Você está na página 1de 96

INTRODUÇÃO

O curso autoinstrucional Política externa do Japão: inserção


internacional e relações bilaterais é um dos produtos da colaboração entre
a Escola de Relações Internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV
RI) e a Japan House São Paulo e dá seguimento ao curso A política
externa do Japão: aspectos institucionais e evolução histórica. Com o
objetivo de difundir e democratizar o acesso ao estudo de aspectos
basilares das relações internacionais do Japão, ambos os cursos são
elaborados por especialistas e têm como público-alvo a sociedade
brasileira, de todas as áreas de atuação, com interesse em obter os
primeiros contatos ou expandir o conhecimento sobre essa temática.
Com base no seu relacionamento bilateral histórico com o Brasil –
marcado pela herança migratória, pelos laços comerciais e de investimento,
bem como pela cooperação para o desenvolvimento – e em face do
processo de ascensão asiática, o Japão é reconhecido como um parceiro
brasileiro importante e um ponto de análise relevante para a compreensão
das relações internacionais. Apesar disso, o conhecimento sobre o Japão na
sociedade brasileira ainda pode ser considerado limitado.
Contribuindo para o preenchimento dessa lacuna, o presente curso
analisa a política externa japonesa a partir das relações bilaterais com
parceiros-chave, de forma a compreender como se dá a inserção
internacional do país. O curso avalia como se estruturam as relações do
Japão com os Estados Unidos da América (EUA), a China e o Brasil, por
meio dos seus principais tópicos de interação. A escolha dos relacionamentos
a serem analisados está atrelada ao seu peso, ao seu impacto e à sua prioridade
em relação aos objetivos fundamentais do Estado japonês.
O primeiro relacionamento bilateral apresentado é com os EUA,
país aliado e principal parceiro estratégico do Japão em nível global. A
análise é realizada a partir das perspectivas político-securitária e econômica.
As relações Japão-China, entre as mais importantes do contexto regional
do Nordeste Asiático, são explanadas na sequência, a partir dos âmbitos
político-diplomático-securitário, econômico, além de tópicos especiais
envolvendo Taiwan, a península coreana e o Mar do Sul da China. Por
fim, tendo em vista disseminar informações sobre o histórico e importante
relacionamento entre o Japão e o Brasil, as interações entre esses países são
contextualizadas sob os pontos de vista da política, da diplomacia, da
imigração, da economia e da cooperação para o desenvolvimento.
O presente curso também busca introduzir literatura acadêmica especializada e de tradição
nos estudos sobre as relações internacionais do Japão, em idioma português, de forma a instigar os
estudantes a dar continuidade à sua instrução e contribuir com pesquisas subsequentes que
mantenham o constante aprimoramento das análises que contemplem o Estado japonês. Pretende-
se, ainda, extrapolar e contextualizar as discussões realizadas durante o ciclo de palestras sobre o
Japão – disponível aberta e virtualmente ao público – realizadas de forma conjunta entre a FGV RI
e a Japan House nos anos de 2020 e 2021.
Dessa forma, enquanto o objetivo geral do curso é oferecer conteúdo analítico-descritivo
acerca das relações internacionais do Japão no século XXI por meio da contextualização histórica
dos seus principais relacionamentos bilaterais, os objetivos específicos incluem:
 Apresentar os condicionantes sistêmicos para a reinserção internacional do Japão após a
II Guerra Mundial.
 Estudar os contextos regionais e globais que incidem sobre a política externa japonesa.
 Analisar os impactos do desenvolvimento japonês principalmente durante o período
da Guerra Fria.
 Promover compreensão geral dos elementos-chave dos relacionamentos bilaterais
prioritários do Japão.
 Compreender os interesses mútuos, complementares ou divergentes entre o Japão e os seus
principais parceiros externos.
 Oferecer reflexão sobre possíveis desdobramentos subsequentes, a balizar as relações
internacionais japonesas nas próximas décadas.

A fim de alcançar tais objetivos, a presente apostila é estruturada em três módulos. No


módulo 1, Relações Japão-Estados Unidos da América, busca-se compreender o complexo
relacionamento entre o Japão e os EUA a partir do final da Guerra Fria. O módulo está estruturado
em três unidades: a primeira trata dos antecedentes históricos dessas relações; a segunda, das
questões político-securitárias; e a terceira, das relações econômicas.
No módulo 2, Relações Japão-República Popular da China, busca-se compreender o complexo
e multifacetado relacionamento entre o Japão e a China a partir do final da Guerra Fria. O módulo está
estruturado em quatro unidades: a primeira trata dos antecedentes históricos e contextualiza a evolução
das relações bilaterais; a segunda se dedica às questões político-diplomáticas e securitárias; a terceira se
ocupa das relações econômicas; a quarta, por fim, analisa tópicos especiais para as relações bilaterais,
nomeadamente, a questão de Taiwan, da península coreana e do Mar do Sul da China.
Finalmente, no módulo 3, Relações Japão-Brasil: uma parceria estratégica, abordam-se as
centenárias relações entre o Japão e a República Federativa do Brasil, objetivando promover uma
compreensão ampla e histórica do relacionamento bilateral, por meio de quatro perspectivas
principais de análise: relações político-diplomáticas; imigração; relações econômicas; e cooperação
para o desenvolvimento.
SUMÁRIO
MÓDULO I – RELAÇÕES JAPÃO-ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA.................................................... 7

ANTECEDENTES HISTÓRICOS DAS RELAÇÕES JAPÃO-EUA ........................................................... 8


RELAÇÕES POLÍTICO-SECURITÁRIAS E DIPLOMÁTICAS ...............................................................12
RELAÇÕES ECONÔMICAS ................................................................................................................18
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................24

MÓDULO II – RELAÇÕES JAPÃO-REPÚBLICA POPULAR DA CHINA ............................................... 25

ANTECEDENTES DAS RELAÇÕES JAPÃO-CHINA ............................................................................26


RELAÇÕES POLÍTICO-DIPLOMÁTICAS E SECURITÁRIAS ...............................................................35
RELAÇÕES ECONÔMICAS ................................................................................................................51
TÓPICOS ESPECIAIS: PENÍNSULA COREANA, TAIWAN E MAR DO SUL DA CHINA ...................58
Questão coreana nas relações Japão-China.........................................................................58
Situação de Taiwan e relações Japão-China .........................................................................61
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................63

MÓDULO III – RELAÇÕES JAPÃO-BRASIL: UMA PARCERIA ESTRATÉGICA ..................................... 65

RELAÇÕES POLÍTICO-DIPLOMÁTICAS ............................................................................................66


IMIGRAÇÃO .......................................................................................................................................68
RELAÇÕES ECONÔMICAS ................................................................................................................72
COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO ................................................................................78
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................83

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................ 84

PROFESSOR-AUTOR ....................................................................................................................... 94
MÓDULO I – RELAÇÕES JAPÃO-ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA

O primeiro módulo do curso busca compreender o complexo relacionamento entre o Japão


e os EUA a partir do final da Guerra Fria. O módulo está estruturado em três unidades: a primeira
trata dos antecedentes históricos dessas relações; a segunda, das questões político-securitárias; e a
terceira, das relações econômicas.
O relacionamento Japão-EUA tem raízes históricas desde o século XIX. Navegadores americanos
começaram a se aproximar do Japão na década de 1820, quando barcos de pesca começaram a avançar
para o Pacífico. A partir de então, as interações entre o Japão e os EUA cresceram. Pode-se dizer que a
reação japonesa ao avanço imperialista na Ásia, do qual os EUA fizeram parte, impulsionou
transformações profundas na sociedade japonesa, e a restauração Meiji é símbolo desse processo, por
isso a análise dessa relação é crucial para compreender a inserção internacional do Japão contemporâneo.
No século XX, o Japão e os EUA se enfrentaram pelo predomínio na Ásia-Pacífico. Nesse
contexto, a II Guerra Mundial opôs os dois países e ensejou um novo momento das relações
bilaterais. Após a derrota do Japão, os EUA ocuparam o país e impuseram restrições constitucionais
à atuação japonesa no sistema internacional, porém, ao longo da Guerra Fria, essas relações se
tornaram de cooperação. Com isso, o Japão se tornou um dos principais aliados dos EUA na Ásia
Oriental. Na esfera econômica, no final da Guerra Fria e nos anos 1990, os EUA e o Japão
ocuparam os postos de principais economias do planeta, e esse quadro levou a uma certa competição
geoeconômica entre Tóquio e Washington.
Com a ascensão da China, as relações entre o Japão e os EUA se tornaram cruciais para a
compreensão das dinâmicas regionais no Leste asiático. A triangulação Japão-EUA-China é um dos
pilares da política internacional contemporânea e determinante para a política externa japonesa.
Mais do que isso, as relações Tóquio-Washington são essenciais para a formação da inserção
internacional do Japão. Desse modo, este módulo se dedica a avaliar as relações bilaterais entre o
Japão e os EUA sob o prisma político-securitário e econômico.
Antecedentes históricos das relações Japão-EUA
O avanço das potências ocidentais em direção ao Oriente transformou as relações
regionais no Leste asiático. Para o Japão, esse novo cenário fez com que se rompesse o
isolamento que o país vivenciava. Essa medida de isolamento era um mecanismo para se manter
afastado do sistema de governança regional chinês, porém, diante do desafio imperialista, as
medidas tomadas pelo Japão até então não foram mais suficientes. A capacidade bélica dos
países ocidentais era superior à dos países orientais, o que provocou a abertura forçada ou a
dominação destas sociedades pelas potências colonialistas.
Os EUA se inseriram no processo de avanço imperialista. Na década de 1850, o comandante
Perry chegou ao Japão e estabeleceu o Tratado de Paz e Amizade entre os EUA o Império do Japão,
o Tratado de Kanagawa (1854). Esse é o início das relações oficiais entre os EUA e o Japão
(IOKIBE, 2017; VISENTINI, 2011). Naquele período, os EUA ainda eram uma potência em
ascensão, mas lograram êxito em abrir o Japão ao mundo.
As mudanças introduzidas pelo início das relações com o Ocidente forçaram transformações
na sociedade japonesa, e a restauração Meiji de 1868 foi o símbolo desse processo. O Japão, a partir
desse período, iniciou um processo de modernização econômica e transformação da sua matriz
produtiva e social, o qual culminou na sua transformação em uma potência industrializada. Diante
disso, a restauração Meiji levou a diversas disputas internas sobre qual modelo de desenvolvimento
seria adotado pelo país. Cabe destacar que os EUA, nesse período, estavam envolvidos com a Guerra
de Secessão (1861-1865) e os seus efeitos. Dessa forma, a política americana se manteve neutra e
não se envolveu nos assuntos internos japoneses (CUMINGS, 2010). Ao fim desse processo de
transformações políticas no Japão, no final do século, este país entrou no jogo das disputas
geopolíticas com as potências ocidentais.
A I Guerra Sino-Japonesa (1894-1895) foi um marco na consolidação do Japão como
potência regional, e, a partir desse momento, o país caminhou para a condição de grande potência.
A aliança nipo-britânica de 1902 que estabeleceu que os dois países se apoiariam mutuamente em
relação à China e à Coreia foi um momento crucial para que o caminho de competição entre os
EUA e o Japão fosse construído. Embora a aliança fosse direcionada, prioritariamente, à contenção
dos interesses russos no Extremo Oriente, colocou o Japão como um competidor no Pacífico. Além
disso, para os EUA, nas décadas subsequentes, a possibilidade de uma aliança entre o Reino Unido
e o Japão seria vista como a principal ameaça à sua segurança (PAINE, 2014; DEPARTAMENTO
DO EXÉRCITO DOS EUA, 2014).

8
Após a I Guerra Mundial, apesar de ter saído vencedor junto com os aliados, não recebeu o
mesmo tratamento que as demais potências ocidentais. Desse modo, o Japão se concentrou na
consolidação do seu poder no Leste asiático, aproveitando a perda de poder relativo das potências
imperiais tradicionais. Então consolidou-se como uma potência naval e, paulatinamente, os seus
interesses confrontaram os dos EUA. Esse caminho que levou à confrontação direta entre Tóquio
e Washington na II Guerra Mundial transformou a história japonesa, e a derrota do Japão,
destruído e atingido por dois artefatos nucleares, levou à ocupação do Japão pelos EUA e à
refundação da política externa do país asiático.
Após a II Guerra Mundial, os EUA se afirmaram como hegemonia global. No contexto asiático,
asseguraram o domínio do Japão e a presença na península coreana. Além disso, tinham interesses na
China. Cabe destacar que, naquele período imediato pós-II Guerra Mundial, a China não era um país
comunista. O governo nacionalista do Guomindang tinha relações de cooperação com Washington.
Desse modo, pode-se dizer que a prioridade estratégica dos EUA na região era a China. Esse quadro só
foi alterado com o advento da Guerra da Coreia em (1950-1953). A partir desta guerra, na qual os
EUA, apesar de toda a superioridade bélica e produtiva, não conseguiram derrotar a China comunista,
que tinha acabado de sair de uma longa guerra civil, Washington passou a articular uma defesa regional
em torno de aliados geoestratégicos. Dessa forma, pela importância geopolítica, o Japão passou a ser
uma prioridade na estruturação da estratégia dos EUA para a Ásia. Até então, os EUA não pretendiam
auxiliar o Japão no processo de reestruturação e de construção de capacidades defensivas.
A ocupação americana começou com o objetivo ostensivo de desmilitarização e
democratização do Japão. 1 O general MacArthur, comandante das forças de ocupação, propôs uma
nova constituição para o Japão baseada em três princípios: manutenção do sistema imperial,
renúncia completa à guerra agressiva e autodefensiva e abolição do sistema feudal (IOKIBE, 2017).
Nesse cenário, a constituição 2 elaborada e proposta pelos EUA continha o art. 9, o qual previa a
renúncia à guerra, fator que constrange a política de segurança do Japão até os dias atuais.
À medida que a Guerra Fria avançou, a posição do Japão melhorou, e o país asiático ganhou
importância, como mencionado, na estratégia de contenção da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS). O primeiro-ministro Shigeru Yoshida (1946-1947 e 1948-1954) defendia que
um Japão empobrecido e incapaz de se defender seria vulnerável, portanto seria importante
assegurar a proteção dos EUA ao firmar um acordo de segurança e permitir o uso de bases no Japão,
especialmente dada a formação do aliança sino-soviética em 1950 (IOKIBE, 2017, VISENTINI,
2011). Além disso, afirmava que o Japão não se rearmaria antes de um tratado de paz ser alcançado,
mas a posição de Yoshida era criticada por setores progressistas no Japão, que defendiam um acordo
de paz multilateral, e não só com os EUA. Apesar disso, Yoshida prevaleceu e, dessa forma, o
caminho para a assinatura do tratado de paz foi pavimentado.

1
Segundo Iokibe (2017, p. 116), “essas medidas incluíam o desarmamento e a desmobilização, a dissolução da organização
militar e a abolição da polícia secreta”.
2
A nova constituição estabeleceu o parlamentarismo e descentralizou poderes fiscais e de segurança interna (VISENTINI, 2011).

9
O Tratado de Paz e o Tratado de Segurança Mútua EUA-Japão foram assinados em São
Francisco em 1951. O acordo inseriu o Japão na estratégia de contenção da URSS e consolidou o
principal eixo determinante das relações bilaterais entre o Japão e os EUA. A partir de então, as
tropas americanas seriam estacionadas no Japão. Tacitamente, este ficaria sob o guarda-chuva
nuclear dos EUA. No plano econômico, houve auxílio tecnológico e financeiro, bem como abertura
do mercado nos EUA para as exportações japonesas. Esse quadro contribuiu para o franco processo
de modernização econômica japonesa, o qual dependia da associação com Washington.
O período que se iniciou na década de 1970 foi transformador para as relações Japão-EUA.
Com a recuperação econômica dos países europeus, principalmente a Alemanha, e do Japão, os
EUA perderam poder relativo na economia mundial, especialmente no comércio. Nesse contexto,
os EUA romperam com a estrutura da governança financeira global estruturada no imediato pós-II
Guerra Mundial e procuraram reestruturar a sua hegemonia.
Inicialmente, esse contexto permitiu o crescimento da inserção econômica internacional do
Japão. Segundo Brites (2018, p. 52),

Para a Ásia, todavia, esse processo foi central para o fortalecimento do


processo de subcontratação japonesa (desnacionalização da base industrial).
Especialmente pela transferência de tecnologia que caracterizou esse
processo e que indicava a formação de uma rede informal de divisão de
trabalho na região. As principais características dessa rede de subcontratação
são os aspectos geopolíticos ligados à regionalização do processo (centrado,
especialmente, no Sudeste e Leste asiático) e o nível de estratificação das
camadas de subcontratação, que funcionam de modo muito mais
coordenado do que ocorre com as redes de subcontratação de empresas
ocidentais, por exemplo (ARRIGHI, 1997). A valorização do iene
ocasionada pela mudança perpetrada pelos Estados Unidos levou o país a
deslocar suas indústrias cuja produção era de menor valor agregado
(principalmente têxteis e componentes metálicos) para outros países da Ásia,
tais como os do Sudeste asiático, Taiwan e própria China.

Em outros termos, à medida que os EUA procuravam avançar em um processo de


reestruturação geopolítica e geoeconômica, o Japão avançou em um projeto de articulação
econômica no Leste asiático. Portanto o crescimento e a afirmação japoneses se viabilizaram a partir
do quadro de transformações da hegemonia americana.

10
O governo de Richard Nixon (1969-1974) assumiu com a missão de reverter o quadro de
perda de poder relativo dos EUA. No plano securitário, a Doutrina Nixon (1969) atribuiu um
papel de maior responsabilidade aos aliados dos EUA nos custos de defesa, e isso alterou
decisivamente o panorama político-estratégico na Ásia, favorecendo o regionalismo asiático. Até
então, as dinâmicas da Guerra Fria eram elementos de constrangimento de relações regionais. No
que diz respeito ao Leste asiático, esse quadro culminou na aproximação entre a China e o Japão,
corroborada pela normalização das suas relações em 1972.
Com as duas crises do petróleo, de 1973 e 1979, Tóquio passou a considerar a superação
da dependência energética como uma prioridade. Isso implicava minimizar a dependência do
abastecimento do Oriente Médio e a estabilidade das suas linhas de comunicação marítimas.
Desse modo, o Japão passou a observar a estabilidade no Sudeste da Ásia como parte integrante
do seu entorno estratégico e a entender que a aproximação com a China poderia ser importante
para prover os recursos de que o país precisava. Ou seja, a crise internacional dos anos 1970,
considerada uma crise da hegemonia dos EUA, ensejou o aumento da assertividade japonesa.
Diante desse quadro, o Japão procurou colocar-se como um ator global. Com isso, a Doutrina
Fukuda 3 (1976-1978) se tornou base desse novo contexto de atuação do Japão e lançou as bases
para o aprofundamento do regionalismo asiático.
A chegada de Ronald Reagan ao poder, no entanto, rompeu com o quadro dos anos 1970,
no qual os EUA permitiram que o regionalismo asiático avançasse. Essa fase liderada pelo Reagan
foi definida como Nova Guerra Fria. Segundo Brites (2018, p. 56),

A Nova Guerra Fria, que caracteriza a segunda fase de rupturas, foi um


processo de reação conservadora à primeira ruptura que marca o fim da era
de ouro do capitalismo pós-II Guerra Mundial. Para o Leste asiático, isso
representou a convergência de forças disruptivas e conjuntivas. Em termos
sistêmicos, avançava a pressão sobre o fortalecimento dos países da região,
mas o regionalismo estruturado a partir do Japão emergiu como elemento
capaz de assegurar resistência frente à onda conservadora de Washington.

Até o final dos anos 1980, o Japão se consolidou como o potencial sucessor dos EUA na
hegemonia; superou as crises da década de 1970 e ganhou fatias do mercado de exportações nos
EUA e em outros mercados tradicionais de domínio americano. Os EUA, por sua vez, absorviam a
maior parcela das exportações japonesas e eram o destino de investimentos japoneses, que
compraram posições importantes no mercado americano. Contudo esse cenário de protagonismo
japonês gerou uma reação americana, a qual veio por meio do Acordo de Plaza, assinado em 1985.

3
Baseada no primeiro-ministro Takeo Fukuda (1976-1978), a doutrina estabelecia que o Japão estava comprometido com
a construção de laços de cooperação e confiança mútua com os países do Sudeste asiático. Os princípios da Doutrina
Fukuda marcaram a política externa japonesa nas décadas subsequentes.

11
O Acordo de Plaza envolveu os EUA, o Japão, a França, a Alemanha Ocidental e o Reino
Unido. A partir dele, o dólar americano foi depreciado em face do marco alemão e iene. Entre 1985
e 1987, o dólar se valorizou em 40% em relação às duas moedas (FRANKEL, 2016). Além disso,
os EUA adotaram uma política de desregulamentação financeira, a qual afetou diretamente o
desempenho econômico do Japão.
Ao passo que a Guerra Fria terminava, a pressão sobre o Japão se ampliou, e a Guerra do Golfo
(1991) foi o marco dessa nova conjuntura para o Japão, produziu o denominado “trauma japonês”.
Logo após a invasão iraquiana do Kwait, o primeiro-ministro Kaifu Toshiki (1989-1991)
implementou sanções ao Iraque. Ao contrário do que ocorria na Guerra Fria, quando a intervenção
internacional era indireta, dessa vez, a comunidade internacional estruturou uma força multinacional
de intervenção. Com isso, apesar da solidariedade e das sanções adotadas, os EUA passaram a
pressionar Tóquio para que auxiliasse em termos de transporte e suprimentos. O Japão tentou recusar,
mas foi pressionado por Washington a financiar o conflito. Como resultado, contribuiu com US$ 13
bilhões para a coalizão liderada pelos EUA (BRITES, 2018). Ou seja, Tóquio foi responsável por
cerca de 20% dos custos de guerra, mas não obteve retornos proporcionais desse alto investimento.
Com isso, Washington avançou na sua política de pressão sobre o Japão.
Desse modo, a Guerra Fria marcou a reconstrução do Japão e a refundação das relações
bilaterais com Washington. As relações que remontam ao século XIX são marcadas pela competição;
no início do século XX, evoluíram para uma relação umbilical de cooperação que permaneceria até
o final da Guerra Fria. Apesar disso, os EUA atuaram para frear o avanço japonês quando o país
asiático se configurava como potência desafiante no plano econômico. A assinatura do Acordo de
Plaza em 1985 e a pressão para que o Japão arcasse com o custo da Guerra do Golfo em 1991
evidenciaram essa postura mais agressiva dos EUA em relação ao Japão, e esse quadro levou Tóquio
a buscar reformular a sua inserção internacional no início dos anos 1990.

Relações político-securitárias e diplomáticas


Esta unidade trata das relações político-securitárias e diplomáticas entre os EUA e o Japão no
período pós-Guerra Fria.
Na primeira metade dos anos 1990, a política externa dos EUA para o Leste asiático
priorizava as questões econômicas, como demonstrado pela criação da Asia-Pacific Economic
Cooperation (Apec) – isto é, Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico – e pelos atritos comerciais
com o Japão. A demonstração de poder inconteste que os EUA deram quando venceram a Guerra
do Golfo em 1991 permitiu que os EUA tivessem a condição de estruturar uma estratégia mais
assertiva em relação aos demais Estados (BRITES, 2018). Esse quadro era crítico para a Ásia, que
enfrentava uma nova conjuntura política e econômica.

12
O crescimento econômico da Ásia levava os países da região a buscar estratégias de inserção
internacional mais autônomas, baseadas nas suas próprias perspectivas de pensamento e de
organização social e política (BRITES, 2018). Esse processo é definido por Huntington (1997)
como “afirmação asiática”. Diante desse panorama, Tóquio procurou engendrar um ambiente
regional mais autocentrado e independente diante dos EUA. Entre os sintomas desse novo quadro,
destacam-se a publicação do relatório Higuchi e a criação do Fórum Regional da Association of
Southeast Asian Nations (Asean) – isto é, Associação das Nações do Sudeste Asiático – em 1994
(ADVISORY GROUP ON DEFENSE ISSUES, 1994).
O relatório Higuchi foi um documento elaborado por um painel ad hoc formado pelo
governo japonês. Tratava dos desafios de segurança do Japão no período pós-Guerra Fria e previa
a necessidade de fortalecer as capacidades defensivas autônomas, bem como assumir uma postura
proativa no contexto regional. Além disso, o documento defendia a criação de instâncias
multilaterais de diálogo lideradas pelo Japão. Essa percepção deriva do novo contexto global, pois
o final da Guerra Fria determinou o término da bipolaridade. Diante disso, parte do establishment
político japonês passou a questionar a subordinação militar que Tóquio tinha em relação aos EUA.
As diretrizes do Programa Nacional de Defesa em 1995 estabeleciam que
1. Defesa nacional:
 Prevenir agressões.
 Tomar medidas responsivas contra agressões.
2. Resposta a desastres de grande escala e outras situações:
 Responder a desastres naturais e outros.
 Responder a situações nas áreas ao redor do Japão.
3. Contribuição para a criação de um ambiente de segurança mais estável:
 Participar de operações de manutenção da paz da ONU, etc.
 Promover o diálogo e o intercâmbio de segurança.
 Cooperar no controle de armas e redução de armas.

Papel da aliança Japão-EUA. [...] Prestando a devida atenção ao aumento


da credibilidade dos arranjos de segurança Japão-EUA, [Japão] se esforçará
para garantir sua própria defesa nacional e contribuir para a paz e
estabilidade da comunidade internacional, atualizando, mantendo e
operando adequadamente sua capacidade 4 (NOBORU, 2012).

4
Tradução nossa. Excerto original: “Role of Japan’s defense capability; National defense; Preventing aggression; Taking
responsive action against aggression; Responding to large-scale disasters and other situations; Responding to natural and
other disasters; Responding to situations in the areas surrounding Japan; Contributing to the creation of a more stable security
environment; Participating in UN peacekeeping operations, etc. Promoting security dialogue and exchange; Cooperating in
arms control and arms reduction; Role of the Japan-US alliance. […] Paying due attention to enhancing the credibility of the
Japan-U.S. security arrangements, [Japan] will strive to ensure its own national defense and contribute to the peace and stability
of the international community by appropriately upgrading, maintaining, and operating its capability” (NOBORU, 2012).

13
Os pontos destacados demonstram o interesse japonês em estabelecer um papel ativo para as
forças de defesa do Japão na segurança regional e global. Apesar disso, as diretrizes reforçam a
importância da parceria com os EUA, desde que se considere a relevância de se desenvolverem forças
autônomas. Em outras palavras, o Japão demonstrava que, como parte do seu amadurecimento
econômico e político nas últimas décadas da Guerra Fria, quando o país se configurou como uma
potência regional e global, chegava a hora de assumir maior protagonismo no campo estratégico.
Os EUA reagiram a essa postura japonesa com o lançamento da “Iniciativa Nye” – alusão ao
secretário de defesa dos EUA – em 1995, derivada do lançamento da “Estratégia de Segurança para a
Região Leste Asiático-Pacífico”. No documento, os EUA defendiam a importância da manutenção
de uma forte presença militar na região. O relatório deu destaque especial para a aliança Japão-EUA,
afirmando que essa aliança era a mais importante para os EUA no mundo. Desse modo, definiu essas
relações bilaterais como fundamentais para a política americana de segurança do Pacífico e para a
manutenção da posição hegemônica dos EUA (BRITES, 2018; NOBORU, 2012). Além disso,
Washington assumiu o compromisso de manter, no mínimo, 100 mil homens no Leste asiático. A
partir da Iniciativa Nye, a aliança dos EUA com Japão – e a Coreia do Sul – foi reforçada.
Com a eleição do primeiro-ministro Junichiro Koizumi (2001-2006), o Japão alterou a sua
política externa e adotou uma postura “globalista” (IOKIBE, 2017); passou a considerar a China e
a Coreia do Sul como concorrentes diretos em termos de produção industrial e procurou uma
relação especial com Washington. Além disso, alinhou-se à agenda de segurança americana, o que
incluiu a revisão da doutrina de emprego de forças, o compromisso com o envio de tropas para a
Guerra no Iraque em 2003 e o apoio logístico às tropas dos EUA no Afeganistão. Acrescente-se que
Tóquio se colocou como responsável pela segurança da península coreana. Com isso, Washington
poderia realocar forças para as guerras no Oriente Médio (SATO, 2004).
Apesar da busca por ser o aliado especial dos EUA, a visão globalista empreendida pelo
governo Koizumi, e mantida nos governos de Shinzo Abe (2006-2007), Yasuo Fukuda (2007-
2008), Tarō Asō (2008-2009), não logrou resolver a estagnação econômica do país (BRITES,
2018). Desse modo, a oposição elegeu Yukio Hatoyama (2009-2010), do Partido Democrático do
Japão (PDJ) 5, com uma nova pauta de governo. Hatoyama defendia que o Japão adotasse uma
postura regionalista, aproximando-se da China e da Coreia do Sul. Além disso, tinha como
prioridade a revisão da presença militar dos EUA no Japão, especialmente, a realocação das bases
americanas em Okinawa. Os EUA, no entanto, recusaram-se a se retirar de Okinawa, o que levou
à renúncia de Hatoyama (BRITES, 2018; VISENTINI, 2011).

5
O PDJ nasceu de um movimento antiPLD que emergiu nos anos 1990. O PDJ tinha como uma das metas principais estabelecer
um novo modelo de negócios na economia japonesa, segundo o qual Tóquio deveria aproximar-se dos vizinhos.

14
Barack Obama chegou ao poder em 2009 e estava na presidência dos EUA quando houve a
recusa acerca da retirada. A sua prioridade, todavia, estava no Oriente Médio. O presidente
democrata tinha a Guerra do Afeganistão e a Guerra no Iraque como principal desafio da política
externa, por isso, em um primeiro momento, focou desengajar o país desses conflitos. Por isso, a
prioridade geopolítica do seu mandato recaiu sobre o Oriente Médio e a Ásia Central. Em relação
à Ásia, esse quadro significou um distanciamento dos EUA (PECEQUILO, 2009). Dessa forma,
coube à então secretária de Estado Hillary Clinton o papel de gerir os assuntos relativos à região.
Nesse primeiro momento, portanto, a política externa dos EUA para a região foi reativa, e foram
mantidas as iniciativas principais que vinham sendo adotadas pelo governo Bush.
No governo de Naoto Kan (2010-2011), as relações exteriores do Japão foram marcadas pela
mudança de postura dos EUA, que, a partir do segundo ano de mandato de Obama, adotou uma
política ativa para a região. Naquele ano, Robert Gates, então secretário de Defesa; e Hillary Clinton
visitaram Hanoi com vistas a aprofundar a aproximação com o Vietnã. Essas visitas representam o
início da política do “pivô asiático”, estabelecido com vistas a contrabalançar o crescimento chinês.
Conforme Clinton (U.S. DEPARTMENT OF STATE, 2010), durante o Fórum Regional da Asean,

[O]s Estados Unidos, como qualquer nação, têm um interesse nacional na


livre navegação, no livre acesso às áreas marítimas comuns da Ásia e no
respeito ao direito internacional no Mar do Sul da China. [...][O]s Estados
Unidos apoiam um processo diplomático colaborativo por parte de todos
os requerentes para que se resolvam as várias disputas territoriais sem
coerção. Nós nos opomos ao uso ou ameaça do uso da força por qualquer
requerente (U.S. DEPARTMENT OF STATE, 2010).

Essa postura dos EUA foi convergente com as preocupações do Japão naquele período. Apesar
de esse período ser marcado pela cooperação entre Japão e China, o incidente entre barcos
pesqueiros chineses e a guarda costeira japonesa nas ilhas Senkaku-Diaoyu em 2010 tensionou as
relações de Tóquio e Pequim. Diante do incidente, o governo dos EUA reafirmou a sua aliança
com o Japão. Desse modo, Washington afirmou que apoiava a reivindicação japonesa, visto que
essas ilhas estão sob controle administrativo efetivo do Japão (BRITES, 2016).

15
Em 2011, um terremoto de 9 graus de magnitude atingiu o nordeste do Japão e provocou um
tsunami que atingiu a costa do país. Esse desastre contribuiu para o acidente nuclear em Fuskushima.
Os EUA enviaram auxílio para o Japão por meio da Operação Tomodachi. Segundo Iokibe (2017),

Um grande esforço de socorro, conhecido como Operação Tomodachi, foi


rapidamente colocado em ação pelas forças armadas dos EUA. Esta foi uma
operação em grande escala que envolveu mais de 24.500 militares, 24 navios
de guerra e 189 aeronaves durante o pico da operação, além de quase US$ 80
milhões em ajuda do governo dos Estados Unidos. As doações do setor
privado americano – indivíduos, empresas e organizações privadas, etc. –
totalizaram US$ 736,9 milhões e é considerada a quinta maior doação privada
da América na história, bem como a terceira maior para um país estrangeiro,
e também o maior para uma nação desenvolvida [...]. Esse número
demonstrou claramente que a relação EUA-Japão não era apoiada apenas por
questões de segurança nacional. O apoio entusiástico e a cooperação
demonstrados pela América no momento do desastre fortaleceram ainda mais
as relações EUA-Japão 6 (IOKIBE, 2017, p. 251).

Como um dos resultados da crise após o tsunami, Shinzo Abe (2012-2020) chegou ao poder.
O novo primeiro-ministro mantinha uma retórica com forte tom nacionalista e a favor de maior
proatividade japonesa no Leste asiático. Entre os lemas, destacam-se “o Japão está de volta” e
“rejuvenescer o Japão” (BRITES, 2018).
Durante o governo de Abe, houve um notável aumento das capacidades nacionais de defesa
do Japão e um esforço por uma reforma da política de segurança. Desde a II Guerra Mundial, o
país foi restringido de exercer política de segurança de modo autônomo, a qual vinha sendo limitada
pela Constituição. Dessa forma, propôs uma reforma voltada a eliminar essa e outras limitações,
apesar da falta de apoio popular.

6
Tradução nossa. Excerto original: “A massive relief effort, known as Operation Tomodachi, was quickly put into action by
US armed forces. This was a large-scale operation that involved more than 24,500 service members, 24 naval ships, and
189 aircraft during the peak of the operation, as well as nearly US$ 80 million in US government aid. Donations from the
American private sector – individuals, companies, and private organizations, etc. – totaled US$ 736.9 million and is believed
to be America’s fifth-largest private donation in history, as well as the third largest to a foreign country, and also the largest
to a developed nation (JCIE 2014). This figure clearly demonstrated that the US-Japan relationship was not supported merely
by national security concerns. The enthusiastic support and cooperation shown by America at the time of the disaster
further strengthened US–Japan relations” (IOKIBE, 2017, p. 251).

16
Além disso, buscou um aprofundamento da aliança militar com os EUA, bem como com
vizinhos como a Austrália e a Índia. Entre as medidas, retomou o Encontro Quadrilateral sobre
Cooperação Regional (Quad) que inclui os EUA, a Índia, a Austrália e o Japão. O Quad trata de
questões militares e envolve a realização de exercícios militares conjuntos (PANDA, 2017). Essa
iniciativa era uma reação à China e à assertividade de Pequim na região. Segundo Brites (2018),

Um dos principais objetivos era o isolamento e o cercamento da China,


que aos olhos do Japão representa uma ameaça tanto econômica quanto
militar. Nesse contexto, Tóquio forneceu equipamento militar e apoio
financeiro a partir da reforma da política oficial de auxílio financeiro ao
exterior (Official Development Assistance – ODA), o que permitiu sua
utilização estratégica em países com divergências com Pequim, como
Filipinas e Vietnã. (BRITES, 2018, p. 194).

Com os EUA, o Japão procurou reforçar a relação de cooperação. Quer dizer, a estratégia era
assentada em uma ação dupla. De um lado, o país procurava desenvolver as suas capacidades
militares de modo autônomo, ampliando a sua capacidade de atuação em termos securitários. De
outro, buscou dissipar quaisquer incertezas nas relações bilaterais com Washington. Os EUA viram
a mudança de postura adotada pelo Japão de modo positivo. Afinal, as relações bilaterais têm
enfrentado um contexto adverso na última década, por isso a aliança EUA-Japão se configura como
um dos pilares da estabilidade regional. O crescimento da China é um dos desafios para os dois
aliados e tem sido um tema prioritário nas relações bilaterais no século XXI.
O balanço das relações Japão-EUA mostra que elas foram basilares para o equilíbrio regional.
Desde o século XIX, o Japão e os EUA estiveram inseridos na definição dos rumos da região. A
confrontação na II Guerra Mundial foi o ápice das divergências e da competição entre os dois países,
porém, a partir desse período, ensejou-se uma relação especial, que auxiliou a reconstrução do Japão
e a ascensão de Tóquio como uma potência global. No final e no pós-Guerra Fria, o Japão continuou
sendo central para os EUA, apesar de, em alguns episódios, como nos Acordos de Plaza, Washington
ter exercido pressão sobre Tóquio e minado a capacidade do Japão de manter a sua trajetória de
crescimento. No século XXI, por fim, observa-se que a aliança Japão-EUA tem buscado reestruturar-
se. Os desafios apresentados pela ascensão da China, fator que muda o equilíbrio regional, têm
implicado mudanças na política externa dos dois países. Em que pese tratar-se de um processo
inconcluso, em disputa, a aliança bilateral seguirá sendo crucial para a ordem internacional.

17
Relações econômicas
Após a breve contextualização dos antecedentes históricos e do âmbito político-diplomático
e securitário das relações Tóquio-Washington, a terceira unidade do módulo 1 apresenta alguns dos
aspectos mais importantes das conexões econômicas, de significativo peso para o relacionamento
bilateral e para a formulação de política externa japonesa. Embora existissem relações comerciais
entre o Japão e os EUA mesmo antes da II Guerra Mundial, foi durante a Guerra Fria que essas
relações ganharam peso.
A importância do Japão para a estratégia de segurança dos EUA no Leste asiático contribuiu
para que o país fosse integrado à governança econômica ocidental. No processo de apoio à
reconstrução asiática, os EUA lançaram o Plano Colombo 7 (BANGSBERG, 1959). Apenas após a
Guerra da Coreia (1950-1953), o Japão foi integrado ao plano. Mais do que isso, como parte dessa
iniciativa de tornar Tóquio um dos pilares da defesa na região, Washington abriu o seu mercado
interno para os produtos japoneses e permitiu a concessão de acesso à tecnologia americana por
parte das empresas japonesas (VISENTINI, 2011; ARRIGHI, 1996).
A partir dos anos 1960, o Japão passou a crescer economicamente de modo vertiginoso.
Como demonstra o gráfico 1, a seguir, a década de 1960 ficou marcada por um crescimento
muito acentuado, com o país conseguindo taxas de crescimento acima de 10% em quase toda
a década, exceto os anos de 1962, com 8,90%; de 1963, com 8,74%; e de 1965, com 5,82%.
Esse crescimento se estendeu por toda a Guerra Fria, apesar de, a partir de meados dos anos
1970, o patamar de crescimento ter caído significativamente. Esse processo de crescimento da
economia japonesa foi pautado pela internacionalização da economia, que integrou o seu
parque produtivo aos vizinhos asiáticos.

7
O Plano Colombo tinha como objetivo fortalecer a cooperação econômica do Ocidente com os países da Ásia-Pacífico e
estava integrado à estratégia dos EUA no pós-II Guerra Mundial. Inicialmente, o foco do plano eram os países do Sudeste
asiático; depois, foi expandido para o Japão também.

18
Gráfico 1 – Crescimento anual do PIB (%) do Japão (1961-1989)

Fonte: World Bank (2021)

A recuperação japonesa levou a que, entre os anos 1960 e 1980, houvesse uma tendência de
aumento do déficit comercial dos EUA em relação ao Japão (OLIVEIRA; MIYAZAKI, 2018). Esse
quadro contribuiu para que existissem atritos recorrentes entre Tóquio e Washington. O Japão
passou a ser um competidor da economia dos EUA, principalmente no âmbito comercial. Em
virtude disso, segundo Oliveira e Miyazaki (2018, p. 96),

Para enfrentar os desequilíbrios do comércio bilateral com o Japão, os


Estados Unidos implantaram políticas que tinham como objetivo diminuir
a expansão das exportações japonesas ao mercado dos Estados Unidos [...].
Por exemplo, os Estados Unidos negociaram com o Japão, restrições
“voluntárias” das exportações japonesas aos Estados Unidos, maior
liberalização das importações por parte dos japoneses, o acesso mais livre
de investimentos americanos no Japão.

Essas disputas não se restringiam ao âmbito tarifário, incluía barreiras não tarifárias e medidas
regulatórias do governo japonês tomadas no âmbito doméstico. As medidas que o governo japonês
adotou para estimular o mercado interno foram alvo de críticas pelos EUA (OLIVEIRA;
MIYAZAKI, 2018; COOPER; MANYIN, 2013). Desse modo, em 1985, é estabelecido o Acordo
de Plaza, o qual depreciou a moeda americana em face do marco alemão e do iene japonês. Essa foi
uma medida para aumentar a competitividade dos EUA na economia internacional. Além desse
acordo, na sequência, Tóquio e Washington estabeleceram uma série de arranjos bilaterais, tais

19
como o Diálogo Market-Oriented Sector-Specific Talks 8 (Moss) de 1985, que tinham como objetivo
redefinir a política comercial bilateral. Ao longo dos anos 1990, a parcela do déficit comercial dos
EUA referente ao Japão foi diminuindo. Em contraposição, como demonstra o gráfico 2, a seguir,
a China foi assumindo a maior parcela do déficit comercial dos EUA.

Gráfico 2 – Parcela do déficit comercial total dos EUA (1989-2007): RPC, Japão e o restante do
Leste asiático

Fonte: Adib (2009)

Como demonstra a tabela 1, a seguir, as exportações japonesas para os EUA continuaram


crescendo até 1995. Após esse período, apesar de alguns anos de crescimento significativo no
volume de comércio, como 2005 e 2006, houve variações. Entre 2015 e 2019, houve um pequeno
ciclo de crescimento. As exportações dos EUA para o Japão apresentaram significativo crescimento
em relação ao início dos anos 1990, porém, em geral, se mantêm em um mesmo patamar.

8
Market-Oriented Sector-Specific Talks (Moss) tentaram reduzir as barreiras comerciais japonesas e promover o aumento do
acesso dos EUA e de outras exportações estrangeiras ao Japão. A estratégia de negociação do Moss se concentrou na
identificação e remoção de barreiras tarifárias e não tarifárias nos setores japoneses selecionados, e não buscou definir
metas comerciais ou cotas específicas (GAO, 1988).

20
Tabela 1 – Comércio Japão-EUA (1991-2020)

exportações dos EUA para Japão exportações do Japão para os EUA


ano ano
(US$ milhões) (US$ milhões)

1991 48,125.3 1991 91,510.6

1992 47,812.7 1992 97,413.7

1993 47,891.5 1993 107,246.4

1994 53,487.6 1994 119,155.8

1995 64,342.7 1995 123,479.3

1996 67,606.6 1996 115,187.1

1997 65,548.6 1997 121.663.3

1998 57,831.0 1998 121,845.1

1999 57,466.0 1999 130,863.8

2000 64,924.4 2000 146,479.4

2001 57,451.5 2001 126,473.1

2002 51,449.2 2002 121,428.6

2003 52,004.3 2003 118,036.6

2004 53,568.7 2004 129,805.2

2005 54,680.6 2005 138,003.7

2006 58,459.0 2006 148,180.8

2007 61,159.6 2007 145,463.3

2008 65,141.8 2008 139,262.2

2009 51,134.2 2009 95,803.7

2010 60,471.9 2010 120,552.1

2011 65,799.7 2011 128,927.9

2012 69,975.8 2012 146,431.7

2013 65,237.4 2013 138,575.3

2014 66,891.8 2014 134,504.5

21
exportações dos EUA para Japão exportações do Japão para os EUA
ano ano
(US$ milhões) (US$ milhões)

2015 62,387.8 2015 131,445.5

2016 63,247.0 2016 132,000.4

2017 67,603.4 2017 136,411.3

2018 75,149.3 2018 142,241.9

2019 74,376.5 2019 143,565.5

2020 64,097.7 2020 119,512.0

Fonte: elaborado pelo autor com base em United Census Bureau (2021)

Segundo o Observatory of Economic Complexity (2021), em 2019, os EUA foram o principal


destino das exportações japonesas, com 19,3% do total de exportações. A China foi o segundo principal
destino, absorvendo 18,3% das exportações japonesas. Em termos de importação, a China é o principal
parceiro comercial do Japão, sendo responsável por 23,2% do total de importações. Os EUA, por sua
vez, é o segundo maior exportador para o Japão: 10,7% das importações japonesas vêm dos EUA (OEC,
2021). A partir da perspectiva dos EUA, o Japão é o quarto principal destino das exportações,
representando 4,64% do total. Esse percentual coloca o Japão como o segundo principal destino para
as exportações americanas na Ásia, atrás apenas da China. Além disso, 5,64% das importações dos EUA
vêm do Japão (OEC, 2021). Isto é, na pauta comercial bilateral, os EUA são mais importantes para o
Japão, do que o Japão é para os EUA, o que gera certa dependência dessa relação bilateral para Tóquio.
Nos últimos anos, o Japão vem expandindo a sua política comercial. O país concluiu uma série
de Free Trade Agreements (FTAs), isto é, acordos de livre comércio; ou acordos de parceria econômica
que não incluem os EUA. O primeiro FTA foi celebrado em 2002, com Singapura. Entre os que
firmaram acordos com o Japão estão: Singapura; México; Malásia; Chile; Tailândia; Indonésia; Brunei;
Asean; Filipinas; Suíça; Vietnã; Índia; Austrália; Mongólia; Peru; União Europeia; e Reino Unido. A
busca por diversificar os parceiros é uma iniciativa do Japão para minimizar a perda de importância
relativa do país na economia mundial e o fracasso de iniciativas como a Trans-Pacific Partnership (TPP),
isto é, a Parceria Transpacífica.
A saída dos EUA da TPP durante o governo Trump (2017-2020) minou a expectativa do Japão
de que o acordo pudesse ser uma alavanca para a integração econômica na Ásia-Pacífico. Desse modo,
o Japão procurou refundar a iniciativa por meio do Acordo Abrangente e Progressivo para a Parceria
Transpacífica (ou TPP-11). A TPP-11 foi assinada em março de 2018 e incluía: Austrália; Canadá;
Japão; México; Nova Zelândia; Singapura; e Vietnã, a partir de 2019. A TPP-11 é uma iniciativa para
conseguir assegurar que alguns elementos da TPP original permanecessem ativos. Em relação à TPP, a
TPP-11 engloba menos países e tem menos força política e econômica. Nesse contexto, o Japão é a
principal economia do acordo (CRS, 2020).

22
Em 2020, o Japão entrou na Regional Regional Comprehensive Economic Partnership
(RCEP) 9 – isto é, Parceria Econômica Abrangente – liderada pela China, a fim de reduzir as
barreiras comerciais entre os membros. O êxito das negociações da RCEP foi facilitado pelo
fracasso da TPP, e a entrada do Japão no acordo ampliou a relevância da parceria. Para as relações
Japão-EUA, essa adesão do Japão à RCEP gerou temor em Washington de que os EUA possam
perder competitividade em termos comerciais, e a China ganhe mais força como principal parceira
do Japão (AKIMOTO, 2020; CRS, 2020).
A análise da cooperação econômica entre o Japão e os EUA demonstra que as relações
bilaterais são importantes para os dois países. Apesar da cooperação entre ambos ter sido crucial
para o desempenho econômico dos dois, ao longo do período discutido, houve disputas comerciais
entre eles. A recuperação japonesa nas décadas pós-II Guerra Mundial trouxe consigo a ampliação
da participação do Japão no comércio internacional e o crescente déficit dos EUA no comércio
bilateral. Esse quadro levou a uma série de atritos e de pressão por parte de Washington para que o
Japão mudasse a sua política comercial. Após a Guerra Fria, com a perda de vigor da economia
japonesa, os conflitos bilaterais perderam força.
Mais recentemente, a TPP foi um dos temas que mobilizou as relações bilaterais. A parceria
oferecia a possibilidade de convergência maior entre os dois países, porém, com a saída dos EUA,
o acordo naufragou. O Japão, em resposta, vem buscando diversificar as suas estratégias de inserção
econômica, por isso ampliou a rede de acordos econômicos pelo planeta e se aliou à iniciativa
chinesa RCEP. Apesar disso, as relações econômicas Tóquio-Washington continuam sendo
importantes para os dois países, principalmente para o Japão.

9
Os países que estão na RCEP são os seguintes: Austrália; Brunei; Camboja; China; Indonésia; Japão; Laos; Malásia;
Mianmar; Nova Zelândia; Filipinas; Cingapura; Coreia do Sul; Tailândia; e Vietnã.

23
Considerações finais
Este módulo tratou das relações bilaterais entre o Japão e os EUA, e a análise delas
evidenciou que, tanto para Washington quanto para Tóquio, as interações são cruciais para a
inserção internacional dos dois países.
Desde o início das interações no século XIX, as relações bilaterais se estruturaram como um
dos elementos prioritários da formação política no Leste asiático. Nas primeiras décadas do século
XX, os interesses sobrepostos do Japão e dos EUA levaram à conflagração pela hegemonia regional
na Ásia. A derrota japonesa e a subsequente ocupação dos EUA redefiniram o destino do Japão e as
relações internacionais do Leste asiático. Ao longo da Guerra Fria, a cooperação bilateral ensejou a
reconstrução do Japão e a ascensão de Tóquio ao posto de maior economia asiática no período e
segunda maior economia do planeta até os anos 2000. Esse quadro, inclusive, gerou atritos
comerciais entre os dois países. Além disso, a presença militar americana em solo japonês é um
elemento crucial para o balanço regional na Ásia.
Por fim, a aliança entre o Japão e os EUA tem sido estratégica para a contenção da China
promovida por Washington. O crescimento chinês tem sido um dos tópicos que norteiam as
relações bilaterais e deve pautar as interações bilaterais nos próximos anos. Dada a importância e a
capacidade dos dois países, bem como o papel do Japão para a hegemonia dos EUA, o futuro dessas
relações bilaterais será crucial para definir o equilíbrio global de poder.

24
MÓDULO II – RELAÇÕES JAPÃO-REPÚBLICA
POPULAR DA CHINA

O segundo módulo do curso busca compreender o complexo e multifacetado relacionamento


entre o Japão e a República Popular da China a partir do final da Guerra Fria. O relacionamento
entre os vizinhos China e Japão é milenar e tem os seus primeiros traços ligados ao período histórico
do chamado Império Tributário Chinês. Por estarem inseridos em um mesmo contexto regional,
os dois países comungam de uma história compartilhada. Ao longo do tempo, as relações bilaterais
oscilaram entre períodos de cooperação e conflito. As relações milenares deixaram legado e
influência em diversos aspectos da organização da sociedade japonesa, por isso a análise dessa relação
é crucial para compreender a inserção internacional do Japão contemporâneo.
Historicamente, desde o fim do padrão de relações tributárias, a China e o Japão passaram
por processos de transformação internos e diferentes estratégias de inserção externa. A
proximidade entre as duas entidades políticas faz com que ambos os países se considerem
mutuamente nos seus cálculos estratégicos, dotando o relacionamento de complexidade e
causando, ora, convergências, ora, divergências.
Após a II Guerra Mundial (1939-1945), ocorreram a fundação da República Popular da
China (1949) e a adoção da nova Constituição japonesa (1947). Em 1972, estabeleceram-se as
relações diplomáticas entre os dois países. Desde então, as estruturas domésticas e internacionais
que originalmente moldaram as relações bilaterais, novamente, passaram por mudanças
significativas. Internacionalmente, houve o fim da ordem bipolar da Guerra Fria, durante a qual
se deu a chamada “Era de Ouro” do relacionamento triangular Pequim-Tóquio-Washington. O
fim da Guerra Fria inaugurou a unipolaridade dos EUA, que passou a ganhar contornos
multipolares na segunda década do século XXI. Domesticamente, Japão e China também
passaram por transformações profundas que resultaram no rápido crescimento das suas
economias, primeiro no Japão; depois, na China.
O módulo está estruturado em quatro unidades. A primeira trata dos antecedentes das
relações bilaterais até o final da Guerra Fria. A segunda trata das relações político-diplomáticas e
securitárias desde o final da Guerra Fria, avaliando as transformações que o período de globalização
trouxe para a política regional do Leste Asiático. A terceira faz uma análise das relações econômicas
e comerciais entre a China e o Japão. Por serem duas das três principais economias do planeta, a
avaliação do intercâmbio comercial e a relação de investimento entre os dois países são elementos
cruciais para a compreensão das dinâmicas geoeconômicas na Ásia-Pacífico. Por fim, a quarta
unidade faz um balanço de dois tópicos especiais que importam para as relações entre a China e o
Japão, nomeadamente, a situação na península coreana e a situação de Taiwan.

Antecedentes das relações Japão-China


As relações entre o Japão e a China são históricas. As duas civilizações compartilham o mesmo
espaço geográfico, especialmente o espaço marítimo, o que os levou a compartilhar uma extensa
história de trocas culturais, comerciais, de cooperação e de competição também. Ao longo dos
milhares de anos de convivência, muitos conflitos ocorreram, o que levou a certa rivalidade histórica
entre os povos. Durante o apogeu do Império Chinês, 10 quando a China se colocou como centro
de um sistema regional, o Japão se manteve alheio, rivalizando com o chamado império do meio.
Àquela altura, a China era um império pujante e o centro de um sistema tributário que aproximava
as demais civilizações no Leste asiático. O Japão, no entanto, isolava-se dele.

10
Destaca-se o período em que a Dinastia Qing (1644-1912) ampliou os territórios controlados pela China ao longo dos
séculos XVII e XVIII.

26
Figura 1 – Nordeste asiático em 1900

Fonte: Time Maps (2021)

No século XIX, o avanço do capitalismo e das potências ocidentais em direção à Ásia


precipitou mudanças significativas no sistema regional asiático. O Leste asiático não estava inserido
na ordem capitalista colonial que prevalecia no Ocidente até então. Ao contrário de outras regiões,
como as Américas, que foram colonizadas já nos séculos XV e XVI, a Ásia se manteve, grosso modo,
apartada da divisão internacional do trabalho até o século XIX. Se, de um lado, para a China, essas
mudanças representaram a progressiva desestruturação do sistema imperial,11 que viria a culminar
na queda do império no início do século XX, para o Japão foi o começo de mudanças que levaram
à Restauração Meiji12 e à sua ascensão como potência industrializada, por isso o avanço das
potências coloniais reestruturou o contexto regional asiático.

11
A Guerra do Ópio (1839-1842), que contrapôs a China e o Império Britânico, marca o início do processo de colonização britânica.
Embora a China não tenha sido formalmente colonizada por uma única grande potência, a assinatura do Tratado de Nanquim
(1842), que colocou fim ao conflito, representou o início de uma série de tratados desiguais que marcam o processo de domínio
das potências ocidentais sobre a China. Esse período dá início ao chamado “século de humilhação” chinês.
12
A restauração Meiji foi um processo de restituição dos poderes do imperador do Japão em 1868. Em termos efetivos,
representou o fim do período Tokugawa, do xogunato, e do sistema feudal que preponderava no Japão.

27
A Restauração Meiji favoreceu uma transformação profunda da política e da economia
japonesas, assim como o fim do sistema feudal. Entre as mudanças adotadas pelos Genro, 1314
destacam-se a centralização político-administrativa, a busca por uma economia industrial e a
modernização das forças armadas. O Japão replicou o modelo ocidental, adaptado ao contexto
histórico da sociedade japonesa, o que impulsionou uma transformação na matriz produtiva e no
sistema financeiro do país 15 (VISENTINI, 2012). A partir disso, modernizou-se e passou a competir
com as potências ocidentais. Para as relações bilaterais, a Restauração Meiji representou um
realinhamento regional (SUMIKAWA, 1999; HALL, 1985).
Essas transformações culminaram em um processo de expansão regional do Japão. Um dos
marcos desse processo foi a I Guerra Sino-Japonesa (1894-1895). 16 O Japão saiu vitorioso e
consolidou a sua superioridade tecnológica, militar e econômica sobre a China no Leste asiático.
Como resultado, segundo o Tratado Shimonoseki, a China foi obrigada a reconhecer a
independência da Coreia, que passou a ser esfera de influência do Japão, a ceder Formosa/Taiwan,
as ilhas pescadores e Liadong 17 – Manchúria meridional – ao Japão. Além disso, a China teve de
pagar uma indenização e a abrir os seus portos – Shashi, Chongqing, Suzhou e Hangzhou – ao
comércio com o Japão (BEASLEY, 1992). Um dos efeitos da guerra entre a China e o Japão foi a
ampliação das disputas territoriais entre as potências. Além da península coreana, a região da
Manchúria se tornou objeto de disputas, o que impulsionou a eclosão da Guerra Russo-Japonesa 18
(1904-1905). Apesar do contexto turbulento, as relações entre a China e o Japão não eram só de
rivalidade, pois havia intercâmbio intelectual e cultural.
No período entreguerras, as relações bilaterais enfrentaram a sua fase mais crítica.19 Em 1931,
o Japão ocupou a região da Manchúria, o que marcou o início do período de maior atrito entre os
dois países. Após um período de uma série de atritos e escaramuças entre eles, eclodiu a II Guerra
Sino-Japonesa (1937-1945), com a invasão japonesa da China. A guerra trouxe profundas marcas

13
Genro é uma designação não oficial aos estadistas que deram à origem ao Japão moderno. São restauradores que
impulsionaram as transformações ocasionadas pela restauração Meiji.
14
Além dessas mudanças, foi abolido o sistema de castas e de privilégios que beneficiava os samurais.
15
Ademais, o Japão implementou uma reforma profunda do sistema educacional, fez reforma agrária e modernizou a
sua infraestrutura.
16
A I Guerra Sino-Japonesa contrapôs a Dinastia Qing e o Império do Japão e durou um pouco mais de oito meses.
17
A Península Liadong foi devolvida à China após a intervenção tripla de Rússia, França e Alemanha em 1895.
18
A guerra entre o Império Japonês e o Império Russo terminou com a vitória do Japão. Foi a primeira vitória de uma
potência asiática sobre uma potência europeia. Segundo o Tratado de Portsmouth, sob mediação dos EUA, a Rússia
reconheceu a Coreia como esfera de influência do Japão, concedeu os seus arrendamentos em Port Arthur e na Península
de Liaodong, saiu da Manchúria e cedeu a metade das Ilhas Sacalinas, que havia anexado em 1875.
19
Um marco do crescimento das rivalidades entre a China e o Japão foi o episódio das 21 demandas durante a I Guerra
Mundial. Estas foram um conjunto de exigências feitas pelo Império do Japão, as quais incluíam a cessão de territórios
chineses, entre outras reivindicações consideradas agressivas pela China.

28
para as relações bilaterais e motivou uma série de pedidos de reparação histórica por parte da China
contra o Japão desde então. O conflito estava inserido no contexto da II Guerra Mundial. A Guerra
no Pacífico acabou levando à derrota do Japão e à destituição do projeto regional do império
(PAINE, 2012). A China, por sua vez, após o final da II Guerra Mundial, enfrentou uma guerra
civil que levou o Partido Comunista Chinês (PCCh) ao poder em 1949.
Ao longo da Guerra Fria, as relações sino-japonesas passaram por três fases distintas. Na
primeira fase (1945-1952), as relações bilaterais quase não existiram. Isso se deve ao fato de que o
Japão, ocupado pelos EUA, bem como a China, no meio a uma guerra civil e no início de um novo
sistema político, estavam voltados aos seus contextos internos. Nesse período, a Guerra da Coreia
(1950-1953) foi fundamental para definir o equilíbrio regional. A partir de então, o Japão se
consolidou como aliado prioritário dos EUA na estratégia de contenção da URSS.
A segunda fase (1952-1972) foi marcada por relações informais e pela percepção mútua de
que era fundamental manter boas relações bilaterais. A ideia era criar um intercâmbio entre os dois
países na esfera cultural e econômica. Dessa forma, a partir dessa cooperação mais específica,
esperava-se que as relações bilaterais evoluíssem para a cooperação política (TOGO, 2005; IRIYE,
1990; JOHNSON, 1986). Em 1955, as delegações da China e do Japão atenderam à Conferência
de Bandung, 20 o que favoreceu um alinhamento acerca da visão de mundo dos dois países (IRIYE,
1990). Além disso, em termos materiais, nessa fase, começou a se observar um crescimento do
comércio bilateral entre eles. Importa destacar que, mesmo que as relações tenham melhorado ao
longo do período, isso não significa que apresentaram uma trajetória linear de melhoria. As crises
no estreito 21 de Taiwan (1954-1955 e 1958), limitaram a aproximação entre os dois países.
A década de 1970 trouxe novas perspectivas para as relações bilaterais, e a mudança na política
externa dos EUA para a Ásia durante o governo de Richard Nixon (1969-1974) ensejou a terceira
fase das relações entre Pequim e Tóquio. A aproximação dos EUA com a China e o fim do padrão
ouro-dólar 22 impactaram decisivamente as relações regionais e impuseram um novo contexto para
o Japão (HOOK et al., 2005). Essa fase é denominada “Era de Ouro” das relações entre China-
EUA-Japão que dura até 1989 (VOGEL; YUAN; TANAKA, 2002). Em termos práticos, essa fase
foi marcada pelo avanço do regionalismo, o que culminou na normalização das relações bilaterais e
no lançamento do Comunicado Conjunto de 1972. A aproximação entre a China e o Japão ocorreu
durante o governo do primeiro-ministro japonês Kakuei Tanaka (1972-1974). Para o Japão, isso
permitiu ao país alavancar o processo de subcontratação – ou segmentação da sua produção

20
A Conferência de Bandung – também chamada de Conferência Afro-Asiática – reuniu 29 países, na sua maioria estados recém-
independentes. Ela marcou o nascimento dos movimentos dos países não alinhados e tinha como mote a reação ao colonialismo.
21
As crises no estreito de Taiwan foram pequenos conflitos ou incidentes que confrontaram a República Popular da China
e a República da China. As disputas tinham como objeto a disputa sobre as ilhas de Quemoy, Matsu e Ichiang.
22
O fim padrão ouro-dólar representa o término do lastro da moeda americana em reservas de ouro. Esse anúncio por
parte dos EUA marcou uma nova fase da hegemonia do dólar.

29
industrial no exterior – e obter um parceiro econômico com recursos naturais relevantes,
especialmente, petróleo. Além disso, dispôs-se a renunciar a reparações financeiras de guerra
(KISSINGER, 2011). A China, por sua vez, estabeleceu, três condições: “(1) o reconhecimento de
Pequim como único governo da China; (2) reconhecimento da indivisibilidade do território chinês;
(3) o reconhecimento de que Taiwan era uma província da China” (BRITES, 2018, p. 51).
O Comunicado Conjunto do Governo do Japão e do Governo da República Popular da
China de 1972 estabelecia, entre outros pontos, que

Apesar das diferenças em seus sistemas sociais existentes entre os dois países,
os dois países devem, e podem, estabelecer relações de paz e amizade. [...]
1. A situação anormal que existiu até agora entre o Japão e a República
Popular da China cessa na data em que este Comunicado Conjunto
é publicado.
2. O Governo do Japão reconhece esse Governo da República Popular
da China como o único Governo legal da China.
3. O Governo da República Popular da China reitera que Taiwan é uma
parte inalienável do território da República Popular da China. O
Governo do Japão compreende e respeita totalmente esta posição do
Governo da República Popular da China e mantém firmemente a sua
posição de acordo com o Artigo 8 da Proclamação de Postdam.
4. [...] decidiram estabelecer relações diplomáticas a partir de 29 de
setembro de 1972. Os dois Governos decidiram tomar todas as
medidas necessárias para o estabelecimento e desempenho das funções
de embaixada um do outro em suas respectivas capitais, de acordo
com a lei e as práticas internacionais, e para trocar embaixadores o
mais rápido possível.
5. O Governo da República Popular da China [...] renuncia ao pedido
de reparação de guerra do Japão.
6. [...] concordam em estabelecer relações de paz perpétua e amizade
entre os dois países com base nos princípios de respeito mútuo pela
soberania e integridade territorial, não agressão mútua, não
interferência mútua nos assuntos internos, igualdade e benefício
mútuo e coexistência pacífica. Os dois governos confirmam que, em
conformidade com os princípios anteriores e os princípios da Carta
das Nações Unidas, o Japão e a China resolverão em suas relações
mútuas todas as controvérsias por meios pacíficos e se absterão de usar
ou ameaçar usar força.

30
7. A normalização das relações [...] não se dirige a nenhum terceiro país.
Nenhum dos dois países deve buscar a hegemonia na região da Ásia-
Pacífico e cada um se opõe aos esforços de qualquer outro país ou
grupo de países para estabelecer tal hegemonia.
8. O governo do Japão e o governo da República Popular da China
acordaram que, com vistas a solidificar e desenvolver as relações de
paz e amizade entre os dois países, os dois Governos entrarão em
negociações com o objetivo de concluir um tratado de paz e amizade.
9. [...] os dois Governos irão, conforme necessário e levando em
consideração as acordos não governamentais, entrar em negociações
com o objetivo de concluir acordos relativos a questões como
comércio, transporte marítimo, aviação e pesca (MOFA, 2021a).

O comunicado trouxe importantes bases para as relações bilaterais. Especialmente, a menção às


disputas territoriais, confirmadas pela citação à Declaração de Potsdam (1945), explicitam a ideia de
postergar a definição sobre essas divergências. A Declaração de Postdam (art. 8º) determinava que “Os
termos da Declaração do Cairo devem ser cumpridos, e a soberania japonesa deve ser limitada às ilhas
de Honshu, Hokkaido, Kyushu, Shikoku e às ilhas menores que determinarmos”. 23 (POTSDAM
DECLARATION, 1945). Ou seja, os territórios contestados, como as ilhas Senkaku (denominação
japonesa), ou Diaoyu (denominação chinesa) não seriam objeto de negociação naquele momento. Além
disso, outro ponto de destaque do comunicado foi a oposição “aos esforços de qualquer outro país ou
grupo de países para estabelecer tal hegemonia” (MOFA, 2021a) na Ásia-Pacífico.
Em 1978, a China e o Japão firmaram o Tratado de Paz e Amizade, que contava com cinco
artigos, os quais estabeleciam que

[Artigo I]
1. As Partes Contratantes desenvolverão relações de paz e amizade
perpétuas entre os dois países com base nos princípios de respeito
mútuo pela soberania e integridade territorial, não agressão mútua,
não interferência nos assuntos internos de cada um, igualdade e
benefício mútuo e coexistência pacífica.
2. [...] em conformidade com os princípios precedentes e com os
princípios da Carta das Nações Unidas, devem, nas suas relações
mútuas, resolver todos os litígios por meios pacíficos e abster-se de
usar ou ameaçar usar a força.

23
No original: “The terms of the Cairo Declaration shall be carried out and Japanese sovereignty shall be limited to the
islands of Honshu, Hokkaido, Kyushu, Shikoku and such minor islands as we determine (POTSDAM DECLARATION, 1945).

31
[Artigo II]
[...] nenhuma delas deve buscar a hegemonia na região da Ásia-Pacífico ou
em qualquer outra região e que cada uma se opõe aos esforços de qualquer
outro país ou grupo de países para estabelecer tal hegemonia.
[Artigo III]
[...] em conformidade com os princípios de igualdade e benefício mútuo e
não interferência nos assuntos internos uma da outra, envidar esforços para
desenvolver ainda mais as relações econômicas e culturais entre os dois
países e promover intercâmbios entre os povos dos dois países.
[Artigo IV]
O presente Tratado não afetará a posição de qualquer das Partes
Contratantes em relação às suas relações com terceiros países.
[Artigo V]
1. [...] O presente Tratado permanecerá em vigor por dez anos e, a partir
de então, continuará em vigor até ser denunciado de acordo com as
disposições do parágrafo 2.
2. Cada uma das Partes Contratantes pode, [...] com um ano de
antecedência, denunciar o presente Tratado no final do período inicial
de dez anos ou em qualquer momento posterior (MOFA, 2021b).

O acordo consolidou o avanço da cooperação bilateral. Pode-se dizer que foi reflexo da
crescente cooperação, da percepção mútua sobre os ganhos com a aproximação e da crescente
interdependência entre os dois países. Na ocasião da assinatura do acordo, Deng Xiaoping se tornou
o primeiro líder chinês a visitar o Japão em mais de dois mil anos de história.
Como desdobramento, a China e o Japão também assinaram o Acordo de Comércio de
Longo Prazo, de US$ 20 bilhões, que previa dobrar o comércio bilateral até 1985. Na sequência,
os dois países concordaram em estabelecer encontros ministeriais regulares a partir dos anos 1980.
Esse quadro impulsionou um incremento nas visitas entre os líderes da China e do Japão e no
aprofundamento das relações bilaterais (KIM, 1985).
Apesar da cooperação que começa a se aprofundar, a década de 1980 fez ressurgirem algumas
antigas disputas entre os dois países. 24 O crescimento econômico do Japão, aliado ao aumento dos
gastos com defesa, fez com que alguns setores políticos na China aumentassem a desconfiança em

24
Segundo Silva (2012, p. 30), “Durante a década de 1980, as questões históricas ressurgiram e perturbaram as relações
em algumas oportunidades. Em 1982, o Ministério da Educação japonês teria requisitado a troca da expressão ‘agressão’
por ‘avanço’ ao se referir à atuação japonesa durante a II Guerra Mundial, o que se provou falso. Em 1985, o primeiro-
ministro Nakasone visitou o Santuário Yasukini de forma oficial. Nesses acontecimentos, após os protestos vindos de
outros países asiáticos, especialmente China e Coreia do Sul, Nakasone optou por desculpar-se e prometer não repetir as
visitas. Em 1987, ainda ocorreria um incidente envolvendo a propriedade de uma república estudantil no Japão, dada pela
corte japonesa a Taiwan, o que gerou fortes protestos por parte do governo chinês”.

32
relação ao vizinho. Esse foi um período importante na transformação das relações bilaterais. Afinal,
a partir de 1978, Deng Xiaoping anunciou o projeto de modernização nas áreas de agricultura,
indústria, defesa e ciência e tecnologia. 25
No contexto regional, a China e o Japão estiveram envolvidos nos principais acontecimentos
daquela virada de década na região. Com isso, houve espaço para cooperação e preocupação conjunta.
A assinatura do Tratado de Paz Soviético-Vietnamita 26 (1978) e a Guerra Cambojana-Vietnamita27
(1978-1989) eram objetos de atenção conjunta (SOON, 1980). Como resultado desse processo de
acirramento das tensões regionais, a China invadiu o Vietnã em 1979, sem a oposição do Japão. Esse
episódio demonstra a concertação entre os dois vizinhos e a triangulação junto aos EUA. Nesse sentido,
a preocupação com a URSS aproximava Pequim e Tóquio. Segundo Kissinger (2011, p. 333),

A China invadira o Vietnã para “ensinar uma lição” ao país depois que as
tropas vietnamitas haviam ocupado o Camboja em reação a uma série de
choques na fronteira com Khmer Vermelho, que havia dominado o
Camboja em 1975, e numa derradeira busca do objetivo de Hanói de criar
uma Federação Indochinesa. A China fizera isso desafiando um tratado de
defesa mútua entre Hanói e Moscou, assinado menos de um mês antes. A
guerra fora extremamente custosa para as forças armadas chinesas, ainda
não plenamente restauradas das depredações da Revolução Cultural. Mas
a invasão serviu a seu objetivo fundamental: quando a União Soviética
fracassou em reagir, ela demonstrou a limitação de seu alcance estratégico.
Desse ponto de vista, pode ser considerado um momento decisivo na
Guerra Fria, embora isso não fosse plenamente compreendido na época. A
Terceira Guerra do Vietnã foi também o ponto alto da cooperação
estratégica sino-americana durante a Guerra Fria.

25
Esse processo ficou conhecido como “Quatro Modernizações”. Segundo Oliveira (2003), as reformas incluíam
transformações mais profundas da governança chinesa. “No XII Congresso do PCC (1982), Deng procurou preparar o
partido e o governo para a boa implementação da abertura ao exterior e as “Quatro Modernizações” (da agricultura, da
indústria, das forças armadas e das atividades de ciência e tecnologia), fixando-lhes para os anos 1980 uma agenda em
quatro pontos: (1) reestruturar a administração e a economia; (2) construir uma civilização socialista, cultural e
ideologicamente avançada; (3) coibir com firmeza atividades criminosas; e (4) corrigir o estilo de trabalho do partido”.
26
Em junho de 1978, a URSS e o Vietnã assinaram um Tratado de Amizade e Cooperação, e esse movimento isolou a
China no tabuleiro regional em face dos dois vizinhos comunistas. Cabe lembrar que a China e o Vietnã, nesse período,
estavam tendo atritos fronteiriços. Além disso, a URSS incluiu o Vietnã como membro pleno do Conselho para Ajuda
Econômica Mútua (Comecon). Essa mudança foi a peça central para a invasão vietnamita do Camboja, aliado chinês,
naquele mesmo ano (SOON, 1980).
27
A Guerra entre o Vietnã e o Camboja teve início após vários atritos fronteiriços entre os dois países. O Khmer vermelho
foi acusado pelo Vietnã de promover uma série de ataques na fronteira sudoeste do país. O Vietnã invadiu o Camboja e
derrotou o regime de Pol Pot (1975-1979).

33
A partir de 1981, o Japão deu início à transferência de recursos para a China por meio,
principalmente, do Official Development Assistance (ODA), isto é, Auxílio Oficial para o
Desenvolvimento (SILVA, 2015; FENG, 2005). Esse apoio fornecido pelo Japão foi crucial para a
construção de infraestrutura chinesa, como aeroportos, portos, ferrovias, energia elétrica,
comunicação, etc. (WU, 2008).
Em 1982, iniciou-se o mandato do primeiro-ministro Yasuhiro Nakasone (1982-1987), cuja
administração foi responsável pela busca por um maior protagonismo do Japão no cenário
internacional (UEHARA, 2018).

Nos anos 1980, o Japão ganhou destaque global como segunda maior
economia mundial e por se tornar o principal país fornecedor de Ajuda
Oficial para o Desenvolvimento [...]. O Japão também superou os EUA
como líder no setor bancário, tecnológico e de manufaturas. Esses fatores
pareciam impulsionar a política externa de Tóquio para um
posicionamento mais afirmativo e de aumento de sua independência em
várias questões, diferenciando-se das práticas até então desenvolvidas
(UEHARA, 2018, p. 67).

O crescimento do protagonismo japonês redimensionou a geopolítica asiática. Como visto,


esse período trouxe alguns atritos entre o Japão e os EUA. Apesar disso, permitiu que a China e o
Japão cooperassem mesmo nesse cenário de transformações na ordem internacional. Desse modo,
pode-se dizer que esse período ficou marcado pela propensão à cooperação nos dois governos, apesar
de eventuais desconfianças mútuas que persistiam.
A Guerra Fria representou um marco de refundação das relações regionais. Para o sistema
regional asiático, representou uma retomada de relações bilaterais entre os países da região, apesar
das disputas vinculadas à bipolaridade sistêmica. Para as relações bilaterais entre o Japão e a China,
o período ficou marcado pela retomada de contatos oficiais e pela construção de um processo de
cooperação ativa na região. O final da Guerra Fria e as mudanças profundas na ordem internacional
trouxeram novas perspectivas para essas relações. O advento da queda da URSS acabou
contribuindo para que a triangulação de ouro entre o Japão, a China e os EUA entrasse em crise.
Afinal, com a crise de Moscou, o inimigo comum deixava de existir. A partir disso, Pequim e
Tóquio entraram em uma nova fase de relacionamento.

34
Relações político-diplomáticas e securitárias
Esta unidade trata das relações político-diplomáticas e securitárias entre a China e o Japão.
O marco do fim da Guerra Fria para as relações entre o Japão e a China é o incidente da Praça da
Paz Celestial – Tiananmen Square – em 1989. O incidente foi considerado um marco, pois mostra
a tentativa de cooperação entre o Japão e a China diante das pressões advindas dos EUA. Em outras
palavras, mostra que, diante do novo contexto global, no qual os EUA emergiam como única
superpotência, Tóquio e Pequim viam na aproximação bilateral uma via para reagir ao avanço da
hegemonia dos EUA.
Esse novo contexto, também marcado pela globalização, foi definido por Visentini
(2011; p. 69) da seguinte forma

O declínio e, finalmente, a desintegração da URSS puseram fim à Guerra


Fria e ao sistema bipolar, abrindo uma nova era de incertezas na construção
de uma nova ordem mundial, numa conjuntura marcada pelo acirramento
da competição econômico-tecnológica mundial. O fenômeno da
globalização passou, cada vez mais, pela regionalização, isto é, pela
formação de polos econômicos apoiados na integração supranacional em
escala regional, em meio a profundos efeitos desestabilizadores na periferia.
É neste quadro de reordenamento mundial que a Ásia Oriental emergia
como uma nova fronteira econômica [...] agora centrada no Pacífico, em
substituição à do Atlântico (VISENTINI, 2011, p. 69).

Nesse novo cenário, a pressão americana sobre o governo chinês aumentou. Pode-se dizer que
a aliança ocasional entre Washington e Pequim deixou de ser prioridade para os EUA. Dessa forma,
isso impactou as relações entre a China e o Japão. Afinal, a aproximação entre os vizinhos asiáticos
foi viabilizada pela concertação com Washington nos anos 1970.
O Japão apoiou a China diante das pressões do Ocidente. Em 1992, o imperador Akihito
visitou a China. Nesse ano, os dois países mantiveram visitas oficiais entre os chefes de Estado e
diálogos de alto nível político. Em 1991, o primeiro-ministro Toshiki Kaifu (1989-1991) visitou
Pequim. Essa visita foi um sinal que o Japão dava em defesa do fim do isolamento chinês em face
das sanções do Ocidente. Kaifu foi o primeiro líder de uma das grandes potências a fazer uma visita
desde o incidente de Tiananmen. A sua visita durou quatro dias e marcou um retorno às relações
normalizadas (CHENAULT, 1991).

35
Apesar disso, esse contexto promoveu mudanças na política interna japonesa. Uma dessas
correntes defendia uma posição mais assertiva no sistema internacional, com uma revisão da atuação
do país na promoção da segurança coletiva e a busca por maior cooperação com os vizinhos. Em
alguma medida, diz respeito à ideia de que o Japão deveria adotar uma postura mais autônoma em
relação aos EUA (UEHARA, 2018). Nesse contexto, Tóquio apoiou a criação da Apec e do Fórum
Regional da Asean em 1994. Em que pese essa autonomização, o Japão cuidava para manter boas
relações com os EUA.
A partir de 1995, as relações bilaterais entraram em uma fase de deterioração. De um lado, o
crescimento econômico vertiginoso da China contrastava com o baixo desempenho econômico do
Japão. Nesse sentido, ensejou-se uma percepção de competição entre os dois vizinhos. Além disso,
Pequim passou a avançar no processo de modernização das suas forças armadas e do seu programa
nuclear. O crescimento do poder militar chinês, particularmente o desenvolvimento e a aquisição
de capacidades aéreas e navais permitiria que Pequim ampliasse a sua capacidade de projeção de
poder na região. Com isso, gerou muitas desconfianças no espectro político japonês. Além disso, as
tensões das relações entre Taiwan e China trouxeram muitas preocupações para o Japão.
Segundo Bush (2009, p. 1), após 1995, a China e o Japão se dividiram em torno das
seguintes questões:

A China considerou as políticas adotadas pelos líderes democraticamente


eleitos de Taiwan como um desafio aos seus interesses fundamentais.
O Japão estava preocupado tanto com a possibilidade de ser atraído para
um conflito de Taiwan do lado dos Estados Unidos quanto com a
aquisição de Taiwan pela RPC, o que ameaçaria sua linha de
abastecimento de energia para o Oriente Médio.
Um longo conflito inflamado sobre quem era o dono das ilhas
Senkaku/Diaoyu, controladas pelo Japão, ameaçou sair de controle.
Um desejo comum de explorar recursos de petróleo e gás no Mar da China
Oriental fomentou reivindicações concorrentes sobre como dividir o
fundo do oceano e, à medida que os dois lados começaram a perfurar, o
perigo de conflito aumentou. 28

28
Tradução nossa. Excerto original: “China regarded the policies adopted by Taiwan’s democratically elected leaders as a
challenge to its fundamental interests. Japan worried both that it might get drawn into a Taiwan conflict on the side of the
United States and that a PRC takeover of Taiwan would threaten its energy lifeline to the Middle East. A long festering
conflict over who owned the Japan-controlled Senkaku/Diaoyu Islands threatened to spin out of control. A common desire
to exploit oil and gas resources in the East China Sea fostered competing claims on how to divide up the ocean floor and,
as the two sides moved toward drilling, the danger of conflict grew” (BUSH, 2009, p. 1).

36
Alguns dos pontos de divergência se estenderam ao longo da década. A questão de Taiwan
será mais bem detalhada na unidade 4, mas as disputas entre China e Taiwan afetaram a relação
com o Japão. Além de aliado histórico de Taiwan, uma possível mudança de status quo na ilha
poderia gerar efeitos para o equilíbrio regional. O temor era de uma escalada nas tensões. Em relação
às ilhas Senkaku/Diaoyu, embora o Japão controle as ilhas, há alegações históricas de ambas as
partes sobre a posse legítima das ilhas. Essa disputa é acirrada pela possibilidade de exploração dos
recursos naturais nas águas vizinhas às ilhas (BUSH, 2009). As ilhas ficam em região próxima à
China, ao Japão e a Taiwan como mostra o mapa abaixo.

Figura 2 – Ilhas Senkaku/Diaoyu

Fonte: Voice of America (2021)

Como reação a esse contexto de acirramento das tensões com a China, o Japão voltou a se
aproximar de Washington. Em 1996, o primeiro-ministro Ryutaro Hashimoto (1996-1998) e o
presidente Bill Clinton deram uma declaração conjunta reafirmando a cooperação entre os dois países,
a importância da presença militar americana para a estabilidade da região e a necessidade de se
aprofundar a cooperação securitária entre os EUA e o Japão (MOFA, 1996). Esse contexto levou a
China a reagir adotando uma postura de aproximação com a Rússia. Desse modo, estabeleceram-se
os Shanghai Five 29 em 1996, quase imediatamente após a declaração conjunta Clinton-Hashimoto.

29
O grupo era composto de: China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão e Tadjiquistão.

37
Na crise asiática em 1997, a liderança regional do Japão foi posta em xeque. A dimensão
crítica da crise que afetou fortemente o Leste asiático levou os países da região a buscar saídas para
a situação. Apesar das propostas do Japão de criar um Fundo Monetário Asiático, a iniciativa não
prosperou. Inclusive, Pequim foi o principal ator regional a frear a iniciativa japonesa. Desse modo,
observa-se que a China ganhou relevância no contexto regional. Além disso, importa ressaltar que,
apesar de a proposta japonesa não ter sido adotada, a iniciativa de Chiang Mai 30 resultou da
diplomacia econômica japonesa também. Segundo Hook et al. (2002, p. 186),

A iniciativa de Chiang Mai apareceu muito como uma iniciativa da Asean


e pan-asiática, mas na verdade, suas origens, como a do AMF, podem ser
rastreadas até o Japão. O governo japonês continuou a argumentar
pacientemente a favor de algum tipo de mecanismo da AMF em várias
arenas internacionais, incluindo o FMI.

De todo modo, a crise ampliou a percepção regional de que a vulnerabilidade externa era
uma fragilidade dos países da região, por isso os países procuraram soluções regionais para tratar
com esses desafios geoeconômicos, o que foi reforçado pela interdependência entre as economias
da região (SILVA, 2012; HOOK et al., 2002). Quer dizer, a crise de 1997 representou uma nova
janela de cooperação entre os países da região e abriu a possibilidade de um novo momento de
aproximação entre a China e o Japão.
Em 1998, o presidente Jiang Zemin (1993-2003) visitou o Japão. Como resultado dessa
visita, os dois países lançaram a “Declaração Conjunta Japão-China sobre a Construção de uma
Parceria de Amizade e Cooperação para a Paz e o Desenvolvimento”, a qual previa que

Ambos os lados acreditam que, após a Guerra Fria, a região asiática continuou
avançando em direção à estabilidade e a cooperação regional se aprofundou
ainda mais. Além disso, ambos os lados estão convencidos de que esta região
exercerá maior influência na política, economia e segurança internacionais e
continuará a desempenhar um papel importante no próximo século.

Ambos os lados reiteram que é política fundamental inabalável dos dois


países manter a paz nesta região e promover o seu desenvolvimento, e que
não buscarão a hegemonia na região asiática e resolverão todas as disputas
por meios pacíficos, sem recurso ao uso ou ameaça de força.

30
A Iniciativa Chiang Mai (CMI) foi o primeiro acordo regional de swap cambial lançado pela Asean + 3 (China, Coreia do Sul
e Japão) em maio de 2000. A iniciativa tinha como objetivo ajudar a resolver as dificuldades de liquidez de curto prazo na
região e complementar arranjos financeiros pré-existentes. A iniciativa é composta de: (a) o Acordo de Swap Asean (ASA)
entre os países da Asean; e (b) uma rede de acordos de swap bilaterais (BSAs) entre os países Asean + 3 (ARIC, 2021).

38
Ambos os lados expressaram seu grande interesse na atual crise financeira
no Leste asiático e nas dificuldades decorrentes para a economia asiática.
Ao mesmo tempo, ambos os lados reconhecem que a base econômica desta
região é sólida e acreditam firmemente que, avançando o ajuste racional e
a reforma com base nas experiências, bem como aprimorando a
coordenação e cooperação regional e internacional, a economia da Ásia
definitivamente superar suas dificuldades e continuar a se desenvolver. [...]

Ambos os lados acreditam que relações estáveis entre as principais nações


da região da Ásia-Pacífico são extremamente importantes para a paz e a
estabilidade dessa região. [...]

O lado japonês reiterou que uma China estável, aberta e em


desenvolvimento é importante para a paz e o desenvolvimento da região
Ásia-Pacífico e de todo o mundo, e reafirmou sua política de cooperação e
assistência contínuas para o desenvolvimento econômico da China. O lado
chinês expressou sua gratidão pela cooperação econômica estendida pelo
Japão à China. O lado japonês reiterou que continuará a apoiar os esforços
da China para a rápida adesão à OMC. [...].

O lado japonês continua a manter sua posição sobre a questão de Taiwan,


que foi apresentada no Comunicado Conjunto do Governo do Japão e do
Governo da República Popular da China e reitera seu entendimento de
que existe uma China. O Japão continuará a manter seus intercâmbios de
natureza privada e regional com Taiwan [...] (MOFA, 1998).31

31
No excerto original: “Both sides believe that, after the Cold War, the Asian region has continued to move toward stability
and the regional cooperation has deepened further. In addition, both sides are convinced that this region will exert greater
influence on international politics, economics and security and will continue to play an important role in the coming century.
Both sides reiterate that it is the unshakable fundamental policy of the two countries to maintain the peace of this region
and to promote its development, and that they will not seek hegemony in the Asian region and settle all disputes by peaceful
means, without recourse to the use or threat of force. Both sides expressed their great interest in the current financial crisis
in East Asia and the ensuing difficulties for the Asian economy. At the same time, both sides recognize that the economic
foundation of this region is sound, and firmly believe that by advancing rational adjustment and reform based on
experiences, as well as by enhancing regional and international coordination and cooperation, the economy of Asia will
definitely overcome its difficulties and continue to develop. […]. Both sides believe that stable relations among the major
nations of the Asia-Pacific region are extremely important for the peace and stability of this region. The Japanese side
reiterated that a stable, open and developing China is significant for the peace and development of the Asia-Pacific region
and the entire world, and restated its policy of continuing cooperation and assistance for the economic development of
China. The Chinese side expressed its gratitude for the economic cooperation extended by Japan to China. The Japanese
side reiterated that it will continue to support China's efforts for the early accession to the WTO. […]. The Japanese side
continues to maintain its stand on the Taiwan issue which was set forth in the Joint Communique of the Government of
Japan and the Government of the People's Republic of China and reiterates its understanding that there is one China. Japan
will continue to maintain its exchanges of private and regional nature with Taiwan” (MOFA, 1998).

39
Na declaração, o Japão e a China reafirmaram alguns princípios que nortearam as relações
bilaterais desde os anos 1970. Entre os tópicos principais, destaca-se o comprometimento do Japão
com o princípio de uma só China, e o compromisso mútuo de não buscar hegemonia na região.
Desse modo, observa-se que a crise reforçou a ideia no Japão e na China de que não é possível
resolver problemas regionais sem que os dois países cooperem. A partir desse período, inaugura-se
uma nova fase do regionalismo asiático (CALDER; FUKUYAMA, 2012).
Como símbolo desse momento, em 1999, o Japão e a China participaram da Declaração
Conjunta sobre Cooperação no Leste Asiático, a qual confirmou a Asean 32como um fórum importante
de diálogo e cooperação regional. Como se sabe, o regionalismo é um dos principais tópicos nas relações
bilaterais, por isso essa aproximação mediada pela Asean representa uma ampliação do entendimento
sobre o que engloba a região do ponto de vista geopolítico. Dessa forma, o Sudeste asiático se tornou
um palco estratégico das relações bilaterais também. Além dos países membros, a declaração foi assinada
pela China, pelo Japão e pela Coreia do Sul. Segundo a Asean (1999),

3. Cientes dos desafios e oportunidades do novo milênio, bem como


da crescente interdependência regional na era da globalização e da
informação, concordaram em promover o diálogo e aprofundar e
consolidar esforços coletivos com vistas a promover o entendimento
mútuo, a confiança e a boa vizinhança. e relações amigáveis, paz,
estabilidade e prosperidade no Leste asiático e no mundo. [...]

na área cultural e de informação, eles concordaram em fortalecer a


cooperação regional na projeção de um ponto de vista asiático para o
resto do mundo e em intensificar os esforços para aumentar os contatos
entre os povos e promover a compreensão cultural, boa vontade e paz,
com foco em os pontos fortes e as virtudes das culturas do Leste asiático
e com base no reconhecimento de que a região deriva parcialmente sua
força de sua diversidade; [...]
na área de segurança e política, eles concordaram em continuar com o
diálogo, a coordenação e a cooperação para aumentar o entendimento
mútuo e a confiança para a construção de uma paz e estabilidade
duradouras no Leste asiático;
na área de questões transnacionais, eles concordaram em fortalecer a
cooperação no tratamento de questões comuns nesta área no Leste asiático.

32
Os Estados-membros da Asean são: Brunei Darussalam, Camboja, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Filipinas,
Singapura, Tailândia e Vietnã.

40
7. Observando como seus esforços coletivos e agenda de cooperação
apoiam e complementam as iniciativas de vários fóruns multilaterais, os
líderes concordaram em intensificar a coordenação e cooperação em vários
fóruns internacionais e regionais, como a ONU, OMC, Apec, Asem e ARF,
bem como em instituições financeiras regionais e internacionais.33

Alguns fatores explicam a tendência de competição que avança no início dos anos 2000. O
primeiro é a mudança na postura dos EUA em relação à Ásia. O governo de George W. Bush
alterou a política externa dos EUA e focou a contenção do terrorismo, priorizando o Oriente Médio
do ponto de vista geopolítico. Em grande medida, essa nova prioridade dos EUA criou uma espécie
de imposição para os aliados de Washington: ou apoiavam os EUA e ajudavam a compartilhar os
custos da Guerra ao Terror, ou estavam contra os EUA (PECEQUILO, 2011; BRIGAGÃO, 2011).
O segundo fator foi a chegada de Junichiro Koizumi (2001-2006) ao poder em 2001. O novo
primeiro-ministro adotou uma nova perspectiva de política externa e procurou aproximar o Japão
dos EUA, com vistas a ser o aliado prioritário de Washington na Ásia-Pacífico.
O governo Koizumi ficou marcado por ser um período de deterioração das relações bilaterais.
Entre os fatores que contribuíram para essa mudança estão as visitas anuais que o primeiro-ministro
fez ao memorial Yasukini. No governo chinês, a chegada de Hu Jintao (2003-2012) representou
uma mudança na política externa chinesa também. A China de Hu procurou adotar uma postura
mais voltada à cooperação com os vizinhos, incluindo o Japão. Nesse contexto, a China procurava
adotar uma postura voltada ao desenvolvimento harmonioso com os vizinhos. Os conceitos de
“sociedade harmoniosa” e “desenvolvimento científico” passaram a marcar essa nova fase da
inserção internacional da China (KISSINGER, 2011).

33
Tradução nossa. Excerto original: “Mindful of the challenges and opportunities in the new millennium, as well as the
growing regional interdependence in the age of globalization and information, they agreed to promote dialogue and to
deepen and consolidate collective efforts with a view to advancing mutual understanding, trust, good neighborliness and
friendly relations, peace, stability and prosperity in East Asia and the world. […]

in the cultural and information area, they agreed to strengthen regional cooperation in projecting an Asian point of view to
the rest of the world and in intensifying efforts in enhancing people-to-people contacts and in promoting cultural
understanding, goodwill and peace, focusing on the strengths and virtues of East Asian cultures and building upon the
recognition that the region partly derives its strength from its diversity;[…]

in the political-security area, they agreed to continuing dialogue, coordination, and cooperation to increase mutual
understanding and trust towards forging lasting peace and stability in East Asia;

in the area of transnational issues, they agreed to strengthen cooperation in addressing common concerns in this area in
East Asia […]

Noting how their collective efforts and cooperation agenda support and complement the initiatives of various multilateral
fora, the Leaders agreed to intensify coordination and cooperation in various international and regional fora such as the
UN, WT0, Apec, Asem, and the ARF, as well as in regional and international financial institutions” (ASEAN, 1999).

41
Durante a administração Koizumi, nenhum líder chinês visitou o Japão (LIDA, 2021). O
seu governo tinha uma plataforma baseada na adoção de reformas estruturais políticas e econômicas.
Entre as transformações que o primeiro-ministro procurava adotar estava a busca pelo aumento do
poder político do gabinete e a privatização de estatais. Essas reformas visavam ampliar a capacidade
competitiva do Japão em relação à China e à Coreia do Sul (SHINODA, 2007).
No plano securitário, Koizumi aprofundou a aliança com Washington e articulou uma espécie
de “divisão de trabalho de segurança entre o Japão e os EUA para o combate ao ‘Eixo do Mal’ e na
‘Guerra ao Terror’” (VISENTINI, 2011, p. 196). Desse modo, Koizumi foi considerado um ponto
de ruptura com a Doutrina Yoshida. Segundo Man (2007) essa doutrina se assentou em três pilares:
“(1) conseguir o poder estrutural, (2) preservar a tranquilidade nacional, e (3) manter a
competitividade econômica do Japão”34 (MAN, 2007, p. 117). O primeiro pilar estratégico dizia
respeito a institucionalizar a presença japonesa na governança global, em outros termos, obter uma
posição de relevância nos assuntos globais que fosse correspondente ao tamanho econômico do Japão.
O segundo objetivo estratégico remetia à necessidade de assegurar estabilidade social no âmbito
doméstico. O terceiro pilar, por sua vez, era voltado à preservação da liderança tecnológica do Japão
no campo econômico (MAN, 2007). Do ponto de vista prático, essa política externa atribuía ao Japão
um maior papel regional e global, e esse cenário trouxe dificuldades para as relações com a China.
No plano geopolítico, foi nesse período que o Japão adquiriu o sistema de escudo antimísseis
dos EUA. Apesar de a alegação ser a ameaça norte-coreana, gerou desconfianças em Pequim.
Segundo APCSS (2003, p. 4),

Uma das principais críticas à BMD no Japão foi o possível impacto


negativo que a implantação de tal sistema teria sobre a relação do Japão
com a China e outros países da região. A China começou a expressar sua
oposição a um plano conjunto de defesa antimísseis EUA-Japão em 1995.
A principal preocupação dos chineses é que a implantação de BMD no
Japão poderia enfraquecer a dissuasão nuclear limitada da China,
minimizando sua eficácia contra os Estados Unidos. O governo chinês
argumentou que isso o forçará a expandir e modernizar seu próprio arsenal
nuclear para superar um sistema de BMD. Outro medo chinês é que um
sistema SMD móvel implantado pelo Japão possa ser usado para defender
Taiwan e, portanto, aumentar a influência japonesa sobre Taiwan, ao
mesmo tempo que reforça o desejo de independência de Taiwan. Os
chineses também acreditam que a BMD no Japão poderia atuar como um
escudo para o desenvolvimento em estágio inicial da capacidade nuclear

34
Tradução nossa. Excerto original: “(1) achieving structural power, (2) preserving national tranquility, e (3) maintaining
Japan’s economic competitiveness” (MAN, 2007, p. 117).

42
japonesa. A paciência dos japoneses com as opiniões chinesas está
diminuindo há algum tempo. Teste de mísseis M-9 feitos pela China na
direção de Taiwan durante a crise através do Estreito de 1996 alarmou
muitos japoneses sobre as intenções chinesas na região. [...] Os analistas de
defesa japoneses também são rápidos em apontar que a China começou a
modernizar seu arsenal de mísseis muito antes de o Japão se interessar
seriamente pelo BMD e que seu envolvimento na proliferação de armas
contribuiu para a atual crise na península coreana, deixando pouco espaço
para fazer exigências relativas à política de defesa do Japão. 35

Isso quer dizer que a mudança no status quo no balanço estratégico gerou insegurança na
relação bilateral. A despeito das possíveis intenções por trás da adoção do escudo antimísseis, o
Japão se colocava em um novo patamar no balanço regional. Um exemplo dessa postura é a
declaração conjunta do Comitê Consultivo de Segurança EUA-Japão de 2005, na qual, pela
primeira vez, Japão citava Taiwan como um objetivo estratégico comum com os EUA (MOFA,
2005). Com o crescimento chinês, e a percepção chinesa de que Pequim estava sendo cercada
no entorno regional, houve dificuldades para que a tendência de cooperação prevalecesse na
primeira metade da década.
A política externa chinesa para o Leste asiático no período estava assentada na defesa da
cooperação regional. Segundo Lida (2021), Wen Jiabao, ex-primeiro-ministro chinês, propunha
que a Asean +3 adotasse cinco passos: i) fortalecer o planejamento estratégico por meio de uma
segunda Declaração Conjunta sobre Cooperação no Leste Asiático; ii) aprofundar a cooperação
econômica, comercial e financeira; nesse sentido, chegou a mencionar a possibilidade de criação de
uma área de livre comércio no Leste asiático e o fortalecimento da Iniciativa Chiang Mai; iii)
aumentar a cooperação em temas de segurança, como terrorismo, crimes transnacionais e desastres
naturais; iv) ampliar a cooperação social e cultural e a busca pela redução da pobreza; e v) aumentar
a cooperação em saúde pública.

35
Tradução nossa. Excerto original: “One of the major criticisms of BMD in Japan has been the possible negative impact
deploying such a system would have on Japan’s relationship with China and other countries in the region. China began
expressing its opposition to a joint U.S.-Japan missile defense plan in 1995. Foremost among Chinese concerns is that BMD
deployment in Japan could weaken China’s limited nuclear deterrent by minimizing its effectiveness against the United
States. The Chinese government has argued that this will force it to expand and modernize its own nuclear arsenal in order
to overcome a BMD system. Another Chinese fear is that a mobile SMD system deployed by Japan could be used to defend
Taiwan and therefore increase Japanese influence over Taiwan, while buttressing Taiwan’s desire for independence. The
Chinese also believe that BMD in Japan could act as a shield for early-stage development of Japan’s own nuclear capability.
Japanese patience with Chinese views has been on the wane for some time. China’s test firing of M-9 missiles in the direction
of Taiwan during the cross-straits crisis of 1996 alarmed many Japanese about Chinese intentions in the region. […] Japanese
defense analysts are also quick to point out that China had begun modernizing its missile arsenal long before Japan took a
serious interest in BMD and that its involvement in weapons proliferation has contributed to the current crisis on the Korean
peninsula, leaving it little room to make demands regarding Japan’s defense policy (APCSS, 2003, p. 4).

43
Em outros termos, o balanço do período Koizumi é que o movimento japonês em direção a
um maior protagonismo na região acabou gerando alguns atritos nas relações bilaterais. A origem
dessa intenção japonesa é a percepção de que o Japão havia perdido poder relativo na região (BUSH,
2009). Importa destacar que o Japão procurou se aproximar de outros atores regionais, como a
Índia, por exemplo, para não se isolar na região.
Em 2006, Koizumi deixou o cargo de primeiro-ministro, então Shinzo Abe assumiu o
governo e procurou reorientar as relações com a China. Os governos subsequentes – Yasuo Fukuda
e Taro Aso – também procuraram reaproximar-se de Pequim. Em 2008, Fukuda e Hu Jintao
lançaram uma declaração conjunta “sobre a promoção abrangente de um relacionamento
mutuamente benéfico com base em interesses estratégicos comuns”. Segundo Mofa (2008a), o
Japão e a China declararam que

Os dois lados resolveram promover de forma abrangente um


“relacionamento mutuamente benéfico baseado em interesses estratégicos
comuns” e alcançar os nobres objetivos de coexistência pacífica, amizade
por gerações, cooperação mutuamente benéfica e desenvolvimento comum
para suas duas nações. [...]
1. O lado japonês expressou sua avaliação positiva do fato de que o
desenvolvimento da China desde o início da reforma e da política
aberta, dizendo que o desenvolvimento da China ofereceu grandes
oportunidades para a comunidade internacional, incluindo o Japão.
O lado japonês declarou seu apoio à decisão da China de contribuir
para a construção de um mundo que promova a paz duradoura e a
prosperidade comum.
2. O lado chinês expressou sua avaliação positiva da busca consistente do
Japão pelo caminho de um país pacífico e da contribuição do Japão
para a paz e estabilidade do mundo por meios pacíficos ao longo de
mais de sessenta anos desde a Guerra Mundial. Os dois lados
concordaram em fortalecer o diálogo e a comunicação sobre a questão
da reforma das Nações Unidas e trabalhar para aumentar o
entendimento comum entre si sobre este assunto. O lado chinês
atribui importância à posição e ao papel do Japão nas Nações Unidas
e deseja que o Japão desempenhe um papel construtivo ainda maior
na comunidade internacional. [...]

44
Com relação à questão de Taiwan, o lado japonês expressou novamente
sua adesão à posição enunciada no Comunicado Conjunto do Governo do
Japão e do Governo da República Popular da China 36 (MOFA, 2008a).

Além de reafirmar a cooperação construída ao longo das últimas décadas, a declaração


defendeu: a construção de um mecanismo para visitas anuais entre os líderes dos dois países; o
aumento da cooperação na área de segurança; a cooperação no âmbito da negociação das seis partes
sobre a questão norte-coreana; e a cooperação na área de mudanças climáticas baseadas no princípio
das “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” (MOFA, 2008a). Dessa forma, observa-se que
os dois países retomaram a tendência de cooperação e avançaram em outros tópicos que ainda não
constavam em documentos anteriores, como mudanças climáticas e contenção de epidemias.
Ainda em 2008, a China e o Japão realizaram a cúpula trilateral com a Coreia do Sul e
lançaram um plano de ação para promover a cooperação entre eles, que incluía diálogo em cinco
áreas principais: i) política; ii) comércio, investimento, finanças, energia e logística; iii) proteção
ambiental, ciência e tecnologia; iv) assuntos sociais, culturais, saúde e higiene; e v) cooperação nos
fóruns internacionais (MOFA, 2008b).
A partir de 2009, as relações bilaterais ganharam novo impulso. A chegada de Yukio
Hatoyama 37 (2009-2010) ao poder representou uma nova visão do establishment político japonês
em relação à China. Nesse sentido, a ideia era que a retomada do crescimento do Japão não passaria
pelo aumento da competição com a China, mas, sim, pelo aumento da integração. Tóquio, nesse
contexto, atuaria como líder científico e tecnológico, controlando a rede de marcas e patentes no
Leste asiático, integrado aos parques industriais da China e da Coreia do Sul (KOPPER, 2009).

36
Tradução nossa. Excerto original: “The two sides resolved to comprehensively promote a ‘mutually beneficial relationship
based on common strategic interests’ and to achieve the noble objectives of peaceful coexistence, friendship for generations,
mutually beneficial cooperation, and common development for their two nations. […]. 1) The Japanese side expressed its
positive evaluation of the fact that China's development since the start of reform and open policy, saying China's development
has offered great opportunities for the international community including Japan. The Japanese side stated its support of China's
resolve to contribute to the building of a world that fosters lasting peace and common prosperity. (2) The Chinese side
expressed its positive evaluation of Japan's consistent pursuit of the path of a peaceful country and Japan's contribution to the
peace and stability of the world through peaceful means over more than sixty years since World War. The two sides agreed to
strengthen dialogue and communication on the issue of United Nations reform and to work toward enhancing common
understanding with each other on this matter. The Chinese side attaches importance to Japan's position and role in the United
Nations and desires Japan to play an even greater constructive role in the international community. […] Regarding the Taiwan
issue, the Japanese side again expressed its adherence to the position enunciated in the Joint Communique of the Government
of Japan and the Government of the People's Republic of China” (MOFA, 2008).
37
Oriundo de uma linhagem política que remonta à restauração Meiji, Hatoyama fundou o Partido Democrático do Japão
(PDJ). Entre outras pautas, Hatoyama defendia: descentralização do poder político, maior distribuição de renda e políticas
de benefícios sociais. O mote do seu governo era o Yu-Ai – fraternidade – pensado como uma terceira via à polarização na
política japonesa, um ponto de equilíbrio entre liberdade e igualdade (KOPPER, 2009).

45
Desse modo, como decorrência dessa perspectiva, Hatoyama sugeriu a criação da
Comunidade do Leste Asiático, que incluía o Japão, a Coreia do Sul e a China. Apesar do ímpeto,
o projeto de integração não avançou (HOSHIRO, 2015), e o insucesso do projeto se deve a
múltiplos fatores: domésticos, regionais e globais.
No âmbito doméstico, a possibilidade de integração com os vizinhos gerou reações de setores
econômicos que temiam ser prejudicados com a competição e políticos que mantêm postura anti-
China. Na esfera regional, alguns incidentes geraram animosidades regionais, como o afundamento
da corveta Cheonan 38em 2010. Embora não tenha envolvido diretamente o Japão, isso contribuiu
para que a confiança mútua na região fosse abalada e fortaleceu a perspectiva de que a presença
militar americana era crucial para a estabilidade regional. Além desses fatores, em 2010, houve um
incidente envolvendo duas embarcações nas ilhas Senkaku/Diaoyu: uma embarcação chinesa
colidiu com uma embarcação da guarda costeira japonesa, o que provocou atritos diplomáticos
entre a China e o Japão 39. As ilhas são objeto de disputa histórica entre os dois vizinhos. Esses
elementos se conectam com a dimensão global do fracasso da Comunidade do Leste Asiático.
Do ponto de vista global, a ideia da Comunidade do Leste Asiático gerou reações por parte
de Washington, e essa contrariedade se manifestou, principalmente, pela disputa sobre as bases
americanas em Okinawa. Uma das promessas de Hatoyama era a saída das bases americanas de
Okinawa, porém as negociações fracassaram. Com isso, Hatoyama perdeu capital político e acabou
renunciando em 2010. Embora o PDJ tenha continuado no poder, o contexto político pró-
integração perdeu força dentro do Japão. Essa situação se agravou com o tsunami e o acidente
nuclear de Fukushima em 2011.40
A partir de 2012, as relações bilaterais entraram em uma nova fase. No Japão, Shinzo Abe
(2012-2020), do PLD, retornou ao cargo de primeiro-ministro. Na China, Xi Jinping (2012-), de
uma ala mais conservadora que a de Hu Jintao, chegou ao poder com uma nova postura e reorientou
a inserção internacional da China. Após um período em que houve avanços na possibilidade de
integração regional, as relações entre Tóquio e Pequim recrudesceram. Nesse cenário, as disputas
sobre as ilhas Senkaku/Diaoyu ganharam novo ímpeto. Cabe destacar que essa tendência
conflituosa estava inserida em um contexto de reordenamento da política externa dos EUA.
Washington adotou a política de rebalanceamento da China, a qual previa o estabelecimento do
pivô asiático, e isso incluía medidas econômicas, políticas e securitárias.

38
Em 2010, a corveta sul-coreana Cheonan foi afundada. Investigações conduzidas pela Coreia do Sul e pelos EUA atribuíram
a culpa à Coreia do Norte, enquanto uma investigação conduzida pela Rússia e pela China alegou que a corveta havia colidido
com uma mina subaquática sul-coreana. Esse incidente fortaleceu os discursos mais conservadores na região.
39
O Japão prendeu a tripulação e o capitão do barco chinês. Isso gerou reações em Pequim, que embargou a venda de
minerais de terras raras ao Japão em resposta.
40
Após o terremoto, um tsunami de 15 metros desativou o fornecimento de energia e o resfriamento de três reatores em
Fukushima, o que causou um acidente nuclear que começou em 11 de março de 2011. Todos os três núcleos derreteram
nos primeiros três dias, e o acidente foi classificado como nível 7 na Escala Internacional de Eventos Nucleares e
Radiológicos (WORLD NUCLEAR ASSOCIATION, 2021).

46
Como efeito desse novo quadro de competição regional, as tensões ganharam nova dimensão
em 2013. Em novembro, a China anunciou o estabelecimento da East China Sea Air Defense
Identification Zone (ECS Adiz), isto é, Zona de Identificação de Defesa Aérea no Mar da China
Oriental. Segundo Rinehart e Elias (2015),

O ECS Adiz afirmou a cobertura do espaço aéreo sobre as Ilhas Senkaku,


que são administradas pelo Japão e reivindicadas pela RPC como as Ilhas
Diaoyu e por Taiwan como as Ilhas Diaoyutai. Além disso, o ECS Adiz da
RPC afirmou a cobertura do espaço aéreo sobre uma rocha submersa sobre
a qual a República da Coreia (ROK) afirma administração e sobre a qual
construiu uma estação de pesquisa oceânica, uma rocha que a ROK chama
de Ieodo e a RPC chama de Suyan Rock. Além disso, o ECS Adiz se
sobrepõe às Adizs existentes do Japão, ROK e Taiwan. [...] o Ministério
da Defesa Nacional da RPC [...] emitiu regras para o ECS Adiz que se
aplicam geralmente a aeronaves voando no ECS Adiz, independentemente
de a aeronave ter a intenção de entrar no espaço aéreo da RPC.
(RINEHART; ELIAS, 2015, p. 7).41

Como pode ser observado na figura abaixo, a ECS Adiz se sobrepunha às demais zonas dos
países vizinhos, mas o Japão, a Coreia do Sul, os EUA e outros países protestaram contra o anúncio
(RINEHART; ELIAS, 2015).

41
Tradução nossa. Excerto original: “The ECS Adiz asserted coverage of the airspace over the Senkaku Islands, which are
administered by Japan and claimed by the PRC as the Diaoyu Islands and by Taiwan as the Diaoyutai Islands. In addition,
the PRC’s ECS Adiz asserted coverage of the airspace over a submerged rock over which the Republic of Korea (ROK) asserts
administration and on which it built an ocean research station, a rock that the ROK calls Ieodo and the PRC calls Suyan
Rock. Moreover, the ECS Adiz overlaps with the existing Adizs of Japan, ROK, and Taiwan. Furthermore, the PRC Ministry of
National Defense (MND) issued rules for the ECS Adiz that apply generally to aircraft flying in the ECS Adiz, regardless of
whether the aircraft intends to enter the PRC’s airspace” (RINEHART; ELIAS, 2015, p. 7).

47
Figura 3 – Zonas de Identificação Aérea no Mar da China Oriental

Fonte: CSIS (2021)

Em 2014, como decorrência da Adiz, houve um incidente entre a força aérea do Japão e a
da China. Caças chineses voaram próximos a aviões de reconhecimento do Japão. As ações foram
consideradas agressivas pelo governo do Japão. A despeito dos detalhes de cada incidente, eles
demonstram que a percepção mútua de ameaça ampliou a agressividade de ambos os lados e
minou o diálogo entre os dois vizinhos. Cabe destacar que os atritos entre eles não impediram
que houvesse cooperação econômica.
Como o balanço das relações político-diplomáticas e securitárias demonstra, há muitas
variações nos padrões de cooperação e conflito entre a China e o Japão ao longo do tempo. A
observação das interações entre os dois países vizinhos evidencia que as dinâmicas locais se misturam
às dinâmicas globais de poder. Afinal, trata-se de duas grandes potências com grande potencial
econômico e militar. Em 2019, por exemplo, segundo o IISS (2020), o Japão era o oitavo país com
o maior gasto militar no planeta, com cerca de US$ 48,6 bilhões, e a China era o segundo maior
gasto em defesa do mundo, com cerca de US$ 181,1 bilhões.

48
No campo da segurança e defesa, alguns pontos têm dominado a agenda externa dos dois
países. A modernização das forças armadas chinesas tem mobilizado a preparação e a adequação das
capacidades defensivas dos vizinhos. À medida que a marinha da China expandiu a sua capacidade,
muitos países, incluindo o Japão, têm procurado melhorar os seus sistemas de vigilância no âmbito
das Japan Self-Defense Forces (JSDF), Forças de Autodefesa do Japão (IISS, 2020).

A última revisão do NDPG teve lugar no contexto do desenvolvimento


contínuo da Coreia do Norte de seus programas nucleares e de mísseis, da
contínua modernização militar da China e das tensões japonesas no Mar da
China Oriental. Além disso, em face da abordagem do governo Trump às
relações de aliança, o Japão se sentiu obrigado a demonstrar um
compromisso ainda maior em apoiar a presença militar dos Estados Unidos
na região. Também houve mais compras de equipamentos de defesa dos
EUA. O NDPG é notável por sua ênfase no desenvolvimento de uma “força
de defesa combinada multidimensional”. As interações anteriores
designaram a JSDF como primeiro uma força “dinâmica” e depois uma
“dinâmica conjunta”. O último NDPG enfatiza a necessidade de operações
da JSDF de “domínio cruzado” não apenas nos domínios terrestre, marítimo
e aéreo, mas também no espaço e no espectro eletromagnético, incluindo
operações cibernéticas e guerra eletrônica. [...] O MTDP destacou a decisão
do Japão de adquirir dos EUA 63 aeronaves de combate F-35A adicionais
para a Força Aérea de Autodefesa do Japão (Jasdf) e, pela primeira vez, 42
F-35Bs para as Forças Marítimas de Autodefesa do Japão (JMSDF). Tóquio
pretende adquirir 147 F-35s no total, tornando-se a segunda maior
operadora da aeronave depois dos Estados Unidos. O MTDP também prevê
a aquisição pelo Jasdf de mísseis stand-off ar-superfície de longo alcance para
auxiliar na defesa de ilhas offshore 42 (IISS, 2020, p. 239).

42
Tradução nossa. Excerto original: “The latest revision of the NDPG took place against the background of North Korea’s
ongoing development of its nuclear and missile programmes, China’s continuing military modernisation and Sino- Japanese
tensions in the East China Sea. Moreover, in the face of the Trump administration’s approach to alliance relations, Japan has
felt obliged to demonstrate yet greater commitment to supporting the United States’ military presence in the region. There
have also been more purchases of US defence equipment. The NDPG is notable for its emphasis on the development of a
‘multidimensional joint defence force’. Previous iterations had designated the JSDF as first a ‘dynamic’ and then a ‘joint dynamic’
force. The latest NDPG stresses the need for ‘cross-domain’ JSDF operations not only in the land, sea, and air domains but also
in space and in the electromagnetic spectrum, including cyber operations and electronic warfare. […] The MTDP highlighted
Japan’s decision to procure from the US an additional 63 F-35A combat aircraft for the Japan Air Self-Defense Force (Jasdf) and,
for the first time, 42 F-35Bs for the Japan Maritime Self-Defense Force (JMSDF). Tokyo is looking to acquire 147 F-35s in total,
making it the second-largest operator of the aircraft after the US. The MTDP also provides for the JASDF’s procurement of long-
range air-to-surface stand-off missiles to assist in defending offshore islands” (IISS, 2020, p. 239).

49
Essa tendência de recrudescimento das relações regionais tem levado o Japão a ampliar a sua
presença nas ilhas mais distantes. O mapa abaixo apresenta a presença do Japão nas ilhas no Mar
da China Oriental, e a presença nesses espaços geopolíticos indica a preocupação japonesa com a
possibilidade de incidentes ligados a disputas territoriais nessa região.

Figura 4 – Presença militar japonesa nas ilhas meridionais do país

Fonte: IISS (2020)

Além dessas ações no âmbito dos seus territórios, outra iniciativa japonesa tem sido aumentar
a cooperação com os países vizinhos. Desse modo, Tóquio tem transferido equipamentos militares
para países da Asean, incluindo aviões e helicópteros. Além disso, por meio da ODA, tem
assegurado a transferência de equipamentos para guarda costeira de países como Indonésia, Malásia,
Filipinas e Vietnã (IISS, 2020). Ou seja, as ações do Japão expressam a sua preocupação com a
situação no Mar do Sul da China, onde Pequim tem interesses territoriais.
Esta unidade tratou das relações político-diplomáticas e securitárias entre a China e o Japão,
gigantes em termos de recursos e capacidades materiais, que compartilham históricas relações
bilaterais, e esse quadro torna a análise das relações bilaterais bastante complexa. Apesar disso,
algumas tendências se verificam no período pós-Guerra Fria.

50
As relações bilaterais têm sido marcadas por ciclos de oscilação nos padrões de cooperação e
conflito. Ao contrário do que aconteceu em períodos anteriores, como nas duas últimas décadas da
Guerra Fria, quando as relações foram melhorando progressivamente, no pós-Guerra Fria, as
relações bilaterais oscilaram entre momentos de grande aproximação e concertação e outros de
elevação das tensões.
Esse quadro deriva de dois fatores principais. O primeiro é que a ordem internacional se
alterou muito desde a queda da URSS. O momento unipolar dos EUA foi acompanhando de
muitas instabilidades no sistema internacional. O comportamento vacilante de Washington levou
os países do Leste asiático a adaptar as suas estratégias a cada mudança na política externa dos EUA.
Nesse contexto, o regionalismo asiático foi utilizado como um mecanismo de proteção diante das
adversidades oriundas da conjuntura internacional. Por outro lado, a pressão de Washington sobre
a China contribuiu para que houvesse maior competição entre Pequim e Tóquio.
O segundo fator é o crescimento chinês. A ascensão da China é um processo que transforma as
relações regionais. O vertiginoso crescimento econômico tornou Pequim um polo gravitacional na
economia asiática. Além disso, esse processo foi acompanhado de modernização das suas forças armadas.
Desse modo, a percepção de que Pequim é uma ameaça aumentou as desconfianças mútuas, o que levou
a atritos entre os dois países e tem sido um elemento que acirrou as relações de cooperação entre a China
e o Japão. Apesar disso, por compartilharem o mesmo espaço geográfico e terem relações históricas, a
cooperação nunca deixou de acontecer, mesmo com as oscilações mencionadas.

Relações econômicas
Após a breve contextualização dos antecedentes históricos e do âmbito político-diplomático
e securitário das relações Tóquio-Pequim, esta unidade apresenta alguns dos aspectos mais
importantes das conexões econômicas, de significativo peso para o relacionamento bilateral e para
a formulação de política externa japonesa. Após a normalização das relações diplomáticas Japão-
China, uma série de acordos oficiais foi firmada, no campo do comércio, da aviação civil, do
transporte marítimo e da pesca, visando regular as relações bilaterais também no âmbito econômico.
O mais notável entre esses foi o Acordo de Comércio de Longo Prazo – Long-Term Trade Agreement
–, assinado em 1978. Conforme a China se abria economicamente, diminuía a importância desse
acordo para o relacionamento bilateral. A força de mercado baseada nas vantagens comparativas
dos dois países se tornou o maior condutor por trás do rápido crescimento do comércio entre o
Japão e a China desde os anos 1990 (CHIANG, 2019).
Uma das principais características da política econômica do Leste asiático desde os anos 1990
é a sobreposição da ascensão chinesa e da estagnação econômica do Japão. Com o passar dos anos,
o Japão e a China trocaram as suas posições como superpotência econômica regional, e tal
fenômeno marca uma nova era nas relações entre Tóquio e Pequim.

51
Por aproximadamente um século e meio, o Japão encontrava uma China fragilizada por derrotas
militares, pelo colapso do seu sistema dinástico, por guerras civis e pelas consequências dos seus projetos
internos, como a Revolução Cultural. 43 Em contraste, durante esse mesmo tempo, o Japão embarcava
em um período de rápida modernização e, desde Era Meiji, forjou um império, iniciou o seu processo
de reconstrução após a derrota na II Guerra Mundial e emergiu como o líder da chamada “revoada dos
gansos”, padrão de desenvolvimento econômico do Leste asiático pós-Guerra. As transformações
estruturais dos anos 1990, contudo, impactaram e alteraram esses padrões. A ascensão chinesa alterou o
modelo da revoada dos gansos, que tinha o Japão como centro (LAM, 2006).
O modelo da revoada dos gansos explica que, conduzidos pela difusão internacional de
tecnologia, um país em desenvolvimento aprimora as suas estruturas industriais e de exportação, ao
passo que transfere as suas indústrias obsoletas para países sucessores. O Japão representava o líder
desse modelo, seguido pelo próximo escalão de Novos Países Industrializados (NPI), como Coreia
do Sul, Taiwan, Hong Kong e Singapura, que por sua vez são seguidos pelo próximo grupo, que
inclui a Tailândia, a Malásia, as Filipinas e a Indonésia, frequentemente vistos como parte da cadeia
de produção japonesa (LAM, 2006).
Embora os períodos de distanciamento político tenham contribuído para que novos acordos
bilaterais no âmbito econômico não fossem formalizados nas últimas décadas, o peso do fator
econômico no relacionamento bilateral é inegável. O desenvolvimento das relações econômicas
entre os dois países não está, nesse sentido, sustentado por acordos formais, o que não impediu o
desempenho das trocas comerciais bilaterais de superar a média mundial, bem como o desempenho
médio das exportações e importações do Japão e, também, a performance média das importações
chinesas (ARMSTRONG, 2012).
Entre os aspectos decisivos para o relacionamento, destaca-se o comprometimento com as
regras e as normas do sistema institucional internacional representado pela Organização Mundial
do Comércio (OMC). Tal comprometimento restringiu os efeitos de tensões político-securitárias
bilaterais e proveu a fundação sob a qual se deu o significativo crescimento das relações econômicas
entre o Japão e a China dentro do sistema multilateral de comércio (ARMSTRONG, 2012).
A admissão da China à OMC em 2001, após 15 anos de negociações, trouxe amplos e
profundos efeitos para o comércio internacional, para as trocas entre Tóquio e Pequim e também
para os investimentos japoneses na China. Ainda durante a década anterior, a crescente
complementaridade comercial entre os dois países era estabelecida, com o crescimento em 30,9%
do intercâmbio total em 1993. No mesmo ano, o Investimento Externo Direto (IED) japonês na
China foi de US$ 1.691 milhões, o que representa valor superior ao total investido durante todo o
período entre 1951 e 1987 (OLIVEIRA, 1995).

43
A Revolução Cultural resultou no retorno de Mao Zedong à posição central do poder na China, depois de uma década de
conflitos sociopolíticos violentos e expulsões de revisionistas e opositores do pensamento maoista.

52
Desde a normalização das relações diplomáticas entre os países em 1972, a economia japonesa
avançou rapidamente durante os primeiros 20 anos, até que as posições passaram a se inverter, com
a economia chinesa notavelmente ascendendo durante as três décadas seguintes. A partir dos anos
2000, as posições relativas em termos econômicos do Japão e da China sofreram inflexões. Entre
1980 e 2013, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês deixou de representar 27,9% do PIB japonês,
passando a figurar 1,87 vez maior que o PIB do Japão. Ao mesmo tempo, enquanto a participação
japonesa no comércio mundial decresceu, a participação da China cresceu significativamente, em
contraste com a queda na dependência da China na economia japonesa. O comércio do Japão com
a China cresceu exponencialmente, sendo que, em 2003, o valor das importações japonesas
provenientes da China ultrapassou o valor das importações vindas dos EUA (KWAN, 2014). Os
gráficos a seguir ajudam a ilustrar esses fenômenos.

Gráfico 3 – Alterações na participação no comércio global entre a China e o Japão

Fonte: KWAN (2014) com base em dados da UNCTADSTAT (2014)

53
Gráfico 4 – Transformação no quadro de dependência econômica do Japão e da China no
comércio bilateral

Fonte: Kwan (2014) com base em dados do Ministério das Finanças da República Popular da China

De fornecedora de matérias-primas, a China se tornou um grande mercado para o Japão,


bem como um ponto de produção-base para a exportação. Durante os anos 1980, a maior parte das
exportações chinesas era de produtos primários, notavelmente petróleo cru. Na década de 1990, já
em função das reformas em preparação para a entrada na OMC, passou a atrair atenção como a
base da produção manufatureira para as exportações de empresas do mundo todo – e as empresas
japonesas não foram exceção, aumentando o volume de investimentos externos diretos no país,
principalmente para a produção com mão de obra intensiva.
A importância da China para as empresas japonesas cresceu não apenas como oficina de
produção, mas também como mercado para os produtos japoneses, principalmente ligados ao setor
automotivo. De acordo com o Ministério da Economia, Comércio e Indústria do Japão, a produção
local por empresas japonesas na China cresceu de US$ 25,1 bilhões em 2001 para US$ 226,5
bilhões em 2013; ao passo em que as vendas locais cresceram de US$ 8,7 bilhões para US$ 144,6
bilhões, com a média de vendas locais chegando a responder por 63,8% do total. Os números
representam, em grande medida, o resultado da expansão da produção automobilística alvejando o
mercado local (KWAN, 2014).
Os fluxos de fundos também mudaram, de um fluxo unilateral do Japão para a China para um
fluxo bidirecional que também inclui o fluxo na direção oposta. Inicialmente, os fluxos provenientes
do Japão se centravam na Ajuda Oficial para o Desenvolvimento. A partir dos anos 1990, conforme
as reformas, as políticas de portas abertas e o desenvolvimento econômico progrediam na China, os
investimentos externos diretos japoneses cresceram. O investimento chinês no Japão também cresceu

54
nos últimos anos, mais notadamente, em um primeiro momento, por meio de fusões e aquisições,
como demonstrado pela aquisição da NEC Corporation pelo Lenovo Group Ltd., por exemplo. O
investimento direto é uma ferramenta efetiva para as empresas chinesas adquirirem tecnologia e
marcas, além de oferecer vantagens às empresas japonesas, conforme promovem apoio financeiro e
um ponto de apoio no mercado de rápido crescimento da China (KWAN, 2014).
Desde o início dos anos 1990, o desenvolvimento das relações de comércio Japão-China foi,
em grande parte, conduzido por empresas japonesas com investimento na China, as quais exportavam
bens de consumo para o Japão após o processo de manufatura na China. Ao mesmo tempo, adquiriam
bens de capital e componentes-chave japoneses, o que, por sua vez, constituía parte significante das
importações chinesas provenientes daquele país. O Japão apresenta um déficit comercial com a China
desde 1988, que, por sua vez, cresceu rapidamente de US$ 0,3 bilhões em 1988 até o seu pico de
US$ 51 bilhões em 2013 e, desacelerou para US$ 30 bilhões em 2018 (CHIANG, 2019). O gráfico
a seguir ilustra a evolução da balança comercial do Japão com a China entre 1998 e 2018.

Gráfico 5 – Comércio bilateral Japão-China (1998-2018)

Fonte: Chiang (2019) com base em Ceic (2018)

Existe uma relação de complementaridade econômica entre o Japão e a China. A partir de


uma perspectiva de divisão do trabalho entre diferentes produtos, as áreas de especialidade deles
estão concentradas em produtos de alta e baixa tecnologia, respectivamente. Na divisão do trabalho
em diferentes processos de produção ao longo da cadeia de abastecimento, o Japão se destaca em
processos upstream (pesquisa, desenvolvimento e produção de componentes-chave) e downstream

55
(marketing, vendas e serviços de pós-venda) com alto valor agregado. A maior vantagem da China,
por sua vez, encontra-se no processo de fabricação e montagem. O avanço complementar, no
entanto, principalmente no curto prazo, depende do sucesso do relacionamento político-
diplomático-securitário (KWAN, 2014).
Após a primeira década e meia do século XXI, porém, os laços econômicos entre os dois países
passaram a apresentar enfraquecimento. De acordo com informações da Japan External Trade
Organization (Jetro), os investimentos japoneses na China declinaram gradualmente após o pico
em 2012 (US$ 13 bilhões) para US$ 10,8 bilhões em 2018. No mesmo sentido, estatísticas oficiais
do governo chinês indicam que o IED proveniente do Japão reduziu, de quase US$ 20 bilhões em
2013 para US$ 9,8 bilhões em 2018. A participação do IED japonês na China, que representava
8% em 1995, foi reduzida para 3% em 2008. O intercâmbio comercial total também declinou de
US$ 345 bilhões em 2011 para US$ 270 bilhões em 2016, com um leve incremento em 2018, para
US$ 317 bilhões. A queda também é visível em termos de turistas japoneses na China, que declinou
de 3,7 milhões de pessoas em 2011 para 2,7 milhões em 2018. A mesma tendência, contudo, não
é observada nas visitas provenientes da China, que seguem representando uma parte importante do
setor de turismo japonês (CHIANG, 2019).
As transformações no ambiente geopolítico tiveram efeitos econômicos para além das reações
de curto prazo dos mercados, explicando a desaceleração nas trocas bilaterais. Como exemplo,
menciona-se o boicote chinês aos produtos japoneses após disputas territoriais em 2012, que
impactaram negativamente as vendas de marcas do Japão, principalmente no setor de eletrônicos e
automóveis (CHIANG, 2019).
Considerando a já mencionada estrutura político-econômica do Leste asiático – que
dependeu dos insumos industriais japoneses e do aparato securitário dos EUA e que se encontra
atualmente em transformação, a partir da emergência chinesa –, mudanças na relação Japão-China
não apenas apresentam implicações profundas para a região, mas também para a estrutura global
de poder (CHIANG, 2019).
Em 2010, o PIB chinês ultrapassou o japonês, passando a ocupar a segunda posição mundial,
atrás dos EUA. Já em 2018, o PIB japonês correspondia a 34% do PIB chinês. Embora o Japão se
mantenha na liderança do fornecimento de produtos de alta tecnologia às economias regionais, os
avanços da China em direção a produtos de maior valor tecnológico agregado e manufaturas de
ponta fazem com que as exportações de produtos japoneses de médio ou baixo nível tecnológico
enfrentem maior competição (CHIANG, 2019).
Em função dos baixos custos, da proximidade geográfica e da apreciação do iene, a China se
tornou muito atrativa aos empresários japoneses, que por sua vez realocaram a sua produção
manufatureira intensiva em mão de obra ao país. Acrescente-se que as liberalizações econômicas
que seguiram a entrada da China na OMC em 2001 promoveram significativo aumento de
investimentos de origem japonesa (CHIANG, 2019). A imagem abaixo ilustra a evolução dos
investimentos japoneses na China entre 1998 e 2018.

56
Gráfico 6 – Investimento do Japão na China (1998-2018)

Fonte: Chiang (2019) com base em Jetro (2018)

Os níveis de interdependência econômica entre o Japão e a China foram estabelecidos desde


a década de 1970, quando o Japão se tornava o líder econômico do Leste asiático e passava a se
preocupar com a estabilidade regional. A China, por sua vez, necessitava de capital, de tecnologia e
do modelo de gestão japonês. Nesse sentido, dependiam um do outro e, a partir dessa realidade,
optaram por um modelo de concertação regional que se baseava em impedir a supremacia de um
sobre o outro e a interferência de atores extrarregionais (SILVA, 2012).
No pós-Guerra Fria, a triangulação Japão-China-EUA se quebrou, e Tóquio optou por
se concertar com a China por meio da institucionalização regional. São exemplos disso o lobby
japonês pela inclusão da China na Apec 44 e na OMC bem como a criação do Fórum Regional
da Asean 45 (SILVA, 2012).
A atual disputa comercial entre a China e os EUA preocupa as perspectivas para as
exportações japonesas, uma vez que o Japão tem sido um importante fornecedor de componentes-
chave para manufatureiras chinesas, taiwanesas e coreanas. No mesmo sentido, devido ao recente
protecionismo do governo de Donald Trump, o Japão e a China buscaram aproximações paralelas.
Em 2017, o primeiro-ministro japonês Shinzo Abe anunciou que estaria aberto a se tornar membro
do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura – em inglês, Asian Infrastructure Investment
Bank (Aiib) –, iniciativa de financiamento multilateral proposta pela China. No mesmo ano,
também anunciou que o Japão estaria pronto para cooperar com a Iniciativa Cinturão e Rota, em
inglês, Belt and Road Initiative (BRI).

44
A Apec remete principalmente ao âmbito econômico e incorpora o projeto globalista norte-americano, que prevê a
disseminação de normas e valores neoliberais, de livre mercado e da democracia liberal.
45
O Fórum Regional da Asean foi o primeiro corpo institucional multilateral a endereçar a agenda securitária asiática, de forma
a atenuar o peso das alianças bilaterais, promovendo confiança, diálogo e prevenindo conflitos entre os atores regionais.

57
Além da cooperação regional em desenvolvimento infraestrutural, o Japão e a China estão
envolvidos em cooperações econômicas regionais, como a Parceria Regional Econômica Abrangente
– em inglês, Regional Comprehensive Economic Partnership (RCEP) – e o Acordo de Livre Comércio
China-Japão-Coreia do Sul (CHIANG, 2019). O Japão aprovou em abril de 2021 a RCEP,
proposta de acordo de livre comércio entre os 10 Estados membros da Asean, isto é, Brunei,
Camboja, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Filipinas, Singapura, Tailândia e Vietnam, além de
Austrália, China, Nova Zelândia, República da Coreia e Japão (RCEP, 2019).
A interdependência econômica e securitária entre os dois países tornou altamente custosa uma
competição econômica e militar entre ambos. A tendência geral de aproximação foi acompanhada
por essa interdependência. O processo de aprofundamento da interdependência, contudo, não é
irreversível e depende das tensões nos demais âmbitos do relacionamento bilateral (SILVA, 2012).
Apesar do envolvimento em diversos mecanismos de cooperação econômica regional, a
profundidade das relações bilaterais de âmbito econômico entre o Japão e a China tem os limites, e os
avanços dependem de uma estável e confiável base política, o que encontra dificuldades em face de
divisões como os interesses geopolíticos entre a China e os EUA e também entre a China e o Japão.

Tópicos especiais: península coreana, Taiwan e Mar do Sul


da China
Esta última unidade do módulo aborda tópicos considerados especiais para as relações
bilaterais entre o Japão e a China. As relações entre Tóquio e Pequim sempre orbitaram em torno
de temas sensíveis, entre estes, a situação na península coreana, em Taiwan e as disputas sobre o
Mar do Sul da China são os principais palcos de divergência entre as duas potências asiáticas. Dessa
forma, esta unidade está estruturada em três subunidades que apresentam os principais elementos
acerca de cada um dos tópicos especiais, considerando os atores envolvidos, os principais temas
debatidos e os desafios que cada uma das situações traz para as relações bilaterais.

Questão coreana nas relações Japão-China


Como signatários do Tratado de não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), que entrou
em vigor em 1970, o Japão e a China não apoiam o desenvolvimento de armas nucleares na Coreia
do Norte. A necessidade de cooperação em questões envolvendo os programas missilísticos e
nucleares de Pyongyang, crescentemente evidente a partir dos anos 2000, contribuiu para o peso
da temática securitária no relacionamento Japão-China. A colaboração se desenvolveu
satisfatoriamente, porém sem apresentar avanços significativos, no âmbito do Diálogo a Seis – Six
Party Talks – criado em 2003 (LAM, 2017).

58
O Diálogo a Seis é produto do esforço multilateral entre a China, os EUA, o Japão, a Rússia,
a República da Coreia (Coreia do Sul) e a República Popular Democrática da Coreia (Coreia do
Norte), na busca por soluções pacíficas para os impasses envolvendo o programa nuclear norte-
coreano. Ao longo das negociações, a China e o Japão utilizaram a arena para consolidar as suas
imagens externas de atores responsáveis. Diferente da China, que liderou e mediou a concertação,
o Japão adotou um baixo perfil de atuação, chamando a atenção principalmente para um caso de
abduções de cidadãos japoneses pela Coreia do Norte, tema que há muitos anos também permeia
a “questão coreana” para o Japão (LEE, 2010). Não reverberando resultados concretos, o diálogo
multilateral foi em grande parte descontinuado em 2009.
O avanço no desenvolvimento do programa nuclear norte-coreano representa uma das
grandes questões que balizam o relacionamento Japão-China. Situado na linha de frente da rede de
aliados dos EUA e anfitrião de parte das forças norte-americanas na Ásia, o Japão se encontra em
posição de vulnerabilidade nos momentos de tensão e deseja evitar a escalada das hostilidades entre
a Coreia do Norte e os EUA (TEO, 2019).
A Coreia do Norte representa uma espécie de amortecedor geográfico principalmente à
influência dos seus vizinhos e aliados norte-americanos no Nordeste asiático, segundo a avaliação da
China, que lutou a favor dos norte-coreanos durante a Guerra da Coreia (1950-1953). A existência
de um programa nuclear, no entanto, não é aprovada por Pequim, que tende a preferir a manutenção
do status quo na península – quer dizer, evitar avanços nucleares subsequentes – inclusive pelos
possíveis efeitos de fortalecimento sobre a pauta de remilitarização no Japão e na Coreia do Sul.
Dificultando a aproximação do Japão com as duas Coreias se encontra a histórica
animosidade proveniente do legado do período colonial japonês sob a península coreana, bem como
a percepção sobre a responsabilidade do Japão em relação às ambições de unificação e independência
coreana ao criar condições para a divisão da península em 1945. O sentimento antijaponês
contribuiu para o nacionalismo tanto no norte quanto no sul da península (HOOK, 2011).
O Japão, por sua vez, como um dos líderes da ordem internacional liberal e entre os principais
aliados norte-americanos, condena o seu desenvolvimento nuclear. Historicamente, o
relacionamento Japão-Coreia do Norte – assim como no caso das relações entre as duas Coreias –
apesar de ensaiar períodos de maior normalização, apresenta poucos avanços significativos. Além
disso, os testes de mísseis balísticos realizados pelos norte-coreanos no Mar do Japão,
principalmente a partir dos anos 2000, prejudicaram consideravelmente o relacionamento bilateral.
A Coreia do Norte permanece sendo o único Estado com o qual o Japão não mantém relações
diplomáticas, sendo que avanços nesse sentido dependem do diálogo e de subsequentes
normalizações entre Washington e Pyongyang. Diferentemente da tendência de evolução, ainda
que com flutuações, das relações com a Coreia do Sul, os laços japoneses com a Coreia do Norte se
deterioram ainda mais no século XXI (HOOK, 2011).

59
Tanto o Japão quanto a China temem os riscos da proliferação nuclear e almejam a estabilização
das tensões na península, concordando com as resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU)
que impõem sanções a Pyongyang. Os dois países diferem, porém, quanto à proposição de soluções,
uma vez que Pequim alerta sobre a necessidade de promover a desnuclearização da península coreana
como um todo; e Tóquio defende o desmantelamento unilateral do programa nuclear norte-
coreano. Como potências regionais, o Japão e a China almejam evitar escalonamentos militares e
ingerências externas que alterem o status quo no Nordeste asiático.
O desenvolvimento conjunto, entre o Japão e os EUA, do sistema Theatre Missile Defense
(TMD) desde 2003, a partir da percepção da Coreia Norte como uma ameaça securitária direta
ao Japão, porém, não é um ponto de convergência entre o Japão e a China. A preocupação chinesa
está atrelada ao fato de que tal sistema tenha a capacidade de tornar obsoleto o seu reduzido
número de armas nucleares, instrumento de dissuasão de Pequim contra atos separatistas em
Taiwan (LAM, 2017).
As negociações realizadas em 2018 e 2019 entre o líder norte-coreano Kim Jong Un e o
presidente Donald Trump foram recebidas com surpresa pelo Japão, que esperava ter sido
previamente consultado, de forma a garantir que os seus interesses fossem levados em consideração
caso um acordo fosse alcançado. O Japão também prefere que as negociações sejam feitas a partir
de uma frente unida e coesa, de forma a resolver os problemas entre os principais atores regionais,
sem privilegiar os interesses de um país sobre os demais em um tema sensível. Para ele, por exemplo,
apenas a desativação dos mísseis de longo-alcance e o fim dos testes nucleares não são resultados
suficientes, pois ainda deixariam o país dentro da faixa de alcance dos mísseis norte-coreanos de
curso e médio alcance (TEO, 2019).
No Japão, episódios de aumento das tensões trazem à tona questões mais amplas e
importantes sobre a política externa japonesa de forma geral e, em particular, sobre a aliança com
os EUA. Entre as principais questões, ressalta-se o nível de autonomia japonês ao depender
inteiramente do aparato de segurança norte-americano e até que ponto os interesses e as soluções
para os problemas securitários dos EUA são necessariamente convergentes com as preocupações
japonesas. Outros pontos de reflexão envolvem o custo, em termos de cálculos financeiros e também
de flexibilidade diplomática; oportunidades políticas; orgulho nacional e progresso democrático. As
problematizações crescem junto com as rápidas transformações do ambiente estratégico, em que as
questões securitárias nem sempre são claramente definidas (TEO, 2019).

60
Situação de Taiwan e relações Japão-China
Desde a normalização das relações bilaterais entre a China e o Japão, um dos tópicos
prioritários é a situação de Taiwan. Após a derrota do Japão em 1945, Tóquio cedeu o controle de
Taiwan, que havia sido conquistada pelos japoneses em 1894, porém não se definiu como seria a
situação política da ilha. Esse contexto foi alterado em 1949, quando a Guerra Civil mudou o status
quo político da China e se passou a discutir se a ilha deveria ser independente ou retornar ao controle
da China continental. As relações da ilha com Tóquio foram consolidadas pelo domínio japonês ao
longo da primeira metade do século XX. Desse modo, relações econômicas, políticas e sociais
profundas entre Taipei e o Japão foram forjadas.
Desde a revolução comunista na China em 1949, Taiwan se tornou uma prioridade para
Pequim. Como resultado da guerra civil, 2 milhões de membros do Guomindang, o Partido
Nacionalista Chinês, fugiram para a ilha de Formosa, dando início ao impasse entre Taipei e
Pequim. O PCCh tentou reintegrar esse território, que possuía uma posição geoestratégica
fundamental para a defesa do continente. Em termos históricos, a ilha de Taiwan foi utilizada como
base de apoio para ataque ao território continental da China, bem como para bombardeios sobre o
país durante a II Guerra Mundial (VISENTINI et al., 2013; KAPLAN, 2014).
Ao longo da Guerra Fria, Taiwan se tornou um dos palcos geoestratégicos prioritários no
Leste asiático. A I Crise do Estreito ocorreu em 1954, após Jiang Jieshi ordenar o envio de 73 mil
homens para as ilhas de Jinmen (Kinmen ou Quemoy) e Mazu (Matsu) e a RPC bombardear as
ilhas em resposta (PIKE, 2010; SILVA, 2015). Em dezembro do mesmo ano, Taipei e Washington
assinaram um Tratado de Defesa Mútua, em caso de ataque de Pequim às ilhas de Taiwan e Penghu,
localizada ao sul. Dessa forma, o ataque das forças continentais a Jinmen e Mazu prosseguiu no
início de 1955. Contudo, a partir da ameaça de uso de armas nucleares e, diante da falta de apoio
soviético, a China optou por recuar (VISENTINI et al., 2013; PIKE, 2010; SILVA, 2015).
Portanto Taiwan se integrou ao eixo de segurança no Leste asiático, compondo com o Japão e a
Coreia do Sul parte do triângulo defensivo dos EUA.
Em 1958, ocorreu a segunda crise do estreito. Em grande medida, a segunda crise foi uma
decorrência da primeira. Em 1957, como resposta à primeira crise, os EUA enviaram um esquadrão
de mísseis Matador para Taiwan (VISENTINI et al., 2013). A China continental temia que o
governo do Guomindang pudesse utilizar os mísseis de modo independente contra o governo
comunista. A partir dessa alegação, a RPC bombardeou Jinmen e Mazu novamente. Os EUA
intervieram na crise e ameaçaram utilizar armas nucleares contra Pequim. Nesse período, embora
integrado à defesa do Leste asiático, não foi um protagonista na resolução da crise.

61
A terceira crise no estreito de Taiwan ocorreu entre 1995 e 1996 e resultou da mudança na
política interna da ilha. A possibilidade de eleição de Lee Teng-hui em 1996, contexto da pauta de
independência de Taiwan e a possibilidade de mudança da política de uma só China por parte de
Taiwan, fizeram Pequim reagir e buscar influenciar as eleições na ilha ao realizar exercícios militares
próximos ao estreito e testes nucleares entre 1995 e 1996. A terceira crise no estreito de Taiwan
(1995-1996) foi resultado da aproximação do governo Clinton (1993-2001) com Taiwan, que
incluiu a venda de 150 unidades do caça F-16.
Para o Japão, esse contexto implicou a maior aproximação com os EUA conduzida pelo
primeiro-ministro Hashimoto (1996-1998). A partir disso, Tóquio e Washington deram uma
declaração conjunta reafirmando a importância da presença militar americana para a estabilidade
da região e a necessidade de aprofundar a cooperação securitária entre os EUA e o Japão.
Apesar das boas relações com Taiwan, o Japão sempre procurou manter relações estáveis e
concertadas com a China acerca do tema. O respeito japonês à política de “Uma China”, que valida
a ideia de que Taiwan não é independente, tem sido um dos pilares das relações bilaterais desde a
década de 1970. Contudo existem pressões internas e externas para que o Japão mude essa política
em relação a Taiwan.
Do ponto de vista prático, Taiwan é um dos palcos para que se observe o status das relações
China-Japão. Isso se deve ao fato de que o Japão é um importante aliado dos EUA, cujo território
fica a menos de 150 km de Taiwan. Além disso, Tóquio é, depois dos EUA, o parceiro internacional
mais importante de Taiwan, e o Japão mantém vínculos extensos, mesmo que “não oficiais” com
Taipei desde 1972. Em outras palavras, a relação entre Tóquio e Taipei é um dos principais tópicos
das relações bilaterais entre a China e o Japão. Ademais, a discussão em torno da independência da
ilha, algo que é rechaçado por Pequim, tem sido um dos principais temas geopolíticos do Leste
asiático, por isso é um aspecto crucial para medir as interações entre a China e o Japão.

62
Considerações finais
Este módulo tratou das relações bilaterais entre a China e o Japão, e a análise das relações
bilaterais evidenciou que, tanto para Pequim, quanto para Tóquio, as interações são cruciais para a
inserção internacional dos dois países.
A milenar história de interações entre os dois povos demonstra ser impossível que os países não
priorizem um ao outro na construção das suas estratégias de inserção internacional. Apesar disso,
como decorrência do período de avanço japonês no entreguerras e o contexto pós-Guerra Fria, as
relações bilaterais não existiram de modo oficial até a década de 1970. Importa destacar que o contexto
de afastamento dos EUA do Leste asiático favoreceu a aproximação entre os dois vizinhos.
No período pós-Guerra Fria, as relações oscilaram muito entre períodos de cooperação e atrito.
Entretanto a interdependência econômica entre as duas economias se aprofundou no período analisado,
e, atualmente, ambos são atores mutuamente importantes nas suas pautas comerciais e de investimento.
A China e o Japão são potências regionais com grande poder de projeção para as demais
regiões do planeta, por isso, apesar da cooperação que existe entre os dois países, como foi visto, a
hipótese de competição esteve sempre presente. As disputas territoriais sobre as ilhas mostra isso.
Ademais, dois teatros demonstram que as relações podem caminhar para a competição: a situação
na península coreana e em Taiwan. Historicamente, tanto a península quanto Taiwan se
configuram como palcos das disputas entre Pequim e Tóquio.
Desse modo, observa-se que as relações com Pequim são cruciais para a inserção internacional
do Japão. Desde que a China passou a crescer vertiginosamente em termos econômicos, essa relação
foi reformada e, com isso, o Japão perdeu o posto de principal economia asiática e teve de lidar com
uma China que se reforçava em muitos setores. Portanto, pode-se dizer, a política externa e de
segurança do Japão é pautada, em grande medida, pelas relações com a China. Mais do que isso,
dada a importância e a capacidade dos dois países, o futuro dessas relações bilaterais contribui para
moldar, não só as relações regionais na Ásia, mas também o equilíbrio global de poder.

63
MÓDULO III – RELAÇÕES JAPÃO-BRASIL:
UMA PARCERIA ESTRATÉGICA

O último módulo do curso aborda as relações entre o Japão e a República Federativa do


Brasil, objetivando promover compreensão ampla e histórica do relacionamento bilateral, a
partir de perspectivas político-diplomáticas, imigração, relações econômicas e cooperação para
o desenvolvimento.
As relações entre o Japão e o Brasil tiveram início no século XIX, a partir da imigração para
as lavouras cafeeiras paulistas, e se desenvolveram paulatinamente, intercalando períodos de maior
e menor dinamismo, adentrando o século XXI com caráter de uma parceria estratégica. O Brasil é
o país com maior concentração de descendentes japoneses fora do arquipélago, representando a
maior população de japoneses que não vivem no Japão. O Brasil e o Japão representam importantes
portas, respectivamente, para a América Latina e a Ásia, tornando a cooperação mutuamente
relevante, especialmente em um cenário internacional de acirramento das competições entre as
maiores potências. A complementaridade econômica e o potencial de crescimento qualitativo e
quantitativo do intercâmbio comercial colaboram para a identificação de novas perspectivas para o
relacionamento bilateral no século XXI, que dependem, em grande medida, do pragmatismo das
iniciativas conjuntamente operacionalizadas pelos países.
Relações político-diplomáticas
O estabelecimento das relações diplomáticas entre o Japão e o Brasil se deu em 5 de novembro
de 1895, quando da assinatura do Tratado de Amizade, Comércio e Navegação, em Paris, pelos
ministros Gabriel de Toledo Piza e Almeida e Sone Arasuke. A Europa era, na época, o centro da
geografia política global. Além de distantes entre si, o Japão e o Brasil ainda estavam distantes das
considerações estratégicas dos países europeus. Tal realidade começaria a mudar, para o Japão, com
a vitória na Guerra Russo-Japonesa, 10 anos mais tarde; para o Brasil, por sua vez, a caminhada até
a relevância global foi mais demorada. As relações entre os países, nessas condições, desenvolveram-
se principalmente no plano bilateral, demorando para adquirir uma dimensão global. A interação
nipo-brasileira, nesse sentido, precisou vencer distâncias geográficas, culturais e políticas para
conseguir estabelecer a parceria robusta e multifacetada que existe hoje (VARGAS, 2017).
Pautada principalmente pela imigração durante a primeira metade do século XX, a relação
bilateral se deteriora no período da II Guerra Mundial. Apesar de inicialmente se manter em posição de
neutralidade, à medida que o conflito se agrava, o Brasil se viu forçado a manifestar apoio a um dos
lados envolvidos. Em 6 de junho de 1945, portanto, Getúlio Vargas assinou o Decreto nº 18.811, por
meio do qual formalmente foi declarada guerra ao Japão. Quando da reconciliação diplomática, no pós-
guerra, encontrou-se um novo ambiente internacional, com o Japão desprovido de forças armadas e
inserido na ordem internacional marcada pela criação da ONU. Em 1951, o Japão e o Brasil assinaram
em São Francisco, na Califórnia, um tratado de paz. Já em 1951, aconteceu a chegada dos primeiros
imigrantes japoneses do período pós-guerra ao solo brasileiro (NUNES, 2008).

A retomada das relações oficiais nipo-brasileiras nas décadas de 1940 e 1950


se mostra ainda tímida. Em 1958, a Usiminas (Usinas Siderúrgicas de Minas
Gerais S/A) é transformada numa joint venture que conta com destacado
percentual de acionistas japoneses. Em novembro de 1960, é assinado um
Acordo de Migração e Colonização e, em janeiro de 1961, um Acordo
Cultural. Essas relações serão impulsionadas e atingirão um nível mais
significativo na segunda metade da década de 1960, quando já havia se
instalado o regime militar no Brasil. Novamente os interesses brasileiros e
japoneses se convergem, sobretudo no que diz respeito à produção agrícola e
mineral. Japão, potência industrializada dependente da importação de
alimentos e matérias-primas; Brasil, Estado dotado de condição natural
favorável – capaz de fornecer o que a indústria japonesa buscava – e
dependente de investimentos externos. A aproximação de Brasil e Japão
integrará a consolidação da política externa brasileira dos anos 1960 e 1970
que almejará a multilateralidade e a conquista de novos mercados. Nessa nova
conjuntura é firmado o Acordo Básico de Cooperação Técnica em
22/09/1970 (NUNES, 2008, p. 141, 142).

66
O Japão e o Brasil mantêm um mecanismo de consultas políticas bilaterais, estabelecido em 1989,
durante visita do então secretário-geral das Relações Exteriores brasileiro Paulo Tarso Flecha de Lima a
Tóquio. A primeira reunião sob a égide do mecanismo aconteceu em 1991 e foi reprisada nos anos
seguintes, apresentando queda na frequência das reuniões ao fim da década (VARGAS, 2017).

Brasil e Japão atualmente são não apenas potências regionais, como


também exercem, em várias áreas, papel de liderança em âmbito global.
Nesse contexto, um dos aspectos mais interessantes e desafiadores da
relação bilateral é o esforço de criar uma agenda global comum entre os
dois países – isto é, identificar temas de relevância internacional em que o
diálogo e a colaboração entre Brasília e Tóquio possam gerar benefícios
para a ordem internacional como um todo. Trata‑se de encontrar formas
pelas quais Brasil e Japão possam somar seus recursos – materiais, políticos,
técnicos ou tecnológicos – para gerar um impacto maior do que a simples
soma de suas capacidades individuais sugeriria (VARGAS, 2017, p. 66).

Entre as pautas bilaterais de âmbito político-diplomático de maior relevância, destaca-se a


formação do Grupo dos Quatro (G4), mecanismo de concertação formado por Brasil, Japão,
Alemanha e Índia, que propõe a reforma do Conselho de Segurança da ONU e a elevação do seu
status na organização para membros permanentes, de forma a refletir mais adequadamente a
realidade geopolítica do século XXI. O Brasil e o Japão concordam sobre a necessidade de enfrentar
os desafios internacionais a partir de processos com maior nível de representatividade, visando
conferir maior efetividade e legitimidade à implementação das decisões provenientes do Conselho
de Segurança. Apesar de os esforços do G4 terem início há mais de 15 anos (2005), o impasse
envolvendo as negociações sobre a reforma permanece (G4, 2014).
Ainda que não tenha obtido resultados concretos, o grupo segue reafirmando apoio mútuo
às duas candidaturas como novos membros permanentes, à expansão das categorias de membros
permanentes e não permanentes, bem como a medidas que aumentem a transparência e a
efetividade do trabalho realizado pelo Conselho de Segurança (G4, 2019).
Em 2014, durante visita oficial ao Brasil, o primeiro-ministro japonês Shinzo Abe e a
presidente brasileira Dilma Rousseff elevaram oficialmente a relação bilateral para o nível de uma
parceria estratégica global, estabelecendo o diálogo Brasil-Japão entre chanceleres, com
periodicidade anual. Na ocasião, foram assinados memorandos de cooperação, declarações de
intenção, memorandos de entendimento, acordos governamentais e entre representantes do setor
privado dos dois países (BRASIL, 2014).

67
O relacionamento Japão-Brasil apresenta características pendulares de dinamização e
estagnação, conforme a conjuntura. Há intensificação da aproximação quando são identificados
interesses comuns, e estagnação quando a conjuntura não é favorável. Embora o âmbito econômico
seja um dos principais fatores para a aproximação, o relacionamento também pode adquirir novos
contornos por meio da ampliação do escopo político. Os dois países estão em busca de renovação
e de consolidação do seu status internacional. Nesse contexto, existem muitos campos de relevância
global com potencial para promover o diálogo bilateral e fortalecer a aproximação entre os países,
como a pauta ambiental, de energia renovável e o desenvolvimento sustentável (UEHARA, 2013).

Imigração
A imigração permeia historicamente o relacionamento Japão-Brasil e representa um dos seus
grandes marcos, havendo produzido legados visíveis à sociedade brasileira. Após o longo período de
isolamento japonês, a emigração representou um dos esforços do governo Meiji para amenizar tensões
sociais internas, entre elas o desemprego e o baixo nível de vida da população. Buscava-se também
expandir a atuação internacional do Japão, criando novos mercados para as suas exportações. Nesse
sentido, a expansão além-fronteiras dos interesses japoneses levou à busca pela aproximação com o
Brasil ao final do século XIX. Após o redirecionamento da emigração japonesa – inicialmente voltada
principalmente aos EUA, ao Canadá, à Austrália e ao México – para a América Latina, o Brasil e o
Peru, particularmente, tornaram-se grandes destinos (UEHARA, 2013). Nesse sentido,

no caso brasileiro, houve uma convergência de seus interesses com os dos


japoneses no início do século XX que favoreceu à imigração. A
promulgação da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, levou o Brasil a
necessitar de mão de obra para a lavoura e motivou a realização de vários
acordos de imigração com países europeus. A Itália, particularmente,
forneceu uma grande quantidade de trabalhadores para as fazendas de café.
Porém, em 1902, influenciado pela crise do mercado de café que afetou a
economia brasileira, o governo italiano restringiu a vinda de seus cidadãos
ao Brasil. Essa medida teve importante repercussão sobre o Brasil com a
retomada do dinamismo na lavoura cafeeira em 1903, gerando a
necessidade de ser no Japão, pois o país vivia dificuldades econômicas
decorrentes da guerra contra a Rússia, desenvolvida ao longo de 1904 e
1905, que aumentaram o interesse dos trabalhadores japoneses pela
emigração (UEHARA, 2013, p. 140-141).

68
O processo de transição de estruturas rurais e feudais para um Japão moderno, urbano e
industrial produzia sequelas e anomalias sociais. Problemas pelos quais as sociedades ocidentais
haviam passado durante os seus processos de formação eram igualmente vistos no cenário japonês,
entre eles a superpopulação nas cidades, a miséria urbana, o desemprego nos campos e nas cidades
em função da aplicação de novas técnicas que reduziam a demanda por mão de obra, etc. O
problema da superpopulação passou a ser uma das principais questões internas no Japão, ameaçando
causar convulsões sociais e prejudicar o desenvolvimento e a modernização do país. Entre os
projetos arquitetados para amenizar a situação, destaca-se o controle demográfico por meio da
emigração de mão de obra. Cabe ressaltar, ainda, o interesse japonês em criar áreas de influência
nas Américas, onde a influência dos EUA e da Inglaterra era historicamente maior. Dessa forma, a
emigração de mão de obra também funcionaria como meio de criar zonas de ocupação japonesa em
território americano (YAMAMURA, 1996).
Símbolo da imigração japonesa ao Brasil, em 18 de junho de 1908 chega ao porto de Santos o
navio Kasato Maru, trazendo a bordo 781 pessoas, fruto da convergência de interesses: demanda por
mão de obra no Brasil e política de emigração do Japão. A viagem foi financiada pelo governo de São
Paulo. A integração japonesa à sociedade brasileira se deu de forma lenta, especialmente considerando
o inicial objetivo de regressar ao Japão – realidade entre muitos dos primeiros imigrantes. Com o
tempo, o estado de São Paulo passou a exigir que os imigrantes viessem em família, aumentando o
grau de continuidade das futuras gerações japonesas em solo brasileiro (UEHARA, 2013).
A partir de 1925, o número de entradas cresceu, acompanhando uma política mais ativa do
governo japonês nos negócios associados à imigração no Brasil, em que há incremento do comércio,
injeção de investimentos e, também, o desenvolvimento de núcleos coloniais, partindo da premissa
de que a presença de famílias japonesas abriria caminho para a realização desses objetivos. Os
primeiros polos de fixação de imigrantes japoneses no País se concretizam por meio do incentivo à
saída das fazendas de café para outras regiões do estado de São Paulo. Ao se instalarem em áreas
pioneiras, ainda inexploradas, de baixo custo e próximas aos trilhos das ferrovias, os imigrantes
japoneses conseguiram ascender socialmente (SAKURAI, 1995).
As companhias de imigração japonesas, incentivando polos de produção agrícola nas mãos
de imigrantes japoneses, estabeleceram núcleos de colonização em algumas regiões do interior de
São Paulo, com terras compradas pelo governo japonês. Outras terras foram doadas pelo governo
paulista para incentivar o cultivo de arroz, café, açúcar e chá. Nesses núcleos foi mantido
maquinário para o beneficiamento do arroz, usinas de açúcar, escolas, consultórios médicos, além
de ter sido introduzida a produção de ovos de bicho-da-seda no Brasil. A presença dos japoneses
passa ser notada por benfeitorias como estradas de rodagem, construídas com recursos e
responsabilidade da companhia. Já os núcleos coloniais formados por iniciativa de lideranças locais,
contudo, desenvolveram-se de forma mais lenta, com menos recursos e sem planejamento prévio,
alcançando realizações mais modestas (SAKURAI, 1995).

69
Considerando os condicionantes internos do Japão e o fechamento de outras portas para a
imigração japonesa, o próprio governo japonês, em parceria com empresas privadas, promoveu uma
intensificação do fluxo migratório. As iniciativas japonesas, organizando-se por meio de um corpo
técnico experimentado, voltaram-se para a busca de novas oportunidades, entre as quais se destaca
o plantio e a exportação de algodão. Nesse contexto, a concentração de imigrantes japoneses nos
núcleos facilitou a manutenção das tradições culturais, a reprodução de formas de associativismo
próprias dos japoneses e a consolidação do importante papel desempenhado pelos pioneiros na
formação de uma segunda geração de japoneses no Brasil, a qual iniciou uma nova etapa na história
da imigração, em que foram sentidos os impactos da derrota do Japão na II Guerra Mundial,
resultando na quebra na trajetória até então desenvolvida e inaugurando a inserção urbana dos
japoneses, com menor presença das autoridades japonesas e ritmo de ascensão social menos
acelerado (SAKURAI, 1995).
Os mais de 6 milhões de japoneses que retornavam à pátria após a II Guerra Mundial
encontraram poucas oportunidades de emprego, e a reabertura da emigração para o Brasil foi muito
aguardada. Em 1º de julho de 1952, o presidente Getúlio Vargas permitiu a introdução de 4 mil
famílias na região Centro-Oeste e de mais de 5 mil famílias na região Norte no Brasil. No Norte, a
busca por imigrantes partiu do diretor executivo do Centro de Pesquisas Agronômicas da
Amazônia, que havia obtido sucesso com o plantio de juta. O maior entrave à reabertura da
imigração, o custo das passagens de navio, foi resolvido depois que o governo japonês passou a
emprestar o dinheiro aos emigrantes (NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
Quando o Brasil voltou a receber imigrantes japoneses, a colônia nipo-brasileira presenciou
atritos envolvendo os recém-chegados e aqueles que deixaram o Japão no pré-guerra. Os imigrantes
já radicados no País há mais tempo passaram a chamar aqueles que haviam chegado há pouco tempo
de “imigrantes novos”. Havia uma lacuna geracional e de visão de mundo, além das diferentes
condições socioeconômicas entre aqueles que haviam acumulado certa quantidade de bens e os
imigrantes que já desembarcavam endividados – o custo da passagem deveria ser pago no prazo de
15 anos. Entre 1952 e 1955, aproximadamente 46 mil imigrantes japoneses entraram no Brasil
(NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
Acompanhando o processo de industrialização brasileiro e o avanço das empresas japonesas
no País, técnicos industriais especializados foram trazidos para trabalhar em empresas como a
Tecelagens Gasparian, no Rio de Janeiro, a primeira a receber 16 técnicos japoneses. Ao todo, foram
mais de 200 técnicos contratados em um período de cerca de duas décadas. Também em busca de
mão de obra qualificada, entre 1958 e 1962, vieram ao Brasil 60 estagiários, com formação em
agronomia, para trabalhar em fazendas; e, entre 1956 e 1965, foram trazidos 201 técnicos
especializados em serviços como topografia, construção de estradas e derrubada de florestas
(NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).

70
Em 2008, completaram-se cem anos desde o início da imigração japonesa para o Brasil. Em
2018, o número de nacionais japoneses residindo no Brasil era de 50.205 pessoas, e
aproximadamente 2 milhões de descendentes de japoneses viviam no Brasil, representando a maior
população de japoneses fora do Japão (MOFA, 2018).
Embora não tenha acontecido um movimento migratório semelhante – organizado e em
grupo – de brasileiros em direção ao Japão, a partir dos anos 1980, o número de imigrantes
provenientes do Brasil, principalmente de descendência japonesa, passou a crescer no Japão. Em
função da situação econômica vivida pelo Brasil na época, e atraídos pelos salários mais altos
oferecidos pelo Japão, o número de brasileiros registrados no arquipélago ultrapassou a marca de
300 mil indivíduos em 2003. Entre esses, verifica-se uma alta no número de brasileiros que
escolhem o Japão como moradia definitiva (NATIONAL DIET LIBRARY, 2009).
Observa-se, portanto, que as primeiras décadas do relacionamento bilateral foram marcadas
principalmente pelos movimentos migratórios e por atividades relacionadas ao assentamento dos
japoneses no Brasil. Nota-se também que o legado da imigração está atrelado à interação entre as
duas culturas e a aspectos como a disseminação de religiões japonesas, a introdução de novos itens
alimentícios – entre eles frutas como o caqui e hortaliças como a abóbora kabocha –, a culinária
típica japonesa, a contribuição japonesa à produção agrícola, ao comércio e ao setor industriário.
Além desse conteúdo, a própria presença dos imigrantes e descendentes, tornando-se a maior
população de japoneses fora do Japão, representa importante herança do relacionamento bilateral,
adicionando uma ligação simbólica entre os dois países (UEHARA, 2013).
Ressaltando a relevância do Brasil para o engajamento e as atividades de cooperação
internacional do Japão, em 2017 foi inaugurada em São Paulo a primeira Japan House, um
empreendimento do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão, com sede em três importantes
metrópoles – São Paulo, Londres e Los Angeles –, que visa difundir os diferentes elementos da
cultura japonesa. A Japan House São Paulo sobrepõe tradição e inovação ao agrupar arte,
tecnologia, informação e gastronomia em um espaço cultural que representa e simboliza a imigração
japonesa no Brasil (JAPAN HOUSE, 2021).

71
Relações econômicas
As relações bilaterais de cunho econômico podem ser consideradas estratégicas para o
desenvolvimento brasileiro, havendo espaço para expansão e aprofundamento, de forma a
aproveitar as complementaridades econômicas existentes. Até a década de 1920, o comércio entre
o Brasil e o Japão foi considerado irrisório (SAKURAI, 1995) e, durante toda a primeira metade
do século XX, o aspecto mais marcante do relacionamento bilateral foi a imigração. Na década de
1950, surgiram os primeiros grandes projetos econômicos bilaterais, como a parceria para a
construção da Usina Siderúrgica de Minas Gerais (Usiminas), o estaleiro Ishikawajima e, em menor
escala, a Toyota. Somente entre o final dos anos 1960 e o início dos anos 1970, período do “milagre
econômico” brasileiro, os investimentos das empresas japonesas cresceram (UEHARA, 2013).
Após o fim da II Guerra Mundial – período em que foram rompidas as relações diplomáticas
entre o Brasil e o Japão – e a subsequente reaproximação entre os dois países, a dimensão econômica
foi a primeira a prosperar e se tornou a principal tônica da relação bilateral (VARGAS, 2017).
Pouco após a II Guerra Mundial, as relações bilaterais se transformaram significativa e
positivamente. Já na década de 1950, o governo brasileiro passou a apresentar interesse pelo capital
do Japão, que por sua vez se interessou pelos recursos nacionais do Brasil, acelerando as relações
econômicas entre os dois países (UEHARA, 2013).
Quando o relacionamento Japão-Brasil foi retomado, o Brasil também detinha um projeto
de modernização que visava dar continuidade e aprofundar as reformas estruturais que marcaram
as décadas de 1930 e 1940, por meio do desenvolvimento do setor energético, da criação de uma
indústria nacional de substituição das importações, da ocupação dos vazios do território que
culminaram na implantação de projetos como a transferência da capital federal e de modernização
das regiões Norte e Centro-Oeste. Também no pós-guerra foram criados órgãos estratégicos e
empresas públicas como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1946; o Conselho
Nacional de Energia Nuclear (CNEN), em 1951; e a Petrobras, em 1954 (NUNES, 2008).
O processo de reconstrução japonesa ocorreu em ritmo acelerado, o que foi ilustrado pelo
boom da sua indústria, tornando-se, com o tempo, referência mundial, inicialmente na indústria
pesada e química e, em seguida, em setores como o eletroeletrônico e o automobilístico. O país
passou a acumular reservas em moeda norte-americana, chegando, na década de 1980, à condição
de maior potência financeira mundial (NUNES, 2008).
Na década de 1970, diversos países industrializados, entre eles o Japão, criaram sistemas de
financiamento voltados para atividades de geoprospecção em países ainda em estágio de
desenvolvimento, tendo em vista a extração mineral. Ao longo dessa década, a América Latina
passou a despontar entre as principais regiões de origem dos recursos minerais importados pelo
Japão. Como grande fornecedor de minério de ferro, o Brasil foi beneficiado pela concentração dos
investimentos industriais japoneses em setores com maior agregação de valor, como a
eletroeletrônica, a informática e a aeronáutica, que privilegia países fornecedores com maiores
investimentos tanto na extração mineral quanto na atividade de fundição (NUNES, 2008).

72
O investimento proveniente do Japão se enquadrou também em programas públicos de
desenvolvimento da Amazônia. Em 1953 foi criada a Superintendência do Plano de Valorização
Econômica da Amazônia (SPVEA), que se tornou a Superintendência do Desenvolvimento da
Amazônia (Sudam) em 1966; também em 1966 foi instituída a Zona Franca de Manaus; e, em
setembro de 1974, foi criado o Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia
(Polamazonia). Nesse sentido, projetos grandiosos foram idealizados e colocados em prática na região
com suporte de investimentos externos, inclusive japoneses, como o Polo Mínero-Metalúrgico dos
Carajás; o Polo Metalúrgico do Tocantins (Marabá-Tucuruí); o Polo Metalúrgico de Belém-
Barcarena; o Polo Metalúrgico de São Luiz; e a Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Diversas empresas
multinacionais de origem ou participação japonesa também se instalam no Brasil nesse período, entre
elas: Fuji; Fujitsu; Honda; Panasonic; Sanyo; Sharp; Sony; Semp Toshiba e Yamaha (NUNES, 2008).
O relacionamento bilateral funcionou também como instrumento complementar no
desenvolvimento da agricultura brasileira. Em 1970, foi assinado o Acordo Básico de Cooperação
Técnica entre os países, a partir do qual teve início o Programa Nipo-Brasileiro para o
Desenvolvimento do Cerrado (Prodecer). Financiado pela Agência Japonesa de Cooperação e
Desenvolvimento Internacional (Jica), o Prodecer promoveu o assentamento de agricultores do
sudeste e do sul do País na região do Cerrado, executando ações que alcançaram as regiões Sudeste,
Centro-Oeste, Norte e Nordeste. O Programa teve função de destaque na expansão da fronteira
agrícola na década de 1980 (NUNES, 2008).
A crise da dívida, resultante do aumento dos juros praticados sobre os empréstimos
internacionais que financiavam o projeto desenvolvimentista brasileiro, e o processo inflacionário
revelaram a fragilidade da estrutura econômica brasileira e afastaram os investidores japoneses. Com
isso, o capital excedente japonês, nos anos 1980, destinou-se aos EUA. Desse modo, as relações
diplomáticas e econômicas entre o Brasil e o Japão, que se desenvolveram de forma mais do que
satisfatória nas décadas precedentes, foram consideravelmente prejudicadas pelo panorama
econômico da década de 1980 (NUNES, 2008).
Após a adoção do Plano Real e da retomada da estabilidade econômica, o Brasil voltou a
atrair investimentos estrangeiros. Nesse período, a participação japonesa foi tímida se comparada à
de outros países, porém os investimentos japoneses, diretos ou indiretos, no setor automotivo
brasileiro merecem destaque. Diante disso, muitas montadoras ligadas à Associação Nacional de
Veículos Automotivos (Anfavea) – entre elas, Honda, Komatsu, Mitsubishi Motors, Nissan e
Toyota – traçaram uma estratégia para o mercado brasileiro e para o Mercado Comum do Sul
(Mercosul) (NUNES, 2008).
A instabilidade e a crise econômica dos anos 1980 no Brasil, combinadas com o colapso da
bolha da economia japonesa na década de 1990, levaram a um arrefecimento temporário no
interesse japonês pelo Brasil. A partir da década de 2000, porém, verificou-se acentuada
reaproximação econômica entre os países, a exemplo do aumento de mais de seis vezes do IED do
Japão no Brasil em relação à década anterior, somando US$ 11 bilhões (VARGAS, 2017).

73
No comércio também houve aceleração a partir de 2002, interrompida apenas em 2009 pelos
reflexos da crise financeira iniciada em 2008 nos EUA. Uma retomada relativa pôde ser observada
a partir de 2010, sendo que, em relação ao ano anterior, as exportações brasileiras para o Japão
cresceram 67,2%; e as importações, 30, 1% (UEHARA, 2013).
A tendência de crescimento dos investimentos japoneses na década de 2000 também sofreu
inflexão em 2008, porém a média dos fluxos de IED japoneses na primeira década do século XXI
foi maior que a das décadas de 1980 e 1990 (UEHARA, 2013). Conforme dados do Banco Central
do Brasil, o auge do investimento direto nipônico no Brasil foi no ano de 2011, quando o Japão se
tornou o quarto maior investidor brasileiro, com um fluxo total de US$ 7,5 bilhões. Apesar da
queda para números mais modestos nos anos subsequentes, o Japão se manteve entre as maiores
origens de IED no Brasil, ocupando a sexta posição em 2015 (VARGAS, 2017). O gráfico a seguir
ilustra o posicionamento japonês entre as principais fontes de IED do Brasil entre 2010 e 2016.

Gráfico 7 – Principais origens de IED no Brasil

Fonte: Banco Central do Brasil (2018)

No início do século XXI, o notável aumento do investimento japonês no Brasil reflete o bom
desempenho da economia brasileira no período e a consequente identificação de oportunidades em
uma economia em expansão, por parte do empresariado japonês. Importa destacar, também, os
esforços governamentais para estimular esse investimento, como ficou evidenciado durante a visita
presidencial de 2005 ao Japão, em que foi adotado o Programa Conjunto de Revitalização das

74
Relações Econômicas, que previa a adoção de um pacote de medidas importantes, como a realização
regular de consultas intergovernamentais, e abrangia setores relevantes, entre eles o de energia,
mineração, infraestrutura, biocombustíveis e agricultura (VARGAS, 2017).

Durante a visita, foi também anunciada a criação do “Conselho


Brasil‑Japão para o Século XXI” – órgão integrado por empresários de
ambos os países e encarregado de formular recomendações para o
aprofundamento das relações bilaterais. Hoje conhecido como o “Grupo
de Notáveis Brasil‑Japão", o órgão continua a congregar alguns dos
principais empresários dos dois países – como presidentes e CEOs da Vale,
Toyota, Nippon Steel e Mitsui – e tem tido papel importante em
apresentar propostas concretas sobre o adensamento da relação,
particularmente na seara econômica, em um bem‑sucedido esforço de
mobilização do setor privado pelos governos com vistas ao fortalecimento
dos laços econômicos (VARGAS, 2017, p. 69-70).

Apesar de despontar entre os 10 maiores parceiros comerciais do Brasil nos últimos 15


anos, não houve negociações para conferir status formal à integração econômica entre os dois
países, o que ampliaria as relações comerciais. Obter um status formal implicaria assinar um
acordo de parceria econômica. Atualmente, ambos os países enfrentam desaceleração
econômica, e a assinatura de acordos de comércio pode oferecer apoio adicional às medidas de
recuperação desses países. Os acordos de parceria econômica já assinados entre o Japão e países
da América Latina (México, em 2005; Chile, em 2007; Peru, em 2012), bem como os que se
encontram em fase de negociação (Colômbia), contribuíram para expandir a presença do país
na região (MIYAZAKI, 2019).
Como se sabe, avanços no relacionamento econômico bilateral são de mútuo interesse. Dessa
forma, as perspectivas de crescimento econômico, as oportunidades de investimento, a relevância
regional e o seu papel de fornecedor de recursos primários tornam o Brasil interessante ao Japão,
que busca diminuir a vulnerabilidade das suas empresas por meio de parcerias alternativas de
negócios que diminuam a dependência do continente asiático. As empresas japonesas, por sua vez,
apresentando alto nível de qualidade e valor agregado nos seus produtos, contribuem para que a
produção nacional amplie a sua capacidade competitiva internacional (UEHARA, 2013).
As imagens abaixo ilustram, respectivamente, as principais categorias que compõem o
comércio bilateral e a participação brasileira, em comparação com os demais países da América do
Sul, nas trocas japonesas.

75
Figura 5 – O que o Brasil exportou para o Japão em 2018?

Fonte: Atlas of Economic Complexity (2021a)

Figura 6 – O que o Japão exportou para o Brasil em 2018?

Fonte: Atlas of Economic Complexity (2021b)

76
Figura 7 – De onde o Japão importou em 2018?

Fonte: Atlas of Economic Complexity (2021c)

Figura 8 – Para onde o Japão exportou em 2018?

Fonte: Atlas of Economic Complexity (2021d)

77
Destaca-se o trabalho da Japan External Trade Organization (Jetro), que iniciou as suas
atividades no Brasil com um escritório de representação em São Paulo em 1955, quando ainda era
denominada Japan External Trade Recovery Organization. A Jetro é vinculada ao governo japonês
e foi inaugurada oficialmente em 1958. Atualmente, conta com uma rede de 46 escritórios
domésticos e 74 no exterior, distribuídos em mais de 50 países. Dentro do seu escopo, visa apoiar
e promover o comércio bilateral entre o Japão e os demais países, contribuindo para o
desenvolvimento e o fortalecimento das relações comerciais e econômicas entre empresas locais e
empresas japonesas. No Brasil, as suas atividades variaram ao longo do tempo, porém se manteve a
atuação em setores com (potenciais) sinergias entre empresas brasileiras e japonesas (JETRO, 2021).
No Brasil, há mais de 60 anos, as principais atuações da organização envolvem o fomento de
comércio e investimentos entre empresas brasileiras e japonesas; na atração de investimentos
brasileiros para o Japão; no fornecimento de informações para empresas japonesas interessadas em
conhecer o mercado brasileiro e no aprimoramento do ambiente de negócios de forma geral. As
principais atividades são divididas em: promoção de comércio exterior, atração de investimentos e
propriedade intelectual (JETRO, 2021).

Cooperação para o desenvolvimento


A cooperação para o desenvolvimento representa um importante aspecto da cooperação nipo-
brasileira. Os recursos japoneses contribuíram para o processo de desenvolvimento econômico do
Brasil e, para o Japão, a promoção de auxílio a nível internacional serviu como instrumento de
política externa e diplomacia, promovendo laços e estreitando relações.
Considerando a renúncia à utilização de meios militares, prevista pela Constituição japonesa
após a derrota na II Guerra Mundial, as ações de política externa ficaram limitadas aos meios não
militares, aumentando o peso de atividades como a cooperação para o desenvolvimento. O primeiro
fluxo de recursos no âmbito da ajuda externa japonesa para o Brasil ocorreu em 1961, tornando o
País um dos primeiros recebedores de empréstimos do Japão no pós-guerra. Os fluxos se sucederam
de forma que, em 1973, o Brasil ocupasse a quinta posição entre os maiores recebedores desse tipo
de cooperação japonesa. O Japão tem sido um dos principais fornecedores de ajuda externa ao
Brasil, havendo ocupado a posição de primeiro lugar durante vários anos (UEHARA, 2013).
Cabe ressaltar que, no período de reconstrução do Japão após sua derrota na II Guerra
Mundial, o país que atualmente é um dos principais prestadores de assistência no mundo, recebeu
auxílio da sociedade internacional, com recursos financeiros, tecnologia e materiais. Do Brasil,
foram enviados suprimentos alimentares e medicamentos por meio da Ajuda de Suprimentos Lara
(Agências Licenciadas para a Ajuda na Ásia) (JICA, 2009).
Considera-se que a cooperação bilateral tenha-se iniciado em fevereiro de 1959, com o envio
de um perito japonês para a primeira cooperação técnica com o Brasil, na área de irrigação agrícola.

78
No ano de 1974, foi fundada a Japan International Cooperation Association (Jica), principal órgão
de cooperação japonês, como resultado da fusão entre a Agência de Emigração do Japão e a Agência
de Cooperação Técnica para o Exterior. O primeiro escritório da Jica no Brasil foi aberto em 1976,
anexo à Embaixada do Japão (JICA, 2009).
Visando apoiar o crescimento e a estabilidade socioeconômica dos países em
desenvolvimento, a Jica é a agência do governo japonês responsável pela implementação da
Assistência Oficial para o Desenvolvimento (ODA). Com sede em Tóquio, possui 15 escritórios
domésticos e 103 escritórios internacionais (JICA, 2021). A Jica expandiu o seu alcance e
atualmente trabalha em parceria com entidades brasileiras em uma ampla gama de áreas, desde
projetos nacionais de desenvolvimento de recursos naturais até projetos em áreas como o meio
ambiente, saúde, segurança e infraestrutura. Além da assistência prestada pelo Japão ao Brasil,
também são desenvolvidos projetos de cooperação triangular envolvendo países africanos. No ano
de 2019, comemorou 60 anos de cooperação japonesa no Brasil, possuindo um segundo escritório
em São Paulo (JICA, 2019).

Figura 9 – Cronologia da cooperação para o desenvolvimento Japão-Brasil

abril/1952 Reatamento das relações diplomáticas entre o Brasil e o Japão

Fundação da entidade jurídica Associação Ásia como entidade


abril/1954
executora da cooperação técnica do Japão

Ingresso do Japão no Plano Colombo. Início da cooperação técnica


outubro/1954
prestada

Ingresso do Japão na ONU. O Brasil participa da Resolução Conjunta de


dezembro/1956 34 países para o ingresso do Japão, 11ª Assembleia Geral da ONU,
dando apoio ao retorno do Japão à comunidade internacional

Envio de Perito para a 1ª Cooperação Técnica com o Brasil (na área de


fevereiro/1959
irrigação agrícola)

Recepção do 1º bolsista brasileiro para Cooperação Técnica no Japão


janeiro/1961
(área de biologia marinha)

Fundação do Fundo de Cooperação Econômica para o Exterior (OECF)


março/1961
como entidade executora cooperação financeira

Início da primeira Cooperação Técnica Tipo Projeto (Centro de


março/1962
Treinamento de Tecnologia Têxtil Industrial – Senai)

79
Fundação da Agência de Cooperação Técnica para o Exterior (OTCA),
junho/1962
precursora da Jica

Assinatura do Acordo Básico de Cooperação Técnica entre o Brasil e


setembro/1970
o Japão

Fundação da Jica como resultado da fusão entre OTCA e Agência de


agosto/1974
Emigração do Japão

Abertura do escritório da JICA no Brasil (como escritório anexo da


agosto/1976
Embaixada do Japão)

Assinatura dos três primeiros contratos de empréstimo ODA ao Brasil:


dezembro/1981 “Projeto de Construção do Porto de Praia Mole”, “Projeto de Construção
do Porto Vila do Conde” e “Projeto de Aquisição de Navio Draga”

Início da 1ª Cooperação Triangular, Curso de Treinamento para


setembro/1985
Terceiros Países “Engenharia Elétrica/Eletricidade Industrial” (Senai)

setembro/1987 Criação da Agência Brasileira de Cooperação (ABC)

Primeira participação dos países africanos ao Treinamento para Terceiros


março/1989
Países “Engenharia Elétrica/Eletricidade Industrial” e “Corpo de Bombeiros”

Fundação do Banco do Japão para Cooperação Internacional (JBIC) como


outubro/1999
resultado da fusão entre OECF e Eximbank do Japão

Assinatura do acordo JBPP (Programa de parceria Japão – Brasil) entre o


março/2000
governo brasileiro e governo japonês

Início do primeiro projeto conjunto JBPP “Treinamento para Fortalecimento


outubro/2007
Funcional do Hospital Josina Machel da República de Angola”

outubro/2008 Integração da Jica com o setor de empréstimo do JBIC

Início da 1ª Cooperação Técnico-Científica no Brasil “Pesquisa de


agosto/2009 Produção de Etanol a partir do bagaço de cana” em resposta aos
desafios no âmbito global

Assinatura do 1º contrato de empréstimo ODA, pós-integração Jica-JBIC,


março/2010
com a Casan (Programa de Saneamento Ambiental de Santa Catarina)

80
Início do 1º projeto de parceria público-privada “Pesquisa preparatória
janeiro/2012 para negócios da BOP adaptados ao ambiente usando o sistema
agroflorestal (promoção da colaboração comercial da BOP)”

Início do “Projeto de Fortalecimento da Estratégia Nacional de Gestão


julho/2013 Integrada de Riscos em Desastres Naturais (Gids)”, um projeto de
prevenção de desastres

Assinatura do primeiro empréstimo na modalidade “Financiamento


para Investimento do Setor Privado – PSIF” entre Amaggi, City Bank e
setembro/2018
Jica do “Projeto de Fortalecimento da Cadeira de Fornecimento Agrícola”
no Brasil após a retomada dos negócios em 2012

Fonte: Jica (2019)

O desenvolvimento da cooperação entre o Brasil e o Japão pode ser dividido em três fases.
A primeira teve início em 1985, quando teve início a implementação da cooperação triangular,
por meio de programas de treinamento a terceiros países. O objetivo central envolve utilizar a
experiência e os resultados da relação bilateral desde 1958. Os programas se destinaram
principalmente à América Latina e países africanos de língua portuguesa, e os principais campos
abrangidos foram: agricultura, saúde, treinamento vocacional, setores ambientais
(SAKAGUCHI, 2012).
A segunda fase da colaboração se iniciou em 2000, quando foi introduzido o Programa de
Parcerias Japão-Brasil – Japan-Brazil Partnership Program (JBPP) –, buscando conduzir a
cooperação triangular com base em um relacionamento mais bem equilibrado entre os dois países.
A terceira fase, por sua vez, foi inaugurada na metade dos anos 2000, quando as atividades
conjuntas aumentaram quantitativamente, e projetos de larga escala passaram a ser estruturados e
executados. Entre outubro de 2007 e novembro de 2012, o programa de parcerias havia realizado
13 projetos, 14 seminários conjuntos e 17 novos cursos de treinamento para terceiros. O salto
qualitativo e quantitativo das ações elaboradas por meio do JBPP é refletido na expansão
significativa em termos de recursos humanos, orçamentos e material. Os projetos desenvolvidos em
conjunto produzem impactos positivos ao processo de desenvolvimento dos países beneficiários
(SAKAGUCHI, 2012).

81
Figura 10 – Cooperação japonesa em números

A assistência japonesa supera um total


acumulado de 440 bilhões de ienes. Desenvolvimento de 345 mil hectares de
terras agrícolas no Cerrado.
O Japão prestou assistência que, no total
acumulado, ultrapassa os 440 bilhões de A cooperação técnica e financeira trouxe,
ienes. As áreas contempladas são as mais posteriormente, o aumento de 65% das
variadas, incluindo meio ambiente, saúde, terras aráveis, de 50% do volume de
agricultura, segurança pública, produção e de 300% da produtividade.
infraestrutura, entre muitas outras.

Contribuição para a melhoria da Contribuição para a melhoria da saúde


segurança por meio do modelo japonês materno-infantil por meio da
de policiamento comunitário. humanização do parto pelo “Projeto Luz”.

Com a disseminação do modelo japonês de A taxa de mortalidade infantil do estado do


policiamento comunitário, o número de Ceará diminuiu de 92/1000 nascimentos
homicídios no estado de São Paulo (1996) para 38/1000 nascimentos (2000).
apresentou uma grande queda, passando de
34,18 casos por 100 mil habitantes (2000) Contribuição para a queda de 40% do
para 6,70 casos por 100 mil habitantes desmatamento da Floresta Amazônica
(2018). Em abril de 2019, o Ministério da em quatro anos.
Justiça e Segurança Pública lançou a Diretriz Como medida contra o desmatamento ilegal
Nacional de Polícia Comunitária, e o modelo da Floresta Amazônica, a Jica implementou
está se expandindo para todo o País. um projeto de cooperação com o Ibama
para construir um sistema de
Contribuição para a produção doméstica
monitoramento do desmatamento ilegal,
de vacinas contra sarampo e poliomielite.
utilizando satélite japonês. O projeto
As vacinas contra sarampo e poliomielite contribuiu para a fiscalização do
dependiam da impostação, mas, a partir de desmatamento ilegal, tendo inclusive
1980, durante quatro anos, executamos o detectado mais de 2.000 locais de
projeto de desenvolvimento do sistema de desmatamento em dois anos desde o início
produção doméstica de vacinas e, com os da cooperação.
esforços do Brasil que continuaram mesmo
após a conclusão do projeto, o País alcançou
a autossuficiência no tocante a ambas as No total, mais de 12.000 técnicos
vacinas. brasileiros participaram do treinamento
da Jica no Japão.
Envio de um total de 3.325 peritos da Jica.

Fonte: Jica (2019)

82
A cooperação bilateral, principalmente proveniente do Japão para o Brasil, é multifacetada,
reunindo prioridades políticas e econômicas, promovendo a aproximação entre os países e produzindo
resultados de impacto e de longo prazo na sociedade brasileira. As necessidades de desenvolvimento
do Brasil aliadas à experiência japonesa em estruturar projetos de cooperação produziram importantes
atividades conjuntas e apresentam potencial de expansão e aprimoramento.

Considerações finais
As relações entre o Japão e o Brasil são centenárias, amplas; apresentam alto nível de
complementaridade e, ainda, diversas possibilidades de expansão e aprofundamento. Ao passo em
que o Japão contribuiu historicamente para o processo de desenvolvimento brasileiro, também o
Brasil contribui para a inserção internacional japonesa, além de responder às necessidades da cadeia
de suprimentos da economia do Japão.
No século XXI, o Brasil despontou como uma das mais relevantes economias emergentes,
chamando a atenção de investidores internacionais, entre eles os japoneses. Atraído pelas vantagens
de participar do processo de desenvolvimento brasileiro, um dos maiores atores da América Latina,
o Japão procurou aumentar o nível de institucionalização e formalização das relações bilaterais.
Por fim, no contexto de transição sistêmica e de acirramento da competição entre as grandes
potências, estreitar o diálogo se torna ainda mais relevante no sentido de que, como players
relevantes nos seus entornos regionais, o Japão e o Brasil representam pontos de inserção para a
Ásia e para a América Latina, respectivamente. Nesse sentido, as expectativas quanto ao aumento
da aproximação, que contribuiu mutuamente para a satisfação de interesses e de objetivos
nacionais, são positivas.

83
BIBLIOGRAFIA
AKIMOTO, Daisuke. Japan expects Biden to rejoin the TPP. The Diplomat, 12 de fevereiro de
2020. Disponível em: <https://thediplomat.com/2021/02/japan-expects-biden-to-rejoin-the-tpp>.

ARRIGHI, Giovanni. A Ilusão do Desenvolvimento. Petrópolis/RJ: Vozes, 1996.

ARMSTRONG, Shiro P. The politics of Japan-China trade and the role of the world trade system.
The World Economy, v. 35, n. 9, p. 1-19, 2012.

ASIA-PACIFIC CENTER FOR SECURITY STUDIES (APCSS). Japan gets serious about missile
defense: North Korean crisis pushes debate. APCSS, v. 2, n. 4, June 2003. Disponível em:
<https://apcss.org/Publications/APSSS/JapanGetsSeriousAboutMissileDefense.pdf>.

ASIA REGIONAL INTEGRATION CENTER (Aric). Chiang Mai initiative: multilateralization.


[S. l.]: Aric, 2021. Disponível em: <https://aric.adb.org/initiative/chiang-mai-initiative>.

ASSOCIATION OF SOUTHEAST ASIA NATIONS (Asean). Joint statement on East Asia


cooperation. Asean, v. 28, November 1999. Disponível em: <https://asean.org/?static_post=joint-
statement-on-east-asia-cooperation-28-november-1999>.

ATLAS OF ECONOMIC COMPLEXITY. What did Brazil export to Japan in 2018? 2021a. Disponível
em: <https://atlas.cid.harvard.edu/explore?country=32&product=undefined&year=2018&productClass
=HS&target=Partner&partner=114&startYear=undefined>. Acesso: 10 maio 2021.

ATLAS OF ECONOMIC COMPLEXITY. What did Japan export to Brazil in 2018? 2021b.
Disponível em: <https://atlas.cid.harvard.edu/explore?country=114&product=undefined&year=
2018&productClass=HS&target=Partner&partner=32&startYear=1995%20Unidade%203:%20
Atividade%20Pol%C3%ADtico-Diplom%C3%A1tica>. Acesso: 10 maio 2021.

ATLAS OF ECONOMIC COMPLEXITY. Where did Japan import from in 2018? 2021c.
Disponível em: <https://atlas.cid.harvard.edu/explore?country=114&product=undefined&year=
2018&tradeDirection=import&productClass=HS&target=Partner&partner=undefined&startYear=
1995>. Acesso: 10 maio 2021.

84
ATLAS OF ECONOMIC COMPLEXITY. Where did Japan export to in 2018? 2021d. Disponível
em: <https://atlas.cid.harvard.edu/explore?country=114&product=undefined&year=2018&
productClass=HS&target=Partner&partner=undefined&startYear=1995>. Acesso: 10 maio 2021.

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Foreign direct investment in Brazil report. 2018. Disponível em:
<https://www.bcb.gov.br/Rex/CensoCE/ingl/FDIReport2016.pdf>. Acesso em: 10 maio 2021.

BANGSBERG, Harry F. The United States and the Colombo plan. India Quarterly , v. 15, n. 2,
p. 130-141, April-June 1959.

BEASLEY, W. G. The Sino-Japanese commercial treaty of 1896. Conflict and amity in East Asia,
p. 1-15, 1992.

BOWN, Chad P.; McCULLOCH, Rachel. US-Japan and US-PRC trade conflict: export growth,
reciprocity, and the international trading system. ADBI Working Paper Series, ADBI Institute, 2009.

BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Visita ao Brasil do primeiro-ministro do Japão, Shinzo
Abe: comunicado conjunto. Disponível em: <http://antigo.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-
imprensa/5777-visita-ao-brasil-do-primeiro-ministro-do-japao-shinzo-abe-comunicado-conjunto-
31-de-julho-a-2-de-agosto-de-2014>. Acesso em: 31 maio 2021.

BRIGAGÃO, Clóvis. Paz, segurança internacional e a inserção brasileira. 2011. Tese (Doutorado
em Estudos Estratégicos Internacionais) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.

BRITES, Pedro V. P. As dinâmicas regionais do Nordeste Asiático e o pivô norte-coreano. 2018. 270
f. Tese (Doutorado em Estudos Estratégicos Internacionais) – Faculdade de Ciências Econômicas,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.

BUSH, Richard. C. China-Japan Tensions, 1995-2006: why they happened, what to do. Brookings
Policy Paper, n. 16, June 2009.

CALDER, Kent E.; FUKUYAMA, Francis. Multilateralismo na Ásia Oriental: perspectivas para a
estabilidade regional. Rio de Janeiro: Rocco, 2012.

CENTRE FOR STRATEGIC AND INTERNATIONAL STUDIES (CSIS). Counter-coercion


series: East China Sea Air Defense Identification Zone. Asia Maritime Transparency Initiative.
[S. l.]: CSIS, 2021.

85
CHENAULT, Kathy. Japanese prime minister meets with China’s communist leader. AP News,
August 1991. Disponível em: <https://apnews.com/article/09f8feb057f36ea1dc9b44052d34ef1e>.

CHIANG, Min-Hua. Contemporary China-Japan relations: the politically driven economic


linkage. East Asia, v. 36, p. 271-290, 2019.

CONGRESSIONAL RESEARCH SERVICE (CRS). U.S.-Japan trade agreement negotiations.


Washington: CRS, 2020.

COOPER; William H.; MANYIN, Mark. E. Japan joins the Trans-Pacific partnership. CRS Report
for Congress. Washington: Congressional Research Service, 2013.

CUMINGS, Bruce. Dominion from sea to sea: Pacific ascendancy and American power. London:
Yale University Press, 2010.

DEPARTAMENTO DO EXÉRCITO DOS EUA. As grandes decisões estratégicas: II Guerra


Mundial. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 2014.

FENG, Shaokui. Japanese Aid to China: a comparison of ODA from Japan and Europe. In:
ARASE, David. Japan's Foreign Aid: old continuities and new directions. London: Routledge, 2005.

FRANKEL, Jeffrey. The Plaza Accord 30 years later. In: BERGSTEN, C. F.; GREEN, Russel.
Conference on currency policy then and now: 30th Anniversary of the Plaza Accord, Houston: Baker
Institute for Public Policy, 2015, p. 1-18.

G4. Joint Press Statement. 2014. Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/files/100002848.pdf>.


Acesso em: 10 maio 2021.

G4. Joint Press Statement. 2019. Disponível em: <https://www.gov.br/mre/en/contact-us/press-


area/press-releases/meeting-of-the-foreign-ministers-of-the-g4-countries-brazil-germany-india-
and-japan-united-nations-security-council-reform-joint-press-statement-new-york-25-september-
2019>. Acesso em: 10 maio 2021.

GAO. U.S.-Japan trade: evaluation of the market-oriented sector-selective talks. Report to the
Honorable Lloyd M. Bentsen, U.S. Senate. United States General Accounting Office, 1988.

HALL, John Withney. El imperio japonés. Madrid: Siglo Veintuno Editores, 1985.

86
HOOK, Glenn D.; GILSON, Julie; HUGHES, Christopher W.; DOBSON, Hugo. Japan and
the East Asian Financial Crisis: patterns, motivations and instrumentalisation of japanese regional
economic diplomacy. European Journal of East Asian Studies, v. 1, n. 2, p. 177-197, 2002.

HOOK, Glenn D.; GILSON, Julie; HUGHES, Christopher W.; DOBSON, Hugo. Japan's
international relations: politics, economics and security. [S. l.]: Routledge, 2011.

HOSHIRO, Hiroyuki. Building an East Asian Community in vain: Japan's Power Shift and regionalism
in the new millennium. ISS Discussion Paper Series, F-172, Institute of Social Sciences, 2015.

HUNTINGTON, Samuel P. O Choque de Civilizações e a Recomposição da Ordem Mundial. Rio


de Janeiro: Objetiva, 1997.

INTERNATIONAL INSTITUTE FOR STRATEGIC STUDIES (IISS). The military balance:


the annual assessment of global military capabilities and defence economics. IISS, 2020.

IOKIBE, Makoto. The History of US-Japan Relations: From Perry to the Present. Palgrave
Macmillan, 2017.

IRIYE, Akira. Chinese-Japanese relations, 1945-90. The China Quarterly, December 1990, n. 124,
China and Japan: History, Trends and Prospects, p. 624-638.

JAPAN HOUSE. O que é JH. 2012. Disponível em: <https://www.japanhouse.jp/pt/what>. Acesso


em: 10 maio 2021.

JETRO. O que é a Jetro. Disponível em: <https://www.jetro.go.jp/brazil/atividades.html>. Acesso


em: 7 maio 2021.

JAPAN INTERNATIONAL COOPERATION AGENCY (Jica). 50 anos de cooperação Brasil-


Japão. [S. l.]: Jica, 2009. Disponível em: <https://www.jica.go.jp/brazil/portuguese/office/
publications/pdf/50anos.pdf>. Acesso em: 7 maio 2021.

JAPAN INTERNATIONAL COOPERATION AGENCY (Jica). As marcas da cooperação japonesa


no Brasil. [S. l.]: Jica, 2019. Disponível em: <https://www.jica.go.jp/brazil/portuguese/office/
publications/c8h0vm000001w9k8-att/60anos.pdf>. Acesso em: 7 maio 2021.

87
JAPAN INTERNATIONAL COOPERATION AGENCY (Jica). Sobre a Jica. [S. l.]: Jica,
2021. Disponível em: <https://www.jica.go.jp/brazil/portuguese/office/about/index.html>.
Acesso em: 7 maio 2021.

JOHNSON, Chalmers. The patterns of Japanese relations with China, 1952-1982. Pacific Affairs,
Autumn, v. 59, n. 3, p. 402-428, 1986.

KAPLAN, Robert D. A vingança da geografia: a construção do mundo geopolítico a partir da


perspectiva geográfica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

KIM, Hong N. Sino-Japanese Economic Relations since 1978. Asian Perspective, Fall-Winter 1985,
v. 9, n. 2 (Fall-Winter 1985), p. 155-168.

KISSINGER, Henry. Sobre a China. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.

KOPPER, Ákos. Yukio Hatoyama and the politics of fraternity: déja vu in Japanese politics?
Hungarian Institute of International Affairs, 2009. Disponível em:
<https://kki.hu/assets/upload/Tanulmanyok_2009_22_Yukio_Hatoyama_and_the_Po.pdf>.

KWAN, Chi Hung. The Rise of China and Transformation of Japan-China Relations:
opportunities and challenges for Japan. Research Institute of Economy, Trade and Industry, 2014.
Disponível em: <https://www.rieti.go.jp/en/china/14080501.html>. Acesso em: 16 maio 2021.

LAM, Peng Er. Japan’s relations with China: facing a rising power. Abingdon: Routledge, 2006.

LEE, Geun. The Clash of Soft Powers Between China and Japan: synergy and dilemmas at the Six-
Party Talks. Asian Perspective, Volume 34, Number 2, 2010, pp. 113-139.

LIDA, Masafumi. Japan-China Relations in East Asia: Rivals or Partners? National Institute for
Defense Studies, s/a. Acesso em: 24 de maio de 2021. Disponível em:
<http://www.nids.mod.go.jp/english/publication/joint_research/series3/pdf/3-6.pdf>.

MAN, Tang Siew. Japan’s grand strategic shift from Yoshida to Koizumi: reflections on Japan’s
strategic focus in the 21st century. Akademika, n. 70, p. 117-136, 2007. Disponível em:
<https://core.ac.uk/download/pdf/11493236.pdf>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Joint press conference: Mr. Ryutaro
Hashimoto, Prime Minister of Japan and Mr. William Clinton, President of the United States of

88
America. Ministry of Foreign Affairs, 1996. Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/region/n-
america/us/relation/visit_C/jointpress.html#6>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Japan-China Joint declaration on building


a partnership of friendship and cooperation for peace and development. Ministry of Foreign Affairs, 1998.
Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/region/asia-paci/china/visit98/joint.html>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Joint Statement U.S.-Japan Security


Consultative Committee. Ministry of Foreign Affairs of Japan, 2005. Disponível em:
<https://www.mofa.go.jp/region/n-america/us/security/scc/joint0502.html>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Joint Statement between the Government
of Japan and the Government of the People's Republic of China on Comprehensive Promotion of a
Mutually Beneficial Relationship Based on Common Strategic Interests. Ministry of Foreign Affairs of
Japan, 2008a. Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/region/asia-paci/china/joint0805.html>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Japan-China-ROK Trilateral Summit:


action plan for promoting trilateral cooperation among the people's Republic of China, Japan and
the Republic of Korea. Ministry of Foreign Affairs of Japan, 2008b. Disponível em:
<https://www.mofa.go.jp/region/asia-paci/jck/summit0812/action.html>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Japan-Brazil relations, 2018. Acesso


em: 6 maio 2021. Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/region/latin/brazil/data.html>. Acesso
em: 6 maio 2021.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Joint Communique of the Government


of Japan and the Government of the People's Republic of China. Ministry of Foreign Affairs of Japan,
2021a. Disponível em: <https://www.mofa.go.jp/region/asia-paci/china/joint72.html>.

MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS OF JAPAN (Mofa). Treaty of Peace and Friendship Between
Japan and The People's Republic of China. Ministry of Foreign Affairs of Japan, 2021b. Disponível
em: <https://www.mofa.go.jp/region/asia-paci/china/treaty78.html>.

MIYAZAKI, S. Y. M. Japanese trade policy and implications for Brazilian trade. In: Observatorio
America Latina-Asia Pacifico (2019). Tercer Seminario Academico: Hacia una Relacion Integral
entre America Latina y Asia Pacifico. Montevideo: Aladi, CAF, Cepal.

89
NATIONAL DIET LIBRARY. 100 anos de imigração japonesa no Brasil. 2009. Disponível em:
<https://www.ndl.go.jp/brasil/pt/index.html>. Acesso em: 6 maio 2021.

NOBORU, Yamaguchi. Redefining the Japan-US alliance. Nippon, 2012. Disponível em:
<https://www.nippon.com/en/features/c00204/#note-1-4>.

NUNES, Paulo H. F. As relações Brasil-Japão e seus reflexos no processo de ocupação do território


brasileiro. Geografia, v. 17, n. 1, p. 137-152, jan./jun. 2008.

OBSERVATORY OF ECONOMIC COMPLEXITY. Trade data. OEC, 2021. Disponível em:


https://oec.world/.

OLIVEIRA, Amaury Porto de. Governando a China: a quarta geração de dirigentes assume o
controle da modernização. Revista Brasileira de Política Internacional, v. 46, n. 2, dez. 2003.
Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbpi/a/YhVZWwxvfjsDPpz3rdzm3Qs/?lang=pt>.

OLIVEIRA, Henrique Altemani de. China e Japão no âmbito da economia política internacional.
Texto do evento realizado no Instituto de Estudos Avançados “China e Japão: parceiros ou rivais”
em 1995. Disponível em: <http://www.iea.usp.br/publicacoes/textos/oliveirachinaejapao.pdf>.
Acesso em: 16 maio 2021.

OLIVEIRA, Henrique Altemani (Org.). Parcerias estratégicas do Brasil: os significados e as


experiências tradicionais. Belo Horizonte: Fino Traço, 2013.

OLIVEIRA, Henrique Altemani de Oliveira; MIYAZAKI, Silvio Yoshiro Mizuguchi. Japão:


Estratégias de Inserção Internacional. Curitiba: Juruá, 2018.

PAINE, S. M. C. The wars for Asia: 1911-1949. Cambridge: Cambridge University Press, 2014.

PANDA, Ankit. China and South Korea: Examining the Resolution of the THAAD Impasse
Image Credit: U.S. National Missile Defense Agency China and South Korea: Examining the
Resolution of the THAAD Impasse. In: The Diplomat, Washington, nov. 2017. Disponível
em: <https://thediplomat.com/2017/11/china-and-south-korea-examining-the-resolution-of-
the-thaad-impasse/>.

PECEQUILO, Cristina. A política externa dos Estados Unidos: continuidade ou mudança. Porto
Alegre: UFRGS, 2011.

90
PIKE, Francis. Empires at war: a short history of modern Asia since World War II. New York: I. B.
Tauris, 2010.

POTSDAM DECLARATION. Proclamation defining terms for Japanese surrender. National Diet
Library, 1945. Disponível em: <https://www.ndl.go.jp/constitution/e/etc/c06.html>.

REGIONAL COMPREHENSIVE ECONOMIC PARTNERSHIP (RCEP). 2019. Disponível


em: <https://rcepsec.org/about>. Acesso em 16 maio 2021.

RINEHART, Ian E.; ELIAS, Bart. China’s Air Defense Identification Zone (Adiz). Congressional
Research Service (CRS), 2015.

SAKAGUCHI, Kota. Case 8 Japan-Brazil Partnership Program: a framework for triangular


cooperation. Scaling up South-South and Triangular Cooperation, 2012, p. 227.

SAKURAI, Célia. Primeiros polos da imigração japonesa no Brasil. Revista USP, n. 27, p. 32-45,
set/nov 1995.

SATO, Heigo. Japan-U.S. Security Relations under the Koizumi administration: implications for
Bush’s second term. National Institute for Defense Studies, Tokyo, 2004.

SHINODA, Tomohito. Koizumi diplomacy: Japan's Kantei approach to foreign and defense affairs.
Washington: University of Washington Press, 2007.

SILVA, Athos Munhoz Moreira da. As relações da República Popular da China e o Japão: da Guerra Fria
à interdependência. 2012. 80 f. Monografia (Graduação em Relações Internacionais) – Faculdade de
Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.

SILVA, Athos Munhoz Moreira da. A ascensão da China e os seus impactos para o Leste asiático. 2015.
185 f. Dissertação (Mestrado em Estudos Estratégicos Internacionais) – Faculdade de Ciências
Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.

SIMÕES, Letícia Cordeiro. Política externa brasileira e a Ásia: as relações Brasil-Leste asiático de
JK a Lula. In: 3º ENCONTRO NACIONAL ABRI 2011, 3, 2011, São Paulo. Proceedings...
Associação Brasileira de Relações Internacionais Instituto de Relações Internacionais, Universidade
de São Paulo. Disponível em: <http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&
pid=MSC0000000122011000300003&lng=en&nrm=abn>. Acesso em: 5 maio 2021.

91
SOON, Lau Teik. The Soviet-Vietnamese treaty: a giant step forward. Southeast Asian Affairs,
p. 54-65, 1980.

SUMIKAWA, Shunsuke. The Meiji restoration: roots of modern Japan. Asia, n. 163, 1999.

TEO, Victor. Japan’s Arduous Rejuvenation as a Global Power: democratic resilience and the US-
China challenge. Hong Kong: Palgrave Macmillan, 2019.

TOGO, Kazuhiko. Japan's Foreign Policy (1945-2003): the quest for a proactive policy. Leiden:
Brill Academic Pub, 2005.

UEHARA, A. R. Brasil-Japão: da imigração ao século XXI. In: LESSA, Antônio Carlos;

UNITED CENSUS BUREAU. Trade in goods with Japan. Foreign Trade, United Census Bureau,
2021. Disponível em: <https://www.census.gov/foreign-trade/balance/c5880.html>.

VARGAS, J. A. C. Brasil e Japão: construindo uma agenda global comum. In: BARBOSA, P. H.
B. (Org.). Os desafios e oportunidades na relação Brasil-Ásia na perspectiva de jovens diplomatas.
Brasília: Funag, 2017.

VISENTINI, Paulo Fagundes. As relações diplomáticas da Ásia: articulações regionais e afirmação


mundial – uma perspectiva brasileira. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011.

VISENTINI, P. G. F.; PEREIRA, A. D.; MARTINS, J. M.; RIBEIRO, L. D.; GRÖHMANN, L.


G. Revoluções e regimes marxistas: rupturas, experiências e impacto internacional. Porto Alegre:
Leitura XXI/Nerint, 2013.

VOGEL, Ezra; YUAN, Ming; TANAKA, Akihiko. The golden age of U.S.-China-Japan triangle:
1972-1989. Cambridge: Harvard University Asia Center, 2002.

VOICE OF AMERICA. Senkaku/Diaoyu Islands Interactive Map. Voice of America, 2021.


Disponível em: <https://www.voanews.com/senkakudiaoyu-islands-interactive-map>.

WORLD NUCLEAR ASSOCIATION. Fukushima Daiichi accident. World Nuclear


Association, 2021.

92
WU, Zhigang. Research on Japan’s ODA to China and It’s Contribution to China’s Development.
Project on the Chinese Economy, ORC, Kyoto Sangyo University, on March, 2008. Disponível
em: <https://www.cc.kyoto-su.ac.jp/project/orc/econ-public/china/documents/WUDP28.pdf>.

YAMAMURA, R. J. H. O estabelecimento das relações Brasil-Japão no século XIX. Textos de História,


v. 4, n. 1, p. 125-148, 1996.

93
PROFESSOR-AUTOR
PEDRO BRITES
FORMAÇÃO ACADÊMICA
 Doutor em Estudos Estratégicos Internacionais pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS).

EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS
 Vice-Coordenador do Programa de Graduação e Professor Agregado da Escola de Relações
Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP).
 Professor Adjunto da Universidade Federal de Pelotas.
 Coordenador e Professor do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário
Ritter dos Reis.
 Pesquisador-Associado do Núcleo Brasileiro de Estratégia e Relações Internacionais
(NERINT-UFRGS) e do Laboratório de Estudos de Defesa e Segurança (LEDS-Centro
Universitário Ritter dos Reis).
 Ex-Diretor-Geral do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE).
 Pesquisador das áreas de relações internacionais da Ásia, política internacional e segurança
internacional com ênfase em estudos regionais.

PUBLICAÇÕES
 Organizou o livro Mundo em crise, lançado em 2021, sobre política internacional na
década após a crise financeira de 2007 e 2008.

Você também pode gostar