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Parafilia

A parafilia é também chamada popularmente de perversão sexual. O


termo perversão, derivado do latim pervertere significa práticas sexuais
consideradas desviantes da norma sexual e social, traz já em seu significado
original sua conotação sexual.
Na base deste julgamento encontra-se a noção de uma sexualidade
normal segundo a natureza, cujo desvio, a depravação, é definido como "contra
a natureza". Tal discurso se baseia na concepção teológica de uma Natureza
(physis), herdeira do pensamento grego, em particular de Aristóteles. Sustenta-
se que existem inclinações naturais nas coisas, e que tudo que é natural
agrada a Deus, logo é bom. É nesta perspectiva que São Tomás de Aquino
qualifica certas práticas sexuais como "contra a natureza" alegando uma
natureza comum aos homens e aos animais. Assim, toda vez que a
sexualidade desvia da finalidade primeira que a referência animal nos mostra
(união de dois órgãos sexuais diferentes para a preservação da espécie),
estamos diante de uma perversão: pedofilia, necrofilia, masturbação,
heterossexualismo separado da procriação, homossexualismo, sodomia.
No século XIX nasce o discurso psiquiátrico que, à sua maneira, retoma
a definição de perversão em função de uma finalidade natural e universal,
dando uma continuidade às posições teológicas e jurídicas: o que é penal
passa a ser da ordem médica. Algumas práticas sexuais são então qualificadas
de "patológicas", o que faz surgir novas formas de perversões em que o outro é
usado para obtenção de prazer e, mais uma vez, a finalidade natural é
subvertida. Voyerismo, exibicionismo, sadismo, masoquismo vêm juntar-se à
infindável nosografia psiquiátrica da época.
Sigmund Freud lança, em 1905, um ensaio de 40 páginas que constitui,
na época, apenas mais uma publicação dentre muitas outras. Os "Três Ensaios
sobre a Teoria da Sexualidade" fez de Freud uma figura extremamente
impopular. A sua contribuição para a compreensão das perversões não vem do
tipo de material clínico observado, mas da afirmação escandalosa de que as
tendências perversas, catalogadas pelos seus colegas como aberrações
humanas, assombram os espíritos de todos os homens, inclusive daqueles que
as catalogaram, estando também presentes nas crianças: "a criança é um
perverso polimorfo".
Na década de 80, o termo parafilia vem substituir a idéia de perversão
sexual na literatura médica psiquiátrica. Parafilia (do grego pará = ao lado de,
funcionamento desordenado ou anormal, oposição + philos = amante, que tem
afinidade, atraído por) traduz melhor o sentido psicanalítico, que, segundo
Laplanche (1998), é o "desvio em relação ao ato sexual normal, definido este
como coito que visa à obtenção do orgasmo por penetração genital, com uma
pessoa do sexo oposto".
A definição médico-legal de parafilia proposta por Fávero (1951), sob o
título de transtorno do instinto sexual, era: "As perversões sexuais são
modificações qualitativas e quantitativas do instinto sexual, quer no que se
refere à finalidade do ato, quer no que diz respeito ao objeto sexual".
Para o DSM IV, as parafilias consistem em fantasias, anseios sexuais ou
comportamentos recorrentes, intensos e sexualmente excitantes envolvendo
objetos não humanos ou situações incomuns, causam sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras
áreas importantes da vida do indivíduo.
Não se podem considerar todos os desvios sexuais como mórbidos, já
que as condutas sexuais admitem uma grande variação de meios e de fins
eróticos para obter o orgasmo. O desvio pode ser entendido quando se tratar
de uma síndrome psicopatológica ou como uma perversão sexual isolada, e
então é necessário estudar a personalidade, motivações e limites de reação do
indivíduo.
Em alguns indivíduos, as fantasias ou estímulos parafílicos são
obrigatórios para a excitação erótica e sempre incluídos na atividade sexual.
Em outros casos, as preferências parafílicas ocorrem apenas episodicamente
(por ex., talvez durante períodos de estresse), ao passo que em outros momentos
o indivíduo é capaz de funcionar sexualmente sem fantasias ou estímulos parafílicos.
O diagnóstico de Parafilias entre as várias culturas ou religiões é
complicado pelo fato de que aquilo que é considerado um desvio em um
contexto cultural pode ser mais aceitável em outro. Exceto pelo Masoquismo Sexual,
em que a proporção entre os sexos está estimada em 20 homens para cada mulher,
as demais Parafilias quase nunca são diagnosticadas em mulheres, embora
alguns casos tenham sido relatados. Certas fantasias e comportamentos
associados com Parafilias podem iniciar na infância ou nos primeiros anos da
adolescência, mas tornam-se mais definidos e elaborados durante a
adolescência e início da idade adulta. A elaboração e revisão das fantasias
parafílicas pode continuar ao longo de toda a vida do indivíduo. Por definição, as
fantasias e os anseios associados com esses transtornos são recorrentes. Muitos
indivíduos relatam que as fantasias estão sempre presentes, mas que existem períodos
em que a freqüência das fantasias e a intensidade dos anseios variam
substancialmente.
Segundo o DSM IV, existem critérios diagnósticos para as parafilas, a
fim de diagnosticar se uma pessoa possui ou não traços patológicos em sua
sexualidade. Tais critérios diagnósticos são:
A. Ao longo de um período mínimo de 6 meses, fantasias, anseios
sexuais e comportamentos sexualmente excitantes recorrentes e intensos
envolvendo a exposição dos próprios genitais a um estranho insuspeito.
B. A pessoa realizou estes desejos sexuais, ou os desejos ou fantasias
sexuais causam acentuado sofrimento ou dificuldade interpessoal.

Existem vários tipos de práticas sexuais consideradas atípicas, essas práticas


incomuns são classificadas em tipos de parafilia, citaremos a seguir as
parafilias mais conhecidas:

Incesto:
Trata-se da ocorrência de relações sexuais entre parentes sanguíneos
próximos; esta definição é ampliada para incluir as relações sexuais entre
padrasto (ou madrasta) e enteado (a) e entre irmãos adotivos (KAPLAN;
SADOCK, 1993, p. 491). A observação de casos reais sugere que a
oportunidade favorece a ocorrência desse comportamento. Do ponto de vista
psíquico, muitas hipóteses podem ser levantadas; em maior ou menos grau,
contudo, todas giram em torno do fator oportunidade. O risco de que isto
aconteça amplia-se quando se trata de famílias incestuosas e determinado
acontecimento insere-se dentro de um contexto que precisa ser compreendido
segundo suas características pontuais e evolutivas.
Pedofilia:
É a preferência sexual por crianças, usualmente de idade pré-puberal ou
no início da puberdade (CID-10, p. 215). Relatos evidenciam intensa
convivência entre o adulto e a criança em situação relativa intimidade e
dependência desta em relação àquele. A natureza do abuso não é
necessariamente a penetração vaginal, pode variar entre vários tipos de atos,
tais como: conversas ou telefonemas obscenos, apresentação forçada de
imagens pornográficas (a internet tem sido um grande meio de propagação da
pedofilia), exibição de órgãos sexuais doadulto para a criança, contatos sexuais
ou masturbação forçada, até relações impostas (vaginais, orais ou anais).
Várias hipóteses são levantadas em relação ao abusador, uma delas é a de
que o abusador foi vítima de abuso na infância, e esse trauma sexual real
funcionaria, mais tarde, como de desencadeador e geraria consequências e
dificuldades no estabelecimento de vínculos afetivos adequados. Outros
apresentam impotência com mulheres adultas, procuram assim crianças
exatamente pela fragilidade e facilidade de exercer seu poder.
Exibicionismo:
Consiste em uma tendência recorrente ou persistente a expor a genitália
a estranhos (usualmente do sexo oposto) ou a pessoas em lugares públicos,
sem convite ou pretensão de contato mais íntimo (CID-10, 1993, p. 214).
Configura crime, descrito no art. 233 do Código Penal – Ato Obsceno. Os
exibicionistas procuram quase sempre os mesmo lugares. A origem de tais
comportamentos pode estar associada a abuso sexual na infância, na
educação sexual repressiva, punição física ou emocional relacionada à
sexualidade ou espancamento por alguém quando estavam manipulando sua
genitália em um ambiente público. O início é mais comum antes dos 18 anos.
Estresse e crises emocionais contribuem para acentuá-los.
Voyeurismo:
Ocorre quando o indivíduo manifesta satisfação ao observar
comportamentos sexuais ou íntimos (tais como despir-se); isso o excita e o
leva á masturbação, sem que o observado tome conhecimento. Essas pessoas
podem estar envolvidas em atos sexuais, nuas, em roupa interior, ou com
qualquer vestuário que seja apelativo para o indivíduo em questão. A prática do
voyeurismo manifesta-se de várias formas, embora uma das características-
chave é que o indivíduo não interage com o objeto (por vezes não cientes de
estarem sendo observados); em vez disso, observa-o tipicamente a uma
relativa distância, talvez escondido, com o auxílio de binóculos, câmera, etc., o
que servirá de estímulo para a masturbação, durante ou após a observação.
No que diz respeito à opinião leiga, para algumas pessoas a definição de
Voyeurismo é ‘’aproveitar o sexo, mesmo sem ter sexo’’
Frotteurismo
Frotteurismo é derivado do francês frotter, que significa esfregar ou
roçar. Consistem em uma parafilia em que, vestido, o agente esfrega seus
órgãos genitais contra o corpo da vítima, obtendo prazer, sem o consentimento
da mesma. Esta parafilia ocorre com frequência no transporte coletivo, exemplo
principal de nossa sociedade atual, principalmente nos horários de grande
movimento, momento em que as vítimas, muitas vezes, nem se dão conta da
ocorrência. Pode ocorrer também em trens, elevadores, em locais com grande
concentração de pessoas, dos quais o indivíduo pode escapar mais facilmente
de uma detenção. Ao fazê-lo, o indivíduo geralmente fantasia um
relacionamento exclusivo e carinhos com a vítima. Entretanto, ele reconhece
que, para evitar um possível processo legal, deve escapar à detecção após
tocar sua vítima. Geralmente, a parafilia inicia na adolescência. A maior parte
dos atos deste transtorno ocorre quando a pessoa está entre os 15 e os 25
anos de idade, após o que se observa um declínio gradual em sua frequência.
Sadomasoquismo
O indivíduo procura atividades sexuais que envolvem servidão, ou
provocam dor ou humilhação (CID-10, 1993, p. 215). O termo sadomasoquismo
seria a relação entre tendências opostas, o sadismo e masoquismo. No
masoquismo, ele é o objeto da estimulação, é a tendência em uma pessoa que
busca sentir prazer em receber o sofrimento físico e moral de outra pessoa, já
no sadismo ele executa, é a tendência em uma pessoa que busca sentir prazer
em impor o sofrimento físico e moral à outra pessoa. Pode ocorrer que a
violência seja necessária para a estimulação erótica. O objetivo é causar
sofrimento físico ou emocional, com humilhações. Somente é considerada
parafilia quando o comportamento tem a finalidade exclusiva de obtenção de
prazer. O sadomasoquismo nem sempre envolve o sexo com penetração,
sendo muito comum a masturbação mútua.
Necrofilia
Necrofilia é uma parafilia caracterizada por atração e gratificação sexual
por pessoas mortas. Richard Von Krafft-Ebing é considerado um dos primeiros
cientistas interessados em comportamentos sexuais anormais e, em 1886, ele
considerava necrofilia como um comportamento perverso e que poderia ser
decorrente de condições "neuropáticas ou psicopáticas". A literatura mais antiga
associava necrofilia com severa psicopatologia. Desrosières analisou 53
observações de casos descritos e encontrou 19% de debilidade mental, 13%
de problemas neuróticos, 7,5% de epilepsia, 5,5% de depressão e 4% de
psicose. Anil Aggrawal propôs uma nova classificação para necrofilia:
pseudonecrofilia (uma pessoa finge estar morta), necrófilo romântico, necrófilos
platônicos ou fantasias necrófilas, necrófilos táteis, necrofilia fetichista,
necromutilomania, necrófilos oportunistas, necrófilos regulares, necrófilos
homicidas e necrófilos exclusivos.
Fetichismo Transvérico
Consiste na dependência do ato de vestir-se com roupas do outro sexo em
privacidade. Frequentemente esta prática difere de outras categorias, pois
ocorre apenas entre homens e relaciona-se a excitação sexual e a chegada do
orgasmo de quem o pratica. Em geral, o travestismo é um comportamento que
dura toda uma existência, a qual raramente conduz ao transexualismo, e não
está necessariamente relacionado ao desejo sexual por pessoas do mesmo
sexo, mas de sentir-se como sendo do outro sexo no momento do orgasmo.
(Benjamin, 1966). Existem diferentes tipos de travestismo, desde aqueles que
se excitam sexualmente ao usar peças íntimas de mulheres em suas práticas
masturbatórias ou heterossexuais, até aqueles que se excitam sexualmente ao
se perceberem como mulheres nessas práticas sexuais.
Segundo o DSM IV, o Transtorno Sexual Sem Outra Especificação
é incluído para a codificação de transtornos do funcionamento sexual não
classificáveis em qualquer das categorias específicas. Entre as parafilias sem
outra especificação, localizamos: zoofilia (ato sexual com animais); necrofilia
(cadáveres); escatologia telefônica (telefonemas obscenos); parcialismo (foco
exclusivo em uma parte do corpo); coprofilia ou excrementofília (obtenção de
prazer durante a evacuação das fezes ou com a sua manipulação); clismafília
(prazer obtido com a aplicação de líquidos dentro do reto, através do ânus ou
introdução de objetos estranhos); urofilia (prazer e excitação sexual obtido com
o contato pelo corpo ou ingestão de urina); cunilíngua (ato de praticar sexo oral
aplicando a língua na vúlva e/ou clitóris); felação (sexo oral feito no genital
masculino); anilíngua ou anilingus (significa literalmente o intercurso da língua
de alguém com o ânus de outrem); dendrofília (relação sexual com plantas ou
frutas); acrotomofilia (preferência sexual por pessoas que tenham alguma parte
de seus corpos amputada); erotofonofilia (a excitação ocorre com a
possibilidade de matar o companheiro, coincidindo essa morte com o próprio
orgasmo); gerontofília (atração sexual por pessoas idosas) entre muitos outros.

Referências

CRISTHINA ALVES, Karla; PRADO DE SOUSA, Silas. A perversão sob a


ótica da Medicina Legal. 2004. Acesso em: 24 de outubro de 2012. Disponível
em:http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?
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MOSCATELLO, Roberto. Necrofilia: uma rara parafilia. 2010. Acesso em 25


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Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/prc/v18n3/a17v18n3.pdf

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MURIBECA, Mercês. As diferenças que nos constituem e as perversões


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em:http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?
pid=S010034372009000100014&script=sci_arttext&tlng=en

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