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Politica Externa Japao Insercao Internacional Relacoes Bilaterais
Politica Externa Japao Insercao Internacional Relacoes Bilaterais
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................ 84
PROFESSOR-AUTOR ....................................................................................................................... 94
MÓDULO I – RELAÇÕES JAPÃO-ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA
8
Após a I Guerra Mundial, apesar de ter saído vencedor junto com os aliados, não recebeu o
mesmo tratamento que as demais potências ocidentais. Desse modo, o Japão se concentrou na
consolidação do seu poder no Leste asiático, aproveitando a perda de poder relativo das potências
imperiais tradicionais. Então consolidou-se como uma potência naval e, paulatinamente, os seus
interesses confrontaram os dos EUA. Esse caminho que levou à confrontação direta entre Tóquio
e Washington na II Guerra Mundial transformou a história japonesa, e a derrota do Japão,
destruído e atingido por dois artefatos nucleares, levou à ocupação do Japão pelos EUA e à
refundação da política externa do país asiático.
Após a II Guerra Mundial, os EUA se afirmaram como hegemonia global. No contexto asiático,
asseguraram o domínio do Japão e a presença na península coreana. Além disso, tinham interesses na
China. Cabe destacar que, naquele período imediato pós-II Guerra Mundial, a China não era um país
comunista. O governo nacionalista do Guomindang tinha relações de cooperação com Washington.
Desse modo, pode-se dizer que a prioridade estratégica dos EUA na região era a China. Esse quadro só
foi alterado com o advento da Guerra da Coreia em (1950-1953). A partir desta guerra, na qual os
EUA, apesar de toda a superioridade bélica e produtiva, não conseguiram derrotar a China comunista,
que tinha acabado de sair de uma longa guerra civil, Washington passou a articular uma defesa regional
em torno de aliados geoestratégicos. Dessa forma, pela importância geopolítica, o Japão passou a ser
uma prioridade na estruturação da estratégia dos EUA para a Ásia. Até então, os EUA não pretendiam
auxiliar o Japão no processo de reestruturação e de construção de capacidades defensivas.
A ocupação americana começou com o objetivo ostensivo de desmilitarização e
democratização do Japão. 1 O general MacArthur, comandante das forças de ocupação, propôs uma
nova constituição para o Japão baseada em três princípios: manutenção do sistema imperial,
renúncia completa à guerra agressiva e autodefensiva e abolição do sistema feudal (IOKIBE, 2017).
Nesse cenário, a constituição 2 elaborada e proposta pelos EUA continha o art. 9, o qual previa a
renúncia à guerra, fator que constrange a política de segurança do Japão até os dias atuais.
À medida que a Guerra Fria avançou, a posição do Japão melhorou, e o país asiático ganhou
importância, como mencionado, na estratégia de contenção da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS). O primeiro-ministro Shigeru Yoshida (1946-1947 e 1948-1954) defendia que
um Japão empobrecido e incapaz de se defender seria vulnerável, portanto seria importante
assegurar a proteção dos EUA ao firmar um acordo de segurança e permitir o uso de bases no Japão,
especialmente dada a formação do aliança sino-soviética em 1950 (IOKIBE, 2017, VISENTINI,
2011). Além disso, afirmava que o Japão não se rearmaria antes de um tratado de paz ser alcançado,
mas a posição de Yoshida era criticada por setores progressistas no Japão, que defendiam um acordo
de paz multilateral, e não só com os EUA. Apesar disso, Yoshida prevaleceu e, dessa forma, o
caminho para a assinatura do tratado de paz foi pavimentado.
1
Segundo Iokibe (2017, p. 116), “essas medidas incluíam o desarmamento e a desmobilização, a dissolução da organização
militar e a abolição da polícia secreta”.
2
A nova constituição estabeleceu o parlamentarismo e descentralizou poderes fiscais e de segurança interna (VISENTINI, 2011).
9
O Tratado de Paz e o Tratado de Segurança Mútua EUA-Japão foram assinados em São
Francisco em 1951. O acordo inseriu o Japão na estratégia de contenção da URSS e consolidou o
principal eixo determinante das relações bilaterais entre o Japão e os EUA. A partir de então, as
tropas americanas seriam estacionadas no Japão. Tacitamente, este ficaria sob o guarda-chuva
nuclear dos EUA. No plano econômico, houve auxílio tecnológico e financeiro, bem como abertura
do mercado nos EUA para as exportações japonesas. Esse quadro contribuiu para o franco processo
de modernização econômica japonesa, o qual dependia da associação com Washington.
O período que se iniciou na década de 1970 foi transformador para as relações Japão-EUA.
Com a recuperação econômica dos países europeus, principalmente a Alemanha, e do Japão, os
EUA perderam poder relativo na economia mundial, especialmente no comércio. Nesse contexto,
os EUA romperam com a estrutura da governança financeira global estruturada no imediato pós-II
Guerra Mundial e procuraram reestruturar a sua hegemonia.
Inicialmente, esse contexto permitiu o crescimento da inserção econômica internacional do
Japão. Segundo Brites (2018, p. 52),
10
O governo de Richard Nixon (1969-1974) assumiu com a missão de reverter o quadro de
perda de poder relativo dos EUA. No plano securitário, a Doutrina Nixon (1969) atribuiu um
papel de maior responsabilidade aos aliados dos EUA nos custos de defesa, e isso alterou
decisivamente o panorama político-estratégico na Ásia, favorecendo o regionalismo asiático. Até
então, as dinâmicas da Guerra Fria eram elementos de constrangimento de relações regionais. No
que diz respeito ao Leste asiático, esse quadro culminou na aproximação entre a China e o Japão,
corroborada pela normalização das suas relações em 1972.
Com as duas crises do petróleo, de 1973 e 1979, Tóquio passou a considerar a superação
da dependência energética como uma prioridade. Isso implicava minimizar a dependência do
abastecimento do Oriente Médio e a estabilidade das suas linhas de comunicação marítimas.
Desse modo, o Japão passou a observar a estabilidade no Sudeste da Ásia como parte integrante
do seu entorno estratégico e a entender que a aproximação com a China poderia ser importante
para prover os recursos de que o país precisava. Ou seja, a crise internacional dos anos 1970,
considerada uma crise da hegemonia dos EUA, ensejou o aumento da assertividade japonesa.
Diante desse quadro, o Japão procurou colocar-se como um ator global. Com isso, a Doutrina
Fukuda 3 (1976-1978) se tornou base desse novo contexto de atuação do Japão e lançou as bases
para o aprofundamento do regionalismo asiático.
A chegada de Ronald Reagan ao poder, no entanto, rompeu com o quadro dos anos 1970,
no qual os EUA permitiram que o regionalismo asiático avançasse. Essa fase liderada pelo Reagan
foi definida como Nova Guerra Fria. Segundo Brites (2018, p. 56),
Até o final dos anos 1980, o Japão se consolidou como o potencial sucessor dos EUA na
hegemonia; superou as crises da década de 1970 e ganhou fatias do mercado de exportações nos
EUA e em outros mercados tradicionais de domínio americano. Os EUA, por sua vez, absorviam a
maior parcela das exportações japonesas e eram o destino de investimentos japoneses, que
compraram posições importantes no mercado americano. Contudo esse cenário de protagonismo
japonês gerou uma reação americana, a qual veio por meio do Acordo de Plaza, assinado em 1985.
3
Baseada no primeiro-ministro Takeo Fukuda (1976-1978), a doutrina estabelecia que o Japão estava comprometido com
a construção de laços de cooperação e confiança mútua com os países do Sudeste asiático. Os princípios da Doutrina
Fukuda marcaram a política externa japonesa nas décadas subsequentes.
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O Acordo de Plaza envolveu os EUA, o Japão, a França, a Alemanha Ocidental e o Reino
Unido. A partir dele, o dólar americano foi depreciado em face do marco alemão e iene. Entre 1985
e 1987, o dólar se valorizou em 40% em relação às duas moedas (FRANKEL, 2016). Além disso,
os EUA adotaram uma política de desregulamentação financeira, a qual afetou diretamente o
desempenho econômico do Japão.
Ao passo que a Guerra Fria terminava, a pressão sobre o Japão se ampliou, e a Guerra do Golfo
(1991) foi o marco dessa nova conjuntura para o Japão, produziu o denominado “trauma japonês”.
Logo após a invasão iraquiana do Kwait, o primeiro-ministro Kaifu Toshiki (1989-1991)
implementou sanções ao Iraque. Ao contrário do que ocorria na Guerra Fria, quando a intervenção
internacional era indireta, dessa vez, a comunidade internacional estruturou uma força multinacional
de intervenção. Com isso, apesar da solidariedade e das sanções adotadas, os EUA passaram a
pressionar Tóquio para que auxiliasse em termos de transporte e suprimentos. O Japão tentou recusar,
mas foi pressionado por Washington a financiar o conflito. Como resultado, contribuiu com US$ 13
bilhões para a coalizão liderada pelos EUA (BRITES, 2018). Ou seja, Tóquio foi responsável por
cerca de 20% dos custos de guerra, mas não obteve retornos proporcionais desse alto investimento.
Com isso, Washington avançou na sua política de pressão sobre o Japão.
Desse modo, a Guerra Fria marcou a reconstrução do Japão e a refundação das relações
bilaterais com Washington. As relações que remontam ao século XIX são marcadas pela competição;
no início do século XX, evoluíram para uma relação umbilical de cooperação que permaneceria até
o final da Guerra Fria. Apesar disso, os EUA atuaram para frear o avanço japonês quando o país
asiático se configurava como potência desafiante no plano econômico. A assinatura do Acordo de
Plaza em 1985 e a pressão para que o Japão arcasse com o custo da Guerra do Golfo em 1991
evidenciaram essa postura mais agressiva dos EUA em relação ao Japão, e esse quadro levou Tóquio
a buscar reformular a sua inserção internacional no início dos anos 1990.
12
O crescimento econômico da Ásia levava os países da região a buscar estratégias de inserção
internacional mais autônomas, baseadas nas suas próprias perspectivas de pensamento e de
organização social e política (BRITES, 2018). Esse processo é definido por Huntington (1997)
como “afirmação asiática”. Diante desse panorama, Tóquio procurou engendrar um ambiente
regional mais autocentrado e independente diante dos EUA. Entre os sintomas desse novo quadro,
destacam-se a publicação do relatório Higuchi e a criação do Fórum Regional da Association of
Southeast Asian Nations (Asean) – isto é, Associação das Nações do Sudeste Asiático – em 1994
(ADVISORY GROUP ON DEFENSE ISSUES, 1994).
O relatório Higuchi foi um documento elaborado por um painel ad hoc formado pelo
governo japonês. Tratava dos desafios de segurança do Japão no período pós-Guerra Fria e previa
a necessidade de fortalecer as capacidades defensivas autônomas, bem como assumir uma postura
proativa no contexto regional. Além disso, o documento defendia a criação de instâncias
multilaterais de diálogo lideradas pelo Japão. Essa percepção deriva do novo contexto global, pois
o final da Guerra Fria determinou o término da bipolaridade. Diante disso, parte do establishment
político japonês passou a questionar a subordinação militar que Tóquio tinha em relação aos EUA.
As diretrizes do Programa Nacional de Defesa em 1995 estabeleciam que
1. Defesa nacional:
Prevenir agressões.
Tomar medidas responsivas contra agressões.
2. Resposta a desastres de grande escala e outras situações:
Responder a desastres naturais e outros.
Responder a situações nas áreas ao redor do Japão.
3. Contribuição para a criação de um ambiente de segurança mais estável:
Participar de operações de manutenção da paz da ONU, etc.
Promover o diálogo e o intercâmbio de segurança.
Cooperar no controle de armas e redução de armas.
4
Tradução nossa. Excerto original: “Role of Japan’s defense capability; National defense; Preventing aggression; Taking
responsive action against aggression; Responding to large-scale disasters and other situations; Responding to natural and
other disasters; Responding to situations in the areas surrounding Japan; Contributing to the creation of a more stable security
environment; Participating in UN peacekeeping operations, etc. Promoting security dialogue and exchange; Cooperating in
arms control and arms reduction; Role of the Japan-US alliance. […] Paying due attention to enhancing the credibility of the
Japan-U.S. security arrangements, [Japan] will strive to ensure its own national defense and contribute to the peace and stability
of the international community by appropriately upgrading, maintaining, and operating its capability” (NOBORU, 2012).
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Os pontos destacados demonstram o interesse japonês em estabelecer um papel ativo para as
forças de defesa do Japão na segurança regional e global. Apesar disso, as diretrizes reforçam a
importância da parceria com os EUA, desde que se considere a relevância de se desenvolverem forças
autônomas. Em outras palavras, o Japão demonstrava que, como parte do seu amadurecimento
econômico e político nas últimas décadas da Guerra Fria, quando o país se configurou como uma
potência regional e global, chegava a hora de assumir maior protagonismo no campo estratégico.
Os EUA reagiram a essa postura japonesa com o lançamento da “Iniciativa Nye” – alusão ao
secretário de defesa dos EUA – em 1995, derivada do lançamento da “Estratégia de Segurança para a
Região Leste Asiático-Pacífico”. No documento, os EUA defendiam a importância da manutenção
de uma forte presença militar na região. O relatório deu destaque especial para a aliança Japão-EUA,
afirmando que essa aliança era a mais importante para os EUA no mundo. Desse modo, definiu essas
relações bilaterais como fundamentais para a política americana de segurança do Pacífico e para a
manutenção da posição hegemônica dos EUA (BRITES, 2018; NOBORU, 2012). Além disso,
Washington assumiu o compromisso de manter, no mínimo, 100 mil homens no Leste asiático. A
partir da Iniciativa Nye, a aliança dos EUA com Japão – e a Coreia do Sul – foi reforçada.
Com a eleição do primeiro-ministro Junichiro Koizumi (2001-2006), o Japão alterou a sua
política externa e adotou uma postura “globalista” (IOKIBE, 2017); passou a considerar a China e
a Coreia do Sul como concorrentes diretos em termos de produção industrial e procurou uma
relação especial com Washington. Além disso, alinhou-se à agenda de segurança americana, o que
incluiu a revisão da doutrina de emprego de forças, o compromisso com o envio de tropas para a
Guerra no Iraque em 2003 e o apoio logístico às tropas dos EUA no Afeganistão. Acrescente-se que
Tóquio se colocou como responsável pela segurança da península coreana. Com isso, Washington
poderia realocar forças para as guerras no Oriente Médio (SATO, 2004).
Apesar da busca por ser o aliado especial dos EUA, a visão globalista empreendida pelo
governo Koizumi, e mantida nos governos de Shinzo Abe (2006-2007), Yasuo Fukuda (2007-
2008), Tarō Asō (2008-2009), não logrou resolver a estagnação econômica do país (BRITES,
2018). Desse modo, a oposição elegeu Yukio Hatoyama (2009-2010), do Partido Democrático do
Japão (PDJ) 5, com uma nova pauta de governo. Hatoyama defendia que o Japão adotasse uma
postura regionalista, aproximando-se da China e da Coreia do Sul. Além disso, tinha como
prioridade a revisão da presença militar dos EUA no Japão, especialmente, a realocação das bases
americanas em Okinawa. Os EUA, no entanto, recusaram-se a se retirar de Okinawa, o que levou
à renúncia de Hatoyama (BRITES, 2018; VISENTINI, 2011).
5
O PDJ nasceu de um movimento antiPLD que emergiu nos anos 1990. O PDJ tinha como uma das metas principais estabelecer
um novo modelo de negócios na economia japonesa, segundo o qual Tóquio deveria aproximar-se dos vizinhos.
14
Barack Obama chegou ao poder em 2009 e estava na presidência dos EUA quando houve a
recusa acerca da retirada. A sua prioridade, todavia, estava no Oriente Médio. O presidente
democrata tinha a Guerra do Afeganistão e a Guerra no Iraque como principal desafio da política
externa, por isso, em um primeiro momento, focou desengajar o país desses conflitos. Por isso, a
prioridade geopolítica do seu mandato recaiu sobre o Oriente Médio e a Ásia Central. Em relação
à Ásia, esse quadro significou um distanciamento dos EUA (PECEQUILO, 2009). Dessa forma,
coube à então secretária de Estado Hillary Clinton o papel de gerir os assuntos relativos à região.
Nesse primeiro momento, portanto, a política externa dos EUA para a região foi reativa, e foram
mantidas as iniciativas principais que vinham sendo adotadas pelo governo Bush.
No governo de Naoto Kan (2010-2011), as relações exteriores do Japão foram marcadas pela
mudança de postura dos EUA, que, a partir do segundo ano de mandato de Obama, adotou uma
política ativa para a região. Naquele ano, Robert Gates, então secretário de Defesa; e Hillary Clinton
visitaram Hanoi com vistas a aprofundar a aproximação com o Vietnã. Essas visitas representam o
início da política do “pivô asiático”, estabelecido com vistas a contrabalançar o crescimento chinês.
Conforme Clinton (U.S. DEPARTMENT OF STATE, 2010), durante o Fórum Regional da Asean,
Essa postura dos EUA foi convergente com as preocupações do Japão naquele período. Apesar
de esse período ser marcado pela cooperação entre Japão e China, o incidente entre barcos
pesqueiros chineses e a guarda costeira japonesa nas ilhas Senkaku-Diaoyu em 2010 tensionou as
relações de Tóquio e Pequim. Diante do incidente, o governo dos EUA reafirmou a sua aliança
com o Japão. Desse modo, Washington afirmou que apoiava a reivindicação japonesa, visto que
essas ilhas estão sob controle administrativo efetivo do Japão (BRITES, 2016).
15
Em 2011, um terremoto de 9 graus de magnitude atingiu o nordeste do Japão e provocou um
tsunami que atingiu a costa do país. Esse desastre contribuiu para o acidente nuclear em Fuskushima.
Os EUA enviaram auxílio para o Japão por meio da Operação Tomodachi. Segundo Iokibe (2017),
Como um dos resultados da crise após o tsunami, Shinzo Abe (2012-2020) chegou ao poder.
O novo primeiro-ministro mantinha uma retórica com forte tom nacionalista e a favor de maior
proatividade japonesa no Leste asiático. Entre os lemas, destacam-se “o Japão está de volta” e
“rejuvenescer o Japão” (BRITES, 2018).
Durante o governo de Abe, houve um notável aumento das capacidades nacionais de defesa
do Japão e um esforço por uma reforma da política de segurança. Desde a II Guerra Mundial, o
país foi restringido de exercer política de segurança de modo autônomo, a qual vinha sendo limitada
pela Constituição. Dessa forma, propôs uma reforma voltada a eliminar essa e outras limitações,
apesar da falta de apoio popular.
6
Tradução nossa. Excerto original: “A massive relief effort, known as Operation Tomodachi, was quickly put into action by
US armed forces. This was a large-scale operation that involved more than 24,500 service members, 24 naval ships, and
189 aircraft during the peak of the operation, as well as nearly US$ 80 million in US government aid. Donations from the
American private sector – individuals, companies, and private organizations, etc. – totaled US$ 736.9 million and is believed
to be America’s fifth-largest private donation in history, as well as the third largest to a foreign country, and also the largest
to a developed nation (JCIE 2014). This figure clearly demonstrated that the US-Japan relationship was not supported merely
by national security concerns. The enthusiastic support and cooperation shown by America at the time of the disaster
further strengthened US–Japan relations” (IOKIBE, 2017, p. 251).
16
Além disso, buscou um aprofundamento da aliança militar com os EUA, bem como com
vizinhos como a Austrália e a Índia. Entre as medidas, retomou o Encontro Quadrilateral sobre
Cooperação Regional (Quad) que inclui os EUA, a Índia, a Austrália e o Japão. O Quad trata de
questões militares e envolve a realização de exercícios militares conjuntos (PANDA, 2017). Essa
iniciativa era uma reação à China e à assertividade de Pequim na região. Segundo Brites (2018),
Com os EUA, o Japão procurou reforçar a relação de cooperação. Quer dizer, a estratégia era
assentada em uma ação dupla. De um lado, o país procurava desenvolver as suas capacidades
militares de modo autônomo, ampliando a sua capacidade de atuação em termos securitários. De
outro, buscou dissipar quaisquer incertezas nas relações bilaterais com Washington. Os EUA viram
a mudança de postura adotada pelo Japão de modo positivo. Afinal, as relações bilaterais têm
enfrentado um contexto adverso na última década, por isso a aliança EUA-Japão se configura como
um dos pilares da estabilidade regional. O crescimento da China é um dos desafios para os dois
aliados e tem sido um tema prioritário nas relações bilaterais no século XXI.
O balanço das relações Japão-EUA mostra que elas foram basilares para o equilíbrio regional.
Desde o século XIX, o Japão e os EUA estiveram inseridos na definição dos rumos da região. A
confrontação na II Guerra Mundial foi o ápice das divergências e da competição entre os dois países,
porém, a partir desse período, ensejou-se uma relação especial, que auxiliou a reconstrução do Japão
e a ascensão de Tóquio como uma potência global. No final e no pós-Guerra Fria, o Japão continuou
sendo central para os EUA, apesar de, em alguns episódios, como nos Acordos de Plaza, Washington
ter exercido pressão sobre Tóquio e minado a capacidade do Japão de manter a sua trajetória de
crescimento. No século XXI, por fim, observa-se que a aliança Japão-EUA tem buscado reestruturar-
se. Os desafios apresentados pela ascensão da China, fator que muda o equilíbrio regional, têm
implicado mudanças na política externa dos dois países. Em que pese tratar-se de um processo
inconcluso, em disputa, a aliança bilateral seguirá sendo crucial para a ordem internacional.
17
Relações econômicas
Após a breve contextualização dos antecedentes históricos e do âmbito político-diplomático
e securitário das relações Tóquio-Washington, a terceira unidade do módulo 1 apresenta alguns dos
aspectos mais importantes das conexões econômicas, de significativo peso para o relacionamento
bilateral e para a formulação de política externa japonesa. Embora existissem relações comerciais
entre o Japão e os EUA mesmo antes da II Guerra Mundial, foi durante a Guerra Fria que essas
relações ganharam peso.
A importância do Japão para a estratégia de segurança dos EUA no Leste asiático contribuiu
para que o país fosse integrado à governança econômica ocidental. No processo de apoio à
reconstrução asiática, os EUA lançaram o Plano Colombo 7 (BANGSBERG, 1959). Apenas após a
Guerra da Coreia (1950-1953), o Japão foi integrado ao plano. Mais do que isso, como parte dessa
iniciativa de tornar Tóquio um dos pilares da defesa na região, Washington abriu o seu mercado
interno para os produtos japoneses e permitiu a concessão de acesso à tecnologia americana por
parte das empresas japonesas (VISENTINI, 2011; ARRIGHI, 1996).
A partir dos anos 1960, o Japão passou a crescer economicamente de modo vertiginoso.
Como demonstra o gráfico 1, a seguir, a década de 1960 ficou marcada por um crescimento
muito acentuado, com o país conseguindo taxas de crescimento acima de 10% em quase toda
a década, exceto os anos de 1962, com 8,90%; de 1963, com 8,74%; e de 1965, com 5,82%.
Esse crescimento se estendeu por toda a Guerra Fria, apesar de, a partir de meados dos anos
1970, o patamar de crescimento ter caído significativamente. Esse processo de crescimento da
economia japonesa foi pautado pela internacionalização da economia, que integrou o seu
parque produtivo aos vizinhos asiáticos.
7
O Plano Colombo tinha como objetivo fortalecer a cooperação econômica do Ocidente com os países da Ásia-Pacífico e
estava integrado à estratégia dos EUA no pós-II Guerra Mundial. Inicialmente, o foco do plano eram os países do Sudeste
asiático; depois, foi expandido para o Japão também.
18
Gráfico 1 – Crescimento anual do PIB (%) do Japão (1961-1989)
A recuperação japonesa levou a que, entre os anos 1960 e 1980, houvesse uma tendência de
aumento do déficit comercial dos EUA em relação ao Japão (OLIVEIRA; MIYAZAKI, 2018). Esse
quadro contribuiu para que existissem atritos recorrentes entre Tóquio e Washington. O Japão
passou a ser um competidor da economia dos EUA, principalmente no âmbito comercial. Em
virtude disso, segundo Oliveira e Miyazaki (2018, p. 96),
Essas disputas não se restringiam ao âmbito tarifário, incluía barreiras não tarifárias e medidas
regulatórias do governo japonês tomadas no âmbito doméstico. As medidas que o governo japonês
adotou para estimular o mercado interno foram alvo de críticas pelos EUA (OLIVEIRA;
MIYAZAKI, 2018; COOPER; MANYIN, 2013). Desse modo, em 1985, é estabelecido o Acordo
de Plaza, o qual depreciou a moeda americana em face do marco alemão e do iene japonês. Essa foi
uma medida para aumentar a competitividade dos EUA na economia internacional. Além desse
acordo, na sequência, Tóquio e Washington estabeleceram uma série de arranjos bilaterais, tais
19
como o Diálogo Market-Oriented Sector-Specific Talks 8 (Moss) de 1985, que tinham como objetivo
redefinir a política comercial bilateral. Ao longo dos anos 1990, a parcela do déficit comercial dos
EUA referente ao Japão foi diminuindo. Em contraposição, como demonstra o gráfico 2, a seguir,
a China foi assumindo a maior parcela do déficit comercial dos EUA.
Gráfico 2 – Parcela do déficit comercial total dos EUA (1989-2007): RPC, Japão e o restante do
Leste asiático
8
Market-Oriented Sector-Specific Talks (Moss) tentaram reduzir as barreiras comerciais japonesas e promover o aumento do
acesso dos EUA e de outras exportações estrangeiras ao Japão. A estratégia de negociação do Moss se concentrou na
identificação e remoção de barreiras tarifárias e não tarifárias nos setores japoneses selecionados, e não buscou definir
metas comerciais ou cotas específicas (GAO, 1988).
20
Tabela 1 – Comércio Japão-EUA (1991-2020)
21
exportações dos EUA para Japão exportações do Japão para os EUA
ano ano
(US$ milhões) (US$ milhões)
Fonte: elaborado pelo autor com base em United Census Bureau (2021)
22
Em 2020, o Japão entrou na Regional Regional Comprehensive Economic Partnership
(RCEP) 9 – isto é, Parceria Econômica Abrangente – liderada pela China, a fim de reduzir as
barreiras comerciais entre os membros. O êxito das negociações da RCEP foi facilitado pelo
fracasso da TPP, e a entrada do Japão no acordo ampliou a relevância da parceria. Para as relações
Japão-EUA, essa adesão do Japão à RCEP gerou temor em Washington de que os EUA possam
perder competitividade em termos comerciais, e a China ganhe mais força como principal parceira
do Japão (AKIMOTO, 2020; CRS, 2020).
A análise da cooperação econômica entre o Japão e os EUA demonstra que as relações
bilaterais são importantes para os dois países. Apesar da cooperação entre ambos ter sido crucial
para o desempenho econômico dos dois, ao longo do período discutido, houve disputas comerciais
entre eles. A recuperação japonesa nas décadas pós-II Guerra Mundial trouxe consigo a ampliação
da participação do Japão no comércio internacional e o crescente déficit dos EUA no comércio
bilateral. Esse quadro levou a uma série de atritos e de pressão por parte de Washington para que o
Japão mudasse a sua política comercial. Após a Guerra Fria, com a perda de vigor da economia
japonesa, os conflitos bilaterais perderam força.
Mais recentemente, a TPP foi um dos temas que mobilizou as relações bilaterais. A parceria
oferecia a possibilidade de convergência maior entre os dois países, porém, com a saída dos EUA,
o acordo naufragou. O Japão, em resposta, vem buscando diversificar as suas estratégias de inserção
econômica, por isso ampliou a rede de acordos econômicos pelo planeta e se aliou à iniciativa
chinesa RCEP. Apesar disso, as relações econômicas Tóquio-Washington continuam sendo
importantes para os dois países, principalmente para o Japão.
9
Os países que estão na RCEP são os seguintes: Austrália; Brunei; Camboja; China; Indonésia; Japão; Laos; Malásia;
Mianmar; Nova Zelândia; Filipinas; Cingapura; Coreia do Sul; Tailândia; e Vietnã.
23
Considerações finais
Este módulo tratou das relações bilaterais entre o Japão e os EUA, e a análise delas
evidenciou que, tanto para Washington quanto para Tóquio, as interações são cruciais para a
inserção internacional dos dois países.
Desde o início das interações no século XIX, as relações bilaterais se estruturaram como um
dos elementos prioritários da formação política no Leste asiático. Nas primeiras décadas do século
XX, os interesses sobrepostos do Japão e dos EUA levaram à conflagração pela hegemonia regional
na Ásia. A derrota japonesa e a subsequente ocupação dos EUA redefiniram o destino do Japão e as
relações internacionais do Leste asiático. Ao longo da Guerra Fria, a cooperação bilateral ensejou a
reconstrução do Japão e a ascensão de Tóquio ao posto de maior economia asiática no período e
segunda maior economia do planeta até os anos 2000. Esse quadro, inclusive, gerou atritos
comerciais entre os dois países. Além disso, a presença militar americana em solo japonês é um
elemento crucial para o balanço regional na Ásia.
Por fim, a aliança entre o Japão e os EUA tem sido estratégica para a contenção da China
promovida por Washington. O crescimento chinês tem sido um dos tópicos que norteiam as
relações bilaterais e deve pautar as interações bilaterais nos próximos anos. Dada a importância e a
capacidade dos dois países, bem como o papel do Japão para a hegemonia dos EUA, o futuro dessas
relações bilaterais será crucial para definir o equilíbrio global de poder.
24
MÓDULO II – RELAÇÕES JAPÃO-REPÚBLICA
POPULAR DA CHINA
10
Destaca-se o período em que a Dinastia Qing (1644-1912) ampliou os territórios controlados pela China ao longo dos
séculos XVII e XVIII.
26
Figura 1 – Nordeste asiático em 1900
11
A Guerra do Ópio (1839-1842), que contrapôs a China e o Império Britânico, marca o início do processo de colonização britânica.
Embora a China não tenha sido formalmente colonizada por uma única grande potência, a assinatura do Tratado de Nanquim
(1842), que colocou fim ao conflito, representou o início de uma série de tratados desiguais que marcam o processo de domínio
das potências ocidentais sobre a China. Esse período dá início ao chamado “século de humilhação” chinês.
12
A restauração Meiji foi um processo de restituição dos poderes do imperador do Japão em 1868. Em termos efetivos,
representou o fim do período Tokugawa, do xogunato, e do sistema feudal que preponderava no Japão.
27
A Restauração Meiji favoreceu uma transformação profunda da política e da economia
japonesas, assim como o fim do sistema feudal. Entre as mudanças adotadas pelos Genro, 1314
destacam-se a centralização político-administrativa, a busca por uma economia industrial e a
modernização das forças armadas. O Japão replicou o modelo ocidental, adaptado ao contexto
histórico da sociedade japonesa, o que impulsionou uma transformação na matriz produtiva e no
sistema financeiro do país 15 (VISENTINI, 2012). A partir disso, modernizou-se e passou a competir
com as potências ocidentais. Para as relações bilaterais, a Restauração Meiji representou um
realinhamento regional (SUMIKAWA, 1999; HALL, 1985).
Essas transformações culminaram em um processo de expansão regional do Japão. Um dos
marcos desse processo foi a I Guerra Sino-Japonesa (1894-1895). 16 O Japão saiu vitorioso e
consolidou a sua superioridade tecnológica, militar e econômica sobre a China no Leste asiático.
Como resultado, segundo o Tratado Shimonoseki, a China foi obrigada a reconhecer a
independência da Coreia, que passou a ser esfera de influência do Japão, a ceder Formosa/Taiwan,
as ilhas pescadores e Liadong 17 – Manchúria meridional – ao Japão. Além disso, a China teve de
pagar uma indenização e a abrir os seus portos – Shashi, Chongqing, Suzhou e Hangzhou – ao
comércio com o Japão (BEASLEY, 1992). Um dos efeitos da guerra entre a China e o Japão foi a
ampliação das disputas territoriais entre as potências. Além da península coreana, a região da
Manchúria se tornou objeto de disputas, o que impulsionou a eclosão da Guerra Russo-Japonesa 18
(1904-1905). Apesar do contexto turbulento, as relações entre a China e o Japão não eram só de
rivalidade, pois havia intercâmbio intelectual e cultural.
No período entreguerras, as relações bilaterais enfrentaram a sua fase mais crítica.19 Em 1931,
o Japão ocupou a região da Manchúria, o que marcou o início do período de maior atrito entre os
dois países. Após um período de uma série de atritos e escaramuças entre eles, eclodiu a II Guerra
Sino-Japonesa (1937-1945), com a invasão japonesa da China. A guerra trouxe profundas marcas
13
Genro é uma designação não oficial aos estadistas que deram à origem ao Japão moderno. São restauradores que
impulsionaram as transformações ocasionadas pela restauração Meiji.
14
Além dessas mudanças, foi abolido o sistema de castas e de privilégios que beneficiava os samurais.
15
Ademais, o Japão implementou uma reforma profunda do sistema educacional, fez reforma agrária e modernizou a
sua infraestrutura.
16
A I Guerra Sino-Japonesa contrapôs a Dinastia Qing e o Império do Japão e durou um pouco mais de oito meses.
17
A Península Liadong foi devolvida à China após a intervenção tripla de Rússia, França e Alemanha em 1895.
18
A guerra entre o Império Japonês e o Império Russo terminou com a vitória do Japão. Foi a primeira vitória de uma
potência asiática sobre uma potência europeia. Segundo o Tratado de Portsmouth, sob mediação dos EUA, a Rússia
reconheceu a Coreia como esfera de influência do Japão, concedeu os seus arrendamentos em Port Arthur e na Península
de Liaodong, saiu da Manchúria e cedeu a metade das Ilhas Sacalinas, que havia anexado em 1875.
19
Um marco do crescimento das rivalidades entre a China e o Japão foi o episódio das 21 demandas durante a I Guerra
Mundial. Estas foram um conjunto de exigências feitas pelo Império do Japão, as quais incluíam a cessão de territórios
chineses, entre outras reivindicações consideradas agressivas pela China.
28
para as relações bilaterais e motivou uma série de pedidos de reparação histórica por parte da China
contra o Japão desde então. O conflito estava inserido no contexto da II Guerra Mundial. A Guerra
no Pacífico acabou levando à derrota do Japão e à destituição do projeto regional do império
(PAINE, 2012). A China, por sua vez, após o final da II Guerra Mundial, enfrentou uma guerra
civil que levou o Partido Comunista Chinês (PCCh) ao poder em 1949.
Ao longo da Guerra Fria, as relações sino-japonesas passaram por três fases distintas. Na
primeira fase (1945-1952), as relações bilaterais quase não existiram. Isso se deve ao fato de que o
Japão, ocupado pelos EUA, bem como a China, no meio a uma guerra civil e no início de um novo
sistema político, estavam voltados aos seus contextos internos. Nesse período, a Guerra da Coreia
(1950-1953) foi fundamental para definir o equilíbrio regional. A partir de então, o Japão se
consolidou como aliado prioritário dos EUA na estratégia de contenção da URSS.
A segunda fase (1952-1972) foi marcada por relações informais e pela percepção mútua de
que era fundamental manter boas relações bilaterais. A ideia era criar um intercâmbio entre os dois
países na esfera cultural e econômica. Dessa forma, a partir dessa cooperação mais específica,
esperava-se que as relações bilaterais evoluíssem para a cooperação política (TOGO, 2005; IRIYE,
1990; JOHNSON, 1986). Em 1955, as delegações da China e do Japão atenderam à Conferência
de Bandung, 20 o que favoreceu um alinhamento acerca da visão de mundo dos dois países (IRIYE,
1990). Além disso, em termos materiais, nessa fase, começou a se observar um crescimento do
comércio bilateral entre eles. Importa destacar que, mesmo que as relações tenham melhorado ao
longo do período, isso não significa que apresentaram uma trajetória linear de melhoria. As crises
no estreito 21 de Taiwan (1954-1955 e 1958), limitaram a aproximação entre os dois países.
A década de 1970 trouxe novas perspectivas para as relações bilaterais, e a mudança na política
externa dos EUA para a Ásia durante o governo de Richard Nixon (1969-1974) ensejou a terceira
fase das relações entre Pequim e Tóquio. A aproximação dos EUA com a China e o fim do padrão
ouro-dólar 22 impactaram decisivamente as relações regionais e impuseram um novo contexto para
o Japão (HOOK et al., 2005). Essa fase é denominada “Era de Ouro” das relações entre China-
EUA-Japão que dura até 1989 (VOGEL; YUAN; TANAKA, 2002). Em termos práticos, essa fase
foi marcada pelo avanço do regionalismo, o que culminou na normalização das relações bilaterais e
no lançamento do Comunicado Conjunto de 1972. A aproximação entre a China e o Japão ocorreu
durante o governo do primeiro-ministro japonês Kakuei Tanaka (1972-1974). Para o Japão, isso
permitiu ao país alavancar o processo de subcontratação – ou segmentação da sua produção
20
A Conferência de Bandung – também chamada de Conferência Afro-Asiática – reuniu 29 países, na sua maioria estados recém-
independentes. Ela marcou o nascimento dos movimentos dos países não alinhados e tinha como mote a reação ao colonialismo.
21
As crises no estreito de Taiwan foram pequenos conflitos ou incidentes que confrontaram a República Popular da China
e a República da China. As disputas tinham como objeto a disputa sobre as ilhas de Quemoy, Matsu e Ichiang.
22
O fim padrão ouro-dólar representa o término do lastro da moeda americana em reservas de ouro. Esse anúncio por
parte dos EUA marcou uma nova fase da hegemonia do dólar.
29
industrial no exterior – e obter um parceiro econômico com recursos naturais relevantes,
especialmente, petróleo. Além disso, dispôs-se a renunciar a reparações financeiras de guerra
(KISSINGER, 2011). A China, por sua vez, estabeleceu, três condições: “(1) o reconhecimento de
Pequim como único governo da China; (2) reconhecimento da indivisibilidade do território chinês;
(3) o reconhecimento de que Taiwan era uma província da China” (BRITES, 2018, p. 51).
O Comunicado Conjunto do Governo do Japão e do Governo da República Popular da
China de 1972 estabelecia, entre outros pontos, que
Apesar das diferenças em seus sistemas sociais existentes entre os dois países,
os dois países devem, e podem, estabelecer relações de paz e amizade. [...]
1. A situação anormal que existiu até agora entre o Japão e a República
Popular da China cessa na data em que este Comunicado Conjunto
é publicado.
2. O Governo do Japão reconhece esse Governo da República Popular
da China como o único Governo legal da China.
3. O Governo da República Popular da China reitera que Taiwan é uma
parte inalienável do território da República Popular da China. O
Governo do Japão compreende e respeita totalmente esta posição do
Governo da República Popular da China e mantém firmemente a sua
posição de acordo com o Artigo 8 da Proclamação de Postdam.
4. [...] decidiram estabelecer relações diplomáticas a partir de 29 de
setembro de 1972. Os dois Governos decidiram tomar todas as
medidas necessárias para o estabelecimento e desempenho das funções
de embaixada um do outro em suas respectivas capitais, de acordo
com a lei e as práticas internacionais, e para trocar embaixadores o
mais rápido possível.
5. O Governo da República Popular da China [...] renuncia ao pedido
de reparação de guerra do Japão.
6. [...] concordam em estabelecer relações de paz perpétua e amizade
entre os dois países com base nos princípios de respeito mútuo pela
soberania e integridade territorial, não agressão mútua, não
interferência mútua nos assuntos internos, igualdade e benefício
mútuo e coexistência pacífica. Os dois governos confirmam que, em
conformidade com os princípios anteriores e os princípios da Carta
das Nações Unidas, o Japão e a China resolverão em suas relações
mútuas todas as controvérsias por meios pacíficos e se absterão de usar
ou ameaçar usar força.
30
7. A normalização das relações [...] não se dirige a nenhum terceiro país.
Nenhum dos dois países deve buscar a hegemonia na região da Ásia-
Pacífico e cada um se opõe aos esforços de qualquer outro país ou
grupo de países para estabelecer tal hegemonia.
8. O governo do Japão e o governo da República Popular da China
acordaram que, com vistas a solidificar e desenvolver as relações de
paz e amizade entre os dois países, os dois Governos entrarão em
negociações com o objetivo de concluir um tratado de paz e amizade.
9. [...] os dois Governos irão, conforme necessário e levando em
consideração as acordos não governamentais, entrar em negociações
com o objetivo de concluir acordos relativos a questões como
comércio, transporte marítimo, aviação e pesca (MOFA, 2021a).
[Artigo I]
1. As Partes Contratantes desenvolverão relações de paz e amizade
perpétuas entre os dois países com base nos princípios de respeito
mútuo pela soberania e integridade territorial, não agressão mútua,
não interferência nos assuntos internos de cada um, igualdade e
benefício mútuo e coexistência pacífica.
2. [...] em conformidade com os princípios precedentes e com os
princípios da Carta das Nações Unidas, devem, nas suas relações
mútuas, resolver todos os litígios por meios pacíficos e abster-se de
usar ou ameaçar usar a força.
23
No original: “The terms of the Cairo Declaration shall be carried out and Japanese sovereignty shall be limited to the
islands of Honshu, Hokkaido, Kyushu, Shikoku and such minor islands as we determine (POTSDAM DECLARATION, 1945).
31
[Artigo II]
[...] nenhuma delas deve buscar a hegemonia na região da Ásia-Pacífico ou
em qualquer outra região e que cada uma se opõe aos esforços de qualquer
outro país ou grupo de países para estabelecer tal hegemonia.
[Artigo III]
[...] em conformidade com os princípios de igualdade e benefício mútuo e
não interferência nos assuntos internos uma da outra, envidar esforços para
desenvolver ainda mais as relações econômicas e culturais entre os dois
países e promover intercâmbios entre os povos dos dois países.
[Artigo IV]
O presente Tratado não afetará a posição de qualquer das Partes
Contratantes em relação às suas relações com terceiros países.
[Artigo V]
1. [...] O presente Tratado permanecerá em vigor por dez anos e, a partir
de então, continuará em vigor até ser denunciado de acordo com as
disposições do parágrafo 2.
2. Cada uma das Partes Contratantes pode, [...] com um ano de
antecedência, denunciar o presente Tratado no final do período inicial
de dez anos ou em qualquer momento posterior (MOFA, 2021b).
O acordo consolidou o avanço da cooperação bilateral. Pode-se dizer que foi reflexo da
crescente cooperação, da percepção mútua sobre os ganhos com a aproximação e da crescente
interdependência entre os dois países. Na ocasião da assinatura do acordo, Deng Xiaoping se tornou
o primeiro líder chinês a visitar o Japão em mais de dois mil anos de história.
Como desdobramento, a China e o Japão também assinaram o Acordo de Comércio de
Longo Prazo, de US$ 20 bilhões, que previa dobrar o comércio bilateral até 1985. Na sequência,
os dois países concordaram em estabelecer encontros ministeriais regulares a partir dos anos 1980.
Esse quadro impulsionou um incremento nas visitas entre os líderes da China e do Japão e no
aprofundamento das relações bilaterais (KIM, 1985).
Apesar da cooperação que começa a se aprofundar, a década de 1980 fez ressurgirem algumas
antigas disputas entre os dois países. 24 O crescimento econômico do Japão, aliado ao aumento dos
gastos com defesa, fez com que alguns setores políticos na China aumentassem a desconfiança em
24
Segundo Silva (2012, p. 30), “Durante a década de 1980, as questões históricas ressurgiram e perturbaram as relações
em algumas oportunidades. Em 1982, o Ministério da Educação japonês teria requisitado a troca da expressão ‘agressão’
por ‘avanço’ ao se referir à atuação japonesa durante a II Guerra Mundial, o que se provou falso. Em 1985, o primeiro-
ministro Nakasone visitou o Santuário Yasukini de forma oficial. Nesses acontecimentos, após os protestos vindos de
outros países asiáticos, especialmente China e Coreia do Sul, Nakasone optou por desculpar-se e prometer não repetir as
visitas. Em 1987, ainda ocorreria um incidente envolvendo a propriedade de uma república estudantil no Japão, dada pela
corte japonesa a Taiwan, o que gerou fortes protestos por parte do governo chinês”.
32
relação ao vizinho. Esse foi um período importante na transformação das relações bilaterais. Afinal,
a partir de 1978, Deng Xiaoping anunciou o projeto de modernização nas áreas de agricultura,
indústria, defesa e ciência e tecnologia. 25
No contexto regional, a China e o Japão estiveram envolvidos nos principais acontecimentos
daquela virada de década na região. Com isso, houve espaço para cooperação e preocupação conjunta.
A assinatura do Tratado de Paz Soviético-Vietnamita 26 (1978) e a Guerra Cambojana-Vietnamita27
(1978-1989) eram objetos de atenção conjunta (SOON, 1980). Como resultado desse processo de
acirramento das tensões regionais, a China invadiu o Vietnã em 1979, sem a oposição do Japão. Esse
episódio demonstra a concertação entre os dois vizinhos e a triangulação junto aos EUA. Nesse sentido,
a preocupação com a URSS aproximava Pequim e Tóquio. Segundo Kissinger (2011, p. 333),
A China invadira o Vietnã para “ensinar uma lição” ao país depois que as
tropas vietnamitas haviam ocupado o Camboja em reação a uma série de
choques na fronteira com Khmer Vermelho, que havia dominado o
Camboja em 1975, e numa derradeira busca do objetivo de Hanói de criar
uma Federação Indochinesa. A China fizera isso desafiando um tratado de
defesa mútua entre Hanói e Moscou, assinado menos de um mês antes. A
guerra fora extremamente custosa para as forças armadas chinesas, ainda
não plenamente restauradas das depredações da Revolução Cultural. Mas
a invasão serviu a seu objetivo fundamental: quando a União Soviética
fracassou em reagir, ela demonstrou a limitação de seu alcance estratégico.
Desse ponto de vista, pode ser considerado um momento decisivo na
Guerra Fria, embora isso não fosse plenamente compreendido na época. A
Terceira Guerra do Vietnã foi também o ponto alto da cooperação
estratégica sino-americana durante a Guerra Fria.
25
Esse processo ficou conhecido como “Quatro Modernizações”. Segundo Oliveira (2003), as reformas incluíam
transformações mais profundas da governança chinesa. “No XII Congresso do PCC (1982), Deng procurou preparar o
partido e o governo para a boa implementação da abertura ao exterior e as “Quatro Modernizações” (da agricultura, da
indústria, das forças armadas e das atividades de ciência e tecnologia), fixando-lhes para os anos 1980 uma agenda em
quatro pontos: (1) reestruturar a administração e a economia; (2) construir uma civilização socialista, cultural e
ideologicamente avançada; (3) coibir com firmeza atividades criminosas; e (4) corrigir o estilo de trabalho do partido”.
26
Em junho de 1978, a URSS e o Vietnã assinaram um Tratado de Amizade e Cooperação, e esse movimento isolou a
China no tabuleiro regional em face dos dois vizinhos comunistas. Cabe lembrar que a China e o Vietnã, nesse período,
estavam tendo atritos fronteiriços. Além disso, a URSS incluiu o Vietnã como membro pleno do Conselho para Ajuda
Econômica Mútua (Comecon). Essa mudança foi a peça central para a invasão vietnamita do Camboja, aliado chinês,
naquele mesmo ano (SOON, 1980).
27
A Guerra entre o Vietnã e o Camboja teve início após vários atritos fronteiriços entre os dois países. O Khmer vermelho
foi acusado pelo Vietnã de promover uma série de ataques na fronteira sudoeste do país. O Vietnã invadiu o Camboja e
derrotou o regime de Pol Pot (1975-1979).
33
A partir de 1981, o Japão deu início à transferência de recursos para a China por meio,
principalmente, do Official Development Assistance (ODA), isto é, Auxílio Oficial para o
Desenvolvimento (SILVA, 2015; FENG, 2005). Esse apoio fornecido pelo Japão foi crucial para a
construção de infraestrutura chinesa, como aeroportos, portos, ferrovias, energia elétrica,
comunicação, etc. (WU, 2008).
Em 1982, iniciou-se o mandato do primeiro-ministro Yasuhiro Nakasone (1982-1987), cuja
administração foi responsável pela busca por um maior protagonismo do Japão no cenário
internacional (UEHARA, 2018).
Nos anos 1980, o Japão ganhou destaque global como segunda maior
economia mundial e por se tornar o principal país fornecedor de Ajuda
Oficial para o Desenvolvimento [...]. O Japão também superou os EUA
como líder no setor bancário, tecnológico e de manufaturas. Esses fatores
pareciam impulsionar a política externa de Tóquio para um
posicionamento mais afirmativo e de aumento de sua independência em
várias questões, diferenciando-se das práticas até então desenvolvidas
(UEHARA, 2018, p. 67).
34
Relações político-diplomáticas e securitárias
Esta unidade trata das relações político-diplomáticas e securitárias entre a China e o Japão.
O marco do fim da Guerra Fria para as relações entre o Japão e a China é o incidente da Praça da
Paz Celestial – Tiananmen Square – em 1989. O incidente foi considerado um marco, pois mostra
a tentativa de cooperação entre o Japão e a China diante das pressões advindas dos EUA. Em outras
palavras, mostra que, diante do novo contexto global, no qual os EUA emergiam como única
superpotência, Tóquio e Pequim viam na aproximação bilateral uma via para reagir ao avanço da
hegemonia dos EUA.
Esse novo contexto, também marcado pela globalização, foi definido por Visentini
(2011; p. 69) da seguinte forma
Nesse novo cenário, a pressão americana sobre o governo chinês aumentou. Pode-se dizer que
a aliança ocasional entre Washington e Pequim deixou de ser prioridade para os EUA. Dessa forma,
isso impactou as relações entre a China e o Japão. Afinal, a aproximação entre os vizinhos asiáticos
foi viabilizada pela concertação com Washington nos anos 1970.
O Japão apoiou a China diante das pressões do Ocidente. Em 1992, o imperador Akihito
visitou a China. Nesse ano, os dois países mantiveram visitas oficiais entre os chefes de Estado e
diálogos de alto nível político. Em 1991, o primeiro-ministro Toshiki Kaifu (1989-1991) visitou
Pequim. Essa visita foi um sinal que o Japão dava em defesa do fim do isolamento chinês em face
das sanções do Ocidente. Kaifu foi o primeiro líder de uma das grandes potências a fazer uma visita
desde o incidente de Tiananmen. A sua visita durou quatro dias e marcou um retorno às relações
normalizadas (CHENAULT, 1991).
35
Apesar disso, esse contexto promoveu mudanças na política interna japonesa. Uma dessas
correntes defendia uma posição mais assertiva no sistema internacional, com uma revisão da atuação
do país na promoção da segurança coletiva e a busca por maior cooperação com os vizinhos. Em
alguma medida, diz respeito à ideia de que o Japão deveria adotar uma postura mais autônoma em
relação aos EUA (UEHARA, 2018). Nesse contexto, Tóquio apoiou a criação da Apec e do Fórum
Regional da Asean em 1994. Em que pese essa autonomização, o Japão cuidava para manter boas
relações com os EUA.
A partir de 1995, as relações bilaterais entraram em uma fase de deterioração. De um lado, o
crescimento econômico vertiginoso da China contrastava com o baixo desempenho econômico do
Japão. Nesse sentido, ensejou-se uma percepção de competição entre os dois vizinhos. Além disso,
Pequim passou a avançar no processo de modernização das suas forças armadas e do seu programa
nuclear. O crescimento do poder militar chinês, particularmente o desenvolvimento e a aquisição
de capacidades aéreas e navais permitiria que Pequim ampliasse a sua capacidade de projeção de
poder na região. Com isso, gerou muitas desconfianças no espectro político japonês. Além disso, as
tensões das relações entre Taiwan e China trouxeram muitas preocupações para o Japão.
Segundo Bush (2009, p. 1), após 1995, a China e o Japão se dividiram em torno das
seguintes questões:
28
Tradução nossa. Excerto original: “China regarded the policies adopted by Taiwan’s democratically elected leaders as a
challenge to its fundamental interests. Japan worried both that it might get drawn into a Taiwan conflict on the side of the
United States and that a PRC takeover of Taiwan would threaten its energy lifeline to the Middle East. A long festering
conflict over who owned the Japan-controlled Senkaku/Diaoyu Islands threatened to spin out of control. A common desire
to exploit oil and gas resources in the East China Sea fostered competing claims on how to divide up the ocean floor and,
as the two sides moved toward drilling, the danger of conflict grew” (BUSH, 2009, p. 1).
36
Alguns dos pontos de divergência se estenderam ao longo da década. A questão de Taiwan
será mais bem detalhada na unidade 4, mas as disputas entre China e Taiwan afetaram a relação
com o Japão. Além de aliado histórico de Taiwan, uma possível mudança de status quo na ilha
poderia gerar efeitos para o equilíbrio regional. O temor era de uma escalada nas tensões. Em relação
às ilhas Senkaku/Diaoyu, embora o Japão controle as ilhas, há alegações históricas de ambas as
partes sobre a posse legítima das ilhas. Essa disputa é acirrada pela possibilidade de exploração dos
recursos naturais nas águas vizinhas às ilhas (BUSH, 2009). As ilhas ficam em região próxima à
China, ao Japão e a Taiwan como mostra o mapa abaixo.
Como reação a esse contexto de acirramento das tensões com a China, o Japão voltou a se
aproximar de Washington. Em 1996, o primeiro-ministro Ryutaro Hashimoto (1996-1998) e o
presidente Bill Clinton deram uma declaração conjunta reafirmando a cooperação entre os dois países,
a importância da presença militar americana para a estabilidade da região e a necessidade de se
aprofundar a cooperação securitária entre os EUA e o Japão (MOFA, 1996). Esse contexto levou a
China a reagir adotando uma postura de aproximação com a Rússia. Desse modo, estabeleceram-se
os Shanghai Five 29 em 1996, quase imediatamente após a declaração conjunta Clinton-Hashimoto.
29
O grupo era composto de: China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão e Tadjiquistão.
37
Na crise asiática em 1997, a liderança regional do Japão foi posta em xeque. A dimensão
crítica da crise que afetou fortemente o Leste asiático levou os países da região a buscar saídas para
a situação. Apesar das propostas do Japão de criar um Fundo Monetário Asiático, a iniciativa não
prosperou. Inclusive, Pequim foi o principal ator regional a frear a iniciativa japonesa. Desse modo,
observa-se que a China ganhou relevância no contexto regional. Além disso, importa ressaltar que,
apesar de a proposta japonesa não ter sido adotada, a iniciativa de Chiang Mai 30 resultou da
diplomacia econômica japonesa também. Segundo Hook et al. (2002, p. 186),
De todo modo, a crise ampliou a percepção regional de que a vulnerabilidade externa era
uma fragilidade dos países da região, por isso os países procuraram soluções regionais para tratar
com esses desafios geoeconômicos, o que foi reforçado pela interdependência entre as economias
da região (SILVA, 2012; HOOK et al., 2002). Quer dizer, a crise de 1997 representou uma nova
janela de cooperação entre os países da região e abriu a possibilidade de um novo momento de
aproximação entre a China e o Japão.
Em 1998, o presidente Jiang Zemin (1993-2003) visitou o Japão. Como resultado dessa
visita, os dois países lançaram a “Declaração Conjunta Japão-China sobre a Construção de uma
Parceria de Amizade e Cooperação para a Paz e o Desenvolvimento”, a qual previa que
Ambos os lados acreditam que, após a Guerra Fria, a região asiática continuou
avançando em direção à estabilidade e a cooperação regional se aprofundou
ainda mais. Além disso, ambos os lados estão convencidos de que esta região
exercerá maior influência na política, economia e segurança internacionais e
continuará a desempenhar um papel importante no próximo século.
30
A Iniciativa Chiang Mai (CMI) foi o primeiro acordo regional de swap cambial lançado pela Asean + 3 (China, Coreia do Sul
e Japão) em maio de 2000. A iniciativa tinha como objetivo ajudar a resolver as dificuldades de liquidez de curto prazo na
região e complementar arranjos financeiros pré-existentes. A iniciativa é composta de: (a) o Acordo de Swap Asean (ASA)
entre os países da Asean; e (b) uma rede de acordos de swap bilaterais (BSAs) entre os países Asean + 3 (ARIC, 2021).
38
Ambos os lados expressaram seu grande interesse na atual crise financeira
no Leste asiático e nas dificuldades decorrentes para a economia asiática.
Ao mesmo tempo, ambos os lados reconhecem que a base econômica desta
região é sólida e acreditam firmemente que, avançando o ajuste racional e
a reforma com base nas experiências, bem como aprimorando a
coordenação e cooperação regional e internacional, a economia da Ásia
definitivamente superar suas dificuldades e continuar a se desenvolver. [...]
31
No excerto original: “Both sides believe that, after the Cold War, the Asian region has continued to move toward stability
and the regional cooperation has deepened further. In addition, both sides are convinced that this region will exert greater
influence on international politics, economics and security and will continue to play an important role in the coming century.
Both sides reiterate that it is the unshakable fundamental policy of the two countries to maintain the peace of this region
and to promote its development, and that they will not seek hegemony in the Asian region and settle all disputes by peaceful
means, without recourse to the use or threat of force. Both sides expressed their great interest in the current financial crisis
in East Asia and the ensuing difficulties for the Asian economy. At the same time, both sides recognize that the economic
foundation of this region is sound, and firmly believe that by advancing rational adjustment and reform based on
experiences, as well as by enhancing regional and international coordination and cooperation, the economy of Asia will
definitely overcome its difficulties and continue to develop. […]. Both sides believe that stable relations among the major
nations of the Asia-Pacific region are extremely important for the peace and stability of this region. The Japanese side
reiterated that a stable, open and developing China is significant for the peace and development of the Asia-Pacific region
and the entire world, and restated its policy of continuing cooperation and assistance for the economic development of
China. The Chinese side expressed its gratitude for the economic cooperation extended by Japan to China. The Japanese
side reiterated that it will continue to support China's efforts for the early accession to the WTO. […]. The Japanese side
continues to maintain its stand on the Taiwan issue which was set forth in the Joint Communique of the Government of
Japan and the Government of the People's Republic of China and reiterates its understanding that there is one China. Japan
will continue to maintain its exchanges of private and regional nature with Taiwan” (MOFA, 1998).
39
Na declaração, o Japão e a China reafirmaram alguns princípios que nortearam as relações
bilaterais desde os anos 1970. Entre os tópicos principais, destaca-se o comprometimento do Japão
com o princípio de uma só China, e o compromisso mútuo de não buscar hegemonia na região.
Desse modo, observa-se que a crise reforçou a ideia no Japão e na China de que não é possível
resolver problemas regionais sem que os dois países cooperem. A partir desse período, inaugura-se
uma nova fase do regionalismo asiático (CALDER; FUKUYAMA, 2012).
Como símbolo desse momento, em 1999, o Japão e a China participaram da Declaração
Conjunta sobre Cooperação no Leste Asiático, a qual confirmou a Asean 32como um fórum importante
de diálogo e cooperação regional. Como se sabe, o regionalismo é um dos principais tópicos nas relações
bilaterais, por isso essa aproximação mediada pela Asean representa uma ampliação do entendimento
sobre o que engloba a região do ponto de vista geopolítico. Dessa forma, o Sudeste asiático se tornou
um palco estratégico das relações bilaterais também. Além dos países membros, a declaração foi assinada
pela China, pelo Japão e pela Coreia do Sul. Segundo a Asean (1999),
32
Os Estados-membros da Asean são: Brunei Darussalam, Camboja, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Filipinas,
Singapura, Tailândia e Vietnã.
40
7. Observando como seus esforços coletivos e agenda de cooperação
apoiam e complementam as iniciativas de vários fóruns multilaterais, os
líderes concordaram em intensificar a coordenação e cooperação em vários
fóruns internacionais e regionais, como a ONU, OMC, Apec, Asem e ARF,
bem como em instituições financeiras regionais e internacionais.33
Alguns fatores explicam a tendência de competição que avança no início dos anos 2000. O
primeiro é a mudança na postura dos EUA em relação à Ásia. O governo de George W. Bush
alterou a política externa dos EUA e focou a contenção do terrorismo, priorizando o Oriente Médio
do ponto de vista geopolítico. Em grande medida, essa nova prioridade dos EUA criou uma espécie
de imposição para os aliados de Washington: ou apoiavam os EUA e ajudavam a compartilhar os
custos da Guerra ao Terror, ou estavam contra os EUA (PECEQUILO, 2011; BRIGAGÃO, 2011).
O segundo fator foi a chegada de Junichiro Koizumi (2001-2006) ao poder em 2001. O novo
primeiro-ministro adotou uma nova perspectiva de política externa e procurou aproximar o Japão
dos EUA, com vistas a ser o aliado prioritário de Washington na Ásia-Pacífico.
O governo Koizumi ficou marcado por ser um período de deterioração das relações bilaterais.
Entre os fatores que contribuíram para essa mudança estão as visitas anuais que o primeiro-ministro
fez ao memorial Yasukini. No governo chinês, a chegada de Hu Jintao (2003-2012) representou
uma mudança na política externa chinesa também. A China de Hu procurou adotar uma postura
mais voltada à cooperação com os vizinhos, incluindo o Japão. Nesse contexto, a China procurava
adotar uma postura voltada ao desenvolvimento harmonioso com os vizinhos. Os conceitos de
“sociedade harmoniosa” e “desenvolvimento científico” passaram a marcar essa nova fase da
inserção internacional da China (KISSINGER, 2011).
33
Tradução nossa. Excerto original: “Mindful of the challenges and opportunities in the new millennium, as well as the
growing regional interdependence in the age of globalization and information, they agreed to promote dialogue and to
deepen and consolidate collective efforts with a view to advancing mutual understanding, trust, good neighborliness and
friendly relations, peace, stability and prosperity in East Asia and the world. […]
in the cultural and information area, they agreed to strengthen regional cooperation in projecting an Asian point of view to
the rest of the world and in intensifying efforts in enhancing people-to-people contacts and in promoting cultural
understanding, goodwill and peace, focusing on the strengths and virtues of East Asian cultures and building upon the
recognition that the region partly derives its strength from its diversity;[…]
in the political-security area, they agreed to continuing dialogue, coordination, and cooperation to increase mutual
understanding and trust towards forging lasting peace and stability in East Asia;
in the area of transnational issues, they agreed to strengthen cooperation in addressing common concerns in this area in
East Asia […]
Noting how their collective efforts and cooperation agenda support and complement the initiatives of various multilateral
fora, the Leaders agreed to intensify coordination and cooperation in various international and regional fora such as the
UN, WT0, Apec, Asem, and the ARF, as well as in regional and international financial institutions” (ASEAN, 1999).
41
Durante a administração Koizumi, nenhum líder chinês visitou o Japão (LIDA, 2021). O
seu governo tinha uma plataforma baseada na adoção de reformas estruturais políticas e econômicas.
Entre as transformações que o primeiro-ministro procurava adotar estava a busca pelo aumento do
poder político do gabinete e a privatização de estatais. Essas reformas visavam ampliar a capacidade
competitiva do Japão em relação à China e à Coreia do Sul (SHINODA, 2007).
No plano securitário, Koizumi aprofundou a aliança com Washington e articulou uma espécie
de “divisão de trabalho de segurança entre o Japão e os EUA para o combate ao ‘Eixo do Mal’ e na
‘Guerra ao Terror’” (VISENTINI, 2011, p. 196). Desse modo, Koizumi foi considerado um ponto
de ruptura com a Doutrina Yoshida. Segundo Man (2007) essa doutrina se assentou em três pilares:
“(1) conseguir o poder estrutural, (2) preservar a tranquilidade nacional, e (3) manter a
competitividade econômica do Japão”34 (MAN, 2007, p. 117). O primeiro pilar estratégico dizia
respeito a institucionalizar a presença japonesa na governança global, em outros termos, obter uma
posição de relevância nos assuntos globais que fosse correspondente ao tamanho econômico do Japão.
O segundo objetivo estratégico remetia à necessidade de assegurar estabilidade social no âmbito
doméstico. O terceiro pilar, por sua vez, era voltado à preservação da liderança tecnológica do Japão
no campo econômico (MAN, 2007). Do ponto de vista prático, essa política externa atribuía ao Japão
um maior papel regional e global, e esse cenário trouxe dificuldades para as relações com a China.
No plano geopolítico, foi nesse período que o Japão adquiriu o sistema de escudo antimísseis
dos EUA. Apesar de a alegação ser a ameaça norte-coreana, gerou desconfianças em Pequim.
Segundo APCSS (2003, p. 4),
34
Tradução nossa. Excerto original: “(1) achieving structural power, (2) preserving national tranquility, e (3) maintaining
Japan’s economic competitiveness” (MAN, 2007, p. 117).
42
japonesa. A paciência dos japoneses com as opiniões chinesas está
diminuindo há algum tempo. Teste de mísseis M-9 feitos pela China na
direção de Taiwan durante a crise através do Estreito de 1996 alarmou
muitos japoneses sobre as intenções chinesas na região. [...] Os analistas de
defesa japoneses também são rápidos em apontar que a China começou a
modernizar seu arsenal de mísseis muito antes de o Japão se interessar
seriamente pelo BMD e que seu envolvimento na proliferação de armas
contribuiu para a atual crise na península coreana, deixando pouco espaço
para fazer exigências relativas à política de defesa do Japão. 35
Isso quer dizer que a mudança no status quo no balanço estratégico gerou insegurança na
relação bilateral. A despeito das possíveis intenções por trás da adoção do escudo antimísseis, o
Japão se colocava em um novo patamar no balanço regional. Um exemplo dessa postura é a
declaração conjunta do Comitê Consultivo de Segurança EUA-Japão de 2005, na qual, pela
primeira vez, Japão citava Taiwan como um objetivo estratégico comum com os EUA (MOFA,
2005). Com o crescimento chinês, e a percepção chinesa de que Pequim estava sendo cercada
no entorno regional, houve dificuldades para que a tendência de cooperação prevalecesse na
primeira metade da década.
A política externa chinesa para o Leste asiático no período estava assentada na defesa da
cooperação regional. Segundo Lida (2021), Wen Jiabao, ex-primeiro-ministro chinês, propunha
que a Asean +3 adotasse cinco passos: i) fortalecer o planejamento estratégico por meio de uma
segunda Declaração Conjunta sobre Cooperação no Leste Asiático; ii) aprofundar a cooperação
econômica, comercial e financeira; nesse sentido, chegou a mencionar a possibilidade de criação de
uma área de livre comércio no Leste asiático e o fortalecimento da Iniciativa Chiang Mai; iii)
aumentar a cooperação em temas de segurança, como terrorismo, crimes transnacionais e desastres
naturais; iv) ampliar a cooperação social e cultural e a busca pela redução da pobreza; e v) aumentar
a cooperação em saúde pública.
35
Tradução nossa. Excerto original: “One of the major criticisms of BMD in Japan has been the possible negative impact
deploying such a system would have on Japan’s relationship with China and other countries in the region. China began
expressing its opposition to a joint U.S.-Japan missile defense plan in 1995. Foremost among Chinese concerns is that BMD
deployment in Japan could weaken China’s limited nuclear deterrent by minimizing its effectiveness against the United
States. The Chinese government has argued that this will force it to expand and modernize its own nuclear arsenal in order
to overcome a BMD system. Another Chinese fear is that a mobile SMD system deployed by Japan could be used to defend
Taiwan and therefore increase Japanese influence over Taiwan, while buttressing Taiwan’s desire for independence. The
Chinese also believe that BMD in Japan could act as a shield for early-stage development of Japan’s own nuclear capability.
Japanese patience with Chinese views has been on the wane for some time. China’s test firing of M-9 missiles in the direction
of Taiwan during the cross-straits crisis of 1996 alarmed many Japanese about Chinese intentions in the region. […] Japanese
defense analysts are also quick to point out that China had begun modernizing its missile arsenal long before Japan took a
serious interest in BMD and that its involvement in weapons proliferation has contributed to the current crisis on the Korean
peninsula, leaving it little room to make demands regarding Japan’s defense policy (APCSS, 2003, p. 4).
43
Em outros termos, o balanço do período Koizumi é que o movimento japonês em direção a
um maior protagonismo na região acabou gerando alguns atritos nas relações bilaterais. A origem
dessa intenção japonesa é a percepção de que o Japão havia perdido poder relativo na região (BUSH,
2009). Importa destacar que o Japão procurou se aproximar de outros atores regionais, como a
Índia, por exemplo, para não se isolar na região.
Em 2006, Koizumi deixou o cargo de primeiro-ministro, então Shinzo Abe assumiu o
governo e procurou reorientar as relações com a China. Os governos subsequentes – Yasuo Fukuda
e Taro Aso – também procuraram reaproximar-se de Pequim. Em 2008, Fukuda e Hu Jintao
lançaram uma declaração conjunta “sobre a promoção abrangente de um relacionamento
mutuamente benéfico com base em interesses estratégicos comuns”. Segundo Mofa (2008a), o
Japão e a China declararam que
44
Com relação à questão de Taiwan, o lado japonês expressou novamente
sua adesão à posição enunciada no Comunicado Conjunto do Governo do
Japão e do Governo da República Popular da China 36 (MOFA, 2008a).
36
Tradução nossa. Excerto original: “The two sides resolved to comprehensively promote a ‘mutually beneficial relationship
based on common strategic interests’ and to achieve the noble objectives of peaceful coexistence, friendship for generations,
mutually beneficial cooperation, and common development for their two nations. […]. 1) The Japanese side expressed its
positive evaluation of the fact that China's development since the start of reform and open policy, saying China's development
has offered great opportunities for the international community including Japan. The Japanese side stated its support of China's
resolve to contribute to the building of a world that fosters lasting peace and common prosperity. (2) The Chinese side
expressed its positive evaluation of Japan's consistent pursuit of the path of a peaceful country and Japan's contribution to the
peace and stability of the world through peaceful means over more than sixty years since World War. The two sides agreed to
strengthen dialogue and communication on the issue of United Nations reform and to work toward enhancing common
understanding with each other on this matter. The Chinese side attaches importance to Japan's position and role in the United
Nations and desires Japan to play an even greater constructive role in the international community. […] Regarding the Taiwan
issue, the Japanese side again expressed its adherence to the position enunciated in the Joint Communique of the Government
of Japan and the Government of the People's Republic of China” (MOFA, 2008).
37
Oriundo de uma linhagem política que remonta à restauração Meiji, Hatoyama fundou o Partido Democrático do Japão
(PDJ). Entre outras pautas, Hatoyama defendia: descentralização do poder político, maior distribuição de renda e políticas
de benefícios sociais. O mote do seu governo era o Yu-Ai – fraternidade – pensado como uma terceira via à polarização na
política japonesa, um ponto de equilíbrio entre liberdade e igualdade (KOPPER, 2009).
45
Desse modo, como decorrência dessa perspectiva, Hatoyama sugeriu a criação da
Comunidade do Leste Asiático, que incluía o Japão, a Coreia do Sul e a China. Apesar do ímpeto,
o projeto de integração não avançou (HOSHIRO, 2015), e o insucesso do projeto se deve a
múltiplos fatores: domésticos, regionais e globais.
No âmbito doméstico, a possibilidade de integração com os vizinhos gerou reações de setores
econômicos que temiam ser prejudicados com a competição e políticos que mantêm postura anti-
China. Na esfera regional, alguns incidentes geraram animosidades regionais, como o afundamento
da corveta Cheonan 38em 2010. Embora não tenha envolvido diretamente o Japão, isso contribuiu
para que a confiança mútua na região fosse abalada e fortaleceu a perspectiva de que a presença
militar americana era crucial para a estabilidade regional. Além desses fatores, em 2010, houve um
incidente envolvendo duas embarcações nas ilhas Senkaku/Diaoyu: uma embarcação chinesa
colidiu com uma embarcação da guarda costeira japonesa, o que provocou atritos diplomáticos
entre a China e o Japão 39. As ilhas são objeto de disputa histórica entre os dois vizinhos. Esses
elementos se conectam com a dimensão global do fracasso da Comunidade do Leste Asiático.
Do ponto de vista global, a ideia da Comunidade do Leste Asiático gerou reações por parte
de Washington, e essa contrariedade se manifestou, principalmente, pela disputa sobre as bases
americanas em Okinawa. Uma das promessas de Hatoyama era a saída das bases americanas de
Okinawa, porém as negociações fracassaram. Com isso, Hatoyama perdeu capital político e acabou
renunciando em 2010. Embora o PDJ tenha continuado no poder, o contexto político pró-
integração perdeu força dentro do Japão. Essa situação se agravou com o tsunami e o acidente
nuclear de Fukushima em 2011.40
A partir de 2012, as relações bilaterais entraram em uma nova fase. No Japão, Shinzo Abe
(2012-2020), do PLD, retornou ao cargo de primeiro-ministro. Na China, Xi Jinping (2012-), de
uma ala mais conservadora que a de Hu Jintao, chegou ao poder com uma nova postura e reorientou
a inserção internacional da China. Após um período em que houve avanços na possibilidade de
integração regional, as relações entre Tóquio e Pequim recrudesceram. Nesse cenário, as disputas
sobre as ilhas Senkaku/Diaoyu ganharam novo ímpeto. Cabe destacar que essa tendência
conflituosa estava inserida em um contexto de reordenamento da política externa dos EUA.
Washington adotou a política de rebalanceamento da China, a qual previa o estabelecimento do
pivô asiático, e isso incluía medidas econômicas, políticas e securitárias.
38
Em 2010, a corveta sul-coreana Cheonan foi afundada. Investigações conduzidas pela Coreia do Sul e pelos EUA atribuíram
a culpa à Coreia do Norte, enquanto uma investigação conduzida pela Rússia e pela China alegou que a corveta havia colidido
com uma mina subaquática sul-coreana. Esse incidente fortaleceu os discursos mais conservadores na região.
39
O Japão prendeu a tripulação e o capitão do barco chinês. Isso gerou reações em Pequim, que embargou a venda de
minerais de terras raras ao Japão em resposta.
40
Após o terremoto, um tsunami de 15 metros desativou o fornecimento de energia e o resfriamento de três reatores em
Fukushima, o que causou um acidente nuclear que começou em 11 de março de 2011. Todos os três núcleos derreteram
nos primeiros três dias, e o acidente foi classificado como nível 7 na Escala Internacional de Eventos Nucleares e
Radiológicos (WORLD NUCLEAR ASSOCIATION, 2021).
46
Como efeito desse novo quadro de competição regional, as tensões ganharam nova dimensão
em 2013. Em novembro, a China anunciou o estabelecimento da East China Sea Air Defense
Identification Zone (ECS Adiz), isto é, Zona de Identificação de Defesa Aérea no Mar da China
Oriental. Segundo Rinehart e Elias (2015),
Como pode ser observado na figura abaixo, a ECS Adiz se sobrepunha às demais zonas dos
países vizinhos, mas o Japão, a Coreia do Sul, os EUA e outros países protestaram contra o anúncio
(RINEHART; ELIAS, 2015).
41
Tradução nossa. Excerto original: “The ECS Adiz asserted coverage of the airspace over the Senkaku Islands, which are
administered by Japan and claimed by the PRC as the Diaoyu Islands and by Taiwan as the Diaoyutai Islands. In addition,
the PRC’s ECS Adiz asserted coverage of the airspace over a submerged rock over which the Republic of Korea (ROK) asserts
administration and on which it built an ocean research station, a rock that the ROK calls Ieodo and the PRC calls Suyan
Rock. Moreover, the ECS Adiz overlaps with the existing Adizs of Japan, ROK, and Taiwan. Furthermore, the PRC Ministry of
National Defense (MND) issued rules for the ECS Adiz that apply generally to aircraft flying in the ECS Adiz, regardless of
whether the aircraft intends to enter the PRC’s airspace” (RINEHART; ELIAS, 2015, p. 7).
47
Figura 3 – Zonas de Identificação Aérea no Mar da China Oriental
Em 2014, como decorrência da Adiz, houve um incidente entre a força aérea do Japão e a
da China. Caças chineses voaram próximos a aviões de reconhecimento do Japão. As ações foram
consideradas agressivas pelo governo do Japão. A despeito dos detalhes de cada incidente, eles
demonstram que a percepção mútua de ameaça ampliou a agressividade de ambos os lados e
minou o diálogo entre os dois vizinhos. Cabe destacar que os atritos entre eles não impediram
que houvesse cooperação econômica.
Como o balanço das relações político-diplomáticas e securitárias demonstra, há muitas
variações nos padrões de cooperação e conflito entre a China e o Japão ao longo do tempo. A
observação das interações entre os dois países vizinhos evidencia que as dinâmicas locais se misturam
às dinâmicas globais de poder. Afinal, trata-se de duas grandes potências com grande potencial
econômico e militar. Em 2019, por exemplo, segundo o IISS (2020), o Japão era o oitavo país com
o maior gasto militar no planeta, com cerca de US$ 48,6 bilhões, e a China era o segundo maior
gasto em defesa do mundo, com cerca de US$ 181,1 bilhões.
48
No campo da segurança e defesa, alguns pontos têm dominado a agenda externa dos dois
países. A modernização das forças armadas chinesas tem mobilizado a preparação e a adequação das
capacidades defensivas dos vizinhos. À medida que a marinha da China expandiu a sua capacidade,
muitos países, incluindo o Japão, têm procurado melhorar os seus sistemas de vigilância no âmbito
das Japan Self-Defense Forces (JSDF), Forças de Autodefesa do Japão (IISS, 2020).
42
Tradução nossa. Excerto original: “The latest revision of the NDPG took place against the background of North Korea’s
ongoing development of its nuclear and missile programmes, China’s continuing military modernisation and Sino- Japanese
tensions in the East China Sea. Moreover, in the face of the Trump administration’s approach to alliance relations, Japan has
felt obliged to demonstrate yet greater commitment to supporting the United States’ military presence in the region. There
have also been more purchases of US defence equipment. The NDPG is notable for its emphasis on the development of a
‘multidimensional joint defence force’. Previous iterations had designated the JSDF as first a ‘dynamic’ and then a ‘joint dynamic’
force. The latest NDPG stresses the need for ‘cross-domain’ JSDF operations not only in the land, sea, and air domains but also
in space and in the electromagnetic spectrum, including cyber operations and electronic warfare. […] The MTDP highlighted
Japan’s decision to procure from the US an additional 63 F-35A combat aircraft for the Japan Air Self-Defense Force (Jasdf) and,
for the first time, 42 F-35Bs for the Japan Maritime Self-Defense Force (JMSDF). Tokyo is looking to acquire 147 F-35s in total,
making it the second-largest operator of the aircraft after the US. The MTDP also provides for the JASDF’s procurement of long-
range air-to-surface stand-off missiles to assist in defending offshore islands” (IISS, 2020, p. 239).
49
Essa tendência de recrudescimento das relações regionais tem levado o Japão a ampliar a sua
presença nas ilhas mais distantes. O mapa abaixo apresenta a presença do Japão nas ilhas no Mar
da China Oriental, e a presença nesses espaços geopolíticos indica a preocupação japonesa com a
possibilidade de incidentes ligados a disputas territoriais nessa região.
Além dessas ações no âmbito dos seus territórios, outra iniciativa japonesa tem sido aumentar
a cooperação com os países vizinhos. Desse modo, Tóquio tem transferido equipamentos militares
para países da Asean, incluindo aviões e helicópteros. Além disso, por meio da ODA, tem
assegurado a transferência de equipamentos para guarda costeira de países como Indonésia, Malásia,
Filipinas e Vietnã (IISS, 2020). Ou seja, as ações do Japão expressam a sua preocupação com a
situação no Mar do Sul da China, onde Pequim tem interesses territoriais.
Esta unidade tratou das relações político-diplomáticas e securitárias entre a China e o Japão,
gigantes em termos de recursos e capacidades materiais, que compartilham históricas relações
bilaterais, e esse quadro torna a análise das relações bilaterais bastante complexa. Apesar disso,
algumas tendências se verificam no período pós-Guerra Fria.
50
As relações bilaterais têm sido marcadas por ciclos de oscilação nos padrões de cooperação e
conflito. Ao contrário do que aconteceu em períodos anteriores, como nas duas últimas décadas da
Guerra Fria, quando as relações foram melhorando progressivamente, no pós-Guerra Fria, as
relações bilaterais oscilaram entre momentos de grande aproximação e concertação e outros de
elevação das tensões.
Esse quadro deriva de dois fatores principais. O primeiro é que a ordem internacional se
alterou muito desde a queda da URSS. O momento unipolar dos EUA foi acompanhando de
muitas instabilidades no sistema internacional. O comportamento vacilante de Washington levou
os países do Leste asiático a adaptar as suas estratégias a cada mudança na política externa dos EUA.
Nesse contexto, o regionalismo asiático foi utilizado como um mecanismo de proteção diante das
adversidades oriundas da conjuntura internacional. Por outro lado, a pressão de Washington sobre
a China contribuiu para que houvesse maior competição entre Pequim e Tóquio.
O segundo fator é o crescimento chinês. A ascensão da China é um processo que transforma as
relações regionais. O vertiginoso crescimento econômico tornou Pequim um polo gravitacional na
economia asiática. Além disso, esse processo foi acompanhado de modernização das suas forças armadas.
Desse modo, a percepção de que Pequim é uma ameaça aumentou as desconfianças mútuas, o que levou
a atritos entre os dois países e tem sido um elemento que acirrou as relações de cooperação entre a China
e o Japão. Apesar disso, por compartilharem o mesmo espaço geográfico e terem relações históricas, a
cooperação nunca deixou de acontecer, mesmo com as oscilações mencionadas.
Relações econômicas
Após a breve contextualização dos antecedentes históricos e do âmbito político-diplomático
e securitário das relações Tóquio-Pequim, esta unidade apresenta alguns dos aspectos mais
importantes das conexões econômicas, de significativo peso para o relacionamento bilateral e para
a formulação de política externa japonesa. Após a normalização das relações diplomáticas Japão-
China, uma série de acordos oficiais foi firmada, no campo do comércio, da aviação civil, do
transporte marítimo e da pesca, visando regular as relações bilaterais também no âmbito econômico.
O mais notável entre esses foi o Acordo de Comércio de Longo Prazo – Long-Term Trade Agreement
–, assinado em 1978. Conforme a China se abria economicamente, diminuía a importância desse
acordo para o relacionamento bilateral. A força de mercado baseada nas vantagens comparativas
dos dois países se tornou o maior condutor por trás do rápido crescimento do comércio entre o
Japão e a China desde os anos 1990 (CHIANG, 2019).
Uma das principais características da política econômica do Leste asiático desde os anos 1990
é a sobreposição da ascensão chinesa e da estagnação econômica do Japão. Com o passar dos anos,
o Japão e a China trocaram as suas posições como superpotência econômica regional, e tal
fenômeno marca uma nova era nas relações entre Tóquio e Pequim.
51
Por aproximadamente um século e meio, o Japão encontrava uma China fragilizada por derrotas
militares, pelo colapso do seu sistema dinástico, por guerras civis e pelas consequências dos seus projetos
internos, como a Revolução Cultural. 43 Em contraste, durante esse mesmo tempo, o Japão embarcava
em um período de rápida modernização e, desde Era Meiji, forjou um império, iniciou o seu processo
de reconstrução após a derrota na II Guerra Mundial e emergiu como o líder da chamada “revoada dos
gansos”, padrão de desenvolvimento econômico do Leste asiático pós-Guerra. As transformações
estruturais dos anos 1990, contudo, impactaram e alteraram esses padrões. A ascensão chinesa alterou o
modelo da revoada dos gansos, que tinha o Japão como centro (LAM, 2006).
O modelo da revoada dos gansos explica que, conduzidos pela difusão internacional de
tecnologia, um país em desenvolvimento aprimora as suas estruturas industriais e de exportação, ao
passo que transfere as suas indústrias obsoletas para países sucessores. O Japão representava o líder
desse modelo, seguido pelo próximo escalão de Novos Países Industrializados (NPI), como Coreia
do Sul, Taiwan, Hong Kong e Singapura, que por sua vez são seguidos pelo próximo grupo, que
inclui a Tailândia, a Malásia, as Filipinas e a Indonésia, frequentemente vistos como parte da cadeia
de produção japonesa (LAM, 2006).
Embora os períodos de distanciamento político tenham contribuído para que novos acordos
bilaterais no âmbito econômico não fossem formalizados nas últimas décadas, o peso do fator
econômico no relacionamento bilateral é inegável. O desenvolvimento das relações econômicas
entre os dois países não está, nesse sentido, sustentado por acordos formais, o que não impediu o
desempenho das trocas comerciais bilaterais de superar a média mundial, bem como o desempenho
médio das exportações e importações do Japão e, também, a performance média das importações
chinesas (ARMSTRONG, 2012).
Entre os aspectos decisivos para o relacionamento, destaca-se o comprometimento com as
regras e as normas do sistema institucional internacional representado pela Organização Mundial
do Comércio (OMC). Tal comprometimento restringiu os efeitos de tensões político-securitárias
bilaterais e proveu a fundação sob a qual se deu o significativo crescimento das relações econômicas
entre o Japão e a China dentro do sistema multilateral de comércio (ARMSTRONG, 2012).
A admissão da China à OMC em 2001, após 15 anos de negociações, trouxe amplos e
profundos efeitos para o comércio internacional, para as trocas entre Tóquio e Pequim e também
para os investimentos japoneses na China. Ainda durante a década anterior, a crescente
complementaridade comercial entre os dois países era estabelecida, com o crescimento em 30,9%
do intercâmbio total em 1993. No mesmo ano, o Investimento Externo Direto (IED) japonês na
China foi de US$ 1.691 milhões, o que representa valor superior ao total investido durante todo o
período entre 1951 e 1987 (OLIVEIRA, 1995).
43
A Revolução Cultural resultou no retorno de Mao Zedong à posição central do poder na China, depois de uma década de
conflitos sociopolíticos violentos e expulsões de revisionistas e opositores do pensamento maoista.
52
Desde a normalização das relações diplomáticas entre os países em 1972, a economia japonesa
avançou rapidamente durante os primeiros 20 anos, até que as posições passaram a se inverter, com
a economia chinesa notavelmente ascendendo durante as três décadas seguintes. A partir dos anos
2000, as posições relativas em termos econômicos do Japão e da China sofreram inflexões. Entre
1980 e 2013, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês deixou de representar 27,9% do PIB japonês,
passando a figurar 1,87 vez maior que o PIB do Japão. Ao mesmo tempo, enquanto a participação
japonesa no comércio mundial decresceu, a participação da China cresceu significativamente, em
contraste com a queda na dependência da China na economia japonesa. O comércio do Japão com
a China cresceu exponencialmente, sendo que, em 2003, o valor das importações japonesas
provenientes da China ultrapassou o valor das importações vindas dos EUA (KWAN, 2014). Os
gráficos a seguir ajudam a ilustrar esses fenômenos.
53
Gráfico 4 – Transformação no quadro de dependência econômica do Japão e da China no
comércio bilateral
Fonte: Kwan (2014) com base em dados do Ministério das Finanças da República Popular da China
54
nos últimos anos, mais notadamente, em um primeiro momento, por meio de fusões e aquisições,
como demonstrado pela aquisição da NEC Corporation pelo Lenovo Group Ltd., por exemplo. O
investimento direto é uma ferramenta efetiva para as empresas chinesas adquirirem tecnologia e
marcas, além de oferecer vantagens às empresas japonesas, conforme promovem apoio financeiro e
um ponto de apoio no mercado de rápido crescimento da China (KWAN, 2014).
Desde o início dos anos 1990, o desenvolvimento das relações de comércio Japão-China foi,
em grande parte, conduzido por empresas japonesas com investimento na China, as quais exportavam
bens de consumo para o Japão após o processo de manufatura na China. Ao mesmo tempo, adquiriam
bens de capital e componentes-chave japoneses, o que, por sua vez, constituía parte significante das
importações chinesas provenientes daquele país. O Japão apresenta um déficit comercial com a China
desde 1988, que, por sua vez, cresceu rapidamente de US$ 0,3 bilhões em 1988 até o seu pico de
US$ 51 bilhões em 2013 e, desacelerou para US$ 30 bilhões em 2018 (CHIANG, 2019). O gráfico
a seguir ilustra a evolução da balança comercial do Japão com a China entre 1998 e 2018.
55
(marketing, vendas e serviços de pós-venda) com alto valor agregado. A maior vantagem da China,
por sua vez, encontra-se no processo de fabricação e montagem. O avanço complementar, no
entanto, principalmente no curto prazo, depende do sucesso do relacionamento político-
diplomático-securitário (KWAN, 2014).
Após a primeira década e meia do século XXI, porém, os laços econômicos entre os dois países
passaram a apresentar enfraquecimento. De acordo com informações da Japan External Trade
Organization (Jetro), os investimentos japoneses na China declinaram gradualmente após o pico
em 2012 (US$ 13 bilhões) para US$ 10,8 bilhões em 2018. No mesmo sentido, estatísticas oficiais
do governo chinês indicam que o IED proveniente do Japão reduziu, de quase US$ 20 bilhões em
2013 para US$ 9,8 bilhões em 2018. A participação do IED japonês na China, que representava
8% em 1995, foi reduzida para 3% em 2008. O intercâmbio comercial total também declinou de
US$ 345 bilhões em 2011 para US$ 270 bilhões em 2016, com um leve incremento em 2018, para
US$ 317 bilhões. A queda também é visível em termos de turistas japoneses na China, que declinou
de 3,7 milhões de pessoas em 2011 para 2,7 milhões em 2018. A mesma tendência, contudo, não
é observada nas visitas provenientes da China, que seguem representando uma parte importante do
setor de turismo japonês (CHIANG, 2019).
As transformações no ambiente geopolítico tiveram efeitos econômicos para além das reações
de curto prazo dos mercados, explicando a desaceleração nas trocas bilaterais. Como exemplo,
menciona-se o boicote chinês aos produtos japoneses após disputas territoriais em 2012, que
impactaram negativamente as vendas de marcas do Japão, principalmente no setor de eletrônicos e
automóveis (CHIANG, 2019).
Considerando a já mencionada estrutura político-econômica do Leste asiático – que
dependeu dos insumos industriais japoneses e do aparato securitário dos EUA e que se encontra
atualmente em transformação, a partir da emergência chinesa –, mudanças na relação Japão-China
não apenas apresentam implicações profundas para a região, mas também para a estrutura global
de poder (CHIANG, 2019).
Em 2010, o PIB chinês ultrapassou o japonês, passando a ocupar a segunda posição mundial,
atrás dos EUA. Já em 2018, o PIB japonês correspondia a 34% do PIB chinês. Embora o Japão se
mantenha na liderança do fornecimento de produtos de alta tecnologia às economias regionais, os
avanços da China em direção a produtos de maior valor tecnológico agregado e manufaturas de
ponta fazem com que as exportações de produtos japoneses de médio ou baixo nível tecnológico
enfrentem maior competição (CHIANG, 2019).
Em função dos baixos custos, da proximidade geográfica e da apreciação do iene, a China se
tornou muito atrativa aos empresários japoneses, que por sua vez realocaram a sua produção
manufatureira intensiva em mão de obra ao país. Acrescente-se que as liberalizações econômicas
que seguiram a entrada da China na OMC em 2001 promoveram significativo aumento de
investimentos de origem japonesa (CHIANG, 2019). A imagem abaixo ilustra a evolução dos
investimentos japoneses na China entre 1998 e 2018.
56
Gráfico 6 – Investimento do Japão na China (1998-2018)
44
A Apec remete principalmente ao âmbito econômico e incorpora o projeto globalista norte-americano, que prevê a
disseminação de normas e valores neoliberais, de livre mercado e da democracia liberal.
45
O Fórum Regional da Asean foi o primeiro corpo institucional multilateral a endereçar a agenda securitária asiática, de forma
a atenuar o peso das alianças bilaterais, promovendo confiança, diálogo e prevenindo conflitos entre os atores regionais.
57
Além da cooperação regional em desenvolvimento infraestrutural, o Japão e a China estão
envolvidos em cooperações econômicas regionais, como a Parceria Regional Econômica Abrangente
– em inglês, Regional Comprehensive Economic Partnership (RCEP) – e o Acordo de Livre Comércio
China-Japão-Coreia do Sul (CHIANG, 2019). O Japão aprovou em abril de 2021 a RCEP,
proposta de acordo de livre comércio entre os 10 Estados membros da Asean, isto é, Brunei,
Camboja, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Filipinas, Singapura, Tailândia e Vietnam, além de
Austrália, China, Nova Zelândia, República da Coreia e Japão (RCEP, 2019).
A interdependência econômica e securitária entre os dois países tornou altamente custosa uma
competição econômica e militar entre ambos. A tendência geral de aproximação foi acompanhada
por essa interdependência. O processo de aprofundamento da interdependência, contudo, não é
irreversível e depende das tensões nos demais âmbitos do relacionamento bilateral (SILVA, 2012).
Apesar do envolvimento em diversos mecanismos de cooperação econômica regional, a
profundidade das relações bilaterais de âmbito econômico entre o Japão e a China tem os limites, e os
avanços dependem de uma estável e confiável base política, o que encontra dificuldades em face de
divisões como os interesses geopolíticos entre a China e os EUA e também entre a China e o Japão.
58
O Diálogo a Seis é produto do esforço multilateral entre a China, os EUA, o Japão, a Rússia,
a República da Coreia (Coreia do Sul) e a República Popular Democrática da Coreia (Coreia do
Norte), na busca por soluções pacíficas para os impasses envolvendo o programa nuclear norte-
coreano. Ao longo das negociações, a China e o Japão utilizaram a arena para consolidar as suas
imagens externas de atores responsáveis. Diferente da China, que liderou e mediou a concertação,
o Japão adotou um baixo perfil de atuação, chamando a atenção principalmente para um caso de
abduções de cidadãos japoneses pela Coreia do Norte, tema que há muitos anos também permeia
a “questão coreana” para o Japão (LEE, 2010). Não reverberando resultados concretos, o diálogo
multilateral foi em grande parte descontinuado em 2009.
O avanço no desenvolvimento do programa nuclear norte-coreano representa uma das
grandes questões que balizam o relacionamento Japão-China. Situado na linha de frente da rede de
aliados dos EUA e anfitrião de parte das forças norte-americanas na Ásia, o Japão se encontra em
posição de vulnerabilidade nos momentos de tensão e deseja evitar a escalada das hostilidades entre
a Coreia do Norte e os EUA (TEO, 2019).
A Coreia do Norte representa uma espécie de amortecedor geográfico principalmente à
influência dos seus vizinhos e aliados norte-americanos no Nordeste asiático, segundo a avaliação da
China, que lutou a favor dos norte-coreanos durante a Guerra da Coreia (1950-1953). A existência
de um programa nuclear, no entanto, não é aprovada por Pequim, que tende a preferir a manutenção
do status quo na península – quer dizer, evitar avanços nucleares subsequentes – inclusive pelos
possíveis efeitos de fortalecimento sobre a pauta de remilitarização no Japão e na Coreia do Sul.
Dificultando a aproximação do Japão com as duas Coreias se encontra a histórica
animosidade proveniente do legado do período colonial japonês sob a península coreana, bem como
a percepção sobre a responsabilidade do Japão em relação às ambições de unificação e independência
coreana ao criar condições para a divisão da península em 1945. O sentimento antijaponês
contribuiu para o nacionalismo tanto no norte quanto no sul da península (HOOK, 2011).
O Japão, por sua vez, como um dos líderes da ordem internacional liberal e entre os principais
aliados norte-americanos, condena o seu desenvolvimento nuclear. Historicamente, o
relacionamento Japão-Coreia do Norte – assim como no caso das relações entre as duas Coreias –
apesar de ensaiar períodos de maior normalização, apresenta poucos avanços significativos. Além
disso, os testes de mísseis balísticos realizados pelos norte-coreanos no Mar do Japão,
principalmente a partir dos anos 2000, prejudicaram consideravelmente o relacionamento bilateral.
A Coreia do Norte permanece sendo o único Estado com o qual o Japão não mantém relações
diplomáticas, sendo que avanços nesse sentido dependem do diálogo e de subsequentes
normalizações entre Washington e Pyongyang. Diferentemente da tendência de evolução, ainda
que com flutuações, das relações com a Coreia do Sul, os laços japoneses com a Coreia do Norte se
deterioram ainda mais no século XXI (HOOK, 2011).
59
Tanto o Japão quanto a China temem os riscos da proliferação nuclear e almejam a estabilização
das tensões na península, concordando com as resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU)
que impõem sanções a Pyongyang. Os dois países diferem, porém, quanto à proposição de soluções,
uma vez que Pequim alerta sobre a necessidade de promover a desnuclearização da península coreana
como um todo; e Tóquio defende o desmantelamento unilateral do programa nuclear norte-
coreano. Como potências regionais, o Japão e a China almejam evitar escalonamentos militares e
ingerências externas que alterem o status quo no Nordeste asiático.
O desenvolvimento conjunto, entre o Japão e os EUA, do sistema Theatre Missile Defense
(TMD) desde 2003, a partir da percepção da Coreia Norte como uma ameaça securitária direta
ao Japão, porém, não é um ponto de convergência entre o Japão e a China. A preocupação chinesa
está atrelada ao fato de que tal sistema tenha a capacidade de tornar obsoleto o seu reduzido
número de armas nucleares, instrumento de dissuasão de Pequim contra atos separatistas em
Taiwan (LAM, 2017).
As negociações realizadas em 2018 e 2019 entre o líder norte-coreano Kim Jong Un e o
presidente Donald Trump foram recebidas com surpresa pelo Japão, que esperava ter sido
previamente consultado, de forma a garantir que os seus interesses fossem levados em consideração
caso um acordo fosse alcançado. O Japão também prefere que as negociações sejam feitas a partir
de uma frente unida e coesa, de forma a resolver os problemas entre os principais atores regionais,
sem privilegiar os interesses de um país sobre os demais em um tema sensível. Para ele, por exemplo,
apenas a desativação dos mísseis de longo-alcance e o fim dos testes nucleares não são resultados
suficientes, pois ainda deixariam o país dentro da faixa de alcance dos mísseis norte-coreanos de
curso e médio alcance (TEO, 2019).
No Japão, episódios de aumento das tensões trazem à tona questões mais amplas e
importantes sobre a política externa japonesa de forma geral e, em particular, sobre a aliança com
os EUA. Entre as principais questões, ressalta-se o nível de autonomia japonês ao depender
inteiramente do aparato de segurança norte-americano e até que ponto os interesses e as soluções
para os problemas securitários dos EUA são necessariamente convergentes com as preocupações
japonesas. Outros pontos de reflexão envolvem o custo, em termos de cálculos financeiros e também
de flexibilidade diplomática; oportunidades políticas; orgulho nacional e progresso democrático. As
problematizações crescem junto com as rápidas transformações do ambiente estratégico, em que as
questões securitárias nem sempre são claramente definidas (TEO, 2019).
60
Situação de Taiwan e relações Japão-China
Desde a normalização das relações bilaterais entre a China e o Japão, um dos tópicos
prioritários é a situação de Taiwan. Após a derrota do Japão em 1945, Tóquio cedeu o controle de
Taiwan, que havia sido conquistada pelos japoneses em 1894, porém não se definiu como seria a
situação política da ilha. Esse contexto foi alterado em 1949, quando a Guerra Civil mudou o status
quo político da China e se passou a discutir se a ilha deveria ser independente ou retornar ao controle
da China continental. As relações da ilha com Tóquio foram consolidadas pelo domínio japonês ao
longo da primeira metade do século XX. Desse modo, relações econômicas, políticas e sociais
profundas entre Taipei e o Japão foram forjadas.
Desde a revolução comunista na China em 1949, Taiwan se tornou uma prioridade para
Pequim. Como resultado da guerra civil, 2 milhões de membros do Guomindang, o Partido
Nacionalista Chinês, fugiram para a ilha de Formosa, dando início ao impasse entre Taipei e
Pequim. O PCCh tentou reintegrar esse território, que possuía uma posição geoestratégica
fundamental para a defesa do continente. Em termos históricos, a ilha de Taiwan foi utilizada como
base de apoio para ataque ao território continental da China, bem como para bombardeios sobre o
país durante a II Guerra Mundial (VISENTINI et al., 2013; KAPLAN, 2014).
Ao longo da Guerra Fria, Taiwan se tornou um dos palcos geoestratégicos prioritários no
Leste asiático. A I Crise do Estreito ocorreu em 1954, após Jiang Jieshi ordenar o envio de 73 mil
homens para as ilhas de Jinmen (Kinmen ou Quemoy) e Mazu (Matsu) e a RPC bombardear as
ilhas em resposta (PIKE, 2010; SILVA, 2015). Em dezembro do mesmo ano, Taipei e Washington
assinaram um Tratado de Defesa Mútua, em caso de ataque de Pequim às ilhas de Taiwan e Penghu,
localizada ao sul. Dessa forma, o ataque das forças continentais a Jinmen e Mazu prosseguiu no
início de 1955. Contudo, a partir da ameaça de uso de armas nucleares e, diante da falta de apoio
soviético, a China optou por recuar (VISENTINI et al., 2013; PIKE, 2010; SILVA, 2015).
Portanto Taiwan se integrou ao eixo de segurança no Leste asiático, compondo com o Japão e a
Coreia do Sul parte do triângulo defensivo dos EUA.
Em 1958, ocorreu a segunda crise do estreito. Em grande medida, a segunda crise foi uma
decorrência da primeira. Em 1957, como resposta à primeira crise, os EUA enviaram um esquadrão
de mísseis Matador para Taiwan (VISENTINI et al., 2013). A China continental temia que o
governo do Guomindang pudesse utilizar os mísseis de modo independente contra o governo
comunista. A partir dessa alegação, a RPC bombardeou Jinmen e Mazu novamente. Os EUA
intervieram na crise e ameaçaram utilizar armas nucleares contra Pequim. Nesse período, embora
integrado à defesa do Leste asiático, não foi um protagonista na resolução da crise.
61
A terceira crise no estreito de Taiwan ocorreu entre 1995 e 1996 e resultou da mudança na
política interna da ilha. A possibilidade de eleição de Lee Teng-hui em 1996, contexto da pauta de
independência de Taiwan e a possibilidade de mudança da política de uma só China por parte de
Taiwan, fizeram Pequim reagir e buscar influenciar as eleições na ilha ao realizar exercícios militares
próximos ao estreito e testes nucleares entre 1995 e 1996. A terceira crise no estreito de Taiwan
(1995-1996) foi resultado da aproximação do governo Clinton (1993-2001) com Taiwan, que
incluiu a venda de 150 unidades do caça F-16.
Para o Japão, esse contexto implicou a maior aproximação com os EUA conduzida pelo
primeiro-ministro Hashimoto (1996-1998). A partir disso, Tóquio e Washington deram uma
declaração conjunta reafirmando a importância da presença militar americana para a estabilidade
da região e a necessidade de aprofundar a cooperação securitária entre os EUA e o Japão.
Apesar das boas relações com Taiwan, o Japão sempre procurou manter relações estáveis e
concertadas com a China acerca do tema. O respeito japonês à política de “Uma China”, que valida
a ideia de que Taiwan não é independente, tem sido um dos pilares das relações bilaterais desde a
década de 1970. Contudo existem pressões internas e externas para que o Japão mude essa política
em relação a Taiwan.
Do ponto de vista prático, Taiwan é um dos palcos para que se observe o status das relações
China-Japão. Isso se deve ao fato de que o Japão é um importante aliado dos EUA, cujo território
fica a menos de 150 km de Taiwan. Além disso, Tóquio é, depois dos EUA, o parceiro internacional
mais importante de Taiwan, e o Japão mantém vínculos extensos, mesmo que “não oficiais” com
Taipei desde 1972. Em outras palavras, a relação entre Tóquio e Taipei é um dos principais tópicos
das relações bilaterais entre a China e o Japão. Ademais, a discussão em torno da independência da
ilha, algo que é rechaçado por Pequim, tem sido um dos principais temas geopolíticos do Leste
asiático, por isso é um aspecto crucial para medir as interações entre a China e o Japão.
62
Considerações finais
Este módulo tratou das relações bilaterais entre a China e o Japão, e a análise das relações
bilaterais evidenciou que, tanto para Pequim, quanto para Tóquio, as interações são cruciais para a
inserção internacional dos dois países.
A milenar história de interações entre os dois povos demonstra ser impossível que os países não
priorizem um ao outro na construção das suas estratégias de inserção internacional. Apesar disso,
como decorrência do período de avanço japonês no entreguerras e o contexto pós-Guerra Fria, as
relações bilaterais não existiram de modo oficial até a década de 1970. Importa destacar que o contexto
de afastamento dos EUA do Leste asiático favoreceu a aproximação entre os dois vizinhos.
No período pós-Guerra Fria, as relações oscilaram muito entre períodos de cooperação e atrito.
Entretanto a interdependência econômica entre as duas economias se aprofundou no período analisado,
e, atualmente, ambos são atores mutuamente importantes nas suas pautas comerciais e de investimento.
A China e o Japão são potências regionais com grande poder de projeção para as demais
regiões do planeta, por isso, apesar da cooperação que existe entre os dois países, como foi visto, a
hipótese de competição esteve sempre presente. As disputas territoriais sobre as ilhas mostra isso.
Ademais, dois teatros demonstram que as relações podem caminhar para a competição: a situação
na península coreana e em Taiwan. Historicamente, tanto a península quanto Taiwan se
configuram como palcos das disputas entre Pequim e Tóquio.
Desse modo, observa-se que as relações com Pequim são cruciais para a inserção internacional
do Japão. Desde que a China passou a crescer vertiginosamente em termos econômicos, essa relação
foi reformada e, com isso, o Japão perdeu o posto de principal economia asiática e teve de lidar com
uma China que se reforçava em muitos setores. Portanto, pode-se dizer, a política externa e de
segurança do Japão é pautada, em grande medida, pelas relações com a China. Mais do que isso,
dada a importância e a capacidade dos dois países, o futuro dessas relações bilaterais contribui para
moldar, não só as relações regionais na Ásia, mas também o equilíbrio global de poder.
63
MÓDULO III – RELAÇÕES JAPÃO-BRASIL:
UMA PARCERIA ESTRATÉGICA
66
O Japão e o Brasil mantêm um mecanismo de consultas políticas bilaterais, estabelecido em 1989,
durante visita do então secretário-geral das Relações Exteriores brasileiro Paulo Tarso Flecha de Lima a
Tóquio. A primeira reunião sob a égide do mecanismo aconteceu em 1991 e foi reprisada nos anos
seguintes, apresentando queda na frequência das reuniões ao fim da década (VARGAS, 2017).
67
O relacionamento Japão-Brasil apresenta características pendulares de dinamização e
estagnação, conforme a conjuntura. Há intensificação da aproximação quando são identificados
interesses comuns, e estagnação quando a conjuntura não é favorável. Embora o âmbito econômico
seja um dos principais fatores para a aproximação, o relacionamento também pode adquirir novos
contornos por meio da ampliação do escopo político. Os dois países estão em busca de renovação
e de consolidação do seu status internacional. Nesse contexto, existem muitos campos de relevância
global com potencial para promover o diálogo bilateral e fortalecer a aproximação entre os países,
como a pauta ambiental, de energia renovável e o desenvolvimento sustentável (UEHARA, 2013).
Imigração
A imigração permeia historicamente o relacionamento Japão-Brasil e representa um dos seus
grandes marcos, havendo produzido legados visíveis à sociedade brasileira. Após o longo período de
isolamento japonês, a emigração representou um dos esforços do governo Meiji para amenizar tensões
sociais internas, entre elas o desemprego e o baixo nível de vida da população. Buscava-se também
expandir a atuação internacional do Japão, criando novos mercados para as suas exportações. Nesse
sentido, a expansão além-fronteiras dos interesses japoneses levou à busca pela aproximação com o
Brasil ao final do século XIX. Após o redirecionamento da emigração japonesa – inicialmente voltada
principalmente aos EUA, ao Canadá, à Austrália e ao México – para a América Latina, o Brasil e o
Peru, particularmente, tornaram-se grandes destinos (UEHARA, 2013). Nesse sentido,
68
O processo de transição de estruturas rurais e feudais para um Japão moderno, urbano e
industrial produzia sequelas e anomalias sociais. Problemas pelos quais as sociedades ocidentais
haviam passado durante os seus processos de formação eram igualmente vistos no cenário japonês,
entre eles a superpopulação nas cidades, a miséria urbana, o desemprego nos campos e nas cidades
em função da aplicação de novas técnicas que reduziam a demanda por mão de obra, etc. O
problema da superpopulação passou a ser uma das principais questões internas no Japão, ameaçando
causar convulsões sociais e prejudicar o desenvolvimento e a modernização do país. Entre os
projetos arquitetados para amenizar a situação, destaca-se o controle demográfico por meio da
emigração de mão de obra. Cabe ressaltar, ainda, o interesse japonês em criar áreas de influência
nas Américas, onde a influência dos EUA e da Inglaterra era historicamente maior. Dessa forma, a
emigração de mão de obra também funcionaria como meio de criar zonas de ocupação japonesa em
território americano (YAMAMURA, 1996).
Símbolo da imigração japonesa ao Brasil, em 18 de junho de 1908 chega ao porto de Santos o
navio Kasato Maru, trazendo a bordo 781 pessoas, fruto da convergência de interesses: demanda por
mão de obra no Brasil e política de emigração do Japão. A viagem foi financiada pelo governo de São
Paulo. A integração japonesa à sociedade brasileira se deu de forma lenta, especialmente considerando
o inicial objetivo de regressar ao Japão – realidade entre muitos dos primeiros imigrantes. Com o
tempo, o estado de São Paulo passou a exigir que os imigrantes viessem em família, aumentando o
grau de continuidade das futuras gerações japonesas em solo brasileiro (UEHARA, 2013).
A partir de 1925, o número de entradas cresceu, acompanhando uma política mais ativa do
governo japonês nos negócios associados à imigração no Brasil, em que há incremento do comércio,
injeção de investimentos e, também, o desenvolvimento de núcleos coloniais, partindo da premissa
de que a presença de famílias japonesas abriria caminho para a realização desses objetivos. Os
primeiros polos de fixação de imigrantes japoneses no País se concretizam por meio do incentivo à
saída das fazendas de café para outras regiões do estado de São Paulo. Ao se instalarem em áreas
pioneiras, ainda inexploradas, de baixo custo e próximas aos trilhos das ferrovias, os imigrantes
japoneses conseguiram ascender socialmente (SAKURAI, 1995).
As companhias de imigração japonesas, incentivando polos de produção agrícola nas mãos
de imigrantes japoneses, estabeleceram núcleos de colonização em algumas regiões do interior de
São Paulo, com terras compradas pelo governo japonês. Outras terras foram doadas pelo governo
paulista para incentivar o cultivo de arroz, café, açúcar e chá. Nesses núcleos foi mantido
maquinário para o beneficiamento do arroz, usinas de açúcar, escolas, consultórios médicos, além
de ter sido introduzida a produção de ovos de bicho-da-seda no Brasil. A presença dos japoneses
passa ser notada por benfeitorias como estradas de rodagem, construídas com recursos e
responsabilidade da companhia. Já os núcleos coloniais formados por iniciativa de lideranças locais,
contudo, desenvolveram-se de forma mais lenta, com menos recursos e sem planejamento prévio,
alcançando realizações mais modestas (SAKURAI, 1995).
69
Considerando os condicionantes internos do Japão e o fechamento de outras portas para a
imigração japonesa, o próprio governo japonês, em parceria com empresas privadas, promoveu uma
intensificação do fluxo migratório. As iniciativas japonesas, organizando-se por meio de um corpo
técnico experimentado, voltaram-se para a busca de novas oportunidades, entre as quais se destaca
o plantio e a exportação de algodão. Nesse contexto, a concentração de imigrantes japoneses nos
núcleos facilitou a manutenção das tradições culturais, a reprodução de formas de associativismo
próprias dos japoneses e a consolidação do importante papel desempenhado pelos pioneiros na
formação de uma segunda geração de japoneses no Brasil, a qual iniciou uma nova etapa na história
da imigração, em que foram sentidos os impactos da derrota do Japão na II Guerra Mundial,
resultando na quebra na trajetória até então desenvolvida e inaugurando a inserção urbana dos
japoneses, com menor presença das autoridades japonesas e ritmo de ascensão social menos
acelerado (SAKURAI, 1995).
Os mais de 6 milhões de japoneses que retornavam à pátria após a II Guerra Mundial
encontraram poucas oportunidades de emprego, e a reabertura da emigração para o Brasil foi muito
aguardada. Em 1º de julho de 1952, o presidente Getúlio Vargas permitiu a introdução de 4 mil
famílias na região Centro-Oeste e de mais de 5 mil famílias na região Norte no Brasil. No Norte, a
busca por imigrantes partiu do diretor executivo do Centro de Pesquisas Agronômicas da
Amazônia, que havia obtido sucesso com o plantio de juta. O maior entrave à reabertura da
imigração, o custo das passagens de navio, foi resolvido depois que o governo japonês passou a
emprestar o dinheiro aos emigrantes (NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
Quando o Brasil voltou a receber imigrantes japoneses, a colônia nipo-brasileira presenciou
atritos envolvendo os recém-chegados e aqueles que deixaram o Japão no pré-guerra. Os imigrantes
já radicados no País há mais tempo passaram a chamar aqueles que haviam chegado há pouco tempo
de “imigrantes novos”. Havia uma lacuna geracional e de visão de mundo, além das diferentes
condições socioeconômicas entre aqueles que haviam acumulado certa quantidade de bens e os
imigrantes que já desembarcavam endividados – o custo da passagem deveria ser pago no prazo de
15 anos. Entre 1952 e 1955, aproximadamente 46 mil imigrantes japoneses entraram no Brasil
(NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
Acompanhando o processo de industrialização brasileiro e o avanço das empresas japonesas
no País, técnicos industriais especializados foram trazidos para trabalhar em empresas como a
Tecelagens Gasparian, no Rio de Janeiro, a primeira a receber 16 técnicos japoneses. Ao todo, foram
mais de 200 técnicos contratados em um período de cerca de duas décadas. Também em busca de
mão de obra qualificada, entre 1958 e 1962, vieram ao Brasil 60 estagiários, com formação em
agronomia, para trabalhar em fazendas; e, entre 1956 e 1965, foram trazidos 201 técnicos
especializados em serviços como topografia, construção de estradas e derrubada de florestas
(NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
70
Em 2008, completaram-se cem anos desde o início da imigração japonesa para o Brasil. Em
2018, o número de nacionais japoneses residindo no Brasil era de 50.205 pessoas, e
aproximadamente 2 milhões de descendentes de japoneses viviam no Brasil, representando a maior
população de japoneses fora do Japão (MOFA, 2018).
Embora não tenha acontecido um movimento migratório semelhante – organizado e em
grupo – de brasileiros em direção ao Japão, a partir dos anos 1980, o número de imigrantes
provenientes do Brasil, principalmente de descendência japonesa, passou a crescer no Japão. Em
função da situação econômica vivida pelo Brasil na época, e atraídos pelos salários mais altos
oferecidos pelo Japão, o número de brasileiros registrados no arquipélago ultrapassou a marca de
300 mil indivíduos em 2003. Entre esses, verifica-se uma alta no número de brasileiros que
escolhem o Japão como moradia definitiva (NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
Observa-se, portanto, que as primeiras décadas do relacionamento bilateral foram marcadas
principalmente pelos movimentos migratórios e por atividades relacionadas ao assentamento dos
japoneses no Brasil. Nota-se também que o legado da imigração está atrelado à interação entre as
duas culturas e a aspectos como a disseminação de religiões japonesas, a introdução de novos itens
alimentícios – entre eles frutas como o caqui e hortaliças como a abóbora kabocha –, a culinária
típica japonesa, a contribuição japonesa à produção agrícola, ao comércio e ao setor industriário.
Além desse conteúdo, a própria presença dos imigrantes e descendentes, tornando-se a maior
população de japoneses fora do Japão, representa importante herança do relacionamento bilateral,
adicionando uma ligação simbólica entre os dois países (UEHARA, 2013).
Ressaltando a relevância do Brasil para o engajamento e as atividades de cooperação
internacional do Japão, em 2017 foi inaugurada em São Paulo a primeira Japan House, um
empreendimento do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão, com sede em três importantes
metrópoles – São Paulo, Londres e Los Angeles –, que visa difundir os diferentes elementos da
cultura japonesa. A Japan House São Paulo sobrepõe tradição e inovação ao agrupar arte,
tecnologia, informação e gastronomia em um espaço cultural que representa e simboliza a imigração
japonesa no Brasil (JAPAN HOUSE, 2021).
71
Relações econômicas
As relações bilaterais de cunho econômico podem ser consideradas estratégicas para o
desenvolvimento brasileiro, havendo espaço para expansão e aprofundamento, de forma a
aproveitar as complementaridades econômicas existentes. Até a década de 1920, o comércio entre
o Brasil e o Japão foi considerado irrisório (SAKURAI, 1995) e, durante toda a primeira metade
do século XX, o aspecto mais marcante do relacionamento bilateral foi a imigração. Na década de
1950, surgiram os primeiros grandes projetos econômicos bilaterais, como a parceria para a
construção da Usina Siderúrgica de Minas Gerais (Usiminas), o estaleiro Ishikawajima e, em menor
escala, a Toyota. Somente entre o final dos anos 1960 e o início dos anos 1970, período do “milagre
econômico” brasileiro, os investimentos das empresas japonesas cresceram (UEHARA, 2013).
Após o fim da II Guerra Mundial – período em que foram rompidas as relações diplomáticas
entre o Brasil e o Japão – e a subsequente reaproximação entre os dois países, a dimensão econômica
foi a primeira a prosperar e se tornou a principal tônica da relação bilateral (VARGAS, 2017).
Pouco após a II Guerra Mundial, as relações bilaterais se transformaram significativa e
positivamente. Já na década de 1950, o governo brasileiro passou a apresentar interesse pelo capital
do Japão, que por sua vez se interessou pelos recursos nacionais do Brasil, acelerando as relações
econômicas entre os dois países (UEHARA, 2013).
Quando o relacionamento Japão-Brasil foi retomado, o Brasil também detinha um projeto
de modernização que visava dar continuidade e aprofundar as reformas estruturais que marcaram
as décadas de 1930 e 1940, por meio do desenvolvimento do setor energético, da criação de uma
indústria nacional de substituição das importações, da ocupação dos vazios do território que
culminaram na implantação de projetos como a transferência da capital federal e de modernização
das regiões Norte e Centro-Oeste. Também no pós-guerra foram criados órgãos estratégicos e
empresas públicas como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1946; o Conselho
Nacional de Energia Nuclear (CNEN), em 1951; e a Petrobras, em 1954 (NUNES, 2008).
O processo de reconstrução japonesa ocorreu em ritmo acelerado, o que foi ilustrado pelo
boom da sua indústria, tornando-se, com o tempo, referência mundial, inicialmente na indústria
pesada e química e, em seguida, em setores como o eletroeletrônico e o automobilístico. O país
passou a acumular reservas em moeda norte-americana, chegando, na década de 1980, à condição
de maior potência financeira mundial (NUNES, 2008).
Na década de 1970, diversos países industrializados, entre eles o Japão, criaram sistemas de
financiamento voltados para atividades de geoprospecção em países ainda em estágio de
desenvolvimento, tendo em vista a extração mineral. Ao longo dessa década, a América Latina
passou a despontar entre as principais regiões de origem dos recursos minerais importados pelo
Japão. Como grande fornecedor de minério de ferro, o Brasil foi beneficiado pela concentração dos
investimentos industriais japoneses em setores com maior agregação de valor, como a
eletroeletrônica, a informática e a aeronáutica, que privilegia países fornecedores com maiores
investimentos tanto na extração mineral quanto na atividade de fundição (NUNES, 2008).
72
O investimento proveniente do Japão se enquadrou também em programas públicos de
desenvolvimento da Amazônia. Em 1953 foi criada a Superintendência do Plano de Valorização
Econômica da Amazônia (SPVEA), que se tornou a Superintendência do Desenvolvimento da
Amazônia (Sudam) em 1966; também em 1966 foi instituída a Zona Franca de Manaus; e, em
setembro de 1974, foi criado o Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia
(Polamazonia). Nesse sentido, projetos grandiosos foram idealizados e colocados em prática na região
com suporte de investimentos externos, inclusive japoneses, como o Polo Mínero-Metalúrgico dos
Carajás; o Polo Metalúrgico do Tocantins (Marabá-Tucuruí); o Polo Metalúrgico de Belém-
Barcarena; o Polo Metalúrgico de São Luiz; e a Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Diversas empresas
multinacionais de origem ou participação japonesa também se instalam no Brasil nesse período, entre
elas: Fuji; Fujitsu; Honda; Panasonic; Sanyo; Sharp; Sony; Semp Toshiba e Yamaha (NUNES, 2008).
O relacionamento bilateral funcionou também como instrumento complementar no
desenvolvimento da agricultura brasileira. Em 1970, foi assinado o Acordo Básico de Cooperação
Técnica entre os países, a partir do qual teve início o Programa Nipo-Brasileiro para o
Desenvolvimento do Cerrado (Prodecer). Financiado pela Agência Japonesa de Cooperação e
Desenvolvimento Internacional (Jica), o Prodecer promoveu o assentamento de agricultores do
sudeste e do sul do País na região do Cerrado, executando ações que alcançaram as regiões Sudeste,
Centro-Oeste, Norte e Nordeste. O Programa teve função de destaque na expansão da fronteira
agrícola na década de 1980 (NUNES, 2008).
A crise da dívida, resultante do aumento dos juros praticados sobre os empréstimos
internacionais que financiavam o projeto desenvolvimentista brasileiro, e o processo inflacionário
revelaram a fragilidade da estrutura econômica brasileira e afastaram os investidores japoneses. Com
isso, o capital excedente japonês, nos anos 1980, destinou-se aos EUA. Desse modo, as relações
diplomáticas e econômicas entre o Brasil e o Japão, que se desenvolveram de forma mais do que
satisfatória nas décadas precedentes, foram consideravelmente prejudicadas pelo panorama
econômico da década de 1980 (NUNES, 2008).
Após a adoção do Plano Real e da retomada da estabilidade econômica, o Brasil voltou a
atrair investimentos estrangeiros. Nesse período, a participação japonesa foi tímida se comparada à
de outros países, porém os investimentos japoneses, diretos ou indiretos, no setor automotivo
brasileiro merecem destaque. Diante disso, muitas montadoras ligadas à Associação Nacional de
Veículos Automotivos (Anfavea) – entre elas, Honda, Komatsu, Mitsubishi Motors, Nissan e
Toyota – traçaram uma estratégia para o mercado brasileiro e para o Mercado Comum do Sul
(Mercosul) (NUNES, 2008).
A instabilidade e a crise econômica dos anos 1980 no Brasil, combinadas com o colapso da
bolha da economia japonesa na década de 1990, levaram a um arrefecimento temporário no
interesse japonês pelo Brasil. A partir da década de 2000, porém, verificou-se acentuada
reaproximação econômica entre os países, a exemplo do aumento de mais de seis vezes do IED do
Japão no Brasil em relação à década anterior, somando US$ 11 bilhões (VARGAS, 2017).
73
No comércio também houve aceleração a partir de 2002, interrompida apenas em 2009 pelos
reflexos da crise financeira iniciada em 2008 nos EUA. Uma retomada relativa pôde ser observada
a partir de 2010, sendo que, em relação ao ano anterior, as exportações brasileiras para o Japão
cresceram 67,2%; e as importações, 30, 1% (UEHARA, 2013).
A tendência de crescimento dos investimentos japoneses na década de 2000 também sofreu
inflexão em 2008, porém a média dos fluxos de IED japoneses na primeira década do século XXI
foi maior que a das décadas de 1980 e 1990 (UEHARA, 2013). Conforme dados do Banco Central
do Brasil, o auge do investimento direto nipônico no Brasil foi no ano de 2011, quando o Japão se
tornou o quarto maior investidor brasileiro, com um fluxo total de US$ 7,5 bilhões. Apesar da
queda para números mais modestos nos anos subsequentes, o Japão se manteve entre as maiores
origens de IED no Brasil, ocupando a sexta posição em 2015 (VARGAS, 2017). O gráfico a seguir
ilustra o posicionamento japonês entre as principais fontes de IED do Brasil entre 2010 e 2016.
No início do século XXI, o notável aumento do investimento japonês no Brasil reflete o bom
desempenho da economia brasileira no período e a consequente identificação de oportunidades em
uma economia em expansão, por parte do empresariado japonês. Importa destacar, também, os
esforços governamentais para estimular esse investimento, como ficou evidenciado durante a visita
presidencial de 2005 ao Japão, em que foi adotado o Programa Conjunto de Revitalização das
74
Relações Econômicas, que previa a adoção de um pacote de medidas importantes, como a realização
regular de consultas intergovernamentais, e abrangia setores relevantes, entre eles o de energia,
mineração, infraestrutura, biocombustíveis e agricultura (VARGAS, 2017).
75
Figura 5 – O que o Brasil exportou para o Japão em 2018?
76
Figura 7 – De onde o Japão importou em 2018?
77
Destaca-se o trabalho da Japan External Trade Organization (Jetro), que iniciou as suas
atividades no Brasil com um escritório de representação em São Paulo em 1955, quando ainda era
denominada Japan External Trade Recovery Organization. A Jetro é vinculada ao governo japonês
e foi inaugurada oficialmente em 1958. Atualmente, conta com uma rede de 46 escritórios
domésticos e 74 no exterior, distribuídos em mais de 50 países. Dentro do seu escopo, visa apoiar
e promover o comércio bilateral entre o Japão e os demais países, contribuindo para o
desenvolvimento e o fortalecimento das relações comerciais e econômicas entre empresas locais e
empresas japonesas. No Brasil, as suas atividades variaram ao longo do tempo, porém se manteve a
atuação em setores com (potenciais) sinergias entre empresas brasileiras e japonesas (JETRO, 2021).
No Brasil, há mais de 60 anos, as principais atuações da organização envolvem o fomento de
comércio e investimentos entre empresas brasileiras e japonesas; na atração de investimentos
brasileiros para o Japão; no fornecimento de informações para empresas japonesas interessadas em
conhecer o mercado brasileiro e no aprimoramento do ambiente de negócios de forma geral. As
principais atividades são divididas em: promoção de comércio exterior, atração de investimentos e
propriedade intelectual (JETRO, 2021).
78
No ano de 1974, foi fundada a Japan International Cooperation Association (Jica), principal órgão
de cooperação japonês, como resultado da fusão entre a Agência de Emigração do Japão e a Agência
de Cooperação Técnica para o Exterior. O primeiro escritório da Jica no Brasil foi aberto em 1976,
anexo à Embaixada do Japão (JICA, 2009).
Visando apoiar o crescimento e a estabilidade socioeconômica dos países em
desenvolvimento, a Jica é a agência do governo japonês responsável pela implementação da
Assistência Oficial para o Desenvolvimento (ODA). Com sede em Tóquio, possui 15 escritórios
domésticos e 103 escritórios internacionais (JICA, 2021). A Jica expandiu o seu alcance e
atualmente trabalha em parceria com entidades brasileiras em uma ampla gama de áreas, desde
projetos nacionais de desenvolvimento de recursos naturais até projetos em áreas como o meio
ambiente, saúde, segurança e infraestrutura. Além da assistência prestada pelo Japão ao Brasil,
também são desenvolvidos projetos de cooperação triangular envolvendo países africanos. No ano
de 2019, comemorou 60 anos de cooperação japonesa no Brasil, possuindo um segundo escritório
em São Paulo (JICA, 2019).
79
Fundação da Agência de Cooperação Técnica para o Exterior (OTCA),
junho/1962
precursora da Jica
80
Início do 1º projeto de parceria público-privada “Pesquisa preparatória
janeiro/2012 para negócios da BOP adaptados ao ambiente usando o sistema
agroflorestal (promoção da colaboração comercial da BOP)”
O desenvolvimento da cooperação entre o Brasil e o Japão pode ser dividido em três fases.
A primeira teve início em 1985, quando teve início a implementação da cooperação triangular,
por meio de programas de treinamento a terceiros países. O objetivo central envolve utilizar a
experiência e os resultados da relação bilateral desde 1958. Os programas se destinaram
principalmente à América Latina e países africanos de língua portuguesa, e os principais campos
abrangidos foram: agricultura, saúde, treinamento vocacional, setores ambientais
(SAKAGUCHI, 2012).
A segunda fase da colaboração se iniciou em 2000, quando foi introduzido o Programa de
Parcerias Japão-Brasil – Japan-Brazil Partnership Program (JBPP) –, buscando conduzir a
cooperação triangular com base em um relacionamento mais bem equilibrado entre os dois países.
A terceira fase, por sua vez, foi inaugurada na metade dos anos 2000, quando as atividades
conjuntas aumentaram quantitativamente, e projetos de larga escala passaram a ser estruturados e
executados. Entre outubro de 2007 e novembro de 2012, o programa de parcerias havia realizado
13 projetos, 14 seminários conjuntos e 17 novos cursos de treinamento para terceiros. O salto
qualitativo e quantitativo das ações elaboradas por meio do JBPP é refletido na expansão
significativa em termos de recursos humanos, orçamentos e material. Os projetos desenvolvidos em
conjunto produzem impactos positivos ao processo de desenvolvimento dos países beneficiários
(SAKAGUCHI, 2012).
81
Figura 10 – Cooperação japonesa em números
82
A cooperação bilateral, principalmente proveniente do Japão para o Brasil, é multifacetada,
reunindo prioridades políticas e econômicas, promovendo a aproximação entre os países e produzindo
resultados de impacto e de longo prazo na sociedade brasileira. As necessidades de desenvolvimento
do Brasil aliadas à experiência japonesa em estruturar projetos de cooperação produziram importantes
atividades conjuntas e apresentam potencial de expansão e aprimoramento.
Considerações finais
As relações entre o Japão e o Brasil são centenárias, amplas; apresentam alto nível de
complementaridade e, ainda, diversas possibilidades de expansão e aprofundamento. Ao passo em
que o Japão contribuiu historicamente para o processo de desenvolvimento brasileiro, também o
Brasil contribui para a inserção internacional japonesa, além de responder às necessidades da cadeia
de suprimentos da economia do Japão.
No século XXI, o Brasil despontou como uma das mais relevantes economias emergentes,
chamando a atenção de investidores internacionais, entre eles os japoneses. Atraído pelas vantagens
de participar do processo de desenvolvimento brasileiro, um dos maiores atores da América Latina,
o Japão procurou aumentar o nível de institucionalização e formalização das relações bilaterais.
Por fim, no contexto de transição sistêmica e de acirramento da competição entre as grandes
potências, estreitar o diálogo se torna ainda mais relevante no sentido de que, como players
relevantes nos seus entornos regionais, o Japão e o Brasil representam pontos de inserção para a
Ásia e para a América Latina, respectivamente. Nesse sentido, as expectativas quanto ao aumento
da aproximação, que contribuiu mutuamente para a satisfação de interesses e de objetivos
nacionais, são positivas.
83
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PROFESSOR-AUTOR
PEDRO BRITES
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Doutor em Estudos Estratégicos Internacionais pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS).
EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS
Vice-Coordenador do Programa de Graduação e Professor Agregado da Escola de Relações
Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP).
Professor Adjunto da Universidade Federal de Pelotas.
Coordenador e Professor do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário
Ritter dos Reis.
Pesquisador-Associado do Núcleo Brasileiro de Estratégia e Relações Internacionais
(NERINT-UFRGS) e do Laboratório de Estudos de Defesa e Segurança (LEDS-Centro
Universitário Ritter dos Reis).
Ex-Diretor-Geral do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE).
Pesquisador das áreas de relações internacionais da Ásia, política internacional e segurança
internacional com ênfase em estudos regionais.
PUBLICAÇÕES
Organizou o livro Mundo em crise, lançado em 2021, sobre política internacional na
década após a crise financeira de 2007 e 2008.