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Bioquímica

Humana Aplicada
à Nutrição
Prof.ª M.ª Jordanna Santos Monteiro

Unidade 01

Introdução
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Diretora Editorial
ANDRÉA CÉSAR PEDROSA
Projeto Gráfico
MANUELA CÉSAR ARRUDA
Autora
JORDANNA SANTOS MONTEIRO
Desenvolvedor
CAIO BENTO GOMES DOS SANTOS
A autora
PROF.ª M.ª JORDANNA SANTOS MONTEIRO

Olá. Meu nome é Prof.ª M.ª Jordanna Santos Monteiro. Sou formada
em Nutrição pela Universidade de Brasília, sou também Mestre em Nutrição
Humana pela Universidade de Brasília, com uma experiência técnico-
profissional na área de nutrição e dietética de mais de 1 ano. Sou técnica
em Nutrição e Dietética da Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Além
disso, fui docente da Faculdade Sena Aires da disciplina Nutrição Humana.
Sou apaixonada pelo que faço e adoro transmitir minha experiência de vida
àqueles que estão iniciando em suas profissões. Por isso fui convidada pela
Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estou
muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho.
Conte comigo!
Iconográficos
Olá. Meu nome é Manuela César de Arruda. Sou a responsável pelo pro-
jeto gráfico de seu material. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de
aprendizagem toda vez que:

INTRODUÇÃO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimen- de se apresentar
to de uma nova um novo conceito;
competência;
NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram
vações ou comple- que ser prioriza-
mentações para o das para você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado sobre o tema em
ou detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e sidade de chamar a
links para aprofun- atenção sobre algo
damento do seu a ser refletido ou
conhecimento; discutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso acessar quando for preciso
um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma ativi- quando o desen-
dade de autoapren- volvimento de uma
dizagem for aplicada; competência for
concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Compreendendo como funciona célula.............................12

A célula ...................................,.........................................12

Citoplasma............................................................13

Organelas ....................................................................13

Núcleo ...................................................................17

Membrana plasmática .....................................................19

Estrutura da membrana plasmática ....................................19

Bicamada lipídica ..................................................19

Proteínas de membrana ..........................................20

Mecanismos de transporte pela membrana.........................21

Transporte passivo .................................................21

Transporte ativo .....................................................22

Água...............................................................................23

Importância da água...........................................................23

Propriedades físico químicas da água ................................26


Ionização da água..............................................................29

Sistema tampão ...............................................................30

Potencial hidrogeniônico e sistemas tampão......................30

Tampões biológicos.................................................32

Tampão de bicarbonato/Ácido carbônico ..................33

Tampão de hemoglobina..........................................37

Conclusões........................................................................38
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 9

01
UNIDADE

INTRODUÇÃO
10 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

INTRODUÇÃO
Você sabia que a Bioquímica Humana Aplicada a Nutrição é
uma das mais importantes áreas da nutrição, ela é responsável pelo
entendimento de como o metabolismo enérgico e dos nutrientes atua na
saúde humana e como esse está associado as desordens metabólicas,
possibilitando o aumento das Doenças Crônicas não Transmissíveis.
Dessa forma, a Nutrição atua como medicina preventiva, e a bioquímica
como ferramenta para melhor compreensão da atuação do alimento e
suas substâncias na saúde humana. Portanto, a Bioquímica é disciplina
primordial para pratica do nutricionista ou profissional de saúde, seja o
que irá atuar em pratica clínica, hospitalar, funcional, esportiva ou em
gestão de produção de refeições. Entendeu? Ao longo desta unidade
letiva você vai mergulhar neste universo!
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 11

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso propósito é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes objetivos de aprendizagem até o
término desta etapa de estudos:
• Compreender a importância da célula
• Saber como é formada a membrada plasmática
• Identificar e compreender as funcionalidades da água
• Saber a importância do sistema tampão
O câncer é uma doença muito complexa, por isso exige muita
dedicação para conhece-la. Então? Preparado para uma viagem sem volta
rumo ao conhecimento? Ao trabalho!
Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao
conhecimento? Ao trabalho!
12 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Compreendendo como funciona célula


OBJETIVO
Ao término deste capítulo você será capaz de entender
como funciona a célula. Isto será fundamental para o
exercício de sua profissão. Os profissionais da saúde,
bem como nutricionistas, sem a devida instrução terão
problemas para compreender as reações metabólicas e
as funções de cada órgão no sistema humano. E então?
Motivado para alcançar esse objetivo? Então vamos lá.
Avante!

A célula
Os seres humanos possuem bilhões de células, que são unidades
fundamentais para existência humana. É nas células onde ocorrem os
processos metabólicos. As células dos seres humanos são constituídas
de citoplasma e núcleo.
Segue na figura 1 uma representação da célula:

Figura 1: Representação da célula

Fonte: Pixabay
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Citoplasma
O citoplasma é solução aquosa que contém diversas moléculas
orgânicas, ions, elementos cito esqueléticos e várias organelas. No
citoplasma, temos um espaço denominado citossol. O citossol é o espaço
entre as organelas e os depósitos, e também chamados de inclusões.
O citossol é formado por água, vários íons, aminoácidos, precursores
dos ácidos nucleicos e enzimas que participam do metabolismo dos
nutrientes.
O citossol possui microfibrilas. Elas são formadas por actina
e microtúbulos, constituídos de tubulina, cujas partes podem
despolimerizar e polimerizar novamente, de forma reversível e dinâmica,
explicando as modificações de consistência. Essas transformações
de consistência fluida para viscosa (gel) e vice-versa são observadas
no citoplasma. Ao serem despolarizadas (separadas umas das outras)
as moléculas das proteínas actina e tubulina conferem maior fluidez
ao citossol. Quando polimerizadas em microfibrinas e microtubulos,
conferem a consistência viscosa similar a gel a região citoplasmática
onde se encontram.

Organelas

DEFINIÇÃO
Organelas: são estruturas intracelulares, presentes em
todas as células, que desempenham funções bem
definidas (Junqueira & Carneiro, 2012).

A figura 2 abaixo apresenta cada organela e sua função celular.


14 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Figura 2: Organelas e suas funções

A primeira organela que iremos estudar são as mitocôndrias, pois


estão presentes na maioria das células humanas. As mitocôndrias são
responsáveis pelo metabolismo oxidativo. No metabolismo aeróbico,
as moléculas de energia provenientes da dieta são utilizadas para
síntese de Adenosina Trifosfato (ATP) dependente de oxigênio. O ATP é a
principal forma de apresentação de ligações ricas em energia, utilizadas
no resto do metabolismo celular e para desempenhar as principais
funções celulares.
Metade da energia gerada pelo ATP é armazenada nas ligações
de fosfato do ATP, e o restante é usada para manutenção da temperatura
corporal. A atividade da enzima ATPase, muito comum nas células,
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 15

libera a energia armazenada no ATP quando a célula dela necessita para


realizar algum trabalho.
A degradação inicial das moléculas de carboidratos, lipídios
e proteínas é realizada no citoplasma, especialmente no citossol. A
substância final dessas vias extramitocondriais produz acetil-coenzima
A (acetil CoA). Ele entra nas mitocôndrias e associa-se como ácido
oxalacético para formar ácido cítrico, iniciando o ciclo do ácido cítrico
(ciclo de Krebs).
No ciclo de Krebs, ocorrem várias reações de descarboxilação
que produzem gás carbônico (CO2) e quatro pares de íons de hidrogênio
(H+) que são removidos por reações especificas catalisadas por
desidrogenases. Os íons H+ reagem como oxigênio para formar H2O, ou
seja, para formar agua.
Pela ação dos citocromos e da coenzima Q, o sistema transportador
de elétrons, localizado na membrana mitocondrial interna, libera energia
que é capturada para formar ATP, a partir de Adenosina Difosfato (ADP)
e fosfato inorgânico. Em condições aeróbias, ou seja, durante o exercício
físico aeróbico, como caminhadas, a glicólise extramitocondrial mais o
ciclo do ácido cítrico e o sistema transportador de elétrons originam 36
mols de ATP por cada mol de glicose. Este rendimento é 18 vezes maior
do que o obtido pela glicólise realizado em condições anaeróbicas,
ou em exercícios anaeróbicos, como musculação e levantamento de
pesos. Fique tranquilo, caro leitor iremos estudar sobre o ciclo de Krebs
e sistema transportador de elétrons nas unidades seguintes.
Nas mitocôndrias também ocorre a codificação de enzimas
necessárias para fosforilação oxidativa a partir do DNA, além disso, o RNA
necessário para a transcrição e tradução de DNA mitocondrial. Assim, no
interior das mitocôndrias estão localizadas as enzimas que participam
do ciclo do ácido cítrico (Ciclo de Krebs) e também da oxidação dos
ácidos graxos. As mitocôndrias atuam como locais de sequestro de ions
de cálcio.
As células com maior consumo de energia, como as células
cardíacas possuem maior quantidade de mitocôndrias. Dessa forma,
é possível concluir que a quantidade de mitocôndrias é proporcional
ao metabolismo energético das células. A matriz mitocondrial possui
16 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

enzimas que atuam na beta oxidação dos ácidos graxos, tendo papel
fundamental no processo metabólico.
A segunda organela é o Retículo Endoplasmático. Conforme a
figura 1, é possível observar que eles são um sistema de túbulos, vesículas
e sacos de membrana interconectados, na forma de membranas
dobradas. O reticulo endoplasmático se apresenta em duas formas o
reticulo endoplasmático rugoso e o reticulo endoplasmático liso.
O Retículo Endoplasmático Granuloso ou Rugoso (RER) é uma
grande rede de muitos ribossomos, que são particularmente encontradas
nas células acinares pancreáticas e plasmócitos, pois são responsáveis
pela síntese proteica.
Outra organela é o chamado Aparelho ou Complexo de Golgi,
que atua em parceria com o Retículo Endoplasmático Rugoso (RER).
Após proteínas serem sintetizadas no RER, elas são encaminhadas para
o Complexo de Golgi. O Aparelho de Golgi é responsável por embalar
as proteínas e encaminhá-las para suas organelas alvo. Portanto, o
complexo de Golgi realiza a embalagem, a secreção e o deslocamento
de diferentes produtos celulares (em particular, proteínas sintetizadas)
para dentro e fora da célula.
O Retículo Endoplasmático não Granuloso ou Liso (REI), não
apresenta ribossomos e por isso possui aparência “lisa” ao ser observado
no microscópio eletrônico. O Reticulo Endoplasmático Liso faz a
metabolização, transformação, neutralização de muitas substâncias
como drogas, pesticidas e hormônios. É nele também que moléculas
apolares são convertidas em polares, facilitando sua excreção pelo
fígado ou pelos rins.
O Retículo Endoplasmático Liso também é responsável por
sintetizar os lipídios. Assim, células das glândulas suprarrenais secretam
o cortisol (hormônio esteroide), células dos ovários e testículos secretam
estrogênios e testosteronas, visto que possuem um extenso e bem
desenvolvido Retículo Endoplasmático Liso. O REI da musculatura
esquelética e cardíaca é chamado de Retículo Sarcoplasmático e tem o
papel de sequestrar íons de cálcio (Ca++), tendo relevância no controle
da contratilidade do coração.
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 17

Outra organela aqui apresentada, são pequenas organelas


membranosas e esféricas, denominadas peroxissomos. Eles possuem
enzimas oxidativas e podem metabolizar vários compostos e oxidar
lipídios, em conjunto com as mitocôndrias. Nas células hepáticas
(do fígado), os peroxissomos metabolizam o álcool (etanol) formando
acetalaldeído.
Você Sabia?: O filme “O óleo de Lourenzo” trata sobre uma
doença genética chamada adrenoleucodistrofia, devido alterações no
metabolismo dos peroxissomos, resultando em um acúmulo de ácidos
graxos de cadeia altamente longa (AGCML) formados por 24 a 26 átomos
de carbono no organismo, especialmente no cérebro e nas glândulas
adrenais. Este acúmulo está relacionado ao processo de desmielinização
dos axônios acometendo as transmissões dos impulsos nervosos e a
insuficiência adrenal.
Os lisossomos, também uma organela estudada aqui, são sacos
esféricos rodeados de membranas, onde são encontradas enzimas
hidrolíticas que participam da digestão. Assim, eles realizam a função
degradativa da célula.
Os flagelos e cílios são formados pela ação dos centríolos,
estruturas ocas constituídas por nove conjuntos de três microtúbulos
unidos por proteínas adesivas, localizados no centro celular. Os
centríolos também são organelas que atuam na divisão celular.
Foi comprovado também que o citoplasma da célula não é apenas
uma solução em que as organelas membranosas diferentes descritas
acima, mas é formado por uma complexa rede de fibras e filamento de
uma natureza protéica heterogênea, denominada citoesqueleto.

Núcleo
As atividades celulares são controladas pelo núcleo, onde estão
os cromossomos e todo o genoma (DNA) celular. O núcleo também é
responsável pela síntese e processamento de todos os tipos de RNA
(rRNA, mRNA e tRNA), que são exportados para o citoplasma.
18 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

DEFINIÇÃO
Genoma: Conjunto de informação genética codificada no
DNA.

O núcleo é formado por um envelope nuclear, que tem poros e


que permite sua comunicação com o citoplasma. O envelope nuclear
envolve o nucleoplasma. Ele contém uma quantidade significativa de
DNA, empacotado nos cromossomos, com proteínas que fornecem um
suporte estrutural e dão origem a fibras de cromatina.

RESUMINDO
A célula é parte fundamental para existência humana, pois
possuem organelas e o centro genético que é o núcleo. As
organelas atuam como pequenos “órgãos”, metabolizado
proteínas, carboidratos e lipídios, através da produção
de energia. As organelas podem também metabolizar
substâncias tóxicas ao organismo, bem como realizar a
síntese proteica. Assim a compreensão das células e das
organelas se torna primordial para o estudo da nutrição
como ciência. A nutrição é a ciência que estuda a ingestão
de alimentos tendo em conta a necessidade alimentar
do corpo. Ou seja, um estudo de como os alimentos e os
mecanismos pelos quais o organismo ingere, assimila e
utiliza os nutrientes. Como estudado nesse item o processo
de metabolismo de boa parte dos nutrientes ocorre na
célula. Estudaremos nas próximas unidades os nutrientes e
como eles são metabolizados pelas células.
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 19

Membrana plasmática
A célula é formada por uma camada que separa a parte interior da
célula da parte exterior da célula. Essa camada é chamada de membrana
plasmática. E ela impossibilita entrada indiscriminada ou não seletiva de
algumas moléculas e substancias para o interior celular, realizando assim
uma barreira. Tais mecanismos realizados pelas membranas plasmáticas
celulares estudaremos a seguir.

Estrutura da membrana plasmática


Todas as membranas possuem uma estrutura básica composta
pela bicamada lipídica. Já a composição qualitativa e quantitativa dos
diferentes lipídios e proteínas variam dependendo do compartimento
ou tipo de célula, mas também variações nutricionais ou fisiológicas ou
patologias.
A compartimentalização estabelecida pelas membranas
intracelulares auxilia na coordenação das reações metabólicas através
do isolamento de vias metabólicas, modificações localizadas de pH e da
concentração de metabolitos. Fique tranquilo! Vamos estudar o pH no
último tópico dessa unidade.

Bicamada lipídica
A bicamada lipídica impede a entrada de substâncias polares
ou hidrossolúveis com facilidade para dentro da célula. A bicamada
lipídica é formada por fosfolipídios que são moléculas anfipáticas, tendo
a sua parte hidrofóbica voltada para o meio extracelular e sua parte
hidrossolúvel é voltada para o meio intracelular.

DEFINIÇÃO
Hidrofóbica: São moléculas insolúveis em água ou apolares.
Hidrofílica: São moléculas solúveis em água ou polares.
Anfipática: São moléculas com parte hidrofóbica e parte
hidrofílica.
20 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

As moléculas hidrofóbicas da bicamada lipídica são os ácidos


graxos e as moléculas hidrofílicas (hidrossolúveis) são os gliceróis
e grupos com álcool associado a fosfato. O colesterol também é
componente fundamental da bicamada. Outro componente da
bicamada são os glicolípidios, moléculas de carboidratos associados
com moléculas de ácidos graxos. Fique tranquilo, iremos estudar as
características dos ácidos graxos e o colesterol nas próximas unidades.
Conforme há mudanças de temperatura e na composição lipídica,
ocorre a fluidez da membrana. Tal fenômeno ocorre quando há um
aumento na temperatura leva os lipídios insaturados da membrana a
modificarem a conformação da molécula, no local da dupla ligação. Essa
modificação da conformação da molécula impossibilita a associação de
modo intimo entre os ácidos graxos da membrana e os que o circundam,
aumentando a fluidez da membrana.
Algumas membranas possuem lipídios que se agregam formando
balsas lipídicas, que estão associadas as proteínas especificas. As balsas
lipídicas separam mecanismos e as moléculas de sinalização.

Proteínas de membrana
A grande parte das funções das membranas é determinada
pelas proteínas que elas possuem. Além de sua função estrutural, as
proteínas de membrana também atuam como transportadores, canais,
enzimas, receptores ou moléculas âncoras. As proteínas de membrana
são classificadas pela forma como elas são inseridas na bicamada de
lipídios.
As membranas plasmáticas contem proteínas chamadas de
integrinas que se ligam a filamentos do citoesqueleto localizados no
citoplasma e a macromoléculas extracelulares. Através dessas ligações
existe uma troca constante de influencias nos dois sentidos entre o
citoplasma e o meio extracelulares.
As proteínas integrais atravessam completamente a bicamada
lipídica interagindo com os lipídios. Elas só podem ser removidas
quebrando a membrana com detergentes ou solventes orgânicos. Estas
proteínas são formadas por domínios transmembrana apolares. Esses
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 21

domínios interagem entre si e com caudas hidrofóbicas de fosfolipídios,


muitas vezes formando estruturas oligoméricas complexas, tais como
canais iónicos.
As proteínas periféricas, por outro lado, não se cruzam a bicamada,
mas estão ligadas apenas a um de seus lados, seja por interações com
proteínas integrais ou bem diretamente com a bicamada. Geralmente,
as proteínas periféricas são separadas da membrana por métodos
relativamente simples, como alterações no pH ou soluções com alta
força iônica, que quebram as ligações não covalentes de aminoácidos.

Mecanismos de transporte pela membrana


Em células saudáveis, ocorre movimento continuo de água e
solutos para dentro e fora da célula. Dessa forma, a membrana com sua
barreia hidrofóbica, faz uma barreira efetiva contra o movimento dos
solutos e da água. Assim formam-se canais que realizam a passagem de
água e outras substâncias para dentro da célula.
A passagem aleatória de partículas sempre ocorre a favor
do gradiente de concentração, ou seja, de um local com maior
concentração para outro de concentração menor. Isso se dá até que a
distribuição das partículas seja uniforme. A partir do momento em que o
equilíbrio for atingido, as trocas de substâncias entre dois meios tornam-
se proporcionais. A passagem de substâncias através das membranas
celulares envolve vários mecanismos, como o transporte passivo e o
transporte ativo.
Definição: Soluções isotônicas: não altera o volume da célula.
Soluções hipotônicas: Fazem o volume da célula aumentar o que leva ao seu
inchaço. Soluções hipertônicas: Promovem a redução do volume da célula.

Transporte passivo
O transporte passivo ocorre sempre a favor do gradiente,
tendendo a igualar as concentrações nas duas faces da membrana. Não
envolve gasto de energia. Ele é realizado através de osmose, difusão
simples e difusão facilitada.
22 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Na osmose, a água se movimenta livremente através da


membrana, sempre do local de menor concentração de soluto para o
de maior concentração.

DEFINIÇÃO
Pressão Osmótica: pressão com a qual a água é forçada a
atravessar a membrana.

A osmose não é influenciada pela natureza do soluto, mas


pelo número de partículas. Quando duas soluções contêm a mesma
quantidade de partículas por unidade de volume, mesmo que não sejam
do mesmo tipo, exercem a mesma pressão osmótica e são isotônicas.
Com o objetivo de se atingir o equilíbrio, a difusão simples é a
passagem das moléculas do soluto, do local de maior para o local de
menor concentração. É um processo lento. Exceto quando o gradiente
de concentração for muito alto ou as distâncias percorridas forem curtas.
A passagem de substâncias, através da membrana, se dá em resposta
ao gradiente de concentração.
Na difusão facilitada, algumas moléculas, como a glicose, alguns
aminoácidos e vitaminas entram na célula a favor do gradiente de
concentração e sem gasto energético. Com uma velocidade maior do
que a permitida pela difusão simples. A velocidade da difusão facilitada
é desproporcional à concentração da substância.
Quando há um aumento na concentração, atinge-se um ponto de
saturação, a partir do qual a entrada obedece à difusão simples. Isto sugere
a existência de uma molécula transportadora chamada permease na
membrana. Quando todas as permeases estão sendo utilizadas, a velocidade
não pode aumentar. Como alguns solutos diferentes podem competir pela
mesma permease, a presença de um dificulta a passagem do outro.

Transporte ativo
No transporte ativo ocorre o gasto de energia, pois as moléculas
saem do local com menor concentração para o de maior concentração,
indo assim, contra o gradiente de concentração. Esse gradiente pode
ser químico ou elétrico, como no transporte de íons.
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 23

O transporte ativo age como uma “porta giratória”. A molécula a


ser transportada liga-se à uma molécula transportadora (proteína da
membrana) como uma enzima se liga ao substrato. Fique tranquilo,
iremos estudar o processo de ação das enzimas em outra unidade. A
molécula transportadora gira e libera a molécula carregada no outro
lado da membrana. Gira, novamente, voltando à posição inicial.
A bomba de sódio e potássio liga-se em um íon sódio (Na+) na
face interna da membrana e o libera no meio extracelular. Ali, se liga a
um íon potássio (K+) e o libera na face externa. A energia para o transporte
ativo vem da hidrólise do ATP.
Existe também o transporte acoplado, onde muitas substâncias
aproveitam a entrada e saída de outras moléculas e íons para entrar
ou sair das células, usando o mesmo canal. Assim, as moléculas de
glicose (açúcar) que ingressam nas células contra o seu gradiente de
concentração. A bomba de sódio/potássio expulsa íons de sódio da
célula, ao mesmo tempo que faz os íons potássio ingressarem, utilizando
a mesma proteína transportadora (o mesmo canal iônico), com gasto de
energia. Levando diminuição da concentração de íons de sódio dentro
da célula, o que induz esses íons a retornarem para o meio intracelular.
Ao mesmo tempo, moléculas de glicose, cuja concentração dentro da
célula é alta, aproveitam o ingresso de sódio e o “acompanham” para o
meio intracelular.

Água
Importância da água
A água é o maior componente único do corpo. O corpo humano
é composto por cerca 45-73% de seu peso total de água. 55% desta está
no espaço intracelular (55%) e 45% está no extracelular (45%). Ela é um
solvente contínuo entre os diferentes compartimentos do nosso corpo.
As células que são mais ativas como as do musculo e as das
vísceras possuem maiores teores de agua, já os tecidos calcificados
tem os menores. A água corporal total é maior em atletas do que em
não atletas. A idade promove diminuição da massa muscular e como
24 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

consequência diminuição do teor de agua corporal. Apesar da proporção


de peso corporal atribuída a água variar com a idade e gordura corporal,
há pouca variação no dia a dia na percentagem de água corporal.
A água é um componente fundamental de todos os tecidos
corporais. Ela permite que vários solutos se tornem disponíveis para a
função celular, e é o meio necessário para todas as reações. Além disso,
ela atua como substrato em reações metabólicas e como componente
estrutural, dando forma as células.
A água é essencial para os processos fisiológicos de digestão,
absorção e excreção. Ela tem um papel fundamental na estrutura e
função do sistema circulatório e atua como meio de transporte para
nutrientes e todas as substâncias do corpo.
A água conserva a constância física e química dos líquidos intra
e extracelulares e tem um papel direto na manutenção da temperatura
corporal. A perda de 20% de água corporal (desidratação) pode causar
morte e perda de apenas 10% causa doenças graves. No clima ameno,
adultos saudáveis podem sobreviver até 10 dias sem água e crianças
podem sobreviver até 5 dias. Enquanto que é possível sobreviver muitas
semanas sem alimentos.
Dessa forma, a água é o meio em que as reações do organismo e
desempenha um papel fundamental em todos metabolismo (absorção,
transporte, digestão e excreção de substâncias inorgânicas e orgânicas).
E também na manutenção da temperatura corporal.
3.2 Distribuição da água no corpo humano
A água corporal é dividida no que denominamos líquidos. O
líquido intracelular é responsável por 50% do peso do indivíduo. Este
líquido encontra-se no interior das diversas células. Sua principal função
é providenciar um meio adequado para as diversas reações químicas
necessárias à manutenção da vida celular.
O liquido extracelular não é um compartimento isolado, contudo
a comunicação entre as células ocorre somente através dos líquidos
intersticial e o plasma. Assim, existem diferentes concentrações e
conteúdo de solutos nas células.
As funções metabólicas normais do corpo exigem a manutenção
de uma força iônica ideal no seu meio, em especial no líquido intracelular,
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 25

onde ocorre a maior parte das reações metabólicas. Por tais motivos, os
mecanismos homeostáticos do corpo estão em constante atuação para
produzir esse ambiente.
Como o líquido extracelular não é o principal local de atividade
metabólica, pode ocorrer uma alteração considerável em sua força
iônica sem efeitos adversos sobre a função do corpo. A principal função
do líquido extracelular é ser condutor entre s células e os órgãos. O
líquido extracelular subdivide-se em três outros compartimentos: o
líquido intersticial, o líquido intravascular e o líquido transcelular.
O líquido intersticial permeia as diversas células do organismo,
permitindo a ocorrência de trocas de gases e substâncias entre o
sangue e as células. A linfa faz parte do líquido intersticial. O líquido
intravascular está contido nos vasos sangüíneos, formando o plasma.
A manutenção de um volume plasmático adequado é importante para
manter uma circulação normal e desta forma prover o organismo do
oxigênio necessário ao seu metabolismo.
O líquido transcelular constitui cerca de 2% do total de líquidos
corporais, que inclui líquidos existentes nos espaços sinovial, peritoneal,
pleural, pericárdico e intra-ocular, além do líquido cefalorraquidiano.
O plasma requer uma via de trânsito rápido, enquanto o liquido
intersticial serve como uma zona de fornecimento lento, dessa forma
o fluxo em torno da célula permite que a superfície celular inteira seja
usada como uma área de troca. A capacidade de atuação eficaz do fluído
extracelular, como um condutor, exige a manutenção de um volume
extracelular ideal, em particular do volume vascular.
Uma outra função importante do líquido extracelular é a regulação
do volume intracelular e de sua força iônica. Em virtude do equilíbrio
osmótico entre as células e o fluido extracelular qualquer alteração
na osmolaridade extracelular é seguida por uma mudança idêntica na
osmolaridade intracelular acompanhada por uma modificação reciproca
no volume celular.
As células e os órgãos podem ser nutridos com substratos e
aliviados por produtos metabólicos com uma circulação muito mais lenta,
a atuação da circulação normal é fundamental para garantir a quantidade
suficiente de oxigênio para as necessidades metabólicas do organismo.
26 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

O volume plasmático normal é um pré-requisito para manutenção


da circulação normal. Como o plasma está em equilíbrio com o liquido
intersticial, a manutenção do volume vascular normal exige um volume
extracelular normal. Um baixo volume extracelular, leva ao dano na
perfusão de órgãos, enquanto que um volume extracelular excessivo
induz a congestão vascular e edema pulmonar.
A água também é importante para a regulação da temperatura
corporal. O metabolismo celular gera calor, que é perdido principalmente
pela evaporação de líquidos de maneira insensível ou através da
sudorese.

Propriedades físico químicas da água


Tais propriedades fisiológicas da água se devem a sua estrutura
dipolar e sua capacidade de formar pontes de hidrogênio. Onde ocorre
a interação de um soluto com um solvente, que leva à estabilização
de moléculas de soluto na solução. Assim, a maneira pela qual a água
(solvente) atua nas biomoléculas influencia sua estrutura.
A água é uma molécula que reage doando um par de elétrons
livres, e como tal é um reagente ou produto em várias reações biológicas.
Por sua vez, a água tem uma ligeira tendência a se dissociar em íons
hidroxila (OH−) e prótons (H +), que influencia a acidez ou basicidade
das soluções aquosa e, consequentemente, participa muito ativamente
mantenha as condições compatíveis com a vida.
A molécula de agua é dipolar pois possui estrutura tridimensional
de carga elétrica distribuída de forma assimétrica em sua estrutura. O
oxigênio é mais eletronegativo que o hidrogênio e transporta uma carga
negativa parcial, enquanto cada um dos dois hidrogênios carregam uma
carga positiva parcial.
Desta forma, cada molécula de água é simultaneamente uma
doadora e uma receptora de ligação de hidrogênio. Essa capacidade
da água de dipolo forte e com alta constante dielétrica faz com que
a água possa dissolver uma quantidade elevada de substâncias com
carga, como sais.
As ligações covalentes entre um átomo de hidrogênio e o oxigênio,
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 27

nitrogênio ou enxofre (grupo doador) são relativamente polares, de


modo que o núcleo de hidrogênio pode ser fracamente atraído por um
par de elétrons livres de um grupo aceptor, como oxigênio, nitrogênio ou
enxofre de uma molécula vizinha, resultando em uma ligação (ou ponte)
de hidrogênio. Desde que a água se reúne estas duas características,
cada molécula pode formar ligações hidrogênio com outras quatro
moléculas de água.
Cada ligação de hidrogênio é relativamente fraca (da ordem de 20
kJ / mol) em relação à ligação covalente (por exemplo, 460 kJ / mol no
caso dos links O-H), mas quando há muitas moléculas que as formam,
elas se tornam agregados tridimensionais grandes e dinâmicos.
No caso de água líquida, cada molécula é associada através de
ligações de hidrogênio para cerca de 3,5 moléculas de água, em média.
Um por sua vez, essas ligações são transitórias, com uma duração
que não é maior que um microssegundo. Por tudo isso, as ligações de
hidrogênio influenciam as propriedades físicas da água, contribuindo
para sua alta viscosidade, tensão superficial e ponto de ebulição.
A formação de ligações de hidrogênio permite que a água
se dissolva muitas moléculas de organismos vivos (biomoléculas)
contendo grupos funcionais capazes de formar ligações hidrogênio com
ela. Assim, por exemplo, os átomos de oxigênio, por exemplo, os átomos
de oxigênio de álcoois, aldeídos, cetonas e amidas fornecem pares de
elétrons não ligados que servem como receptores de hidrogênio de
moléculas de água
Além disso, as ligações de hidrogênio não são exclusivamente
com a água, contudo elas podem se formar entre moléculas que
atendem às características de doadores e receptores, como entre
a molécula de álcool ou entre o oxigênio no grupo carboxila de uma
ligação peptídica e ligação de hidrogênio ao nitrogênio de outro.
Mesmo ligações não covalentes sendo mais fracas que as
ligações covalentes, eles contribuem de forma importante na estrutura,
estabilidade e até mesmo na funcionalidade de macromoléculas. Estas
forças podem ser de atração ou repulsão, e envolvem interações dentro
da própria molécula ou entre ela e o moléculas de água que a rodeiam.
Esta configuração facilita o número máximo de estruturas
28 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

favoráveis à energia em biomoléculas, como interações dipolo-dipolo,


grupo com ligações de dipolo ou hidrogénio. Compostos apolares em
meio aquoso tendem a associar uns aos outros, levando a uma interação
hidrofóbica. Tal associação impede ou minimiza interações de energia
desfavorável entre grupos apolares e água. Então, quando misturar
moléculas hidrofóbicas (isto é, com aversão à água) com a água, elas se
associam, o que não é o resultado de uma atração mútua ou o que veio
a ser definido com ligações hidrofóbicas é, no entanto, o resultado de
minimizar interações desfavoráveis entre grupos apolares e água.
A estrutura dipolar da água e sua capacidade de formar ligações
de hidrogênio com átomos eletronegativos permitem dissolver
substâncias iônicas e polares, como é o caso dos sais, como o cloreto
de sódio (NaCl), que são ligados por ligações iônicas.
Em solução aquosa, os íons salinos são encontrados hidratados,
devido precisamente à polaridade positiva e negativa de moléculas de
água, eles são atraídos por íons como Na + e Cl−. O resultado é que
esses íons se separam porque moléculas de água atraem-nos com uma
força maior que a força com o qual elas se atraem, de modo que em
solução aquosa elas estão dissociadas.
Interações eletrostáticas do tipo de ligação iônica entre grupos
com carga diferente dentro de uma biomolécula ou entre eles, eles
geralmente são chamados de pontes salinas. Essas pontes são eficazes
a uma distância maior que as pontes de hidrogênio.
Há também forças fracas de atração entre biomoléculas neutras
chamadas interações ou forças de Van der Waals. Eles são formados pela
atração de dipolos transitórios que são gerados a partir do movimento
rápido de elétrons de todos átomos neutros. Essas interações são mais
fracas do que ligações de hidrogênio, então elas são eficazes apenas
em distâncias muito curtas, mas eles realmente são numerosos em
biomoléculas, como as proteínas.
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 29

Ionização da água
A capacidade de ionização da água é limitada, mas essencial para
organismos vivos. A água pode atuar como um ácido, na transferência de
um íon hidrogênio (H+) e como base (OH-); sua ionização ou dissociação
pode (atribuição de um íon de hidrogênio, H +) e como uma base
(formação do íon de hidróxido, OH-).

Em uma solução aquosa há somente prótons de hidrônio (H3O+),


e também os múltiplos deles (H5O2+, H7O3+). No entanto, estes prótons
são normalmente representados como H, embora tendo em conta que
são hidratados. Assim, a dissociação da água pode ser representada da
seguinte forma: H2O(l) ↔ H+(aq)+ OH-(aq). E a constante de equilíbrio da reação
ou constante de dissociação (Kw) é:
30 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Consequentemente, esse valor é a concentração de íons


hidrogênio e íons hidroxila em água pura e neutra. Quando uma
substância iônica ou polar se dissolve na água, o valor relativo de H+ e
OH- pode mudar, embora o de Kw permaneça constante. Isso resulta
em soluções ácidas ou básicas.

Sistema tampão
Potencial hidrogeniônico e sistemas
tampão
O potencial hidrogeniônico (pH) é uma escala logarítmica que
mede o grau de acidez, neutralidade ou alcalinidade de uma determinada
solução (de Andrade, 2010). As variações de pH influenciam muito nos
processos bioquímicos, visto nos processos metabólicos celulares o pH
pode variar em uma faixa estreita de 7-7,4.
No meio intracelular, o pH interfere na atividade enzimática, nos
catalisadores de todas as reações químicas celulares. Muitas destas
reações processam-se com a liberação ou captação de prótons do meio
aquoso em que estão dissolvidas as substancias presentes nas células.
No entanto, os valores do pH plasmático se mantem fixo. Tal manutenção
do pH em seres vivos ocorre graças a um sistema tampão.
Os ácidos são substâncias capazes de doar prótons e as bases
são substâncias capazes de recebe-las. Os ácidos fortes são aqueles
que se desassociam completamente, como é o caso do ácido clorídrico
(HCL), presente no estômago e do ácido sulfúrico (H2SO4) e possuem
valores de pH muito baixos. Os ácidos fracos, como o ácido acético
(CH3-COOH) ou o ácido carbônico (H2CO3) dissociam-se parcialmente,
portanto, seu pH é mais alto que o dos ácidos fortes.
As bases fortes, como KOH ou NaOH são completamente
dissociadas, enquanto as bases fracas, como o Ca (OH)2 estão
parcialmente dissociadas. Por sua vez, um sal é um composto formado
por cátions (íons carregados positivamente) e ânions (íons carregados
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 31

negativamente), e constituem o produto típico de uma reação entre uma


base (fornece o cátion) e um ácido (fornece o anião).
Um ácido é considerado uma espécie protonada ou doadora de
prótons (por exemplo, HA ou R-NH+3) enquanto em forma desprotonada
(A ou R-NH2) é denominada base conjugada, por ser um aceptor de
prótons. Da mesma forma, refere-se a uma base no caso de A- ou R-NH2,
enquanto seus respectivos ácidos conjugados serão HA ou R-NH+3
também indicam que, para qualquer ácido fraco, sua base conjugada é
forte e, da mesma forma, para cada base fraca, seu ácido o conjugado
é forte.
O sistema tampão é constituído de ácidos fracos e bases
conjugas, que impede grandes variações de pH quando ocorre a adição
de ácidos ou bases. Os tampões são soluções que resistem a mudanças
no pH quando ácidos ou bases são adicionados. Eles são formados
pela mistura de um ácido fraco (como ácido acético, CH3-COOH) e sua
base conjugada (íon acetato, CH3-COO-), ou pela mistura de uma base
fraca (como a amônia, NH3) e seu ácido conjugado (o íon amônio, NH+4).
Assim, as misturas CH3COOH / CH3-COO- e NH3/ NH+4 são exemplos de
sistemas tampão.
No caso do sistema CH3-COOH/ CH3-COO-, os compostos
presentes em uma solução tampão seriam ácido, seu sal de sódio e
água, uma vez que o sal de um ácido fraco é fortemente dissociado.
Conforme a equação abaixo:

Ao se adicionar um ácido (isto é, íons H+) a esta mistura, quase


todos os íons hidrogênio reagirão com os íons acetato. Assim, o equilíbrio
se desloca em direção à formação de ácido acético, ocorrendo o
tamponamento pela chegada de H+. Conforme a equação abaixo:
32 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Quando íons OH- são adicionados, tais como a adição de uma


base, os íons H+ presentes no sistema reagirão com os íons OH- na
formação de água, e o equilíbrio irá mudar para o íon acetato, que irá
tamponar o pH. De acordo com a equação abaixo:

Tampões biológicos
Os tampões biológicos são aqueles encontrados nos seres vivos,
como exemplo temos o tampão de hemoglobina, responsável por
manter o pH do sangue próximo a 7,4. Não são muitos os ácidos fracos
que satisfazem este requisito. Os principais sistemas tampões são o
fosfato, as proteínas e o bicarbonato.

DEFINIÇÃO
Hemoglobina: proteína existente no interior das hemácias,
no plasma e em certas plantas e cuja principal função é o
transporte de oxigênio.

A principal fonte de íons H+ no corpo é o ácido carbônico, formado


a partir do dióxido de carbono produzido no metabolismo celular. Como
também, a degradação de muitas proteínas e outras biomoléculas
resulta na liberação de ácidos, como os ácidos sulfúrico e fosfórico,
no fluido extracelular. Estes ácidos, num meio aquoso como o sangue,
dissociam-se em íons e aníons H+.
Por outro lado, no metabolismo são produzidos ácidos orgânicos
como o ácido lático e os ácidos graxos, que também se dissociam da
liberação de íons H+. Portanto, íons H+ são continuamente formados no
corpo. Apesar desta formação contínua de íons H+, é essencial que sua
concentração permaneça constante tanto no fluido extracelular como
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 33

intracelular, já que de outro modo ocorreriam alterações estruturais e


funcionais em proteínas e outras moléculas, e a distribuição de outros
íons entre o fluido extracelular e no interior das células. Tudo isso requer
a disponibilidade de mecanismos capazes de neutralizar efetivamente
os ácidos produzidos metabolicamente.
Uma parte importante dos ácidos é neutralizada pelas bases da
dieta. No entanto, o restante dos ácidos neutralizado pelo próprio corpo.
Para tal, o corpo humana utiliza tampões ou tampões fisiológicos e a
subsequente eliminação do ácido ou base pela via renal ou respiratória.
Os principais tampões fisiológicos são o sistema ácido carbônico/
bicarbonato, hemoglobina e tampão fosfato.
Outros sistemas tampão são as proteínas e aminoácidos. O
objetivo dos sistemas tampões fisiológicos, são manter a faixa de pH
entre 7,35 a 7,45 no sangue. De fato, considera-se que uma pessoa
sofre de acidose quando o pH de seu sangue é inferior a 7,35, enquanto
sofre alcalose quando é maior que 7,45. Por sua vez, os limites de pH
sangüíneo entre os quais a vida humana adulta é possível são 7,0 e
7,8. Assim, a eficiência de um tampão está restrita a uma faixa de pH e
da concentração de ácidos e bases, que não prejudique os processos
metabólicos intracelulares.
O entendimento do pH e do sistema tampão contribuem para
compreensão que no metabolismo celular as moléculas a serem
metabolizadas e hidrolisadas se desassociam liberando prótons ou
recebendo, assim o equilíbrio ácido-base está fortemente associado a
saúde celular.

Tampão de bicarbonato/Ácido carbônico


Este é o principal tampão de sangue e fluidos extracelulares. O gás
carbônico (CO2) é formado intracelularmente nos tecidos como produto
final do metabolismo dos compostos de carbono. O gás carbônico é
um gás, e por isso difunde-se no meio extracelular, onde uma parte é
hidratada formando ácido carbônico, que é um ácido fraco. De acordo
com a reação abaixo:
34 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

O restante do CO2 circulante no sangue (cerca de 95%) se


difunde para as hemácias, onde a enzima anidrase carbônica catalisa a
conversão de CO2 em ácido carbônico. Posteriormente, dissocia-se em
íons H+ e íons bicarbonato (HCO-3):

Embora o ácido carbônico seja fraco, essa dissociação é


extremamente eficaz (quase 100%), porque a hemoglobina captura íons
H+ no processo de sua ação tamponante. Isso faz com que, por um
lado, a reação se mova para a direita e que o íon bicarbonato formado
deixe a hemácia para o plasma. Por outro lado, isso favorece que as
concentrações de ácido carbônico no sangue sejam muito baixas.

SAIBA MAIS
Estudo publicado na revista Experimental Physiology,
pesquisadores brasileiros confirmaram a importância
de um grupo específico de neurônios, situados em uma
região encefálica conhecida como núcleo retrotrapezoide
(RTN), na detecção de alterações nos níveis de dióxido
de carbono (CO2) e na modulação da atividade de outros
grupos neuronais que controlam a atividade respiratória.

A pesquisa contou com a participação de cientistas brasileiros da


Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual Paulista
(Unesp).
“O CO2 é importante para regular o equilíbrio ácido-básico do
sangue. Quando a concentração desse gás fica acima do normal, o
sangue tende a ficar mais ácido, o que promove a ativação de sensores
especializados chamados quimiorreceptores”, disse Eduardo Colombari,
professor da Faculdade de Odontologia da Unesp em Araraquara e
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 35

coordenador do Projeto Temático“


“Alguns desses quimiorreceptores estão localizados no sistema
nervoso central, mais especificamente na superfície ventrolateral do
bulbo (região do encéfalo responsável pelo controle neurovegetativo,
que faz a interface entre a medula espinal e o mesencéfalo), no RTN”,
explicou.
Segundo Colombari, os neurônios dessa região expressam um
marcador específico, o que facilita a sua identificação. Esse marcador
consiste em um fator de transcrição chamado de Phox2b, envolvido na
diferenciação celular de neurônios autonômicos e respiratórios.
“Esses neurônios comunicam-se com outros grupamentos neurais
responsáveis pelo controle da atividade respiratória com o objetivo de
manter os níveis de CO2 em faixas consideradas fisiológicas”, disse o
pesquisador.
Trabalhos anteriores da literatura científica, contou Colombari,
sugeriam que o controle da quimiorrecepção (detecção e modulação
dos níveis de CO2) envolvia diversos grupamentos neuronais, como o
núcleo do trato solitário, os núcleos da rafe (que secretam serotonina),
regiões pontinas e hipotalâmicas.
No entanto, o trabalho do grupo demonstrou que as alterações
respiratórias promovidas pelo aumento dos níveis de CO2ficam
prejudicadas quando ocorre a destruição seletiva dos neurônios do RTN
que expressam o fator de transcrição Phox2b.
“Esses neurônios que expressam Phox2b têm em sua membrana
receptores para um neurotransmissor chamado substância P. Esse
neurotransmissor está envolvido em várias comunicações neurais que
mantêm o funcionamento adequado de diversas funções fisiológicas”,
disse Colombari.
Para induzir a lesão neuronal, os pesquisadores utilizaram uma
toxina – conhecida como saporina – acoplada ao principal receptor da
substância P. Ela foi injetada diretamente na região do RTN em animais
de experimentação.
“Estudos anteriores já haviam mostrado que o processo de
destruição de neurônios pela saporina demora entre 10 e 14 dias. E, de
fato, nas medidas feitas nos primeiros dias após a injeção não foram
36 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

observadas grandes diferenças entre o grupo controle e o grupo que


teve a lesão neuronal na região do RTN. Mas, após o 14º dia, a resposta
respiratória dos animais que receberam a saporina já estava bastante
comprometida”, contou Colombari.
Os animais foram colocados em uma câmara onde era possível
medir a quantidade de ar inspirado e expirado a cada ciclo respiratório.
Em seguida, os cientistas introduziram nesse ambiente uma mistura
gasosa com cerca de 7% de CO2, concentração bem mais alta que a do
ar atmosférico (em torno de 0,03%), suficiente para causar um estado de
hipercapnia (elevação dos níveis de CO2 no sangue arterial) e promover
a ativação do quimiorreflexo.
Após dez minutos de exposição ao CO2, o grupo de animais que
recebeu a toxina apresentou uma redução significante da ventilação em
condições de ar ambiente, bem como durante a exposição a elevados
valores de CO2.
Segundo Colombari, a resposta foi prejudicada principalmente
pela redução no volume de ar corrente no grupo que recebeu saporina.
“Esses animais praticamente perderam a capacidade de eliminar
o excesso de CO2 e poderiam morrer intoxicados se a condição
experimental fosse mantida por mais tempo”, disse.
De acordo com o pesquisador, o trabalho elucida como uma
pequena região do encéfalo contém neurônios com uma assinatura
bioquímica clássica (Phox2b) e que estão envolvidos na detecção e
manutenção dos níveis adequados de CO2, permitindo que a homeostase
seja mantida em equilíbrio.
Leptina e controle da ventilação
Outra linha de investigação dentro do Projeto Temático mostrou
que as respostas desencadeadas pelo quimiorreflexo central podem
ser prejudicadas pela deficiência de leptina – hormônio produzido pelo
tecido adiposo e envolvido na sensação de saciedade.
“Alguns casos de obesidade são causados por deficiência na
produção de leptina. Em camundongos geneticamente modificados
para não expressar leptina mostramos que a reposição desse hormônio
melhora as respostas do quimiorreflexo central. Mas ainda estamos
investigando de que forma a leptina está envolvida nesse controle”,
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 37

contou Colombari.
Segundo Colombari, o avanço no conhecimento dos mecanismos
envolvidos na percepção dos níveis de CO2 no sistema nervoso central
pode ajudar, no futuro, a prevenir casos de morte súbita em adultos e
em crianças recém-nascidas.
“Há casos de crianças recém-nascidas em que os neurônios que
expressam Phox2b na região do RTN, isto é, os neurônios que detectam
variações de CO2, estão comprometidos, prejudicando o processo
ventilatório durante o sono e vigília”, disse.
“Essa é uma síndrome extremamente rara chamada de Síndrome
da Hipoventilação Congênita Central ou Síndrome de Ondina. Quando
esses mecanismos estiverem mais bem esclarecidos, poderemos pensar
em desenvolver testes para identificar pessoas que necessitariam de um
melhor monitoramento dos níveis de CO2 para adaptação nas condições
fisiopatológicas”, disse o pesquisador.

Tampão de hemoglobina
Vamos continuar com nosso estudo sobre os tampões fisiológicos.
Outro tampão fisiológico é o tampão de hemoglobina. A propriedade
tampão da hemoglobina baseia-se no par reduzido de hemoglobina/
oxihemoglobina e deve-se as suas propriedades à capacidade de
dissociação do grupo proteico ligado ao ion ferroso (Fe2+) na sua
estrutura.
A desoxiemoglobina (forma reduzida de hemoglobina, HHb) é
um ácido mais fraco do que a oxihemoglobina, que contém hidrogênios
de seus grupos capazes de dissociar-se (HHbO2). Suas respectivas
dissociações podem ser representadas da seguinte maneira:
38 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Em condições fisiológicas, a HHb é dissociada em 20%, enquanto


80% não é dissociada. Nestas condições, o HHbO2 está 80% dissociado,
enquanto 20% é ácido. Isso torna possível agir como um tampão
efetivo. O sistema, integrado com a participação do CO2 derivado do
metabolismo tecidual e da incorporação de oxigênio nos pulmões, é
escrito da seguinte forma:

Na dissociação de gás carbônico (CO2) hidratado (H2CO3) a HCO-


3+ H+ este se combina com hemoglobina para formar HHb, enquanto
ocorre a saída de HCO-3 da hemácia e a troca de íons cloreto (Cl -).
Como resultado, o monóxido de carbono (CO2) hidratado é tamponado,
ocorrendo a liberação do íon de bicarbonato, contribuindo efetivamente
na manutenção de um alto coeficiente da razão [HCO-3]/[H2CO3].
Quando a hemoglobina é reduzida, o oxigênio transportado associado
à hemoglobina (HHbO2) é liberado e difunde-se no plasma e atinge os
tecidos.
Assim, o monóxido de carbono liberado no metabolismo tecidual
e difundido para o plasma é preferencialmente transportado na forma
de bicarbonato (HCO-3), após sua formação nas hemácias, contribuindo
efetivamente para a manutenção do pH sanguíneo.

Conclusões
A nutrição como ciência da área da saúde demanda o estudo
do corpo humano e como os alimentos são metabolizados e utilizados
para as necessidades individuais de cada pessoa. Para que os alimentos
desempenhem seu papel de suprir o corpo de nutrientes, como
carboidratos, proteínas, lipídios, vitaminas, minerais e água, o corpo
precisa estar em equilíbrio em suas ações celulares. Como vimos, a célula
é a menor parte do corpo humano que é responsável por metabolizar
os nutrientes, além de ter o material genético que traz características
únicas a cada indivíduo. As células possuem organelas que realizam
várias funções como pequenos órgãos.
Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição 39

A célula também possui uma camada anfipática chamada


membrana plasmática, que realiza a seletividade de quais substâncias
podem entrar para dentro da célula. Até porque a maioria das substâncias
(glicose e vitaminas polares por exemplo) são hidrossolúveis, assim
a membrana plasmática impede a entrada facilitada de substâncias
solúveis em água, obrigando-as a utilizarem canais.
A água como substância fundamental para existência humana,
desempenha função primordial no metabolismo energético, como
observado nos sistemas tampão a água participa de várias reações
de tampão e veremos nas próximas unidades que ela realiza funções
relevantes para o metabolismo celular.
Os sistemas tampão auxiliam o equilíbrio de acido-base das
células e no sangue, contribuindo para que as células estejam em um
meio que as tornem saudável e prontas para realizarem todas as reações
do metabolismo energético.
40 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

BIBLIOGRAFIA
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vista panorâmica sobre a estrutura, funções e evolução das células.
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confirma-como-organismo-regula-niveis-elevados-de-co2-no-
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42 Bioquímica Humana Aplicada à Nutrição

Bioquímica Humana
Aplicada à Nutrição
Prof.ª M.ª Jordanna Santos Monteiro

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