento da hipertensão arterial,
como mostra a Figura 5.

95
FIGURA 5 – O OCTETO MEDICAMENTOSO PARA O TRATAMENTO DA HAS

Legenda: TIAZ: diurético tiazídico/tipo tiazídico; iSRA: inibidor do sistema renina-angiotensina;


BCC: bloqueador do canal de cálcio; βB: betabloqueador; α2A: agonista alfa-2 central; α1B:
bloqueador alfa-1 adrenérgico; VD: vasodilatador arterial direto. *Caso não haja controle da pressão
arterial com TIAZ, iSRA e BCC, e o TIAZ for hidroclorotiazida, substituir o TIAZ por clortalidona
ou indapamida. Se a taxa de filtração glomerular for <30 mL/min, substituir TIAZ por diurético de
alça, como furosemida. †Se não houver tolerância à espironolactona, especialmente por efeitos
antiandrogênicos, considerar substituir esta medicação por amilorida. ‡βB está indicado como
escolha inicial caso existam indicações específicas, tais como angina, pós-infarto do miocárdio,
insuficiência cardíaca, arritmia ou controle da frequência cardíaca.

FONTE: Feitosa et al. (2020, p. 271).

2.2 DIETOTERAPIA NA HIPERTENSÃO


Para o tratamento da HAS já se está bem estabelecido o papel dos hábitos
de vida, mas também não podemos desconsiderar as interações com os tratamentos
médicos anti-hipertensivos. Em alguns casos, a mudança do estilo de vida é considerada
o tratamento de primeira linha contra a HAS.

Segundo as diretrizes da ESC e ESH (do inglês, European Society of Cardiology


e European Society of Hypertension, respectivamente) um estilo de vida saudável é o
único tratamento necessário para pessoas com hipertensão leve durante os três a seis
meses após o diagnóstico, caso a HAS não seja controlada, se adiciona o tratamento
farmacológico somente após esse período (VALENZUELA et al., 2020).

Os benefícios de um estilo de vida saudável não podem ser negligenciados ao


se considerar o tratamento farmacológico, ambos têm que caminhar juntos, porém a
intervenção no estilo de vida é a pedra angular para o controle da HAS independente
do tratamento médico recebido (VALENZUELA et al., 2020). Veja como um estilo de vida
inadequado pode levar ao aumento da PA (Figura 6).

96
FIGURA 6 – ESTILO DE VIDA E HAS

Adiposidade visceral
↑ liberação de adipocitocina (como
leptina, resistina e TNF)
↑ infiltração de macrófagos
↑ atividade do nervo simpático renal

Exercício físico

Resistência à insulina
↑ da glicemia
↑ da insulinemia

Controle do peso corporal Sistema RAA


↑ atividade do eixo vasoconstritor
↑ reabsorção de sódio
↓ natriurese

Estrutura vascular
Refração e rarefação ↑ pressão
↑ rigidez arterial sanguínea
Padrão dietético
↑ resistência vascular
↓ volume do vaso

Função vascular e status oxidativo


↑ produção de EROS
↓ disponibilidade do óxido nitrico
Sincronia circadiana

Inflamação
↑ células pró-inflamatórias
↑ moléculas pró-inflamatórias
(como PCR e TNF)

Manejo do estresse
Função autonómica
↑ tônus SNS
↓ função dos baroreceptores

FONTE: Adaptada de Valenzuela et al. (2020)

Falando de dieta, será mesmo que é só reduzir o sódio e a HAS irá se estabilizar?
Continue a leitura e vamos descobrir juntos.

Muito se fala da carga dietética ácida, e isso se dá, pois o excesso de ácidos
deve ser excretado pelos rins para manter o equilíbrio ácido-base.

Uma alta carga ácida pode aumentar o risco de hipertensão, visto que há uma
sobrecarga renal, devido a uma alta carga ácida proveniente da dieta a qual solicita
mecanismos adaptativos para aumentar a excreção de ácidos, e no caso de uma doença
renal crônica pode levar a uma lesão renal, aumentando o risco para a HAS.

Nesse caso, uma dieta caracterizada pela redução na ingestão de sal, aumento
no consumo de frutas, tubérculos, raízes e vegetais levará a um aumento no magnésio
e diminuição na relação sódio-potássio (VALENZUELA et al., 2020).
97
Além disso, devemos nos atentar ao padrão dietético ocidental. Evidências
científicas apontam que as populações não ocidentalizadas têm baixas taxas de
hipertensão e prevalência muito baixa de aumentos relacionados à idade na PA e DCV
em geral, apesar de não receberem tratamento farmacológico, o que fornece dados
importantes do papel dos fatores de estilo de vida na prevenção da HAS.

Essas baixas taxas de HAS estão associadas a estilos de vidas mais tradicio-
nais, como padrão alimentar não ocidentalizado, atividade física regular, ciclo natural
de sono/vigília (ciclo circadiano regulado) e exposição ao sol (Figura 7) (VALENZUELA
et al., 2020).

98
FIGURA 7 – PADRÕES DIETÉTICOS E EFEITOS NA SAÚDE

População não ocidental População ocidental

Estilo de vida sedentário


• Baixo gasto energético

Atividade física regular


• Alto gasto energético Padrões alimentares
ocidentalizados
• Dieta hipercalórica
Padrões alimentares não • Alto consumo de carne processada,
ocidentalizados álcool, açúcar, grãos refinados e
Efeitos em parâmetros de alimentos ultra processados
• Alto consumo de frutas, tubérculos, saúde
raízes e vegetais • Razão proporção de sódio para
• Taxa de hipertensão potássio
• Baixo consumo de alimentos • Nível de adiposidade
processados • Nível sanguíneo de glicose e
insulina
• Lipídios sanguineos Ruptura circadiana
• Inflamação • Ciclo dormir-acordar irregular
Sincronia circadiana • Atividade do SNS • Padrão alimentar irregular
• Ciclo dormir-acordar regular • Inatividade física
• Comer durante o dia • Alto uso de telas a noite
• Exposição ao sol
• Atividade física diurna

Comportamento psicossocial
• Estresse psicossocial crônico

FONTE: Adaptada de Valenzuela et al. (2020)

99
Pegando os Estados Unidos como exemplo, uma dieta norte-americana típica é
rica em gorduras saturadas, ácidos graxos ômega 6, carboidratos de alta carga glicêmica
e aditivos químicos artificiais e isso é um retrocesso no combate as DCV, principalmente a
HAS (CHALLA; AMEER; UPPALURI, 2020).

NOTA
DIFERENÇA ENTRE ÍNDICE GLICÊMICO (IG) E CARGA GLICÊMICA (CG)

Índice glicêmico (IG) Carga glicêmica (CG)


O IG expressa o aumento da glicose no
A CG indica a qualidade e quantidade de
sangue após o consumo de um alimento
carboidratos dentro de uma porção con-
fonte de carboidratos, comparando com o
sumida de nutrientes pela dieta. Fornece
consumo de um alimento controle, em ge-
resultado do efeito glicêmico da dieta como
ral a glicose ou pão branco, e foi proposto
um todo, pois avalia a porção de carboidra-
com a finalidade de classificar os alimentos
to disponível dos alimentos e o IG, forne-
a partir das respostas glicêmicas (RG), ou
cendo uma noção mais real do efeito glicê-
seja, a capacidade que o alimento tem de
mico de diferentes porções alimentares.
aumentar a glicemia.

FONTE: Adaptado de Pujol (2017)

Em 1990, teve origem a dieta DASH, a qual muitos já devem ter ouvido falar.
DASH é a sigla em inglês de Dietary Approach to Stop Hypertension, os estudos iniciaram em
1992 pelo National Institute of Health (NIH), que começou a financiar os projetos de pes-
quisa para verificar se intervenções dietéticas específicas eram úteis para o tratamento
da hipertensão.

As pesquisas demonstraram que as modificações no estilo de vida foram capazes,


por si só, de diminuir a pressão arterial sistólica em cerca de 6 a 11 mmHg (CHALLA;
AMEER; UPPALURI, 2020).

Mas o que compõem a dieta DASH? Um plano alimentar DASH prioriza o consumo
de alimentos minimamente processados e frescos. Têm muita semelhança com padrões
dietéticos recomendados para a saúde cardiovascular. Seguem as recomendações da
dieta DASH (CHALLA; AMEER; UPPALURI, 2020):

• Legumes: cerca de cinco porções por dia.


• Frutas: cerca de cinco porções por dia.
• Carboidratos: cerca de sete porções por dia.
• Laticínios com baixo teor de gordura: cerca de duas porções por dia.
• Produtos de carne magra: cerca de duas ou menos porções por dia.
• Nozes e sementes: 2 a 3 vezes por semana.

100
Os carboidratos devem ser inclusos na dieta, para fornecer energia. Dietas com
muito baixo teor de carboidratos podem levar à diminuição da ingestão calórica, mas
podem culminar no erro de aumento de gorduras prejudiciais como a saturada e trans.

Os carboidratos inclusos na dieta DASH são: vegetais verde-escuros, grãos in-


tegrais (ex.: milho, aveia, tubérculos e raízes), frutas, leguminosas (feijão, lentilha, grão-
-de-bico) (CHALLA; AMEER; UPPALURI, 2020).

As gorduras têm sofrido forte investigação há algum tempo no desenvolvimento


de doenças crônicas. As gorduras são classificadas como “boas” e “ruins”.

As “boas”, ou mono e poli-insaturadas, fornecem ácidos graxos essenciais


que promovem saúde, e estão inclusas na dieta DASH como: azeite, abacate, nozes,
sementes de linhaça, peixes ricos em ômega 3. Já as gorduras “ruins”, ou saturadas e
trans, não devem fazer parte de um plano alimentar DASH, são elas: margarina, óleos
vegetais hidrogenados, frituras (CHALLA; AMEER; UPPALURI, 2020).

Na dieta DASH, as proteínas vegetais são mais recomendadas (leguminosas,


soja, nozes e sementes).

A proteína animal, quando presente, é composta principalmente de carnes


magras, laticínios com baixo teor de gordura, ovos e peixes. Deve-se ter atenção às
carnes processadas e curadas, as quais não são recomendadas por mostrarem causar
HAS e por possuírem em sua composição substâncias cancerígenas (CHALLA; AMEER;
UPPALURI, 2020).

Outro ponto importante da dieta DASH é a inclusão de alimentos ricos em


potássio, cálcio e magnésio, os quais são excelentes preventivos da disfunção endotelial
e promovem o relaxamento do músculo liso endotelial.

Entre eles destacam-se: bananas, laranjas e espinafre (ricos em potássio),


laticínios e vegetais verde-escuros (ricos em cálcio), grãos inteiros, vegetais folhosos,
nozes e sementes (ricos em magnésio) (CHALLA; AMEER; UPPALURI, 2020).

Como vimos, a orientação nutricional é muito efetiva na diminuição da PA,


principalmente quando é realizada por uma equipe multidisciplinar em que o profissional
nutricionista está presente. Na atenção primária, a consulta com nutricionista mostrou ser
mais efetiva na melhora da qualidade da dieta (BARROSO et al., 2020).

A consulta com o nutricionista deve conter os seguintes aspectos: anamnese


alimentar com avaliação da rotina de consumo, número de refeições, horários, alimentos
ingeridos e quantidades, além da frequência de consumo de alimentos cardioprotetores.

101
Avaliação antropométrica: medida de peso e altura, medida da circunferência
abdominal e cálculo do índice de massa corporal. Prescrição e orientação da dieta com
base no diagnóstico médico e exames laboratoriais. Acompanhamento das mudanças
dietéticas e evolução antropométrica. Participação em ações com a população
(BARROSO et al., 2020).

Além disso, o nutricionista pode promover ações coletivas, como: a orientação


nutricional deve ser centrada nas mudanças de impacto na diminuição da PA: perda de
peso, aumento do consumo de frutas e vegetais e diminuição do consumo de sódio.
Atualmente, a utilização de recursos tecnológicos gratuitos na área de nutrição
representa um importante recurso de informação em larga escala, e seu uso deve ser
incentivado (BARROSO et al., 2020).

IMPORTANTE
Exemplo de cardápio DASH simplificado:

COMPOSIÇÃO DE MACRONUTRIENTES

Caloria 1977
Carboidrato 203,02g (40,8%)
Proteína 165,38g (33,2%)
Lipídio 57,47g (26%)

Para ajudar no controle do estresse: Comece o seu dia agradecendo ou fazendo uma
meditação
Café da manhã
1 iogurte desnatado
2 colheres de sopa de aveia em flocos
1 unidade de banana

Importante: Lembre-se de tomar água.

Lanche da manhã
1 unidade de maçã
3 unidades de Castanha do Pará sem sal
Almoço
1 filé médio de frango grelhado
4 colheres de sopa de arroz integral cozido
3 colheres de sopa de legumes variados cozidos

102
Lanche da tarde
1 copo de vitamina de abacate (1 copo de leite desnatado + ¼ de abacate maduro + 1 fio de
mel)

Importante: Lembre-se de tomar água

Jantar
1 filé de peixe assado ou grelhado
2 colheres de sopa cheias de batata doce cozida sem sal picada
3 colheres de sopa de grão-de-bico cozido
3 colheres de sopa de legumes variados cozidos
Ceia
1 kiwi
3 colheres de chá de semente de linhaça

FONTE: O autor

HIPERTENSÃO AFETA UM EM CADA QUATRO BRASILEIROS ADULTOS

Paula Laboissière

No ano de 2017 foram contabilizadas oitenta e quatro mortes por hora, 829
mortes por dia e mais de 302 mil em todo o ano. Esses números são referentes
mortes em decorrência de doenças cardiovasculares e acidente vascular cerebral no
Brasil, que tem como o principal fator de risco a hipertensão arterial. O Ministério da
saúde afirma que a pressão alta afeta um em cada quatro brasileiros adultos.

O dia 26 de abril foi instituído como o Dia Nacional de Combate a Hipertensão,


quando os órgãos de saúde, como o ministério, alertam para o consumo excessivo de
sódio (presente no sal) aumenta o risco para a hipertensão e doenças cardiovasculares.

O alerta vem por causa do dado de que dois terços do consumo de sal pela
população brasileira vêm do sal adicionado direto no prato, e que o brasileiro consome
mais que o dobro (quase 12g) da quantidade recomendada pela Organização mundial
da saúde (OMS).

No combate a hipertensão o ministério da saúde recomenda a adoção de um


estilo de vida saudável desde a infância até a terceira idade, realização de exames
periódicos pelo menos uma vez ao ano e a prática de exercício físico.

103
No sistema único de saúde (SUS) há o fornecimento, de forma gratuita,
de medicamentos para hipertensão nas unidades básicas de saúde, e em 31 mil
unidades farmacêuticas credenciadas ao programa Farmácia Popular. Para retirar o
remédio é preciso apresentar documento de identidade, CPF e receita médica dentro
do prazo de validade (120 dias).

FONTE: Adaptado de <https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2019-04/hipertensao-


afeta-um-em-cada-quatro-brasileiros-adultos>. Acesso em: 26 fev. 2020.

104
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:

• A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é umas das causas mais comuns de doenças
cardiovasculares, afetando 20% da população adulta nas sociedades industrializadas.

• É caracterizada por elevação sustentada dos níveis pressóricos ≥ 140 e/ou 90 mmHg.

• Os fatores de risco envolvidos com o desenvolvimento da HAS são: genética, idade,


sexo, etnia, sobrepeso/obesidade, ingestão de sódio e potássio, sedentarismo, álcool
e outros fatores.

• A PA é determinada pelo produto do débito cardíaco (DC) e da resistência vascular


periférica (RVP), em pacientes normais e nos que apresentam HAS existe um aspecto
de variação do DC com respostas concomitantes da RVP para um determinado nível
de PA.

• O sistema renina-angiotensina é muito importante para o controle fisiológico da PA e


do equilíbrio hidroeletrolítico.

• Existem polimorfismos funcionais, em genes do sistema renina-angiotensina relacio-


nados a HAS.

• A obesidade é um fator de risco para a HAS, pois promove um aumento da insulina e


leptina circulantes.

• Para o diagnóstico de um paciente com HAS é necessária uma avaliação que inclui a
confirmação do diagnóstico, a suspeita e a identificação de causa secundária, além
da avaliação do risco cardiovascular (CV).

• O tratamento medicamentoso tem como objetivo primordial a proteção CV que


consiste em administração de medicamentos anti-hipertensivos.

• Para o tratamento da HAS já se está bem estabelecido o papel dos hábitos de vida,
mas também não podemos desconsiderar as interações com os tratamentos médicos
anti-hipertensivos.

• Evidências científicas apontam que as populações não ocidentalizadas têm baixas ta-
xas de hipertensão e prevalência muito baixa de aumentos relacionados à idade na PA
e DCV em geral, apesar de não receberem tratamento farmacológico, o que fornece
dados importantes do papel dos fatores de estilo de vida na prevenção da HAS.

105
• Os estudos com a dieta DASH iniciaram em 1992 pelo National Institute of Health
(NIH), que começou a financiar os projetos de pesquisa para verificar se intervenções
dietéticas específicas eram úteis para o tratamento da hipertensão.

• Um plano alimentar DASH prioriza o consumo de alimentos minimamente proces-


sados e frescos.

• A orientação nutricional é muito efetiva na diminuição da PA, principalmente quan-


do é realizada por uma equipe multidisciplinar em que o profissional nutricionista
está presente.

106
AUTOATIVIDADE
1 A avaliação inicial de um paciente com HAS inclui a confirmação do diagnóstico, a
suspeição e a identificação da causa secundária e a avaliação do risco cardiovascular.
Sendo assim, o diagnóstico da HAS é caracterizado por elevação sustentada de níveis
pressóricos de:

a) ( ) 120 – 129 e/ou 80 – 84 mmHg.


b) ( ) 130 – 139 e/ou 85 – 89 mmHg.
c) ( ) ≥ 140 e/ou 90 mmHg.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

2 A PA é determinada pelo produto do ____________________ e da ____________________. Assinale


a alternativa que completa as lacunas.

a) ( ) Débito periférico; resistência vascular cardíaca.


b) ( ) Débito cardíaco; resistência vascular periférica.
c) ( ) Débito cardíaco; resistência vascular cardíaca.
d) ( ) Débito periférico; resistência vascular periférica.

3 A pressão arterial sofre alterações por meio do exercício físico e da dieta, sendo
que intervenções contribuem para o seu controle. Evidências sugerem que o ganho
de peso, consumo de álcool, alta ingestão ou deficiência de minerais específicos
relacionados à dieta contribuem para a hipertensão. Quais minerais estão envolvidos
com os níveis pressóricos?

a) ( ) Zinco e potássio.
b) ( ) Sódio e ferro.
c) ( ) Sódio e potássio.
d) ( ) Cobre e Cálcio.

4 A redução da PA é a primeira meta a fim de reduzir a mortalidade associada à HAS. O


uso dos medicamentos pode ser iniciado como monoterapia ou com combinação de
fármacos, e é realizada pelo médico. Qual o objetivo do tratamento medicamentoso
da HAS?

a) ( ) Proteção CV.
b) ( ) Proteção hepática.
c) ( ) Proteção cerebral.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

107
5 Em 1990, teve origem a dieta DASH. Um plano alimentar DASH prioriza o consumo de
alimentos minimamente processados e frescos. Têm muita semelhança com padrões
dietéticos recomendados para a saúde cardiovascular. Quais alimentos compõem a
dieta DASH?

I- Legumes, frutas, carboidratos, laticínios, carne magra, nozes e sementes.


II- Apenas legumes e frutas.
III- Somente carboidratos, nozes e sementes.
IV- Apenas proteínas magras e laticínios com baixo teor de gordura.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a afirmativa II está correta.
b) ( ) As afirmativas II, III e IV estão incorretas.
c) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.
d) ( ) Nenhuma das afirmativas está correta.

6 Diversas opções medicamentosas envolvem o tratamento da HAS, e, por esse mo-


tivo, encontram-se dificuldades na uniformização das condutas resultando em um
insucesso ao tratamento. Estudos e diretrizes de HAS sugerem classes medicamen-
tosas preferenciais para o tratamento, que incluem o chamado “trio de ouro”. O “trio
de ouro” é composto por quais medicamentos?

7 Nos últimos tempos, os carboidratos dietéticos receberam publicidade negativa com


relação ao emagrecimento, principalmente pelas dietas ricas em proteínas para a
perda de peso. Descobertas apontam que os carboidratos podem ser piores que as
gorduras saturadas e elevarem os riscos para DCV em pessoas com obesidade, dia-
betes e resistência à insulina. A quantidade e o tipo de carboidratos a ser recomen-
dados em dietas saudáveis tem sido alvo de questionamentos, pois a maioria dos
carboidratos consumidos são de má qualidade, ou seja, com alto IG e CG, baixo teor
de fibras e alta densidade energética. Qual é a diferença entre carga glicêmica (CG) e
índice glicêmico (IG)?

108
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
DOENÇAS CARDIOVASCULARES 2

1 INTRODUÇÃO
Segundo as estimativas do Global Burden of Diseases (GBD), a prevalência glo-
bal de Doença Arterial Coronariana (DAC) foi de 154 milhões em 2016, representando
32,7% da carga global de doenças cardiovasculares e 2,2% da carga global de doenças
(BAUERSACHS et al., 2019).

Trata-se de uma doença silenciosa e progressiva que, sem tratamento e pre-


venção adequados, acaba levando a eventos cardiovasculares, hospitalização, proce-
dimentos de revascularização que representam um gasto econômico significativo, com
hospitalização, medicamentos e perda de produtividade (BAUERSACHS et al., 2019).

A DAC é subjacente a um espectro de condições que dependem dos graus de


estenose, das consequências hemodinâmicas da estenose e das características da pla-
ca e do nível de isquemia miocárdica. Os resultados da DAC são eventos CV adversos
maiores (MACE, do inglês, major adverse CV events) como morte CV, infarto do miocár-
dio (IM), acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência cardíaca, hospitalização, incapa-
cidade e redução das atividades diárias (BAUERSACHS et al., 2019).

As taxas de sobrevivência em pacientes com DAC melhoraram nos Estados


Unidos da América (EUA), por exemplo, a mortalidade ajustada por idade, entre 1980
e 2002, foi aproximadamente reduzida à metade em pacientes do sexo masculino (de
900 a 400 por 100.000) e do sexo feminino (de 500 a 250 por 100.000) com DAC. Já na
Alemanha, a mortalidade ajustada caiu de aproximadamente 300 para 140 por 100.000,
entre 1990 e 2015. Outro ponto importante observado foi a qualidade de vida geral dos
pacientes, as mudanças observadas foram específicas ao gênero, quando as mulheres
relataram uma qualidade de vida mais alta do que os homens nos dois a quatro anos
após um evento CV. Além disso, observaram que pacientes com depressão tiveram um
risco maior de morte e admissão pode IM em comparação com os que tinham DAC sem
depressão (BAUERSACHS et al., 2019).

É importante destacar que, além das condições CV, as condições musculoes-


queléticas também são frequentes em pacientes com DAC, esses pacientes podem vir
a apresentar artrite e dores articulares, levando a incapacidade substancial (BAUERSA-
CHS et al., 2019).

109
2 FISIOPATOLOGIA NA DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA
Por muito tempo, a DAC (também conhecida como doença aterosclerótica) foi
considerada resultante do acúmulo de lipídios na parede arterial. Porém, nas últimas
décadas, houve um aumento nos estudos do campo vascular que forneceram mais
detalhes à definição inicial da doença aterosclerótica (BARBALHO et al., 2015).

Trata-se de uma doença caracterizada pela inflamação crônica da parede da


artéria e, como consequência, a formação de placas envolvendo células inatas do
sistema imune, responsáveis pelo depósito de substâncias constituintes destas placas,
principalmente lipídios, cálcio e células inflamatórias.

Assim, as lesões decorrentes são uma série de respostas celulares e moleculares


altamente específicas, dinâmicas e inflamatórias (BARBALHO et al., 2015) (Figura 8).

FIGURA 8 – DOENÇA CORONARIANA

FONTE: <https://imeb.com.br/wp-content/uploads/2017/06/Doen%C3%A7a-isqu%C3%
AAmica-do-cora%C3%A7%C3%A3o.jpg>. Acesso em: 26 fev. 2021.

110
Os fatores de riscos envolvidos na formação das placas aterogênicas estão
relacionadas ao estilo de vida (dieta aterogênica, sedentarismo, obesidade, tabagismo
e consumo de álcool), além disso, fatores com resistência à insulina (RI) ou diabetes
mellitus, hipertensão arterial, hipertrigliceridemia, baixos níveis de HDL colesterol e LDL
oxidado, alterações nos valores de homocisteína, proteína C reativa (PCR), fator VII de
coagulação do ativador tecidual do plasminogênio e do PAI-1 (BARBALHO et al., 2015).

Nos pacientes que já tem uma predisposição, a aterosclerose se desenvolve


por meio de influência das condições que traumatizam o endotélio, como envelheci-
mento, tabagismo, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, diabetes e obesidade, os
quais estão envolvidos com o dano endotelial o qual estimula uma reação inflamatória
ou proliferativa na parede vascular (BARBALHO et al., 2015).

O processo inflamatório envolvido tem a capacidade de aumentar o risco


para hipertensão arterial e diabetes tipo 2, além de promover elevação das citocinas
inflamatórias envolvidas diretamente com o recrutamento de monócitos e infiltração
de macrófagos na parede arterial, formando assim a placa de ateroma. Esse processo é
lento e assintomático, os sinais demoram anos para se manifestar, por isso é importante
um monitoramento dos marcadores bioquímicos através do exame de PCR, por exemplo,
o qual é um importante marcador (BARBALHO et al., 2015).

A HAS tem relação com o aumento do estresse oxidativo e desencadeamento


do processo inflamatório dos vasos. Além da HAS, como citado anteriormente, a
hiperglicemia também se relaciona com o desenvolvimento da aterosclerose por
diferentes mecanismos. A formação de produtos de glicação avançada (AGE, do inglês,
Advanced Glycation Endproducts) levam à síntese de interleucina 6 (IL-6), à ativação
de macrófagos e ao estresse oxidativo, que provoca o aumento da produção de PCR,
contribuindo para a inflamação (BARBALHO et al., 2015).

Os AGES são mediadores de lesão endotelial, inflamação e alterações lipídicas


como a oxidação do LDL, por exemplo. Essa condição torna o LDL altamente aterogêni-
co, pois os macrófagos envolvidos com a formação da placa têm receptores scavenger
para captação de LDL oxidada, e com o tempo esses macrófagos tornam-se células es-
pumosas. Além disso os AGES estão envolvidos na expressão do gene MCP-1, da molé-
cula 1 de adesão intercelular (ICAM-1), molécula de adesão da célula vascular 1 (VCAM-1)
e PAI-1, que, como vimos anteriormente, estão envolvidos diretamente na formação da
placa de ateroma, esses eventos são seguidos pelo recrutamento de células inflamató-
rias nas paredes dos vasos.

Uma outra propriedade aterogênica dos AGES é a interferência na produção


de óxido nítrico (NO, do inglês, nitric oxide), pois promove a diminuição da atividade
do óxido nítrico sintase – uma família de enzimas que catalisam a produção de óxido
nítrico (NO) a partir da L-arginina. Sabemos que o óxido nítrico tem um importante papel
na regeneração endotelial, na vasodilatação e na inibição da agregação plaquetária,
portanto a deficiência de produção promove uma piora na disfunção endotelial e na
formação da placa (BARBALHO et al., 2015).

111
Como já citado, a obesidade também tem um papel importante na formação da
doença aterosclerótica. Isso acontece devido ao aumento da produção de tecido adiposo
visceral o qual está associado diretamente aos níveis de PCR, o qual é proporcional ao
acúmulo de tecido adiposo visceral e aos componentes da RI.

Assim, o aumento do tecido adiposo visceral está diretamente correlacionado


com o desenvolvimento da aterosclerose. Ou seja, a RI, o aumento do IMC (obesidade,
principalmente a visceral) e a aterosclerose estão relacionados com a resposta
exacerbada dos eventos inflamatórios do endotélio vascular (BARBALHO et al., 2015).

DICAS
Para compreender didaticamente a formação da placa de ateroma, assista ao
vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=WVGMCCNSuW8.

Como já vimos, a aterosclerose pode ser assintomática por muitos anos,


os sinais e sintomas desenvolvem quando as lesões já impedem o fluxo sanguíneo.
Pode haver desenvolvimento de sintomas isquêmicos transitórios (angina estável
por esforço, episódios isquêmicos transitórios e claudicação intermitente), quando as
placas estáveis crescem e reduzem o lúmen arterial em < 70% (THANASSOULIS, 2019).

A vasoconstrição pode alterar uma lesão que não limita o fluxo sanguíneo para
uma estenose grave ou completa e podem surgir sintomas de angina instável ou infarto
do miocárdio, acidente vascular encefálico isquêmico ou dor em repouso nos membros
inferiores pode se desenvolver quando placas instáveis se rompem e causam oclusão
aguda de artéria principal, com superposição de trombose ou embolia. Apesar disso,
a aterosclerose também pode causar morte súbita, sem nenhum sintoma pregresso
(THANASSOULIS, 2019).

O diagnóstico depende dos sintomas. Pacientes sintomáticos com sinais


e sintomas de isquemia devem ser avaliados para determinar o grau e a localização
da oclusão vascular, com exames invasivos e não invasivos, dependendo o órgão
comprometido.

Também devem ser avaliados para determinar a existência de fatores de risco


para aterosclerose: história e exame físico; perfil lipídico de jejum; níveis de hemoglobina
A1C (THANASSOULIS, 2019).

112
Pacientes com doença documentada em um local (exemplo, artérias periféri-
cas) devem ser investigados para identificação da doença em outros locais, como nas
artérias coronárias e carótidas, e para isso pode ser utilizado exames de imagens não
invasivos que avaliarão a morfologia e características da placa: ultrassonografia vascu-
lar tridimensional; tomografia computadorizada (TC); angiografia por RMN.

Alguns exames invasivos também podem ser utilizados: ultrassonografia


intravascular, que utiliza um transdutor de ultrassom na ponta de um cateter para gerar
imagens da luz e da parede da artéria; angioscopia, que utiliza cateteres especiais de fibra
óptica que podem visualizar diretamente a superfície arterial; termografia das placas,
usada para detectar o aumento da temperatura nas placas com processo inflamatório
em atividade; tomografia de coerência óptica, que utiliza laser com luz infravermelha
para geração de imagens; e elastografia, usada para identificar placas moles ricas em
lipídios (THANASSOULIS, 2019).

O tratamento envolve mudanças drásticas no estilo de vida, como dieta,


interrupção do tabagismo e atividade física, além disso, tratamento medicamentoso
de fatores de risco diagnosticados (diabetes, hipertensão, hipercolesterolemia, por
exemplo), utilização de medicamentos antiplaquetários, estatinas, inibidores da enzima
conversora de angiotensina (ECA) e betabloqueadores (THANASSOULIS, 2019).

3 DIETOTERAPIA NA DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA


Agora que já entendemos um pouco da fisiopatologia da DAC, vamos começar a
discutir a dietoterapia, que envolve essa doença complexa e com vários fatores de risco.

Como já vimos, mudanças no estilo de vida são primordiais no controle da doen-


ça, porém, na alimentação, muitas alterações são necessárias, como: menor consumo de
gordura saturada, exclusão de gordura trans, menos carboidratos refinados, maior consu-
mo de frutas, verduras, fibras, ingestão moderada de álcool (THANASSOULIS, 2019).

As modificações dietéticas são requisitos básicos para o controle da hiperco-


lesterolemia e redução do peso, sendo essenciais para todos os pacientes. Além disso,
uma restrição energética se faz importante no controle do peso (THANASSOULIS, 2019).

Os ácidos graxos trans são altamente aterogênicos, sendo necessária sua


exclusão completa do plano alimentar. Pequenas reduções na ingestão de gorduras
não parecem diminuir ou estabilizar a aterosclerose, se faz necessária alterações mais
efetivas que limitam a ingestão de gorduras para 20 g/dia, em que 6 a 10 g são de
gorduras poli e monoinsaturadas, principalmente o ômega 3. A gordura saturada precisa
ser restrita a ≤ 2 g por dia (THANASSOULIS, 2019).

113
Quando os níveis circulantes de ácido graxo ômega 6, ácido araquidônico (AA)
diminuem, os níveis circulantes e a incorporação da membrana celular dos ácidos graxos
ômega 3 (DHA e EPA) aumentam. Essa mudança no perfil ácidos graxos resulta em
uma secreção hepática reduzida de lipoproteínas ricas em triglicerídeos e diminuição na
hipertrigliceridemia (BÄCK, 2017).

Como vimos, na lesão aterosclerótica, os macrófagos infiltrantes sofrem uma


troca de mediado lipídico quando o ômega 3 e AA competem como substrato para as
enzimas biossintéticas do mediado lipídico, gerando a série 5 do leucotrieno B (LT), que
atua como inibidores da sinalização de LTB4 pró-inflamatória.

Além disso, DHA e EPA servem como substrato para, por exemplo, as resolvinas
de mediadores de pró-resolução especializados (SPMs) das séries D e E, respectivamente.
No total, essa troca de mediador lipídico desviará a balança da inflamação para a pró-
resolução, inibirá a progressão da placa e aumentará a estabilidade da placa.

Embora o tromboxano derivado de EPA (TX) A3 das plaquetas exiba ações


agregadoras mais fracas em comparação com seu análogo derivado de AA TXA2, as
duas prostaciclinas, PGI2 e PGI3, são antiagregantes e vasodilatadoras. Além disso, o
último equilíbrio é, portanto, inclinado para um perfil benéfico pela suplementação de
ômega 3 (Figura 9) (BÄCK, 2017).

114
FIGURA 9 – MECANISMO DE AÇÃO DO ÔMEGA 3 NA ATEROSCLEROSE

↑DHA 22:6 (ω-3)


↑AA 20:4 (ω-6)
↑EPA 20:5 (ω-3)

Fígado

Placa aterosclerótica

Macrófago

↓ Triglicerídeos

↑ resolvinas(-
série D e E)

Pró-
aterogênico
Pró-
resolução
Endotélio

Plaquetas
Instabili- Progres-
dade da são da
placa placa

Agregação plaquetária
Vasodilatação
anti-agregação
FONTE: Adaptada de Bäck (2017)

Em um manejo dietético no qual o aumento dos carboidratos serve para com-


pensar a diminuição das gorduras saturadas, eleva os níveis de triglicerídeos plasmáti-
cos e reduz os níveis de HDL, por isso, a deficiência calórica deve ser compensada com
proteínas e gorduras insaturadas, em vez de carboidratos, porém, deve-se incentivar o
consumo de carboidratos complexos (ex.: verduras e grãos integrais).

115
O consumo de frutas e verduras (cinco porções ao dia) parece ter influência na
redução do risco de aterosclerose. O mecanismo envolvido ainda precisa ser esclarecido,
não se sabe se é decorrente da redução de gordura saturada, ou aumento da ingestão
de fibras e vitaminas (THANASSOULIS, 2019).

Que o consumo de fibras é importante é inegável, mas você sabe qual a relação
do consumo de fibras com o manejo da DAC? Vamos ver de forma resumida a seguir.

As fibras insolúveis são resistentes à hidrólise por enzimas do intestino delgado


em humanos, mas são utilizadas e fermentadas por bactérias intestinais em ácidos
graxos de cadeia curta (AGCC) no intestino grosso. Os AGCC levam a alterações na
microbiota intestinal, contribuindo para efeitos hipocolesterolêmicos da fibra solúvel.
Além disso, a fibra adiciona volume à dieta, adsorve e sequestra o colesterol, diminuindo
a absorção hepática e aumenta a excreção através da bile e dos lipídios fecais e dos
ácidos biliares (SOLIMAN, 2019).

A microbiota intestinal também pode estar relacionada com a DAC. Estudos


demonstram que a fosfatidilcolina ou L-carnitina dietética (proveniente de alimentos
de origem animal, principalmente carne vermelha) é metabolizada pela microbiota
intestinal em trimetilamina (TMA) no intestino, a TMA é transportada para o fígado e
oxidada pela flavina mono-oxigenase 3 (FMO3), levando à produção de TMAO (N-óxido
de trimetilamina). A TMAO acelera o desenvolvimento da aterosclerose, promovendo um
influxo de colesterol, inibindo o efluxo de colesterol, bloqueando a via de ácidos biliares e/
ou causando ativação excessiva de plaquetas. Assim, a TMAO pode ser considerado um
biomarcador de risco para DCV e promotor de doenças ateroscleróticas (MA; LI, 2018).

Polifenóis, prebióticos e probióticos são considerados a estratégia dietética


dos três “P”, cujo objetivo é regular a composição da microbiota intestinal e/ou suas
atividades metabólicas/imunológicas. Os polifenóis são metabólitos secundários das
plantas que possuem atividades biológicas importantes, como: anti-inflamatória,
antioxidante e anticarcinogênica (PIECZYNSKA et al., 2020).

Os produtos naturais contêm grande quantidade de polifenóis que possuem


funções como proteção ao sistema CV e redução das respostas inflamatórias, porém, a
maioria deles não pode ser absorvido diretamente pelo intestino delgado, por isso sua
biodisponibilidade e impacto na saúde do hospedeiro depende da função da microbiota
intestinal e da conversão de seus componentes, e essa conversão é realizada pelas
bactérias intestinais (PIECZYNSKA et al., 2020).

116
LEITURA
COMPLEMENTAR
HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR: DOENÇA AFETA NÍVEL DE
COLESTEROL NO SANGUE

Jornal da USP

A American Heart Association (AHA) em uma pesquisa recente aprofundou os


conhecimentos a respeito da hipercolesterolemia familiar, uma doença hereditária que
afeta o processo de remoção do colesterol do sangue. Essa condição pode desencadear
20 vezes mais distúrbios cardíacos e pode atingir pessoas que possuem a doença 20
anos mais cedo que a população em geral. Os resultados desse estudo são de mais de
duas décadas de pesquisas.

Uma em cada 250 pessoas será afetada pelo problema na população em geral.
O componente genético, faz com que nas famílias afetadas uma em cada duas pessoas
desenvolvam a doença. Geralmente, várias gerações da mesma família apresentam
colesterol alto, e possuem antecedentes de problemas do coração, como infarto e
angina, de 10 a 15 anos antes da população em geral. Isso acontece, pois, o colesterol
apresenta níveis altos desde o nascimento do indivíduo, o valor pode variar de duas a
quatro vezes mais alto do que o normal, e é essa exposição precoce que leva a problemas
cardíacos mais cedo.

No Brasil, o programa Hipercol Brasil, realiza o diagnóstico genético e de trata-


mento de pessoas com a doença, e nos últimos 10 anos houve avanços nos estudos
da doença por conta desse programa. O Hipercol já avaliou 5 mil pessoas, a maioria do
estado de São Paulo, e diagnosticou 1,5 mil casos, encaminhando o paciente para o
tratamento no Incor.

Além disso, o programa ainda conta com a triagem em cascata, que consiste
em convidar a família da pessoa que teve o diagnóstico positivo a fazer o teste genético
também, e isso acaba identificando o problema em outras pessoas e expandindo o
tratamento. Esse processo é importante, pois trata-se de uma doença silenciosa, e que
pode ser tratada quando identificada, seja através de medicações preventivas a fim de
reduzir o colesterol, associada a dieta.

O LDL-c, conhecido popularmente como colesterol ruim, tem seu valor normal
em torno de 110 mg/dL, em uma pessoa com hipercolesterolemia esse valor pode
alcançar o valor de 300 mg/dL.

117
Outra maneira de identificar o risco de o indivíduo desenvolver problemas car-
díacos é através de uma tomografia cardíaca, onde pode se identificar placas ateros-
cleróticas, que entopem as artérias em pessoas assintomáticas. Esse exame detecta a
calcificação nos vasos, sendo diretamente proporcional, quanto mais cálcio, mais placas
e quanto mais placas, maior o risco de infarto. Se identificado em uma pessoa com idade
biológica de 40 anos uma coronária repleta de cálcio, isso equivale a uma idade vascular
de alguém de 70 anos.

O programa Hipercol identificou que 20% dos pacientes já tiveram algum tipo de
evento vascular no passado, além disso já estão tratando a terceira geração de algumas
famílias e o tratamento foi gradualmente evoluindo.

FONTE: Adaptado de <https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/01/01/hiper-


colesterolemia-familiar-doenca-afeta-nivel-de-colesterol-no-sangue.htm?cmpid=copiaecola>.
Acesso em: 26 fev. 2021.

118
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:

• A doença arterial coronariana é silenciosa e progressiva que, sem tratamento e pre-


venção adequados, acaba levando a eventos cardiovasculares, hospitalização, pro-
cedimentos de revascularização que representam um gasto econômico significativo,
com hospitalização, medicamentos e perda de produtividade.

• É importante destacar que além das condições CV, as condições musculoesqueléticas


também são frequentes em pacientes com DAC, esses pacientes podem vir a
apresentar artrite e dores articulares, levando a incapacidade substancial.

• A DAC é caracterizada pela inflamação crônica da parede da artéria e, como


consequência, a formação de placas, envolvendo células inatas do sistema imune
as quais são responsáveis pelo depósito de substâncias constituintes destas placas,
principalmente lipídios, cálcio e células inflamatórias.

• Os fatores de riscos envolvidos na formação das placas aterogênicas estão relacio-


nados ao estilo de vida (dieta aterogênica, sedentarismo, obesidade, tabagismo e
consumo de álcool).

• O processo inflamatório envolvido na DAC é lento e assintomático, os sinais demo-


ram anos para se manifestar, por isso é importante um monitoramento dos marca-
dores bioquímicos.

• O diagnóstico depende dos sintomas. Pacientes sintomáticos com sinais e sin-


tomas de isquemia devem ser avaliados para determinar o grau e a localização
da oclusão vascular, com exames invasivos e não invasivos, dependendo o órgão
comprometido. Também devem ser avaliados para determinar a existência de fato-
res de risco para aterosclerose: história e exame físico; perfil lipídico de jejum; níveis
de hemoglobina A1C.

• O tratamento da DAC envolve mudanças drásticas no estilo de vida como dieta,


interrupção do tabagismo e atividade física, além disso, tratamento medicamentoso
de fatores de risco diagnosticados (diabetes, hipertensão, hipercolesterolemia, por
exemplo), utilização de medicamentos antiplaquetários, estatinas, inibidores da
enzima conversora de angiotensina (ECA) e betabloqueadores.

• As modificações dietéticas são requisitos básicos para o controle da hipercolestero-


lemia e redução do peso, sendo essenciais.

119
• Os ácidos graxos trans são altamente aterogênicos, sendo necessária sua exclusão
completa do plano alimentar.

• O consumo de frutas e verduras (cinco porções ao dia) parece ter influência na


redução do risco de aterosclerose.

• A fibra adiciona volume à dieta, adsorve e sequestra o colesterol, diminuindo a


absorção hepática e aumenta a excreção através da bile e dos lipídios fecais e dos
ácidos biliares.

• Polifenóis, prebióticos e probióticos são considerados a estratégia dietética dos três


“P”, que tem como objetivo regular a composição da microbiota intestinal e/ou suas
atividades metabólicas/imunológicas.

120
AUTOATIVIDADE
1 Trata-se de uma doença caracterizada pela inflamação crônica da parede da artéria
e, como consequência, a formação de placas envolvendo células inatas do sistema
imune, as quais são responsáveis pelo depósito de substâncias constituintes destas
placas, principalmente lipídios, cálcio e células inflamatórias. Que doença é essa?

a) ( ) Doença arterial coronariana.


b) ( ) Insuficiência cardíaca.
c) ( ) Infarto agudo do miocárdio.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

2 Os pacientes que já têm uma predisposição à aterosclerose se desenvolvem por meio


de influência das condições que traumatizam o endotélio, como:

I- Envelhecimento, tabagismo, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, diabetes e


obesidade.
II- Envelhecimento, tabagismo, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, diabetes e
atividade física.
III- Apenas envelhecimento.
IV- Apenas hipertensão arterial.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a afirmativa III está correta.
b) ( ) As afirmativas III e IV estão corretas.
c) ( ) Apenas a afirmativa I está correta.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

3 A diabetes mellitus promove complicações vasculares que são a principal causa


de morbimortalidade nos países desenvolvidos. Entre as explicações, de como a
hiperglicemia crônica produz danos celulares e teciduais na doença cardiovascular
está a formação de produtos que são mediadores de lesão endotelial, inflamação e
alterações lipídicas, como a oxidação do LDL. Quais produtos são esses?

a) ( ) AGES.
b) ( ) Óxido nítrico.
c) ( ) Proteína C reativa.
d) ( ) Molécula de adesão da célula vascular 1.

121
4 Mudanças no estilo de vida são primordiais no controle da doença, porém na
alimentação muitas alterações são necessárias, como:

I- Menor consumo de gordura saturada, exclusão de gordura trans, menos carboidratos


refinados, maior consumo de frutas, verduras, fibras, ingestão moderada de álcool.
II- Menor consumo de gordura saturada, consumo moderado de gordura trans,
menos carboidratos refinados, maior consumo de frutas, verduras, fibras, ingestão
moderada de álcool.
III- Maior consumo de gordura saturada, exclusão de gordura trans, menos carboidratos
refinados, maior consumo de frutas, verduras, fibras, ingestão moderada de álcool.
IV- Maior consumo de gordura saturada, consumo moderado de gordura trans, menos
carboidratos refinados, menor consumo de frutas, verduras, fibras, ingestão
moderada de álcool.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a afirmativa I está correta.
b) ( ) Apenas a afirmativa II está correta.
c) ( ) Apenas a afirmativa III está correta.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

5 Os ____________________________ leva a alterações na microbiota intestinal, contribuindo


para efeitos hipocolesterolêmicos da fibra solúvel. Assinale a alternativa que comple-
ta a lacuna.

a) ( ) Lactobacillus.
b) ( ) AGCC.
c) ( ) Polifenóis.
d) ( ) Probióticos.

6 ____________________________, ___________________________ e ___________________________ são


considerados a estratégia dietética dos três “P”, que tem como objetivo regular a
composição da microbiota intestinal e/ou suas atividades metabólicas/imunológicas.
Assinale a alternativa que completa as lacunas.

a) ( ) Polifenóis, prebióticos e proteínas.


b) ( ) Polifenóis, peptídeos e probióticos.
c) ( ) Polifenóis, prebióticos e probióticos.
d) ( ) Polifenóis, proteínas e prebióticos.

7 A aterosclerose pode ser assintomática por muitos anos, os sinais e sintomas


desenvolvem quando as lesões já impedem o fluxo sanguíneo, por isso o tratamento
deve ser iniciado o mais rápido possível. O que envolve o tratamento da aterosclerose?

8 Os polifenóis são metabólitos secundários das plantas que possuem atividades


biológicas importantes. Quais são essas atividades biológicas?

122
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126
UNIDADE 3 —

TRATO GASTROINTESTINAL
E DOENÇAS CRÔNICAS
NÃO TRANSMISSÍVEIS NA
NUTRIÇÃO CLÍNICA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender a fisiopatologia e dietoterapia da diabetes tipo 1, tipo 2 e síndrome


metabólica;

• reconhecer a fisiopatologia dessas doenças;

• aprender a dietoterapia adequada em cada patologia abordada;

• entender o raciocínio clínico necessário na abordagem das patologias.

PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar
o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – DIABETES MELLITUS TIPO 1


TÓPICO 2 – DIABETES MELLITUS TIPO 2
TÓPICO 3 – SÍNDROME METABÓLICA

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

127
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!

Acesse o
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128
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
DIABETES MELLITUS TIPO 1

1 INTRODUÇÃO
A diabetes tipo 1 (DM1) é uma doença heterogênea, trata-se de uma destruição
das células beta pancreáticas, ocasionando a deficiência absoluta de insulina. Alguns
casos se atribuem a uma destruição autoimune mediada de células beta (tipo 1a),
enquanto uma minoria de casos resulta de destruição idiopática ou falha de células
beta (tipo 1b) (MAAHS et al., 2010). 5 a 10% do total de casos de diabetes do mundo é
proveniente da DM1, sendo mais comum em crianças e adolescentes, apesar do diabetes
tipo 2 (DM2) ser mais frequentemente diagnosticado na juventude (MAAHS et al., 2010).

Assim como outras doenças crônicas, o DM é um importante e crescente pro-


blema de saúde, independente do grau de desenvolvimento dos países. A Internatio-
nal Diabetes Federation (IDF) estimou que 8,8% da população mundial com 20 a 79
anos de idade (424,9 milhões de pessoas) vivia com diabetes. Segundo as projeções,
em 2045 628,6 milhões de pessoas podem apresentar DM. No Brasil, as projeções
para 2045 são de 20,3 milhões (18,6 a 22,1) de pessoas com diabetes (entre 20 a 79
anos) (DIRETRIZES [...], 2019).

Um dado interessante é sobre o aumento da prevalência estar associado a


fatores como: rápida urbanização, transição epidemiológica, transição nutricional, estilo
de vida sedentário, excesso de peso, crescimento e envelhecimento populacional e a
maior sobrevida dos indivíduos com diabetes. Cerca de 79% dos casos vivem em países
em desenvolvimento e é nesses países que ocorrerá o maior aumento dos casos de DM
nas próximas décadas (DIRETRIZES [...], 2019).

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a glicemia elevada é o


terceiro maior fator de causa de mortalidade prematura, superada apenas por pressão
arterial aumentada e uso de tabaco (DIRETRIZES [...], 2019).

Estudos epidemiológicos tentam elucidar a história natural e a patogênese do


DM, baseando-se apenas nas alterações glicêmicas apesar da grande variedade de ma-
nifestações clínicas e condições associadas. Nas últimas décadas foram sugeridos me-
canismos etiológicos diferentes, como genéticos, ambientais e imunológicos, os quais
possuem papel importante no curso clínico e no aparecimento de complicações do DM
(DIRETRIZES [...], 2019).

129
É importante que tenhamos informações sobre a incidência (frequência de
novos casos) e a prevalência (casos existentes) para que possamos determinar a carga
que o DM representa no sistema de saúde.

A incidência dá informações do risco médio da população adquirir a doença,


servindo também de parâmetro para a avaliação do impacto produzido por medidas de
prevenção. A prevalência nos indica a magnitude da carga atual que a doença repre-
senta para os serviços de saúde e para a sociedade, serve também como preditor da
futura carga que as complicações crônicas do DM representarão (DIRETRIZES [...], 2019).

Em 2015, houve um óbito a cada oito segundos em decorrência do DM, sendo


que a idade era de 20 a 79 anos. A doença cardiovascular é a principal causa de óbito
entre as pessoas com DM, responsável por metade dos óbitos por diabetes na maioria
dos países.

O DM também é responsável por 10,7% da mortalidade mundial por todas as


causas, ou seja, é maior que a soma de óbitos causados por doenças infecciosas (HIV/
AIDS, tuberculose e malária) (DIRETRIZES [...], 2019).

Em regiões mais carentes, onde faltam recursos médicos, os indivíduos com


diabetes tipo 1 tendem a morrer precocemente por complicações metabólicas agudas
(por falta de insulina, por exemplo) ou infecções (tuberculose), já indivíduos com DM2,
nesses locais, têm a doença cerebrovascular (hipertensão) uma das principais causas
de óbito (DIRETRIZES [...], 2019).

A maioria dos países despendem de 5 a 20% do seu gasto total com saúde para
o tratamento do DM, visto que esses pacientes fazem uma maior utilização dos serviços
de saúde, perdem a produtividade, requerem cuidados prolongados para tratar compli-
cações crônicas como: insuficiência renal, cegueira, problemas cardíacos e pé diabético.

O elevado custo torna o DM um importante desafio para os sistemas de saúde e


um obstáculo para o desenvolvimento econômico sustentável (DIRETRIZES [...], 2019).

130
2 FISIOPATOLOGIA DA DIABETES MELLITUS TIPO 1

DICAS
Antes de começarmos a discutir a fisiopatologia da DM1, é importante resgatar
alguns conceitos de bioquímica e fisiologia. Por isso, assista ao vídeo clicando
disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4CRK3VAtojc.

Agora que já resgatamos alguns conceitos, podemos continuar.

Como sabemos, a DM1 tem um caráter multifatorial, tendo como base a pre-
disposição genética, a qual, quando sofre ação de fatores ambientais, desencadeia
agressões contra as células β pancreáticas (NEVES et al., 2017). Nos Estados Unidos,
indivíduos com parentes de primeiro grau com DM1 tem risco de 1 em 20 de desenvolver
DM1 ao longo da vida, em comparação com o risco de 1 em 300 ao longa da vida para a
população em geral.

Irmãos de crianças com início de DM1 antes dos 5 anos de idade têm um risco
cumulativo de diabetes três a cinco vezes maior aos 20 anos, em comparação com
irmãos de crianças diagnosticadas entre 5 e 15 anos de idade. Assim, o início do DM1
antes dos 5 anos é um marcador de alto risco familiar e sugere um papel importante para
os fatores genéticos (MAAHS et al., 2010). Falando dos genes agora, existem múltiplos
genes implicados na suscetibilidade (e resistência) ao DM1, os mais importantes são
os antígenos leucocitários humano (HLA) no cromossomo 6, em particular de classe II,
sendo que dois haplótipos de suscetibilidade na região HLA de classe II são considerados
os principais marcadores de suscetibilidade para DM1 (MAAHS et al., 2010).

Pesquisas têm sugerido uma tendência temporal recente de menos genótipos


HLA de alto risco em jovens diagnosticados com DM1, levantando a hipótese de uma
influência maior dos fatores ambientais no desenvolvimento de DM1 nas últimas décadas
(MAAHS et al., 2010). Existem também associações, bem elucidadas, entre DM1 e outras
doenças autoimunes, como doença autoimune de tireoide, doença de Addison, doença
celíaca e gastrite autoimune. Essa associação de doenças autoimunes está relacionada
a genes dentro do complexo principal de histocompatibilidade (MAAHS et al., 2010).

Como vimos, os fatores ambientais podem ser bem atuantes no desenvolvimento


da DM1. Pesquisas demonstram que os fatores ambientais no início da vida parecem
desencadear o processo imunomediado em indivíduos geneticamente suscetíveis. Além
disso, esses mesmos estudos evidenciaram que os fatores não genéticos desempenham
um papel no desenvolvimento de DM1 em estudos de migração, aumento da incidência
em populações geneticamente estáveis e estudos de gêmeos (MAAHS et al., 2010).

131
Esses fatores ambientais que iniciam a destruição das células β pancreáticas
ainda são desconhecidos, porém, há hipóteses de que fatores nutricionais possam estar
envolvidos como: leite de vaca, amamentação, glúten, vitamina D e E.

Sugere-se que a introdução precoce de leite de vaca em bebês pode contribuir


para o desenvolvimento de DM1 na infância, mas as pesquisas são ambíguas e podem
depender da suscetibilidade genética. Outro ponto é a introdução de cereais ricos
em glúten ou outros alimentos na infância, alterando o risco de autoimunidade e
desenvolvimento de DM1.

Em contrapartida, a suplementação de vitamina D e E na infância parece estar


associada à redução do risco de DM1, exercendo assim um fator protetor. Porém, todas
essas evidências ainda estão sendo discutidas, necessitando de evidências mais firmes
na influência dos fatores nutricionais na etiologia da DM1 (MAAHS et al., 2010).

Como vimos, os fatores genéticos e ambientais exercem influência na


perda progressiva da massa de células β-pancreáticas e/ou alteram sua função que
se manifesta clinicamente como hiperglicemia, levando ao desenvolvimento de
complicações como mostra a Figura 1 (SKYLER et al., 2016).

132
FIGURA 1 – FATORES GENÉTICOS E AMBIENTAIS NA FISIOPATOLOGIA DO DIABETES

Ambiente
Genes ex: vírus, microbioma, ativ. Física,
fatores dietéticos

Inflamação e Inflamação e estresse


autoimunidade metabólico

Destruição das células beta Disfunção da célula beta

Hiperglicemia

Diabetes (tipo 1, tipo 2, outras formas)

Complicação

Complicações microvasculares Complicações macrovasculares


Retinopatia Doença arterial coronariana
Nefropatia Doença arterial periférica
Neuropatia Derrame

FONTE: Adaptada de Skyler et al. (2016)

Fatores de risco genéticos e ambientais levam à inflamação, autoimunidade


e estresse metabólico, isso afeta a massa e a função das células β-pancreáticas,
fazendo com que os níveis de insulina sejam incapazes de responder suficientemente
às demandas de glicose, levando a níveis altos de hiperglicemia, configurando assim o
DM (SKYLER et al., 2016).

133
No DM1 a secreção anormal de insulina pode ocorrer bem antes do diagnóstico,
sendo que um declínio gradual começa pelo menos dois anos antes do diagnóstico e
acelerando próximo ao diagnóstico. As células β-pancreáticas apresentam um declínio
em sua sensibilidade à glucose, podendo ocorrer um período de tempo semelhante.
Então, à medida que a resposta insulínica inicial declina, a resposta insulínica posterior
torna-se maior, indicando um possível mecanismo compensatório (SKYLER et al., 2016).
Agora vamos conversar um pouco do diagnóstico do DM1.

O diagnóstico do DM1 geralmente é realizado em pacientes jovens (crianças,


adolescentes ou adultos jovens) que apresentam sintomas de hiperglicemia grave
(poliúria, polidipsia, polifagia, noctúria e perda de peso inexplicada). Esses sintomas
podem evoluir rapidamente e progredir para cetose, desidratação e acidose metabólica,
caracterizando cetoacidose diabética (CAD) especialmente na presença de estresse
agudo (CONITEC, 2019).

Os valores glicêmicos acima dos valores de referência, mas ainda abaixo


dos valores diagnósticos de DM, denomina-se pré-diabetes. A resistência à insulina
já está presente e, na ausência de medidas de combate aos fatores de risco, evolui
frequentemente para a doença manifesta e associa-se ao risco aumentado de doença
cardiovascular e complicações.

As categorias de tolerância à glicose são definidas com base nos seguintes


exames: glicemia em jejum, teste de tolerância oral a glicose (TTOG) e hemoglobina
glicada (HbA1c). Além disso, ainda pode ser solicitado autoanticorpo e peptídeo C
(DIRETRIZES [...], 2019) (Quadro 1).

QUADRO 1 – ESTÁGIOS DO DM1 E SUAS CARACTERÍSTICAS

Estágios
1 2 3
Autoimunidade Anticorpos positivos Anticorpos positivos Anticorpos positivos
Hiperglicemia
Disglicemia: níveis
evidente e de início
glicêmicos alterados,
recente, critérios
compatíveis com pré-
Normoglicemia: clássicos para
Níveis glicêmicos diabetes (jejum entre
glicemia de jejum, diagnóstico de DM
para diagnóstico 100 e 125 mg/dL, 2h
TOTG e HbA1c normais. (glicemia de jejum
no TOTG entre 140 e
≥ 126mg/dL, 2h no
199 mg/dL, ou HbA1c
TOTG ≥ 200mg/dL,
entre 5,7 e 6,4%).
ou HbA1c ≥ 6,5%*).
Sintomas Ausentes Ausentes Presentes
Legenda: HbA1c – hemoglobina glicada; TOTG – teste oral de tolerância à glicose; DM –
Diabetes mellitus.
*Em pacientes sintomáticos, deve-se preferir diagnóstico pelas dosagens diretas de glicemia
em vez da determinação de HbA1c.

FONTE: Diretrizes [...] (2019, p. 20)

134
Após o diagnóstico inicial e a estabilização metabólica, alguns pacientes com
DM1 mantêm a capacidade de produzir insulina endógena.

A manutenção dessa baixa secreção insulínica é importante, pois está asso-


ciada a uma menor incidência de retinopatia e hipoglicemia menos grave em estágios
avançados da doença. Por isso, com o objetivo de preservar a secreção de insulina após
o início da doença tem se tornado um alvo terapêutico e pode envolver terapia intensiva
com insulina, tecnologias mecânicas ou intervenção imunológica para se interromper a
destruição das células β-pancreáticas (ATKINSON; EISENBARTH; MICHELS, 2014).

O peptídeo C é secretado pelas células β em uma proporção de um para um com


a insulina, e essa análise, após o início da doença, mostra que a perda é mais rápida no
primeiro ano após o diagnóstico do que no segundo ano, sendo que crianças e adoles-
centes perdem a produção de insulina endógena em uma taxa maior do que adultos
com DM1 (ATKINSON; EISENBARTH; MICHELS, 2014).

Com o avanço da ciência, já existem vários métodos para otimização metabóli-


ca por meio da terapia com insulina. Existe a possibilidade de injeções diárias, análogo
de insulina de ação prolongada fornecendo insulina basal e uma insulina de ação rápida,
administrada antes das refeições com base na quantidade de carboidratos consumidos.

Uma tecnologia interessante, porém, com alto custo, são as bombas de infusão
contínua de insulina, que controlam de forma mais eficaz os níveis de glicose (ATKIN-
SON; EISENBARTH; MICHELS, 2014). Estudos mostram que pacientes adultos com DM1,
que fizeram uso da bomba de infusão, apresentaram níveis mais baixos de hemoglobina
glicada (HbA1C), atingindo níveis desejados de HbA1C.

Além disso, preparações e sistemas de aplicação de insulina foram aprimora-


dos, houve avanços para o controle glicêmico e diminuição da hipoglicemia que incluem:
medição de HbA1C no local de atendimento, relatórios de automonitoramento de glicose
no sangue e monitores de glicose contínuos em tempo real, reduzindo hipoglicemia e a
HbA1C (ATKINSON; EISENBARTH; MICHELS, 2014).

135
NOTA
• Glicemia em jejum: coletada em sangue periférico após
jejum calórico de no mínimo 8 horas;
• TOTG: previamente à ingestão de 75 g de glicose dissolvida
em água, coleta-se uma amostra de sangue em jejum para
determinação da glicemia; coleta-se outra, então, após
duas horas da sobrecarga oral. Importante reforçar que a
dieta deve ser a habitual e sem restrição de carboidratos
pelo menos nos três dias anteriores à realização do teste.
Permite avaliação da glicemia após sobrecarga, que pode
ser a única alteração detectável no início do DM, refletindo
a perda de primeira fase da secreção de insulina;
• Hemoglobina glicada (HbA1c): oferece vantagens ao refletir
níveis glicêmicos dos últimos três a quatro meses e ao sofrer
menor variabilidade dia a dia e independer do estado de
jejum para sua determinação. Vale reforçar que se trata
de medida indireta da glicemia, que sofre interferência
de algumas situações, como anemias, hemoglobinopatias
e uremia, nas quais é preferível diagnosticar o estado de
tolerância à glicose com base na dosagem glicêmica direta.
Outros fatores, como idade e etnia, também podem interferir
no resultado da HbA1c (DIRETRIZES [...], 2019, p. 23).

O tratamento da DM1 é basicamente o uso da insulina, que é imprescindível e


deve ser instituído assim que o diagnóstico for feito.

O Control and Complications Trial (DCCT) demonstrou que o tratamento intensi-


vo do DM1 com três ou mais doses diárias de insulina (com diferentes tipos de ação), ou
com o sistema de infusão contínua (bomba de infusão), é eficaz na redução das compli-
cações crônicas advindas do mau controle glicêmico (DIRETRIZES [...], 2017). O objetivo
do tratamento do DM1 é manter as metas glicêmicas dentro dos limites da normalidade.

Esquemas terapêuticos diferentes podem ser adotados no tratamento, mas,


na prática, a reposição insulínica é feita com uma insulina basal (que tem a função
de evitar a lipólise e a liberação hepática de glicose no período interalimentar), uma
insulina durante as refeições (bolus de refeição) e doses de insulina necessárias para
corrigir as hiperglicemias pré-prandiais ou no período interalimentar (bolus de correção)
(DIRETRIZES [...], 2017).

A escolha do esquema terapêutico deve levar em consideração as caracterís-


ticas das insulinas, idade, estágio puberal, horário da escola/trabalho, atividade física,
padrão de alimentação e a aceitação do esquema proposto pelo indivíduo ou pela fa-
mília (SBD, 2012).

136
Existem diversos tipos de insulinas, as insulinas humanas como a insulina
regular (R) e a insulina intermediária (NPH – Neutral Protamine Hagedorn), os análogos
de insulina, os análogos de insulina de ação ultrarrápida, análogos de ação prolongada,
vamos entender cada uma delas no Quadro 2:

QUADRO 2 – INSULINAS

Tipo Início da ação Pico Duração Horário para injeção


Bolus
Ultrarrápidas (análogos Utilizada junto
ultrarrápidos) às refeições.
• Apidra® (Glulisina) 10-15 minutos 1-2 horas 2-5 horas Deve ser injetada
• Humalog® (Lispro) imediatamente antes
• NovoRapid® (Asparte) das refeições.
Utilizada junto às
Rápida (Insulina Humana
refeições ao dia. Deve
regular) 6 horas e
30 minutos 2-3 horas ser injetada entre 30
• Humulin® N 30 minutos
e 45 minutos antes do
• Novolin® N
início das refeições.
Basal
Frequentemente, a
aplicação começa
Ação intermediária (NPH – uma vez ao dia, antes
humana) de dormir. Pode ser
1-3 horas 5 – 8 horas Até 18 horas
• Humulin® N indicada uma ou
• Novolin® N duas vezes ao dia.
Não é específica para
refeições.
Frequentemente, a
aplicação começa
uma vez ao dia, antes
Lantus: até de dormir. Levemir
Longa duração (Análogos
24h pode ser indicada uma
lentos)
Levemir: de ou duas vezes ao dia.
• Lantus® (Glargina) 90 minutos Sem pico
16 a 24h Tresiba é utilizada
• Levemir® (Detemir)
Degludeca: sempre uma vez ao
• Tresiba® (Degludeca)
>24h dia, podendo variar o
horário de aplicação.
Não é específica para
refeições.
Pré-
misturadas
30% da 30% da
Aplicada junto a uma
Insulina pré-misturada 10-15 minutos dose como dose como
ou mais refeições ao
regular (componente insulina R insulina R
dia. Deve ser injetada
• Homulin® 70/30 R) e 1 a 3 horas e 70% da e 70% da
30 a 45 minutos antes
• Novolin® 70/30 (componente N) dose como dose como
do início das refeições.
insulina N insulina N

137
Insulina Insulina
ultrarrápida ultrarrápida
O número indica
e insulina N e insulina N
o percentual Aplicada junto a uma
Insulina Pré-misturada (de acordo (de acordo
de ultrarrápida ou mais refeições ao
análoga com a com a
na mistura, o dia. Deve ser injetada
• NovoMix® 30 proporção proporção
restante tem o de 0 a 15 minutos
• Humalog Mix® 25 do produto: do produto:
perfil de ação antes do início das
• HumalogMix® 50 25, 30 ou 25, 30 ou
compatível com refeições.
50% da 50% da
insulina N
dose de dose de
ultrarrápida) ultrarrápida

FONTE: <https://www.diabetes.org.br/publico/diabetes/insulina>. Acesso em: 1° mar. 2021.

Quando o paciente compreende como a insulina funciona ele é capaz de planejar


refeições, lanches e exercícios. O tratamento insulinêmico deve ser ajustado quanto ao
estilo de vida e às necessidades do controle glicêmico. Devemos sempre lembrar que
o uso é individual e não, o planejamento terapêutico não será acertado de primeira,
requerendo assim paciência do paciente e do médico (INSULINA, 2021).

A insulina humana (NPH e Regular) é produzida em laboratório, a partir da


terapia de DNA recombinante. A insulina regular é idêntica à humana na sua estrutura,
já a NPH é associada a duas substâncias (protamina e zinco), que promovem um efeito
mais prolongado (INSULINA, 2021). Basicamente, a insulina é injetável, não podendo
ser tomada em pílulas ou cápsulas, pois os sucos digestivos interferem na sua eficácia
(INSULINA, 2021).

As insulinas análogas são produzidas a partir da insulina humana e modifica-


das de modo a terem ação mais curta ou ação mais prolongada. Ainda podem ser
pré-misturadas insulina NPH + insulina Regular, na proporção de 70/30, análogos de
ação prolongada + análogos de ação rápida (Humalog® Mix 25 e 50, Novomix® 30)
(INSULINA, 2021).

Elas podem ser apresentadas em frascos de 100 ml ou em canetas, onde os


refis contêm três ml, ou podem vir em canetas de aplicação descartáveis. Além disso,
como já comentamos, existe a bomba de infusão de insulina que possui outro sistema
(INSULINA, 2021).

138
3 DIETOTERAPIA NA DIABETES MELLITUS TIPO 1
Estudos clínicos e epidemiológicos mostram que a terapia nutricional é
importante no tratamento do DM1, porém, é importante deixar claro que embora
apresente pequenas diferenças, a composição indicada para portadores da doença
assemelha-se à da recomendação para a população em geral (LOTTENBERG, 2008).

O DM está diretamente relacionado ao metabolismo de carboidratos, proteínas e


lipídios, por isso a nutrição desempenha um importante papel no seu controle. Antes do
aparecimento da terapia insulínica, acreditava-se que a restrição de diversos alimentos
seria uma forma eficaz de tratamento, pois prevenia a elevação da glicemia, porém,
essa conduta provocava desnutrição grave gerando morte precoce nos indivíduos
(LOTTENBERG, 2008).

A abordagem nutricional individualizada precisa ser efetiva, pois requer


mudanças no estilo de vida e objetivos que possam resultar em intervenções dietéticas
complexas. Para essa individualização é necessário conhecer aspectos relacionados ao
contexto de produção e do consumo de alimentos, cultura, regionalidade, composição
dos nutrientes e preparo das refeições. Por isso, o nutricionista é o profissional habilitado
para implementar intervenções e educação nutricional para indivíduos com DM.

Muitos estudos tentam identificar a melhor composição de nutrientes para indi-


víduos com DM, porém, não há proporção ideal aplicável, sendo necessário, então, que
macro e micronutrientes sejam prescritos de forma individualizada. Assim, as recomen-
dações são semelhantes às para população geral, considerando a faixa etária (Quadro 3).

QUADRO 3 – RECOMENDAÇÕES DIETÉTICAS PARA DIABETES MELLITUS

Macronutrientes Ingestão recomendada diária


Carboidratos (CHO) 45 a 60%
Sacarose Máximo de 5 a 10% do VET
Frutose Não se recomenda adição aos alimentos
Fibra alimentar Mínimo 14g/ 1.000kcal
20 a 35% do VET; dar preferência para ácidos
graxos monoinsaturados e poli-insaturados;
Gordura total (GT)
limitar os saturados em até 10% e isenta de
trans
Proteína 15 a 20% do VET
Micronutrientes Ingestão recomendada diária
Seguem as recomendações da população
Vitaminas e minerais
sem diabetes
Legenda: VET – Valor Energético Total (considerar as necessidades individuais, utilizando
parâmetros semelhantes aos da população sem diabetes, em todas as faixas etárias).

FONTE: Diretrizes [...] (2019, p. 98)

139
3.1 CONTAGEM DE CARBOIDRATOS
Como sabemos, os carboidratos são os macronutrientes que mais afetam
a glicemia, e quase 100% são convertidos em glicose em um tempo que varia de 15
minutos a duas horas.

Antigamente, antes de 1980, dietas restritas em carboidratos eram prescritas


para indivíduos com diabetes, a partir de 1980, as coisas mudaram e uma dieta contro-
lada em gordura, mas rica em carboidratos “complexos” e fibras alimentares, foi estimu-
lada (SBD, 2016).

Assim foi desenvolvida a metodologia de contagem de carboidratos, a qual é


uma estratégia nutricional que promove uma maior flexibilidade na alimentação e de
acordo com o estilo de vida da pessoa diabética.

Tem como objetivo encontrar o equilíbrio entre a glicemia, a quantidade de


carboidratos ingerida e a quantidade de insulina necessária (SBD, 2016). Todos os
pacientes com DM podem utilizar a contagem de carboidratos, porém, é necessário
motivação, disciplina, trabalho em equipe e compromisso com o método durante toda a
implementação, o que pode ser trabalho no início (SBD, 2016).

O nutricionista definirá qual o valor calórico necessário ao dia e também defi-


nirá quanto de carboidratos precisa ser consumido diariamente e em cada refeição. É
importante que o paciente anote o que consome, para que se conheça as quantidades
e a qualidade da distribuição, lembrando de levar em consideração a atividade física e
o estilo de vida do indivíduo (SBD, 2016). Depois, é necessário medir as glicemias antes
de cada refeição e duas horas depois, para verificar o efeito dos alimentos e da medi-
cação sobre a taxa glicêmica. Conhecendo a quantidade de carboidratos ingeridas e o
efeito daquele alimento nas taxas glicêmicas, o paciente consegue saber a quantidade
de insulina aplicar para se manter na meta glicêmica. Isso traz autonomia para fazer es-
colhas alimentares em ambientes sociais, como festas, casamentos, confraternizações
etc. (SBD, 2016).

DICAS
Para entender mais sobre contagem de carboidratos assista ao vídeo:
https://www.youtube.com/watch?v=JGN3mOOvVwU.

140
3.2 MICROBIOTA
Siljander, Honkanen e Knip (2019) hipotetizam que a microbiota intestinal
pode contribuir para o desenvolvimento de DM1 por meio de duas fases: o processo
começa no nascimento e termina com o aparecimento dos primeiros autoanticorpos
associados ao DM1. Durante essa fase, é importante um treinamento bem-sucedido
do sistema imunológico em desenvolvimento para estabelecer a autotolerância e
controlar as respostas inflamatórias. Se durante esse processo a microbiota intestinal
sofre um desequilíbrio nas proporções de Bacteroides, Bifidobacteria e Eschericia coli,
a maturação do sistema imunológico fica comprometida e aumenta a suscetibilidade a
doenças imunomediadas (SILJANDER; HONKANEN; KNIP, 2019).

O segundo ponto que os autores colocam é a fase de soroconversão para DM1,


que parece ser caracterizada por uma diversidade microbiana reduzida e uma disbiose
intestinal pró-inflamatória. Sendo esse um desafio para a ciência, a qual ainda precisa
explorar os mecanismos por trás dessa propagação da inflamação intestinal local em
direção à autoimunidade (SILJANDER; HONKANEN; KNIP, 2019).

O processo ainda será logo, estudos terão que ser aprofundados e a ciência ain-
da está no início dos entendimentos sobre o papel do microbioma intestinal no desen-
volvimento de DM1 e doenças imunomediadas (SILJANDER; HONKANEN; KNIP, 2019).

90 ANOS DE INSULINA

Em 1921, três cientistas canadenses chamados Frederick G. Banting, Charles


H. Best e James Collip, trabalhando em um laboratório da Universidade de Toronto,
descobriram a insulina, um hormônio proteico retirado das ilhotas pancreáticas
bovinas que se mostrava eficaz em reduzir a glicemia de cães pancreatectomizados.

Em 1922, 15ml desse extrato pancreático foi injetado no adolescente Le-


onard Thompson, o qual era portador de diabetes e se apresentava em estado
clínico extremamente crítico, porém, sem que se obtivesse resposta em reduzir
glicosúria e cetonúria, e produzindo um abscesso estéril no local da aplicação. Ja-
mes Collip então conseguiu purificar o extrato pancreático e uma segunda dose foi
administrada no jovem Leonard Thompson, o qual teve seu metabolismo regulari-
zado e sua vida restituída.

Desde então a insulina nos conta uma trajetória brilhante na história da


medicina, e o detalhe importante é o espaço de tempo curto em que uma pesquisa
básica e seu uso imediato, na beira do leito do paciente. Porém, atualmente
vivemos na era da medicina baseada em evidência, de grandes estudos clínicos,

141
nos quais medicamentos e tratamentos são prescritos baseados em estatística e
médias. Muitas vezes os estudos clínicos são feitos em ambientes controlados e
demonstram eficácia, porém, quando se extrapola para a vida real não conseguem
ser reproduzidos. Mas esses resultados geram evidências que se transformam em
diretrizes, posicionamentos e recomendações da sociedade científica.

Atualmente a tecnologia com toda a sua capacidade computacional,


algoritmos e ferramentas de busca está envolvida em um desenvolvimento mais
rápido da genômica. E isso pode mudar completamente a forma com se faz ciência.

A insulina então contribuiu para se questionar sobre o método científico


atual, pois se em 11 de janeiro de 1922 vigorassem os atuais critérios para uso clínico
de uma substância, a insulina só teria sido liberada para uso oito a dez anos após e
Leonard Thompson não teria contado a mesma história.

FONTE: Adaptado de <https://www.diabetes.org.br/publico/ultimas/400-%2090-anos-de-


insulina>. Acesso em: 1° mar. 2021.

142
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• A diabetes tipo 1 (DM1) é uma doença heterogênea, trata-se de uma destruição das
células beta pancreáticas ocasionando a deficiência absoluta de insulina.

• O DM é um importante e crescente problema de saúde, independente do grau de


desenvolvimento dos países.

• A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a glicemia elevada é o terceiro


maior fator de causa de mortalidade prematura superada apenas por pressão arterial
aumentada e uso de tabaco.

• A maioria dos países despendem de 5 a 20% do seu gasto total com saúde para o
tratamento do DM.

• A DM1 tem um caráter multifatorial, tendo como base a predisposição genética.

• Existem múltiplos genes implicados na suscetibilidade (e resistência) ao DM1, os mais


importantes são o antígeno leucocitário humano (HLA).

• Existem, também, associações bem elucidadas entre DM1 e outras doenças au-
toimunes, como doença autoimune de tireoide, doença de Addison, doença celíaca e
gastrite autoimune.

• Os fatores genéticos e ambientais exercem influência na perda progressiva da massa


de células β-pancreáticas e/ou alteram sua função que se manifesta clinicamente
como hiperglicemia.

• No DM1 a secreção anormal de insulina pode ocorrer bem antes do diagnóstico, sen-
do que um declínio gradual começa pelo menos dois anos antes do diagnóstico e
acelerando próximo ao diagnóstico.

• Após o diagnóstico inicial e a estabilização metabólica, alguns pacientes com DM1


mantêm a capacidade de produzir insulina endógena.

• Já existem vários métodos para otimização metabólica por meio da terapia com insulina.

• Existe a possibilidade de injeções diárias, análogo de insulina de ação prolongada


fornecendo insulina basal e uma insulina de ação rápida, administrada antes das
refeições com base na quantidade de carboidratos consumidos.

143
• O tratamento da DM1 é basicamente o uso da insulina, o qual é imprescindível e deve
ser instituído assim que o diagnóstico for feito.

• O objetivo do tratamento do DM1 é manter as metas glicêmicas dentro do limite da


normalidade.

• A terapia nutricional é importante no tratamento do DM1.

• O DM1 está diretamente relacionado ao metabolismo dos carboidratos, proteínas e


lipídios por isso a nutrição desempenha um importante papel no seu controle.

• A abordagem nutricional individualizada precisa ser efetiva, pois requer mudanças no


estilo de vida e objetivos que possam resultar em intervenções dietéticas complexas.

• Estudos tentam identificar a melhor composição de nutrientes para indivíduos com


DM, porém, não há uma proporção ideal aplicável.

• A contagem de carboidratos é uma estratégia nutricional que promove maior


flexibilidade em sua alimentação, de acordo com o estilo de vida da pessoa diabética.

• A microbiota pode contribuir para o aparecimento do DM1.

144
AUTOATIVIDADE
1 Como sabemos, a DM1 tem um caráter multifatorial, tendo como base a predisposição
genética, a qual, quando sofre ação de fatores ambientais, desencadeia agressões
contra as células β pancreática. Existem múltiplos genes implicados na suscetibilidade
(e resistência) ao DM1, os mais importantes são:

a) ( ) PDCA.
b) ( ) HLA.
c) ( ) BLA.
d) ( ) DLA.

2 O aparecimento de outras doenças autoimunes contra outros órgãos e tecidos são


mais frequentes e ocorrem em 20% a 30% dos portadores de DM1, que tem relação
especialmente com o aumento da idade, duração do diabetes e sexo feminino. Quais
são essas doenças?

I- Doença autoimune de tireoide.


II- Doença de Addison.
III- Doença celíaca.
IV- Gastrite autoimune.
V- Doença de Parkinson.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a alternativa I está correta.
b) ( ) Apenas as alternativas II e V estão corretas.
c) ( ) As alternativas I, II, III e IV estão corretas.
d) ( ) Todas as alternativas estão corretas.

3 Quando a massa e a função das células β-pancreáticas são afetadas, fazem com
que os níveis de _____________________ sejam incapazes de responder suficientemente às
demandas de glicose, levando a níveis altos de hiperglicemia, configurando assim o
DM. Assinale a alternativa que preenche corretamente a lacuna.

a) ( ) Leptina.
b) ( ) Insulina.
c) ( ) Adiponectina.
d) ( ) Cortisol.

145
4 O DM pode ser diagnosticado por meio da realização de exames laboratoriais e um
conjunto deles é importante para determinar a tolerância à glicose. As categorias de
tolerância à glicose são definidas com base em quais exames?

5 O DM1 tem um caráter multifatorial, tendo como base a predisposição genética, a


qual, quando sofre ação de fatores ambientais, desencadeia agressões contra as
células β pancreáticas. Com base no seu caráter multifatorial, classifique V para as
afirmativas verdadeiras e F para as falsas:

( ) Após o diagnóstico inicial e a estabilização metabólica, alguns pacientes com DM1


mantêm a capacidade de produzir insulina endógena.
( ) Existe a possibilidade de injeções diárias, análogo de insulina de ação prolongada
fornecendo insulina basal e uma insulina de ação rápida, administrada antes das
refeições com base na quantidade de lipídios consumidos.
( ) As bombas de infusão contínua de insulina, controlam de forma menos eficaz os
níveis de glicose.
( ) Estudos mostram que pacientes adultos com DM1 que fizeram uso da bomba
de infusão, apresentaram níveis mais baixos de hemoglobina glicada (HbA1C),
atingindo níveis desejados de HbA1C.
( ) A contagem de carboidratos, é uma estratégia nutricional que promove uma menor
flexibilidade na alimentação.

Assinale a alternativa que contém a sequência CORRETA:


a) ( ) V; F; F; V; F.
b) ( ) F; F; F; V; F.
c) ( ) F; F; F; F; F.
d) ( ) V; V; V; F; F.

6 Esquemas terapêuticos diferentes podem ser adotados no tratamento da DM1, mas,


na prática, a reposição insulínica é feita com uma insulina basal, uma insulina duran-
te as refeições (e doses de insulina necessárias para corrigir as hiperglicemias pré-
-prandiais ou no período interalimentar (bolus de correção). De acordo com o expos-
to, qual insulina é produzida em laboratório, a partir da terapia de DNA recombinante?

7 O tratamento da DM1 é basicamente o uso da insulina, que é imprescindível e deve


ser instituído assim que o diagnóstico for feito. Quais características o esquema
terapêutico insulinêmico deve levar em consideração?

I- As características das insulinas.


II- A idade.
III- O estágio puberal.
IV- O horário da escola/trabalho.
V- A atividade física.
VI- O padrão de alimentação e a aceitação do esquema proposto pelo indivíduo ou
pela família.

146
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As características I, II e III estão corretas.
b) ( ) As características IV, V e VI estão incorretas.
c) ( ) Apenas a característica VI está incorreta.
d) ( ) Todas as características estão corretas.

8 O peptídeo é secretado pelas células β em uma proporção de um para um com a insu-


lina e pode ser analisado. A análise do peptídeo, após o início da doença, mostra que a
perda é mais rápida no primeiro ano após o diagnóstico do que no segundo ano, sendo
que crianças e adolescentes perdem a produção de insulina endógena em uma taxa
maior do que adultos com DM1. De acordo com o exposto, qual é o peptídeo?

9 A compreensão de como a insulina funciona torna o paciente capaz de planejar


refeições, lanches e exercícios. O tratamento insulinêmico deve ser ajustado quanto
ao estilo de vida e às necessidades do controle glicêmico. Devemos sempre lembrar
que o uso é individual e não, o planejamento terapêutico não será acertado de
primeira, requerendo, assim, paciência do paciente e do médico. De acordo com o
exposto, quais insulinas são produzidas a partir da insulina humana e modificadas de
modo a terem ação mais curta ou ação mais prolongada?

a) ( ) Insulinas análogas.
b) ( ) Análogos lentos.
c) ( ) NPH humana.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

147
148
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
DIABETES MELLITUS TIPO 2

1 INTRODUÇÃO
As Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) são consideradas causas
importantes de morbidade e mortalidade no mundo. O Estudo de Carga Global de
Doença coloca que as DCNT correspondiam, em 1990, por 43% dos anos de vida perdidos
ajustados por incapacidade (Disability Adjusted Life Years – DALY), e, em 2010, passou
a representar 54% (COSTA et al., 2017).

A Organização Mundial da Saúde (OMS), coloca que o impacto humano e


socioeconômico das DCNT afeta o progresso das Desenvolvimento do Milênio, sendo
suas consequências impactadas nos países de baixa e média renda e populações em
vulnerabilidade (COSTA et al., 2017).

A diabetes mellitus tipo 2 (DM2) é uma DCNT e é considerada uma epidemia,


que corresponde por, aproximadamente, 90% dos casos de diabetes. As estimativas são
alarmantes, no ano de 2030, 439 milhões de indivíduos podem ser diagnosticados com
DM2, acredita-se ainda que 50% dos DM2, atualmente, desconhecem que têm a doença
instalada (COSTA et al., 2017).

Não podemos esquecer que o envelhecimento da população, a prevalência da


obesidade e do sedentarismo e os processos de urbanização estão envolvidos com o
aumento da incidência e prevalência do DM2 em todo o mundo. Indivíduos com DM2
geram um alto custo social e financeiro ao paciente e ao sistema de saúde, pois o DM2
está associado a complicações graves como insuficiência renal crônica, amputação
de membros inferiores, cegueira, doença cardiovascular (DCV), entre outras. Essas
complicações acarretam em prejuízos à autonomia e qualidade de vida dos indivíduos
(COSTA et al., 2017).

2 FISIOPATOLOGIA NA DIABETES MELLITUS TIPO 2


Como vimos no Tópico 1, o indivíduo está constantemente sujeito a oscilações
na concentração plasmática de glicose, já que os níveis glicêmicos aumentam após
uma refeição e diminuem progressivamente durante o intervalo entre as refeições
(BARREIROS, 2015).

O sistema de regulação e contrarregulação é complexo, baseado em hormônios


sensíveis a situações extremas, com o objetivo de sempre manter a glicose em concen-
tração adequada assegurando a homeostase do organismo (BARREIROS, 2015).

149
Quando o nível de glicose aumenta no sangue (após uma refeição), as
células β pancreáticas promovem o aumento da insulina, esse aumento estimula
a gliconeogênese e a glicólise com consequente produção de glicogênio e piruvato.
Porém, quando o nível plasmático de glicose cai, sintomas de alerta são acionados e
mecanismos de contrarregulação envolvem outras respostas hormonais, nas quais as
células β pancreáticas reduzem a síntese de insulina, mas o nível de glicose continua
caindo, e aí entra um incremento na secreção de glucagon pelas células α pancreáticas,
o qual estimula a produção hepática de glicose via glicogenólise (quebra de glicogênio)
e via gliconeogênese (convertendo ácido lático, aminoácidos e glicerol). Porém, quando
esses sistemas falham, ocorrem o DM (BARREIROS, 2015).

A inflamação pode ser considerada um fator comum entre o DM1 e DM2, que leva
à destruição das células β pancreáticas. No DM1, por exemplo, as células β danificadas
liberam autoantígenos que se apresentam ao T-helper via células apresentadoras de
antígenos. Citocinas ativas de liberação de T auxiliares que aumentam a inflamação, por
sua vez induzem espécies reativas de oxigênio (ROS, do inglês reactive oxygen specie)
e Fas, levando à apoptose das células β. Da mesma forma, no DM2, os tecidos adiposos
liberam citocinas que aumentam a inflamação e afetam a sinalização da insulina nas
células β via ativação das vias JNK (do inglês c-Jun NH2-terminal kinase) e NF-κB (do
inglês, Nuclear factor-κB) (Figura 2) (TAN et al., 2019).

FIGURA 2 – INFLAMAÇÃO E DM

Legenda: APC - Célula apresentadora de antígeno; TNF-α /-β - fator de necrose tumoral α e β;
MCP-1 - proteína quimioatrativa de monócitos-1; IL-6 – interleucina-6; IL1β - interleucina-1β; PAI-
1 - inibidor-1 do ativador do plasminogênio; RI – Resistência à insulina.
FONTE: Tan et al. (2019)

150
O DM2 corresponde a 90-95% dos casos de DM. É mais comum no adulto depois
dos 40 anos, mas pode ocorrer em populações com elevada prevalência da doença.
Trata-se de uma doença silenciosa, que passa despercebida durante anos, e seu
diagnóstico só é feito quando surgem complicações ou valores alterados nos exames
de sangue (BARREIROS, 2015).

Está associada à história familiar, envelhecimento, estilo de vida, sedentarismo


e obesidade abdominal. É caracterizada pela resistência periférica à insulina, princi-
palmente nas células musculares, além disso, uma produção de glicose pelo fígado e
alteração na secreção pancreática de insulina (BARREIROS, 2015).

Nos estágios iniciais, os indivíduos apresentam níveis de insulina normais ou


pouco elevados em jejum, mas que gradualmente atingem concentrações despropor-
cionalmente elevadas em relação à glicose no sangue. Esse fato compromete as células
β pancreáticas até que não tenha insulina suficiente para absorção de glicose pelas cé-
lulas corporais e se inicie a síntese hepática de glicose aumentando cada vez mais sua
concentração sanguínea (BARREIROS, 2015).

Para identificar essas alterações, é necessário fazer um rastreamento que


consiste em um conjunto de procedimentos que tem como objetivo diagnosticar o DM2
ou a condição de pré-diabetes em indivíduos assintomáticos. Isso é importante para a
saúde pública, pois a possibilidade de diagnóstico e tratamento precoce, minimiza os
riscos de complicações cardiovasculares, por exemplo (DIRETRIZES [...], 2019).

Esse procedimento de rastreamento deve ser realizado em uma população


de alto risco, selecionada de acordo com os escores dos questionários como Finnish
Diabetes Risk Score (FINDRISC) ou o da Associação Americana de Diabetes (American
Diabetes Association – ADA), ambos já validados. Se não houver a possibilidade de
aplicação dos questionários, o rastreamento pode ser feito em indivíduos acima de 45
anos, ou qualquer idade, com sobrepeso/obesidade, hipertensão arterial ou história
familiar de DM2 (DIRETRIZES [...], 2019).

Outros fatores de risco que devem ser levados em consideração são a história
prévia de diabetes gestacional, uso de medicações como corticoides, diuréticos
tiazídicos, antipsicóticos e atentar-se para a presença de comorbidades associadas
ao DM2 como periodontite, infecções micóticas, hepatite C e infecções virais crônicas.
Se fatores de risco cardiovasculares forem identificados, estes devem ser tratados
corretamente (DIRETRIZES [...], 2019).

Os exames realizados para o diagnóstico de DM2 podem ser usados no rastre-


amento como: glicemia de jejum, glicemia de duas horas pós-sobrecarga ou hemoglo-
bina glicada (HbA1c).

151
A glicemia de duas horas pós-sobrecarga diagnostica mais casos que os outros
testes, mas é o menos utilizado. Quando mais de um teste é feito e ocorrem resultados
diferentes confirmados, considera-se aquele que diagnostica o DM2 ou o pré-diabetes
(DIRETRIZES [...], 2019). Confira no Quadro 4 os critérios diagnósticos para o DM2.

QUADRO 4 – CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA DM2

Glicose 2
horas pós
Glicose Glicose ao
sobrecarga HbA1c
em jejum acaso (mg/ Observações
com 75g de (%)
(mg/dL) dL)
glicose (mg/
dL)
OMS emprega valor
de corte de 110 mg/
Normoglicemia < 100 < 140 - < 5,7
dL para normalidade
da glicose em jejum.
Positividade de
Pré-diabetes
qualquer dos
ou risco ≥ 100 e < ≥ 5,7 e
≥ 140 e <200# - parâmetros confirma
aumentado 126* < 6,5
diagnóstico de pré-
para DM
diabetes.
Positividade de
qualquer dos
parâmetros confirma
diagnóstico de
≥ 200 com DM. Método de
sintomas HbA1c deve ser
Diabetes
≥ 126 ≥ 200 inequívocos ≥ 6,5 o padronizado.
estabelecido
de Na ausência
hiperglicemia de sintomas de
hiperglicemia, é
necessário confirmar
o diagnóstico pela
repetição de testes.
Legenda: OMS: Organização Mundial da Saúde; HbA1c: hemoglobina glicada; DM: diabetes
mellitus.
* Categoria também conhecida como glicemia de jejum alterada.
# Categoria também conhecida como intolerância oral à glicose.

FONTE: Diretrizes [...] (2019, p. 24)

2.1 TRATAMENTO FARMACOLÓGICO


O tratamento farmacológico do diabetes mellitus tipo 2, também pode ser feito
através de insulinoterapia, porém, os esquemas de aplicação podem variar. Em alguns
pacientes, os níveis de glicemias não controlados adequadamente com a modificação
no estilo de vida e hipoglicemiantes orais não insulínicos, possuem a necessidade de
acrescentar a insulina quando a glicemia permanecer sem controle, mesmo quando há
a utilização de três fármacos ou mais (BRUTSAERT, 2019).

152
Os esquemas insulínicos variam de uma única injeção/dia de insulina de ação
longa ou intermediária (geralmente ao ir dormir) até esquemas com múltiplas doses,
utilizados para pacientes dom DM1, mas, geralmente, prefere-se utilizar o esquema
mais simples e eficaz.

Como esses pacientes podem apresentar uma resistência à insulina, alguns


precisam de doses mais altas (> 2 U/Kg/dia), e uma complicação comum é o ganho de
peso, pela redução da perda de glicose na urina e à melhora na eficiência metabólica
(BRUTSAERT, 2019). Além da insulina, os pacientes DM2 contam com o auxílio de
hipoglicemiantes orais, que são praticamente a base do tratamento do DM2 associados
aos agonistas do receptor de peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1).

Os hipoglicemiantes orais podem aumentar a secreção pancreática de insulina


(secretagogos), sensibilizar tecidos periféricos à ação da insulina (sensibilizadores),
alterar a absorção gastrointestinal de glicose e aumentar a glicosúria. Sendo que os
fármacos com diferentes mecanismos de ação podem ser combinados, apresentando
uma ação sinérgica (BRUTSAERT, 2019).

As sulfonilreias são da classe secretagogos, ou seja, estimulam a secreção de


insulina pelas células β pancreáticas e podem também melhorar a função periférica
e a sensibilidade hepática à insulina reduzindo assim a toxicidade da glicose (BRUT-
SAERT, 2019).

A utilização das sulfonilreias está bem estabelecido há décadas, mas apre-


senta riscos de hipoglicemia, principalmente, em idoso e multimórbidos (PFEIFFER;
KLEIN, 2014).

Essa hipoglicemia, causada por fármacos de longa ação pode persistir por
dias após a interrupção do tratamento, ocasionalmente pode causar incapacidades
neurológicas permanentes e levar a morte. Indivíduos que utilizam as sulfonilreias em
monoterapia acabam precisando de outros fármacos para atingir uma glicemia normal,
sugerindo que as sulfonilreias podem esgotar a função das células β (BRUTSAERT,
2019). Além disso, essa classe medicamentosa promove um ganho de peso e parece
perder a eficácia mais rapidamente que a metformina (PFEIFFER; KLEIN, 2014).

Os secretagogos de insulina de ação rápida, trabalham de forma semelhante às


sulfonilreias estimulando a secreção de insulina, o diferencial é que apresentam ação
mais rápida e podem estimular mais a secreção de insulina durante as refeições do
que em outros momentos. Sendo assim, são eficazes em reduzir a hiperglicemia pós-
prandial e parecem causar menor risco de hipoglicemia. Os indivíduos que fazem uso
dos secretagogos podem ganhar peso, porém, menos do que aqueles que fazem uso de
sulfonilreias (BRUTSAERT, 2019).

153
Já as biguanidas agem de forma diferente, reduzindo a glicemia plasmática
por diminuírem a produção hepática de glicose (gliconeogênese e glicogenólise). Elas
sensibilizam perifericamente a insulina, mas essa captação periférica de glicose pode
ser resultado da redução de glicose decorrente dos seus efeitos hepáticos. Também
possuem a capacidade de diminuir os níveis de lipídios e, consequentemente, diminuir
a absorção de nutrientes no trato gastrointestinal (TGI), aumentar a sensibilidade
das células β pancreáticas à glicose circulante e reduzir as concentrações de PAI-1,
exercendo um efeito antitrombótico.

A metformina é um medicamento da classe das biguanidas, e é tão eficaz quanto


as sulfonilreias na redução da glicose plasmática, raramente causa hipoglicemia e pode
ser utilizada com segurança com outros fármacos e insulina, ela não causa ganho de
peso, promove uma perda ponderal por suprimir o apetite, porém, os efeitos colaterais
sobre o TGI são dispepsia e diarreia, que podem até desaparecer com o tempo. Além
disso, causa má absorção de B12 (BRUTSAERT, 2019).

A classe das tiazolidinedionas (TZD) tem como objetivo reduzir a resistência


periférica à insulina, mas seu mecanismo específico ainda não é bem elucidado.
Sugere-se que esse fármaco se liga a um receptor nuclear primário presente nas células
adiposas como o PPAR-γ (proliferadores do peroxissoma gama), que está envolvido na
transcrição de genes que regulam o metabolismo da glicose e dos lipídios. A classe
das TZD aumenta a concentração de colesterol HDL, reduzem triglicerídeos, podem
apresentar efeitos anti-inflamatórios e antiateroscleróticos (BRUTSAERT, 2019).

Os efeitos colaterais das TZD podem ser edema periférico, especialmente em


pacientes que utilizam insulina e pode agravar a insuficiência cardíaca em pacientes
suscetíveis. Demonstra ganho de peso substancial (> 10 Kg) em alguns indivíduos
(BRUTSAERT, 2019).

Existem também os inibidores da α-glicosidase, sendo que a acarbose é o


principal inibidor da -glicosidase retardando a digestão dos carboidratos, a absorção da
glicose e reduzindo os níveis de glicose pós-prandial (UPADHYAY et al., 2018).

Essa classe de medicamentos inibe competitivamente enzimas intestinais que


hidrolisam os carboidratos da alimentação, sendo assim, os carboidratos são digeridos
e absorvidos mais lentamente, reduzindo assim as concentrações pós-prandiais de
glicose (BRUTSAERT, 2019). Através do seu mecanismo de ação não causam hipoglicemia
(UPADHYAY et al., 2018).

O problema está na sua eficácia e nos efeitos adversos, visto que os inibidores
da α-glicosidase são menos eficazes que outros fármacos e os pacientes abandonam
o tratamento por apresentarem dispepsia, flatulência e diarreia. Porém, são fármacos
seguros e podem ser usados em associação a outros fármacos orais e insulina
(BRUTSAERT, 2019).

154
Outra classe de medicamentos são os inibidores da dipeptil peptidase 4 (DPP-
4), que são uma enzima da membrana plasmática amplamente expressa em todo o
organismo, principalmente nos linfócitos T circulantes, pâncreas exócrino, TGI e cérebro.
A DPP-4 afeta polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP) e peptídeo
semelhante ao glucagon (GLP-1), mas também outras moléculas como o polipeptídeo
pancreático (PP), quimiocinas e substância P. O mecanismo de ação resumido é a
inibição da degradação enzimática das incretinas, incluindo GLP-1 e GIP, aumentando o
nível de GLP-1 bioativo endógeno, consequentemente, aumenta a secreção de insulina
de forma dependente da glicose (UPADHYAY et al., 2018). Um dos efeitos colaterais é o
aumento do risco de pancreatite, mas, de qualquer forma, são considerados seguros e
bem tolerados (BRUTSAERT, 2019).

A glicose é filtrada pelos rins e é reabsorvida no túbulo convoluto proximal. A


quantidade de glicose filtrada aumenta linearmente com o aumento da concentração
de glicose circulante até que o máximo de transporte de glicose seja alcançado. Essa
reabsorção ocorre via cotransportador de sódio-glicose 2 (SGLT2), que são proteínas
transportadoras ligadas à membrana de alta capacidade e baixa afinidade.

Os SGLT2 são responsáveis por até 90% da reabsorção de glicose e atuam


independentemente da insulina. Em pacientes com DM2 os SGLT2 são regulados
positivamente, resultando em um aumento de 20% no transporte máximo de glicose,
aumentando, então, a reabsorção de glicose (UPADHYAY et al., 2018).

Os inibidores de SGLT2, bloqueiam o SGLT2 no túbulo proximal do rim, bloque-


ando assim a reabsorção de glicose, causando glicosúria e diminuindo a glicemia. O pro-
blema está nos efeitos colaterais mais comuns – infecções geniturinárias –, principal-
mente infecções fúngicas, hipotensão ortostática e cetoacidose diabética em pacientes
DM1 e DM2 (UPADHYAY et al., 2018; BRUTSAERT, 2019).

Outra classe são os agonistas de GLP-1, os quais aumentam a secreção insulino-


dependente da glicose e desaceleram o esvaziamento gástrico. Esses agonistas podem
reduzir o apetite, promover perda ponderal e estimular a proliferação das células β
pancreáticas. Os efeitos adversos são relacionados ao TGI, como náuseas e vômitos, e
também causam um ligeiro aumento do risco de pancreatite (BRUTSAERT, 2019). E, por
último, os análogos da amilina.

A amilina é liberada junto com a insulina pelas células β pancreáticas, portanto,


quando há disfunção nas células β pancreáticas ocorre deficiência de amilina e insulina.
A amilina reduz o esvaziamento gástrico, diminuindo a taxa de absorção dos alimentos,
possivelmente também aumenta a saciedade e diminui a ingestão calórica (UPADHYAY
et al., 2018). Assim, os seus análogos mimetizam a amilina, ajudando a regular e controlar
as concentrações da glicemia (BRUTSAERT, 2019).

155
DICAS
Leia mais sobre os tratamentos para o DM2 acessando os artigos indicados
a seguir:

• https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3952010/
• https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28920861/.

3 DIETOTERAPIA NA DIABETES MELLITUS TIPO 2


Que os fatores dietéticos são muito importantes no controle e prevenção do DM
já sabemos, porém, apesar de todo o progresso nas orientações dietéticas baseadas em
evidências, alguns desafios e controvérsias existem (FOROUHI et al., 2018).

Saber o que comer e manter o padrão alimentar ideal é um desafio, por isso a ideia
de fazer uma dieta para uma doença crônica, como o DM, pode afastar muitas pessoas.
A terapia nutricional foi estabelecida para guiar uma abordagem sistemática, baseada
em evidências, para o controle do DM através da dieta, sua eficácia foi comprovada, mas
ocorrem dificuldades importantes nesse processo (FOROUHI et al., 2018).

A maioria das diretrizes recomendam o início da farmacoterapia após as


primeiras mudanças nutricionais e de estilo de vida (introdução da prática de atividade
física), porém, isso não é seguido, visto que a maioria dos médicos não têm expertise em
intervenções nutricionais tornando uma barreira para orientar esse paciente de forma
eficaz (FOROUHI et al., 2018). Outro ponto importante é que conversar sobre nutrição
com o paciente consome muito tempo, é claro que muitos locais contam com uma
equipe multidisciplinar com nutricionistas, médicos e educadores físicos, mas longe
desses grandes centros a realidade é outra, o paciente sai da consulta médica com um
plano alimentar padrão impresso, ou apenas com a prescrição dos medicamentos sem
nem receber orientações sobre alimentação (FOROUHI et al., 2018).

Outro problema complexo é aumentar a ingestão para cinco porções/dia de


frutas e vegetais, como é recomendado pela maioria das diretrizes.

O custo dessas cinco porções/dia pode comprometer a renda familiar em


até 52% em países de baixa renda. Puxando o gancho pelo valor dos alimentos, um
mercado de alimentos rotulados “para diabéticos” foi estabelecido, onde os produtos
são caros e não são mais saudáveis, podendo até muitas vezes serem piores que os
alimentos normais (FOROUHI et al., 2018). Diante do abordado anteriormente, é de suma
importância o papel do profissional nutricionista no tratamento do paciente com DM2 e,
para isso, é importante conhecer a dietoterapia que envolve o DM2.

156
Vimos, no Tópico 1, a dietoterapia relacionada ao DM1, e a dietoterapia relacionada
ao DM2 não é diferente, pois a Sociedade Brasileira de Diabetes traz as recomendações
dietéticas para pacientes com DM de uma forma geral, sendo que as recomendações são
semelhantes às para a população em geral, como podemos rever no Quadro 5.

QUADRO 5 – RECOMENDAÇÕES DIETÉTICAS PARA DIABETES MELLITUS

Macronutrientes Ingestão recomendada diária


Carboidratos (CHO) 45 a 60%
Sacarose Máximo de 5 a 10% do VET
Frutose Não se recomenda adição aos alimentos
Fibra alimentar Mínimo 14g/ 1.000kcal
20 a 35% do VET; dar preferência para ácidos
Gordura total (GT) graxos monoinsaturados e poli-insaturados;
limitar os saturados em até 10% e isenta de trans
Proteína 15 a 20% do VET
Micronutrientes Ingestão recomendada diária
Seguem as recomendações da população sem
Vitaminas e minerais
diabetes
Legenda: VET – Valor energético total (considerar as necessidades individuais, utilizando
parâmetros semelhantes aos da população sem diabetes, em todas as faixas etárias).

FONTE: SBD (2019)

A American Diabetes Association concluiu que não há uma composição ideal


de macronutrientes para todas as pessoas com DM, devendo prestar atenção às metas
individuais recomendadas (FOROUHI et al., 2018).

Dietas de baixo teor de carboidratos e índice glicêmico para controle de peso,


ganharam popularidade, especialistas citam que uma dieta pobre em carboidratos e
baixa ingestão de gordura saturada é a melhor (FOROUHI et al., 2018), porém, devemos
lembrar de analisar o indivíduo como um todo, levando em consideração sua rotina,
hábitos de vida e medicamentos utilizados.

Corroborando com o citado anteriormente, Ojo et al. (2018), em uma revisão


sistemática e metanálise, demonstraram que as dietas com baixo índice glicêmico são
mais eficazes no controle da hemoglobina glicada (HbA1c) e da glicose em jejum, em
comparação com as dietas controle em pacientes com DM2.

Sabemos que o consumo excessivo de carboidratos processados e de alto


índice glicêmico, leva ao aumento da secreção de insulina, que, por sua vez, promove
a oxidação da gordura, facilita a lipogênese “de novo” e promove o armazenamento de
gordura, ao mesmo tempo que favorece a inflamação, resistência à insulina e estresse
oxidativo (PUJOL, 2017).

157
Quando o carboidrato dietético é restrito, a insulina diminui, os processos
metabólicos mudam e favorecem a oxidação de gordura, como consequência esses
indivíduos apresentam melhora no perfil lipídico, melhora dos processos lipotóxicos que
prejudicam as funções das células β pancreáticas e a ação da insulina (PUJOL, 2017).

A perda de peso para pacientes com DM2 é recomendada, visto que a gordura
visceral, principalmente, está relacionada ao aparecimento de DM2. Porém, é necessário
prestar atenção quanto à estratégia dietética a ser utilizada, devido a fatores como:
adesão ao longo do tempo, a qualidade da dieta com baixo teor de carboidratos e
gorduras (FOROUHI et al., 2018)

Assim, a melhor abordagem nutricional para o paciente com o DM2 é uma


avaliação individual bem-feita e um foco na alimentação que mais permite ao indivíduo
limitar a ingestão calórica e melhorar a qualidade dos macronutrientes, evitando os
carboidratos refinados, por exemplo (FOROUHI et al., 2018).

Chester et al. (2019) em um estudo de revisão colocaram que o DM2 é uma


condição complexa, em que a adesão do paciente ao plano alimentar é de extrema
importância.

Os autores analisaram três dietas (low carb e cetogênica, vegana e mediterrânea),


e verificaram que todas as três mostraram uma melhora no controle glicêmico e perda de
peso, porém, a dieta mediterrânea é mais moderada, inclui todos os grupos alimentares e,
consequentemente, se torna mais fácil de o indivíduo manter ao longo prazo.

A dieta mediterrânea possui as características desejadas, como: baixo teor de


carboidratos refinados, alto teor de fibras, moderado teor de gorduras (principalmente
monoinsaturadas) e teor moderado a alto de vegetais e proteínas. A adesão às práticas
dietéticas saudáveis, como a dieta mediterrânea, pode atrasar o processo de DCNT,
incluindo DM2 (ESPOSITO; GIUGLIANO, 2014).

Nos últimos anos, houve um crescente foco na microbiota intestinal como


um fator importante no desenvolvimento de doenças inflamatórias. Já se sabe que a
microbiota intestinal se relaciona com a nutrição, ambiente e genética do hospedeiro para
o desenvolvimento de distúrbios metabólicos relacionados à obesidade. Woldeamlak,
Yirdaw e Biadgo (2019) enfatizam que a disbiose microbiana do trato gastrointestinal
aumenta a captação de energia e expressão de um fenótipo obeso. Mudanças na razão
Bateroidetes/Firmicutes associam-se à maior expressão de genes microbianos que
codificam enzimas relacionadas ao metabolismo dos carboidratos. O microbioma de
pessoas obesas difere do microbioma de indivíduos magros e são caracterizados por
uma prevalência mais baixa de Bateroidetes e mais alta de Firmicutes.

158
Essa alteração na razão Bateroidetes/Firmicutes é um fator ambiental que
fornece material genético para uma capacidade aumentada de captar energia da die-
ta. Essa maior captação de energia promove a lipogênese e aumenta o número e o
tamanho das gotículas de lipídeos nos tecidos extra intestinais (WOLDEAMLAK; YIR-
DAW; BIADGO, 2019).

As alterações no perfil da microbiota e consequentemente no perfil de fermen-


tação do microbioma alteram a permeabilidade intestinal e a homeostase energética, o
que causa endotoxemia, inflamação de baixo grau e obesidade. Isso tudo acarreta uma
hiperglicemia, hiperlipidemia que favorece a obesidade e pode levar em últimos casos a
uma resistência à insulina (WOLDEAMLAK; YIRDAW; BIADGO, 2019).

Assim, é importante uma reintegração da microbiota intestinal por meio da uti-


lização de prebióticos e probióticos no tratamento do paciente com DM2. Sendo impor-
tante a detecção precoce e uma triagem adequada para se identificar o processo de dis-
biose e melhorar a sobrevida desse indivíduo (WOLDEAMLAK; YIRDAW; BIADGO, 2019).

PESSOAS COM DIABETES TÊM O DOBRO DE RISCO PARA INFARTO


AGUDO DO MIOCÁRDIO

Marcelo Bertoluci

Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes há a necessidade de um bom


controle da doença para prevenir complicações cardiovasculares.

As doenças cardiovasculares são as complicações decorrentes do diabetes


que mais levam a óbito, sabia? O International Diabetes Federation (IDF) coloca que
80% dos pacientes com diabetes tipo 2 morrem por causas relacionadas a problemas
cardíacos, sendo que esse índice é superior aos óbitos ligados ao HIV, à tuberculose
e ao câncer de mama.

Indivíduos diabéticos conseguem reduzir o risco de infarto com mudanças


no estilo de vida, que incluem: alimentação saudável, atividade física, parar de fumar,
fazer exames periódicos e utilizar medicações preventivas prescritas pelo médico
que o acompanha.

O médico endocrinologista Dr. Marcello Bertoluci, explica que a incidência de


complicações cardiovasculares é grande no diabetes devido ao aumento dos níveis
de glicose no sangue que, somados ao colesterol e a pressão arterial promovem a
formação de placas de colesterol que danificam e entopem as artérias.

159
Esses níveis muito altos de glicose no sangue, promovem uma série de
eventos como: o colesterol se torna mais agressivo, formando mais placas nas
artérias coronárias, favorece a maior produção de coágulos que também podem
obstruir as artérias, e isso gera falta de oxigênio para o tecido e o tecido sadio morre,
sendo substituído por uma cicatriz, que dependendo da extensão pode ser fatal ou
deixar sequelas irreversíveis, como uma insuficiência cardíaca, por exemplo, explica
o Dr. Marcelo.

Tudo isso somado aos fatores que elevam o risco como hipertensão,
colesterol alto, obesidade, sedentarismo, tabagismo e o histórico familiar de infarto
agudo do miocárdio se potencializam quando a pessoa tem diabetes e devem ser
controlados com rigor, sendo necessário acompanhamento médico periódico.

É importante salientar que os sintomas do infarto agudo do miocárdio


podem ser diferentes nas pessoas com DM. Os sinais clássicos nesses indivíduos
como a dor forte no peito irradiando para o braço podem não ser muito evidentes. Em
algumas pessoas a falta de ar (dispneia) surgida sem explicação, sensação de mal-
estar generalizado com sudorese, náuseas e vômitos, um desmaio inexplicado e até
mesmo uma descompensação do controle da glicose podem ocorrer.

Isso acontece por conta de outra complicação do diabetes, a neuropatia


autonômica, uma disfunção que afeta o sistema nervoso simpático e parassimpá-
tico, isso faz com que as pessoas sintam menos dor e o quadro clínico do infarto
fique mascarado. É importante orientar o paciente que, se sintomas estranhos sur-
girem repentinamente ele deve procurar ajuda imediata em uma unidade médica
de emergência.

Outra complicação que devemos nos atentar é o acidente vascular cerebral


(AVC). No AVC os sinais mais comuns são perda ou diminuição súbita da força ou
surgimento de dormência em apenas um lado do corpo, como braço ou perna. Podem
ocorrer também fala arrastada, confusão mental com troca de palavras, desvio na
boca, ou desmaio. O paciente que apresenta esses sintomas precisa de atendimento
imediato, pois a reversão tardia do fluxo sanguíneo cerebral pode deixar sequelas
irreversíveis ou ser fatal.

A Insuficiência vascular periférica é outra complicação vascular que pode


ocorrer. As artérias que nutrem os membros inferiores são obstruídas levando à
gangrena e a amputações de membros inferiores, por isso o paciente com diabetes
deve fazer exames periódicos dos pés.

160
O Dr. Marcello enfatiza que, na população em geral, essas complicações
vasculares afetam mais os homens do que as mulheres, porém, quando se trata
de diabetes essas diferenças desaparecem. Homens e mulheres acabam tendo
incidências semelhantes de infarto agudo do miocárdio e AVC, mas representam
o dobro quando comparados a pessoas sem diabetes. E vale salientar que quando
ocorre em mulheres elas tendem a ser mais graves, com maior mortalidade.

FONTE: Adaptado de <https://www.diabetes.org.br/publico/noticias/2041-pessoas-com-


diabetes-tem-o-dobro-de-risco-para-infarto-agudo-do-miocardio>. Acesso em: 1° mar. 2021.

161
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:

• As Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) são consideradas uma causa impor-
tante de morbidade e mortalidade no mundo.

• A Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2) é uma das DCNT e considerada uma epidemia, que
corresponde por aproximadamente 90% dos casos de diabetes.

• O DM2 corresponde a 90 a 95% dos casos de DM. É mais comum em adultos depois
dos 40 anos, mas pode ocorrer em populações com elevada prevalência da doença.

• Não podemos esquecer que o envelhecimento da população, a prevalência da obe-


sidade e do sedentarismo e os processos de urbanização estão envolvidos com o
aumento da incidência e prevalência do DM2 em todo o mundo.

• O indivíduo está constantemente sujeito a oscilações na concentração plasmática


de glicose.

• Quando o nível de glicose aumenta no sangue (após uma refeição), as células β pan-
creáticas promovem o aumento da insulina, este aumento estimula a gliconeogênese
e a glicólise com consequente produção de glicogênio e piruvato.

• A inflamação pode ser considerada um fator comum entre o DM1 e DM2, o que leva à
destruição das células β pancreáticas.

• Está associada à história familiar, envelhecimento, estilo de vida, sedentarismo e


obesidade abdominal.

• Nos estágios iniciais, os indivíduos apresentam níveis de insulina normais ou pouco


elevados em jejum, mas que gradualmente atingem concentrações desproporcional-
mente elevadas em relação a glicose no sangue.

• Os exames realizados para o diagnóstico de DM2 podem ser usados no rastreamento


como: glicemia de jejum, glicemia de duas horas pós-sobrecarga ou hemoglobina
glicada (HbA1c).

• O tratamento farmacológico do diabetes mellitus tipo 2, também pode ser feito


através de insulinoterapia, porém, os esquemas de aplicação podem variar.

• Além da insulina, os pacientes DM2 contam com o auxílio de hipoglicemiantes orais.

162
• Saber o que comer e manter o padrão alimentar ideal é um desafio, por isso a ideia de
fazer uma dieta para uma doença crônica como o DM pode afastar muitas pessoas.

• A maioria das diretrizes recomendam o início da farmacoterapia após as primeiras


mudanças nutricionais e de estilo de vida (introdução da prática de atividade física),
porém, isso não é seguido.

• A dietoterapia relacionada ao DM2 não é diferente da DM1, pois a Sociedade Brasileira


de Diabetes traz as recomendações dietéticas para pacientes com DM de uma forma
geral, sendo que as recomendações são semelhantes às da população em geral.

• Não há uma composição dietética ideal para pessoas com DM, devendo prestar
atenção às metas individuais recomendadas.

• Quando o carboidrato dietético é restrito a insulina diminui, os processos metabólicos


mudam, e favorecem a oxidação de gordura, como consequência esses indivíduos
apresentam melhora no perfil lipídico, melhora dos processos lipotóxicos que preju-
dicam as funções das células β pancreáticas e a ação da insulina.

• A perda de peso para pacientes com DM2 é recomendada, visto que a gordura
visceral, principalmente, está relacionada ao aparecimento de DM2.

• A dieta mediterrânea possui as características desejadas, como: baixo teor de


carboidratos refinados, alto teor de fibras, moderado teor de gorduras (principalmente
monoinsaturadas) e teor moderado a alto de vegetais e proteínas.

• Já se enfatiza que a disbiose microbiana do trato gastrointestinal aumenta a captação


de energia e expressão de um fenótipo obeso.

• É importante uma reintegração da microbiota intestinal por meio da utilização de


prebióticos e probióticos no tratamento do paciente com DM2.

163
AUTOATIVIDADE
1 Com o envelhecimento da população, a prevalência da obesidade e do sedentarismo
e os processos de urbanização estão envolvidos com o aumento da incidência e
prevalência do DM2 em todo o mundo. Indivíduos com DM2 geram um alto custo
social e financeiro ao paciente e ao sistema de saúde, pois o DM2 está associado a
complicações. De acordo com o exposto, quais as complicações graves em que o
DM2 está envolvido?

2 O sistema de regulação e contrarregulação é complexo, baseado em __________________


sensíveis a situações extremas, com o objetivo de sempre manter a glicose em con-
centração adequada assegurando a homeostase do organismo. Assinale a alternati-
va que preenche a lacuna corretamente.

a) ( ) Citocinas.
b) ( ) Hormônios.
c) ( ) Células.
d) ( ) Mucosa.

3 A inflamação é um fator comum entre os dois tipos de DM, na DM2, em específico, o


tecido adiposo libera citocinas que aumentam a inflamação e afetam a sinalização de
insulina, nas células especializadas em secretar insulina. De acordo com o exposto,
quais células importantes a inflamação destrói, no caso da DM?

a) ( ) Células de defesa.
b) ( ) Células β pancreáticas.
c) ( ) Células langerhan.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

4 A DM2 é uma doença silenciosa, que passa despercebida durante anos, e seu diag-
nóstico só é feito quando surgem complicações ou valores alterados nos exames de
sangue. De acordo com o exposto, qual é a principal característica metabólica da DM2?

164
5 Para identificar as alterações do DM2, é necessário fazer um rastreamento que con-
siste em um conjunto de procedimentos que tem como objetivo diagnosticar o DM2
ou a condição de pré-diabetes em indivíduos assintomáticos. Isso é importante para
a saúde pública, pois a possibilidade de diagnóstico e tratamento precoce, minimiza
os riscos de complicações cardiovasculares, por exemplo. De acordo com o exposto,
o procedimento de rastreamento do DM2 deve ser realizado em qual população?

a) ( ) Baixo risco.
b) ( ) Médio risco.
c) ( ) Alto risco.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

6 Fatores de risco devem ser levados em consideração no diagnóstico do DM2, como: a


história prévia de diabetes gestacional, uso de medicações como corticoides, diuréticos
tiazídicos, antipsicóticos e atentar-se para a presença de comorbidades associadas ao
DM2 como periodontite, infecções micóticas, hepatite C e infecções virais crônicas.
Se fatores de risco cardiovasculares forem identificados, estes devem ser tratados
corretamente, porém exames laboratoriais também devem ser solicitados. Quais
exames são realizados para o diagnóstico de DM2? Analise as alternativas a seguir:

I- Glicemia de jejum.
II- Glicemia de 2 horas pós-sobrecarga.
III- Hemoglobina glicada (HbA1c).

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) O item I está correto.
b) ( ) O item III está incorreto.
c) ( ) Todas os itens estão corretos.
d) ( ) Nenhum dos itens está correto.

7 O tratamento farmacológico do DM2 pode ser feito através da insulina, com variação nos
esquemas de aplicação. Porém, em alguns pacientes, os níveis da glicemia não são
controlados adequadamente havendo a necessidade de combinar fármacos. Além da
insulina, os pacientes DM2 contam com o auxílio de qual classe medicamentosa?

a) ( ) Inibidores da bomba de prótons.


b) ( ) Hipoglicemiantes orais.
c) ( ) Anticoagulantes.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

165
8 Quando o __________________ dietético é restrito à __________________ diminui, os processos
metabólicos mudam, e favorecem a oxidação de __________________, como consequência
esses indivíduos apresentam melhora no perfil __________________, melhora dos processos
lipotóxicos que prejudicam as funções das células β pancreáticas e a ação da insulina.
Assinale a alternativa que melhor responde as lacunas:

a) ( ) Carboidrato; insulina; gordura; lipídico.


b) ( ) Proteína; insulina; gordura; lipídico.
c) ( ) Carboidrato; insulina; gordura; glicêmico.
d) ( ) Carboidrato; glicose; gordura; lipídico.

9 Dietas de baixo teor de carboidratos e índice glicêmico para controle de peso ganha-
ram popularidade no controle da DM2. Porém, qual é a melhor abordagem nutricional
para o paciente com DM2?

10 As alterações no perfil da microbiota e consequentemente no perfil de fermentação


do microbioma alteram a permeabilidade intestinal e a homeostase energética, o
que causa endotoxemia, inflamação de baixo grau e obesidade. Isso tudo acarreta
uma hiperglicemia, hiperlipidemia que favorece a obesidade e pode levar em últimos
casos a uma resistência à insulina. É importante uma reintegração da microbiota
intestinal por meio da utilização de quais substâncias no tratamento do paciente
com DM2?

a) ( ) Probióticos e prebióticos.
b) ( ) Antibióticos.
c) ( ) Hipoglicemiantes.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

166
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
SÍNDROME METABÓLICA

1 INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, a Síndrome Metabólica (SM) foi alvo de muitos estudos. Foi
definida como um grupo de fatores de risco inter-relacionados de origem metabólica
que contribuem para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV) e DM2
(PENALVA, 2008).

São considerados fatores de risco metabólico: dislipidemia aterogênica


(hipertrigliceridemia, níveis elevados de apolipoproteína B, LDL colesterol com partículas
pequenas e densas, níveis baixos de HDL colesterol), hipertensão arterial, hiperglicemia e
um estado pró-inflamatório e pró-trombótico (PENALVA, 2008).

Outro ponto importante, não é apenas a quantidade de gordura corporal, mas


também a sua distribuição. Quando a gordura é acumulada no abdômen, caracteriza-se
obesidade central ou androide, frequentemente associado ao DM2 e outros problemas
metabólicos, como hipertensão arterial e dislipidemia (altos níveis de triglicerídeos e
baixos níveis de HDL), doença cardiovascular aterosclerótica (COSTA; PAULA, 2006).

Os estudos hipotetizam que a resistência à insulina seja a ligação entre os fatores


que integram a SM, e foi Reaven (1998 apud COSTA; PAULA, 2006) que descreveu a
associação entre esses fatores denominando de síndrome X e que incluía a intolerância
à glicose, hipertensão arterial, dislipidemia e doença cardiovascular aterosclerótica,
porém, com o passar dos anos, esse conceito foi ampliado e agora outras comorbidades
fazem parte desse contexto, recebendo o nome de SM.

2 FISIOPATOLOGIA DA SÍNDROME METABÓLICA


Os mecanismos que envolvem a SM são complexos e ainda precisam ser
totalmente elucidados. Discute-se se os componentes individuais da SM representam
patologias distintas ou manifestações de um mecanismo patogênico comum (ROCHLANI
et al., 2017).

Os fatores ambientais e o estilo de vida, como o consumo excessivo de calorias


e a falta de atividade física podem ser os principais contribuintes.

167
Como já vimos, o acúmulo de gordura visceral, no abdômen, demonstra ser
um gatilho primário para a maioria das patologias envolvidas na SM, confirmando a
importância da ingestão calórica excessiva como um dos principais fatores. De todos
os mecanismos propostos, a resistência à insulina, a ativação neuro-hormonal e a
inflamação crônica parecem ser os principais pilares na iniciação, progressão e transição
de SM para DCV (ROCHLANI et al., 2017) (Figura 3).

FIGURA 3 – PILARES DA SÍNDROME METABÓLICA

FONTE: Rochlani et al. (2017)

Se regatarmos alguns mecanismos das aulas de bioquímica, vamos lembrar que


a insulina aumenta a captação de glicose no músculo e no fígado e inibe a lipólise e
a gliconeogênese hepática. Quando ocorre a resistência à insulina no tecido adiposo,
prejudica a inibição da lipólise mediada pela insulina, aumentando consequentemente
os ácidos graxos livres (AGL) circulantes, os quais, por sua vez, vão inibir ainda mais o
efeito antilipolítico da insulina (ROCHLANI et al., 2017).

Os AGL inibem a proteína quinase no músculo, reduzindo assim a captação


de glicose. Em contrapartida aumentam a ativação da proteína quinase no fígado,
promovendo gliconeogênese e lipogênese, gerando assim um estado hiperinsulinêmico
para manter a euglicemia (glicemia normal). Porém, eventualmente, essa compensação
falha e a secreção de insulina diminui, pois os AGL são lipotóxicos para as células β
pancreáticas, reduzindo então a secreção de insulina (ROCHLANI et al., 2017).

168
Outro fator que a resistência à insulina contribui, é para o desenvolvimento de
hipertensão, pois há perda do efeito vasodilatador da insulina e vasoconstrição causada
pelos AGL. Além disso, aumentam a ativação simpática e reabsorção de sódio nos rins.
A resistência à insulina também causa aumento da viscosidade do sangue, indução de
um estado pró-trombótico e liberação de citocinas pró-inflamatórias do tecido adiposo,
contribuindo para o surgimento de DCV (ROCHLANI et al., 2017).

Você percebe que a hiperinsulinemia causa um efeito cascata, desequilibrando


vários sistemas? Por isso é importante olhar para o paciente como um todo, e entender
os mecanismos envolvidos por trás de cada patologia. Vamos continuar.

Como citado anteriormente, os depósitos de gordura visceral exercem um


importante papel na patogenia da SM. Esses depósitos contribuem para a resistência
à insulina, muito mais do que a gordura subcutânea, pois a lipólise visceral leva a
um aumento do suprimento de AGL para o fígado através da circulação esplênica. O
aumento dos AGL promove o aumento da síntese de triglicerídeos e apolipoproteína
B contendo LDL de muito baixa densidade, rica em triglicerídeos no fígado. Esse
aumento de colesterol LDL pequeno e denso e a redução do HDL são efeitos indiretos
da resistência à insulina causada por metabolismo lipídico alterado no fígado DCV
(ROCHLANI et al., 2017).

Quando se descobriu que o tecido adiposo, ou, mais especificamente, os


adipócitos, possuíam propriedades endócrinas e imunológicas, isso forneceu percepções
mais novas do mecanismo envolvido na SM (ROCHLANI et al., 2017).

As pesquisas demonstraram que o tecido adiposo visceral libera adipocinas


relacionadas a SM e DCV. Por exemplo, a leptina controla a homeostase energética
mediada pelo hipotálamo. A obesidade aumenta os níveis de leptina, os quais estão
relacionados ao aumento do risco cardiovascular. Já a adiponectina é anti-inflamatória
e antiaterogênica e seus efeitos são os opostos da leptina.

A adiponectina diminui a reatividade vascular e a proliferação do músculo liso e


melhora a estabilidade da placa, por isso foi considerada um fator protetor contra DM,
hipertensão e infarto agudo do miocárdio. Quando ocorre um aumento do tecido adiposo,
isso se correlaciona com um desequilíbrio entre os níveis reduzidos de adiponectina e
níveis mais elevados de leptina, aumentando o risco de DCV (ROCHLANI et al., 2017).

A obesidade e a resistência à insulina estão associadas ao aumento de angio-


tensina II, que também é produzida pelo tecido adiposo. A angiotensina II leva à geração
de espécies reativas de oxigênio (EROS), que promove uma infinidade de efeitos nega-
tivos incluindo a oxidação de LDL, lesão endotelial, agregação plaquetária, ativação de
fatores de transcrição que promovem um ciclo vicioso de inflamação, dano endotelial
que contribuem para o desenvolvimento de hipertensão, dislipidemia, DM, hipertrofia
cardíaca e DCV (ROCHLANI et al., 2017).

169
Como podemos perceber, a ativação de várias vias pró-aterogênicas conver-
gem em uma via comum final de inflamação que leva a manifestações clínicas da SM.

3 DIETOTERAPIA NA SÍNDROME METABÓLICA


A nutrição é um fator ambiental de fundamental importância no tratamento
da SM. Como vimos, a SM é resultado de um consumo de calorias desproporcional,
por isso as modificações no estilo de vida são fundamentais no gerenciamento dos
fatores de riscos.

Um importante ponto é a redução e manutenção do peso corporal ideal, bem


como modificações dietéticas como baixa ingestão de gorduras saturadas, trans,
colesterol, sódio e açúcar simples, os quais já são bem conhecidos por contribuir para
dislipidemias, hiperglicemia e hipertensão (ROCHLANI et al., 2017).

Por isso, a adesão a um plano alimentar saudável é fundamental para o trata-


mento da SM. Como vimos anteriormente, a SM é multifatorial, ou seja, em decorrência
de doenças de cunho metabólico, assim o plano alimentar deve ser individualizado e
favorecer perda de peso sustentável de 5% a 10% do peso corporal inicial.

O profissional nutricionista deve estabelecer as necessidades individuais a partir


de uma avaliação nutricional minuciosa e determinar os parâmetros antropométricos
(IMC, circunferência abdominal e composição corporal quando possível) (SBC, 2005).

Timóteo (2018) revisou dietas com restrições mais intensas de alguns macronu-
trientes (low carb, mediterrânea e low fat) e concluiu que em todas as dietas é possível
uma perda de peso, principalmente nos primeiros seis meses, porém, nas dietas low
carb isso é um pouco mais significativo. O autor observa um pequeno aumento de peso
a partir dos 12 meses, com estabilização até dois anos. Fatores de risco, como coleste-
rol HDL e triglicerídeos, parecem responder mais favoravelmente a uma dieta baixa em
carboidratos (low carb) ou mediterrânea, bem como os outros parâmetros relacionados
à resistência à insulina (TIMÓTEO, 2018).

O autor enfatiza o que já citamos anteriormente, que os maiores benefícios são


obtidos pelos indivíduos que mantêm a adesão dietética alta em longo prazo. Por isso,
é válido considerar a análise do padrão dietético habitual de cada indivíduo e identificar
o que ele poderá manter a longo prazo, considerando suas preferências pessoais no
plano alimentar proposto, muito antes de considerar determinada composição dietética
padrão (TIMÓTEO, 2018).

O sucesso do tratamento vai depender mais de um padrão dietético de compo-


sição moderada em macronutrientes, associado a um consumo energético moderado
mantido em associação com exercícios físicos e intervenções comportamentais quan-
do necessárias (TIMÓTEO, 2018).

170
Além do plano alimentar, alguns suplementos alimentares promovem efeitos
benéficos à saúde além do valor nutricional básico, e são denominados de nutracêuticos.
Vários compostos naturais derivados de extratos de plantas, ervas, óleos essenciais,
especiarias apresentam benefícios no manejo da SM (ROCHLANI et al., 2017).

Um desses produtos é a curcumina, derivada da Curcuma longa, apresenta


atividades anti-inflamatórias e antioxidantes, suprimindo a cascata inflamatória pela
redução da expressão de citocinas pró-inflamatórias. Interrompe a sinalização da
leptina, aumentando a expressão de adiponectina, auxiliando na SM (ROCHLANI et al.,
2017).

O alho (Allium sativum), tempero muito usado na nossa culinária, também apre-
senta propriedades medicinais antioxidantes e antitrombóticas, demonstrando melhora
em perfis lipídicos como colesterol e triglicerídeos.

Os organossulfurados presentes no alho, apresentam efeito anti-inflamatório


(ROCHLANI et al., 2017).

A canela (Cinnamomum verum), também de uso tradicional na nossa culinária,


possui polifenois que têm propriedades antitrombóticas e sensibilizantes à insulina,
hipolipemiantes, anti-inflamatórias e antioxidantes, benéficas na SM.

Os estudos ainda não elucidaram as vias mecanicistas envolvidas no processo,


mas levantam a hipótese de que o extrato da canela pode regular a expressão do gene
de adipócitos para melhorar o transporte de glicose (via GLUT4) e sinalização da insulina
(ROCHLANI et al., 2017).

Outro ponto importante para se pensar em modular em um paciente com SM, é


a microbiota. Como já vimos nas unidades anteriores, o microbioma intestinal tem sido
relacionado com a etiopatogênese de várias doenças, desde as intestinais (doenças
inflamatórias intestinais, câncer de cólon) às neurológicas (doença de Parkinson e au-
tismo). Porém, o papel das bactérias intestinais em doenças metabólicas ainda não está
bem definido. Uma das fortes razões é que os fatores que são os motores centrais de
um dismetabolismo também são impulsionadores da composição da microbiota intesti-
nal: dieta e estilo de vida (DABKE; HENDRICK; DEVKOTA, 2019).

Em 2007 iniciaram as evidências para uma teoria centrada no intestino da SM,


com uma série de estudos (humanos e roedores) mostrando que o consumo de uma
dieta rica em gordura levava a um desequilíbrio na barreira intestinal, o qual facilitava
a passagem do conteúdo do lúmen intestinal (antígenos alimentares, subprodutos
bacterianos e bactérias) e lipopolissacarídeo bacteriano (LPS), na circulação sistêmica.

171
A inflamação de baixo grau causada foi denominada de endotoxemia metabólica
por seu efeito inibitório sobre a função normal da glicemia. Surgiram, então, os primeiros
relatos de ativação bacteriana de LPS de receptores Toll-like (TLR) levando a uma
resposta imune inata que prejudicou a sensibilidade à insulina (DABKE; HENDRICK;
DEVKOTA, 2019).

DICAS
• LPS: as bactérias Gram-negativas apresentam em sua superfície celular
os LPS que funcionam como antígenos, estimulando a resposta imune do
hospedeiro (MORAES et al., 2014).
• TLR: a identificação dos Toll-Like Receptors (TLR) permitiu entender como
nosso organismo reconhece antígenos (como o LPS) e como ocorrem as
reações pró-inflamatórias e distúrbios metabólicos. Vários TRLs (TRL 1, 3, 5,
6, 7, 9 e 10) têm sido descritos como mecanismos para gerar inflamação e
resistência à insulina, destacando-se especialmente as descobertas relativas
ao TRL2, TRL4 e TLR5 (MORAES et al., 2014).

Em um paciente que ingere uma dieta rica em gordura e pobre em fibras, por
exemplo, promove um desequilíbrio bacteriano chamado disbiose intestinal. Isso resulta
em concentrações anormais de metabólitos que interrompem a integridade das jun-
ções apertadas mediadas por GLP-2.

Essa perda de integridade das junções apertadas, torna o epitélio intestinal


mais permissivo ao lipopolissacarídeo microbiano (LPS), trimetialmina (TMA) e outros
metabólitos que conseguem atingir a circulação sanguínea e contribuem para a infla-
mação crônica do fígado e tecido adiposo, relacionada ao desenvolvimento de DCV, re-
sistência à insulina e outras condições associadas à SM (DABKE; HENDRICK; DEVKOTA,
2019) (Figura 4).

172
FIGURA 4 – INTERAÇÃO ENTRE MICROBIOTA INTESTINAL COM A BARREIRA EPITELIAL EM
DOENÇAS METABÓLICAS

FONTE: Adaptada de Dabke, Hendrick e Devkota (2019)

173
Como vimos, as evidências científicas mostram que as alterações microbianas
intestinais levam à obesidade e SM, diretamente ou como consequência dos distúrbios
na microbiota intestinal, causando inflamação, a qual, por sua vez, promove o desenvol-
vimento de SM. Os metabólitos derivados da microbiota como os ácidos graxos de cadeia
curta (AGCC) participam dessa inflamação de baixo grau, assim como no apetite e regula-
ção da ingestão energética (SANTOS-MARCOS; PEREZ-JIMENEZ; CAMARGO, 2019).

NOTA
Ácidos graxos de cadeia curta: os ácidos graxos de cadeia curta (AGCC)
são compostos orgânicos que podem ser obtidos endogenamente (meta-
bolismo de gorduras e carboidratos) ou exogenamente (absorção de pro-
dutos formados pela fermentação bacteriana de carboidratos) sendo essa
a principal fonte de AGCC no organismo (VINOLO, 2010). Os AGCC abun-
dantes encontrados no intestino são o acetato, propionato e o butirato e
sua produção no intestino está relacionada a diversas funções intestinais
como motilidade, absorção e fonte energética para os colonócitos (OLIVEI-
RA, 2014).

A disbiose presente em pacientes com SM promove uma redução de espécies


bacterianas com importante atividade sacarolítica, sugerindo uma redução na capaci-
dade de degradação de carboidratos em pacientes com SM, causando assim uma redu-
ção na produção de dois AGCC como propionato e acetato. A redução de acetato pode
reduzir a abundância de bactérias benéficas, as quais consomem acetato e produzem
butirato (SANTOS-MARCOS; PEREZ-JIMENEZ; CAMARGO, 2019).

Essa redução nas taxas bacterianas produtoras de AGCC, e uma menor disponi-
bilidade desses ácidos influenciam diretamente o eixo intestino-cérebro. Já foi relatado
que os AGCC induzem liberação de moléculas como GLP-1 (do inglês, glucagon-like
peptide-1) ou grelina, que agem a nível cerebral modulando a ação da insulina e do ape-
tite, influenciando assim no desenvolvimento da obesidade e SM (SANTOS-MARCOS;
PEREZ-JIMENEZ; CAMARGO, 2019).

Assim, as alterações da microbiota intestinais em indivíduos com SM produzem


uma capacidade reduzida de degradar carboidratos em AGCC, o que está relacionado
com o grau de disfunção metabólica do hospedeiro.

Uma dieta rica em carboidratos, baixo teor de gorduras e alta ingestão de fibras
ou uma dieta com alto teor de gorduras boas, como a dieta mediterrânea, que apresen-
tam um alto consumo de frutas e vegetais, é benéfica para restaurar a microbiota de
indivíduos com SM que se encontram em disbiose.

174
Como podemos ver na Figura 5, as estratégias nutricionais atuam em diferentes
órgãos e tecidos e têm se mostrado capaz de reduzir a inflamação e a resistência à
insulina, e, consequentemente, melhorando a SM (SANTOS-MARCOS; PEREZ-JIMENEZ;
CAMARGO, 2019).

FIGURA 5 – EFEITOS DAS ESTRATÉGIAS NUTRICIONAIS SOBRE A MICROBIOTA EM


NÍVEL SISTÊMICO

Acúmulo de gordura
Ganho de peso
Ingestão de alimentos

Oxidação de ácidos
graxos Cél. Treg anti-inflamatórias
Captação de glicose Oxidação de ácidos graxos
Captação de glicose
Citocinas inflamatórias
Translocação bacteriana

Akkermansia muciniphila
Proteínas de junção
apertada
Estruturas vilosas
Citocinas inflamatórias
Translocação bacteriana

Oxidação de ácidos Insulina


graxos
Cél. NKT
Glucagon
Colesterol e LDL
Gliconeogênese

Citocinas anti-inflamatórias

Citocinas pró-inflamatórias

FONTE: Adaptada de Santos-Marcos, Perez-Jimenez e Camargo (2019)

175
Além disso, a suplementação de probióticos e prebióticos aumentam a produção
de AGCC e se torna uma alternativa válida para o tratamento da SM com modulação
da microbiota intestinal. Porém, é importante ressaltar o que já viemos falando desde
o início do tópico: não podemos generalizar. É importante observar o indivíduo como
um todo, visto que ocorrem diferenças entre as populações, variabilidade genética e
histórico alimentar (SANTOS-MARCOS; PEREZ-JIMENEZ; CAMARGO, 2019).

176
LEITURA
COMPLEMENTAR
SÍNDROME METABÓLICA E COVID-19: ONDE AS VIAS SE CRUZAM

Luciano R. Giacaglia

Até uns meses atrás a pandemia global do novo coronavírus (COVID-19) parecia
estar longe de uma solução, e agora com a chegada da vacina já vemos uma luz de
esperança. Porém, ainda há a inexistência de medicamentos claramente eficazes e a
falta de conhecimento amplo sobre todas a epidemiologia e fisiopatologia que envolve
a doença. O motivo da elevada proporção de contaminação, inesperada e rápida
disseminação por todo planeta, a presença de manifestações sintomáticas amplas e
desfechos graves ainda precisam ser mais bem estudadas.

O diabetes mellitus (DM), a hipertensão arterial (HAS) e a idade avançada


são fatores de risco para a pior evolução clínica e maior letalidade, com um desfecho
desfavorável da doença com a resistência periférica à insulina (RI), presente na patologia
da SM.

Já se sabe que existe uma correlação entre o DM com uma maior morbimor-
talidade em infecções virais, bacterianas e fúngicas, por isso recomenda-se que essa
população específica se vacine com a pneumocócica e H1N1, por exemplo. Existe um
ponto importante a se considerar, visto que o DM é mais prevalente na população idosa,
que é mais suscetível e que apresenta outras comorbidades como DCV e renal.

A hiperglicemia crônica compromete vários órgãos, que chamamos de ór-


gãos-alvo, os quais são essenciais para a manutenção da homeostase do organismo,
incluindo aqui além das complicações cardiovasculares, renais e neuronais, a micro-
anginopatia pulmonar, que compromete a troca gasosas alveolar, já comprometida
pelo COVID-19.

A hiperglicemia apresentada por esses pacientes também está ligada com uma
menor capacidade eritrocitária de captação e difusão do oxigênio para os tecidos, esse
processo é secundário à glicação da hemoglobina, modificando a estrutura terciária desta
proteína carreadora de oxigênio. E ainda, a hiperglicemia compromete tanto a resposta
imune inata como a imunidade celular adaptativa linfo-monocitária, importantíssimas
para o combate do COVID-19 e outros micro-organismos oportunistas.

177
A hiperglicemia aumenta o risco trombótico, pois aumenta a osmolaridade
sanguínea, pela fragilidade crônica do endotélio e por disfunção das células plaquetárias,
que adquirem um maior poder de agregação.

Porém, estamos falando da SM, então o foco é na resistência à insulina (RI),


independente da presença de hiperglicemia. A RI intensifica-se quando ocorre um
estresse agudo, independente da sua existência prévia, pois há a liberação de hormônios
contrarreguladores. No COVID-19, o que chama atenção é a elevação desproporcional
da RI do que se esperaria apenas pelo estresse da infecção viral. A hipótese dos
pesquisadores com relação a isso, é que na infecção do COVID-19 ocorre uma liberação
exacerbada de citocinas inflamatórias, e isso somado ao uso de corticosteroides ou
drogas vasoativas nas UTIS, os quais tem ação anti-insulina.

A insulina possui outras ações, além de apenas transportar a glicose par adentro
da célula. Ela é fundamental para a geração de óxido nítrico, promovendo melhor
perfusão tecidual, a qual está comprometida na RI. A insulina é capaz de frear a geração
de citocinas pró-inflamatórias, e sabemos que no COVID-19 ocorre a tempestade de
citocinas, gerando um quadro grave em um paciente que já está inserido em um quadro
inflamatório em decorrência da RI.

A RI compromete a capacidade fibrinolítica e aumenta o risco de fenômenos


tromboembólicos. Frequentemente é encontrado, em pacientes que evoluem para um
quadro de Síndrome da Angústica Respiratória do Adulto (ARDS), depósitos de fibrina
nos espaços aéreos e no parênquima pulmonar.

Existe um grande número de pacientes com SM e obesidade, com o avanço do


COVID-19 ficou claro que a obesidade é um fator de risco para complicações. Um estudo
no Reino Unido observou que 72% dos pacientes internados em UTI por COVID-19 apre-
sentavam obesidade ou sobrepeso. Inclusive, dos pacientes internados em UTI, apre-
sentando índice de massa corpórea (IMC) >30 kg/m2, o índice de mortalidade chegou a
taxas de 60,9%.

Devemos lembrar que a obesidade limita o atendimento clínico, pois há a


necessidade de leitos especiais, maior número de profissionais para mudança de
decúbito e realização de procedimentos, maior dificuldade de intubação orotraqueal
e maior dificuldade de acesso venoso. Além disso, dificulta a imunidade de memória
(linfócitos T CD8+), diminuindo a capacidade de resposta ao vírus e reduzindo a eficácia
da vacinação específica, então se espera algo semelhando nos casos de COVID-19.

Sabemos que nem todo paciente que apresenta RI é obeso, mas o conteúdo
adiposo corporal reduz a mobilidade do indivíduo, favorece os quadros trombóticos,
compromete a expansão da caixa torácica aumentando a resistência ao fluxo de ar nas
vias aéreas. O acúmulo de gordura visceral, em tecidos ectópicos, parece estar envolvido
na piora do quadro inflamatório.

178
A RI também exerce efeitos na hipertensão arterial, os efeitos da hiperinsuline-
mia nos túbulos renais são exacerbados, promovendo o aumento da taxa de reabsor-
ção de sódio. Esse efeito aliado à menor concentração de óxido nítrico, ao aumento da
conversão de angiotensinogênio em angiotensina, promovido pelos adipócitos viscerais
hipertrofiados e, finalmente, pelo espessamento da camada muscular média dos va-
sos sanguíneos, determinada pelo estímulo da insulina na via trófica das MAP-quinase/
mTOR, contribuem ainda mais para o incremento dos níveis pressóricos. A retenção
hidrossalina promovida pela hiperinsulinemia poderia ser um fator agravante no quadro
respiratório pela sobrecarga volumétrica, especialmente em pacientes com comprome-
timento da função miocárdica.

Outro ponto importante de se destacar é que os pacientes obesos, com maior


componente de gordura corporal, principalmente os idosos, apresentam hipovitaminose
D a qual é agravada pelo isolamento domiciliar, com menor exposição solar. Estudos
já tem demonstrado o papel da vitamina D na imunidade, e sua deficiência tem sido
associada a maior risco de infecções respiratórias por agentes infecciosos. Porém, o
excesso de vitamina D pode ocasionar efeitos deletérios para os rins e para o sistema
cardiovascular, por isso sua reposição deve ser realizada com responsabilidade.

Em pacientes com SM, os aspectos sociais contribuem para a piora do quadro


clínico. Esses indivíduos apresentam transtorno de humor frente à nova situação e a
necessidade de isolamento por longos períodos, ocorrem também distúrbios do sono;
adoção de uma dieta de pior qualidade, pobre em vegetais e legumes; aumento do con-
sumo de alimentos industrializados; redução das consultas de rotina, para ajustes me-
dicamentosos; baixa atividade física, e sabemos que atividade física melhora a respos-
tas imunológica, aumenta a sensibilidade à insulina e traz outros benefícios.

FONTE: Adaptado de <https://www.diabetes.org.br/sindrome-metabolica-e-covid-19-onde-as-


vias-se-cruzam/>. Acesso em: 1° mar. 2021.

179
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:

• A SM foi definida como um grupo de fatores de risco inter-relacionados, de origem


metabólica que contribuem para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares
(DCV) e DM2.

• São considerados fatores de risco metabólico: dislipidemia aterogênica (hipertriglice-


ridemia, níveis elevados de apolipoproteína B, LDL colesterol com partículas peque-
nas e densas, níveis baixos de HDL colesterol), hipertensão arterial, hiperglicemia e
um estado pró-inflamatório e pró-trombótico.

• Quando a gordura é acumulada no abdômen, caracteriza-se a obesidade central ou


androide, frequentemente associada ao DM2 e outros problemas metabólicos, como
hipertensão arterial e dislipidemia (altos níveis de triglicerídeos e baixos níveis de HDL),
doença cardiovascular aterosclerótica.

• Os mecanismos que envolvem a SM são complexos e ainda precisam ser totalmente


elucidados.

• Os fatores ambientais e o estilo de vida, como o consumo excessivo de calorias e a


falta de atividade física podem ser os principais contribuintes.

• De todos os mecanismos propostos, a resistência à insulina, a ativação neuro-


hormonal e a inflamação crônica parecem ser os principais pilares na iniciação,
progressão e transição de SM.

• Quando ocorre a resistência à insulina no tecido adiposo, prejudica a inibição da


lipólise mediada pela insulina, aumentando consequentemente os ácidos graxos
livres (AGL) circulantes, os quais, por sua vez, vão inibir ainda mais o efeito antilipolítico
da insulina.

• A resistência à insulina contribui para o desenvolvimento de hipertensão, pois há


perda do efeito vasodilatador da insulina e vasoconstrição causados pelos AGL.

• Os depósitos de gordura contribuem para a resistência à insulina, muito mais do que


a gordura subcutânea, pois a lipólise visceral leva a um aumento do suprimento de
AGL para o fígado através da circulação esplênica.

• O tecido adiposo visceral libera adipocinas relacionadas à SM e DCV.

• A SM é resultado de um consumo de calorias desproporcional, por isso as modificações


no estilo de vida são fundamentais no gerenciamento dos fatores de riscos.

180
• O profissional nutricionista deve estabelecer as necessidades individuais a partir de
uma avaliação nutricional minuciosa e determinar os parâmetros antropométricos
(IMC, circunferência abdominal e composição corporal quando possível).

• O sucesso do tratamento vai depender mais de um padrão dietético de composição


moderada em macronutrientes, associado a um consumo energético moderado
mantido em associação com exercícios físicos e intervenções comportamentais
quando necessárias.

• As evidências científicas mostram que as alterações microbianas intestinais levam à


obesidade e SM, diretamente ou como consequência dos distúrbios na microbiota in-
testinal causando inflamação, a qual, por sua vez, promove o desenvolvimento de SM.

181
AUTOATIVIDADE
1 A Síndrome Metabólica (SM) tem sido muito estudada e foi definida como um grupo
de fatores de risco inter-relacionados de origem metabólica que contribuem para
o desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV) e DM2. De acordo com o
exposto, quais são os fatores de risco metabólicos envolvidos na SM?

2 O acúmulo de gordura visceral, no abdômen, demonstra ser um gatilho primário


para a maioria das patologias envolvidas na SM, confirmando a importância da
ingestão calórica excessiva como um dos principais fatores. A gordura acumulada
no abdômen é considerada uma gordura:

a) ( ) Androide.
b) ( ) Ginoide.
c) ( ) Ginecoide
d) ( ) Androgenética

3 A resistência à insulina, a ativação neuro-hormonal e a inflamação crônica parecem


ser os principais pilares na iniciação, progressão e transição de SM para DCV. De
acordo com o exposto, a insulina aumenta a capacidade de captação de glicose no
músculo e fígado e:

a) ( ) Inibe a lipólise e a gliconeogênese hepática.


b) ( ) Estimula a lipólise e inibe a gliconeogênese hepática.
c) ( ) Inibe a lipólise e a gliconeogênese no músculo.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.

4 A descoberta de que o tecido adiposo e suas células (adipócitos) desempenhavam


propriedades endócrinas e imunológica, favoreceu percepções sobre o mecanismo
envolvido na SM. Essas pesquisas demonstraram que o tecido adiposo visceral libera
adipocinas relacionadas a SM e DCV. Quais adipocinas o tecido adiposo visceral
libera relacionadas à SM e DCV?

I- Adiponectina.
II- Leptina.
III- Angiotensina.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Os itens I e III estão corretos.
b) ( ) Apenas o item I está correto.
c) ( ) Os itens I e II estão corretos.
d) ( ) Todas os itens estão corretos.

182
5 A SM é multifatorial, ou seja, em decorrência de doenças de cunho metabólico,
sendo assim, o plano alimentar deve ser individualizado e favorecer uma perda de
peso sustentável. Quantos % deve ser essa perda de peso?

a) ( ) 5% a 10%.
b) ( ) 5% a 15%.
c) ( ) 5% a 20%.
d) ( ) 5% a 25%.

6 Os maiores benefícios do tratamento da SM são objetivados pelos indivíduos que


mantêm uma adesão dietética alta em longo prazo. De acordo com o exposto, do
que depende o sucesso do tratamento na SM?

7 Vários compostos naturais derivados de extratos de plantas, ervas, óleos essenciais,


especiarias apresentam benefícios no manejo da SM. Quais alimentos podemos
utilizar para reduzir a inflamação e melhorar o perfil antioxidante na SM?

I- Curcuma longa.
II- Allium sativum.
III- Cinnamomum verum.
IV- Capsicum annuum.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas o item I está correto.
b) ( ) Os itens II e III estão incorretos.
c) ( ) Os itens I, II e III estão corretos.
d) ( ) Todas os itens estão corretos.

8 As alterações microbianas intestinais levam à obesidade e SM, diretamente ou


como consequência dos distúrbios na microbiota intestinal (disbiose), causando
inflamação, a qual, por sua vez, promove o desenvolvimento de SM. De acordo com
o exposto, qual é o perfil dietético que causa disbiose intestinal?

9 A disbiose presente em pacientes com SM promove uma redução de espécies


bacterianas com importante atividade sacarolítica, sugerindo uma redução na
capacidade de degradação de carboidratos em pacientes com SM, causando assim
uma redução na produção de ácidos graxos de cadeia curta. De acordo com o
exposto, o que são os ácidos graxos de cadeia curta?

183
REFERÊNCIAS
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